O Software da Poda quer monitorar as condições das árvores pelos bairros de São Paulo
por
Julia Sena
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03/11/2025 - 12h

Por Julia Sena

 

No bairro da Vila dos Remédios, na zona oeste de São Paulo, seu Francisco, de 68 anos, já se acostumou com o barulho de galhos batendo contra os fios de energia nos dias de vento forte. Diz que na rua, quando chove, já sabe que vai faltar luz. Ele já fez inúmeros pedidos de poda à prefeitura, mas as respostas, quando vêm, demoram meses. A cena se repete em muitos bairros da cidade, árvores plantadas há décadas, sem planejamento e monitoramento. Além de crescidas demais, raízes que invadem calçadas, rompem fios e danificam tubulações. A falta de gestão eficiente da arborização urbana torna-se ao mesmo tempo um problema de segurança e um desafio ambiental. Foi diante desse cenário que um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo desenvolveu o projeto Poda, uma iniciativa que usa inteligência artificial e softwares de modelagem ecológica para apoiar o poder público na tomada de decisões sobre o manejo de árvores nas cidades.

A iniciativa nasceu dentro do Instituto de Biociências da USP, sob coordenação do professor Marcos Buckeridge, especialista em fisiologia vegetal e diretor do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (INCT Bioetanol). A ideia surgiu de uma pergunta simples sobre se seria possível usar dados científicos para prever quais árvores precisam de poda antes que se tornem um risco. Para ele, o manejo das árvores urbanas ainda é muito reativo, a poda acontece depois que o problema aparece. O que se pretende é criar um sistema preventivo, capaz de indicar quando e onde agir, usando informações sobre o crescimento das espécies, o clima e as condições do solo.

O sistema desenvolvido pela equipe combina imagens de satélite, modelos de crescimento vegetal e dados climáticos locais. A partir disso, os pesquisadores conseguem estimar o ritmo de desenvolvimento das árvores e identificar áreas de risco, como regiões onde há alta densidade de copas próximas à rede elétrica.

Um dos diferenciais do projeto é a criação de modelos preditivos que consideram o impacto das mudanças climáticas no comportamento das árvores. Com o aumento das temperaturas e das chuvas intensas, algumas espécies têm crescido mais rápido e de forma desordenada, o que aumenta a chance de quedas e rompimentos. O software já permite prever o comportamento das árvores ao longo do tempo. Isso ajuda o poder público a planejar melhor as podas e reduzir custos com emergências.

A proposta da Poda é tornar a arborização urbana mais sustentável e integrada à rotina das prefeituras. O sistema já foi testado em áreas piloto de São Paulo e pode, futuramente, ser adaptado a outras cidades brasileiras. E o objetivo não é apenas tecnológico, mas também social,. pois o que está em jogo quando se pensa em árvores é preciso considerar sombras, em conforto térmico, em qualidade do ar. Mas se não houver manejo, esses benefícios se perdem.

De volta à Vila dos Remédios, seu Francisco ouve falar do projeto com esperança. Ele considera que se tiver um jeito de a Prefeitura saber antes que a árvore vai cair, já ajuda muito, porque esperar cair em cima do carro ninguém quer.

A equipe da USP também trabalha em uma interface pública, que permitirá aos cidadãos acompanhar o mapeamento das árvores de suas regiões e reportar problemas diretamente pelo sistema. Assim, o ciclo se completa: da denúncia à prevenção, com base em dados e participação popular. “Cuidar das árvores é cuidar das pessoas”, resume Buckeridge. E agora, com a ajuda da ciência é possível fazer isso de maneira mais inteligente.



 

Lugares que focavam em atividades de lazer e contemplação da natureza estão sendo transformados em shoppings a céu aberto
por
Victória da Silva
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31/10/2025 - 12h

Por Victória da Silva

 

Na Zona Sul da capital paulista, o Parque Ibirapuera é bastante frequentado por pessoas que não se restringem a residentes da cidade. Miriam Santos, sorridente e carismática, frequenta regularmente o local em períodos de descanso e, acompanhada por Andre Bressa, sente as mudanças causadas pela iniciativa privada que invade o espaço público e o torna um tanto quanto diferente do habitual. Miriam trabalhou durante 48 anos na mesma empresa e agora, aposentada, encontra no parque um refúgio no meio da selva de pedra, diz que o lugar já não é mais para todos os tipos de pessoas. Atualmente, com a grande quantidade de carrinhos de sorvetes sofisticados e o aumento do preço de lanches, ela mostra a mochila que Andre carrega com bolsas térmicas cheias de garrafas de água e alimentos para quando necessário. Bressa, que é pintor e trabalha em feiras livres, demonstra certa curiosidade sobre a quantidade de propagandas e publicidades que estão sendo distribuídas por todo o parque após a concessão. Ele atenta para um anúncio da tinta Suvinil, algo nunca visto antes em anos de visita ao local.

O Parque Ibirapuera não foi privatizado, já que sua propriedade continua sendo do município, mas foi concedido à iniciativa privada em 2020 para a concessionária Urbia, que vai comandá-lo durante os próximos 30 anos. Não só o Ibirapuera, mas os parques Villa-Lobos e Cândido Portinari também estão sob concessão, lidando com as mudanças. Há também projetos de concessão para outras regiões, principalmente na Zona Leste, no Parque Ecológico do Tietê, Parque Vila Jacuí e Parque Maria Cristina Hellmeister de Abreu.

No Parque da Água Branca, localizado em Perdizes, Andre relembra o episódio em que a concessionária, Reserva Novos Parques Urbanos S.A, instalou um showroom de carros da Peugeot que foi desmontado após ser considerado ilegal e gerar vários protestos. O pintor destaca como os espaços estão sendo utilizados para promover eventos de nichos mais elitizados e o quão evidente isso se tornou após o controle da e empresas. Além disso, ele observa que as lojas e restaurantes distribuídos, além dos eventos, shows e festivais realizados são majoritariamente frequentados por pessoas brancas, repercutindo uma desigualdade racial dentro dos parques que anteriormente não eram exclusivos de determinada raça ou classe.

Outros visitantes como Beatriz e sua mãe Alessandra, que costumam andar de bicicleta pela pista do local, se depararam com o alto preço de produtos simples, como a água. A garota relata que o preço da garrafa é o que mais a incomoda e sua mãe complementa contando que todos os produtos ficaram caros, incluindo os alugueis das bicicletas em que 1 hora com o veículo custa 18 reais.

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Concedido à iniciativa privada em outubro de 2020, Ibirapuera enfrenta alta no preço de produtos e instalação de unidades comerciais. Foto: Victória da Silva

Em maio deste ano, o Ministério Público de São Paulo abriu um inquérito para investigar a Prefeitura e a concessionária Urbia por uso e segregação de espaços públicos para fins particulares. Na época, o promotor Silvio Marques manifestou sua indignação contando que a empresa estava transformando o Ibirapuera em um “verdadeiro shopping center”. Também segundo o inquérito do MP, a Urbia promove um "loteamento" com a instalação de lojas, construção de grandes edifícios, comércio de bens e serviços e o uso remunerado de diversos espaços, com redução do espaço livre para uso gratuito da população. A investigação revela a crescente tensão entre o discurso de modernização via parcerias público-privadas.

Os radialistas, Viviane e Everton, que semanalmente vão ao parque para praticar exercícios e corrida, relembram a instalação da Casa Centauro que foi retirada após as muitas denúncias. Diferentemente, o casal não vê problemas nas mudanças que a concessionária promove e afirma que não sentiu tantas diferenças. No entanto, o mau planejamento dos serviços é um fator levantado pelos dois. Ele afirma que os espaços livres estão sempre lotados, dividindo-se entre pessoas que vão para passear e outras que praticam algum esporte. Apesar de admirada com a quantidade de novos serviços e possibilidades dentro do parque, a mulher faz uma dura crítica à falta de segurança, já que, para ela, a concessionária deveria investir em questões como essa.

