Alexandre de Moraes já pode decidir por início do cumprimento da pena de prisão
por
CRISTIAN FRANCISCO BUONO COSTA
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12/11/2025 - 12h

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) realizou, na última sexta-feira (7), o julgamento virtual dos embargos de declaração apresentados por Jair Bolsonaro e outros condenados do chamado “núcleo 1” da trama golpista. A sessão abriu às 11h e o sistema de votação permaneceria disponível até 23h59 de 14 de novembro. Esse tipo de recurso serve para apontar eventuais omissões ou contradições do acórdão e, em regra, não reverte o resultado do julgamento principal.

Ainda no dia 7, formou-se a unanimidade para rejeitar o recurso de Bolsonaro, com votos de Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia. Luiz Fux não participa desta fase, após sua migração para a Segunda Turma. O entendimento também alcançou os demais réus do grupo, como Braga Netto, Anderson Torres, Augusto Heleno, Almir Garnier, Paulo Sérgio Nogueira e Alexandre Ramagem.

 

Bolsonaro no STF

O ex-presidente Jair Bolsonaro acompanha julgamento no STF. (Foto: Antonio Augusto/STF)

Na sequência da votação, o colegiado encerrou o julgamento com placar de 4 a 0 e manteve a condenação de Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão, ao rejeitar os embargos de declaração. As defesas buscavam evitar a execução das penas em regime fechado, mas a Primeira Turma considerou que os argumentos já haviam sido examinados no mérito.

A decisão não implica prisão imediata. Caberá ao relator declarar o trânsito em julgado e, então, decidir sobre a execução das penas, inclusive o local de cumprimento e eventuais pedidos da defesa. Até essa etapa, o ex-presidente segue em prisão domiciliar no âmbito de outro inquérito, e os réus ainda podem tentar medidas residuais, embora a própria Primeira Turma tenha deixado claro que não há direito automático a novo recurso ao plenário.

 

 

 

 

Projeto de Decreto Legislativo revoga diretrizes de proteção a meninas vítimas de estupro e exige boletim e aval judicial para aborto legal
por
Carolina Zaterka
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12/11/2025 - 12h

Entrou em discussão no Congresso Nacional, na última semana, o Projeto de Decreto Legislativo 3/2025 (PDL 3/2025), que tem como objetivo sustar a Resolução nº 258/2024 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). A resolução, editada no final de 2024, estabeleceu diretrizes para atendimento humanizado e acesso ao aborto legal para crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, buscando garantir direitos já previstos em lei.


Em votação polêmica na última quarta-feira (5), a Câmara dos Deputados aprovou o PDL 3/2025, texto que agora segue para análise do Senado. O projeto é de autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ), representante da ala ultraconservadora do Congresso, com coautoria de mais de 30 parlamentares, principalmente de partidos das bancadas religiosa e de direita (como PL, Republicanos, PP, MDB). Tonietto e seus apoiadores argumentam que a resolução do Conanda “extrapolou” as atribuições do conselho ao modificar procedimentos sem passar pelo Legislativo, citando, por exemplo, que a norma dispensou a apresentação de boletim de ocorrência policial para o aborto de menores que sofreram estupro.
 

Deputada Chris Tonietto - Reprodução: Câmara dos Deputados
Deputada Chris Tonietto - Reprodução: Câmara dos Deputados

Conforme o texto aprovado na Câmara, todas as orientações do Conanda sobre casos de estupro de vulnerável seriam canceladas. Na prática, isso altera o protocolo atualmente adotado nos hospitais e unidades de saúde: a resolução vigente do Conanda dispensa a exigência de boletim de ocorrência, de autorização judicial e até do consentimento dos responsáveis para realização de aborto legal em crianças e adolescentes, nos casos em que essas exigências representem risco ou impedimento ao procedimento ou à proteção da vítima. Também prevê que, havendo conflito entre a vontade da criança e a dos pais/responsáveis (por exemplo, se o agressor for o próprio pai ou parente), a Defensoria Pública e o Ministério Público devem ser acionados para garantir os direitos da menor. O PDL 3/2025 cancela essas diretrizes, o que na prática restabelece barreiras burocráticas: passa a exigir registro policial da ocorrência e aval do Judiciário para que meninas estupradas acessem o aborto previsto em lei, além de presumir a necessidade do consentimento dos pais ou responsáveis. Essas exigências adicionais revitimizam as meninas e atrasam o atendimento médico, muitas vezes inviabilizando a intervenção dentro do prazo adequado. Outro efeito do projeto é proibir ações informativas e preventivas: o texto impede que profissionais de saúde orientem as vítimas sobre seu direito ao aborto legal e também veda campanhas públicas de conscientização contra o casamento infantil (uniões entre adultos e menores), iniciativas que haviam sido recomendadas pelo Conanda como parte da estratégia de proteção à infância. 


Os proponentes do PDL 3/2025 defendem que a medida visa proteger crianças e punir estupradores, argumentando que a resolução atual facilitaria a “impunidade” ao não exigir prontamente uma denúncia formal. Em discurso no plenário, a deputada Chris Tonietto afirmou que “a violência sexual não pode ser combatida com o aborto”, o qual ela classificou como “outra violência”, dizendo que o caminho para enfrentar o abuso de menores é o fortalecimento da segurança pública e da investigação policial, e criticou o fato de a norma do Conanda dispensar até mesmo o boletim de ocorrência do estupro. Na mesma linha, a deputada Bia Kicis (PL-DF) argumentou que não obrigar a notificação policial favoreceria os estupradores, pois muitos casos poderiam deixar de ser investigados sem o registro formal: “Quando você libera o boletim de ocorrência, você está favorecendo o estuprador. Não está defendendo as crianças”. Já o deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) foi além e acusou a resolução de “viabilizar o aborto sem autorização dos pais, sem exame de corpo de delito, sem B.O. ou limite de tempo de gestação”, declarando que o Congresso precisava “frear a indústria do aborto, a cultura da morte” no país. Segundo esses parlamentares, a prioridade deve ser punir agressores e evitar “incentivos” ao aborto, cabendo aos pais ou responsáveis, e não ao Estado, a decisão final nos casos envolvendo meninas menores de 14 anos grávidas em decorrência de estupro. 
Os autores do projeto também sustentam um argumento legalista: afirmam que a resolução do Conanda usurpou competências do Legislativo ao detalhar procedimentos que, em sua visão, extrapolam o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O trecho da norma que retira dos pais a decisão sobre interromper a gravidez da filha (quando há suspeita de abuso intrafamiliar) foi citado como contrário ao Código Penal, já que este atribui aos representantes legais a responsabilidade por menores incapazes. Outro ponto contestado por Tonietto e aliados é que a resolução, segundo eles, não estabeleceu um limite gestacional para o aborto em vítimas mirins, o que “na prática autorizaria abortos até perto de 40 semanas” de gravidez, uma interpretação questionada pelos críticos, mas usada pelo relator Luiz Gastão (PSD-CE) para justificar a sustação da medida. “Admitir que um órgão do Executivo desconsidere por completo a viabilidade fetal e estabeleça a possibilidade de abortos em gestações avançadas […] revela-se incompatível com o Código Penal”, argumentou Gastão, citando que mesmo países onde o aborto é legal impõem prazos de corte. Em suma, na  justificativa oficial do PDL 3/2025 consta a alegação de que “o aborto não constitui um direito” propriamente dito, e que a orientação do Conanda estaria flexibilizando excessivamente a prática ao dispensar requisitos formais.


