Acompanhe como foi a primeira mesa do evento , realizado no Tucarena, teatro da PUC-SP
por
Beatriz Alencar Gregório
João Pedro Lopes Oliveira
Geovana Bosak Santos
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15/03/2024 - 12h

Na quarta-feira (13), a Agência Pública celebrou seus 13 anos de jornalismo investigativo no Tucarena, em Perdizes, em  parceria com o   curso de Jornalismo e a Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes da PUC São Paulo. O evento "Pública 13 anos: O jornalismo na linha de frente da democracia", contou com três mesas de debate ao longo do dia, reunindo nomes ilustres do jornalismo, da antropologia e do clima. A comemoração discutiu temas como a desinformação, a crise climática e a defesa da democracia.

A primeira mesa, com o tema “Desinformação e Populismo Digital”, foi mediada por Natalia Viana, co-fundadora e diretora executiva da Pública, ela também se graduou em Jornalismo na PUC e mencionou a escolha da universidade para sediar o evento. Segundo ela, “a democracia é a cara da PUC”. Como convidadas, juntaram-se à mesa a antropóloga Leticia Cesarino e a pesquisadora Nina Santos para discutir as ondas de desinformação, a regulamentação da inteligência artificial e o poder das big techs e algoritmos nos sistemas de informação.

Ao final da discussão, também foram abertas perguntas ao público. Geovana Bosak, estudante de jornalismo perguntou: "Como você vê o futuro do jornalismo em um ambiente que está cada vez mais dominado pela manipulação dos algoritmos e pela desinformação?"

Nina Santos:

"O jornalismo está passando por um momento de transformação, porque de fato a economia da atenção, que é o rege o funcionamento das plataformas digitais, acaba mudando muito até a forma de acesso das pessoas ao jornalismo. O que a gente vê nas últimas pesquisas é que as pessoas acessam cada vez mais o conteúdo jornalístico através das plataformas. Ao invés de entrar diretamente nos veículos, elas entram nas plataformas digitais, que são espaços de informação e também de entretenimento, e através dessas plataformas que elas acabam se informando sobre o que tá acontecendo, o que é importante, e sobre o quê que elas precisam agir".

A Agência Maurício Tragtenberg esteve presente na primeira mesa de discussão "Desinformação e Populismo Digital", e gravou um vídeo de cobertura. Para conferir, acesse: 

https://www.instagram.com/reel/C4icdfIOyQo/utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==

 

Como a adesão do sistema de videomonitoramento no Brasil representa a falência da segurança pública
por
Gabriela Figueiredo
Victoria Leal
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27/11/2023 - 12h

Por Gabriela Figueiredo e Victoria Leal 

"Estão criando uma polêmica em algo que a gente já construiu, um sistema que muitas cidades já desenvolvem, que no metrô tem, em vários locais tem, é como se fosse algo muito inovador e na verdade estamos atrasados. São Paulo está correndo atrás de um prejuízo". Ricardo Nunes, prefeito da cidade de São Paulo, sobre o sistema de videomonitoramento Smart Sampa.

O Smart Sampa é o novo sistema de videomonitoramento da cidade de São Paulo, que iniciou, na segunda-feira (7) de agosto de 2023, a instalação de 20 mil câmeras inteligentes de segurança, que integram a tecnologia de biometria facial, com serviços públicos da cidade, para monitoração em tempo real da população. 

O sistema funciona unindo informações captadas dos rostos dos cidadãos pelas câmeras de segurança distribuídas pela cidade, com o banco de dados do sistema de segurança pública da região, para identificar, principalmente, pessoas que cometem infrações, mas segundo prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes, a monitoração será utilizada em união com outros órgãos, para identificar possíveis acidentes e chamados voltados para políticas públicas.

O prefeito explicou ainda que “tem que ter mais de 90% de similaridade na biometria facial [para iniciar uma operação de busca] e não teremos a transmissão automática às forças policiais quando for detectado alguém que seja, por exemplo, um procurado da Justiça. Ele vai passar ainda por um comitê integrado à Controladoria Geral do Município para a análise antes do envio”.

A decisão do consórcio que cuidará do sistema passou por um pregão eletrônico, que contou com a participação de 12 empresas, em que o contratado foi o Consórcio Smart City SP, formado pelas empresas CLD – Construtora, Laços Detentores e Eletrônica LTDA, Flama Serviços LTDA, Camerite Sistemas S.A. e PK9 Tecnologia e Serviços LTDA, com previsão de instalação das câmeras em 18 meses, por um custo mensal de R$ 9,8 milhões.

 

HISTÓRICO

O sistema de videomonitoramento já tem seu histórico no Brasil, com instalações no Rio de Janeiro e Bahia. Em uma pesquisa publicada em novembro deste ano, pela Rede de Observatórios da Segurança - grupo criado em maio para coletar indicadores que não são divulgados oficialmente - de março a outubro, foram detidas 151 pessoas com o uso de tecnologias de reconhecimento facial, sendo 52% dos casos na Bahia, 37% no Rio de Janeiro e 7% em Santa Catarina.

A organização não oficial levantou os dados usando reportagens de veículos de imprensa, páginas das polícias e de outras organizações e órgãos nas redes sociais. Ainda, segundo a pesquisa, o perfil das pessoas presas segue a tendência da população carcerária, sendo 90% das pessoas negras, 88% homens, com idade média de 35 anos e com abordagens por tráfico de drogas e roubo.

E é aqui que o histórico passa a ter seu contrapeso na implementação da tecnologia. Em um primeiro teste executado durante os quatro dias de Micareta, em Feira de Santana, Carnaval fora de época que acontece no município próximo a Salvador, mais de 1,3 milhão de pessoas tiveram seus rostos captados e 903 chamados foram gerados, mas apenas 33 mandados de prisão foram cumpridos.

No Rio de Janeiro, uma mulher e um homem foram detidos por engano em Copacabana, em julho, com acusação de homicídio, em que, no processo de investigação do caso, foi descoberto que a procurada já estava na prisão havia 4 anos.

A professora do Programa de Tecnologias Inteligentes e Design Digital (TIDD) PUC SP, Dora Kaufman, explica que "o reconhecimento facial é uma das aplicações da técnica de aprendizado de máquina, subcampo da inteligência artificial", a aplicação serve para diversas atividades, desde reconhecimento de imagens em pesquisas no Google até biometria facial, em que o algoritmo aprende com base exemplos extraído de dados.

No caso da biometria facial, um dos obstáculos é processo de reconhecimento do rosto, que não chega à precisão completa. O cálculo acontece a partir da distância entre alguns pontos do rosto e comparação com o banco de dados. Quando um certo grau de semelhança é emitido, o alerta é direcionado.

