A ascensão das plataformas digitais como palco central da nova política e o desafio da polarização
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
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27/11/2025 - 12h

 

A imagem conceitual representa a polarização política. FONTE: Shutterstock / Imagem Conceitual

O cenário político contemporâneo foi drasticamente redefinido pela ascensão das redes sociais. O que antes era um mero canal de comunicação secundário transformou-se no principal palco de debate, engajamento e, por vezes, de acirrada polarização. Líderes e figuras públicas, de todas as ideologias, utilizam plataformas como X (antigo Twitter), Instagram, Facebook e TikTok não apenas para disseminar informações, mas para construir narrativas, interagir diretamente com eleitores e moldar a opinião pública.

A Onipresença Digital: Vantagens e Riscos

A presença massiva de políticos nas redes oferece uma série de vantagens:

  • Acesso Direto: Permite uma comunicação sem intermediários com o eleitorado, humanizando a figura pública e criando um senso de proximidade.

  • Mobilização: Ferramenta poderosa para organizar movimentos, manifestações e campanhas de forma rápida e eficiente.

  • Quebra de Monopólio: Diminui a dependência da mídia tradicional, permitindo que políticos e partidos estabeleçam suas próprias agendas.

No entanto, essa "democratização" da comunicação não está isenta de riscos e desafios:

  • Polarização e Bolhas: Os algoritmos das redes tendem a criar "bolhas" de informação, reforçando crenças existentes e expondo os usuários a conteúdo que confirma seus vieses, o que contribui para a polarização.

  • Desinformação (Fake News): A velocidade de propagação e a falta de filtros rigorosos tornam as redes um terreno fértil para a disseminação de notícias falsas, boatos e manipulação de informações, com sérias consequências para o debate público e a democracia.

  • Discurso de Ódio: A anonimidade e a falta de moderação eficaz em algumas plataformas facilitam a proliferação de discursos de ódio, ataques pessoais e campanhas difamatórias.

Foto de uma tela de celular com vários ícones de redes sociais misturados. Fonte: Depositphotos / Mídia Social e Política

Estratégias Digitais em Constante Evolução

A "nova política" é inerentemente digital. Políticos e suas equipes investem pesadamente em estratégias de marketing digital, análise de dados e criação de conteúdo. O uso de memes, vídeos curtos e transmissões ao vivo (lives) são táticas comuns para viralizar mensagens e engajar diferentes faixas etárias.

Observa-se também a profissionalização das equipes digitais, com especialistas em análise de sentimentos, SEO (Search Engine Optimization) e gestão de crises online. A capacidade de responder rapidamente a eventos e narrativas em tempo real tornou-se um diferencial competitivo crucial.

O Futuro da Política e das Redes

O fenômeno dos políticos nas redes sociais é irreversível. O desafio para as democracias é encontrar mecanismos para regular e fiscalizar o ambiente digital sem cercear a liberdade de expressão, garantindo que as plataformas sirvam como ferramentas de fortalecimento do debate público e não de sua deterioração. A busca por um equilíbrio entre a liberdade, a responsabilidade e a moderação de conteúdo continuará a ser um dos temas centrais dos próximos anos, moldando não apenas a política, mas a própria sociedade.

 

Unanimidade da 1ª Turma confirma preventiva e abre caminho para execução imediata da pena de 27 anos
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
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26/11/2025 - 12h

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, manter a prisão preventiva do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro. A decisão, referendada na segunda-feira (24), confirmou o decreto do ministro Alexandre de Moraes que converteu a prisão domiciliar do ex-presidente em preventiva no último sábado (22).

A manutenção da prisão ocorre no momento em que o processo final de condenação do ex-presidente na Ação Penal (AP) 2668 se aproxima do trânsito em julgado, permitindo que o ministro relator determine o início imediato do cumprimento da pena. Bolsonaro está detido na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília.

 

Ministro Alexandre de Moraes discursando na bancada. Fonte: STF (Supremo Tribunal Federal)

 

Argumentos da Corte e Motivação da Prisão Preventiva

A decisão unânime dos ministros da 1ª Turma (Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin) considerou que a prisão preventiva é imprescindível para garantir a ordem pública, assegurar a aplicação da lei penal e coibir o reiterado desrespeito às medidas cautelares impostas.

Os fatores centrais que motivaram a conversão da prisão domiciliar para preventiva são:

  1. Violação da Tornozeleira Eletrônica: A Polícia Federal apontou que o equipamento de monitoramento eletrônico foi violado intencionalmente pelo ex-presidente. Moraes classificou o ato como uma violação "dolosa e consciente", após o próprio Bolsonaro admitir ter usado um ferro de solda na tornozeleira, alegando ter agido sob "surto" e efeito de medicamentos.

  2. Risco de Fuga e Obstrução: O ministro relator citou o risco concreto de fuga, intensificado pela violação do equipamento e pela convocação pública para uma "vigília" em frente à residência de Bolsonaro, feita por um familiar. A Corte avaliou que essa mobilização poderia criar tumulto e facilitar uma eventual evasão.

 

Os Argumentos da Defesa

A defesa do ex-presidente apresentou recursos e pedidos que foram, em grande parte, rejeitados ou considerados prejudicados pela decretação da prisão preventiva.

  • Prisão Domiciliar Humanitária: O principal pleito da defesa foi a prisão domiciliar humanitária, citando o quadro de saúde frágil de Bolsonaro, que inclui gastrite, esofagite e crises de soluços. No entanto, o ministro Moraes considerou este pedido prejudicado com a prisão preventiva, embora tenha determinado o atendimento médico em regime de plantão na PF.

  • Contradições na Condenação: Nos recursos apresentados contra a condenação na AP 2668, a defesa alegou que a decisão foi baseada em provas frágeis e contradições no acórdão, e que o ex-presidente não teve participação direta nos atos que levaram à denúncia.