A reação de diversos setores ao projeto foi imediata e contundente. Parlamentares da oposição, organizações da sociedade civil, órgãos governamentais de direitos humanos e especialistas em direito qualificam o PDL 3/2025 como um enorme retrocesso legal e humanitário, acusando-o de punir as vítimas em vez dos agressores. A Bancada do PT na Câmara votou contra a matéria e vem se pronunciando fortemente a respeito. A deputada Maria do Rosário (PT-RS), ex-ministra de Direitos Humanos, classificou o projeto como “cruel e inconstitucional”, por violar o princípio da proteção integral à criança previsto na Constituição e no ECA. “Trazer esse tema para o plenário é atrasar os procedimentos adequados diante de crianças que foram violentadas. Manter uma criança estuprada em condição de violência permanente é inaceitável”, declarou Rosário durante o debate. Érika Kokay (PT-DF) salientou que a resolução do Conanda “não cria novos direitos, apenas detalha como aplicar a lei para salvar vidas”, já que o aborto em caso de estupro já é permitido por lei há décadas, e criticou os setores conservadores que tentam obrigar meninas a levar adiante gestações resultantes de estupro. “Há quem queira forçar uma criança de 9 ou 10 anos a ser mãe, mesmo que isso lhe custe a vida. […] Quem ataca essa resolução está atacando a vida das crianças e adolescentes deste país”, protestou Kokay em plenário.


Entre os órgãos governamentais, tanto o Ministério das Mulheres quanto o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) emitiram notas oficiais condenando a aprovação do PDL. A pasta das Mulheres afirmou que “ao anular essa orientação, [o PDL] cria um vácuo que dificulta o acesso dessas vítimas ao atendimento e representa um retrocesso em sua proteção”. Já o MDHC destacou que a resolução do Conanda tinha por objetivo garantir celeridade e atendimento integrado às vítimas, conforme já previsto em leis como o ECA, a Lei da Escuta Protegida (13.431/2017) e a Lei do Minuto Seguinte (12.845/2013), todas normas que dispensam a exigência de B.O. ou autorização judicial para o aborto em caso de estupro justamente para evitar revitimização. Suspender seus efeitos constitui grave retrocesso na política de proteção à infância, cria barreiras ao acesso a direitos fundamentais e fragiliza o atendimento especializado previsto em lei, alertou a secretária nacional da criança do MDHC em nota à imprensa. 


Entidades da sociedade civil e especialistas independentes endossam as críticas. Diversos movimentos de mulheres e direitos humanos apelidaram o PDL 3/2025 de “PL da Pedofilia”, numa inversão irônica, sugerindo que a proposta, em vez de combater abusadores, acabaria por “beneficiar pedófilos” ao forçar meninas violentadas a manterem gestações indesejadas. “Chamamos essa medida pelo nome que ela merece: a PL da Pedofilia. Porque quem obriga uma criança violentada a parir defende a continuidade da violência sexual infantil; quem nega o aborto legal a uma menina estuprada protege o agressor e pune a vítima”, escreveram Rafaella Florencio e Jenni Dantas, do coletivo feminista Pão e Rosas, em nota pública divulgada logo após a votação . Juristas e defensores de direitos da criança também apontam possíveis ilegalidades e conflitos constitucionais no projeto: ao negar efetividade a direitos assegurados (como o atendimento de saúde emergencial a vítimas de estupro, previsto na Lei 12.845/2013) e contrariar o princípio do melhor interesse da criança, o PDL pode ser alvo de ações judiciais. “É ferir de morte o Estatuto da Criança e do Adolescente e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário”, opinou a advogada Giovana Verdura, especializada em direitos sexuais, em entrevista ao portal Jota.info (em referência às obrigações do país de proteger crianças da tortura e tratamento degradante, categorias nas quais a gravidez forçada de meninas se enquadraria). Integrantes do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil também discutem a possibilidade de acionar o Supremo Tribunal Federal caso a medida seja definitivamente aprovada, por afronta a cláusulas de direitos fundamentais (até o momento, entretanto, não há confirmação de ação judicial concreta). 


Além do impacto direto sobre vítimas de violência sexual, analistas alertam para o uso político da pauta da “pedofilia” como pretexto para censura e ataques a direitos de expressão e informação. Organizações de direitos digitais e coletivos LGBTQIAP+ destacam que um discurso moralizante em torno do combate à pedofilia vem sendo empregado para justificar projetos de lei que cerceiam discussões sobre gênero, sexualidade e arte, sob a alegação de “proteção da infância”. Um levantamento do portal CartaCapital mostra que, de 2019 a 2024, foram apresentados mais de 100 projetos de lei nas esferas federal e estaduais mirando crianças e adolescentes LGBTQIAP+, muitos deles promovendo censura em salas de aula, proibição de materiais didáticos sobre diversidade, veto a eventos culturais e restrição de publicidade com temática LGBT para o público jovem. Esses projetos frequentemente tramitam sob títulos genéricos de proteção infantil, mas entidades como a ONG Observatória e a Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos têm denunciado que acabam por excluir e silenciar minorias, ao confundir educação sexual ou reconhecimento da diversidade com “ameaça” às crianças.