A professora ainda aponta que “existem estudos de ONGs indicando que mais de 20 secretarias de segurança de cidades brasileiras estão usando esses sistemas, com falhas significativas. O problema é alguém ser reconhecido equivocadamente, ou seja, ser preso sem ter incorrido em nenhum crime simplesmente porque o sistema falhou”.

 

O CICLO SE REPETE

Com 90% de identificação da população preta em alvo do sistema e uma das maiores porcentagens da instalação de câmeras na zona mais rica da cidade - 3.300 câmeras na região central, 6 mil na Zona Leste, 3.500 na Oeste, 2.700 na Norte e 4.500 na Sul -

Amailton Azevedo, professor do Programa de Estudos Pós-graduados em História e do Departamento de História da Faculdade de Ciências Sociais da PUC-SP, aponta que "trata-se de outros mecanismos para renovar e sofisticar o racismo made in Brazil. Se há a tese de que considera o racismo brasileiro se manifesta de modo silencioso e velado, de outro, pode-se defender que políticas de segurança como essas tornam explícitas as soluções brancas para problemas negros e mestiços".

O prefeito Ricardo Nunes afirmou ainda que “quem tem que estar preocupado é quem fez alguma coisa contra a lei, mas quem não tem nada contra a lei, fique despreocupado. Alguém que fez algo contra a lei, alguém que traz transtorno para a sociedade, acho que essas pessoas têm que estar preocupadas”.

Em uma alusão com o mundo real, o anime japonês “Psycho-Pass” mostra, ainda no primeiro episódio, como o sistema de monitoramento por inteligência artificial pode ser falho a ponto de pôr em risco a vida da população que “não tem nada contra a lei”. O episódio apresenta um medidor de “potencial de criminalidade”, monitorado pelo Estado, que após atingir certos estágios, pode levar a prisão ou execução.

Após sofrer um trauma por tentativa de abuso, a personagem vítima tem seu psycho-pass elevado a nível de execução, mesmo sem nunca ter apresentado qualquer sinal natural do “potencial de criminalidade”.

Sendo 90% de potencial de identificação do sistema de monitoramento ou 90% dos alvos sendo pessoas pretas, a falta de precisão do Smart Sampa e de qualquer outro sistema vira mais um agravante para um problema estrutural da sociedade.

 

IMAGEM DE CAPA: Reprodução Portal Outras Palavras

Qualidade da água do rio continua muito ruim, mas margens recuperadas já trazem benefícios para a população
por
Lucas Gomes
Matheus Marcolino
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21/11/2023 - 12h

Por Lucas Gomes (texto) e Matheus Marcolino (audiovisual)

 

Jhonatan Barbosa cresceu e passou grande parte de sua vida adulta em Cidade Tiradentes, extremo da Zona Leste de São Paulo. O dia a dia na periferia não era fácil. Ele começou a trabalhar aos 14, em buffets nas festas dos ricos do centro da capital. Já que a rotina de horas e horas dentro do transporte público era extremamente desgastante, sonhava em viver em um grande centro. E esse sonho é antigo: quando criança, nos anos 1990, sua mãe costumava levá-lo a um consultório médico na avenida Paulista. No caminho, passavam por hospitais e grandes monumentos da cidade, além da Marginal Pinheiros, que margeia o rio. Ele via os prédios na região da Vila Olímpia com espanto. Parecia uma outra realidade. 

Em 2019, Jhonatan conheceu sua atual esposa. Na época, ela morava numa kitnet em Santo Amaro, Zona Sul da capital. Com o início da pandemia, em 2020, ele decidiu se mudar para lá. O sul oferecia a Jhonatan o que o leste não tinha: além de conseguir morar perto do trabalho, agora ele e a companheira tinham opções de lazer, como as margens do Rio Pinheiros, que vive um processo de despoluição há quatro anos. Inaugurou-se um programa de casal: andar de bicicleta, caminhar, ou até mesmo fazer yoga no recém-inaugurado Parque Bruno Covas. Criou-se uma relação com um rio que estava morto.

O Rio Pinheiros sempre fez parte da história de São Paulo. Ele foi navegável até o início do século passado, quando o interesse do setor energético impulsionou uma mudança: o curso do Pinheiros mudou, e o rio passou a correr em direção à represa Billings, construída para servir como um reservatório para geração de energia hidrelétrica. Nos quase 100 anos que se passaram desde então, o Pinheiros foi um dos rios mais violentados pela população e pelo poder público, e se tornou sinônimo de sujeira, mau cheiro e descaso.

Em 2019, João Dória, então governador do Estado de São Paulo, fez uma promessa bastante ambiciosa: despoluir o Rio Pinheiros até o fim de 2022. O programa “Novo Rio Pinheiros” previa o investimento de mais de R$ 1,5 bilhão, que focaria no tratamento de esgoto para impedir que lixo e dejetos continuassem chegando ao rio. 

O mapeamento “Observando os Rios”, da ONG SOS Mata Atlântica, acompanha a situação do Rio Pinheiros e dá uma nota para a qualidade da água em três pontos de medição: Ponte João Dias, Ponte do Jaguaré e Ponte da Cidade Jardim. Desde o início do monitoramento mensal, em agosto de 2021, somente em duas vezes os pontos de medição não receberam a nota mínima (péssimo): em outubro de 2021, João Dias recebeu nota “ruim”, sendo o mesmo caso da Ponte Cidade Jardim, em janeiro deste ano. 

César Pegoraro, biólogo e integrante da Equipe de Água da SOS Mata Atlântica, conta que, passados quatro anos desde o início do programa Novo Rio Pinheiros, os avanços são inegáveis, mas a situação segue calamitosa. Foram registradas 650 mil ligações de domicílios à rede de esgoto, diminuiu-se a carga orgânica do rio, mas o estado da água do Pinheiros ainda é horrível. “A gente ressuscitou um rio e conseguiu devolver esse rio à UTI. Ele não é um rio saudável”, explica.  Na visão de César, João Dória cometeu um erro ao estipular uma data de entrega, já que a natureza tem um tempo próprio - e, às vezes, resultados concretos podem demorar a chegar.

A principal métrica usada no mundo para medir a limpeza de um rio é a de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio). Ela determina quanto oxigênio é consumido em cada litro de água por causa da poluição. Em 2022, a gestão Dória afirmou que a meta estava sendo cumprida. “Dos 13 pontos de monitoramento do rio, 11 já apresentaram o chamado DBO abaixo de 30 mg/L, quantidade mínima para que a água não tenha odor, melhore a turbidez e permita vida aquática”, relata, em nota, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (SEMIL) do Governo do Estado de SP. 

José Carlos Mierzwa, chefe do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica (POLI) da USP, conta que um DBO de 30 mg/L não é o ideal para um rio vivo. Segundo ele, para que haja vida aquática é necessário um DBO na faixa dos 5 mg/L. O projeto de despoluição é coordenado pela SEMIL-SP e conta com participações da Sabesp e da Cetesb. 