Para além dos fatores levantados, taxas para corredores e para assessorias esportivas também são alvos de revolta. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) autorizou, em julho deste ano, a aplicação de tarifas pensando no uso do espaço do parque para atividades esportivas. Mais do que discutir contratos e taxas, está em jogo o compromisso de preservar os espaços públicos como lugares de encontro, lazer e diversidade, e não como territórios delimitados pelo poder de consumo. A garantia que espaços públicos não se convertam em mercados restritos permanece aos órgãos municipais e a população que frequenta os ambientes precisa lidar com a frequente disputa que acontece desde 2024.

Gratuidade do transporte público no Brasil é possível, e joga luz nos gastos das famílias com a locomoção e exclusão social
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Vítor Nhoatto
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24/10/2025 - 12h

Por Vítor Nhoatto

 

É de manhã, por volta das sete, e o começo do dia para milhões de brasileiros em um ponto lotado. As dezenas de pessoas tentando se colocar fora do sol escaldante da cidade, com rostos franzidos e olhos apertados toda vez que um ônibus passa, torcendo para que seja o seu. E decepcionadamente dispostos, pagam por algo que deveria ser universal, e poderia, mas é na verdade um peso desproporcional e impede o acesso a outros direitos.

Mas nos últimos meses uma luz no fim do túnel, ou melhor, um letreiro iluminado no ônibus com o destino desejado voltou a ser discutido. A chamada Tarifa Zero do transporte público no País está em análise pelo Governo Federal, e o presidente Lula solicitou estudos para a viabilidade do projeto, que envolve questões políticas e relativa falta de esperança pelo povo.

O público no meio da avenida é desse jeito, já apático diante do barulho do motor diesel e dos corpos todos em contato na condução do dia a dia. Para Josefa Sueli, só Sueli pede ela, e cerca de 10 milhões de pessoas só na capital paulista segundo a SPTrans, é exatamente nesse cenário que o ir e vir acontece. Trabalhadora doméstica há mais de 30 anos e pernambucana arretada, conta que pelo menos quatro vezes por semana desembolsa R$5,80 no ônibus da EMTU azul e vermelho até a estação em Osasco ou a Lapa aqui na capital, e mais R$5,20 no trem ou R$5,00 no ônibus agora da SPTrans. Fato é que como milhões de outros brasileiros, o gasto só na ida passa dos dez reais, e o tempo nessa brincadeira urbana não é menor que duas horas. 

Pessoas com mochila nas costas que atrapalham a passagem, condução que não chega no intervalo que era para chegar. Olhos nervosos mirando o relógio na tela do celular que seguram com uma mão, enquanto a outra suada se segura nas próprias pessoas ao redor… não há espaço para encontrar as barras de suporte. E lá se foram as duas horas. Sueli chega então na casa do dia perto das nove da manhã, e com R$11 a menos na conta. Entre vassouradas e esfregadas, continua comentando sobre episódios que só o transporte coletivo pode proporcionar. Mas depois de uma janela que não pôde abrir, uma encarada de lá e um empurrão de cá, a constatação que mesmo assim ainda gasta um absurdo só para chegar até os lugares, em vida e dinheiro.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), o gasto com transporte das famílias só não é maior que habitação e alimentação, sugando até 20% do salário por mês. No caso da Sueli, que perde a mesma quantia na volta, lá se foram pelo menos R$350 no mês, só indo e vindo do trabalho quatro dias na semana.

Recentemente tendo passado por uma suspeita de câncer de intestino, ela conta feliz que não tem a doença, e todo final de semana sai para comemorar a vida. Às vezes com o filho, que mora na zona leste de São Paulo, há mais de duas horas de distância, outras com a irmã e com as amigas em algum bar, se ela não conseguiu um ingresso para um show de algum cantor sertanejo que tanto gosta.  E tudo isso ela faz de ônibus e metrô na maioria das vezes, salva as pouquíssimas vezes que sobra algo para o Uber, mas enfim, também meio de locomoção. Fazendo então seus “passeios” obrigatórios no transporte ultrapassarem o gasto de 400 reais. 

Não precisava nem ser totalmente de graça aos olhos dela, que já viveram muitas histórias, e suas mãos calejadas que agarram as barras no ônibus e metrô tanto quanto o esfregão. Ela suspira enquanto levanta o seu óculos e indaga que algumas patroas ajudam com a condução, mas é um dinheiro que podia gastar com tantas outras coisas. 

Comprar um saco de arroz e feijão a mais, uma guloseima para a companheira de quatro patas, Bela, uma ida na Villa Country ou no Centro de Tradições Nordestinas (CTN). Uma quantia que faria a economia girar. Segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), nas cidades com gratuidade universal, o número de empregos aumentou 3,2% e o de empresas 7,5%, sem falar da redução em 4,2% das emissões de poluentes pela diminuição de carros. 

Mas ela ainda se lembra da parte da sua família que vive em Pernambuco e dos conhecidos de lá. Cada real a mais faz a diferença para quem não tem o que ela tem. Um litro de leite, uma ida no posto que não pode fazer por causa da passagem, destaca.

Uma realidade para milhões de brasileiros que têm os seus direitos básicos negados também pelo transporte, um outro direito que consta na Constituição de 1988. O artigo 5º prevê direito à livre locomoção, e o artigo 6º o direito ao transporte, mas que são segregados e traduzidos como ferramenta de desigualdade social na prática.

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Transporte público é o meio de acessar os outros direitos além de simples meio de locomoção  - Foto: Vítor Nhoatto

De olhos na cidade

De volta ao ônibus, agora à tarde, mesmo que de pé ou sentado, é engraçado ver a vida passando pela janela. Os olhos dos CLTs, dos estudantes, dos trabalhadores informais como a Sueli olham para a cidade lotada de trânsito… quando não estão cochilando de cansaço com a cabeça encostada tremendo no vidro. Sobre essa questão, o mestre em economia pela universidade de São Paulo (USP), e mais que isso, militante da área, Antônio Carlos de Moraes destaca como isso é enorme e importante. Não se trata apenas de algo eleitoreiro e de apelo popular, destaca ele, mas algo que realmente muda a vida das pessoas. 

O modelo atual do transporte se baseia no ganho por passageiro, então quanto mais cheia for a linha, quanto mais empurrões e reclamações a Sueli tiver para contar na ida e vinda do trabalho, dentista, mercado, médico, bar, mais rentável ela se torna. Nisso tudo o número de carros aumenta para quem pode, tal qual o de acidentes, congestionamento e poluição, além das pessoas que deixam de acessar lugares pelo preço cada vez mais alto das tarifas. 

Com um sistema público nacional de transporte coletivo a história seria muito diferente, como enfatiza Antonio, lembrando de suas vivências e não de números que só interessam a economistas. Ele destaca que todos arcam com os prejuízos da troca do ônibus pelo carro, mas são os mais pobres que pagam o preço na pele, com cada vez menos para gastos básicos como alimentação, e abrindo mão de ir e vir compulsoriamente pelo orçamento que não fecha. 

Falando em sistema, tramita na Câmara o Marco Legal do Transporte Público, que visa estabelecer diretrizes nacionais sobre a contratação de empresas, regras, fiscalização e fontes de financiamento. Isso pode aumentar ainda mais a quantidade de cidades que adotam a Tarifa Zero de algum jeito, hoje o Brasil é o país com o maior número do mundo, com 170 municípios. E mais que isso, ele pressiona e possibilita a reparação histórica que seria um Sistema Único de Saúde (SUS) do transporte público. Poder ir e vir seria garantido, mais pessoas iriam à escola, ao médico, ao museu, ao mercado… e prefeririam o coletivo ao individual. 

