O livro “Infocracia: Digitalização e a crise da democracia” foi escrito por Byung-Chul Han em 2022 (Ed. Vozes), o livro complementa outra obra do ator, “sociedade do cansaço”. Em ambos os livros, o ensaísta analisa a digitalização que vivemos hoje, sendo ela uma ameaça para a democracia, o principal argumento desenvolvido é de que esta digitalização rápida e cada vez mais intensa estaria criando diversas novidades, entre elas a nova era do capitalismo, o capitalismo da informação e da vigilância. Comparado à obra de Pierre Lévy, em que prega o aprimoramento da democracia pela pela inteligência coletiva, pois os feedbacks seriam imediatos e a melhorariam o coletivo, Han é pessimista, diz que seria uma grande ilusão, já que a internet potencializa fanáticos, abrindo a própria cultura do cancelamento atual, e como as redes levaram extremismos novamente, como por exemplo nas eleições argentinas de 2023, esses fanáticos seriam como gados de representantes políticos, sem poder de decisão e de discernimento, transformando grupos desses fanáticos em bolhas.
Han vence o “debate” com Levy sobre esta questão, pois o francês idealiza uma realidade utópica, diferente do sul-coreano .Ele também argumenta e traz a obra a obsessão pelo entretenimento na sociedade atual e como nos tornamos escravos das telas, vivendo em uma própria teatrocracia, isso abrange e aproxima a outras obras, como “1984” de George Orwell. O autor nos instiga com a questão de sermos observados e vigiados a todo momento nas redes, e de como isso a afeta por fora, no offline, destacando eleições e manipulações políticas, usou Donald Trump, “o presidente tuiteiro” como exemplo a essa sociedade da informação. A grande busca por informações rápidas transforma a sociedade imediatista, e a fragmenta com o excesso de informações, e nesse meio as fake news ganham força, já que o discernimento não é influenciado, além de que estas notícias falsas podem ser confortantes para certas bolhas políticas, não existindo a busca pela verdade exata, apenas para a “sua” verdade, com sensacionalismo e distorções, as verdadeiras e sem grandiosidades sensacionalistas são renegadas.
Estas bolhas muitas vezes são controladas pelos próprios mentirosos, em que divulgam essas mentiras e teorias da conspiração, estes grupos criam identidades para quem as participa, como por exemplo o bolsonarismo, sair dessas bolhas machuca, pois o pertencimento e a afirmação constante é confortante, por isso para a maioria não faz sentido buscar a verdade. O autor sul-coreano acerta ao mostrar a forma em que a sociedade está sendo conduzida, de forma passiva e sem perceber, e também ao citar a embriaguez por informações, principalmente as que não nos afetam mais, por serem tão frequentes. Sobre a vigilância e dados da população, o filósofo mantém sua coerência, porém explora áreas parecidas com de outras obras literárias, um buraco que poderia ser preenchido.
Han cita e concorda com Orwell, autor de "1984", na questão das teletelas e controle da sociedade, mas discorda de ser de um “grande irmão”, deixando mais em questão das grandes corporações nos controlarem, sendo que o estado tem um poder muito forte em sua sociedade, ele determina de forma mais extrema de que será desta sociedade, sendo o governo um grande potencializador do controle de informação, como no livro distópico.
Para um contraponto a essas ideias, recomendamos os livros do já citado Pierre Lévy, sendo eles: “cibercultura”, “ciberdemocracia” e “o que é o virtual?”. Mas para quem quer entrar mais afundo sobre o que Han diz, recomendamos “sociedade do cansaço” e “psicopolitica: neoliberalismo e as novas técnicas de poder”. O autor é filósofo e ensaísta sul-coreano, tem como destaque os livros: “Sociedade do Cansaço” e “Agonia do Eros”. O coreano também é professor da Universidade de Artes de Berlim, o filósofo se inspira em Michael Foucalt. Ele se formou na Universidade de Freiburg em filosofia e em teologia na Universidade de Munique.
O livro ‘’Como Sair das Bolhas?’’ de Pollyana Ferrari começa sendo apresentado por Martha Gabriel, formada em Engenharia Civil pela Unicamp, pós-graduada em Comunicação de Marketing pela ESPM-SP e professora de pós-graduação na PUC-SP do TIDD (Tecnologias da Inteligência e Design Digital). Ela inicia falando sobre o ser humano e sua relação com a tecnologia, e, lista os desafios que implicam a velocidade com que se propaga as informações. Além, de introduzir os conceitos de fake news e pós-verdade. O prefácio é feito por Lúcia Santaella, formada em Letras Português/Inglês, professora titular no programa de pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP, que aborda sobre como somos invadidos diariamente por notícias e informações falsas através das redes sociais, como por exemplo, o Facebook. Para embasar a sua análise, cita alguns teóricos, sendo um deles Sigmund Freud quando fala sobre a bondade inata do homem e que isso parece até uma miragem nos dias de hoje. Atribui a notabilidade da expressão pós-verdade após a vitória de Donald Trump na eleição americana de 2016 e do plebiscito do Brexit, no Reino Unido, no mesmo ano.