Os órgãos e empresas citadas foram procurados, mas não responderam até o fechamento da reportagem. 

O CHEIRO 

Jhonatan conta que sentiu uma melhora no odor vindo do rio Pinheiros durante os últimos anos. O cheiro não incomoda seu trajeto para o trabalho ou quando ele sai com sua companheira para caminhar no Parque Bruno Covas, por exemplo. Na estação Cidade Universitária, da Linha 9-Esmeralda, porém, a história é outra: um odor forte de esgoto é notado pelos usuários do transporte público. A estudante Ana Carolina diz que o cheiro se intensifica em dias de chuva ou de calor, que estão se tornando cada vez mais comuns na capital.

Pegoraro explica que as diferenças entre os diferentes pontos do rio se dão pelos muitos afluentes do Pinheiros e do processo de saneamento nas regiões atendidas por eles. Enquanto nos arredores do Parque Bruno Covas o rio é mais verde e o tratamento de esgoto é localizado e avançado, regiões como a da estação Cidade Universitária ou do Parque Villa-Lobos sofrem para tratar grandes quantidades de esgoto. Os rios Pirajussara e Jaguaré, principais afluentes dessas localidades, ainda têm uma carga orgânica maior - o que acaba deixando o cheiro mais forte.

A IMPORTÂNCIA DO RIO

Um rio vivo impacta a comunidade de seu entorno de muitas formas, mas duas são as mais destacáveis. O primeiro - e mais imediato - aspecto é o da oferta de lazer. O Rio Pinheiros, por exemplo, teve suas margens revitalizadas, e pessoas como Jhonatan e outros moradores da Zona Sul ganharam uma nova opção de convívio com a família, amigos e natureza, mesmo que nem todo ambiente esteja próprio para isso. A despoluição de rios é uma boa oportunidade para o setor de turismo, e o caso do Rio Sena, na Europa, chama atenção: antes tido como “morto”, o canal francês agora é favorito a receber competições de natação nas Olimpíadas de Paris, em 2024.
 

O segundo aspecto impactado por um rio vivo é a saúde física e mental da população. A baixa qualidade da água dos rios vem, principalmente, do mau tratamento de esgoto - que afeta especialmente os mais pobres. Um relatório da OMS, divulgado em 2013, apontou que cada dólar investido em saneamento gera 4,3 dólares de economia na saúde global. “Saneamento é qualidade de vida e saúde pública”, afirma José Carlos Mierzwa, que acredita que o investimento do poder público nesse sentido é extremamente necessário.

A saúde mental também não fica para trás. Publicado em 2010, um estudo da Universidade de Chiba (JAP) aponta que a convivência com áreas verdes reduz o estresse e a pressão arterial. “Teríamos muito mais saúde se tivéssemos rios mais limpos. (...) Ajudariam muito a melhorar a saúde mental das pessoas e a diminuir a violência urbana”, aponta Pegoraro. 

Apesar dos avanços tímidos nos quatro anos do Novo Rio Pinheiros, o poder público e a sociedade civil devem continuar engajados no processo de recuperação do rio. Assim, quem sabe, o próximo passo pode ser tirar o Pinheiros da UTI.
 

Como a falta de regulamentação das plataformas digitais modula o comportamento civil e estatal
por
Amanda Tescari
Fernanda Querne
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12/11/2023 - 12h

Por Amanda Tescari (texto) e Fernanda Querne (audiovisual) 

 

A modernização contínua das sociedades atuais a partir dos avanços tecnológicos alavancou diversos questionamentos acerca dos rumos da coletividade. No âmbito político, o neoliberalismo se alia ao fator tecnológico, formando uma nova forma de enxergar a realidade que nos cerca: a tecnocracia. Essa sistemática se dá com base na credibilidade da atuação do Estado alicerçada no conhecimento técnico enquanto verdade científica, de modo que esta se mistura com a ideologia política.    

Por mais que esteja vestido sob os trajes de neutralidade, este estudo teórico continua submetido à estrutura mercadológica, sujeito aos interesses de quem a controla - as big techs - razão pela qual é de grande importância a regulamentação do meio digital, viabilizando uma maior segurança dos dados e informações fornecidos online. 

 É possível entender a virada tecnológica feita pelas grandes corporações a partir do livro “A cidade Inteligente: Tecnologias urbanas e democracia”. Os autores são Evgeny Morozov e Francesa Bria. Morozov publicou Big Tech: a ascensão dos dados e  a morte da política. Já a edição de 2018 da Forbes citou Bria como uma das cinquenta mulheres mais influentes da Tecnologia pelos seus projetos focados em democracia digital. 

O livro explica como o neoliberalismo faz parte do conceito das cidades inteligentes, as quais continuarão buscando soluções digitais corporativas - em especial das plataformas digitais, dando magnitude aos nossos dados a partir dos sistemas algoritmos - lugares de controle e modulação de comportamentos. Surge então o questionamento sobre a ideia de neutralidade tecnológica e modernização constante. Isso porque as smarts cities se beneficiam deste tipo de governo, no qual a sua administração passa por uma descentralização. Assim, mesmo tendo que seguir alguns dispositivos regulatórios de governança, há uma ausência  de regulamentação das plataformas. 

 

                                           

                                            Legenda: Carro elétrico em Yokohama, Japão Foto: Smart Cities World

 

No universo das redes sociais, essa regulação também assume um papel primordial. Isso porque, em razão da rapidez exacerbada inerente aos tempos atuais, os indivíduos acabam por experienciar cada vez mais a sensação de pressa e inquietação. Decorrente disso, as redes sociais acabam por ocupar um papel de “poupar” o nosso tempo, e dentro deste contexto, tornam-se o meio mais prático de observar e compreender o que está acontecendo no mundo. 

Sobre o tema, o professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) Marcus Bastos opina, dizendo sobre a importância do regulamento das redes sociais, já que estas se transformam em um vetor dominante da construção do imaginário das pessoas e podem ser extremamente problemáticas em função da polarização, discursos de ódio e das fake news.

Não apenas ele, o advogado especializado em direito digital Bruno Bícego também destaca a importância da regulação dos ambientes online. Atuando de maneira próximo ao universo aqui elucidado, ele evidencia a questão sob seu aspecto político, enfatizando que a regulamentação em nada se confunde com o impedimento da liberdade de expressão, direito assegurado aos cidadãos brasileiros. 

Ao contrário disso, Bruno ainda expõe, em uma conversa realizada também digitalmente, sobre como a regulamentação precisa visar responsabilizar estas big techs, que atuam promovendo e investindo em campanhas em massa de propagação de fake news, de discurso de ódio ou até manipulação da opinião pública e de processos eleitorais e, consequentemente, colocando em risco a nossa democracia. 

