Sancionada em 2006, o dispositivo é responsável por proteger vítimas da violência doméstica e acrescentou medidas nos últimos anos
por
Amanda Furniel
Giuliana Zanin
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20/03/2024 - 12h

A Lei Maria da Penha, uma medida de prevenção e punição em caso de violência doméstica, foi sancionada em 7 de agosto de 2006. Dezessete anos depois, em 2023, o Brasil ainda é o quinto país com mais casos de violência contra mulher, com 3.181 denúncias contra parceiros e parentes. 

A Lei determina que todo caso de violência dentro de casa e por familiares é crime, sendo julgados nos Juizados Especializados de Violência Doméstica Contra a Mulher. Nos últimos cinco anos, houve pelo menos oito coberturas incluídas no projeto, dentre elas, o afastamento imediato da vítima do ambiente de violência sem a prescrição doboletim de ocorrência (B.O.) e a proteção de mulheres transgêneras.

 

Mas, afinal, quem é Maria da Penha?

Maria da Penha Maia Fernandes foi vítima de duas tentativas de feminicídio em 1983. Na primeira, enquanto dormia, seu então marido atirou contra a suas costas, o que a deixou paraplégica. Quatro meses após uma recuperação intensiva da tragédia intencionada que quase tirou a sua vida, o ex-parceiro tentou eletrocutá-la durante o banho, enquanto a mantinha em cárcere privado. Depois de muita luta, a família e os amigos de Maria conseguiram tirá-la de casa e das mãos do agressor.  

 

O caso de Maria da Penha levou ao todo 19 anos e seis meses de disputas judiciais. O agressor chegou a ser sentenciado à prisão duas vezes, com penas de 10 e 15 anos, mas nenhuma das sentenças foi cumprida por falhas na justiça. Na primeira, em 1991, os advogados do réu anularam o julgamento e, na segunda, em 1996, o réu foi condenado a dez anos e seis meses, mas recorreu e acabou passando apenas cerca de dois anos preso. 

 

Origem da Lei 

Após um ultimato da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), em 1998, o Estado Brasileiro foi denunciado e responsabilizado por “negligência, omissão e tolerância” em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. 

O caso de Maria de Penha passou a ser tratado como uma violência contra a mulher por razão de gênero, mas, em 2002, foi formado um Consórcio de ONGs Feministas para reivindicar a elaboração de uma lei especializada no combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Depois de debates e reivindicações dentro dos tribunais, o Projeto de Lei n. 4.559/2004, da Câmara dos Deputados, chegou ao Senado Federal (Projeto de Lei de Câmara n. 37/2006) e foi aprovado por unanimidade em ambas as Casas. A Lei Maria da Penha (Lei N. 11.340) foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.  

Como uma das recomendações do CIDH foi uma reparação simbólica e material à Maria da Penha, o Estado do Ceará pagou uma indenização a ela e o Governo Federal nomeou a lei em reconhecimento e homenagem à sua luta contra a violação dos direitos humanos das mulheres.  

Em 2015, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que a Lei Maria da Penha diminuiu em 10% a taxa de feminicídio cometidos pelos agressores dentro da residência das vítimas. 

A legislação trouxe avanços e amparos para as mulheres brasileiras. Além de tipificar a violência doméstica, ela oferece medida protetiva com o afastamento do agressor da vítima e seus familiares, proíbe aplicação de penas pecuniárias, (ou seja, não pode ser paga por multas ou doações de cestas básicas), oferece auxílio para a mulher caso ela seja financeiramente dependente do agressor e amplia a pena do agressor de um a três anos de cadeia caso a mulher vítima seja deficiente.  

 

Mudanças e inclusões 

Desde 2019, outras medidas foram acrescentadas à Lei Maria da Penha, entre elas:  

  • Lei nº 13.827/19, que permitiu a adoção de medidas protetivas de urgência e o afastamento do agressor do lar pelo delegado;   

  • Lei nº 13.836/19, tornando obrigatório informar quando a mulher vítima de agressão doméstica ou familiar é pessoa com deficiência;  

  • Lei nº 13.871/19 determina como responsabilidade do agressor o ressarcimento dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados; 

  • Lei nº 13.894/19, que atribuiu ao Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a ação de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável. A norma também estabeleceu a prioridade de tramitação dos procedimentos judiciais em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar;

  • Lei nº 13.984/20, estabelecendo obrigatoriedade referente ao agressor, que deve frequentar centros de educação e reabilitação e fazer acompanhamento psicossocial;

  • Lei nº 14.132/21 inclui um artigo no Código Penal (CP) para tipificar os crimes de perseguição (stalking);

  • Lei n° 14.164/21, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para incluir conteúdo sobre a prevenção à violência contra a mulher nos currículos da educação básica, além de instituir a Semana Escolar de Combate à Violência Contra a Mulher, a ser celebrada todos os anos no mês de março;

  • No primeiro semestre de 2022, a Sexta Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a Lei Maria da Penha seria aplicada também em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgêneras. 

 

Os números não param de crescer

Em 2023, o Brasil registrou 1.463 casos de feminicídio, crime em que o assassinato de uma mulher ocorre pelo simples fato de ser mulher, ou seja, uma mulher a cada seis horas era assassinada. No mesmo ano, a cada 24 horas, oito mulheres foram vítimas de violência doméstica, segundo o boletim "Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver".

​De acordo com a ONU, sete a cada 10 mulheres no mundo já foram ou serão vítimas de violência de gênero em algum momento da vida. No mundo, de acordo com a OMS e a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, a estimativa é de que 35% dos feminicídios são cometidos por seus parceiros, ao passo que 5% dos homicídios de homens são praticados por suas parceiras.

 

Com três mesas de conversa, o veículo independente de jornalismo investigativo debate sobre o papel do setor na democracia
por
Artur Maciel
Carol Rouchou
Geovana Bosak
Leticia Falaschi
Marina Jonas
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19/03/2024 - 12h

Na última quarta-feira, 13, a Agência Pública, em parceria com o curso de Jornalismo e a Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes da PUC-SP (FAFICLA), realizou o evento “Pública 13 anos: O jornalismo na linha de frente da democracia” para celebrar seus 13 anos de jornalismo investigativo. Com três mesas redondas, o evento foi sediado no Tucarena, auditório do Teatro da Universidade Católica de São Paulo (TUCA), e reuniu expoentes do jornalismo, da antropologia e da ciência do clima para discutir temas como desinformação, populismo digital, polarização dentro e fora das redes, inteligência artificial, crise climática e, por fim, a defesa da democracia. 

Fundada em 2011 por repórteres mulheres, a Agência Pública é a primeira agência de notícias sem fins lucrativos do Brasil. Seu compromisso é com o jornalismo independente de qualidade e com a promoção da defesa dos direitos humanos, do discurso democrático e do direito à informação. Em comunhão com os valores da PUC-SP, que foi e ainda é palco de luta e resistência pelo Estado Democrático de Direito, a Pública escolheu o auditório próximo à instituição para celebrar o aniversário de treze anos de trabalho.