  • Inexistência de Risco: Advogados argumentaram que a prisão preventiva não se justificava, pois a situação já estava controlada pela prisão domiciliar, e Bolsonaro não representaria um risco iminente à sociedade.

Ex-presidente Jair Bolsonaro em evento público (imagem de arquivo). Fonte: Agência Brasil / EBC

 

A Condenação na Ação Penal 2668 e Execução da Pena

Jair Bolsonaro foi condenado pelo STF a 27 anos e 3 meses de prisão em regime inicial fechado, além de multa (124 dias-multa no valor de dois salários mínimos à época dos fatos), na Ação Penal (AP) 2668.

  • Crimes: O ex-presidente foi condenado, majoritariamente, por ser o líder da organização criminosa que articulou planos para impedir a posse do governo eleito em 2022, sendo réu pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

  • Trânsito em Julgado: O prazo para a defesa apresentar o último recurso contra a condenação encerrou-se nessa segunda-feira (24). Com isso, a Corte confirmou o trânsito em julgado para Bolsonaro.

  • Próximo Passo: O ministro Alexandre de Moraes está liberado para, a qualquer momento, determinar a expedição da guia de execução penal, documento que formaliza o início do cumprimento da pena em regime fechado. A sede da PF é apenas o local inicial da custódia, sendo o Complexo Penitenciário da Papuda, ou outra unidade compatível com sua condição de ex-presidente, o destino mais provável para o cumprimento da sentença.

Nova ferramenta deve integrar informações socioeconômicas relacionadas ao gênero
por
Marcela Rocha
Jalile Elias
Isabelle Maieru
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25/11/2025 - 12h
Foto: José Cruz/Agência Brasil
Ativistas participam da 5ª edição da CNPM. Foto: José Cruz/Agência Brasil

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A 5ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres (CNPM), ocorreu em Brasília entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro. Durante o evento foi anunciada a plataforma DataMulheres, criada pelo governo federal através do Ministério das Mulheres.

Desenvolvida entre uma parceria do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero e a Dataprev (empresa vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos), a tecnologia deve integrar informações de gênero e auxiliar procedimentos de pesquisas, observatórios, projetos e demais iniciativas de gestores públicos e instituições nacionais.

O encontro contou com a presença de 4 mil participantes de coletivos, movimentos sociais, deputadas, ministras e outras autoridades, além do oferecimento de palestras, redes de diálogo e stands para a exposição de livros e artesanatos produzidos por mulheres de todo o Brasil.

Na plenária final do evento foram aprovados o relatório de propostas para o novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e 33 moções, com 98% dos votos favoráveis. O resultado quase unânime reflete a assertividade de diálogos previamente realizados nas instâncias municipais e estaduais.

Com o intuito de reconhecer a pluralidade das 100 milhões de mulheres que vivem no Brasil, o texto do relatório foi dividido em 15 temas, entre eles a questão do fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho, igualdade salarial, desigualdades econômicas e raciais, fortalecimento da participação política de mulheres, autonomia econômica e o enfrentamento à violência de gênero.

Durante o evento, a Ministra das Mulheres, Márcia Lopes, afirmou que “a luta não acaba nunca”, sendo necessário construir “não somente o Brasil, mas a América Latina, o Caribe, um mundo de paz”, para que as mulheres sejam livres e em que não haja nenhum tipo de violência contra elas.

Mudanças incluem teto para operadoras, repasse mais rápido e interoperabilidade
por
Antônio Bandeira e Fábio Pinheiro
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24/11/2025 - 12h

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou no dia 11 de novembro o decreto que moderniza as regras do vale-refeição e vale-alimentação dentro do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). As mudanças criam um teto para as taxas cobradas pelos operadores, reduzem prazos de repasse aos estabelecimentos e definem novas obrigações para empresas e bandeiras do setor.

Entenda as mudanças mais importantes:

Redução de taxa: O texto fixa limite de 3,6% para a taxa cobrada dos restaurantes e outros estabelecimentos. Atualmente, segundo o governo, esse percentual chega a 15% em alguns casos. As empresas terão 90 dias para se adequar à nova regra. O decreto também estabelece teto de 2% para a tarifa de intercâmbio e proíbe cobranças adicionais.

Interoperabilidade: Em até 360 dias, qualquer maquininha deverá aceitar cartões de todas as bandeiras. A medida, conforme o Ministério do Trabalho, amplia a concorrência e facilita o uso do benefício pelos trabalhadores e pelos estabelecimentos.

Prazo de repasse aos comerciantes: Os restaurantes e supermercados passarão a receber em até 15 dias após a transação. Antes das novas regras, o pagamento ocorria em cerca de 30 dias, podendo chegar a 60.

Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert
Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert

As regras incluem ainda a abertura dos chamados “arranjos fechados”. Empresas que atendem mais de 500 mil trabalhadores terão 180 dias para migrar para sistemas abertos. A mudança deve reduzir a concentração de mercado e permitir que mais credenciadoras participem do sistema.

Além disso, o decreto proíbe práticas consideradas abusivas, como deságios, descontos indiretos, bonificações e vantagens financeiras não relacionadas à alimentação.

De acordo com o governo, mais de 22 milhões de trabalhadores e cerca de 330 mil empresas cadastradas no PAT serão afetados. O valor do benefício não muda e segue exclusivo para compra de alimentos.

Para o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, o decreto corrige distorções que vinham sendo cobradas por restaurantes, mercados e padarias. Ele afirmou que o governo discutiu o tema por dois anos com empresas e representantes do setor, mas não houve consenso para um acordo.

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados, João Galassi, disse que a medida aumenta a concorrência e deve melhorar o valor final disponível para o trabalhador. Segundo Galassi, a redução da intermediação permitirá que mais pequenos estabelecimentos aceitem os vales.