A questão política resta, então, cada vez mais sensível dentro deste cenário. Os nossos dados são valiosos para o algoritmo e, dentro de um ciclo quase que interminável, os conceitos de informação e propaganda política se misturam na formação da opinião pública. Através da coleta e análise de dados de maneira extremamente personalizada, é possível delimitar perfis cada vez mais assíduos dos usuários, o que faz com que as grandes corporações estejam até mais íntimas de cada indivíduo do que eles mesmos. 

Para o professor, isso implica numa grande capacidade de manipulação em termos de marketing ou propaganda política. Durante a conversa, ele versa também sobre o fenômeno da pós -verdade e das fake news, destacando que, inicialmente, a pós verdade surge no sentido de derrubar narrativas que expliquem o mundo de forma absoluta. 

Contudo, a disputa de narrativas leva a uma dificuldade de encontrar consensos objetivos sobre muitas coisas - inclusive, às vezes, sobre fatos nomeadamente incontroversos. Com o algoritmo cada vez mais direcionado aos próprios interesses de cada um, torna-se mais palatável acreditar em tudo aquilo que aparece em nossos feeds, e, desta maneira, a checagem dos fatos torna-se cada vez mais acessória no processo de consumo e compartilhamento de informações. 

Conforme as pessoas ficam cada vez mais restritas a seus círculos e bolhas, essa dinâmica se acentua, pois elas perdem o acesso ao contraditório, fazendo com que se tornem cada vez mais convictas de suas visões de mundo. A discussão acerca da importância da regulação das redes sociais é de suma importância nessa geração tão tecnológica. No Brasil, entre as discussões no Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, o debate sobre o tema aguarda os próximos capítulos para que tenha seus detalhes mais bem delineados. 

 

 

Estudo comandado pela NewsGuard aponta que 20% das buscas na plataforma trazem desinformação
por
Sophia Pietá Milhorim Botta
Isabella Santos
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06/11/2023 - 12h

Após o sucesso estrondoso da rede social chinesa Tiktok, durante a pandemia de Covid-19, a plataforma ultrapassou seu posto de postagens de danças, entretenimento e brincadeiras para uma rede em que as fake news e a disseminação de conteúdos ofensivos e mentirosos dominaram os perfis dos usuários. Desde desinformações sobre política, cultura, ciência e até sobre a manipulação de vozes e imagens através da inteligência artificial. Um caso recente foi a recriação da voz do ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama se defendendo de uma nova e explosiva teoria da conspiração sobre a morte repentina de seu ex-chefe de cozinha, em uma falsificação convincente para criar narrativas falsas na internet. “Embora eu não consiga compreender a base das alegações feitas contra mim, peço a todos que se lembrem da importância da união, da compreensão e de não se precipitar em julgamentos”, diz a voz. 

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop), em 2023, apontou para uma preocupação entre os jovens: a desconfiança na ciência. E um dos grandes motivos seria a forte propagação de fake news nas redes sociais, principalmente no TikTok. Por meio de vídeos rápidos, com muita imagem, áudios e legendas claras, usuários que não se identificam e criam perfis sem nomes reais, disseminam uma série de conteúdos falsos, utilizando de imagens adulteradas e inverdades para convencer o público, principalmente os jovens que ainda estão em formação estudantil. A “Geração Tik Tok”, como ficou conhecida, se torna refém, uma vez que elas nascem sabendo mexer nos celulares, computadores e são experts nas redes sociais. Isso faz com que esses jovens se informem somente das plataformas digitais, não leem um livro, jornal ou revista, todo o conhecimento deles vem das informações expostas nessas plataformas em que as fake news e teorias da conspiração dominam os conteúdos.

Um exemplo é o atual conflito de Israel X Hamas, que dominou a internet e o Tiktok vem sendo acusado de espalhar desinformação e conteúdos ilegais em sua plataforma. Vídeos de outras guerras antigas, áudios de outros conflitos e informações falsas sobre a cultura desses povos são espalhados rapidamente tendo um alto alcance em todo o mundo. Recentemente um comentarista político francês Jackson Kinkle fez uma postagem via Twitter alegando que estaria acontecendo protestos na França Pró-Palestina compartilhando um vídeo que alegava ser o protesto. Após internautas checarem a veracidade, foi constatado que o vídeo se tratava da torcida do time brasileiro de futebol Palmeiras em uma comemoração durante um partida contra o Boca Juniors. 

Após casos de fake news, preconceito cultural e muita desinformação, o comissário europeu Thierry Breton enviou uma carta direcionada ao CEO da plataforma, Shou Zi Chew, em que o Tiktok teria 24 horas para remover conteúdos irregulares divulgados na plataforma ou deverá arcar financeiramente com multas. Segundo Breton, a rede social deve ser “oportuna, diligente e objetiva” na remoção de informações erradas. “Em primeiro lugar, dado que a sua plataforma é amplamente utilizada por crianças e adolescentes, você tem uma obrigação especial de protegê-los de conteúdo violento que retrata a tomada de reféns e outros vídeos explícitos que supostamente circulam amplamente na sua plataforma, sem as devidas salvaguardas”, escreveu Breton.

Por se tratar de uma plataforma 100% gratuita e que proporciona um alto alcance e monetização aos usuários que tiverem seus vídeos viralizados, o sensacionalismo acaba dominando os conteúdos. Através de imagens explícitas, efeitos de voz, sonoplastia e pouca fiscalização, o deep fake publicado alcance pessoas ao redor do mundo de diferentes idades, fazendo com que segundos se torne fatal para a desinformação generalizada.

Segundo um estudo da NewsGuard, empresa de segurança dos Estados Unidos, 20% das buscas no Tiktok trazem desinformação. O estudo do “pesquisar” do aplicativo foi constatado que dos 540 vídeos analisados, 105 foram classificados como conteúdos contendo informações falsas. Executivos do Google reconheceram o Tiktok como mecanismo de busca padrão da Geração Z, esse fato explica a falta de informação verdadeira propagada pelos jovens. 

 

Como Byung-Chul Han explica a onda que causou a demissão do treinador e a crise no movimento que marcou o século XX
por
Fernando Muro Schwabe
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06/11/2023 - 12h

Contratado no dia 21 de abril de 2023, o treinador brasileiro Alexi Stival, o Cuca, chegava ao Corinthians após a demissão do técnico Fernando Lázaro. Com um passado "obscuro", Stival foi contratado sob protestos não só da torcida do Corinthians, mas até mesmo de torcedores rivais. Acusado de estuprar uma garota de 13 anos em 1987, quando era jogador do Grêmio Football Club Porto Alegrense, em uma excursão do clube gaúcho à Alemanha, Cuca nunca pagou pelo crime. Depois de mais de 25 anos, Cuca voltou a ganhar notoriedade no futebol brasileiro. Agora como treinador, o brasileiro liderou o Clube Atlético Mineiro a sua primeira conquista da Copa Libertadores da América, em 2013. Na época, poucas pessoas tinham conhecimento do episódio de 1987, permitindo com que o Alexi tivesse sua passagem por Belo Horizonte quase que despercebida por seus atos. 