 

Mesa 1: “Desinformação e Populismo Digital” 

Em ano de eleições - tanto municipais no Brasil, quanto presidenciais ao redor do mundo - é de extrema importância avaliar os impactos e os riscos do desenvolvimento da tecnologia no processo eleitoral, desde as campanhas políticas até às urnas. Diante disso, a primeira mesa “Desinformação e Populismo Digital" tratou sobre a dimensão da tecnologia no presente cenário político e social. 


Neste primeiro momento do evento, os principais tópicos abordados foram a onda de desinformação online, gerada principalmente por grupos de extrema direita - como é o caso dos grupos de Whatsapp e Telegram do bolsonarismo. Além disso, a mesa abordou a regulamentação do uso da inteligência artificial (IA), e o poder das “big techs” e de sua arquitetura algorítmica dentro do sistema comunicacional.

 

Ecologia de mídia e desinformação

Natalia Viana, co-fundadora e diretora-executiva da Agência Pública, foi a mediadora da mesa “Desinformação e o Populismo Digital” e iniciou o debate relacionando a manifestação convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, no dia 25 de fevereiro deste ano, com a ecologia de mídia, um conceito que descreve como a tecnologia afeta diversos aspectos da sociedade - campos político, social, cultural ou demográfico.


Viana argumenta que o ato bolsonarista, realizado no início do ano, é um exemplo de como a desinformação online migra para a vida offline em velocidades e escalas inimagináveis. Ela explica que tanto conteúdos mais elaborados, como deep fakes, quanto aqueles mais simples, como fake news, complementam-se e participam da ecologia de mídia, que retroalimenta a desinformação. No dia 25 de fevereiro, o protesto, que aconteceu na Avenida Paulista, contou com um público que varia de 185 mil pessoas, segundo divulgado em pesquisa da Universidade de São Paulo (USP), até 600 mil, de acordo com estimativas da Secretaria de Segurança Pública (SSP). Segundo a mediadora da mesa, os participantes tendem a basear suas decisões em fake news recebidas através de canais diretos de mensagem. Viana ainda completa dizendo que, uma vez questionados, os manifestantes pareciam não compreender exatamente o motivo de estarem presentes.

 

IA e as eleições 

Nina Santos, pesquisadora na área de comunicação e informação, explica que o uso da inteligência artificial (IA) em período de eleições ainda é recente, mas representa um aspecto tecnológico promissor. No entanto, a ferramenta também carrega um potencial significativo de danos, a depender da forma como for usada, principalmente para produzir e disseminar fake news

Para Santos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desempenha um papel crucial na mitigação dos riscos que surgem com a utilização da IA em momentos decisivos da esfera política. O órgão é responsável por instituir a regulamentação adequada do recurso tecnológico em questão frente às possíveis influências distorcivas que ele pode trazer, mas isso pode não ser suficiente. Em entrevista à AGEMT, a pesquisadora reforça a necessidade de “um processo legislativo na Câmara, no Senado, em que os deputados e as deputadas mobilizem as suas bases, façam discussões amplas e construam a política para lidar com a inteligência artificial em todos os momentos da nossa vida, e não só das eleições”.

No encerramento da mesa, Natalia Viana levanta uma questão fundamental: “em um ambiente em que todo mundo participa ativamente da construção do debate público, qual é o papel do cidadão?” 

Leticia Cesarino, antropóloga e assessora especial de Educação e Cultura em Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, responde à questão enfatizando que, embora não exista um caminho único de atuar no mundo, o importante é que todos estejam comprometidos com os princípios democráticos.  

“É fundamental pensar em soluções que unam ações individuais e coletivas, construindo fontes de informações confiáveis e acompanhando coletivamente discussões em diversos ambientes sociais, seja no trabalho, na escola ou no seu próprio bairro”, completa a pesquisadora Nina Santos.

 

Mesa 2: “Como cobrir o governo de maneira equilibrada”

A segunda mesa do evento trouxe atenção à cobertura política dos governos e discutiu maneiras de fazê-la de forma equilibrada e justa. As convidadas foram as repórteres Juliana Dal Piva e Fabiana Moraes, que também atua como pesquisadora, enquanto a mediação foi realizada por Rubens Valente, repórter, colunista e também autor da Agência Pública. 

Confira, a seguir, a transmissão na íntegra. 

 

Mesa 3: “Colapso Climático e o Antropoceno”

A terceira e última mesa do evento, apresentada à noite, teve como recorte temático o "Colapso Climático e o Antropoceno", com participações do ambientalista e filósofo Ailton Krenak, do climatologista Carlos Nobre, da jornalista Daniela Chiaretti, e a mediadora Giovana Girardi, chefe da cobertura socioambiental da Agência Pública. Os convidados discutiram as problemáticas e também as soluções que permeiam o novo cenário ambiental. 

 

A Emergência Global 

"As mudanças climáticas não afetam a democracia, a democracia que afeta as mudanças climáticas”. Essa foi a sentença que o climatologista Carlos Nobre usou para introduzir a conversa. A reflexão esbarrou nas questões sistemáticas que levam ao esgotamento do planeta, já que o modo de vida e os sistemas de produção não são os únicos componentes alteráveis na remediação dos efeitos climáticos. As estruturas políticas e sociais são a base desse problema, segundo relembra o escritor, filósofo e futuro imortal da Academia Brasileira de Letras, Ailton Krenak. As democracias populistas foram colocadas como um agravante quando se trata de emissões de GEEs (gases do efeito estufa). A China, atualmente, é a maior emissora, seguida dos Estados Unidos, da Índia e da Rússia. Apesar de tanto barulho, os convidados reiteram que as causas climáticas não são pautas que elegem ou sequer movimentam escolhas políticas, em qualquer esfera, o tanto que deveriam.  

Foi discutido, também, como a onda de ascensão da extrema direita afeta a luta pela causa. É um enorme desafio combater as manobras do extremismo e do negacionismo, ainda mais quando atacam um tópico de vulnerabilidade em questão de apoio efetivo da população.  

Ailton destacou algumas posições contraditórias de órgãos públicos mundiais em relação à proteção do meio-ambiente. “Enquanto selecionam novas reservas de biosfera em uma semana, na outra, a UNESCO patrocinou uma reunião em Paris para discutir formas de mineração em outras reservas”. 

A jornalista Daniela Chiaretti, referência em coberturas e reportagens sobre o tema, aponta que “o capitalismo tenta se colocar como bússola para um problema que ele mesmo causou”.  A jornalista também alertou para o fenômeno que já é uma realidade e aquece discussões entre os profissionais de saúde mental. Segundo ela, as consequências dessa “falsa busca” têm causado à população, principalmente aos jovens, uma angústia diferente das outras, e em massa: a “ansiedade climática”.  

Os convidados enfatizaram, constantemente, que as consequências da intensificação do aquecimento global não impactam igualmente a população. O racismo ambiental foi um fator importante da mesa. Pessoas em situações de marginalização social e econômica são afetadas de um modo muito pior, estando submetidas à falta de recursos para lidar com eventos que podem chegar aos casos extremos. Os refugiados climáticos também foram um ponto importante. O termo é designado para um grupo de indivíduos que é obrigado a abandonar seu local de habitação devido a irregularidades radicais que impedem sua permanência - irregularidades essas causadas pelos efeitos do aquecimento global. 

