“A mídia poderia fazer vídeos de pessoas com esquizofrenia que venceram na vida”, sugere Elvis, à imprensa
por
Vitória Nunes de Jesus
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27/11/2024 - 12h

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a esquizofrenia é a terceira causa de perda da qualidade de vida entre os 15 e 44 anos. São cerca de 1,6 milhão de brasileiros que, além da doença, sofrem com o estigma, que causa mais sofrimento do que o próprio transtorno.

Ainda conforme a OMS, o estigma é “uma marca de vergonha, desgraça ou reprovação que leva um indivíduo a ser rejeitado, discriminado e excluído de participar em diferentes esferas da sociedade”.

Um estudo publicado pela World Psychiatry revelou que nove em cada dez pessoas com esquizofrenia enfrentam estigma e discriminação, incluindo em ambientes de trabalho, serviços de saúde e relações sociais.

Para esclarecer melhor sobre esse transtorno que ainda é um tabu na sociedade, o médico psiquiatra Cristiano Noto explica melhor sobre a psicose, os sintomas da esquizofrenia e o estigma. “A psicose é um sintoma. A psicose é uma ruptura com a realidade. Normalmente se fala em delírio e alucinação, sendo que delírio são crenças dos pacientes que muitas vezes estão destorcidas da realidade. Na esquizofrenia, o mais comum é a alucinação auditiva, então normalmente a pessoa escuta vozes que xingam, que mandam ela fazer coisas, que têm um conteúdo mais depreciativo”.  

Cristiano explica que os sintomas acima são os chamados “sintomas positivos”. Ele conta que, além destes, existem outros. “Também é muito comum a desorganização do pensamento e no comportamento. Existem os sintomas negativos que são bastante frequentes, que são retração, então a pessoa se isola, tem menos prazer nas atividades, vai ficando mais apática, traz bastante sofrimento para o paciente e para a família”.  

O doutor diz que a esquizofrenia tem uma causa genética de 70 a 80% e que existem fatores ambientais que estimulam estes genes. “Entre esses fatores, vários podem ser citados, mas geralmente são relacionados com estresse, por exemplo: problemas no parto, maus tratos na infância, violência, abuso, uso de droga, principalmente maconha”. 

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que o estigma é uma das principais barreiras para o tratamento de pessoas com esquizofrenia.

Para os jornalistas, o tema não é abordado por não conhecerem o transtorno mental, preconceito, focar em outros transtornos como ansiedade e depressão e receio de a reportagem não ser bem vista por conta do tabu existente.

A jornalista Thaís Itaqui conta a sua experiência com pautas de saúde mental. “Falar de esquizofrenia para mim virou algo mais rotineiro porque eu tenho uma pessoa na minha família que convive com essa doença, que é meu irmão, o Thiago. Eu fiquei trabalhando na TV Globo por quase vinte anos, quando comecei a vender pautas de saúde mental, percebia que estas pautas eram mais facilmente veiculadas quando tinha uma data especial. Ou falava-se de depressão, ansiedade, dificilmente outros transtornos eram abordados. Quando eu me tornei jornalista e comecei a fazer um trabalho dentro da TV e quis começar a vender essa pauta justamente por conhecer e trazendo a importância de se falar disso, eu comecei a perceber a dificuldade que era de perceberem que essa pauta era importante, então normalmente eles falavam que eu trazia a pauta devido ao meu irmão, mas que não era algo comum de se abordar. Então começa a perceber que o tema é um tabu em vários lugares. A pessoa acaba sendo excluída e a família também, pois a pessoa tem dificuldades e a família pega essas dores”. 

Thaís diz acreditar ter recebido retornos positivos em sua profissão. “No começo quando se levanta uma pauta tão difícil como essa e consegue colocá-la na mídia, a gente está conseguindo abrir uma porta, então no momento que milhares de pessoas assistiram minhas matérias, eu acredito ter alcançado pessoas que vivem com o problema, familiares e profissionais que cuidam desses pacientes. Eu também percebi uma coisa muito legal com os meus colegas de trabalho, porque como eles sabiam da minha experiência com meu irmão, eles começaram a conhecer mais a doença por minha causa”.

Dados do Schizophrenia Research Journal indicam que as representações na imprensa representam frequentemente a esquizofrenia ao comportamento violento.

Para completar os depoimentos, não poderia faltar o de uma pessoa com esquizofrenia. Elvis Presley Guarany de Melo conta como foi o momento em que foi diagnosticado. “Fui diagnosticado quando eu era criança. Aprendi a falar com 9 anos, mas minha mãe nunca entendia o meu problema, aí ela começou a perceber as minhas dificuldades na escola, porque eu não me enturmava com os alunos, mas ela não queria aceitar e ela viu que repeti a 1ª série três vezes aí ela percebeu que eu tinha um problema e a professora percebia que eu ficava afastado das pessoas, foi aí que surgiu o início da esquizofrenia. Com o tempo, eu fui crescendo, foi piorando o diagnóstico e eu comecei a passar no psiquiatra a partir dos dezoito anos”.  

O ambiente em que a pessoa é criada interfere no desenvolvimento da esquizofrenia. Elvis conta como foi sua infância na casa onde foi criado. “Eu tenho um irmão gêmeo que também tem esquizofrenia, mas eu tenho um grau mais elevado. Meus pais se separaram porque meu pai traiu minha mãe, que teve que cuidar de 4 filhos, então minha mãe não pode dar luxo para os filhos. O governo se negava a dar assistência social e tratamento de fonoaudiólogo. Os sintomas foram piorando porque quem não tem recursos não se trata, e o governo ignora. Eu passo no CAPS 3, que é onde se trata pessoas com esquizofrenia e não tem psiquiatra, você pega o remédio há cada 3 meses e não tem médico e quando você vai questionar, eles aumentam a dosagem do seu remédio porque não gostam que as pessoas falem a verdade. Mas o CAPS está sendo insuficiente porque nós não temos todos os tratamentos e psiquiatras quando precisamos”.  

De acordo com a OMS, menos de 15% das pessoas diagnosticadas com esquizofrenia têm empregos formais, comparado a 65% da população geral. Elvis relata sua grande dificuldade de permanecer em um trabalho. “Eu já trabalhei em 42 empresas e em todas fui mandado embora porque as empresas não são adequadas para pessoas com esquizofrenia. Eu nunca agredi alguém, eu vejo coisas, ouço vozes e isso faz parte de mim. Eu estou cansado de me esconder e é por isso que eu quero que as pessoas saibam da minha história que é real. Eu quero estudar, eu quero trabalhar, eu quero ser útil”.  