Porém, quem iria então pagar a conta? Essa é a principal pergunta de Roseli Rodrigues, passageira de ônibus não por opção. Com um semblante preocupado, atrasada para o trabalho na Avenida Doutor Arnaldo enquanto espera no ponto da Rua Guaicurus, reclama do preço da gratuidade lembrando que de domingo, quando é de graça, o ônibus nunca chega.  Passando a mão pelo rosto em sinal de aflição e cinco reais no bolso ardendo para sair dali quando o número certo aparecer no letreiro no horizonte, destaca que é contra a gratuidade se a qualidade piorar. 

Mas em seguida, lembra que seria ótimo poder ir ao mercado com 200 reais a mais, valor que gasta em média por mês, já que prefere não ter 6% descontado do seu salário com Vale-Transporte (VT). Nos domingos, Roseli destaca ainda, que sempre que pode opta pelo carro de aplicativo devido a demora do ônibus e a lotação do metrô. 

Em exclusividade à CNN Brasil, segundo o presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Vander Costa, o custo anual da gratuidade universal de ônibus, trem e metrô custaria R$90 bilhões. Quantia, no entanto, que como destaca Antonio, pode se tornar realidade sem colocar as contas públicas em risco. Ele destaca que a solução não é tirar de outras áreas essenciais nem criar impostos novos para o povo, mas sim, por exemplo, tributar super ricos. Uma decisão política que precisa ser bancada além de calculada para dar certo. 

No caso das empresas, ele lembra como elas se beneficiam diretamente das obras de infraestrutura voltadas ao transporte, apontando para os prédios em construção ao redor com destaque para o outdoor que grita “more perto da futura linha-6 laranja do metrô”. É mais que justo que elas contribuam para o transporte, portanto, sem falar da diminuição do trânsito e melhora no rendimento dos funcionários, defende.  Além disso, o ônibus que não chega aos domingos para levar Roseli, ou a lotação de todo dia que pega na Guaicurus, e que faz jus a esse apelido, deixaria de ser o modelo de negócios praticado. Com a criação de regras e diretrizes tal qual o Marco Legal propõe, e a Frente Parlamentar - Tarifa Zero, as empresas em acordo iriam receber verba independente da quantidade de passageiros pagantes. Assim, não sendo benéficas economicamente a superlotação e qualidade ruim.

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Os públicos no ônibus são diversos, mas a necessidade de se locomover é universal - Foto: Vítor Nhoatto

E agora já está quase escuro lá no céu, e o fluxo de volta para casa começou. A fila no ponto de Roseli está dando a volta no quarteirão, tão longa quanto essa discussão. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a pasta quer apresentar os estudos de viabilidade ainda em 2025, mas os embates políticos e ideológicos são tão intensos quanto os pisões e esbarradas no corredor cansado do transporte coletivo. 

Avisos dizem, “cuidado degrau” no ônibus, e “atenção com o vão” nos trilhos, mas o verdadeiro foco deve ser nas ações políticas das próximas estações dessa história. Inegável programa de redistribuição de renda, esses 90 bilhões são um investimento e devolução de direitos a milhões de brasileiros, desde que passem a ser vistos assim. Mas enfim, até lá a vida não para, e agora tenho que ir que esse é o meu ônibus. 

Voluntários se reúnem quinzenalmente para apoiar pessoas em situação de vulnerabilidade na capital paulista
por
FABIANA CAMINHA
JOÃO VICTOR ESPOSO GUIMARÃES
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25/09/2025 - 12h

Domingo, 7h da manhã. Enquanto a cidade ainda desperta, a fila já contorna os fundos do Shopping da Lapa, zona oeste de São Paulo. Essa cena se repete a cada 15 dias. Antes mesmo da chegada dos voluntários do Ondas de Amor, quem deseja receber os kits já sabe onde se posicionar. Pessoas com mobilidade reduzida são prioridade. Todos aguardam organizados quando chega o primeiro carro carregado com os itens que serão distribuídos. 

 

Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa
Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa. ​​​​Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Criado em 2019, o grupo distribui, a cada ação, cerca de 180 kits de café da manhã, além de água e itens de higiene, como sabonetes, absorventes e papel higiênico. Ocasionalmente, também são oferecidos produtos adicionais, como escovas e pasta de dente, aparelhos de barbear e desodorantes.

Em dias frios, a entrega inclui cobertores e toucas de lã. Além de suprir necessidades básicas, a iniciativa oferece também mensagens de acolhimento inspiradas na doutrina espírita a quem quiser ouvir.

A ideia nasceu de uma dinâmica com adolescentes em um centro espírita da Vila Romana, bairro da zona oeste. Desafiados a elaborar um projeto de caridade, os jovens sugeriram o nome Ondas de Amor e propuseram oferecer não apenas alimentos básicos, mas itens que consideravam “gostosos”, como sanduíches, bolachas recheadas, doces e achocolatado. O projeto não foi adiante com os adolescentes, mas duas das educadoras, Marildes Esposo e Valéria Vareta, decidiram colocá-lo em prática.

No início, as limitações eram grandes. Somente cerca de 20 kits eram distribuídos, por falta de recursos e voluntários. Com o tempo, a ação ganhou força. Nem mesmo a pandemia interrompeu o trabalho. Com adaptações, máscaras, luvas e distanciamento, o Ondas manteve as distribuições em um período em que a vulnerabilidade de quem vive nas ruas se agravou.

 

Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos.
Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Hoje, aproximadamente 130 kits são entregues na Lapa e o restante é oferecido nos arredores da Avenida General Olímpio da Silveira, sob o Minhocão. Nessa segunda etapa, os voluntários percorrem as barracas, chamando as pessoas pelo nome e demonstrando os vínculos construídos ao longo dos últimos anos.

O senhor José, em situação de rua, é um exemplo dessa relação. Há anos recebe os kits do grupo sob o viaduto e, a pedido dele, o projeto passou a incluir livros, dispostos de forma acessível a qualquer interessado. Sempre que possível, são distribuídos sacos de rações para animais e quando há doações de roupas e calçados, esses itens também são entregues a quem precisar.

Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária.
Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Mas a atuação do grupo vai além da entrega de alimentos, livros e vestimentas. Em alguns casos, é possível fazer uma diferença ainda maior, como no de Ana, que vivia em uma barraca sob o Minhocão quando os voluntários perceberam que estava grávida.

Com sua permissão, Marildes, Eloisa Cestari e Márcia Aoki, outras colaboradoras do projeto, se mobilizaram para garantir o acompanhamento médico de Ana. Desde então, ela passou a viver na Associação Amparo Maternal, centro de acolhida para gestantes, mães e bebês apoiado pela Prefeitura de São Paulo.

O caso evidencia como a iniciativa pode transformar vidas, especialmente quando atua em parceria com outras instituições. Segundo Marildes, o projeto busca ir ainda mais longe. “Nosso sonho é criar uma rede de apoio que nos permita ampliar e qualificar o acolhimento dos que precisem desse tipo de ajuda”, afirma.

Uma operação com um impacto tão grande exige um esforço quase proporcional. A preparação para o domingo começa cerca de uma semana antes. Alguns voluntários cuidam das compras, outros montam os lanches e organizam as sacolas. Atualmente, cerca de 20 pessoas atuam diretamente na logística para que tudo esteja pronto no dia da ação, além daqueles que contribuem indiretamente com doações e apoio financeiro. 

Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários.
Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

“O trabalho voluntário é isso, é dar e fazer o que é possível, mesmo que sejam 10 minutos na ação ou 10 reais doados.”  afirma Marildes, que reforça a importância do esforço coletivo. É possível encontrar mais detalhes sobre o trabalho do grupo e outras formas de contribuir com o projeto no site https://ondasdeamor.com.br/social 

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Maior evento europeu do setor continua na rota por novidades eletricas e mais concorrência a cada ano
por
Vítor Nhoatto
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22/09/2025 - 12h

Ocorrido entre os dias 9 e 14 de setembro, o IAA Mobility recebeu mais de 500 mil visitantes, superando a sua última edição em 2023. Estiveram presentes as germânicas Audi, BMW, Mercedes, Opel, Porsche e Volkswagen, mas Fiat, Peugeot e nenhuma japonesa compareceu. Com isso, mais uma vez uma grande parte de Munique foi palco para as chinesas se consolidarem e expandirem.