Além disso, menciona os três fatores que fomentam a indústria de fake news - que são, respectivamente: o ambiente de alta polarização política, a descentralização da informação pelos meios de comunicação independentes e o ceticismo generalizado entre as pessoas em relação às instituições democráticas, com os principais alvos sendo os governos, partidos e veículos de mídia tradicional. Santaella classifica esta obra de Ferrari como ‘’um verdadeiro manifesto contra a leviandade ingênua ou deliberada das crenças e dos compartilhamentos às cegas.’’
O manuscrito possui doze capítulos, no total, e a cada seção, a autora escolheu colocar uma frase ou um excerto dito por um escritor, com exceção do primeiro. Pollyana abre o livro contando um pouco sobre sua vida pessoal e compartilha sua visão espiritual com os leitores, cita o poder da meditação e destaca a importância de se viver o presente. No mundo agitado em que vivemos, muitas vezes nos encontramos escravizados pela correria diária e pela dependência dos nossos dispositivos móveis. Isso nos leva a realizar múltiplas tarefas simultaneamente, resultando na perda da conexão conosco mesmos e no esquecimento de apreciar o momento presente e a profundidade do silêncio.
Ela explica, também, que vivemos em uma bolha, e isso significa que, às vezes, não percebemos que estamos dentro dela, portanto, não buscamos formas de sair. É algo que já se tornou intrínseco e automatizado em nós, mas basta repararmos se só frequentamos os mesmos estabelecimentos, se só ouvimos o mesmo gênero musical, entre outros comportamentos limitadores, que devemos evitar ceder à zona de conforto imposta por essas ‘'bolhas’’. A escritora relata que este livro foi feito a partir dos oito passos do Shastra Abhidharma Mahavibhasha em mente, e enfatiza a influência dos ensinamentos de Buda e da filosofia védica para a construção desta obra.
Aponta as ferramentas necessárias para identificarmos se a notícia é falsa ou verdadeira, apresenta algumas agências de fact-checking (checagem de fatos) como a Lupa, a primeira no Brasil, uma empresa privada patrocinada pelo Instituto Moreira Salles. Aos Fatos, que teve seu surgimento por meio de investimento próprio dos fundadores, sendo suas três fontes de financiamento: as parcerias editoriais, as contribuições da iniciativa privada e de organizações da sociedade civil e apoio de leitores e de financiamento coletivo (crowdfunding). Preto no Branco, primeiro blog de checagem de fatos do Brasil, criado com o objetivo de testar o grau de veracidade dos políticos durante as campanhas eleitorais, possui classificação própria para dar suas notícias e usa termos como: falso, ainda é cedo para dizer, insustentável, verdadeiro, mas…; contraditório e exagerado. Chequeado, site pioneiro da América Latina dedicado à verificação do discurso, está entre as dez primeiras organizações do mundo, é comandado por uma jornalista, advogada e professora chamada Laura Zommer, especializada em direito à informação pública, e mantém-se com um plano de negócios diversificado, obtém sua fonte de renda por meio de indicações de particulares, colaborações com empresas na realização de eventos e parcerias internacionais.
A autora cita o Instituto Poynter, líder mundial em jornalismo, e o código elaborado por eles a ser compartilhado por meio da Rede Internacional de Fact-Checking (IFCN), que vem sendo adotado por diversos veículos e contém cinco itens, que são: 1) Compromisso de apartidarismo e equidade, 2) Compromisso pela transparência das fontes, 3) Compromisso pela transparência de financiamento e organização, 4) Compromisso com transparência de métodos, 5) Compromisso com correções francas e amplas. Este código é usado desde 2017 pelo Facebook para filtrar informações. Ademais, a rede social incluiu o item fake news no menu para denúncias.