O decreto cria ainda um comitê gestor para acompanhar a implementação das novas regras, fiscalizar práticas abusivas e definir parâmetros técnicos para o funcionamento do sistema.

Congresso irá analisar nesta quinta-feira (27), os 63 vetos feitos pelo presidente Lula
por
CRISTIAN FRANCISCO BUONO COSTA
Antônio Bandeira de Melo Carvalho Valle
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24/11/2025 - 12h

A votação dos vetos ao novo marco do licenciamento ambiental virou um dos temas centrais da agenda do Congresso para novembro. Deputados e senadores se reúnem no dia 27 para decidir se mantêm ou derrubam os 63 trechos barrados pelo presidente Lula na lei sancionada em agosto. O resultado importa porque define até onde o país flexibiliza ou reforça o controle sobre atividades que causam impacto ambiental.

O licenciamento sempre foi o principal instrumento de fiscalização ambiental no Brasil. Ele estabelece quais estudos cada empreendimento precisa apresentar; quais riscos devem ser controlados e quais condicionantes precisam ser cumpridas. O processo costuma ser longo e heterogêneo entre estados, e por isso o Congresso discute há anos uma lei geral que dê mais previsibilidade.

A proposta aprovada em maio deste ano avançou justamente nessa direção: criou regras nacionais, previu modalidades mais simples — como a licença única (LAU) e a licença por adesão e compromisso (LAC) — e dispensou determinadas atividades do processo formal de licenciamento.

Os vetos do governo miraram pontos considerados sensíveis. O Planalto argumenta que alguns trechos ampliavam exageradamente as dispensas, reduziam a fiscalização e fragilizavam compromissos ambientais assumidos pelo país. A justificativa foi a mesma em outras áreas: garantir proteção ambiental sem abandonar a segurança jurídica para o setor produtivo. Entre os vetos estão dispositivos que tratavam da dispensa de licenciamento para obras de manutenção em estradas, linhas de transmissão e linhas férreas, e regras mais amplas para empreendimentos agropecuários.

Parlamentares contrários aos vetos dizem que as restrições prejudicam obras estruturantes e atrasam investimentos. Para eles, trechos barrados pelo Executivo traziam justamente o alívio burocrático que falta para modernizar o setor. O debate ganhou ainda mais força porque a lei entra em vigor em fevereiro de 2026 e o Congresso quer definir o texto final antes disso. Também pesa o cenário político: o tema aparece na agenda de eventos internacionais de clima, e o governo tenta apresentar avanços em governança ambiental.

A votação deve mostrar qual será o equilíbrio escolhido pelo Legislativo para os próximos anos. Manter os vetos significa reforçar o papel fiscalizador do licenciamento, enquanto derrubá-los abre espaço para uma lei mais permissiva, com processos mais rápidos e menos pontos de controle. Para estados, municípios, empreendedores e órgãos ambientais, o resultado define como novos projetos, como o de hidrelétricas, estradas, etc, serão avaliados a partir de 2026.

A comunidade do Morro do Piolho enfrenta o racismo ambiental com educação e ajuda da ONG Juntos pelo Capão
por
Silvia Monteiro
Lívia Rozada
Maria Elisa Tauil
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29/11/2023 - 12h

“A gente não precisava ter ficado mais de uma semana sem luz e água. Da ponte pra lá as pessoas receberam um formulário (da Enel) pra falar o que tinha sido estragado, aqui as pessoas nem sabem que podem fazer isso”, relata.

No dia 3 de novembro o Estado de São Paulo foi atingido por fortes chuvas e rajadas de vento de até 100 km/h. O temporal, um dos tantos exemplos da crise climática, não escolheu as suas vítimas, entretanto o racismo ambiental sim. Rose Borges, moradora do Morro do Piolho, periferia localizada no bairro do Capão Redondo, Zona Sul, enfrentou 10 dias sem luz e água.

“Isso é racismo ambiental. Por que quem mora lá pode ir atrás do direito deles e aqui não? Como o Eduardo Lyra fala em Gerando Falcões: a favela tem que sair do museu, reflete Rose.

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Moradores do Morro do Piolho passaram mais de 10 dias sem luz e água. (Foto: Maria Elisa Tauil)

O racismo ambiental é um termo utilizado para descrever situações de injustiça social, onde grupos minoritários são sistematicamente submetidos às consequências da degradação do ecossistema. Isso fica evidente quando moradores de bairros e territórios periféricos, em sua maioria pessoas pretas, indígenas e famílias de baixa renda, são diretamente afetados com o agravamento das condições climáticas, enquanto os mais privilegiados usufruem de melhores condições de vida.

“JUSTIÇA CLIMÁTICA É JUSTIÇA RACIAL”

O racismo ambiental está presente na sociedade em diferentes formas, como por exemplo, na maior incidência de riscos de inundações, deslizamentos de terra, concentração dos piores índices de poluição do ar e das águas, e até mesmo a falta de saneamento básico em comunidades. Dessa forma, a população está mais exposta aos impactos dos desastres naturais. Um exemplo marcante é o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG). A tragédia, que deixou 270 pessoas mortas e derramou milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração na bacia do Rio Paraopeba, teve como sua principal vítima a população negra e de baixa renda, que morava na região. Quatro anos após o ocorrido, a empresa responsável pelo desastre não foi responsabilizada e as famílias afetadas ainda sofrem com as consequências da desigualdade socioambiental.

No lançamento do livro “Racismo Ambiental e Emergências Climáticas no Brasil”, organizado pelo Instituto de Referência Negra Peregum, os autores debateram sobre a necessidade de trazer à tona as demandas dos movimentos negros e denunciaram o embranquecimento do movimento ambientalista. “A crise ecológica global é, simultaneamente, uma crise de justiça global”, expôs a jornalista Mariana Belmont na coletiva de imprensa.