Durante o pouco tempo de abertura para perguntas, a AGEMT perguntou à mesa, dado a celebração dos 13 anos do órgão comunicativo, como o jornalismo poderia ser um meio efetivo na luta. Os convidados responderam que a insistência em inserir os temas em tudo, e saber infiltrar a informação nos núcleos conservadores, que insistem na manipulação e no negacionismo, é uma das formas. 

 

O Antropoceno 

Não se pode separar este componente do anterior. O Antropoceno é uma proposta de marcação de uma nova era geológica (delimitação de tempo que se divide com base em como o planeta e os seres vivos reagem a determinada configuração geofísica e ambiental). Essa proposta foi feita por um grupo amplo de cientistas, geólogos e especialistas em mudanças climáticas, que defendem que a presença do ser humano e seu modo de produção já alteraram as estruturas do planeta em um período curto (comparando-se a outras eras geológicas). O embate na comunidade científica se encontra na dificuldade de enquadrar a ação humana como potencializadora das mudanças, ou como causa. “Não é a geologia que provoca o antropoceno, é o sapiens”, demarca Ailton Krenak. 

A terceira mesa encerrou o evento com o lembrete de que as mudanças climáticas são uma realidade irreversível. Cabe à humanidade liderar as mudanças nos sistemas, estruturas e no modo de sobrevivência da população. 

As obras reunidas no Centro Cultural Banco do Brasil, convidam cada visitante a navegar por diferentes aspectos da produção de mais de 60 artistas negros
por
Beatriz Alencar Gregório
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15/03/2024 - 12h

O Centro Cultural do Banco do Brasil abraçou, dessa vez, o Projeto Afro: uma plataforma afro-brasileira de mapeamento e difusão de artistas negros; com a exposição “Encruzilhadas da Arte Afro-Brasileira”.

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OBRA - Paty Wolff : Divulgação: Projeto Afro


Com uma experiência imersiva, educativa e cativante, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) proporcionou uma visão de que “a população afro-brasileira não é só centrada na questão da escravidão (...) a gente sabe fazer arte. A arte não é só a europeia; a gente sabe desenvolver, temos vários fatores culturais”, explicou Otávio Rodrigues, visitante da exposição. A mostra é composta de mais de 60 artistas e obras que vão desde pinturas a formatos áudio visuais. “Foi uma exposição que não falava sobre nossos colonizadores e sim sobre nossos povos, de preto para preto, e mostra que a gente sabe fazer muita coisa. Me senti num lugar que realmente falava sobre a real história afro-brasileira”. Para interagir, como ocorreu com Otávio, visite o CCBB até o dia 18/03/2024. Mas, você pode conferir uma prévia que a AGEMT preparou, acessando o link:

https://www.instagram.com/reel/C4iXXhYrdLK/utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==

 

 

Aula magna da PUC-SP recebe o Presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, e tem como questionamento central “Brasil para quem?”
por
Romulo Santana
Giuliana Zanin
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06/03/2024 - 12h

Na última segunda-feira (4), a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) sediou a aula magna realizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Indicado à Suprema Corte, em 2013, pela então presidente Dilma Rousseff, Barroso é bacharel e doutor em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e detém título de mestre pela Universidade de Yale.  

Plateia do TUCA ocupada por diversas pessoas, com poucos lugares vazios
A aula magna reuniu alunos e profesores de diferentes cursos. Giuliana Zanin/AGEMT

Na chegada ao campus, Barroso tomou café da manhã na reitoria e visitou a capela da Universidade. O evento organizado pelo Centro Acadêmico 22 de Agosto, lotou o TUCA - Teatro da Universidade Católica -, com a presença da comunidade acadêmica, jornalistas, políticos e juristas. Apresentada por Henrique Joia - aluno do Direito -, a aula teve como convidados: Ana Julia Carmona, presidente do CA; os professores Flávia Piovesan e Vidal Serrano, docentes do programa de Direito Constitucional da PUC-SP; e Maria Amália Pie Abib, reitora da instituição.  

Três pessoas posam para foto, à esquerda Luís Roberto Barroso, ao centro Flávia Piovesan e à direita Henrique Joia
Professora Flávia Piovesan é homenageada pela PUC-SP.  Giuliana Zanin/AGEMT

A aula teve como temas principais a regulamentação da inteligência artificial (IA), as crises democráticas mundiais como o 8 de janeiro, mencionadas pelo ministro como “aflições do nosso tempo”. 

Inteligência Artificial 

Inicialmente, Barroso reflete sobre os caminhos que levaram a humanidade até a “nova revolução industrial”, representada pelo surgimento das IAs criadas a partir da transferência de capacidades humanas para as máquinas, como as tomadas de decisão e a cognição. O ministro considera importante lembrar que a Inteligência Artificial não lida com questões éticas e que, sem a consciência do que é “certo” ou “errado”, cabe ao ser humano realizar juízos de valor sobre a produção de linguagens, geração de conteúdo e de criatividade, realizadas com o auxílio da ferramenta. 

Mesa da aula magna composta por dois homens e três mulheres
Da esquerda para a direita: Flávia Piovesan, Luís Roberto Barroso, Maria Amália Pie Abib, Vidal Serrano e Ana Júlia Carmona.  Giuliana Zanin/AGEMT

O presidente do STF ainda justifica que as IAs são capazes de tomar decisões mais assertivas através do processamento de dados. Além disso, ela pode pôr fim às barreiras linguísticas, favorecer a automação de ações humanas e otimizar o diagnóstico de doenças. A partir disso, ele ainda ensaia sobre a necessidade do Estado de recapacitar aqueles que perderão seus empregos por conta desse processo. 

Com a popularização da IA generativa como um elemento massificador de fake news, o deepfake - função que cria vídeos falsos usando a imagem e imitando a voz de qualquer pessoa -, vem se tornando cada vez mais uma ameaça ao processo democrático. Para Barroso, a regulação das IAs é necessária, mas ela tem como inimiga o tempo e a velocidade da evolução tecnológica “a transformação é muito ligeira”.  

Ministro Barroso discursa no Pupto
Ministro Luís Roberto Barroso lecionando a aula magna. Giuliana Zanin/AGEMT

Instabilidade Democrática  

O ministro relembra a história da Pontifícia como um centro de resistência ao autoritarismo do regime militar. Dentre os principais eventos, destacou a invasão policial do campus Monte Alegre, em 22 de agosto de 1977, liderada por Antônio Erasmo Dias, coronel do exército; e o incêndio do TUCA, em 1984, local citado pelo ministro como um símbolo da defesa da democracia.

Os desafios encontrados na reabertura política, como a inclusão e a estabilidade social, foram relembrados pelo ministro, que considera que as ameaças à democracia são os populismos que acolheram aqueles que foram abandonados pelo Estado. “Embora a democracia tenha sido a ideologia vitoriosa do século XX, alguma coisa parece não estar indo bem nos dias atuais, em muitos lugares do mundo”, aponta.