Com o lema “It’s all About Mobility”, em tradução livre, “É Tudo Sobre Mobilidade”, o foco da mostra se manteve em soluções inteligentes e inovadoras. Startups como a Linktour com  seus micro carros elétricos, e marcas de bicicletas e motocicletas elétricas estavam por todos os lados do München Expo Center. E repetindo o formato aplicado desde 2021, com o chamado “Open Space”, uma área de experiências interativas gratuitas ao ar livre, os visitantes podiam experimentar tudo isso.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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 Além disso, a inovação tecnológica foi tema de muitos debates e coletivas de imprensa com representantes da indústria. Fornecedoras como a Bosch, Aisin e Revolt, além de empresas de carregadores como a Charge X e E-Mobilio e a gigante de baterias CATL foram só alguns dos mais de 750 expositores presentes. 

Setor premium atento

Falando em eletricidade, ela estava no centro das atenções de todas as marcas, apesar das vendas de carros elétricos (BEV) terem sido prejudicada na Europa no ano passado. O fim ou diminuição de subsídios governamentais e metas de descarbonização estagnadas na União Europeia foram os principais motivos segundo o Global EV Outlook 2025 da International Energy Agency (IEA). No entanto, as projeções para esse ano e os próximos são de crescimento.

De olho nisso a BMW lançou o novo iX3, modelo mais importante em anos ao inaugurar uma nova era para a alemã. A segunda geração do modelo estreia uma plataforma sob medida e exclusiva para elétricos de nova geração, chamada de Neue Klasse. O destaque fica com a nova bateria de 108.7kWh de capacidade integrada ao chassi, compatível com carregamento ultrarrápido de até 800V - ganha 372km em apenas dez minutos - e autonomia de 805km em uma carga segundo o ciclo WLTP. 

No quesito design a ruptura com o passado é ainda mais evidente, com uma nova linguagem visual, inspirado nos modelos da BMW dos anos 80. No interior foi inaugurado o Panoramic iDrive, com o painel de instrumentos correndo ao longo de todo o para-brisa, um novo volante de quatro raios e um multimídia com inteligência artificial de 17,5 polegadas. “A Neue Klasse é o nosso maior projeto futuro e marca um grande salto em termos de tecnologias, experiência de condução e design”, frisou o presidente do conselho de administração da marca, Oliver Zipse.

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Alemã aproveitou o evento para apresentar o futuro Sedan i3, que seguirá o capítulo iniciado pelo SUV iX3,  irmão de plataforma. Foto: BMW Group / Divulgação 

Do outro lado do pavilhão, a Mercedes-Benz fez um movimento parecido, lançando a segunda geração do GLC elétrico. O modelo foi o primeiro elétrico da marca, ainda em 2018 como EQC. Mas pelas vendas baixas havia sido descontinuado no ano passado, e agora retorna com o nome “GLC With EQ Technology”, para evidenciar as mudanças. Rival direto do iX3, segue a linguagem de design inaugurada no novo CLA no ano passado, aqui com uma grade iluminada e enormemente proeminente.

Construído sob a inédita plataforma elétrica MB.EA Medium, independente do GLC, a combustão portanto, possui carregamento de até 800V e uma bateria de 94kWh, traduzidos em 713 km de autonomia. No interior, o SUV inaugura o “Hyperscreen”, transformando o painel inteiro em uma tela de 39.1 polegadas. O interior pode ser todo vegano e certificado, e a comunicação Car-to-X - que coleta e envia dados para comunicar outros veículos - se destaca no quesito segurança. O preço inicial deve girar em €60 mil quando chegar às lojas ainda esse ano, tal qual o rival.

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Faróis possuem tecnologia Matrix, e sob o capô há um espaço de 128 litros para bagagens. Foto: Mercedes-Benz / Reprodução

Mas nem só de SUVs o mercado premium é formado, e a Polestar compareceu a Munique para o lançamento mundial do seu novo modelo de topo, o sedã 5. A marca do grupo Geely, divisão de performance da Volvo até 2017, aposta em sustentabilidade e alta performance, estreando a nova plataforma PPA do grupo. São 872 cavalos, tração integral, aceleração de 0 a 100 em 3,2 segundos e ausência de janela traseira, tal qual no crossover 4.

Um presente e futuro elétrico

Nas duas últimas edições do Salão de Munique, ambientalistas protestaram em frente ao evento em defesa de uma mudança sistêmica da indústria, o que se repetiu. As ONGs Extinction Rebellion e Attac levaram placas pedindo por mais investimento em transporte público e justiça social, jogando atenção para uma mentalidade individualista e o preço dos elétricos. 

Em relação a essa questão, um estudo da empresa de consultoria, Gartner, mostra que até 2027 os BEVs serão mais baratos de produzir que os carros a combustão (ICEVs), e o Grupo Volkswagen promete preços competitivos para sua nova geração de elétricos. 

Foram revelados no evento quatro modelos para o segmento B baseados na plataforma MEB Entry do conglomerado. O principal deles foi o ID.Polo da Volkswagen, com previsão de início de vendas em maio na casa dos € 25 mil. Como o seu nome sugere, é a versão elétrica do hatch Polo, e contará com baterias de 38 e 56 kWh, com uma autonomia de 350 e 450 km respectivamente. Uma versão GTI do modelo será também comercializada, com 223 cavalos.

Continuando o apelo esportivo que a versão encurtada da plataforma em que os modelos do segmento C, ID.3 e ID.4, são construídos, a espanhola Cupra mostrou a versão de produção do Raval. Com dimensões e motorizações basicamente iguais às do ID.Polo, promete continuar a expansão da nova marca do grupo, antigamente uma divisão de performance da Seat.

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Cupra Raval, ID.Polo e ID.Polo GTI  (direita) serão lançados em março do ano que vem, enquanto os SUVs Epiq e ID.Cross (esquerda) chegarão no segundo semestre. Foto: Volkswagen AG / Divulgação

Como era de se esperar pela relação do Polo com o T-Cross, sua versão SUV, o conceito ID.Cross foi mostrado. Com o mesmo tamanho do modelo que substituirá em 2026, integra o segmento disputado dos B-SUV elétricos, formado por nomes como Peugeot e-2008, Renault 4 e Volvo EX30. Focando em espaço e ergonomia, marca a volta de botões físicos no volante e do ar condicionado, além de um maior uso de materiais reciclados. 

Por fim, a Skoda apresentou a sua versão do SUV, denominada Epiq. Tal qual os irmãos de plataforma, será construído em Pamplona, na Espanha, e contará com a capacidade de carregar dispositivos externos como eletrodomésticos (V2L). A velocidade de carregamento é de até 125 kW, indo de 10% a 80% em 20 minutos, e o modelo estreará uma nova identidade visual para a tcheca no ano que vem.

Ascensão chinesa continua 

Aprofundando essa questão dos preços, são as marcas chinesas que se destacam globalmente, como destaca a IEA. Com grandes reservas dos minérios utilizados nas baterias, as fábricas para construí-las e anos de investimento estatal na tecnologia, seguiram com sua expansão em solo alemão. 

A BYD, maior marca chinesa em números, marcou presença com o recém lançado Dolphin Surf - a versão europeia do Dolphin Mini. Avaliado com cinco estrelas pelo Euro NCAP, é um dos BEVs mais baratos hoje à venda na Europa, custando cerca de € 20 mil. No campo dos híbridos plug-in (PHEV) a Station Wagon do segmento D, Sealion 06, foi lançada, focada em conforto e tecnologia com até 1.092 km de autonomia combinada.