No contexto atual, novas proposições legislativas ligadas ao tema pedofilia também suscitam preocupação entre defensores da liberdade de expressão. Exemplo: o PL 2685/2025, de autoria do deputado Julio Cesar Ribeiro (Republicanos-DF), que tramita na Câmara, busca tipificar como crime a “apologia à pedofilia” por meio de conteúdo audiovisual com personagens de aparência infantil. Embora o objetivo seja coibir a divulgação de material que sexualize crianças (como animações, bonecos ou deepfakes envolvendo menores), críticos temem que conceitos vagos possam dar margem à censura de obras artísticas ou educativas legítimas. Representantes do campo cultural lembram casos em que exposições de arte, peças de teatro e até livros foram alvo de ataques sob acusação infundada de “pedofilia” ou “pornografia infantil”, em geral, motivados por grupos ultraconservadores. “Há uma paranoia sobre a pedofilia que acaba atingindo produções culturais de forma indiscriminada”, afirmou o cientista político Luis Felipe Miguel, ao analisar episódios recentes de censura moral no país. Educadores também receiam que programas de educação sexual nas escolas, essenciais para prevenir abusos, sejam prejudicados: “Chamar qualquer debate sobre corpo e sexualidade de ‘erotização precoce’ ou ‘incentivo à pedofilia’ impede que crianças aprendam a se proteger de fato”, observou uma representante da ONG Mães pela Diversidade. Em suma, os especialistas alertam que, se não houver definições precisas e salvaguardas, o “combate à pedofilia” pode virar instrumento de perseguição a conteúdos pedagógicos, comunidades LGBTQIA+ e manifestações artísticas, sob o manto de uma suposta defesa da moral e dos bons costumes. 


A aprovação do PDL 3/2025 provocou forte repercussão nacional, com manifestações de repúdio em redes sociais, abaixo-assinados e pronunciamentos de figuras conhecidas. Celebridades e ativistas denunciaram o projeto, destacando o impacto sobre meninas vítimas de estupro. A cantora Anitta afirmou que o país “precisa de mais mulheres na política”, enquanto a atriz Luana Piovani chamou o texto de “PDL da pedofilia” e lembrou que “criança não é mãe, criança não é esposa”, lema que viralizou nas redes como #CriançaNãoÉMãe.

Ato em favor da descriminalização do aborto. Foto: Rovena Rosa - Reprodução: Agência Brasil
Ato em favor da descriminalização do aborto. Foto: Rovena Rosa - Reprodução: Agência Brasil

Organizações da sociedade civil também reagiram com uma petição online que reuniu milhares de assinaturas, pedindo ao Senado que rejeite o projeto. Hashtags como #PDLdaPedofilia e #CriançaNãoÉMãe dominaram as redes, impulsionadas por vídeos explicativos e manifestações de repúdio. Entidades de direitos humanos publicaram notas denunciando o retrocesso e cobrando que o texto seja arquivado.
 

Arte compartilhada por Manuela D’Ávila em protesto contra o PDL - Reprodução: Instagram Manuela D’Ávila

Arte compartilhada por Manuela D’Ávila em protesto contra o PDL - Reprodução: Instagram Manuela D’Ávila

Enquanto isso, grupos conservadores e religiosos celebraram discretamente a aprovação, tratando-a como vitória “pró-vida”. Em contrapartida, especialistas em saúde e direitos da infância alertaram que obrigar meninas estupradas a manter gestações é uma forma de violência institucional, reacendendo o debate sobre o que realmente significa proteger as crianças.


Se o PDL 3/2025 for aprovado também no Senado, as diretrizes do Conanda deixarão de valer imediatamente, mudando o protocolo de atendimento a vítimas de estupro. Hospitais e profissionais de saúde passarão a exigir registro policial e autorização judicial antes de realizar o aborto, mesmo em casos de meninas de 10 a 13 anos. Isso reduzirá o acesso ao aborto legal, aumentando o número de partos infantis forçados.


Entre 2013 e 2023, o Brasil registrou mais de 232 mil nascimentos de bebês cujas mães tinham até 14 anos, a maioria decorrente de estupros. Em 2023, apenas 154 meninas conseguiram realizar o aborto legal. Sem as diretrizes do Conanda, o acesso tende a se tornar ainda mais difícil. A médica Paula Viana, da ONG Curumim, resume: “Sem essa proteção, mais meninas serão obrigadas a parir seus estupradores”.

Após décadas de avanços, a criminalização do aborto e a falta de políticas públicas interseccionais seguem colocando em risco a vida de mulheres negras e pobres no Brasil
por
Por Joana Prando e Luiza Zaccano
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11/11/2025 - 12h

 

Por trás das estatísticas sobre abortos clandestinos e violência obstétrica, há uma história de silenciamento. O corpo das mulheres, especialmente o das negras e periféricas, segue sob a tutela de um Estado que criminaliza a autonomia, evidenciado pelo fato de que mulheres negras têm 46% mais probabilidade de recorrer ao aborto no Brasil, e de uma sociedade que trata direitos como moralidade, o que também vemos na mortalidade materna, na qual mães negras morrem em média duas vezes mais que mães brancas.


O corpo feminino é alvo de vigilância e controle por autoridades masculinas. Na tradição cristã ocidental, o corpo feminino frequentemente é associado ao pecado e à tentação. Essa concepção legitima a vigilância e a regulação da figura feminina pela Igreja, que estabelecia e ainda impõe moralidades sobre a virgindade e a maternidade. 

A partir do século XIX, a medicina consolidou discursos para patologizar o corpo e a sexualidade feminina, como a histeria, caracterizado pelo excesso de emoções e perda de controle, diagnosticada majoritariamente em mulheres. Isso indica como a ciência foi utilizada como mecanismo de manutenção para a ideia de que figuras femininas eram instáveis e necessitavam de tutela masculina. Do ponto de vista jurídico, as legislações históricas também revelam esse controle. Quando o Código Penal de 1940 definiu o aborto como crime, o fez sob o olhar de um país governado por homens e moldado por valores patriarcais. As exceções previstas, raras e sempre sob o filtro da moral masculina, tratavam a decisão sobre o corpo feminino não como um direito, mas como concessão. Essa lógica atravessava também o casamento: a mulher só podia agir sobre si com a permissão do marido, como se sua autonomia fosse um privilégio a ser concedido, não uma condição natural.
 

Nos Estados Unidos, durante a década de 1970, o aborto era um tópico central no movimento feminista, pois a partir dele, poderia haver a emancipação da mulher. No entanto, a comunidade afro-estadunidense se mantinha distante do movimento, já que o controle de natalidade tinha forte componente racial e legitimava interesses racistas. A partir de um estudo comparativo feito pela PubMed, estima-se que entre 1970 e 1975, cerca de 2,3 milhões de mulheres nos EUA fizeram laqueadura, em que a maioria ocorria após o parto. Mulheres não-brancas tinham taxas de esterilização aproximadamente duas vezes maiores que as mulheres brancas.
 