Por fim, Elvis conta sobre seu doloroso tratamento e sua luta para ter uma condição de vida melhor.  

Eu já fiz uma terapia chamada terapia do choque, que eles colocam tipo um metal na boca e dão estímulos de carga elétrica na cabeça. A pessoa com esquizofrenia tem a mente acelerada, ela vê coisas e pensa em muitas coisas ao mesmo tempo. Eu já fui amarrado numa maca e não foi fácil porque, se eu tivesse o tratamento e apoio de todos os profissionais de saúde necessários, eu não precisaria ter passado por tratamentos tão severos como os tratamentos de choque que levei muitas vezes.  

— E você teve quantos surtos mais ou menos? Eu vejo pessoas que às vezes me chamam, eu ouço muitas vozes, em lugar muito cheio eu uso abafador auditivo. Eu lutei para ter um cachorro para identificar quem é real e quem não é, mas o governo não me disponibiliza um cachorro treinado, e eu estou nessa luta. No Brasil, nós estamos muito atrasados na luta contra a esquizofrenia.  

Diante destes apontamentos, é claro perceber que a mídia deve abordar mais sobre a esquizofrenia visando mostrar a realidade destas pessoas. Existem pacientes que podem ter apenas um surto durante toda a vida, pode ter uma pessoa com esquizofrenia do seu lado no metrô. Falta informação e acolhimento.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Produzir orgânicos é um desafio que envolve altos custos, manejo artesanal e um compromisso com a sustentabilidade.
por
NINA JANUZZI DA GLORIA
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12/11/2024 - 12h

Por Nina J. da Glória

 

No coração de uma pequena fazenda nos arredores de São Paulo, a paisagem exibe fileiras simétricas de verduras, um campo verde que mais parece um quadro pintado com paciência e precisão. Cada folha simboliza uma promessa livre de químicos, cultivada à mão, mas também testemunha de um trabalho árduo, invisível ao consumidor final. Esse é o cotidiano de Mariana Silva, uma agricultora que decidiu, há quase uma década, abandonar a produção convencional para dedicar-se ao orgânico. No início, acreditava que seria um retorno ao básico, uma reconexão com a natureza. Mas a realidade mostrou-se mais densa e complexa do que o imaginado. O solo, como um organismo vivo, exigia constantes cuidados e uma compreensão que ia além dos métodos tradicionais. Cada semente carregava uma incerteza, e cada colheita trazia consigo os riscos de uma produtividade menor, vulnerável a pragas e intempéries. "O solo não aceita pressa", sua frase parece pairar na atmosfera ao redor das hortas, impregnada de paciência e resignação.

Nas redondezas, em outra propriedade de São Roque, Paulo Mendes compartilha a mesma visão, mas com uma trajetória que o levou ao orgânico por caminhos distintos. Ao contrário de Mariana, ele vem de uma família que cultivava com agroquímicos, mas sempre sentiu a necessidade de transformar as práticas de cultivo. Para ele, o orgânico é como um resgate da essência da terra, uma escolha que exige mais do que habilidades tradicionais. É um compromisso com o solo, com o ciclo de nutrientes e com o futuro. Paulo vê o campo como um delicado organismo, onde a compostagem e a rotação de culturas são essenciais, mas também um desafio financeiro. Cada safra se transforma em uma experiência quase artesanal, onde a eficácia do manejo natural precisa competir com a tentação das facilidades químicas. Esse processo, para ele, é como uma dança cuidadosa com a natureza, em que observar e respeitar o ritmo das estações torna-se tão vital quanto qualquer técnica de plantio.

                                                            Comunidade de pessoas que trabalham juntas na agricultura para cultivar alimentos

Para Mariana e Paulo, a colheita orgânica traz consigo um custo invisível ao olhar do consumidor. A vulnerabilidade às pragas, por exemplo, é uma preocupação constante. Sem pesticidas convencionais cada infestação é uma batalha natural que, muitas vezes, se perde. A introdução de insetos benéficos para conter pragas ou o uso de biofertilizantes representa um custo adicional, tornando a logística do manejo um quebra-cabeça financeiro. Além disso, há as certificações rigorosas exigidas para que o produto receba o selo de orgânico, que Mariana descreve como "um segundo trabalho", com visitas e inspeções que, embora necessárias, absorvem ainda mais recursos.

No centro dessa cadeia está Cláudia Ramos, proprietária de uma loja de produtos orgânicos em São Paulo. De seu ponto de vista privilegiado, ela percebe o esforço e as dificuldades de seus fornecedores, mas também o descompasso entre o preço desses produtos e a percepção dos consumidores. Em cada item das prateleiras, Cláudia vê um microcosmo de esforço e idealismo, mas, ao explicar as diferenças entre orgânico e convencional, enfrenta um público que ainda considera o orgânico um luxo. Ela afirma que cada produto é uma história de sacrifício, e explica que o custo mais alto representa a vulnerabilidade da produção orgânica, que exige cuidados permanentes e colheitas menos previsíveis.

                                                                                           Close-up de plantas verdes na estufa

A produção orgânica, então, emerge como uma complexa equação de valores, sacrifícios e riscos. Cada um dos envolvidos—do campo à prateleira—carrega uma parte dessa carga, como se fosse um ciclo contínuo de compromissos, onde o ideal e o real se encontram e se confrontam. A busca pela pureza e pelo cuidado no cultivo se mescla a um cotidiano cheio de dificuldades, e o produto final se transforma numa espécie de narrativa silenciosa sobre perseverança e dedicação ao que se acredita ser o melhor para o futuro do planeta e do ser humano.

Doença que afeta cerca de 8 milhões de brasileiras ainda tem diagnóstico complicado e demorado
por
Giovanna Takamatsu
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12/11/2024 - 12h

Por Giovanna Takamatsu 

Eram 4h00min, talvez 5h00min, de algum dia da semana de 2017. Estava chovendo forte, uma daquelas tempestades com trovoadas, que deixa o céu totalmente escuro e tudo parece noite. Lara foi acordada por uma dor descomunal. Nunca tinha sentido algo assim antes em toda sua vida. Parecia que tinha sido atingida por uma faca ou um machado em sua perna direita. Ou então como se uma mão gigante estivesse apertando cada vez mais forte seus músculos da coxa. Ela não sabia o que fazer, pois não tinha nada aparentemente errado com seu membro; começou então a chorar e soluçar de tanta dor. Isso fez com que seus pais acordassem e checassem o que estava acontecendo. 