Outra marca com novidades foi a Leapmotor, que já vende o hatch subcompacto T03 e o D-SUV C10 no continente, de lançamento marcado para o Brasil ainda em 2025. Pertencendo 20% à Stellantis, que controla a sua operação internacional, apresentou o inédito hatch B05, rival de Volkswagen ID.3 e BYD Dolphin. Sob a mesma plataforma do C-SUV B10, terá cerca de 400 km de autonomia e início de vendas para o ano que vem por cerca de € 30 mil.

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"O B05 (direita) reflete nosso compromisso com a inovação, acessibilidade e a capacitação da próxima geração de motoristas em toda a Europa e além", declarou o CEO global da marca, Zhu Jiangming. Foto: Leapmotor / Divulgação

Munique foi para além de um lugar de novos modelos, mais uma vez o palco de marcas inteiras debutando em solo europeu. A marca AITO, do grupo Seres, que usa a tecnologia da Huawei, se lançou no mercado internacional com os SUVs 9, 7 e 5. Mirando as marcas premium alemãs nos segmentos E e D, podem ser tanto BEVs ou elétricos com extensor de autonomia (REEV), repetindo a abordagem da Leapmotor com o C10.

O grupo Changan Auto iniciou as operações da sua marca Deepal com os SUVs de apelo jovem e esportivo S05 e S07, ambos com opções de serem elétricos ou PHEVs. No campo de luxo, a marca Avatr da gigante chinesa mostrou seu primeiro concept car, o Xpectra, além dos modelos 06, 07 e 12, já comercializados em alguns países europeus e com planos de chegarem a 50 mercados em breve.

A premium Hongqi esteve presente e revelou o C-SUV elétrico EHS5, além de anunciar planos de expansão com 15 modelos e 200 pontos de venda pela Europa nos próximos anos. E aumentando a sua aposta no evento, a Xpeng teve um stand dentro do pavilhão e apresentou a nova geração do P7, sedã que começou a ser comercializado na Europa no IAA Mobility 2023.

Além disso, a recém chegada ao Brasil, GAC, estreou no velho continente levando cinco modelos para a mostra. Seguindo com o “European Plan Market” anunciado no ano passado, lançou como modelos de topo o novo GS7, um SUV grande híbrido plug-in, e a MPV híbrida (HEV) E9. Mas os destaques da marca foram o hatch AION UT, rival de BYD Dolphin, e o D-SUV rival de Tesla Model Y, o AION V.

O primeiro possui bateria de 60 kW/h com 430 km de autonomia e previsão de início da comercialização em 2026 na casa dos € 30 mil. Já para o segundo, comercializado no Brasil por R$214.990, o preço de € 35.990 foi anunciado, muito competitivo para o segmento. Com 510km de autonomia e cinco estrelas no teste do Euro NCAP - com mais ADAS que o brasileiro - será o primeiro a chegar às lojas, já em setembro em mercados como Portugal, Finlândia e Polônia. O plano é que a marca venda em todos os países europeus até 2028.

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Estava ainda em Munique o carro elétrico voador GOVI AirCab (ao fundo) buscando mostrar os avanços da indústria chinesa, segundo a empresa. Foto: GAC Group / Divulgação

Eletrificação em todos os níveis 

Para além das novatas, ícones do mercado aproveitaram os holofotes da feira para se renovarem completamente. Esse foi o caso da única francesa presente, a Renault, que lançou a sexta geração do hatch Clio, o segundo carro mais vendido no continente em 2024.

Construído sob a mesma plataforma que o seu predecessor, mantém o motor 1.2 TCe e uma opção movida a GPL, mas as semelhanças acabam por aqui. No powertrain, estreia um novo sistema full-hybrid (HEV) formado por um motor 1.8 e dois elétricos, resultando em 160 cavalos e modo de condução elétrico na cidade. Conforme a estratégia da marca, o Clio não terá versão elétrica, papel delegado ao hatch de estilo retrô, o 5.

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Hatch cresceu 6 centímetros em comprimento, evocando uma silhueta mais esportiva e afilada. Foto: Renault Group / Divulgação

No quesito design, o carro rompe por inteiro com a geração anterior, o oposto do que havia acontecido com a quinta geração em relação à quarta. A frente ostenta uma nova assinatura em DRL, que forma o símbolo da Renault, e a traseira possui lanternas duplas, nunca vistas em um Clio. O interior é todo novo também em relação ao antecessor, mas com o mesmo layout e sistema operacional do Google do irmão elétrico 5.

A Volkswagen foi outra que debutou no IAA uma nova geração de um best-seller, o T-Roc. Em sua segunda encarnação, também não terá versões elétricas, sendo o último novo carro a combustão desenvolvido pela marca. Haverão pela primeira vez no SUV opções micro-híbridas (MHEV), já conhecidas dos irmãos de plataforma como o Golf e A3, além de um novo sistema HEV, com 134 e 168 cavalos. Não haverá, pelo menos por ora, versões PHEV, sendo o único modelo sob a MEB Evo sem essa possibilidade, no entanto.

Seu exterior é uma evolução da primeira geração, mantendo linhas semelhantes e o seu apelo descolado, descrito pela marca. As dimensões aumentaram, 12 centímetros em comprimento, chegando a 4.37 metros, o colocando alinhado a rivais como o Toyota CH-R e Mazda CX-30. Por dentro a abordagem continua, com telas maiores e mais itens de conectividade e segurança assistida, mas com uma disposição de elementos clássica, vista nos últimos Golf e Tiguan.

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Modelo construído em Portugal foi o quinto carro mais vendido na Europa no ano passado. Foto: Volkswagen Group / Divulgação

Concorrência de todos os lados

Além das chinesas em franca expansão nos últimos anos no continente, outras concorrentes vêm se destacando na corrida pelos elétricos principalmente. A coreana Kia compareceu ao evento e mostrou ao público os novos integrantes da família EV, o EV4 e o EV5. 

O primeiro é um hatch do segmento C, acompanhado de uma variante sedã. Já o último se trata de um modelo lançado em 2023 - inclusive a venda no Brasil desde o ano passado - mas que chega só agora à União Europeia como a versão elétrica do Sportage. Sua conterrânea e marca irmã também esteve em Munique com o Concept 3, prevendo o futuro Hyundai Ioniq 3, equivalente do EV4.

Mas nem só da Ásia as novidades chegam, com a primeira marca turca de automóveis elétricos, a Togg, debutando em solo alemão a sua ofensiva no continente europeu. Fundada em 2018 e com a primeira fábrica inaugurada em 2022, apresentou o C-SUV T10X e o sedã T10F ao público. A pré-venda dos modelos começará em 29 de setembro na Alemanha, e no ano que vem a empresa pretende iniciar seus trabalhos na França e Itália, com meta de ter até 2030 um milhão de veículos em toda a Europa.

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Preços ainda não foram divulgados, mas devem ficar em torno de € 40 mil tomando como base as cifras no mercado turco. Foto: Togg / Divulgação

Construídos sob uma plataforma elétrica, ambos receberam nota máxima no Euro NCAP recentemente, com mais de 9% de proteção para adultos e 80% nos ADAS. A respeito do desempenho, a bateria possui 88.5 kWh de capacidade, e autonomias de até 500 e 600 km para o SUV e o sedã respectivamente. 

“Nossos modelos proporcionam uma experiência de mobilidade voltada para o usuário e voltada para o futuro”, comentou Gürcan Karakaş, CEO da marca durante o evento. A marca anunciou ainda que trabalha no terceiro de cinco modelos que irá lançar até o fim da década, o B-SUV T8X. Karakaş finalizou destacando que prepara para introduzir baterias de pirofosfato de lítio (LFP), e que a indústria deve estar preparada para as mudanças e maior concorrência.