Barroso também fez menção à crescente onda autoritária, até mesmo nas democracias mais sólidas, que têm sido enfraquecidas pelos populismos utilizando as fake news e as ferramentas geracionais, a fim de criar instabilidades no processo democrático.  

Ao abordar os acontecimentos do 8 de Janeiro de 2023, Luís Roberto destaca que o episódio foi articulado em muitas instâncias, mas que serve de aprendizado de que a democracia foi reconstruída no processo eleitoral, permitindo que a sociedade brasileira debata abertamente sobre os rumos do país, “respeitar a liberdade é respeitar quem pensa diferente”.

Ao final da aula magna, Barroso respondeu à AGEMT sobre o enfrentamento da Justiça Eleitoral aos deepfakes nas próximas eleições. O ministro citou a medida aprovada pelo órgão, que proíbe o uso desse recurso em campanhas eleitorais e determina a retirada desse tipo de conteúdo das redes sociais. “É um problema grave mesmo para a democracia, não é singelo enfrentar, mas está sendo enfrentado com as medidas possíveis”. A medida no entanto esbarra em outras matérias discutidas no Congresso Nacional como a regulamentação das redes sociais, que ainda não avançou. 

 

 

 

 

 

Passado quase um ano, liderança indígena Yanomami fala sobre atual momento de seu povo, após Ministério da Saúde declarar Estado de Emergência de Saúde Pública na região
por
Artur Maciel
Bianca Abreu
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23/11/2023 - 12h

 

Em 20 de janeiro deste ano, o território Yanomami foi declarado em Estado de Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional pelo Ministério da Saúde brasileiro. Concentrados em uma região Amazônica entre o Brasil e a Venezuela, com cerca de 30,4 mil habitantes, Yanomamis sofrem com a intensa atividade de garimpos ilegais no local. Epidemias - como gripe e malária - insegurança alimentar, morte sistemática de crianças indígenas e destruição do meio ambiente são provenientes das ações dos extrativistas na região.

Em entrevista por telefone ao repórter Artur Maciel, da Agência Maurício Tragtenberg (AGEMT), o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami (Condisi) e representante do Conselho de Saúde Indigena (SESAI), Júnior Hekurari Yanomami, fala sobre a importância da atuação do poder público no combate ao genocídio provocado pela extração ilegal de minérios.

 

Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental
Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental

 

“A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”. Júnior Hekurari Yanomami

A fim de combater a desassistência sanitária no território Yanomami, o Ministério da Saúde instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE - Yanomami) - cuja gestão está sob a responsabilidade da SESAI. Segundo a pasta, ao chegar na terra Yanomami, o órgão “se deparou com crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição grave, além de muitos casos de malária, infecção respiratória aguda (IRA) e outros agravos”.

“Durante 6 meses, muita gente voluntária. Médicos. Enfermeiros. Farmacêuticos. De São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba”, explica Júnior Hekurari, quando questionado sobre o suporte atual na região após declarada crise sanitária. “A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”.

Segundo ele, “antes não tínhamos uma visão, apenas medo. O garimpeiro poluindo nossas terras. Nossas águas. Interrompendo nossos rituais. Culpa do governo ladrão de jóias. As crianças voltaram a brincar e andar depois das ações”. “Eu tinha medo do povo morrer. Sem o Lula, o povo Yanomami ia morrer. Em 2020, 2021, 20 mil garimpeiros destruíram nossas vida” desabafa, citando o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e a atuação do Estado na crise humanitária. Mas pontua com veemência que “ainda tem muita coisa a melhorar”.

Quando perguntado sobre como era tratado o impacto ambiental na região, em relação ao lixo gerado pela atividade garimpeira, o presidente do Condisi declara que “os garimpeiros não respeitam. Desmatam e tiram a terra de nossa vida”. “Durante 4 anos, fomos abandonados pelo governo brasileiro. Por um governo ladrão de jóias. Agora o governo voltou e os profissionais de saúde estão apagando o fogo das emergências pensando em uma restauração”, completa. Ele se refere ao governo do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), que não raras vezes, ao longo de sua vida pública, legitimou publicamente as atividades ilegais dos garimpos.

 

Doença, fome e violência: genocídio em prática

As doenças, a insegurança alimentar, a violência e a morte passaram a fazer parte do cotidiano dos Yanomami diante da negligência do Estado em frear a extração indevida de minérios na região. De acordo com levantamento do Malária Journal, o aumento do número de casos de malária - causa recorrente de mortes de crianças indígenas - na região Yanomami saltou de 2.559, em 2010, para 18.765, em 2020. Sobre a presença da doença na região, o representante da Sesai afirma que a doença contamina até mesmo quem vai em seu combate. “Muitos dos médicos 'adoeceu'. Pegou malária e voltaram (para casa)”, conta. “Mas o importante é que a maioria 'desse' profissionais viram Roraima. Viram o Brasil!”, completa, demonstrando, em sua voz, um misto de preocupação pela saúde dos profissionais e esperança diante da visibilidade à situação de seu povo.

Outro aspecto da presença dos garimpeiros na região é o acúmulo de lixo nas proximidades das comunidades. Por conta disso, os indígenas locais entram em contato com elementos provenientes de fontes aquém da natureza - produzidos com materiais que não se reintegram àquele território. Pelo contrário, o desequilibram e o prejudicam. “Hoje tem lama em todo lugar, os garimpeiros deixaram lixo em todo lugar. Máquinas, latas e lixo”.

O que nos leva a outro problema que compõe esse efeito dominó no descaso com a saúde Yanomami: a fome. A alimentação indígena é, primordialmente, garantida pela natureza por meio da caça, pesca e consumo de frutas. Diretamente afetada pelo uso de mercúrio no garimpo, a água foi contaminada. Com isso, peixes mortos, impróprios para consumo, perdem-se nos rios onde a atividade garimpeira está. “O garimpo destruiu nossos rios. Nossas vidas. As mulheres não iam pescar. Não tinha peixe nem camarão para comer. Mataram tudo, não tinha alimento”, aponta Junior. E questiona, em seguida: “que dia vamos voltar a comer peixe? Voltar a comer camarão? O povo não tem”.

Além da malária e da fome, os indígenas ainda precisavam se proteger de outro perigo. Júnior Hekurari Yanomami denuncia que os crimes cometidos pelos garimpeiros também se estendem à violência sexual. Deixando, ainda mais evidente, o risco que a presença desse grupo não-indígena e extrativista provoca na população local. “O que aconteceu aqui foi muito traumático. Meninas de 12 anos grávidas. Estupradas por garimpeiros. Estamos agregando trauma de mães com luta dos filhos. Deram tiros nas crianças”, expõe a liderança. “Destruíram meu povo. Tem cicatrizes grandes até hoje e vai demorar para curar. Talvez em 50 anos. Quem sabe se cura”, conclui, reflexivo.

 

*Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.