Tipos de laqueadura - Reprodução: G1

No Brasil, a esterilização em massa foi uma estratégia utilizada pelo racismo, mascarada de planejamento familiar, que consistia na esterilização massiva de mulheres negras e jovens, e na distribuição em larga escala de pílulas e dispositivos intrauterinos. Tais procedimentos médicos, não eram informados devidamente para as mulheres, assim como suas consequências. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 1986 mostrou que 49,3% das mulheres que usavam métodos contraceptivos estavam esterilizadas. Além disso, o índice do procedimento contraceptivo cresceu em áreas mais pobres e era mais presente entre mulheres com menos escolaridade. Com a criação da CPI da Esterilização, em 1991, foi constatado que houve a prestação inadequada de serviços, abuso de métodos irreversíveis. 
 

Como aponta a professora Vanessa Souza de Oliveira, do curso de jornalismo na PUC-SP e no Mackenzie, episódios de violência reprodutiva em mulheres não são uma exceção. “A gente ainda sofre essas violências de maneiras diferentes. Um exemplo na minha família: minha avó paterna teve um DIU implantado sem qualquer aviso. Ela foi à Santa Casa por causa de uma apendicite, se não me engano, e só anos depois descobriu que tinha um DIU dentro do corpo. Ninguém informou nada. E a dor era absurda: o corpo passa um, dois anos tentando expulsar aquilo até se adaptar. Só descobriu muito mais velha  e, pior, já tinha ultrapassado o tempo seguro de uso daquele dispositivo.” Histórias assim são comuns em famílias negras e mestiças. São violências silenciosas, muitas vezes descobertas décadas depois. E o mais preocupante é que estamos vivendo uma onda conservadora em que práticas desse tipo voltam a ser tratadas como aceitáveis: esterilizações e intervenções feitas sem consentimento, sem explicação, sem garantir o mínimo de informação sobre o próprio corpo.”
 

A criminalização da prática do aborto impacta diretamente a vida reprodutiva. O racismo e as relações patriarcais se articulam construindo um contexto de desigualdades e vulnerabilidade para mulheres negras e pobres que precisam recorrer ao aborto clandestino. A criminalização do aborto não evita que esse procedimento não ocorra, ao contrário, empurra práticas para a clandestinidade e para ambientes inseguros.
 

No Brasil, o aborto é crime exceto em casos de risco de vida para a mulher, estupro e anencefalia fetal. A ausência de políticas públicas interseccionais que integrem recortes raciais, de gênero e socioeconômicos na saúde perpetua a exclusão. A partir de um levantamento feito pelo G1 com dados do DataSus, no primeiro semestre de 2020, o número de mulheres atendidas por abortos mal-sucedidos, tenham sido provocados ou espontâneos no Brasil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) foi 79 vezes maior que o de interrupções de gravidez previstas pela lei. Apenas no primeiro semestre de 2020, o SUS gastou quase 30 vezes mais com procedimentos pós-abortos incompletos do que com interrupções previstas em lei, R$ 14,29 milhões em comparação com R$ 454 mil.
 

O enquadramento penal (artigos 124–126) transforma um problema de saúde e de direitos reprodutivos em questão forense, ampliando estigmas e dificultando o acolhimento médico adequado. A criminalização, além de não reduzir a ocorrência do aborto, sustenta a ilegalidade e a punição seletiva, como visto no sistema de justiça, que criminaliza rotas da vida reprodutiva que recai com mais força sobre mulheres pobres e racializadas, enquanto mulheres brancas com mais poder econômico permanecem intactas. Um levantamento feito pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro, apontado entre 2005 à 2017, revelam que a maioria das mulheres processadas por aborto no Rio de Janeiro são negras e pobres.
 

A junção da interseccionalidade, sendo ela, a coexistência de desigualdades de gênero, raça e classe, revelam que as mulheres negras e em situação de pobreza são as que mais realizam o aborto em locais com pouca ou nenhuma higiene e sem supervisão médica. Segundo a Pesquisa Nacional do Aborto (PNA 2016–2021), mulheres negras têm 46% mais chance de realizar um aborto do que mulheres brancas, em qualquer faixa etária. Aos 40 anos, 21% das mulheres negras já teriam recorrido ao procedimento, contra 15% das brancas. Esses números refletem não apenas desigualdades raciais, mas também econômicas e territoriais, são as mulheres de menor renda, escolaridade e acesso a serviços de saúde que mais se submetem a abortos clandestinos, muitas vezes em locais sem higiene adequada e sem supervisão médica.
 

As estatísticas e relatos expõem um projeto histórico de controle sobre os corpos femininos, sobretudo os corpos negros e periféricos. Entre a criminalização do aborto e a esterilização forçada, persiste a mesma lógica de tutela que nega às mulheres o direito de decidir sobre si mesmas. Enquanto o debate público seguir guiado por moralistas e não por políticas de saúde baseadas em justiça e igualdade, a liberdade reprodutiva continuará sendo um privilégio de poucas.
 

Editado por: Carolina Zaterka

 

Segundo Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), pessoas cis têm o dobro de expectativa de vida que pessoas da comunidade LGBTQIA+
por
Annick Borges
Chiara Abreu
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11/11/2025 - 12h
Gráfico sobre estados que mais assassinaram pessoas trans

Enquanto a expectativa de vida no Brasil é de 76,4 anos, para a comunidade trans esse número cai pela metade. O país é o que mais mata pessoas trans e travestis no mundo, refletindo a vulnerabilidade interseccional enfrentada especialmente por mulheres trans. Com a falta de projetos de lei que protejam as pessoas, a necessidade de buscar alternativas para moradia e renda, colaboram para a redução da longevidade.  

Muitas mulheres trans, ao se assumirem, são expulsas de casa. O mercado de trabalho, assim como toda a sociedade, ainda é muito preconceituoso. Uma pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de 2020, indicou que apenas 13,9% das mulheres trans e travestis tinham emprego formal. Para sobreviver, elas se prostituem. A ANTRA estima que cerca de 90% das mulheres trans recorrem ao trabalho como forma de sobrevivência.  

Em entrevista para o programa “#provoca”, da TV Cultura, a deputada Erika Hilton conta parte de sua história. “Eu não queria viver da prostituição. Com 14 anos de idade você não quer ser prostituta. E aí você não tem emprego, não tem condições de trabalho, você não tem idade e o seu corpo é constantemente acessado através do sexo.”   