Cuca no GALO
Reprodução/Clube Atlético Mineiro

Três anos após liderar o Galo ao título da América, Cuca é contratado pela Sociedade Esportiva Palmeiras com o objetivo de liderar a equipe a conquistar o campeonato brasileiro, conquista que não vinha à sala de troféus do clube paulista desde 1994. Mais uma vez com pouca ciência da população e protestos quase que isolados nas redes sociais, Stival saiu do clube mais uma vez impune por seus atos passados. Depois de algum tempo fora dos holofotes, Cuca leva o Santos Futebol Clube à final da edição de 2020 da Copa Libertadores da América, cuja a equipe da baixada foi derrotada pelo Palmeiras por 1 a 0. No ano seguinte, ele volta ao Atlético Mineiro e lidera o clube a conquista do Campeonato Brasileiro, depois de 50 anos de seca, e da Copa do Brasil, sete anos após o último título do clube. Alegando problemas de saúde, o treinador deixou o cargo no final da temporada. Apesar do sucesso, a evolução das redes sociais e do conhecimento do caso de 1987 pelos apaixonados pelo futebol aumentou, e pela primeira vez, Cuca viu a pauta voltar a ser parte de sua vida. 

Foi quando, em abril de 2023, o Corinthians, após demitir Fernando Lázaro, contratou Cuca. Conhecido por ser um clube abertamente ligado a causas sociais e democráticas, o Timão deu "um tiro no próprio pé" ao assinar com o treinador. Não demorou muito para que as manifestações contra o vínculo recém assinado acontecessem. Menos de 30 minutos após o anúncio, era possível ver centenas de pessoas na porta do Centro de Treinamento Joaquim Grava protestando contra o novo treinador e o presidente Duílio Monteiro Alves. 

Cuca apresentado no Corinthians
Rodrigo Coca / Agência Corinthians

Cuca estreou no comando técnico do Corinthians diante do Goiás. A partida em Goiânia colocou em cheque todo o legado da famosa e histórica Democracia Corinthiana, movimento que lutou contra a Ditadura Militar, entre os anos de 1982 e 1984, liderada pelo Doutor Sócrates e companheiros de equipe. Na ocasião, o clube paulista foi derrotado pelo esmeraldino por 3 a 1. Na quarta-feira (26), o Corinthians tinha uma missão complicada. Reverter a dura derrota contra o Remo-PA por 2 a 0 era uma missão complicada dentro de campo, e com os milhares de protestos nas redes e arquibancadas, o Corinthians teria mais um adversário: a relação entre Cuca e o torcedor. 

Com gols de Adson e Roger Guedes, o Corinthians conseguiu empatar o confronto no último lance do tempo regulamentar. A equipe paulista conquistou a vaga às oitavas de final da Copa do Brasil nos pênaltis. Na entrevista coletiva, Cuca anunciou, uma semana após assumir o cargo, que não era mais o treinador do Corinthians. Alexi também revelou que os atletas não apoiaram a decisão do profissional e queriam que ele permanecesse no clube. A relação, inclusive, gerou protestos da equipe feminina do Timão, que fez publicações nas redes sociais contra Cuca. Em setembro de 2021, o Corinthians, em parceria com a Nike, lançou a campanha "Respeita as Minas". Após a contratação de Cuca, a equipe se sentiu "atacada" pela diretoria do clube e pela falta de luta pelos direitos das mulheres. 

Nota publicada pelo elenco feminino do Corinthians
Nota publicada pelo elenco feminino do Corinthians - Foto: Reprodução

A situação foi um ataque, não só ao legado da Democracia Corinthiana, mas a tudo que o clube acreditou e construiu durante seus 113 anos de história. Segundo o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, que nunca veio ao Brasil, mas por meio do seu livro "Infocracia", a demissão do técnico pode ser explicada por uma crise geral da democracia, devido à evolução das redes. Para Han, a “nuvem” expõe apenas aquilo que o usuário gostaria de ver através do algoritmo, mas tem o poder de manipular o que o usuário recebe, que pode ser utilizado para mudanças de opinião. Entretanto, quando assuntos, principalmente delicados, deixam sua “bolha”, as reações nas redes são inúmeras. No caso de Cuca, a esmagadora maioria pedia que o treinador cumprisse um período na prisão, enquanto uma breve minoria pedia para que a história fosse deixada no passado. 

O novo dilema das redes, que controla e consegue até mesmo “mudar” resultados de eleições presidenciais, como foi no caso das fake news na eleição de Donald Trump, em 2016, tem o poder de expandir informações e histórias para diferentes grupos, que, teoricamente, não receberiam essas mensagens por não fazerem parte da “bolha”.  Em entrevista para a AGEMT, o torcedor do Corinthians Bruno Spade afirmou que foi contra a contratação do treinador e afirmou que o acordo “manchou tudo aquilo que o Corinthians lutou e prezou desde os primeiros anos de sua história”. O jovem de 18 anos também disse que torceu para a equipe ser eliminada pelo Remo na Copa do Brasil e que não comemorou a classificação: “Pela primeira vez torci para que o meu time fosse amassado, que a gente não conseguisse se classificar pra esse pesadelo acabar logo”. 

Para Bruno, a decisão de Cuca rescindir com o Timão aconteceu pelos grandes protestos na porta do centro de treinamento e pelas redes sociais: “ Acredito que se não fossem os protestos tanto no CT, quanto nas redes sociais, ele teria continuado no Corinthians. Ainda bem que a torcida abraçou as causas que o clube sempre defendeu e conseguiu tirá-lo em uma longa e dolorida semana para o apaixonado pelo Timão”. Como ensina Han, a forte mudança do comportamento das manifestações públicas das mídias sociais permite que a sociedade seja manipulada pelo algoritmo, mas que também possa usá-la para trazer justiça a quem mereça. 

A guerra entre Israel e Hamas acentuou uma das maiores problemáticas da tecnologia
por
Ian Valente
Rodolfo Dias
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31/10/2023 - 12h

Por Ian Valente (texto) e Rodolfo Dias (audiovisual)

Capadócia, o Red Canyon, o Mar Morto e as cachoeiras Tortum são alguns pontos de alto valor que facilmente se acha em agências especializadas em turismo, estas regiões tem algo em comum, são todas encantos estonteantes do oriente médio. As infinidades de desertos e regiões áridas dão uma coloração avermelhada que não se assemelha a nenhum outro lugar no mundo. Porém, estas belezas são ofuscadas pelo "calor" politico que se instaura a quase um século, que marca e denuncia conflitos que estigmatizam muitos países ricos e exuberantes. O destaque fica entre Israel e o grupo palestino, Hamas protagonizam tais situações que necessitam cuidado e atenção.