Sua mãe, que é farmacêutica, ao entender a situação, logo pensou em remédios disponíveis pela casa para tentar acabar com a dor, mas nenhum chegou nem perto de melhorar o sintoma de Lara – mesmo tomando remédios fortes, como codeína + paracetamol. O último recurso menos ‘drástico’ que sua mãe pensou foi uma massagem. A família tinha um massageador automático que esquentava enquanto agia. E por algum milagre, era exatamente isso que a adolescente precisava. Depois de uma longa hora - que pareceu uma sessão de tortura -, a dor de Lara finalmente diminuiu e ela conseguiu pegar no sono novamente. 

Um mês se passou sem que essa agonia voltasse, e Lara chegou a pensar que foi somente um episódio de dor de crescimento mais intensa– aqueles desconfortos que parecem uma mistura de câimbra e um apertão que acontecem com os pré-adolescentes – já que era muito comum disso acontecer com ela. Mas novamente, Lara acordou com aquele sofrimento, na mesma perna, no mesmo local. Não era possível. Dessa vez ela já sabia o que fazer, como proceder, mas precisa entender a causa dessa dor. 

Claro que a menina foi avisar sua mãe. E como se fosse uma epifania, a mãe percebeu sobre o que se tratava essas dores misteriosas. Ela já havia passado por algo parecido. Notou que ambas as vezes que essa dor na perna aconteceu, Lara estava menstruada. Esse era o ponto em comum entre as aflições. Só podia ser algo relacionado a isso. Fazia total sentido; ela sempre sofreu com sua menstruação: tinha dores e cólicas intensas nas costas, seu fluxo era intenso, já tinha o diagnóstico de Síndrome do Ovário Policístico (SOP) e seu ciclo era extremamente desregulado. 

Talvez seja endometriose, disse a mãe que lembrou ter tido isso quando era mais nova. Endometriose. Lara perguntou o que sua mãe fezpara resolver. Sua mãe foi enfática ao dizer que a gravidez, em sua época, era o tratamento mais comum. Mas Lara ainda era uma adolescente, e nem sabia se queria ter filhos. E o tratamento para a pior dor da vida não poderia ser engravidar.  Ela se sentiu em uma distopia, em ‘O Conto de Aia’. Lara foi procurar sobre essa tal de endometriose e na Internet viu que demora entre 4 a 10 anos para conseguir fechar o diagnóstico. 10 anos!!! E que não há cura, somente manejo dos sintomas. 

            O próximo passo lógico era ir à uma ginecologista. Lara não estava muito animada com isso já que entendeu que talvez demoraria anos e anos para resolver aquela situação. Mas enfim, ela foi. A ginecologista não deu muita atenção à queixa de Lara. Na consulta foram feitos os exames de rotina, e no final foi receitado uma pílula de gestrinona, que deveria bloquear totalmente sua menstruação, assim não teria nenhum sintoma relacionado a ela. Mas ainda sim não recebeu a confirmação de endometriose. 

Após alguns anos de dúvidas em seu diagnóstico, Lara decidiu a passar em outra ginecologista especialista em endometriose. Essa nova médica pediu que ela fizesse um exame de ressonância magnética da pelve, para identificar se havia focos de tecido endometrial fora do útero. Somente após que o exame voltou positivo, foi fechado o diagnóstico, ou seja, após 4 ou 5 anos do primeiro episódio de dor. Hoje, ela maneja seus sintomas com a pílula. Por se tratar de uma doença crônica, sua médica se preocupa com a questão de sua fertilidade, mesmo que Lara seja nova ainda. Demorou alguns anos, mas hoje Lara sabe que possuí uma rede de apoio médico que a auxilia em qualquer momento e respeita suas escolhas.   

Mas se sabe que essa realidade não é de todas as mulheres brasileiras com endometriose. Segundo o Ministério de Saúde, 1 em cada 10 mulheres sofrem com a endometriose. Isso são 8 milhões de brasileiras no total com essa doença. O diagnóstico dessa moléstia não é fácil, devido a inespecificidade dos sintomas, que podem significar muitas doenças ginecológicas. Mas o preconceito por parte de profissionais de saúde, que constroem estigmas cerca às aflições da mulher, afeta muito no tempo do diagnóstico e ressalta como as mulheres ainda não são levadas a sério nos diversos âmbitos sociais

Eliane tem 26 anos e é moradora do Campo Limpo, periferia de São Paulo. Desde adolescente, ela sofre com os sintomas da endometriose, tendo um quadro parecido com o de Lara: dores e cólicas fortes em diversas regiões próximas ao útero, fluxo intenso, ciclo desregulado. A principal diferença entre as mulheres é que, enquanto Lara conseguiu atenção médica e diagnóstico preciso já no início de sua dor, Eliane precisou de quase 10 anos para finalmente fechar seu diagnóstico. 

Isso se deve muito a desvalorização médica em casos de dores e cólicas uterinas. Eliane já escutou de profissionais da saúde em UBSs e UPAs que isso era normal da menstruação – o que não fazia o menor sentido em sua cabeça; não é normal uma dor que parece que suas pernas, seu abdome, suas costas estão sendo esmagadas. Ela se sentia ignorada toda vez que tentava falar sobre o assunto, e, de certa forma, ela desistiu de procurar ajuda para aquelas dores terríveis que tinha todos os meses. 

Aos 22 anos, Eliane conheceu seu atual marido. O casal começou a tentar engravidar, mas isso nunca se concretizou. Após 1 ano de tentativa, Eliane decidiu que iria passar por uma ginecologista para entender o que estava acontecendo. Essa médica não deu muita importância para as queixas de dor intensa, e alegou que era normal. Mas, para desencargo de consciência, a ginecologista pediu que ela realizasse o ultrassom transvaginal com preparo intestinal – prática comum para o diagnóstico de endometriose, uma vez que, com as alças do intestino vazias, a visualização dos focos de tecido é mais fácil – tanto para a endometriose quanto para o problema de fertilidade. 

Finalmente, no retorno da consulta, Eliane recebeu seu diagnóstico: endometriose. Entretanto, pelos anos que ela passou sem tratar essa doença, ela desenvolveu problemas de fertilidade. Hoje, ela realiza tratamentos que auxiliam resgatar sua fertilidade, mas ainda não conseguiu carregar uma gestação a termo. 