A comunidade lida de forma cotidiana com a invisibilidade e institucionalização da violência, o que estabelece um ciclo de exclusão e marginalização desses corpos. Foram 122 casos de assassinatos contra travestis e mulheres transexuais no ano de 2024, segundo “Dossiê de assassinatos e violência contra travestis e transexuais brasileiras”. Essa é a primeira vez que o número de casos ficou abaixo da média de assassinatos, que, naquele ano, foi de 125 assassinatos. 78% dos crimes ocorrem justamente com as profissionais do sexo, a maioria atuando nas ruas. 77,5% dos assassinatos aconteceram em espaços públicos.   

O descaso com a população trans também está no acesso à saúde pública. Em 2024, no Dia Internacional dos Direitos Humanos, o Ministério da Saúde apresentou o programa Pop Paes Trans, com objetivo de ampliar o acesso e melhorar a qualidade da atenção em saúde para pessoas trans e travestis. O que seria um grande avanço para a comunidade, se encontra paralisado há pelo menos 10 meses. O programa regulamentaria a realização de cirurgias de readequação e autorização do uso de hormônios aos jovens de 16 anos. Em entrevista à Agência Brasil, 15% dos entrevistados disseram que raramente ou nunca vão ao médico. Além disso, 54% das pessoas que usam hormônio fazem por conta própria, e 44% das travestis já utilizaram silicone industrial.  

 

Editado por: Beatriz Manocchio e Sophia Aquino

 

Universidade enfrenta diversas barreiras em equalizar o cotidiano dos alunos
por
Davi Rezende
Rafael Pessoa
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11/11/2025 - 12h

 

Em protestos realizados no ano de 2025 por alunos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), diversos problemas envolvendo questões de acessibilidade no campus foram denunciados. Durante a ocupação do Movimento Estudantil, em maio, no campus Monte Alegre, vários alunos de diferentes cursos sugeriram, dentre diversas pautas, ações concretas da Reitoria e da Fundação São Paulo (FUNDASP), mantenedora da universidade, em relação aos problemas no espaço frequentado pelos estudantes.

Esta manifestação abrangia pautas frequentes entre os alunos PCD, principalmente em relação aos problemas de mobilidade no campus da universidade. A unidade Monte Alegre é dividida em dois prédios, o Edifício Cardeal Motta (“Prédio Velho”) e o Edifício Reitor Bandeira de Mello (“Prédio Novo”), este último sendo o mais moderno em relação às formas de locomoção. Os estudantes circulam entre cinco dos seis andares do prédio através de rampas e elevadores, com o espaço mais acima do edifício sendo acessível somente pelas escadas de incêndio.  

Em questão ao “Prédio Velho”, a locomoção se dá exclusivamente por escadas, sem a presença de rampas, elevadores ou qualquer meio de mobilidade acessível a alunos PCD. A conexão do edifício com os outros espaços da universidade também não é acessível, à exceção da rampa principal, presente na entrada da universidade através da rua Monte Alegre. 

Rampas do prédio novo da PUC-SP, unidade monte alegre, com carteiras bloqueando a passagem, em manifestações do movimento estudantil
Alunos da PUC-SP fazem piquetes nas rampas em manifestações - Foto: Reprodução/Facebook 

Após o período de férias, o volta às aulas foi marcado por algumas reformas, o seu refeitório universitário, conhecido como bandejão, e uma nova loja da Havan. Em uma entrevista dada ao jornal-PUC pela gerente do setor de Arquitetura e Infraestrutura da Fundasp, Ana Maria Eder afirmou: “A reforma trará contemporaneidade, conforto e uma revitalização geral da praça de alimentação, convidando a comunidade a frequentá-la ainda mais”. Em contrapartida, em uma pesquisa feita entre os alunos do curso de jornalismo da universidade, em sua grande maioria foi apontado que não há acessibilidade e pontuado também por alunos que não têm muitos lugares para cadeira de rodas no bandejão. 

Lucas Oliveira, estudante de RI na PUC-SP, nos procurou queixando-se sobre a infraestrutura do campus, que devido a sua dificuldade de locomoção se tornaram problemáticas. Lucas que entrou na universidade em 2018 afirma: ”os maiores desafios eu encontro até hoje, na verdade, por que eu não tenho autonomia para acessar o campus”. Essa questão foi trazida pelo estudante como seu maior desafio, contando que necessita de uma segunda pessoa, seja ela funcionário, aluno, professor ou alguém que esteja passando por perto, para poder utilizar o campus. 

Além disso, a PUC carece de representatividade, assim como disse o estudante: “Eu não acho que a PUC possui um perfil de alunos ou até mesmo docentes diversificados a ponto de representar as mais diversas pessoas que possam frequentar a instituição.” Atualmente a universidade conta com diversos coletivos que são ativos no movimento estudantil, fato que foi visto e comprovado nas manifestações, mas nenhum deles representa a comunidade PCD que depende do Setor de atendimento comunitário, o PAC, para resolverem suas queixas.

Entrada do prédio velho da PUC-SP, campus Monte Alegre
Prédio velho da PUC-SP sofre com falta de acessibilidade - Foto: Reprodução/Youtube

No site da instituição eles colocam como principal projeto Inclusão e Diversidade que,segundo eles, “Tem o compromisso de contribuir com a construção de um ambiente universitário inclusivo e representativo, atuando no âmbito das Políticas Afirmativas.”

O estudante conclui que “Em termos de ensino, oportunidades no mercado e professores a PUC é muito boa” e acrescentou que se sente bastante confortável na universidade, “não sei eu tenho um carinho especial pela PUC”. Por fim adicionou “Entretanto em termos de acessibilidade a PUC deixa muito a desejar”.

Editador por: Ian Ramalho e Lucal Leal

O programa tem como objetivo ampliar os atendimentos dos restaurantes Bom Prato Móvel visando o alcance da população periférica
por
Gusthavo Sampaio
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11/04/2023 - 12h
Fila nas instalações do Bom Prato
Fila nas instalações do restaurante popular Foto: Reprodução/Estadão

A Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo anunciou nesta semana o número de refeições servidas pelo programa Bom Prato Móvel. Com 27 unidades em operação, o governo contabilizou cerca de 1,7 milhão de marmitas entregues. O recorte é inserido no período entre março de 2022 até março de 2023.

A previsão é de alcançar 2 milhões de refeições até o final do ano, com mais sete unidades do Bom Prato Móvel sendo instaladas, nas regiões da Capital (Itaquera e Parelheiros), Grande São Paulo (São Bernardo do Campo II, Diadema e Embu das Artes) e no Interior (Taubaté e Limeira), totalizando 34 pontos. 