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Lançamento do livro que ocorreu no Instituto de Referência Negra Peregum em São Paulo. (Foto: Maria Elisa Tauil)

Em uma entrevista a Agemt, Andressa Dutra, gestora ambiental, mestranda em Ecoturismo e uma das autoras do livro, conta que a questão racial é a chave para solucionar a crise ambiental. “Entendendo que o Brasil é um país estruturado no racismo, o Silvio Almeida fala que a gente não vai conseguir resolver as grandes questões se a gente não trouxer um foco para questão racial, porque é isso que dá base e faz entender quem vai viver e quem vai morrer”, explica.

“Não adianta mais a gente tentar resolver as mazelas dos problemas ambientais sem pensar na questão racial,” relata a ativista. 

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“Livro “Racismo Ambiental e Emergências Climáticas no Brasil”. (Foto: Maria Elisa Tauil)

MORRO DO PIOLHO: UM REFLEXO DO RACISMO AMBIENTAL

Localizado na região do Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, o Morro do Piolho, segundo moradores, abriga 300 famílias, sendo uma delas a da líder comunitária e agente transformadora Rose Borges, fundadora da ONG Juntos pelo Capão.  “Tem muita coisa acontecendo do outro lado da ponte do rio Pinheiros, que separa os pobres dos ricos, o lado A do lado B”, relata.

Rose conta que em decorrência da tempestade e rajadas de vento, ela ficou sem luz por quatro dias, enquanto alguns vizinhos ficaram mais de uma semana. Na segunda-feira, três dias após a tempestade, a maior parte do bairro seguia sem energia e sem água; consequentemente, a maior parte das escolas e creches não abriram. Assim como muitas mães e avós, ela precisou ficar em casa para cuidar da sua neta, precisando ligar à sua chefe para avisar que não tinha condições de ir trabalhar. Muitas outras mulheres da comunidade passaram pela mesma situação, mas receberam um tratamento diferente das empresas, com seus salários e benefícios sendo descontados. “Não é culpa delas, mas é visto assim. ‘Se vira’. Como se a gente pudesse se teletransportar”.

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Morro do Piolho, localizado na Zona Sul de São Paulo. (Foto: Maria Elisa Tauil)

A moradora denuncia a situação precária que as mães do bairro, grande parte mulheres negras e mães solo, precisam enfrentar ao ficar sem energia. “A maioria das mães aqui, quando saem, deixam coisas pros filhos comerem, porque elas vão trabalhar e só voltam à noite. Então ela trabalhou lá o dia inteiro, e, quando chegou em casa, não tinha luz nem água pra sobreviver”. Rose relata que, muitas pessoas precisaram se locomover e ficar na casa de amigos que já tinham energia. Ela precisou ir à casa da sogra, que fica em Campo Limpo, 42 km de distância do Morro do Piolho. A fundadora da ONG levou seu celular e os de seus vizinhos para carregar lá, além de trazer os alimentos que havia em sua geladeira.

Dessa forma, a comunidade se viu na necessidade de se mobilizar para enfrentar a falta de água e luz. Um vizinho de Borges, que tinha acesso a um lugar com água, ficou responsável por levar galões de água e trazer água para os moradores. Por ser uma quantidade limitada, as pessoas pegavam garrafas de 2 litros e faziam um banho rápido, e os que tinham filhos, tiveram que usar a mesma água em duas ou três crianças, e o restante foi usado para fazer comida e beber.

Além da falta de energia, a cidade de São Paulo também passou, recentemente, por uma onda de calor e mais uma vez, as comunidades periféricas foram as mais afetadas. Rose conta que, por conta do calor extremo, as pessoas precisaram dormir com as janelas abertas, e muitas precisaram colocar o colchão na parte externa da casa, onde era mais fresco. “Eu tive que colocar o colchão na garagem, sabe quando você não aguenta o calor?”, fala.

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Comunidade do Morro do Piolho enfrenta a onda de calor. (Foto: Maria Elisa Tauil)

O calor extremo chegou enquanto muitas pessoas ainda estavam sem energia, sendo ainda mais prejudicial às pessoas da comunidade. Sem luz, as geladeiras não funcionavam e as comidas apodreciam. “Minha cunhada perdeu tudo que estava na geladeira. Minha vizinha tinha duas crianças pequenas, e teve que ir pra um lugar no extremo sul porque lá as crianças tinham água e o que comer. Ela preferiu pegar um dinheiro e gastar com a condução do que ficar aqui”.

JUNTOS PELO CAPÃO: UM OLHAR DE ESPERANÇA

Claro, projetos como o de Rose não começam do dia para a noite. Durante a entrevista, ela nos conta que a ideia começou, no final de 2019, quando estava na missa e ouviu um pedido do pároco local, Padre Márcio, que fazia aniversário naquele dia. Como presente, ele queria um panetone porque tinha uma criança que não sabia o sabor do bolo. No seu trabalho, numa escola particular na zona oeste da cidade, ela pediu ajuda às mães dos alunos e conseguiram uma “parede” de panetones para serem doados no Natal, e a partir daí passou a acontecer todos os anos, conta com empolgação.

No início de 2020, com a chegada da pandemia, as escolas fecharam e as crianças moradoras do Morro do Piolho não tinham onde ficar. Para Rose, sua única opção era sair da bolha e se mobilizar, “a gente sempre tem um pouco de social, mas uns desenvolvem outros não”. Com a vontade de mudar a sua comunidade, ela pediu ao Padre Márcio uma sala que estava desocupada e começou ali seu projeto: Juntos pelo Capão.