A relação conflituosa tem raízes históricas complexas que surgiram desde a proclamação da república de Israel apoiada pelos EUA. No entanto, um dos momentos-chave que marcou o início de uma série de conflitos significativos ocorreu em 2006, com as eleições legislativas palestinas e a subsequente tomada do controle da Faixa de Gaza pelo Hamas em 2007. Isso levou a um aumento nas tensões entre o Hamas, que governa Gaza, e Israel. Desde então, houve diversos conflitos armados entre Israel e o Hamas, mas em maio de 2021, foi observado um aumento acentuado na violência entre eles, quando confrontos em Jerusalém Oriental, disputas sobre o acesso à Mesquita de Al-Aqsa e a expulsão de famílias palestinas de suas casas em Sheikh Jarrah desencadearam um conflito em grande escala. O Hamas lançou foguetes em direção a Israel, e Israel respondeu com ataques aéreos em Gaza. Esse conflito durou cerca de 11 dias antes de um cessar-fogo mediado pelo Egito entrar em vigor. Em outubro deste ano, o Hamas arquitetou o maior ataque já realizado ao Estado de Israel. A organização de origem palestina lançou em 7 de outubro um ataque surpresa, matando aproximadamente 800 soldados e 400 civis israelitas cerca de 1.200, não 1.400, como anunciado inicialmente, além da captura de reféns. Como resposta, os israelitas lançaram diversos bombardeios à Faixa de Gaza, porém com muito mais armamento e estratégia que o Hamas. Tais ataques de Israel já mataram mais de oito mil palestinos, dentre eles muitos são crianças e mulheres, visto que os ataques foram direcionados a hospitais e áreas residenciais, além das bases do Hamas. Israel alega que os ataques foram feitos para atingir somente o Hamas, e que os “terroristas” usam a população de Gaza como escudos humanos.

Logo a notícia se espalhou pelo mundo, com uma ampla cobertura da mídia hegemônica causando reações diversas àqueles que sabiam como o confronto se sucedeu. Aí surgem as redes-sociais como importante fonte de informação sobre o conflito. Vídeos e fotos dos resultados dos ataques, com crianças e civis muito machucados, moldaram como as pessoas enxergam esse conflito. A influência das redes sociais na formação de opinião sobre o conflito entre Israel e o Hamas é significativa e complexas, estas plataformas têm um papel crucial na disseminação de informações, mas também na amplificação de pontos de vista polarizados e na propagação de discursos extremados. Por um lado, as redes sociais oferecem acesso a uma variedade de perspectivas, permitindo que indivíduos de diferentes partes do mundo expressem suas opiniões e compartilhem informações. Isso pode enriquecer a compreensão do conflito ao expor usuários a narrativas diversas e vozes que, de outra forma, poderiam não ser ouvidas. Além disso, as plataformas digitais têm sido usadas para mobilizar apoio e conscientização sobre questões humanitárias associadas ao conflito, impulsionando movimentos de solidariedade e ativismo.

No entanto, as redes sociais também têm sido criticadas por amplificar polarizações e disseminar desinformação. Por meio de algoritmos que mostram conteúdo com o qual os usuários já concordam, criam-se bolhas de filtro que reforçam pontos de vista existentes, dificultando a exposição a diferentes perspectivas. Isso pode levar a uma compreensão limitada e distorcida do conflito, contribuindo para uma visão unilateral e extremada. É crucial que os usuários estejam cientes do papel das redes sociais na formação de opinião e busquem fontes diversas e confiáveis de informação para compreender a complexidade do conflito entre Israel e o Hamas. Estar consciente dos filtros e algoritmos das plataformas pode ajudar na busca por uma visão mais abrangente e informada sobre esse assunto delicado e multifacetado.

Foi apontado como as redes sociais podem distorcer fatos e pendular para um lado da história. Uma estudante judia da PUC, que preferiu não se identificar acredita que as redes são um veículo importante devido o alcance, ela busca usar o seu Instagram para mostrar como os judeus e descendentes israelitas sofrem preconceito, mesmo não possuindo nenhuma relação com os crimes de guerra que o Estado de Israel vem cometendo contra o povo palestino. Ela realça que a guerra deu abertura às pessoas antissemitas de espalharem seu ódio sem pudor. A estudante compreende que os mais afetados devido todo o processo histórico, são os palestinos, mas que preconceito é inaceitável em qualquer circunstância e que ao invés de nos tornamos fanáticos e como torcidas de futebol se tornarem inimigo, devemos aproveitar a tecnologia e esse espaço para abrir um diálogo entre os dois lados e entendermos o que cada um sofre, ajudando uns aos outros nesse momento delicado.

A tecnologia é usada por criminosos em casos variados
por
Lucas Allabi
Guilherme Gastaldi
|
22/11/2023 - 12h

Por Lucas Allabi (texto) e Guilherme Gastaldi (audiovisual)

O termo deepfake, traduzido do inglês, é uma mistura de “deep learning” e “fake”. Ou seja, é um sistema de aprendizado constante de uma inteligência artificial que visa criar vídeos e imagens falsas com cada vez mais semelhanças à realidade. A tecnologia teve início no ano de 2017. Usuários do Reddit usaram os softwares Keras e TensorFlow para criar uma IA que mapeia rostos e os substitui por outro qualquer. O software consegue até imitar expressões faciais e movimentos labiais.

Isso facilitou o uso de qualquer um a esse tipo de tecnologia, já que ela deixou de ser manual, substituindo frame por frame o vídeo selecionado, e automatizou completamente o processo. A tecnologia, com nenhuma regulação sob ela, logo se popularizou e começou a ser utilizada para diversas finalidades. Se tornou comum vídeos pornográficos serem feitos com rostos de pessoas que nunca fizeram parte de nenhum vídeo erótico.

No começo era uma espécie de fetichização da pessoa, visando dar prazer para quem tinha desejo por alguém que nunca fez pornografia. O uso criminoso dessa tecnologia, entretanto, logo surgiu. Diversos relatos da época revelaram tentativas de suborno feitas por criminosos que ameaçavam publicar deepfakes de civis. A vítima deveria pagar ao infrator para que um vídeo pornográfico com seu rosto não fosse publicado como verdadeiro.

A quantidade de usos de deepfakes para fins criminosos cresceu com a crescente facilidade do público de acessar essa tecnologia. Com um rápido google achamos ferramentas gratuitas como o aplicativo Reface, os sites DeepSwap e DeepFakes Web e os programas FaceApp e DeepFaceLab.

deepfake
 Site que oferece gratuitamente a tecnologia do deepfake.