Após atingir a marca, o secretário estadual do Desenvolvimento Social, Gilberto Nascimento concedeu um depoimento: “Quando se trata do enfrentamento à fome, precisamos entender as demais vulnerabilidades da população. As pessoas que não têm dinheiro para comer, não terão recurso para o transporte até o Bom Prato mais próximo. Por isso, precisamos garantir que o alimento chegue até as pessoas que vivem em áreas mais distantes e assoladas pela pobreza e extrema pobreza”, comenta.

O programa Bom Prato

Criado em 28 de dezembro de 2000, durante o governo de Mario Covas (PSDB ), o projeto tem como objetivo levar refeições saudáveis e de alta qualidade para a população de baixa renda do Estado de São Paulo, visando a segurança alimentar dessa população.

No ano de 2022, o Brasil retornou para o Mapa de Fome da ONU (Organização das Nações Unidas), com a marca de 4,1% da população sofrendo pela falta de alimentos, sendo o percentual necessário para entrar no mapa  2,5%. Segundo uma pesquisa feita pela Rede Penssam (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), entre dezembro de 2021 e abril de 2022, o Estado de São Paulo acumulou o maior número de pessoas com fome no país, cerca de 6,81 milhões, o equivalente a aproximadamente 15% da população do estado. 

O primeiro restaurante Bom Prato foi inaugurado em janeiro de 2001, no bairro dos Campos Elíseos, atualmente existem 72 unidades fixas espalhadas pelo Estado. A vertente Móvel foi iniciada em dezembro de 2021, durante a gestão João Doria (PSDB), na região de Perus, Zona Norte, e conta com 27 unidades. Apesar da quantidade de restaurantes, um dossiê produzido pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, em 2022, afirma que muitas pessoas em situação de rua não têm acesso às instalações, pois habitam em locais com mais de um quilômetro de distância dos restaurantes.

O programa é coordenado pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e conta com uma estimativa de R$ 59,2 milhões de investimento, que cobrem as refeições e as instalações das unidades.

 

Informações

Todos restaurantes funcionam de segunda a sexta-feira, havendo uma divisão em três períodos para as refeições:

Café da manhã: 7h

Almoço:          10h30 (Preferencial para Idosos)

                        11h00 (Público geral)

Jantar:             17h   

As unidades de Bauru, Campinas, Carapicuíba, Franca, Rio Claro, São José dos Campos, Santos I, Taubaté e Santana, abrem de segunda a sábado.

As unidades de 25 de Março, Brás, Campos Elísios, Guaianases, Lapa e São Mateus, abrem de segunda a domingo.

Preços:

Café da manhã: R$ 0,50

Almoço e jantar: R$ 1,00

Existe a possibilidade de gratuidade das refeições para pessoas em situação de rua, por meio de um cartão com QR Code. As prefeituras são responsáveis por esses cadastros e pela entrega  dos cartões, que serão utilizados nos restaurantes.

Confira os endereços de todas as unidades: https://www.desenvolvimentosocial.sp.gov.br/bom-prato-funcionamento/

 

Carlos Viana, responsável pelo Esporte na cidade, fez a promessa aos vereadores da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da Câmara da capital.
por
Artur Maciel Rodrigues
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08/04/2023 - 12h

 

O Secretário Municipal de Esporte e Lazer, Carlos Augusto Viena, apresentou à comissão de Educação cultura e Lazer da Câmara Municipal, no início deste mês, os novos planos para ampliar os serviços de sua pasta para 2023.

Uma das propostas é o conjunto de reformas no parque Ceret na Vila Regente Feijó, zona leste da capital. Entre elas estão a renovação do campo de Rugby, o primeiro desse tipo instalado e autenticado pela Federação Nacional de Rugby na cidade "Uma grande conquista", disse o representante do executivo. Além disso, segundo Viana, a prefeitura também irá revitalizar a pista de atletismo do parque, prometida pelo prefeito Ricardo Nunes em outubro de 2022.

BOLSA ATLETA SP

Também foi discutido na comissão o futuro da Bolsa Atleta SP, projeto que fornece bolsas para atletas olímpicos, paraolímpicos, pan-americanos e parapan-americanos entre 13 a 21 anos. Ele foi reestruturado em 2022 e aberto novamente em março deste ano. "Contemplamos 181 crianças e agora o prefeito Ricardo Nunes deu a possibilidade dele chegar a até mil atletas na cidade de São Paulo" disse o secretário, que ressaltou a importância da educação para os esportistas: "muitas vezes o atleta no Brasil deixa de ter uma formação escolar para se dedicar ao esporte, é um absurdo isso" conclui ele.

Audiência Pública realizada na Câmara Municipal ficou marcada pela insatisfação dos participantes com o atual modelo
por
Vitor Bonets
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08/04/2023 - 12h

Nesta quinta-feira (6), a Comissão de Política Urbana Paulo realizou a terceira Audiência Pública na Câmara Municipal de São Paulo para tratar da revisão do Plano Diretor Estratégico. O tema do dia foi “Eixo de Transformação da Estruturação Urbana” e o foco principal de discussão foram as propostas para melhoria de adensamento habitacional, a mobilidade da população em relação às atividades do cotidiano e o aumento de qualidade dos espaços públicos.  

O evento comandado pelos vereadores da Comissão De Política Urbana, teve também a presença de  representantes da Prefeitura e de moradores dos eixos da capital paulista. Fernando Henrique Gasperini, membro da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento e representante do Executivo, foi o responsável pela apresentação do projeto de revisão do PDE.

Nela, estavam presentes algumas mudanças, como a superação da cota parte máxima de terreno até o limite de 30m² e a alteração na quantidade de vagas consideradas não computáveis para empreendimentos não residenciais e mistos. Isso gerou uma grande discussão ao redor do ambiente. Dúvidas, declarações, depoimentos e opiniões surgiram a partir deste momento e foi a partir disto que a Audiência Publica aconteceu, de fato.

Após a apresentação, Fernando Henrique ainda disse que essa revisão tem o intuito de aperfeiçoar o Plano Diretor existente, que está vigente desde quando o prefeito de São Paulo era Fernando Haddad (PT). O projeto visa o aprimoramento de pelo menos 75 artigos presentes na Lei nº 16.050, de 31 de julho de 2014.