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Rose Borges, criadora da ONG Juntos pelo Capão. (Foto: Maria Elisa Tauil)

Atualmente, há 2 projetos no portfólio da ONG: Escritores Mirins, onde, com a intenção de incentivar a literatura e escrita, cada criança participante escreve e publica seu próprio livro e Desenvolvedores Mirins (ou Pacote Office), responsável pela capacitação de jovens em ferramentas digitais. Além disso, a ONG organiza a ação Capão Sem Fome, uma frente permanente de combate à fome no Morro do Piolho, com distribuição de cestas básicas para famílias carentes durante todo o ano.

Quando o Estado não olha para aqueles que são invisíveis na sociedade, existe em contrapartida um cidadão ou cidadã que tem a capacidade de sair de sua bolha para causar um impacto na comunidade, e Rose Borges é uma delas. Através de seu olhar, de sua garra, ela consegue mobilizar toda uma comunidade para juntos se unirem e mudarem seu entorno. “Quando me deu esse despertar de fazer mesmo social como diferença na minha vida, de olhar para os outros, eu me senti uma torneira aberta jorrando água potável”, finaliza.

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de jornalismo da PUC-SP. 

Passado quase um ano, liderança indígena Yanomami fala sobre atual momento de seu povo, após Ministério da Saúde declarar Estado de Emergência de Saúde Pública na região
por
Artur Maciel
Bianca Abreu
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23/11/2023 - 12h

 

Em 20 de janeiro deste ano, o território Yanomami foi declarado em Estado de Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional pelo Ministério da Saúde brasileiro. Concentrados em uma região Amazônica entre o Brasil e a Venezuela, com cerca de 30,4 mil habitantes, Yanomamis sofrem com a intensa atividade de garimpos ilegais no local. Epidemias - como gripe e malária - insegurança alimentar, morte sistemática de crianças indígenas e destruição do meio ambiente são provenientes das ações dos extrativistas na região.

Em entrevista por telefone ao repórter Artur Maciel, da Agência Maurício Tragtenberg (AGEMT), o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami (Condisi) e representante do Conselho de Saúde Indigena (SESAI), Júnior Hekurari Yanomami, fala sobre a importância da atuação do poder público no combate ao genocídio provocado pela extração ilegal de minérios.

 

Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental
Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental

 

“A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”. Júnior Hekurari Yanomami

A fim de combater a desassistência sanitária no território Yanomami, o Ministério da Saúde instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE - Yanomami) - cuja gestão está sob a responsabilidade da SESAI. Segundo a pasta, ao chegar na terra Yanomami, o órgão “se deparou com crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição grave, além de muitos casos de malária, infecção respiratória aguda (IRA) e outros agravos”.

“Durante 6 meses, muita gente voluntária. Médicos. Enfermeiros. Farmacêuticos. De São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba”, explica Júnior Hekurari, quando questionado sobre o suporte atual na região após declarada crise sanitária. “A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”.

Segundo ele, “antes não tínhamos uma visão, apenas medo. O garimpeiro poluindo nossas terras. Nossas águas. Interrompendo nossos rituais. Culpa do governo ladrão de jóias. As crianças voltaram a brincar e andar depois das ações”. “Eu tinha medo do povo morrer. Sem o Lula, o povo Yanomami ia morrer. Em 2020, 2021, 20 mil garimpeiros destruíram nossas vida” desabafa, citando o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e a atuação do Estado na crise humanitária. Mas pontua com veemência que “ainda tem muita coisa a melhorar”.

Quando perguntado sobre como era tratado o impacto ambiental na região, em relação ao lixo gerado pela atividade garimpeira, o presidente do Condisi declara que “os garimpeiros não respeitam. Desmatam e tiram a terra de nossa vida”. “Durante 4 anos, fomos abandonados pelo governo brasileiro. Por um governo ladrão de jóias. Agora o governo voltou e os profissionais de saúde estão apagando o fogo das emergências pensando em uma restauração”, completa. Ele se refere ao governo do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), que não raras vezes, ao longo de sua vida pública, legitimou publicamente as atividades ilegais dos garimpos.

 

Doença, fome e violência: genocídio em prática

As doenças, a insegurança alimentar, a violência e a morte passaram a fazer parte do cotidiano dos Yanomami diante da negligência do Estado em frear a extração indevida de minérios na região. De acordo com levantamento do Malária Journal, o aumento do número de casos de malária - causa recorrente de mortes de crianças indígenas - na região Yanomami saltou de 2.559, em 2010, para 18.765, em 2020. Sobre a presença da doença na região, o representante da Sesai afirma que a doença contamina até mesmo quem vai em seu combate. “Muitos dos médicos 'adoeceu'. Pegou malária e voltaram (para casa)”, conta. “Mas o importante é que a maioria 'desse' profissionais viram Roraima. Viram o Brasil!”, completa, demonstrando, em sua voz, um misto de preocupação pela saúde dos profissionais e esperança diante da visibilidade à situação de seu povo.

Outro aspecto da presença dos garimpeiros na região é o acúmulo de lixo nas proximidades das comunidades. Por conta disso, os indígenas locais entram em contato com elementos provenientes de fontes aquém da natureza - produzidos com materiais que não se reintegram àquele território. Pelo contrário, o desequilibram e o prejudicam. “Hoje tem lama em todo lugar, os garimpeiros deixaram lixo em todo lugar. Máquinas, latas e lixo”.

O que nos leva a outro problema que compõe esse efeito dominó no descaso com a saúde Yanomami: a fome. A alimentação indígena é, primordialmente, garantida pela natureza por meio da caça, pesca e consumo de frutas. Diretamente afetada pelo uso de mercúrio no garimpo, a água foi contaminada. Com isso, peixes mortos, impróprios para consumo, perdem-se nos rios onde a atividade garimpeira está. “O garimpo destruiu nossos rios. Nossas vidas. As mulheres não iam pescar. Não tinha peixe nem camarão para comer. Mataram tudo, não tinha alimento”, aponta Junior. E questiona, em seguida: “que dia vamos voltar a comer peixe? Voltar a comer camarão? O povo não tem”.