     

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Para além de desafios científicos, programas de planejamento familiar frequentemente ignoram a necessidade de inclusão dos homens nas decisões reprodutivas
por
Laura Mariano
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23/10/2024 - 12h

Desde da década de 1960, esforços têm sido feitos para desenvolver um método contraceptivo masculino que seja reversível e possua uma eficácia comparável, ou até superior, à da pílula anticoncepcional. Contudo, até o presente momento, esse produto não chegou ao mercado. Ainda que a pesquisa sobre contraceptivos masculinos seja conduzida desde a introdução dos métodos contraceptivos femininos à população, os métodos convencionais de contracepção continuam predominantemente focados no controle da fertilidade das mulheres.

As razões abrangem desde os desafios fisiológicos do sistema reprodutivo masculino, uma vez que isso implica na redução das taxas de testosterona, podendo levar a problemas de função erétil e incapacidade de conceber, até a insuficiente dedicação por parte da indústria farmacêutica e aos estigmas associados aos diversos métodos potenciais, sejam eles baseados em hormônios ou de natureza de bloqueio, como exemplificado pelo Risug — Inibição Reversível do Esperma sob Orientação: um conceito que atraiu interesse desde o início de suas pesquisas nos anos 1970.

Dessa ideia, surgiu o Risug que injeta um polímero — popularmente conhecido como gel, chamado SMA (anidrido maleico de estireno) — no canal do deferente que, próximo à bolsa escrotal, inibe a passagem do fluido espermático local. Como alternativa, o procedimento promete, de acordo com estudos em modelos animais, esterilidade em até 10 anos.

O Instituto Indiano de Tecnologia (IIT), que estuda o procedimento com SMA, divulgou que os testes estão em estágio avançado e o Risug estaria disponível para a população. Isto é, caso haja a liberação dos órgãos reguladores de cada país, como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), no Brasil. A injeção contraceptiva chegaria ao mercado valendo, em média, R$400,00, segundo o IIT.

O médico urologista do Centro de Medicina Sexual do Hospital Sírio Libanês, Celso Gromatsky, explicou que existe a possibilidade de reversibilidade do procedimento através de uma nova injeção no deferente, com uma mistura de bicarbonato de sódio e ácido dinitrosalicílico (DNS), um composto de moléculas redutoras.

“O gel atua na motilidade do esperma. Então, o indivíduo vai ejacular normalmente, só não vai conter espermatozoide. Há uma semelhança com a vasectomia, ou seja, o mecanismo é mais ou menos o mesmo, a diferença é que a reversibilidade do Risug é mais simples”, afirma Gromatsky.

Métodos contraceptivos espalhados com um fundo rosa
Nova método contraceptivo masculino foi eficaz em reduzir a fertilidade em testes do Instituto Indiano - Fonte: Freepik
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Mesmo assim, não parece a solução perfeita. Os espermatozoides ainda conseguem ultrapassar a barreira, e quando entram em contato com SMA, após uma transformação química, acabam sofrendo defeitos morfológicos, fragmentação do DNA e habilidade e fertilização prejudicada. Para além disso, os métodos propostos à população masculina ainda apresentam taxas de insucesso, além dos riscos de reversão, infertilidade e obstruções locais. 

A partir do momento em que os primeiros estudos sobre esse assunto foram divulgados, os pesquisadores enfrentam desafios para introduzir os medicamentos na indústria farmacêutica, dado que a taxa de eficácia se destaca como um fator de risco significativo. Ao analisar os resultados, a pílula anticoncepcional feminina, por exemplo, emerge como um dos métodos mais seguros quando utilizado de forma adequada, demonstrando uma eficácia de 99,9% dos casos.

“É muito caro produzir medicamentos, ainda mais quando falamos de uma situação na qual existem métodos muito mais efetivos. A pílula feminina, por exemplo, tem um perfil de segurança e um custo benefício maior, né? Tem que ser um produto que seja tão eficaz e tão seguro quanto, para ser lançado ao mercado”, afirma Erick José Ramo da Silva, doutor em Farmacologia e professor do Departamento de Biofísica e Farmacologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp).

A sociedade contemporânea está mais inclinada a deixar a responsabilidade de controle da reprodução para mulheres. Uma possível razão para essa situação é que, em sua grande maioria, a determinação da fertilidade é conduzida pelas mulheres, uma vez que são elas que enfrentam os riscos associados à gravidez e desempenham predominantemente o papel principal na criação dos filhos. Como resultado, a maioria dos métodos contraceptivos é voltada para o público feminino, deixando apenas três opções disponíveis para o público masculino: preservativo, vasectomia e o método de retirada.

“Estamos no século XXI, a vasectomia existe há mais de um século e existem homens que acreditam que o procedimento impactaria no desempenho sexual. Por isso, o advento do anticoncepcional masculino no mercado possibilita compartilhar a responsabilidade da gravidez de forma igualitária entre parceiro e parceira”, pondera Celso Gromatsky. 

No presente, em que se enfatiza tanto a necessidade de os homens assumirem suas responsabilidades reprodutivas, fica mais evidente essa lacuna de conhecimento e cada vez mais evidente a reivindicação da participação masculina no mérito da reprodução, bem como sua percepção acerca dos diferentes papéis de gênero em relação às decisões sobre quando ter relação sexual e uma gravidez.

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Segundo secretário de Polícia Civil do Rio, erro nos resultados dos testes tinha objetivo de obter lucro
por
Laura Mariano
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14/10/2024 - 12h

 

A Polícia Civil do Rio de Janeiro iniciou nesta segunda-feira (14) uma operação que investiga o laboratório PCS-Saleme. A empresa é apontada como responsável pelo erro que provocou a infecção por HIV em seis pacientes após o transplante de órgãos infectados.


Os agentes prenderam duas pessoas envolvidas na emissão de laudos falsos que resultaram no transplante de órgãos infectados com HIV. As prisões de Walter Vieira, médico ginecologista e sócio do Laboratório PCS-Saleme; e Ivanilson Fernandes, técnico do laboratório, foram resultado da primeira fase da operação “Verum”, realizada pela Delegacia do Consumidor (DECON).

“As informações iniciais, colhidas até o momento, dão conta de que houve uma falha operacional de controle de qualidade nos testes aplicados ao diagnóstico de HIV. E tudo isso com o objetivo de obter lucro”, afirmou o secretário de Polícia Civil, Felipe Curi, em coletiva nesta segunda-feira (14).

Segundo as investigações, a análise das amostras deixou de ser realizada diariamente para se tornar semanal para diminuir os custos. A questão contratual com o laboratório também está sendo investigada pela Polícia Civil.