 

VEREADORES COM A PALAVRA        

 

O primeiro representante do legislativo a ter direito à palavra foi o vereador Professor Toninho Vespoli (PSOL). A respeito da velocidade que as audiências ocorrem, ele disse: “Para que uma rapidez desse jeito? Algo tão importante que é pensar a cidade, pensar como ela cresce e para quem esse crescimento dá o direito às pessoas. Então, eu sou totalmente contrário como isso está tramitando aqui na casa!” Logo depois de tecer críticas ao projeto apresentado de revisão, Toninho complementou: “Essa revisão do Plano Diretor é para atender o povo da cidade de São Paulo ou é para atender o Mercado Imobiliário?”

Em sequência, o Vice-presidente da Comissão, vereador Marlon Luz (MDB) concedeu o direito de fala para a vereadora Sylvia da Bancada Feminista (PSOL), que se mostrou totalmente oposta ao que foi proposto na reunião. A parlamentar considera que é necessário aproximar a moradia do trabalho, o que reduz o tempo de locomoção dos trabalhadores da cidade. Além disso, direcionou duras palavras ao Mercado Imobiliário ao mencionar que o mesmo se aproveita das brechas existentes na lei.

De acordo com Sylvia, a proposta do novo Plano Diretor prejudica as famílias de baixa renda. Ela afirmou: “O que está sendo proposto aqui vai piorar a situação dos eixos. Vão ter mais carros, apartamentos maiores. E o que vai acontecer com a população mais pobre? Vai ser expulsa! Vai morar cada vez mais na periferia! Está tudo errado aqui!”

 

SOCIEDADE CIVIL

 

Por parte dos moradores dos eixos da cidade de São Paulo, o cenário de criticas não foi diferente. O clima no salão da Câmara Municipal chegou a ficar pesado, em certo momento, com tantas manifestações proferidas ao que foi exposto. A insatisfação dos presentes marcou o evento e trouxe à tona a realidade vivida por diversos habitantes dos mais diversos lugares da capital paulista.

Reinaldo Renzo, morador da Vila Mariana, na zona centro-sul, questionou como pôde ter sido aprovado o atual Plano Diretor. Ainda assim, mostrou toda sua indignação com o que tem acontecido: “Eu acho um absurdo o que tem de liberação de construção! Isso não é um problema das construtoras. Isso é um problema dos políticos da cidade, que permitem essas construtoras fazerem o que quiserem!”

Já Rosanne Broncatelli, representante do Movimento Pró-Pinheiros, disse que deseja o controle das construções. “A Prefeitura está construindo para quem? É para os moradores?” Não! É para o setor imobiliário, que nem mora no bairro e nem em São Paulo.”

Mas se você pensa que o descontentamento da população parou por aí, está completamente enganado.  João Afif Acras cobrou pelo básico, infraestrutura. “As construtoras chegam primeiro, mas aí não vem a Sabesp, não vem a Enel, não vem ninguém. E os bairros ficam à mercê disso. O que acontece é falta de luz, falta de água, falta de saneamento básico...”  disse o morador da Aclimação.

 

FINALIDADE DA AUDIÊNCIA

 

Por fim, outros dois vereadores expressaram suas opiniões em relação à importância de realizar as audiências públicas e ouvir o que a população tem a dizer.

O primeiro, Rodrigo Goulart (PSD), também relator do colegiado, comunicou que todas as contribuições serão analisadas de forma técnica e jurídica para serem acolhidas no texto final.  Rodrigo destacou: “Estamos discutindo, recebendo toda a colaboração de cada um dos senhores e das senhoras. E espero alcançar o melhor entendimento entre todos.”

João Ananias (PT) ressaltou: “É importante que a gente ouça a voz do povo na hora de votar, ouça para o futuro. Nossos filhos precisam de uma cidade mais humanitária, mais igualitária e que a inclusão social atenda as gerações futuras!”

 

PRÓXIMOS PASSOS

 

A próxima Audiência Pública na Câmara Municipal de São Paulo será realizada pela Comissão Permanente de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente no dia 10/04 às 17:00. O evento é aberto à sociedade civil e é necessário apenas a realização de identificação na entrada do local para participar do debate.

A retirada das que estiverem montadas durante o dia na região central começou na segunda-feira 3 de abril.
por
Giuliana Barrios Zanin
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08/04/2023 - 12h

Na última sexta-feira (31), o Desembargador Ribeiro de Paula derrubou o projeto que impedia o desabrigo social aprovado pela juíza Juliana Brescansin Demarchi Molina da 7ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Essa decisão tinha sido recorrida pelo Deputado Federal do PSOL, Guilherme Boulos, e pelo Padre da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, Júlio Lancellotti, dois ativistas na frente da ocupação habitacional.

 

O PROCESSO

A liminar estava sob estudo de caso em 2020, no auge da Pandemia da COVID-19, e proibiu os fiscais responsáveis pelas evacuações de retirar quaisquer pertences pessoais, ao não ser objetos que atrapalhasse o percurso de calçadas e praças. O prefeito do município, Ricardo Nunes (MDB), respondeu ao G1 sobre a decisão  "Muito, muito importante essa decisão que caça a liminar, onde o seu autor defende as barracas nas ruas e calçadas de São Paulo. Rua não é endereço, barraca não é lar. Não é digno pessoas nas ruas expostas ao sol, chuva, sem banheiro, sem chuveiro, torneira". O político ainda completa com os planos públicos de abrigar os afetados em casas de 18 m² na Vila Reencontro que proporcionará espaços exclusivos para essa parcela, além de 3500 vagas em hotéis.

Na última sexta-feira (31), o Desembargador Ribeiro de Paula derrubou o projeto que impedia o desabrigo social aprovado pela juíza Juliana Brescansin Demarchi Molina da 7ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Essa decisão tinha sido recorrida pelo Deputado Federal do PSOL, Guilherme Boulos, e pelo Padre da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, Júlio Lancellotti, dois ativistas na frente da ocupação habitacional.

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Moradores de rua dormem dentro de barracas na Praça da Sé, no Centro de SP — Foto: Paula Paiva Paulo/G1

O DESABRIGO 

Com a crise econômica e o congelamento de serviços “não-essenciais” durante a quarentena, o número de populações sem-teto ou sem qualquer cuidado básico saltou 31%, em comparação a 2019. A cada calçada virada, há cada vez mais famílias passando dificuldade. Segundo dados da UFMG, há 20 mil vagas em abrigos para uma população de mais de 48 mil pessoas na capital paulista. A matemática não fecha.