Evento contou com a participação de importantes lideranças que atuam na defesa dos direitos humanos no país
por
Danilo Zelic
|
06/06/2022 - 12h

Na quinta-feira passada (02) aconteceu o Seminário “Ditadura Nunca Mais! – O Brasil e o descumprimento das condenações internacionais por Violações de Direitos Humanos”, promovido pela Faculdade de Direito e os Centros Acadêmicos Benevides Paixão e Reconvexo de jornalismo e direito, respectivamente, da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP).

A primeira parte do seminário teve a participação de Amélia Teles, presa política na ditadura e membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos, a ex-prefeita de São Paulo e Deputada Federal, Luiza Erundina (PSOL), Rosalina Santa Cruz, professora de Serviço Social da PUC-SP, presa política durante a ditadura e membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos e Adriano Diogo, ex-deputado estadual e Presidente da Comissão da Verdade Rubens Paiva (ALESP/SP).

Ao falar sobre os casos de tortura durante a ditadura, a Dep. Luiza Erundina disse que “a ditadura nunca acabou durante esse tempo. Do período de 21 anos da vigência da ditadura militar” e seus desdobramentos contemporâneos, Erundina lembrou do caso de Genivaldo de Jesus Santos, 38, torturado e morto por policiais rodoviários federais em viatura da corporação após sofrer golpes e pontapés dos agentes e ser colocado no porta-malas do carro impregnado com gás lacrimogênio.

“Chegamos à dois, três dias atrás, num crime horrendo, que não se imaginava que em uma civilização, em um país dito democrático, se pudesse registrar um crime tão terrível, tão brutal, tão desumano, daquele cidadão lá em Sergipe. Nos deixa todos muito mal, nos deixa de uma certa forma nos perguntando, o que deixamos de fazer ou o que fizemos de errado para que as coisas chegassem a esse ponto”, lembrou a Deputada.

Rosalina Santa Cruz, Luiza Erundina e Amélia Teles
Rosalina Santa Cruz, Luiza Erundina e Amélia Teles - Foto: Victoria Leal

Amélia Teles começou falando sobre o papel que a universidade teve como palco de resistência no regime, “espaço democrático mesmo em tempo de ditadura”, citando o episódio que ficou conhecido como a Invasão da PUC, ocorrido em 1977. Naquele ano, tropas da polícia militar invadiram a universidade, à mando do Secretário de Segurança Pública do Estado, Erasmo Dias. “Aqui o Erasmo Dias invadiu a PUC, teve estudantes queimadas, mas a luta continuou. Então isso aqui tem muita história”, recordou Teles.

Representando a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos, Teles comentou da ação promovida por Erundina à frente da Prefeitura de São Paulo, realizando a abertura das valas clandestinas do Cemitério Dom Bosco, conhecido com Cemitério de Perus, zona norte da capital.

Para ela foi fundamental a abertura da Vala, principalmente quando a Comissão, ao lado de organizações de direitos humanos, entrou com uma ação contra o Brasil, no caso conhecido como “Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) vs. Brasil”, que diz respeito aos mortos e desaparecidos políticos na Guerrilha do Araguaia.

No ano de 1990, após a descoberta feita pelo jornalista Caco Barcellos sobre corpos de militantes políticos executados pela ditadura serem enterrados no Cemitério Dom Bosco, a então prefeita decidiu instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), na Câmara Municipal de São Paulo, para investigar os crimes cometidos durante a ditadura.

“Isso impulsionou e abriu possibilidades jurídicas. Porque a Vala de Perús trouxe uma informação que a sociedade não tinha, a gente falava em desaparecido e ficava uma coisa abstrata. De repente desaparecido tinha crânio, tinha esqueleto, tinha osso. Então isso deu credibilidade e legitimidade à nossa luta, porque a opinião pública passou a acreditar naquilo que a gente falava”, lembrou Teles.

mh
Marlon Weichert, Gabriel Sampaio, Débora Duprat e Eugênia Gonzaga - Foto: Victoria Leal

Participaram da segunda mesa Débora Duprat, ex-Subprocuradora Geral da República, do Ministério Público Federal (MPF), Marlon Alberto Weichert e Eugênia Gonzaga, ambos Procuradores da República do MPF e Gabriel Sampaio, advogado e coordenador do Programa de Enfretamento à Violência Institucional da Conectas Direitos Humanos. O principal tema discutido por essa mesa foi as tomadas de decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) após ações construídas pela sociedade civil contra o Estado brasileiro.

De início, Duprat levantou um ponto importante para pensar alguns casos da justiça brasileira envolvendo violações aos direitos humanos: como o judiciário brasileiro se mantêm sem nenhuma alteração desde o fim do regime militar. “Como uma Constituição, portanto, de direito interno e direito internacional, tão forte, mantêm o mesmo judiciário da época da ditadura, nenhuma singela alteração, nenhuma”, disse Duprat.

Um dos casos citados por Duprat foi o “Favela Nova Brasília”. Entre 1994 e 1995, em decorrência de ações policiais na comunidade Nova Brasília, no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, 26 pessoas morreram e três adolescentes foram vítimas de violência sexual durante o ocorrido. Mais de dez anos depois, em 2017, decisão da CIDH condenou o Estado brasileiro por violência policial nesse caso. O Estado reconheceu a condenação sofrida.

“A gente continua tendo o Jacarezinho [ação policial, conhecida como Chacina do Jacarezinho, ocorrida na Favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, que resultou na morte de 28 pessoas, incluindo um policial, em 06 de maio de 2021], 28 mortes, 24 inquéritos arquivados”, falou Duprat.

Em seguida mencionou o caso da “ADPF das Favelas”, uma “decisão banana”, segundo a subprocuradora. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635, é uma petição assinada por diversas organizações da sociedade civil e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro que visa reduzir as ações executadas pela polícia da cidade nas favelas e comunidades, diminuindo a letalidade e a violência nas regiões.

“No momento em que o Supremo [Supremo Tribunal Federal] não consegue mais fazer cumprir as suas decisões. Esse caso das favelas é uma evidência, o Supremo faliu na sua capacidade de cumprir as suas decisões”, completou a subprocuradora.

Em sua participação, a Procuradora Eugênia Gonzaga falou sobre o vídeo da campanha #ReinterpretaJáSTF, organizado pelo Movimento Vozes do Silêncio e entidades de direitos humanos.  A campanha tem a participação de vítimas da ditadura, familiares de mortos e desaparecidos políticos e tem o intuito de “sensibilizar o STF”, de acordo com Gonzaga, acompanhado de um manifesto que teve cerca de 5 mil assinaturas colhidas em poucos dias do lançamento.

Documento revela aumento de casos e ampliação do escopo de atuação da Polícia Rodoviária Federal durante o atual governo
por
Artur dos Santos
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02/06/2022 - 12h

A Comissão Dom Paulo Evaristo Arns realizou, na manhã desta quarta (1/06), uma reunião com o representante do Alto Comissariado da ONU na América do Sul com o fim de entregar um relatório oficial de crítica à crescente violência policial no Brasil.

 

Convocada pela mesma comissão, uma semana após o Tribunal Permanente dos Povos , a reunião teve um caráter urgente e contou com a presença de Jan Jarab, representando o Alto Comissariado da ONU, que estava de passagem pelo Brasil. Jarab já desempenhou diferentes funções na comunidade internacional de direitos humanos como no Escritório de Direitos Humanos da República Tcheca, além de ter atuado como Comissário do Governo para Direitos Humanos.