O outro sócio do laboratório, Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, filho de Walter, se apresentou à polícia para prestar depoimento. Ao todo, onze mandados de busca e apreensão foram expedidos pela Justiça do Rio de Janeiro. Duas pessoas estão foragidas.


“Assim que tive conhecimento sobre os casos, determinei a apuração imediata dos fatos. Todos os envolvidos estão sendo investigados e os culpados serão punidos com o rigor da lei. Esse crime atenta contra todo o estado, e daremos uma resposta dura”, declarou o governador Cláudio Castro.

Em nota, o Laboratório PCS Saleme afirmou que Walter Vieira, em depoimento nesta segunda-feira (14), disse que a sindicância interna do laboratório apontou falha humana na transcrição dos resultados de dois testes de HIV. 

“A defesa dele e de Mateus Vieira repudia com veemência a insinuação de que existiria um esquema criminoso para forjar laudos no laboratório, que atua no mercado desde 1969. A defesa confia que, após os esclarecimentos prestados por Walter, a Justiça entenderá desnecessário mantê-lo preso”, diz o posicionamento da defesa.

“O laboratório reafirma que dará todo suporte necessário às vitimas assim que tiver acesso oficial à identidade delas; e que está à disposição das autoridades que investigam o caso”, finaliza a nota. 

autoridades da policia civil sentadas a mesa durante uma coletiva de imprensa
Coletiva de imprensa sobre a operação contra envolvidos em contaminação de transplantados por HIV - Fotos: Rafael Campos (Polícia Civil)

Entenda o caso


No dia 10 de setembro, um paciente que fez um transplante de coração foi ao hospital com sintomas neurológicos e teve o resultado para HIV positivo — ele afirmou que não tinha o vírus antes.

A partir daí, as autoridades refizeram todo o processo e chegaram aos exames feitos pelo PCS-Saleme com resultado falso negativo. O doador infectado morreu em 23 de janeiro, aos 28 anos, no Hospital Municipal Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias.

Foram doados os rins, o fígado, o coração e a córnea. Todos foram testados, de acordo com o laboratório PCS, e não reagentes para HIV. Sempre que um órgão é doado, uma amostra é guardada. A SES-RJ, então, fez uma contraprova do material e identificou o HIV.

Em paralelo, a pasta rastreou os demais receptores e confirmou que dois doadores tiveram exames com falsos negativos no laboratório. Ao todo, foram duas pessoas que receberam os rins testaram positivo para o HIV; a paciente que recebeu o fígado morreu pouco depois do transplante, mas o quadro dela já era grave, e a morte não teria relação com o HIV. Um paciente recebeu a córnea, que não é tão vascularizada, e testou negativo.

No dia 3 de outubro, outro transplantado apresentou sintomas neurológicos e testou positivo para HIV. Essa pessoa também não tinha o vírus antes da cirurgia.

Na última sexta-feira (11), a Polícia Civil informou que investigava o caso. O Ministério Público do Rio de Janeiro também instaurou um inquérito para apurar as infecções. O objetivo é identificar os responsáveis pela emissão de laudos falsos que resultaram no transplante de órgãos infectados com HIV. A investigação ainda suspeita que o laboratório tenha falsificado laudos em outros casos.

A Secretaria de Estado de Saúde (SES-RJ) contratou o laboratório PCS-Saleme para realizar os exames dos doadores de órgãos a partir de dezembro de 2023. Ao todo, até agora, seis pessoas foram infectadas por HIV após passarem por transplantes de órgãos na rede pública de saúde do Rio de Janeiro.

De acordo com a secretaria, todos os exames de sorologia dos doadores deste laboratório foram transferidos para o HemoRio, uma unidade de saúde estadual, que vai retestar o material armazenado de 286 doadores.

A polícia investiga ainda se o PCS-Saleme falsificou laudos em outros casos além dos transplantes. A unidade atendia outras 10 unidades de saúde estadual.

As autoridades também chegaram a outro exame errado, o de uma doadora no dia 25 de maio deste ano. Uma mulher de 40 anos morreu no Hospital Municipal Albert Schweitzer, em Realengo, e teve os rins e fígado doados. Os exames na PCS haviam dado negativo, mas a contraprova constatou que os três receptores dos órgãos dela haviam sido infectados.


O laboratório Patologia Clínica Doutor Saleme (PCS-Saleme) tem como sócios dois parentes do ex-secretário estadual de Saúde do estado, Doutor Luizinho, atualmente deputado federal e líder do Partido Progressistas (PP) na Câmara. Na época, os parentes de Luizinho chegaram a fazer campanha para a candidatura dele para o Legislativo — são eles Walter Vieira, casado com a tia do deputado; Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, primo de Luizinho.


Em nota, o deputado disse que jamais participou da contratação de qualquer laboratório e lamentou o ocorrido — Luizinho deixou a secretaria três meses antes de o laboratório ser contratado.

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Entenda como abandonar seu parceiro prejudica também a vida dos seres humanos.
por
Luísa Ayres Dias de Oliveira
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28/10/2022 - 12h

Pelas ruas, a cena se repete. Quem nunca viu um animal desabrigado, revirando lixo ou se escondendo da chuva?

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), sobrevivem cerca de 30 milhões de animais abandonados no país. Desses, aproximadamente 20 milhões são cães e, 10 milhões, gatos.

Apesar de corriqueiro, o cotidiano do abandono revela um problema grave de responsabilidade, empatia e, principalmente, conhecimento da lei. Abandonar animais de estimação é crime. Além do pagamento de multa e proibição da guarda, a reclusão do indivíduo pode chegar a 5 anos – tratando-se de cães e gatos. Caso o animal venha a falecer, a pena aumenta de um sexto a um terço (Conforme a Constituição Federal e a Lei de Crimes Ambientais de nº 9.605/98).  

Priscila Gaieta, voluntária da ONG Canto da Terr, pontua que as causas para o abandono são uma somatória de 3 fatores: Falta de recursos e planejamento, pouco acesso à informação e irresponsabilidade.

“Eu resgato muito animal que ninguém quer. Agora terça feira (18), resgatei uma (cadela Vivi) que foi jogada de um carro a 80 km/h. Está cheia de ponto na cabeça”, conta Priscila, que também cuida de vários bichinhos portadores de alguma deficiência ou dificuldade motora, sobretudo cães cadeirantes que também foram abandonados. “O Banzé foi abandonado na ONG, muito machucado, muito idoso. Hoje está comigo, é o amor da minha vida”, conta emocionada sobre um dos seus cachorros resgatados.