Obras em local simbólico para a cidade de São Paulo estão perto de serem finalizadas, concessão é o próximo passo
por
Gabriel Porphirio Brito e Rafaela Reis Serra
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11/09/2020 - 12h
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Vale do Anhangabaú em reforma; futuros quiosques à direita. Foto: Gabriel Porphirio Brito



Projeto elaborado em 2007, e que só seria recuperado na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad, a reforma do Vale do Anhangabaú chega perto de ser finalizada no segundo semestre de 2020. Com investimento inicial de R$80 milhões, e sendo a maior obra do atual prefeito de São Paulo Bruno Covas, o plano é de entregar um terreno totalmente remodelado para a iniciativa privada, a fim de atrair novo público ao local.

Pedido há 13 anos pelo ITDP, o rascunho inicial da obra teve o arquiteto dinamarquês Jan Gehl como responsável. Mas, logo ficaria de lado, sendo doado a prefeitura em 2013, fazendo parte do Plano de Metas do então prefeito Fernando Haddad (PT).

As obras iniciadas por Bruno Covas (PSDB) em junho de 2019, orçadas atualmente em R$ 94 mi, tinham previsão para serem entregues um ano após seu início, custando R$14 milhões a menos. Já sem muito apreço popular, a obra atualmente está atrasada em três meses. Dentro dos planos da gestão atual a concessão para sua privatização já era pra ter ocorrido: tal feito já foi adiado duas vezes.

 

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Parte da obra em finalização. Edifícios Martinelli e Altino Arantes aos fundos. Foto: Rafaela Reis Serra



Segundo Guido Otero, arquiteto e representante da IABsp (Instituto de Arquitetos do Brasil) na Comissão Executiva da Operação urbana centro, o poder público busca historicamente uma “reativação” do centro da cidade, sempre fazendo projetos culturais para área. “Existe uma vontade declarada da prefeitura de trazer um novo público para a região. O centro tem esse caráter popular que é interessante. Existe essa vontade por trás desses projetos de ter uma transformação no perfil social das pessoas que moram lá.”

Para uma parcela daqueles que acompanham o desenrolar das obras, o olhar é receoso, uma vez que parece ser inexplicável o alto valor gasto na reestruturação completa do vale. Pode-se perceber que todos param para contemplar o Vale. Fernando Júnior, o qual transitava todo dia pelo Viaduto do Chá, conta que para ele é uma obra inútil e a cidade precisa de outras prioridades.

O vereador Gilberto Natalini (sem partido), afirma que era possível ter usado pelo menos um terço do custo total: “Se fosse feito um projeto de revitalização efetiva - não de fazer um Anhangabaú novo, como foi feito - você poderia ter gasto um terço do dinheiro.”

A revitalização de Natalini consiste em, basicamente, uma reforma na estrutura já existente do local, preservando o antigo projeto de 1981 dos renomados urbanistas Jorge Wilheim, Jamil Kfouri e Rosa Grena Kliass. Sendo assim, não apagaria o anterior com uma reformulação complexa. “[...]Sou contra o esbanjamento de dinheiro que foi feito ali, o desrespeito aos arquitetos que fizeram a obra anterior, e a falta de transparência e participação popular no processo [de reforma]”.

Símbolo histórico

Localizado no coração da cidade de São Paulo como um ponto turístico e de manifestações das mais diversas vertentes, o Vale do Anhangabaú passa pela sua terceira grande reforma, mais uma vez com a justificativa de revitalização da área.

Após um período de descaso no século XIX, o rio Anhangabaú foi canalizado em 1910, transformando a região em uma avenida que liga Zona Norte à Zona Sul, o centro novo ao centro velho, à época. Porém, após concurso público em 1981, o Vale voltou às suas funções de origem: uma grande praça na qual pessoas poderiam caminhar livremente. Foi construída uma espécie de laje abaixo do Viaduto do Chá, que hoje está totalmente asfaltada, dando um aspecto árido para a região.

Local de cunho social, que sempre apelou pelo caráter coletivo, fora palco de uma das maiores manifestações já registradas em São Paulo, a das Diretas Já. Ademais, além de ser conhecido pelos protestos, costuma ser também área utilizada para grandes eventos culturais nos últimos anos, como a Virada Cultural e os aniversários da cidade de São Paulo.

Comoção popular

Parte das maiores críticas ao processo todo é devido a falta de verde no local, a pouca transparência e a quantidade de dinheiro investido em um projeto que não possuía tanta urgência. Luis Guerretta, Coordenador do Setor de Arquitetura e Urbanismo do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), afirma que existem dois problemas: “O primeiro se refere à falta de prioridade nos gastos públicos e o segundo se refere a política higienista adotada pela gestão Doria/Covas”.

Guerretta afirma que a região central da cidade tem inúmeros problemas sociais historicamente ignorados pelo poder público. “Revitalização significa dar nova vida a algo. Ao se referir a obra como um processo de revitalização, as gestões deixam implícito que a população que ali vive não tem valor algum e deve ser substituída por algo ‘novo’.[...] É uma intervenção a serviço da especulação imobiliária.”, completa.

Em nota oficial, a prefeitura explica que: As obras do Vale do Anhangabaú vão fortalecer o local como cartão-postal da cidade, qualificando suas conexões com o transporte público, espaços culturais e edifícios próximos, e transformando-o em um espaço mais convidativo e de permanência à população, com segurança, acessibilidade, lazer e zeladoria.”

A prefeitura também declara que foram plantadas mais árvores comparado ao projeto anterior: “Em sua forma final, o Anhangabaú contará com 532 árvores [...] E para qualificar ainda mais o microclima da região, a água tem papel fundamental no projeto, uma vez que 850 jatos d’água umidificam o ambiente.”, como uma maneira de homenagear o rio Anhangabaú, no qual foi canalizado.

Sobre a gestão do espaço, ele será concedido a título oneroso à iniciativa privada por dez anos com obrigações em contrato para a sua manutenção, preservação e ativação sociocultural. Em certos dias, porém, poderá usar o local para eventos privados, gerando controvérsias.

A concessão aconteceria logo após o término das obras, previsto para setembro. Foi adiada, porém, pelo menos duas vezes, sendo 13 de outubro a última data marcada para a abertura dos envelopes.

 

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Futuros quiosques voltadas para o comércio. Foto: Gabriel Porphirio Brito

 

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Adaptações tecnológicas, para suprir demandas de sala de aula, evidenciam disparidades graves no sistema educacional do país
por
Maria Luiza de Oliveira e Marina Daquanno
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18/09/2020 - 12h

 

O Ensino a Distância (EAD) se tornou um meio para os estudantes continuarem tendo aula durante a pandemia do covid-19, que começou em março no Brasil. Muitos acreditam que essa tenha sido a solução mais viável, porém, com muitos problemas, ainda mais se for comparar entre as escolas públicas e privadas brasileiras, onde há tantas discrepâncias entre esses dois sistemas educacionais, como ressalta a professora Sandra Cantinelli, que ministra as aulas de artes e “projeto de vida” na Escola Estadual Paul Hugon, “Se antes (da pandemia) já não se tinha uma limpeza correta e uma boa infraestrutura, como vamos voltar às atividades, agora que precisamos aderir a tantas medidas de precaução, em uma escola que, se chove, temos que botar balde debaixo das goteiras? Não temos nem lixeiras suficientes.”

 

As aulas remotas evidenciaram as diferenças entre os ensinos. De um lado se tem toda uma estrutura de plataformas online e de professores preparados, do outro, existem alunos que não estão tendo aulas de matemática desde o início da quarentena. É o que conta a estudante do ensino médio Isabella Cantinelli de Castro Correia (16, E.E Paul Hugon): “Não tive aula de verdade, os professores mandam algumas atividades, às vezes eles fazem um plantão de dúvidas. Mas têm matérias que não estou tendo nada, como matemática.” Diferente do ensino particular, que houve uma organização da maioria das escolas para essa nova forma de ensino virtual, é o que afirma o professor de história do colégio e cursinho Objetivo, Artur Favaro Lucchesi (32). 