Além da malária e da fome, os indígenas ainda precisavam se proteger de outro perigo. Júnior Hekurari Yanomami denuncia que os crimes cometidos pelos garimpeiros também se estendem à violência sexual. Deixando, ainda mais evidente, o risco que a presença desse grupo não-indígena e extrativista provoca na população local. “O que aconteceu aqui foi muito traumático. Meninas de 12 anos grávidas. Estupradas por garimpeiros. Estamos agregando trauma de mães com luta dos filhos. Deram tiros nas crianças”, expõe a liderança. “Destruíram meu povo. Tem cicatrizes grandes até hoje e vai demorar para curar. Talvez em 50 anos. Quem sabe se cura”, conclui, reflexivo.

 

*Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.

Da prostituição à Câmara dos Deputados, conheça a história da primeira mulher trans preta no Congresso Nacional
por
Julia Barbosa
Maria Elisa Tauil
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17/11/2023 - 12h

Em seu primeiro ano no Congresso Nacional e com mais de 64 mil votos, Erika Hilton (PSOL) foi intitulada a segunda melhor deputada do Brasil pelo prêmio Congresso em Foco, realizado em setembro deste ano. A parlamentar é a primeira mulher trans e negra a ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados.

Erika, aos 30 anos e na política há 6, possui suas prioridades bem definidas enquanto ativista dos Direitos Humanos: o combate à fome, defesa do SUS (Sistema Único de Saúde) e a valorização das iniciativas culturais jovens e periféricas, assim como a luta pela equidade para a população negra, combate à  discriminação e em prol de direitos da comunidade LGBTQIA +.

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Erika Hilton, eleita a segunda melhor deputada do Brasil (Foto: Mandato Erika Hilton)

Primeira travesti preta eleita deputada

Nascida em Franco da Rocha e criada na periferia de Francisco Morato, região metropolitana de São Paulo, a luta de Erika começou muito antes de sua atuação na Câmara dos Deputados. Assim como muitas outras pessoas LGBTQIA+ no Brasil, aos 14 anos, devido à sua identidade de gênero e à chegada do fundamentalismo religioso dentro do seu núcleo familiar, foi expulsa de casa e precisou recorrer à prostituição como um meio de sobrevivência.

Em uma entrevista à TV Brasil, a deputada contou como foi vivenciar esse processo. “Diferente da maioria das pessoas eu nunca sofri hostilidade na minha infância, nunca tive o meu gênero reprimido, fui criada em um lar por mulheres e essas mulheres me deram a possibilidade e a liberdade de ser quem eu sou", comentou. “O fundamentalismo mudou um pouco essa lógica de uma forma muito violenta e abrupta, eu não esperava por isso.”

“Essa expulsão de casa vai me levar à prostituição muito jovem, como ocorre com a maioria das mulheres transexuais e travestis no Brasil ainda hoje. É importante que as pessoas saibam que 90% das mulheres transexuais e travestis vivem compulsoriamente da prostituição porque são expulsas de casa e não encontram espaço no mercado de trabalho,” disse.

Aos 19 anos, após conseguir se reconectar com a família, Erika concluiu o ensino médio por meio do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), e cursou pedagogia e gerontologia na Universidade Federal de São Carlos, interior de São Paulo. Lá, participou do movimento estudantil e fundou um cursinho pré-vestibular para mulheres trans e travestis. Foi nessa época que sua trajetória de ativismo e militância começou.

O gatilho aconteceu em 2015, quando uma empresa de ônibus se negou a imprimir uma passagem com seu nome social. Ao defender o direito de pessoas trans escolherem seus próprios nomes, a futura deputada ganhou um alto engajamento nas redes sociais, resultando na conquista do seu objetivo e reconhecimento na luta contra a violência de gênero.

Em 2016, Hilton se filiou ao PSOL e, no mesmo ano, candidatou-se ao cargo de vereadora de Itu (SP), mas não se elegeu. Dois anos depois, como codeputada, fez parte da bancada ativista na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) através de uma chapa coletiva, que foi eleita com aproximadamente 150 mil votos.

Já em 2020, a ativista precisou deixar a ALESP para concorrer ao cargo de vereadora da cidade de São Paulo. Naquele ano, tornou-se a mulher mais votada do país e se elegeu com mais de 50 mil votos. Em uma entrevista à revista GQ, Érika conta sobre a importância de ter uma mulher trans e preta ocupando uma cadeira na Câmara Municipal da capital paulista. “Estamos rompendo com uma mazela histórica da ausência desses corpos. Até agora, haviam sido eleitas apenas duas mulheres negras, o que revela o racismo institucional, estrutural e estruturante da nossa sociedade. Ocupar aquele lugar é trazer à tona e visibilizar o nosso corpo, nossa luta, nossa história, pautar a política que precisamos e que queremos,” comentou.

“Nós, corpos negros, trans, periféricos, podemos existir e atuar para além dos espaços que nos foram sentenciados, como as esquinas, o cárcere, os manicômios, lugares de desumanização,” explicou.

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Erika Hilton no parlamento da capital paulista. (Foto: Afonso Braga/Câmara Municipal de São Paulo)

Ao longo do seu mandato na Câmara dos Vereadores, Erika presidiu a Comissão Extraordinária dos Direitos Humanos e Cidadania, ganhando ainda mais visibilidade no meio. Com isso, ela decidiu concorrer ao cargo de deputada federal.

Em 2022, Erika fez história ao se tornar a primeira mulher trans a ser eleita deputada federal por São Paulo. Com mais de 250 mil votos e uma das 10 candidaturas paulistas mais votadas, a deputada do PSOL se tornou uma protagonista na luta pela defesa dos direitos humanos, igualdade de gênero, racial e social dentro da Câmara dos Deputados.