Através de seus relatos, percebem-se os diversos tipos de abandono. Desde aqueles animais que são deixados nas ruas ou nas portas dos abrigos, até os cenários mais desumanos possíveis, como aconteceu com Paçoca, um cãozinho atropelado e abandonado em um dia de chuva ainda dependendo do uso de acesso venoso.

Na pandemia, o índice de abandono cresceu cerca de 61%, conforme aponta a Associação das Mulheres Protetoras dos Animais Rejeitados e Abandonados (Ampara Animal). Como agravante, houve menores índices de adoção em 2022 se comparado ao ano passado, causando superlotações em muitos abrigos.

O que pode ser feito?

Apesar de tentar convencer os donos a ficar com os bichos, Priscila conta que as desculpas são sempre as mesmas: “Ai, já tentei de tudo”, “Meu marido não quer”, “Eu não tenho como cuidar”. Isso quando muitos não mentem, chegando à ONG com um bicho supostamente achado na rua.

Por isso, ela conta que exige uma adoção responsável, em que é feito todo um processo de acompanhamento com os novos tutores, que devem enviar fotos e vídeos do animal pelo tempo que for necessário, além de assegurar a aplicação das vacinas no prazo. Caso contrário, o bicho é retirado através de meios legais.

Além disso, os animais são entregues castrados e os novos donos são informados com antecedência sobre as necessidades e personalidade do animal.

“A gente não tira da rua pra voltar pra rua”, afirma.

Legenda: Rafaela, Carlos Eduardo e a gatinha Flora, respectivamente, durante evento de adoção realizado no pet shop Pata Natural.
Legenda: Rafaela, Carlos Eduardo e a gatinha Flora, respectivamente, durante evento de adoção realizado no pet shop Pata Natural. Créditos: Luísa Ayres.

 

Pensando na causa, o Dezembro Verde, uma campanha realizada em diversos lugares do país, inclusive na ONG e nos projetos de Priscila, tenta conscientizar a população acerca do tema - apesar do mês ser um dos que apresenta maior índice de rejeição animal, sobretudo em meio às festas de fim de ano e viagens de férias.

Cuidar dos animais é cuidar das pessoas

Além de ameaçar a vida dos próprios animais, o abandono também prejudica a vida da população, sobretudo, devido à maior disseminação de doenças. Dentre elas, a raiva, leptospirose, micose, infestação de lombrigas, sarna, giardíase e toxoplasmose. Todas apresentam risco letal, podendo ser transmitidas através de mordidas, arranhões e contato com ferimentos dos bichos.

A ONG internacional World Animal Protection orienta para a denúncia de casos de abandono ou maus tratos: Há a possibilidade de lavrar um Boletim de Ocorrência (BO) ou então de comparecimento à Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. É possível denunciar também ao órgão público do município, utilizando-se inclusive da Lei Estadual ou Federal. Já pelo telefone, pode-se discar 190 (polícia), 181(disque denúncia) ou 0800 61 8080 (IBAMA – em caso de animais silvestres). Pela internet, é possível acessar os portais do Ministério Público Federal ou do Safer Net. Para informações mais específicas de como denunciar em cada região e estado do país, acesse a página da ONG.

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Mais de 30 mil brasileiros aguardam esperançosamente na fila de transplante por um rim compatível, única opção para tratar pacientes com doença renal crônica em estágio avançado.
por
Manuela Almeida Dias
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26/10/2022 - 12h

 

O Brasil está em terceiro lugar no ranking dos países que mais realizam transplantes renais no mundo. Em 2021, foram registrados 4.828 procedimentos desse tipo, 90% deles financiados integralmente pelo SUS (Sistema Único de Saúde). 

 

Mesmo com um alto volume de transplantes realizados com sucesso todos os anos, a fila de espera por um rim é muito longa. Em alguns casos, pacientes estão há mais de 15 anos na fila aguardando por um rim compatível, sendo submetidos a diversos tratamentos e correndo um alto risco de vida.

 

Os rins desempenham papéis fundamentais em nosso organismos. Eles são responsáveis por filtrar o sangue e remover todos os resíduos tóxicos presentes na circulação sanguínea. Quando eles param de funcionar, o paciente deve se submeter a sessões de hemodiálise ou diálise para se manter vivo.

 

Em 2021, com base obtidos pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), 15.640 pacientes renais ingressaram na fila de espera pelo transplante, e destes, 3.009 (19,24%) vieram a óbito. 

 

No Brasil, existe o sistema de lista única para transplantes, conhecido popularmente como fila única de transplantes, regulamentado pelo Decreto n.º 2.268, de 1997. Com a demora da fila para transplante, mais de 30 mil pacientes aguardam pelo contato dos hospitais. É o caso do Izaias Sineco de Almeida, um paciente renal de 75 anos que está há mais de 15 anos esperando pelo transplante.

 

“Recentemente fez 15 anos que eu estou aguardando na fila de transplante. Já fui chamado três vezes, mas por ter uma idade avançada eles preferiram priorizar outros pacientes. É agonizante ver os seus colegas falecerem durante uma sessão de hemodiálise. Ter fé é a única coisa que nos resta nesse momento”, diz Izaias.

 

Desde 2007, ele realiza sessões de hemodiálise com 4 horas de duração, três vezes por semana.

 

“Vou à clínica de hemodiálise três vezes por semana. Com o auxílio da minha esposa e filhos tenho permanecido forte e irei me manter dessa maneira até encontrar o meu rim compatível", comenta emocionado.

 

A nefrologista Caroline Reigada explica como é classificada a lista de espera para transplante pelo SUS: “A principal característica de classificação das listas de espera para o tão sonhado transplante é que elas não funcionam por ordem de chegada, mas sim, por condições médicas, como a compatibilidade entre o paciente e o doador e gravidade da doença”.

 

Fundado em 1998, o Hospital do Rim (Hrim), localizado na capital paulista, é o maior centro de transplantes renais do mundo, com mais de 900 procedimentos por ano. O Hrim realiza, em média, 20% de todos os transplantes de rins realizados no País.

 

Tatiane Fonseca, de 46 anos, é professora de Biologia. Ela foi diagnosticada em 2010 com insuficiência renal, e há 4 anos vive com o seu novo rim transplantado:

 

“Frequentei a clínica de hemodiálise por oito anos. Confesso que foram os anos mais difíceis da minha vida, mas me mantive viva e saudável e em 2018 recebi uma ligação do Hospital do Rim de São Paulo. Consegui realizar o meu transplante. Hoje eu tenho uma família linda e pude continuar a dar aulas”, diz Tatiane.