A recente atividade de retirada das barracas começou em 6 de fevereiro deste ano com o subprefeito, coronel Álvaro Camilo, responsável pela administração do distrito da Sé afirmou ao SP2 que pretendia regulamentar o uso das tendas e até retirá-las durante o período matutino. Em períodos de comunicação com a parcela sensibilizada, a desmontagem dos pertences passou a ser mais exposta. Foi quando a Deputada Federal Erika Hilton (PSOL-SP), pediu um inquérito de investigação dessas ações e a Justiça concedeu bloqueio às movimentações municipais no dia dezessete.

 

O ANDAMENTO

Nas redes sociais, o prefeito se pronunciou sobre as unidades habitacionais citadas anteriormente, e até agora, 5962 chaves já haviam sido entregues às pessoas. Em um post no Twitter, o filiado ao MDB atualiza os trabalhos que estão sendo feitos e promete que “não vai faltar local para os que desejam ser acolhidos pelos programas da Prefeitura”.

Durante a semana, a Prefeitura de SP deve discutir sobre as consequências dessas desocupações, mas enquanto não há nenhum aviso, é importante que os programas de serviço público sejam fiscalizados socialmente para além da prévia institucional, já que a estatística de insegurança social de 2015 a 2019  cresceu  mais de 7000 indivíduos em situação de rua,  o que comprova que a pandemia não foi a única condição que proporcionou esse aumento, mas que também é um fenômeno estrutural e histórico de desigualdade socio-econômica.

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via story @prefeitoricardonunes


 

 

Vereadores de São Paulo denunciam ações truculentas de fiscais municipais
por
Marcela Rocha
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08/04/2023 - 12h
Barracas e lonas de pessoas em situação de rua. Foto: Ronaldo Silva/Photopress/Estadão Conteúdo
Barracas e lonas de pessoas em situação de rua. Foto: Ronaldo Silva/Photopress/Estadão Conteúdo

O número de sem-teto tem crescido nos últimos anos. Desde o início da pandemia de Covid-19 foram registradas 48 mil pessoas em situação de rua na capital paulista. A cidade de São Paulo abriga 25% dos sem-teto do país. É improvável caminhar pela cidade sem reparar na quantidade de pessoas vivendo em moradias improvisadas. O agrupamento de barracas de acampamento espalhadas pelas avenidas, por vielas ou mesmo debaixo de toldos comerciais aumentou consideravelmente.

Diante do problema habitacional, parlamentares como Silvia Ferraro (PSOL), Celso Giannazi (PSOL) e Luna Zarattini (PT) têm usados suas redes para denunciar o retorno de ações violentas de funcionários fiscais da prefeitura contra os sem-teto da capital paulista. Os cumpridores da lei tomam os pertences dessas pessoas, desde as barracas, cobertas e roupas, até seus documentos pessoais. A vereadora Silvia Ferraro tem demonstrado indignação sobre as ações através de suas redes sociais, chamando os atos de “desumanos” e atribuindo a responsabilidade dos atos ao prefeito Ricardo Nunes.

Em uma publicação compartilhada através do Instagram, Silvia conversa com Daniele, uma pessoa em situação de rua que relata no vídeo como teve seus bens levados pelo “rapa” (termo popular para se referir aos fiscais municipais) enquanto dormia. Sentada no chão de sua barraca, tocando nas pernas, pés e cabelos, Daniele gesticula com a cabeça para cima e para baixo, como quem parece concordar com as falas de Silvia, enquanto a parlamentar narra como a moça não conseguiu vaga em abrigos femininos noturnos e que a barraca serve como a acomodação vespertina que os abrigos não oferecem.

Publicação da vereadora Silvia ferraro
Publicação compartilhada pela vereadora Silvia Ferrado em seu perfil do Instagram, em conversa com Daniele.

A situação de Daniele é bastante comum. Ao ter além de seus objetos de subsistência levados pela prefeitura, a pessoa perde sua condição de cidadão e passa a ser ainda mais excluída dos espaços de convivências. Ser rejeitada por abrigos e órgãos de assistencialismo, assim como não conseguir comprovar sua naturalidade, são algumas das questões enfrentadas por Daniele e outros em condição semelhante.

A vereadora Luna Zarattini assinou o pedido para que a remoção das barracas a mando da prefeitura de São Paulo seja investigada. Em seu perfil no Instagram a parlamentar questiona em um vídeo o prefeito Ricardo Nunes sobre as ações: “se as pessoas não têm onde morar, e não conseguem atualizar o cadastro para recebimento dos benefícios, o que elas devem fazer? A população exige respeito e respostas.”

 

Vídeo publicado por Luna Zarattini em seu perfil no Instagram.
Vídeo publicado por Luna Zarattini em seu perfil no Instagram.

CONTEXTO

O problema da habitação no Brasil é estrutural. São 6 milhões de imóveis desocupados e 281,4 mil pessoas sem moradia, somando 6,9 milhões de famílias, e para entender o porquê de termos tantos imóveis vazios e pessoas sem casa é preciso compreender o processo de crescimento das grandes cidades e a especulação imobiliária.

Ao ocorrer a industrialização das grandes cidades, iniciou-se um movimento migratório de moradores e trabalhadores do campo para os grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro, com o objetivo de conseguir melhores condições de vida e de trabalho. A urbanização das cidades não acompanhou o processo de industrialização, e enquanto o número de habitantes, houve pouco incentivo governamental à construção de moradia popular nos centros, como a construção de vilas comunitárias e cortiços próximos aos locais de trabalho, em que o valor do aluguel era descontado dos salários dos funcionários.

Conforme as cidades foram se desenvolvimento economicamente as elites passaram a residir nos grandes centros, estimulando a construção de ambientes culturais, o que aumentou o valor dos aluguéis e forçou os trabalhadores a procurar moradia de valor mais acessível no entorno das cidades, nas chamadas regiões periféricas. Nas periferias as residências foram construídas pelos próprios moradores, muitas vezes sem realizar o tratamento e averiguação dos terrenos arenosos, em que havia risco de desabamento e deslizamento de terra.

As condições que podem levar alguém a viver nas ruas são inúmeras, e para sobreviver alguns procuram movimentos sociais relacionados a ocupações, e outros vivem em barracas, ambos correndo o risco de ter todos os seus pertencem levados pelo poder público.

Ao todo existem 7 milhões de imóveis desocupados no Brasil, sendo 6 milhões ilegais. De acordo com a Constituição, para garantir o direito à propriedade privada de um imóvel é necessário que o imóvel (rural ou urbano) esteja cumprindo sua função social, e caso contrário estará em situação de ilegalidade. A questão da política habitacional, assim como a urgência em amparar a população em situação de rua faz parte da perversidade Estatal e incerteza de um sem-teto sobre onde irá dormir no dia seguinte.