Com uma trajetória política que se iniciou com a disputa pela Câmara Municipal de Itu e chegou até Brasília, Erika foi incluída, pela segunda vez consecutiva, na lista das “100 Lideranças que Mudarão o Futuro” da revista norte-americana Time.

Vivência no Congresso Nacional

Na segunda faixa do álbum “Roteiro para Aïnouz (Vol. 2)” de Don L, o compositor canta sobre o fundamentalismo religioso: “Depois do massacre ergueram catedrais; Uma capela em cada povoado; Como se a questão fosse guerra ou paz; Mas sempre foi guerra ou ser devorado; Devoto catequizado; Crucificar em nome do crucificado; Seu Deus é o tal metal, é o capital; É terra banhada a sangue escravizado; Jesus nunca estaria do seu lado; Não estaria do seu lado.”

A vida imita a arte. Erika, enquanto primeira mulher negra e travesti na Câmara dos Deputados, é alvo constante de ataques transfóbicos e critica o conservadorismo no Congresso Nacional.

Em setembro deste ano, durante um discurso na comissão que discutia o projeto de Lei contra o casamento homoafetivo, a parlamentar utilizou de seus 15 minutos de fala para denunciar colegas de Câmara. Para Erika, os deputados conservadores buscam, através de suas manifestações, criar uma guerra que nem mesmo existe no Brasil entre a comunidade LGBTQIA + e os cristãos.

Assim como Don L, a deputada afirma: "Eu tenho certeza que se Jesus voltasse hoje, não seria com vossas excelências que se sentaria, seria conosco, os oprimidos, os humilhados.”

A lista de afrontas e ataques por parte de outros parlamentares direcionados à deputada é extensa. No entanto, Erika se mantém firme: “E nós chegamos sim até aqui, mas não só para discutir os direitos das mulheres transexuais e travestis. Porque eu não sou apenas uma mulher transexual, travesti, eu sou uma mulher assim como a senhora, queira você ou não, na sociedade”, rebateu a deputada após outra parlamentar afirmar que na Comissão da Mulher, mulheres trans estariam roubando o espaço de “mulheres de verdade”.

Em outra ocasião, durante Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos atos golpistas no 8 de janeiro, ao ser debochada por parlamentares que causaram tumulto na sessão após uma piada homofóbica vinda do deputado Abilio Brunini (PL-MT), a parlamentar se posicionou: “Não aceitarei, não tolerarei ser desrespeitada, interrompida ou colocada em situações de baixo calão ou de baixo nível. Trato todos os colegas com respeito, com diplomacia, e exijo o mesmo tratamento. E aqueles que fugirem dessa diplomacia terão de responder criminalmente por qualquer tentativa de estereotipar a minha identidade”

Violência de gênero

Durante uma entrevista à TV Brasil, Erika denunciou a violência que sofre dentro do Parlamento. Segundo ela, sua vivência na instituição lhe causa mais medo do que entrar no carro de um desconhecido durante a madrugada. “Essa analogia serve para dizer vejam: eu enquanto deputada eleita com a visibilidade que tenho, hoje talvez corra mais risco do que quando era uma adolescente perdida numa esquina de prostituição,” expõe. “Isso não é para minimizar os riscos que essas meninas estão correndo, é só uma analogia para que a gente consiga comparar e ter a fotografia do que é a violência política de gênero hoje no Brasil”, completou.

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Erika Hilton, primeira mulher trans a ser eleita como deputada federal. (Foto: Poder360)

Segundo o Ministério da Mulher, a violência política de gênero pode ser estabelecida como a agressão física ou simbólica, que impede ou limita a mulher ao acesso e exercício de funções públicas. “O ambiente político ainda é muito tóxico para as mulheres, que são comumente ofendidas, humilhadas, ameaçadas e desrespeitadas exclusivamente em razão da sua condição feminina”, afirmou Maria Bucchianeri, a ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em uma entrevista ao CNJ.

Apesar de afetar todas as mulheres, a situação é ainda mais violenta quando envolve a mulher negra na política. A ministra observou que inúmeras parlamentares negras demandam proteção especial para si e suas famílias, devido ao volume de ameaças que recebem.

A violência política de gênero agride os valores democráticos por apartar mulheres dos espaços de poder, deixando esses espaços sob domínio de pessoas que são, majoritariamente, homens brancos héteros cisgêneros. A presença e atuação de Erika na Câmara dos Deputados, portanto, é uma afronta à masculinidade e branquitude que estão enraizadas na sociedade brasileira.  

Moda enquanto fazer político

Erika também ousa desafiar a “cafonice” dentro do parlamento, assim como a forma com que a política é estruturada: “Eu acho que a política tem que ser renovada em tudo, desde a roupa até a forma como se organiza. Do jeito que é não funciona, pelo menos para nós. Funciona para aquela casta de homens brancos que sempre estiveram lá. Quando você olha para uma parlamentar que tem referências de moda, que se parece com você e com as pessoas do seu convívio, que parece um ser humano normal e que está lá e tem projeto… A gente não está brincando, isso é importante frisar, não é que a gente traz um pop e banaliza o fazer política”, comenta a deputada a Vogue Brasil.

A parlamentar, que cruzou as passarelas do São Paulo Fashion Week de 2023, entende a moda como parte de seu fazer político, e acredita que essa seja uma das maneiras de introduzir os debates à aqueles que não se identificam com a clássica imagem do poder, passando por cima de um discurso excludente.

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Deputada Erika Hilton em bastidores do desfile SPFW pela Apartamento 03. (Foto: Bruno Santos/ Folhapress)

Em entrevista à revista Marie Claire, a deputada defende que “a população negra, indígena, LGBTQIAP+, sempre viveu em situação de subalternidade em todos os aspectos, desde os direitos civis à representação imagética no ambiente da moda. Mas mesmo dentro desse contexto histórico, político, social e econômico, a gente seguiu caminhando.”