 

A libertação da máquina e agulhas traz o significado de poder desenvolver ações simples que eram possíveis antes do tratamento, como passear no parque, ir à praia, trabalhar ou ir ao cinema, coisas que parecem “bobas” para quem tem uma vida saudável.

 

“Sinto falta de poder tomar um copo de água ou poder correr com os meus netinhos pela rua. Sei que o meu rim está me esperando em algum lugar, e em breve poderei me divertir novamente”, finaliza Izaias. 

 

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A plataforma está sendo desenvolvida por pesquisadores que visam comprovar a eficácia da inteligência artificial em diagnosticar depressão, ansiedade e estresse.
por
Laura Lima
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30/06/2022 - 12h

Por Laura Martins

O projeto gravida digital é um aplicativo destinado a identificar transtornos de ansiedade, depressão e estresse em mulheres grávidas. A ideia surgiu em 2020, pelos pesquisadores Hermano Tavares e Kelly dos Santos Prado, ambos médicos psiquiatras pela USP. Mas, só foi lançado no início de 2021 e está disponível pelas plataformas IOS e Play Store. Atualmente o projeto conta com 319 pacientes recrutadas, mas apenas 207 fizeram o download do app pois 112 voluntárias ainda não conseguiram instalar a plataforma por causa de dificuldades técnicas. 

A pesquisa está sendo desenvolvida pelo Instituto Nacional de Psiquiatria do desenvolvimento para a infância e adolescência (INPD), o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) e o Setor de Inovação e Transferência de Tecnologia (SITT), em parceria com os serviços de atendimento a gestantes com psicopatologia da Obstetrícia e do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, integrando-se a  um núcleo composto por outros três projetos: um pensando no monitoramento de transtornos mentais em mulheres no período neonatal, um focado no rastreio de transtornos mentais na infância e o último, na adolescência. 

A maioria das selecionadas são abordadas durante as consultas de pré-natal no instituto central do hospital das clínicas, em São Paulo. Podem ou não já estarem passando por um tratamento psicológico e psiquiátrico ou, sequer, terem suspeitas das doenças. Após as voluntárias aceitarem participar do  projeto, elas devem instalar o aplicativo chamado “DM Health” para que, através dele, se submetam a uma série de questionários sobre como elas estão se sentindo ao longo do dia. Tal procedimento é repetido semanalmente, junto a uma foto de rosto e um áudio. 

Essa tecnologia viabiliza o rastreio de transtornos psiquiátricos baseando-se em biomarcadores de voz, em expressão facial e utilização de metadados. O aplicativo também permite que o usuário agende uma consulta com um psiquiatra de forma remota ou presencial, sempre que achar necessário. Todas as grávidas que utilizam o app passam por uma avaliação com o que é considerado "gold standard” (ou, padrão ouro): uma ou várias consultas online com um médico psiquiatra. 

De acordo com os pesquisadores, no período perinatal, estima-se uma prevalência de 10-25% de depressão e 11-21% de transtornos ansiosos. Entretanto, apenas 20% das mulheres procuram tratamento e cerca de dois terços dessas pacientes não são diagnosticadas. O diagnóstico é mais difícil em grávidas, pois os sintomas presentes na gestação são parecidos com os de um quadro de depressão e ansiedade, como por exemplo cansaço, mudança de apetite, distúrbios do sono, diminuição da libido, dentre outros.

O estudante de medicina pela USP, Adrian Novelle, ingressou no projeto no início deste ano e explica que: "Um dos motivos das diagnosticadas não darem continuidade ao tratamento é, muitas vezes, a negação e o preconceito com o próprio diagnóstico psiquiátrico. Ainda há muito preconceito com transtornos mentais, as pessoas não querem tratamento, pois acham que só é tratado quem é louco e esse grupo populacional em específico (o de mulheres grávidas) é ainda mais vulnerável, já que a maioria não tem o amparo adequado de seus respectivos cônjuges ou familiares. 

No início de maio, o CFM (Conselho Federal de Medicina) regulamentou a telemedicina no Brasil. Assim, serviços médicos mediados por tecnologia podem ser feitos sem qualquer impedimento ou restrição. Segundo um estudo feito pela American Medical Association, 75% das visitas a serviços médicos regulares ou de emergência são desnecessárias, podendo ser feitas por telefone, chat, vídeo ou outras plataformas digitais. Adrian também reforça que, “Ao contrário do que se possa imaginar, o diagnóstico e tratamento online não é elitista. Na verdade, pode ser mais inclusivo do que se pensa, porque é muito mais fácil para pessoas que moram em regiões extremas terem acesso a um celular e a uma Internet, por mais que seja ruim, do que se locomover até um centro e hospital especializado. Então, ter a possibilidade de entrar em contato com  uma equipe de profissionais tão qualificados pela Internet, é uma alternativa bem interessante para quem tem dificuldade em acessar o serviço de saúde”. 

Após reunidos e trabalhados, os dados obtidos nas quatro pesquisas serão cruzados, gerando um monitoramento longitudinal de transtornos mentais desde a gravides até a adolescência. O pesquisador afirma que “ A gente vai ter um banco de dados gigantesco para poder incorporar a outras pesquisas. Um dos questionários que estamos aplicando é para a obtenção de dados sociodemográficos. Futuramente, a gente vai poder fazer o cruzamento desses dados e investigar se existe uma relação entre as tendências de mulheres grávidas que possuem transtornos mentais dependendo da classe social, da escolaridade, de onde moram e etc”. 

Atualmente, a plataforma DM Health é administrada pelo médico, psiquiatra e desenvolvedor Rodrigo Dias e sua equipe, por meio de um contrato previsto no orçamento. Adrian também afirma que, “A nossa intenção não é mercantilizar o app, mas é possível. Inclusive, há pessoas com essa intenção: o próprio desenvolvedor do software tinha a intenção de vender o app depois de comprovada a eficácia para empresas de convênio de saúde. Essas empresas têm muito interesse nesse tipo de trabalho, pois há um número expressivo de dados longitudinais coletados desde a gravidez até a adolescência… Vende bem.”

Atualmente, o projeto não tem data prevista para término, mas uma troca na empresa que administra a plataforma deve ocorrer em breve. Tendo em vista que o principal objetivo do projeto é definir se a tecnologia é eficaz para o rastreio de transtornos mentais, e não concentrar-se no tratamento de tais doenças, faz-se necessário atentar a utilidade do conjunto desses dados, para garantir que a pesquisa seja convertida em melhorias efetivas para o Sistema Único de saúde (SUS) e, não se torne mais uma ferramenta restrita aos convênios médicos. 
 