Com a entrega do relatório às mãos do representante, e com a saída deste, a reunião foi aberta à presença virtual de veículos de imprensa, junto dos quais se encontrava a Agemt. 

Laura Greenhalgh, uma das componentes da Comissão Arns presentes na reunião, abriu a comitiva de imprensa afirmando que a reunião ocorreu para demonstrar à comunidade internacional “providências que a [Comissão] Anrs tomou contra a chacina na Vila Cruzeiro a à tortura e morte de Genivaldo, em Sergipe”.

Jarab foi recebido com os relatos da violência policial crescente no Brasil e, além de ouví-los, compartilhou parte de sua experiência de passagem no país nos últimos dias e relatou sua visita a comunidades indígenas no norte, região também afetada pelo aumento da violência. Segundo a Comissão, as denúncias foram muito bem recebidas e continuarão sendo feitas.

Paulo Sérgio Pinheiro afirma que seria útil que o Alto Comissariado lembrasse o Brasil de suas obrigações e que “é evidente para nós e ele [Jan Jarab] que a violência é pré-existente, mas tende a se agravar pelas homenagens feitas pelo presidente aos agressores”.

José Vicente, membro fundador da Comissão Arns e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, completa a fala de Pinheiro ao relembrar que, no caso de Genivaldo, a comunidade brasileira estava diante de um flagrante de homicídio e relaciona a crescente atuação da Polícia Rodoviária Federal em diferentes operações à autorização de Sérgio Moro sobre as operações conjuntas.

Quanto a possíveis ações da ONU, Greenhalgh diz ser evidente que a Comissão não pode reivindicar ações, mas acionar diferentes canais que possam, por sua vez, intervir, além de dizer que o Alto Comissariado se encontra em sintonia com a Arns em relação à atual situação do Brasil.

Sobre a PRF, foram feitas considerações acerca da retirada da formação de Direitos Humanos do currículo e o como esta acarreta em táticas cada vez mais violentas e em situações tais como a operação na Vila Cruzeiro e a tortura e morte de Genivaldo. Victória Benevides (Comissão Arns) afirma ser um retrocesso a retirada da formação em direitos humanos do currículo de qualquer instituição, ainda mais de uma que lida com conflitos. Paulo Sérgio Pinheiro acrescenta: “é uma situação deprimente; a PRF era aliada nas lutas de repressão ao tráfico de mulheres e meninas pelo país. É trágico”.

Em resposta à Agemt, a Comissão afirma que existem razões para esperar um futuro melhor e que tornou-se evidente, após o Tribunal Permanente dos Povos, que a consciência brasileira sobre a história atual do país está melhorando. Entretanto, afirma que, aos olhos de instituições internacionais de respeito, o Brasil se tornou um anti exemplo, uma “grande vergonha”.

Sobre o Relatório redigido pela Comissão Arns:

O documento enviado ao Alto Comissariado da ONU foi recebido na íntegra pela Agemt e trata dos crescentes casos de violência policial durante o período de Jair Bolsonaro à frente da presidência. Confirma que, entre 2019 e 2021, 18 mil e 919 pessoas foram mortas pela polícia no país (das quais cerca de 80%, em 2020, eram negras).  Traz também condutas de apoio de Bolsonaro às operações policiais como as de Vila Cruzeiro, sobre a qual parabenizou policiais por terem neutralizado pelo menos 20 marginais ligados ao narcotráfico, ou como a operação em Jacarezinho, que deixou 28 mortos (também parabenizada pelo presidente).

Quanto à ampliação indevida do escopo das operações da Polícia Rodoviária Federal, retrata que as atribuições originárias limitadas ao patrulhamento das rodovias foram “indevidamente ampliadas pelo Ministério da Justiça” durante o atual governo.

Seus requerimentos ao Alto Comissariado são: instar as autoridades do Estado Brasileiro para cumprir os compromissos que prometeu obedecer; reforçar a necessidade de incrementação de um controle externo das atividades policiais; condenar a ampliação do escopo de atuação da PRF; e atentar a atos para-institucionais que incitem a violência e atuação ilegal por parte das polícias.

 

Em decorrência de uma sociedade em retrocesso, menos de 4% dos municípios no país realizam o procedimento de forma legal
por
Laura Paro
Marina Jonas
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02/06/2022 - 12h
Em entrevista, a médica Helena Paro conta que o aborto legal no Brasil é de difícil acesso.  (Imagem: arquivo pessoal)
Em entrevista, a médica Helena Paro conta que o aborto legal no Brasil é de difícil acesso. 
(Imagem: arquivo pessoal)

“O que vemos é que pouquíssimos hospitais (menos de 60 em todo o país, provavelmente) oferecem o aborto legal para os casos de estupro”, afirma a ginecologista e obstetra Helena Paro. No entanto, em 2013, foi promulgada a “lei do minuto seguinte”, que obriga todos os hospitais do SUS a prestarem atendimento integral, multiprofissional e emergencial a vítimas de violência sexual no Brasil (Lei 12.845/2013). Dessa forma, o aborto – que é legalizado em casos de estupro, riscos de morte à mulher e anencefacilia fetal – continua sendo de difícil acesso no país. Os dados comprovam esta dificuldade: segundo pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), menos de 4% dos municípios brasileiros realizam o procedimento, resultando na sua falta de seu acesso por quase 60% das mulheres do país.

De acordo com Helena, outra razão pela qual não se tem oferta ao aborto legal é o fato de "não conseguirmos mudar a realidade complexa da violência baseada em gênero apenas com leis”. Na verdade, a raiz desse problema está na existência de uma sociedade misógina e patriarcal, em que é recorrente a banalização da violência sofrida pela mulher e a culpabilização da vítima pelo o que viveu. “Muitas mulheres não denunciam as agressões sofridas porque sabem que diversas vezes serão novamente vítimas de uma violência institucional nesses espaços que deveriam ser de acolhimento (serviços de saúde, de segurança pública e de justiça)”, afirma a médica.

Ligado a isso, a obstetra conta que o direito da mulher à interrupção de sua gravidez é muitas vezes negligenciado pelos próprios médicos, e que isso a motivou a fazer parte do atendimento à vítimas de violência sexual: “ficou claro para mim que, diante da escassez criminosa (justificada por ‘objeção de consciência’) de médicos que assistem mulheres em situação de aborto por gravidez decorrente de estupro, eu tinha o dever de lutar pela melhoria da qualidade do cuidado dirigido a essas meninas e mulheres.” Esta negligência na área médica está diretamente ligada ao sexismo e o patriarcalismo enraizados e institucionalizados na sociedade.

É nesse sentido que traços culturais muito enraizados, como a objetificação, hipersexualização e assédios verbais e físicos sofridos desde a infância pelas mulheres trazem a ideia machista de que todos, menos a própria mulher, têm propriedade sobre o corpo dela. Dessa forma, desencadeando a opinião comum de que abortar seria um absurdo, pensamento vindo muitas vezes de pessoas que nunca passaram por uma situação em que sentiram a necessidade de abortar. 