Fonte: E.E. Prof. Paul Hugon, Secretaria da Educação do Estado de São Paulo
E. E. Prof. Paul Hugon, Secretaria da Educação do Estado de São Paulo

 

Com aulas gravadas previamente pelos professores e depositadas numa plataforma virtual para os alunos, ou então com a grade horária mantida e aulas realizadas por meio de plataformas como o Microsoft Teams, as escolas particulares tiveram uma resposta pronta para a demanda de seus consumidores. Para uma demográfica que, em geral, possui acesso a computadores, celulares e internet em casa, o modelo virtual de ensino tem se mostrado eficaz diante dessa nova realidade. Contudo, tem exigido uma “autodisciplina e tem sido um novo método muito difícil para a maioria das pessoas. Requer um foco e uma concentração muito grande, tanto para alunos quanto professores, que tiveram que se reinventar", como relata o estudante Thiago Furtado Bravo (16, Colégio Objetivo).

 

Muito se tem discutido a respeito do impacto das aulas em EAD na vida dos jovens: prejuízos na convivência social, na aprendizagem, danos graves à saúde mental e nutricional dos alunos. Para Claudia Bernasconi, mãe de Caio (15) e André (13), tem sido uma constante luta mantê-los na rotina de estudos no conforto de casa, “Para que eles tenham disciplina para estudar eles tem que ir pra escola, estudar de casa não é a mesma coisa. Eles ficam muito dispersivos, precisam de alguém por perto para prender a atenção deles”. Atitudes como assistir às aulas de pijamas ou deitados na cama tem sido a realidade de muitos jovens do ensino fundamental e médio, seja por conforto ou por falta de um local apropriado para estudar.

 

Apesar das falhas que existem na nova forma de aprender, a adesão a volta às aulas presenciais são baixas, e com diversas críticas de alunos e professores. O Governo de São Paulo autorizou o retorno das atividades para um reforço presencial no dia 08 de setembro, porém somente 3,53% das escolas estaduais paulistas aderiram a essa medida. Para Favaro “não é seguro, não é correto (...), é um imediatismo da educação brasileira.  Você estará expondo a criança e o professor a uma doença.” Correia diz que a escola onde estuda não está preparada para qualquer retorno: “(...) não me sentiria segura. A escola nem tem papel higiênico direito, não tinha sabonete, eles não conseguiriam lidar.”

 

Contudo, a adesão dos alunos, à essas aulas de reforço, também foi baixa. De acordo com Bebel Noronha, presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), isso é apenas o reflexo da  “insegurança da população no que diz respeito à volta às aulas”. Tanto com os alunos e seus pais, quanto com os professores, o sentimento é o mesmo, “medo” descreve não só o que sentem por si e pela saúde dos que amam, mas também pelo que sentem por seus colegas e mestres. Na escola dos filhos de Claudia, foi feito uma enquete para saber se os pais voltariam com seus filhos para a escola, antes de uma vacina ser aprovada, “Apesar deles (a escola) terem feito um trabalho bacana para receber os alunos, contratando infectologista do Einstein e se preparando com todas as medidas de precaução, nossos filhos não voltarão. Não que eu não confie nas medidas tomadas, é só que eu não acho justo os funcionários terem que se submeter aos riscos de irem à escola só para concluir o ano letivo.”

 

Mesmo assim, o governo de São Paulo anunciou, dia 18 de setembro, o retorno das aulas presenciais do ensino fundamental da rede estadual a partir de 3 de novembro, ensino médio e EJA seguem liberadas a partir do dia 7 de outubro. As escolas que quiserem aderir tanto em outubro quanto em novembro — e tiverem autorização das respectivas prefeituras — devem apresentar um plano de adaptação à Secretaria da Educação e às Diretorias Regionais de Ensino, com limite máximo de alunos e respeito a protocolos sanitários.

 

Fonte foto de capa: <a href='https://br.freepik.com/fotos/escola'>Escola foto criado por freepik - br.freepik.com</a>

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A pandemia tem se mostrado eficaz em expor a fragilidade das pessoas, mas pouco é explanado sobre a cenário de pessoas em situação de rua
por
Eduardo Rocha
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06/09/2020 - 12h

Em um clima de descontração, com música, pessoas alegres e vontade de fazer o bem, é realizada a entrega de mantimentos na tenda franciscana, no largo São Francisco, no centro de São Paulo.

Segundo o frei João Paulo Gabriel, coordenador da Tenda Franciscana, é visível que o perfil dessas pessoas mudou e muito, desde 27 de maio, quando se fez necessário montar a tenda. Acompanhando a entrega de marmitas, pães e garrafas de água mineral, é possível ver a extensão da fila formada e é nítido e até chocante ver as pessoas que a enfrentaram embaixo do sol escaldante. Muitas são visivelmente dependentes de drogas e álcool e outras tantas enfrentam essa fila, simplesmente por não terem como se alimentar. Famílias inteiras, entregadores de comida por aplicativo com suas bicicletas, que sentem o cheiro do que iram entregar, mas não tem o que comer. Uma verdadeira pluralidade de pessoas em diversas condições, mas que tem a fome como mal comum.

 “O SEFRAS (Serviço Franciscano de Solidariedade) a 20 anos atende pessoas em situação de rua, mas isso sempre foi realizado com o que ficou popularmente conhecido como ‘Chá do Padre’, que é um centro de acolhida, escuta e partilha na cidade de São Paulo. Nesse centro, além da entrega de mantimentos, são realizados atendimentos psicológicos, auxílio a encaminhamento a trabalho entre outros, mas com o aumento da procura pelos serviços e por atendermos em um espaço pequeno, fez-se necessário a criação emergencial da tenda” – nos relata Frei João Paulo.

A tenda que foi idealizada, montada e é mantida pelos freis e voluntários e que se encontra disposta na calçada, em frente ao prédio histórico da faculdade de direito da USP, não teve qualquer financiamento da prefeitura ou do governo do estado. “Entramos com uma solicitação, junto a prefeitura, para que nos cedessem um espaço para a montagem da tenda e apenas nos foi liberado o uso da calçada. Já houve caso de um rapaz sofrer um ataque epilético enquanto aguardava sua vez na fila e nos o acolhemos e chamamos o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), mas não foi nos dado atenção quando foi dito que se tratava de uma pessoas em situação de rua. Apenas depois de duas horas, após uma viatura da polícia militar, que estava passando, e foi cercada pelas pessoas que estavam na fila, ter chamado o serviço de urgência” – diz.

Outro dado importante citado pelo frei João Paulo é a falta de transparecia quanto ao número de vítimas entre essas pessoas, seja por frio, fome, suicídio, assassinato, ou agora, causadas pela COVID. Estando na linha de frente do atendimento e na acolhida que também é feita conversando, ouvindo, costumam saber, pelos próprios ajudados, sobre casos ocorridos.

São distribuídas, de domingo a domingo, uma média de 1200 refeições, no almoço e no jantar. Para atender essa demanda, 600 refeições são feitas em cozinhas da própria igreja, sendo elas instaladas na sede do SEFRAS no bairro do Pari e a outra na região do Bixiga. Todo o mantimento vem de doação. As demais refeições são feitas e montadas por voluntários.

“A tenda foi criada com intuito de atender mais e melhor, mas acabou nos dando mais visibilidade. Dessa forma, muitos que tem o coração generoso, que já realizavam a partilha, mas tiveram que para, por medo do vírus, passou a nos procurar, através do site (http://doesefras.org.br/) para fazer usas doações.  E como tivemos um aumento expressivo da população em situação de rua no entorno, foi instalado, pela prefeitura, do outro lado da rua, um sistema de higienização, onde estes podem tomar banho e lavar suas roupas. Não sabemos dizer se isso já estava nos planos da prefeitura, ou se causamos essa iniciativa indiretamente, mas somos gratos por mais essa ação”.