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Perda do pai ainda quando bebê, levou Laura Martins Paro a vivenciar importância da terapia como tratamento
por
José Pedro dos Santos
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30/06/2022 - 12h
Sessão de terapia Autora: zebradaa (Fernanda Bornancin)
Sessão de terapia zebradaa (Fernanda Bornancin)

Laura Martins Paro explica que a perda de seu pai quando ainda era bebê, acarretou um comportamento introvertido, apesar de ter diversos amigos na infância, além de achar que se não tivesse feito acompanhamento psicológico não seria quem é hoje. Segundo Ana Monteiro, mestre em linguística aplicada na PUC e psicanalista, a morte e o luto afetam cada um de uma forma singular e profunda, mas para a criança, essa perda pode ter consequências muito serias sem um acompanhamento.

Para a psicanalista, a importância da terapia de maneira geral está em permitir um melhor autoconhecimento, mas ao tratar sobre o luto, a possibilidade de ajudar na elaboração e compreensão da morte e a construção de um novo caminho sem a presença deste ente querido. A psicanálise e psicologia não são apenas para esse tipo de questão, podendo também atender pessoas que sofrem com outros tipos de problemas, como depressão e ansiedade e até mesmo pessoas que não são diagnosticadas, para ajudá-las a se entenderem melhor e controlarem melhor suas emoções e sentimentos.

A Psicanálise foi criada pelas ideias do médico Sigmund Freud, ela visa a procura do bem-estar do analisando a partir de uma série de introspecções que levam o mesmo a concluir e conseguir entender coisas de seu funcionamento por conta própria, partindo do auxílio de um psicanalista.

 

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A humanização proposta pelo voluntariado faz com que o hospital seja um ambiente mais confortável e acolhedor para pacientes internados ou em tratamento.
por
Sônia Xavier
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07/06/2022 - 12h

 

A atividade de Clown Care - cuidados com palhaços, em tradução livre - é uma prática de humanização hospitalar, na qual voluntários se vestem de palhaços e tentam de forma lúdica distrair pacientes da realidade carregada de estresse, ansiedade e melancolia dos hospitais. Conforme a história do movimento, a prática de palhaços-doutores teve início na década de 60, com participação do médico norte americano Hunter Adams - o Patch Adams -, que teria sido o primeiro a entrar num ambiente hospitalar vestido de palhaço a fim de levar alegria a pacientes que passavam dificuldades psicológicas e físicas por conta das suas enfermidades. 

O próprio Adams passou por um período de grave crise depressiva, logo após a morte do pai, chegando a se internar numa clínica psiquiátrica, percebendo assim que “o riso, a alegria e a criatividade são parte integrante do processo de cura” (The Gesundheit Institute). Em 1971, com ajuda de amigos, acaba fundando o Instituto Gesundheit para abordar todos os problemas de saúde em um único modelo. 

No Brasil o primeiro grupo de Clown Care foi o “Os Doutores da Alegria” criado pelo brasileiro Wellington Nogueira, em 1991, inspirado pelo projeto similar do qual participava em Nova Iorque - a Clown Care Unit . Hoje em dia são várias as instituições sem fins lucrativos que utilizam a arte do palhaço para desmistificar tratamentos e levar conforto a pacientes em situações sensíveis. O uso da dramaticidade e do improviso tenta reduzir o estresse e a ansiedade provocada pela rotina hospitalar, buscando aliviar e dar conforto psicológico e social para essas pessoas.

O simples fato de se caracterizar já atrai um novo olhar sobre o voluntário. Abgail Menezez, voluntária pelo Instituto Nenex desde 2019, relata a sensação de entrar como palhaço no ambiente hospitalar "Quando você entra num hospital sem estar caracterizado, as pessoas mal te olham, mas quando você se caracteriza todos te olham e geralmente abrem um sorriso, então o nariz de palhaço te dá liberdade pra falar com as pessoas, brincar”. 

Voluntários caracterizados de palhaços
Atendimento com voluntários caracterizados. (Foto: arquivo pessoal)

O voluntário coloca à disposição do paciente o prazer de rir, fazendo com que se sinta acolhido, o que para o psicoterapeuta Árlon Miqueias pode  fazê-lo acreditar mais na cura. Tal posicionamento também é partilhado pelo professor e psicólogo Claudinei Affonso, que acredita na mudança da postura perante o tratamento e, ademais, nas relações entre todos os atores que partilham do espaço, como médicos e acompanhantes. Para ele, "algumas intervenções auxiliam na forma como o paciente reage diante do tratamento, outras, ajudam na recuperação e, outras, resgatam a dignidade e identidade perdida em uma internação ou nos modos de tratamento”.

As ações também acrescentam muito na vida do voluntário. Abgail relata que acha o voluntariado muito gratificador: “É muito gratificante você chegar perto de uma criança, fazer bolinha de sabão e na hora ela parar de chorar, ou a enfermeira te chamar pra distrair a criança enquanto aplica a medicação, ou mesmo, colocar as senhorinhas pra dançar. Eu fico com uma sensação de que sirvo pra alguma coisa, mesmo que seja uma palhaçada, risos”. 

Menezez revela que na sua vivência, os adultos lhe parecem mais fragilizados e carentes. Ela acredita que como as crianças geralmente estão acompanhadas ou com brinquedos, elas se distraem com mais facilidade. Os adultos geralmente se sentem mais sozinhos: “ Às vezes, você quer sair do quarto e eles querem continuar conversando, isso é muito legal”. Com a ajuda desse mundo lúdico eles distraem e fazem com que o processo fique um pouco menos doloroso e como é uma atividade sem fins lucrativos é fácil sentir o carinho e o cuidado dos voluntários para com os pacientes “Eu quando estou sem o nariz sou uma pessoa, quando coloco o nariz sou outra. E o legal é que qualquer brincadeira que fizermos se não der certo não tem problema porque a gente é palhaço, se a gente canta e desafina não tem problema, a gente é palhaço”, ressalta Abgail. 

Voluntários caracterizados de palhaços
Palhaços em visita à hospital.(Foto: arquivo pessoal)

Dessa forma os doutores- palhaços têm auxiliado na recuperação de enfermidades físicas e mentais das pessoas, se preocupando com o bem estar delas num ambiente muitas vezes pesaroso. Levando a arte aos outros com amor e, claro, muito bom humor. 

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