Além disso, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 73 milhões de abortos são realizados no mundo todo ano, sendo estimado que 1 milhão destes são no Brasil – menos de 2000 dentro de condições legais. O resultado: a cada dois dias, calcula-se a morte de uma mulher em função de um procedimento mal feito. Esses dados colocam em evidência o impacto negativo da criminalização da prática sobre a saúde das mulheres e a importância de sua descriminalização. 

Com estas estatísticas em vista, é fato que criminalizar o aborto não reduz em hipótese alguma suas taxas, mas empurra as mulheres às clínicas clandestinas, colocando mais vidas em risco. Afinal, como explica o ginecologista Jefferson Ferreira em entrevista para o jornal Brasil de Fato: “o que faz a mulher buscar não é se a lei permite ou proíbe; o processo para evitar uma gravidez indesejada vai muito além da lei. Ele passa pelo planejamento reprodutivo de alta qualidade, pela redução da violência de gênero, uma educação sexista… Enfim, passa por um monte de coisas que não necessariamente têm a ver com a proibição.”

 

 

As equipes devem inscrever-se até o dia 17 de maio no site oficial da ONG PDMIG.
por
Gustavo Pereira
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26/04/2022 - 12h
Imagem de divulgação do início das inscrições para a "Copa dos refugiados e Imigrantes" - Foto: ONG Pacto Pelo Direito de Migrar
Imagem de divulgação do início das inscrições para a "Copa dos Refugiados e Imigrantes" - Foto: ONG Pacto Pelo Direito de Migrar

Após três anos de paralisação por conta da pandemia, a “Copa de Refugiados e Imigrantes” está de volta. Os capitães ou representantes das equipes interessadas em participar do torneio devem responder o formulário disponibilizado no site oficial da ONG Pacto pelo Direito de Migrar até o dia 17 de maio de 2022. A inscrição para o campeonato é gratuita. 

O que é a “Copa dos Refugiados e Imigrantes”? 

Criada em 2014 pela ONG PDMIG, o campeonato já conta com 6 edições e é atualmente apoiada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, ACNUR, Cruz Vermelha Brasileira, OIM (Organização Internacional para as Migrações) e da SJMR (Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados Brasil). Apesar do início humilde, há oito anos, em um campo improvisado no bairro do Glicério, a Copa já atinge grandes proporções. Um exemplo disso foi a última edição realizada em 2019, dividida em etapas regionais com mais de 1200 atletas e disputada em 5 estados diferentes: Recife, Curitiba, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo, além do Distrito Federal. Na etapa de São Paulo a final ocorreu no histórico Estádio do Pacaembu. 

O principal objetivo desse projeto é promover a integração dos imigrantes e refugiados por meio do futebol e das oficinas que acontecem no evento, além de gerar o protagonismo destes na sociedade brasileira. 

Como irá funcionar o campeonato? 

A 7ª edição terá um alcance ainda maior, sendo disputada em dois países: No Brasil, com jogos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Minas Gerais e Distrito Federal e em Buenos Aires, capital da Argentina. 

A “Copa dos Refugiados e Imigrantes” terá início no mês de setembro com o seguinte formato: A primeira fase será dividida em nível local, como na edição anterior; na segunda etapa, os vencedores de cada estado disputarão o nacional e, por fim, o campeão brasileiro enfrentará o vitorioso da Copa Argentina. 

A premiação é muito mais do que um troféu, como diz o presidente da ONG PDMIG, Jean Katumba, “O principal prêmio do campeão é a união, a confraternização e a celebração da nossa causa de imigração, é isso que vale. Não tem taça como a Copa do Mundo, mas tem taça da solidariedade e da conquista de nossa nova vida em um país que não é nosso”. 

O evento não se baseia apenas nos jogos. Acontecerão simultaneamente feiras culturais, oficinas e a “Corrida Coração Acolhedor”. 

Qual a importância de ter um evento como esse? 

Para Luiz Fernando Godinho, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), a Copa “chama a atenção primeiro para a situação das pessoas refugiadas no Brasil, para a integração deles com a cultura nacional representada por meio do futebol e é também um momento de demonstrar que as pessoas refugiadas são capazes de organizar eventos. Elas têm suas capacidades e sua interação com a comunidade onde elas vivem”.  

Luiz ainda comenta sobre a importância do esporte como um todo para os refugiados e imigrantes: “Por um lado o esporte é uma maneira de retomar uma certa normalidade da vida das pessoas. É uma atividade de lazer que contribui para reduzir o estresse e para aliviar um pouco do sofrimento dessas pessoas, além de um mecanismo de socialização muito forte, tanto para pessoas refugiadas, quanto entre elas e as nacionais. No caso do Brasil, o futebol é uma tremenda ferramenta de integração”, concluiu. 

Expectativa para o retorno 

Após uma paralisação de três anos, os organizadores estimam que o campeonato terá 1520 atletas. Katumba se diz esperançoso com o retorno: “Depois dessa paralisação da pandemia queremos retomar tudo, para tentar sensibilizar e acabar com essa xenofobia que cada vez mais cresce dentro da sociedade”, afirmou. 

Jornalista australiano está preso por divulgar documentos que comprovam abusos e assassinatos realizados pelo governo norte-americano e aliados
por
Camilo Mota, Luan Leão
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20/04/2022 - 12h

 

A justiça do Reino Unido emitiu nesta quarta-feira (20) a ordem formal que autoriza a extradição do jornalista e fundador do site WikiLeaks, Julian Assange, aos Estados Unidos, para que possa ser julgado pelo crime de espionagem. Durante a manhã, na frente do Tribunal de Magistrados de Westminster, manifestantes protestaram contra a decisão, entre eles estavam a esposa do jornalista, Stella Morris, o ex-líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn e membros da Anistia Internacional.

O australiano de 50 anos de idade está em uma penitenciária britânica desde abril de 2019, quando foi detido na embaixada do Equador, onde passou sete anos, após o presidente equatoriano Lenín Moreno retirar a proteção concedida pelo seu antecessor, Rafael Correia, em 2012. 

A acusação contra Assange é baseada na denúncia realizada pelo WikiLeaks sobre a atuação de tropas estadunidenses nas guerras do Iraque e Afeganistão, com a publicação de mais de 700 mil documentos confidenciais a partir de 2010. Nos documentos vazados, o site trouxe à tona atividades diplomáticas e militares estadunidenses que mostraram a brutalidade das ações de guerra. 

Em um vídeo divulgado em abril de 2010 e intitulado "Assassinato Colateral", parte do material divulgado pelo WikiLeaks, é possível ver forças militares dos Estados Unidos atirando indiscriminadamente de um helicóptero em civis de Bagdá, capital do Iraque. Neste ataque, um motorista e um jornalista da Agência de notícias Reuters e outras dez pessoas, morreram. 