Com a evolução do acesso ao deepfake, também aumentaram os crimes relacionados à tecnologia. É possível forjar um vídeo para criar um álibi, um depoimento para convencer que uma pessoa defende um determinado ponto de vista ou mesmo uma situação de crime, de modo a incriminar alguém. Tudo depende da criatividade do editor e de quantos vídeos da pessoa estão disponíveis na internet.

Um exemplo é que, nos Estados Unidos, ganhou projeção um golpe que usou o rosto do influenciador mais popular do mundo, MrBeast, que tem 201 milhões de inscritos no seu canal do YouTube. O vídeo usa um clone de James Stephen Donaldson, o dono do canal MrBeast, que oferecia iPhones 15 em troca de quantias irrisórias de dinheiro no Tik Tok. O que seria uma abordagem implausível, ganha em persuasão ao se considerar que ele se tornou famoso ao distribuir prêmios a quem supera desafios em seu canal.

No ano de 2022, com as eleições presidenciais no Brasil, notou-se um crescimento no uso da ferramenta, dessa vez, com o objetivo de manipular falas e criando narrativas tendenciosas com o objetivo de favorecer um lado, ao mesmo tempo em que prejudicava o outro. Além disso, a suscetibilidade de grande parte da população brasileira de acreditar favorece o uso de ferramentas que promovem a disseminação de desinformação.

Em pesquisa divulgada em janeiro de 2022 pela Kaspersky, empresa tecnológica russa especializada na produção de softwares de segurança à Internet, em parceria com a Corpa, a maior parte dos brasileiros não sabem reconhecer quando um vídeo foi editado usando o deepfake. Segundo o estudo, 66% dos brasileiros ignoram a existência dessa técnica. O relatório revela também que a maioria dos entrevistados brasileiros (71%) não reconhece quando um vídeo foi editado digitalmente usando essa técnica. 

Na mesma linha, a professora da PUC-SP Lúcia Santaella elenca alguns motivos pelos quais identificar um deepfake pode ser difícil, especialmente para pessoas sem conhecimento tecnológico. A pesquisadora lembra que as teorias da percepção revelam que o ser humano não pode duvidar daquilo que vê, ou seja, vídeos costumam ser tomados como verdade. Em segundo lugar, as peças audiovisuais manipuladas normalmente são consumidas a partir da tela de um smartphone, o que, pelo tamanho reduzido, dificulta a identificação de detalhes que denunciem a edição. 

Ela ainda ressalta que nós estamos acostumados a ver filmes e vídeos dublados. Portanto, a atenção ao movimento labial é um hábito que nós não temos. A nossa atenção toda vai para a sequência visual do vídeo, para o que é contado, narrado ou apresentado.

No ano dessa eleição, foi produzido um vídeo de deepfake onde os âncoras do Jornal Nacional, William Bonner e Renata Vasconcellos, falavam que o candidato à presidência Lula (PT) e seu vice Geraldo Alckmin (PSB) eram “bandidos”. Visto o prestígio do programa e dos apresentadores, o vídeo passou como verdadeiro para vários espectadores, criando o perigo de manipular os votos para a eleição. Esses resultados são preocupantes e evidenciam como nossa sociedade ainda é muito vulnerável à essa nova tecnologia e como precisamos nos preparar e entender o seu funcionamento. 

Além disso, a apuração mostra como políticos e influenciadores podem ter grande sucesso utilizando a manipulação digital para favorecer campanhas de desinformação, principalmente nas redes sociais como Twitter e WhatsApp, onde esses vídeos recebem uma tração muito grande e são compartilhados em massa, tanto por pessoas que não sabem que o vídeo é mentira como pessoas tem plena consciência da falta de veracidade do conteúdo, mas compartilham da mesma maneira para favorecer pontos de vista particulares. 

 

 

 

Acompanhe como os algoritmos influenciam os usuários
por
Gabriel Cordeiro
Pedro Lima Gebrath
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31/10/2023 - 12h

A internet é fundamental em nossas vidas, estamos conectados quase que inconscientemente a ela, seja jogando, conversando, postando nossas opiniões, buscando conteúdo ou diversas outras funções que a internet pode exercer, mas não podemos nos enganar ao pensar que possuímos total controle sobre ela, pois não possuímos. A internet muitas vezes passa a sensação de um oceano de possibilidades, o que não passa de uma ilusão criada pela própria, tudo que fazemos está sendo observado e condicionado e devido aos algoritmos estamos consumindo apenas o que é condizente com “nossa bolha”.

Esse espaço virtual possui uma vasta capacidade de armazenamento de dados e informações, e por isso ela é capaz de muitas vezes direcionar por meio de seu algoritmo o conteúdo que será apresentado para nós, muitas vezes filtrando nossos gostos e nos privando culturalmente, socialmente e até gastronomicamente, nos privando de muito conhecimento e impedindo uma possível ampliação cultural por conta dessa manipulação causada pelas grandes corporações, que conseguem realizar isso ao possuir um vasto acesso aos nossos dados, que liberamos ao realizar cadastros e respondendo questionários de gostos e personalidade em seus sites e redes.

As redes sociais também podem ter efeitos negativos, por sua grande influência na sociedade atual elas podem ser determinantes para importantes acontecimentos. Um grande exemplo das redes sociais sendo utilizadas de maneira maléfica é no caso das eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, no qual o candidato republicano Donald Trump foi eleito usando táticas antidemocráticas. O ex-presidente utilizou de uma manipulação dos algoritmos com base em dados pessoais que foram vendidos pelas empresas de meios de comunicação, convertendo muitos dos “indecisos” para votarem a favor de Trump, se utilizando de muitas das chamadas “fake news” (notícias falsas).

Essa prática não foi determinante apenas nessa eleição, esse esquema de manipulação também definiu a votação do Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), se utilizando desses dados pessoais dos usuários de redes sociais como o Facebook para a manipulação do indivíduo, se utilizando de uma estratégia de algoritmo com base na personalidade e traçando um perfil do eleitorado visando convencer os mais suscetíveis à se tornarem um possível voto favorável, essa estratégia foi desenvolvida pela empresa Cambridge Analytica.

De acordo com Brittany Kaiser, responsável pelas campanhas de empresa durante o período que compreendeu os dois períodos históricos acima, a ferramenta detida pela Cambridge Analytica não possuía apenas a função de melhorar o marketing da empresa, mas era capaz de manipular mentes de usuários que superava o simples uso das redes sociais; era impossível se libertar dessa influência, visto que ela já se via presente nas mais diversas esferas da sociedade mundial. A empresa reproduzia a verdade conveniente a quem lhe pagava, passando uma imagem distorcida a quem a via e gerando um sentimento de que uma simples tomada de decisão resolveria diversos dilemas impostos de maneira exacerbada na internet.