Como Erika define, a crise em Brasília é estética. "Sempre olhei a política como algo muito cafona. Ela é cinza, tem uma linguagem rebuscada, não tem uma aparência bela exatamente porque se pleiteia a distanciar as pessoas daquele lugar.” A deputada exalta: "Não preciso me adequar a uma forma cafona para ser respeitada!”

Nossa equipe entrou em contato com a assessoria da deputada Erika Hilton, mas não foi possível marcar uma entrevista por questões de agenda. 

Além de impactos sociais e humanitários, a ditadura de Pinochet moldou profundamente a economia chilena.
por
Barbara
|
10/11/2023 - 12h

A instauração da ditadura militar no Chile por meio de um golpe de Estado em setembro de 1973 constituiu um capítulo sombrio na história. Com a destituição do governo de Salvador Allende, Augusto Pinochet assumiu o comando do país, inaugurando um período caracterizado pela repressão política e violações aos direitos humanos que perdurou até 1990. 

Augusto Pinochet

Além de impactos sociais e humanitários, a ditadura de Pinochet moldou profundamente a economia chilena. O país adotou políticas neoliberais como reformas que visavam reduzir o papel do Estado na economia, privatização de empresas estatais e abertura do mercado para investidores estrangeiros. Essa transição para o neoliberalismo teve implicações devastadoras na estrutura socioeconômica do Chile que podem ser observadas na história recente. Essa razão econômica, política e social foi implementada pelos “Chicago Boys”, economistas que tiveram passagem pela Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, escola que distribuía e distribui a ideologia para governos mundo afora.  

protestos no chile

As consequências brutais da instituição desse modelo, que continuou após a redemocratização no país, sob o pretexto de uma suposta ciência, contribuíram fortemente para o surgimento de protestos intensos que tinham como objetivo a elaboração de uma nova constituição, em 2019. O debate e a tramitação de uma nova constituição seguem no país, enquanto a constituição de de Pinochet persiste.

https://vm.tiktok.com/ZMj3pnkGE/

Os sistemas de educação, saúde e previdência, representam as violências dessa estrutura política e econômica sobre a população, que luta para seu fim e construção de uma nova constituição com direitos sociais universais.

 

Relembre como foi a manifestação a favor da democracia em São Paulo
por
Fernanda Querne
|
13/11/2023 - 12h

 

“Foi uma tentativa de golpe de Estado. Tem que ser punido exemplarmente. Vamos para cima deles” - essa foi um pouquinho da palavra do deputado federal pelo Partido Socialista e Liberdade (PSOL), Guilherme Boulos. O político estava no ato pró-democracia, concedeu uma entrevista à Agemt embaixo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateubard. Para saber mais do relato, ouça através do QR Code. 

 



 

Aqueles que protestavam contra ao extremismo visto no dia anterior, ressignificaram a bandeira do Brasil como um símbolo resgatado. Vários cartazes dizendo "Democracia para Sempre". Existia uma euforia ao extravasar tudo o que repudiaram no último mandato, mas aliviados com a vitória do petista. Os manifestantes repudiaram os ataques nos Três Poderes. Os invasores negavam a vitória do Luiz Lula Inácio Lula da Silva. Durante o dia 8, houve uma suposta negligência em relação à segurança. Assim, os vândalos gravaram os seus próprios crimes. Já era notório algumas movimentações dos bolsonaristas, alguns estavam acampando desde do resultado do segundo turno. Antes do resultado das eleições, havia uma suposta semelhança entre os apoiadores do Bolsonaro e dos apoiadores do Trumpismo ao invadirem o Capitólio.

 

Legenda: Comício eleitoral de Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro/ Por Fernada Querne

 

Com o sol quase se pondo, as ruas de São Paulo já estavam cheias de policiais rondando a Paulista. O começo do ato contou com organizações políticas levando a multidão a dizer: "Sem anistia". Ou até mesmo: "Ão Ão Ão, Bolsonaro na prisão". Havia uma preocupação em diversificar as vozes representantes da manifestação. Scaneie e ouça mais quais eram as lideranças que estavam por trás da manifestação.

 

 

"Salve Salve, eu sou o Júnior Rocha da Coalizão Negra Por Direito e da União Afro Brasil, vou ajudar a coordenar o ato aqui com vocês hoje. E vamos para cima derrubar o bolsonarismo ou não vamo?" - fala de Rocha, uma das lideranças da manifestação no começo do ato. Além dessa figura, havia também grupos que focavam em outras pautas, como: trabalhistas, feministas e entre outras. Mesmo com ideologias distintas, os manifestantes entiram que estavam lutando por uma causa só: "Hoje estamos aqui para dizer que nós não vamos permitir nenhum ato antidemocrático" - coordenadora do Povo Sem Medo.  

Explicitamente, chamavam os invasores de fascistas e extremistas. Pediam pela punição dos invasores, os quais chamavam de "golpistas". Aqueles contra o antigo candidato pelo Partido Liberal (PL), já sentiam que o derrotam nas ruas. Agora, a multidão desejava acabar com o fascismo nas ruas. Os manifestantes aclamavam pelo encarceramento da família do ex-presidente - atualmente, Jair Bolsonaro está inelegível. 

"Agora é a vez dos trabalhares, agora eles que vão para a cadeia. Eles devem porque são fascistas - um dos coordenadores do MST. De acordo com o Portal da Câmara dos Deputados: "Cerca de duas mil pessoas foram levadas pelas forças policiais pelos atos em 8 de janeiro, dos quais 1,4 mil ficaram presas por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, relator das investigações sobre as invasões."  

Para saber mais, aqui está o áudio completo do ato e o link da postagem no Instagram