A divulgação do vídeo desmontou a afirmação do Departamento de Defesa estadunidense de que as pessoas mortas no ataque eram "terroristas". Antes do vídeo, o site já havia publicado as Regras de Combate das Forças dos Estados Unidos no Iraque em 2007, as informações ajudaram na constatação de que as operações realizadas pelas forças de ocupação ocorriam fora do que estabelecem as regras internacionais que limitam as ações durante conflitos armados, em particular as Convenções de Genebra.

Outro escândalo vazado foi o da prisão, por anos, de pelo menos 150 pessoas mesmo sabendo que eram inocentes. Um deles foi o jornalista da Al Jazeera, veículo de comunicação do Catar, Sami Al-Hajj,  que ficou preso por anos em Guantánamo, em condições inumanas e sob a falsa acusação de ligação com o terrorismo, mesmo a CIA (serviço de inteligência dos EUA) sabendo que não havia nenhuma conexão. A prisão de Al-Hajj foi estendida para que o serviço de inteligência pudesse obter mais informações internas sobre o trabalho do jornalista. 

Esses são alguns dos diversos casos divulgados nos vazamentos realizados pelo WikiLeaks, que expuseram a estratégia dos Estados Unidos na chamada "guerra global ao terror".

Agora cabe à Ministra do Interior do Reino Unido, Priti Patel, a decisão final sobre a extradição ou não de Assange. Ela só pode negar o pedido com base na lei britânica de extradições, que estipula poucas exceções. O prazo para que ela se manifeste é de 28 dias. A defesa do jornalista tem até 18 de maio para apresentar suas alegações.

Caso seja extraditado, Assange pode ser condenado a pelo menos 175 anos de prisão. Vale lembrar que o governo dos Estados Unidos tem 25 acusações contra o australiano, e para eludir as críticas de ameaçar a liberdade de imprensa, diz que Assange é um "hacker" e não um jornalista.

A Secretária-Geral da Anistia Internacional, Agnes Callamard, afirmou em nota que a extradição de Assange poderia causar danos "irreversíveis" ao bem-estar físico e psicológico dele, e "seria devastadora para a liberdade de imprensa" no mundo. 

"As acusações contra Assange nunca deveriam ter sido feitas, em primeiro lugar. Nunca é tarde demais para as autoridades dos Estados Unidos acertarem as coisas e retirarem as acusações", afirmou Callamard. 

Assange foi um dos homenageados com o Troféu Audálio Dantas - Indignação, Coragem e Esperança, realizado pela família Kunc Dantas, Oboré e mais 30 entidades e 17 personalidades apoiadoras da democracia, da liberdade de imprensa e dos direitos humanos. O prêmio foi entregue no último dia 9, na Praça Memorial Vladimir Herzog, pelo radialista e ativista social ítalo-brasileiro José Luis Del Roio. 

Quem o recebeu em nome do jornalista australiano foi Carmen Diniz, coordenadora do Capítulo Brasil do Comitê  Internacional Paz, Justiça e Dignidade aos Povos, em solidariedade ao jornalista no país.

Na foto, José Luiz Del Roio entrega o prêmio a Carmen Diniz, coordenadora do Comitê Internacional Paz, Justiça e Dignidade aos Povos, capítulo Brasil. Foto: Camilo Mota.


Na foto, José Luiz Del Roio entrega o prêmio a Carmen Diniz, coordenadora do Comitê Internacional Paz, Justiça e Dignidade aos Povos, capítulo Brasil. Foto: Camilo Mota.

 

Os repórteres do Consórcio de Veículos de imprensa, criado para divulgar os dados sobre a pandemia após omissão do Governo Federal, também foram homenageados no evento. 

Antes da entrega a Assange, Del Roio enfatizou que a prisão de Assange, há 10 anos, é uma das grandes dores da humanidade. “Assange é um jovem, que teve coragem de denunciar detalhadamente torturas”. O radialista, que disse estar no Conselho da Europa quando as declarações de tortura chegaram a público, ressaltou que se soube “ dessas torturas detalhadas, como, quando e onde, feitas pelos EUA e seus aliados, sobretudo Inglaterra”, mas que o Conselho, mesmo assim, não denunciou os Estados Unidos. 

“Teve que ter um jovem jornalista que pegou aquele material e muitos outros, e denunciou o mundo. Ele é um dos prisioneiros mais perseguidos. Há 10 anos vive em quartos fechados ou em embaixadas, numa cela, que só arrisca passar o resto da vida num buraco nos EUA até morrer. Aqui tem muita gente que perdeu amigos, familiares, e tem gente aqui que foi torturada. E todos esses, não só o agradecem, mas agradecem a sua resistência”, acrescentou.

Ao receber o troféu, que será encaminhado à Inglaterra, Carmen Diniz realçou: “a gente só sabe que existe tortura na prisão do Iraque, por causa do Assange, do WikiLeaks. A gente só sabe que existiam soldados norte-americanos num helicóptero matando civis e rindo, como se fosse num videogame, graças ao Assange. (...) Não é contra o Assange, o que eles estão fazendo, é contra nós. Contra nós sabermos a verdade. Essa perseguição política ao Assange é contra nós também”, finalizou.

A Anistia Internacional enfatizou que “se a Ministra do Interior britânica autorizar a extradição de Assange, isso irá violar a proibição contra tortura e abrir um precedente alarmante para editores e jornalistas em todo o mundo”. Em nota, a organização ainda disse que o Reino Unido tem obrigação de não mandar ninguém para nenhum lugar em que sua segurança seja colocada em risco.

No Brasil, a Associação Brasileira de Imprensa disse que a "perseguição ao criador do WikiLeaks é um gravíssimo atentado à liberdade de imprensa", manifestou "integral solidariedade a Assange" e denunciou "de forma vigorosa a arbitrariedade da qual ele é vítima" A ABI convocou os meios de comunicação brasileiros a "se somarem à sua defesa, que no momento se confunde com a defesa da liberdade de imprensa". 

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) se manifestou dizendo que o "suposto crime" que Assange cometeu foi o de "denunciar crimes de guerra, irregularidades e violações a direitos humanos do governo norte-americano". A associação ainda declarou que "sua extradição é um sinal muito perigoso dado para jornalistas que trabalham com documentos de interesse público", e "vê com muita preocupação essa extradição, pois ela podeum efeito intimidatório em outros jornalistas e a partir de outros vazamentos que denunciem crimes de guerra e violações de direitos humanos que devem vir à tona para que as sociedades possam agir", concluiu a presidente da Abraji, a jornalista Natalia Mazotte.

Sérgio Gomes, jornalista integrante do Instituto Vladimir Herzog de Direitos Humanos, amigo da família Kunc Dantas e fundador do Projeto Repórter do Futuro e da Obore, ressaltou que “mais de 30 entidades representativas dos jornalistas - incluindo a Oboré -, artistas e estudantes de jornalismo de São Paulo, se uniram para promover o Troféu Audálio Dantas – Indignação, coragem e esperança, que foi entregue para a Carmen Diniz, representante do Julian Assange". A entrega ocorreu no dia 9 de abril, na Praça Memorial Vladimir Herzog, localizada no bairro Bela Vista da capital paulista. "Isso significa uma manifestação unitária de todos os jornalistas, artistas e estudantes daqui de São Paulo", afirmou.