A vitória do republicano Donald Trump em 2016 foi o início de uma onda da extrema direita pelo mundo que teve impacto também em nosso país, com o resultado das eleições 2018 elegendo Jair Bolsonaro também com grande influência das redes sociais. O candidato e atual presidente da república foi acusado de manter uma rede de trafego de notícias falsas e tendenciosas por meio de grupos informais de conversas, no caso o aplicativo WhatsApp, atitude que pode tê-lo ajudado a ganhar a disputa contra o candidato Fernando Haddad, do PT.

O gráfico a seguir exemplifica as fake news sobre os candidatos do 2° turno nas eleições brasileiras de 2018:

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Segundo essa tabela da Agência Lupa e Projeto Comprova, é apontado que Bolsonaro foi bem mais beneficiado por fake news que seu concorrente Fernando Haddad, com 87,5% das notícias falsas sendo favoráveis ao mesmo. Além das fake news em maior quantidade que favorecem Bolsonaro os temas abordados também são menos genéricos e mais chocantes, podendo se concluir que se trata de um método de sua equipe e não somente coincidências.

 

Uma das fake news mais famosas propagadas pelo atual presidente, com mais de 400 mil compartilhamentos, foi sobre Fernando Haddad (PT) ter criado o “kit gay” para crianças de seis anos. É possível encontrar não só esse, mas também outros boatos acerca do mesmo tema. Além de acusarem Haddad de ter criado o “kit gay”, em outros boatos também o acusam de incentivar a pedofilia e o incesto. O “kit gay”, nesses boatos, teria a função de sexualizar as crianças precocemente e ensinar a elas a “ideologia de gênero”.

O assunto foi tão relevante que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ordenou que as publicações do ex candidato do PSL acusando o ex ministro da educação de distribuir o tal “kit gay” nas escolas públicas enquanto seu período no ministério fossem retiradas do ar, pois este kit nunca existiu

 

No topo das publicações mais compartilhadas está o perfil oficial do candidato Jair Bolsonaro, que reiteradamente se refere a Haddad como o “pai do kit gay” (Reprodução/TV Globo)

Foto de Jair Bolsonaro segurando o livro “Aparelho Sexual & Cia” no Jornal Nacional da Globo (Reprodução/TV Globo)

As noticias falsas atingiram principalmente os idosos, que possuem pouca familiaridade com a internet e redes sociais, normalmente com dificuldades de confirmar o que se vê nos espaços virtuais. Em entrevista com Maria Francisca, senhora de 79 anos, a mesma afirma ter participado de diversos grupos do aplicativo Whatsapp onde eram compartilhadas as noticias, onde se afirmava que haviam fraudes nas eleições de 2022 em relação as urnas. Também era incitado uma possível intervenção militar, o que motivou diversos acampamentos em frente aos quarteis generais, tudo organizado e fomentado nos grupos de Whatsapp e do  Telegram. Maria diz se sentir muito chateada por ter disseminado tanta desinformação e agradece ao Tribunal Superior Eleitoral e as agencias de checagem por informarem os fatos, mesmo que a grande maioria dos outros participantes não acreditem nas fontes e sigam com a versão compartilhada nos grupos.

 

Os paradigmas da presença tecnológica como ferramenta nas escolas
por
Khadijah Calil
Lais Romagnoli
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01/11/2023 - 12h

Por Lais Romagnoli (texto) e Khadijah Calil (audiovisual)

 

Caio Silva atua na área da educação há 3 anos e atualmente é professor de duas escolas estaduais localizadas em São Paulo. Ele que foi estudante do ensino particular, sempre trabalhou em escolas públicas e percebe que o governo de São Paulo está intensificando o uso de tecnologias dentro das salas de aula, mas considera que os recursos não são implantados para que isso ocorra de maneira satisfatória, sobretudo pela quantidade de equipamentos disponíveis.

Em meio a sala de aula vazia, ele afirma que mesmo com a distribuição de tablets e computadores, os prazos costumam ser curtos para as realizações de provas e trabalhos. Além da quantidade de aparelhos não ser condizente com o número de alunos, parte deles não realizam suas tarefas a tempo nas datas solicitadas. 

Com um olhar de indignação ele acredita que esse tipo de situação não deve ocorrer em centros educacionais particulares, uma vez que há um cuidado muito rigoroso a essas questões. Alunos do ensino particular já possuem a tecnologia inserida na educação há muito tempo, já estão acostumados com salas de aula repletas de computadores e tablets.

Em relação ao uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, Caio acredita que a tecnologia pode auxiliar na compreensão dos conteúdos e na superação das dificuldades dos alunos além de proporcionar uma aula mais dinâmica do modelo tradicional. Ele também enfatiza que as ferramentas oferecidas pela escola e pelo governo são essenciais, mas aponta questões negativas sobre o uso.

Caio confessa que mesmo com a utilização em massa do celular em sala de aula para uso pessoal, como acessar o Instagram ou assistir vídeos de assuntos variados no Tiktok, muitos alunos ainda demonstram um desinteresse pelo uso da tecnologia quando atrelada a educação, principalmente os do ensino médio. 

Caio conta que os alunos entre 11 a 18 anos costumam aceitar a inserção da tecnologia em sala de aula. Ele acredita que cabe ao profissional uma reflexão com os estudantes para que compreendam aquilo como algo positivo. No entanto, o professor muitas vezes esbarra em uma cultura escolar, que já vem de décadas, que dificulta essa sensibilização por parte dos estudantes.

Questionado sobre a influência da era digital na educação, o profissional enfatiza que a tecnologia possibilita um acesso a informações que nunca tivemos em nossa história, mas é necessário pensar na forma que utilizamos essa ferramenta. É preciso um olhar crítico acerca da qualidade desses materiais que os jovens que estão saindo do Ensino Médio terão acesso.

A Internet pode sim ser positiva, com várias formas de se adquirir e transmitir conhecimento, conta. Mas também, com o advento das redes sociais, muitos estudantes acabam por perder o interesse em questões que realmente podem mudar a sua vida. A realidade é transportada para as redes sociais e tudo que se almeja é um cumprimento de padrões impostos pelas redes. Ele enfatiza que o fator principal para se entender o lado positivo e negativo é compreender com qual finalidade esse jovem vai utilizar a Internet e seus aparelhos eletrônicos. 

Os avanços tecnológicos passaram a ter domínio da sociedade de forma que os equipamentos se tornaram essenciais para o cotidiano, com benefícios e malefícios. Essa modernização atingiu o âmbito educacional, trazendo a tona um debate sobre a maneira que celulares e computadores podem ser contribuintes ou não na formação dos estudantes.