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Para profissionais da saúde, contudo, aglomerações devem ser evitadas durante a pandemia
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Daniel Seiti Kushioyada
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30/06/2020 - 12h

            Em meio a pandemia de coronavírus e a insatisfação com o governo federal, manifestações presenciais ocorreram em diversas regiões do Brasil. De acordo com Alessandra Lopes Camargo, mestra em Ciência Política, “As manifestações fortalecem nossa democracia”. No entanto, profissionais da saúde afirmam que aglomerações devem ser evitadas durante a pandemia.

            A atual gestão do governo de Jair Bolsonaro, principalmente sobre as declarações relacionadas ao combate do coronavírus e o descaso com o crescente número de vítimas da doença, gerou insatisfação popular e resultou em protestos por todo o país. Grupos de manifestantes organizaram atos presenciais antifascismo e contra o Presidente da República no domingo, 7 de junho. Entretanto, grande parte da população acostumada a frequentar manifestações optou por permanecer em suas residências, seguir a quarentena e protestar remotamente.

Alessandra Lopes Camargo. Foto: acervo pessoal
Alessandra Lopes Camargo. Foto: acervo pessoal

Mestra em Ciência Política pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), a professora Alessandra Lopes Camargo compreende a importância histórica das lutas antifascismo como essenciais na consolidação da democracia.  

“Do ponto de vista histórico, há um fortalecimento da democracia, resultado de resistência ao fascismo de anos anteriores, na metade do século XX. Foi o momento da história em que mais se construíram tratados internacionais de defesa de elementos democráticos”, afirmou a professora. 

Camargo também explica a necessidade de atos antifascismo, remotamente ou presencialmente, nos dias atuais para garantir a preservação do Estado Democrático de Direito. 

“Atualmente, não temos um governo fascista. Para ter um governo fascista seria necessário ter um partido único, a censura completa da imprensa e uma legislação autoritária. Porém, o atual governo brasileiro, muitas vezes, possui várias atitudes autoritárias e antirrepublicanas”, disse a mestra.

“As manifestações são uma forma de prevenir o desenvolvimento do fascismo que, assim como mostra a história, não acontece da noite para o dia”, completou.

           Atos presenciais foram marcados dentro do período pandêmico, em que a quarentena ainda é recomendada pelas Secretarias de Estado de Saúde e pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Muitos brasileiros encontram-se dentro de um dilema, pois, ao mesmo tempo em que querem protestar, temem por contrair o vírus e desenvolverem uma complicação de saúde ou contribuir para a sua disseminação.

O otorrinolaringologista, Dr. Paulo Sérgio Dal Secco, formado em medicina pela PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas), alerta sobre os riscos de exposição ao COVID-19 em protestos e locais de aglomeração.

Paulo Sérgio Dal Secco. Foto: acervo pessoal
Paulo Sérgio Dal Secco. Foto: acervo pessoal

“Por ser uma doença de caráter viral, ela se dissemina muito rápido, porque os meios de disseminação são ações que realizamos a todo o momento, como respirar, falar, tocar, tossir e espirrar. E o que dizer de uma aglomeração de tal vulto? Por mais que as pessoas usem proteções, como a máscara, a virulência naquele ambiente é muito elevada”, disse o médico

“Apesar da validade de uma manifestação, independente do lado político, acho que, por ora, deve-se tentar evitar esse tipo de evento”, recomendou. 

Dal Secco explica que indivíduos que não compõem o grupo de risco também estão vulneráveis a um desenvolvimento de uma complicação da doença e reforça a importância de evitar locais aglomerados durante a pandemia.

           “Pessoas entre 20 e 40 anos não fazem parte deste grupo em primeira mão. Há várias condições clínicas, como doenças respiratórias, que podem levar a uma complicação. Inclusive, houve muitos óbitos de uma faixa de idade não esperada. Por isso, acho que é necessário se atentar a esses detalhes e evitar a exposição ao máximo que puder, dentro de um bom senso”, concluiu.

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Inara C. F. Novaes
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30/03/2020 - 12h
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Imagem: Inara Novaes

O Parasita

“Como todos os parasitas, [o capitalismo] pode prosperar durante certo período, desde que encontre um organismo ainda não explorado que lhe forneça alimento. Mas não pode fazer isso sem prejudicar o hospedeiro”, essas são palavras retiradas do livro Capitalismo Parasitárioescrito pelo filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman.

Com a ascensão da Cultura Ostentação em 2008, as comunidades periféricas mostraram-se organismos bem receptivos ao capitalismo parasitário e, na esperança de sentirem-se incluídas na sociedade, cometeram o deslize de, sem saber, tornarem-se involuntariamente mercadorias.

Quando se vive às margens das cidades e parece que ninguém te vê ou escuta, há o desejo eminente de romper com a paralisia e fazer-se notável.  “O pobre é forçado a uma situação na qual tem de gastar o pouco dinheiro ou os poucos recursos de que dispõe com objetos de consumo sem sentido, e não com suas necessidades básicas, para evitar uma possível exclusão social e evitar a perspectiva de ser provocado e ridicularizado”, trecho retirado do livro Vida para o Consumo, também de autoria de Bauman.

Mas não basta consumir: para não sumirem novamente em meio ao mar de gente, há a necessidade de criar uma identidade e um estilo de vida que os diferenciem das demais mercadorias expostas nas vitrines.

 

Desencontros

Na corrida pela sensação de pertencimento, aquele que foi humilhado vai usar o consumo para sentir-se acolhido e aceito, mas corre-se o risco de idealizar um mundo fictício incompatível com o modelo de vida e as limitações da periferia, principalmente num país em que a metade da população mais pobre, cerca de 104 milhões de brasileiros, vive apenas com 413 reais mensais, de acordo com dados do IBGE.

Nessa corrida que nunca tem fim, nem linha de chegada, porque a economia consumista lucra com as diferentes mercadorias produzidas e posteriormente descartadas, o que prevalece é o desejo de substituir o que se tem por bens novos e atualizados. Em consequência, os indivíduos acabam carregando não apenas o peso de dívidas exorbitantes – 63,2 milhões de brasileiros possuem dívidas atrasadas, de acordo com o Serasa – mas também de frustrações e desencontros.

A realidade nos mostra indivíduos cada vez mais descontentes e infelizes, à procura de algo que lhes traga satisfação, consumindo num ciclo sem fim: comprar, descartar e substituir, sem priorizar as necessidades.

É nesse impasse que muitas vezes ocorre a inversão de prioridades, pois devemos decidir entre quais necessidades atender: a de aderir à um plano de saúde, consertar a goteira no teto da sala, a infiltração na parede do quarto ou o sentimento de pertencimento que muitas vezes vem mascarado na imagem de um celular ou televisão do ano, por exemplo. O capitalismo nos induz a consumir e gozar sem cessar por itens que não podemos pagar, derivando parcelamentos, empréstimos e endividamentos absurdos.

 

Horizontes NoFront

NoFront é uma empresa focada no empoderamento financeiro voltada para negros e negras subrepresentados no mundo das finanças. A ideia surgiu para traduzir as fórmulas difíceis e complicadas dos investimentos às vidas periféricas usando o RAP como instrumento.

A NoFront surgiu a partir da análise do legado das mulheres negras do Brasil do século XIX. “Lavadeiras, costureiras, quituteiras e domésticas. A história das mulheres negras no contexto anterior a abolição nos traz muitas narrativas de trabalho e superação. Organização coletiva que conquistava não só a liberdade individual, mas também coletiva. Nosso objetivo é resgatar essa disciplina, essas práticas em relação ao dinheiro, através da educação financeira e do Hip-hop”, observa a economista Gabriela Mendes Chaves, em trecho retirado do site da empresa.

Atravessando horizontes sobre o que é ser negro numa sociedade excludente e racista à táticas para não usar o consumo como uma escapatória e sim de forma responsável e consciente. 

 

 

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