Ao longo de sua reflexão, Ferrari explora algumas concepções para abordar a questão da credibilidade das informações publicadas. Ela sugere que, com a volta dos jornais por meio de assinaturas, os leitores passarão a valorizar mais a veracidade das notícias e procurarão fontes que ofereçam serviços de checagem. Ela observa, também, que as notícias falsas se espalham de forma rápida devido à intervenção dos algoritmos e dos bots (robôs). Além do mais, Ferrari aponta que os jornalistas também têm uma parcela de responsabilidade na disseminação das notícias falsas, já que na busca pela primazia na divulgação das informações, a devida apuração dos fatos muitas vezes é negligenciada, resultando em possíveis notícias que não são verdadeiras por completo.
Declara, que a tecnologia não é a vilã da história, basta sabermos como utilizá-la da melhor forma possível, usufruindo de todas as ferramentas que ela nos oferece, para assim, domá-la ao nosso favor. Visto que, até mesmo os empresários e CEOs das grandes empresas de big techs da Califórnia não matriculam seus filhos em escolas que têm acesso livre a internet, muito pelo contrário, suas escolhas são pautadas nas que proíbem o porte e o acesso a dispositivos eletrônicos.
Por fim, nos propõe refletir quanto a dependência que a sociedade adquiriu em ser aceita a todo custo, um exemplo disso, é a foto lotada de filtros e efeitos que são capazes de nos transformar em outra pessoa - o famoso efeito degradante do ‘’Photoshop’’.
Para fundamentar a sua análise, referencia o filósofo polonês Zygmunt Bauman, quando aborda a questão de que vivemos em uma sociedade onde tudo é efêmero, o que sobrecarrega nosso cérebro diante da avalanche de conteúdo a que somos expostos a cada minuto por meio de nossos dispositivos. Contudo, não podemos embasar a nossa felicidade em coisas que não fazem parte da nossa realidade e em padrões inalcançáveis.
A partir do avanço da informação e do estímulo que desenvolvemos para recebermos novidades a cada segundo, nos tornamos ‘’reféns’’ dessa sociedade capitalista de consumo, e sempre quando compramos algo novo, imediatamente já estamos desejando o próximo item. O fato é que nos tornamos seres insaciáveis.
A digitalização do mundo pode ser explicada por uma sequência de fatores que conectam a comunicação no meio virtual com as formas democráticas impostas pelos algoritmos da era digital. Em seu livro Infocracia: digitalização e a crise da democracia, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han explica a transformação do “regime disciplinar”, que tratava-se da exploração de corpos e energias e assume uma forma maquinal, em “regime de informação”, na qual o controle incide sobre informações e dados. Segundo Han, o poder não é mais decorrente dos meios de produção, mas do acesso à informação: “acesso a dados utilizados para vigilância, controle e prognóstico de comportamento psicopolíticos”.
O smartphone é a principal arma da dominação do regime de informação, ocultada na medida em que se funde com o cotidiano. Simples ações do dia a dia como acionar um comando para assistente virtual, acessar um aplicativo inteligente ou até mesmo fazer uma publicação em uma mídia social são exemplos que evidenciam a existência de um regime dominante exercido pelo capitalismo da informação. A criação do like, por exemplo, nas redes sociais é justamente uma técnica do poder do regime de informação. Essa sensação de receber curtidas em publicações funcionam como “estímulos positivos” controladores de comportamento que exploram a liberdade dos usuários. Quem nunca viu uma pessoa que faz literalmente de tudo, muitas vezes de forma inconsciente, para conseguir milhares de likes nas redes sociais? Para Han, “no regime da informação, ser livre não significa agir, mas clicar, curtir e postar”.
E nessa onda de estímulos positivos que entra o papel dos influenciadores digitais nos dias de hoje. Seja no YouTube ou Instagram, seja influenciador fitness, de beleza ou de viagem, é feita uma auto-encenação com produtos enviados por marcas com o intuito de formar um exército de followers, os seguidores, que passam a se comportar de acordo com uma vida baseada em um cotidiano encenado. Byung-Chul Han entende que os influencers são adorados como modelos. Os produtos de consumo se transformam em objetos de autorrealização e a identidade funciona como uma mercadoria. Quem nunca comprou ou chegou perto de comprar um produto simplesmente por status? A Apple é um exemplo disso. Nos últimos anos, as próprias crianças cresceram com a ideia de que ter um iPhone era a solução para popularidade e aceitação em uma sociedade capitalista. Ter um dispositivo com a famosa maçã se transformou em um dos principais símbolos de status do mundo atual. Para o autor de “Infocracia”, toda mudança decisiva de mídia produz um novo regime, já que “mídia é dominação”.
Além disso, há também o entendimento de que o mundo se tornou uma sociedade paliativa, em que desejos e necessidades são automaticamente satisfeitos. Nesta realidade, os novos meios de dominação são baseados no entretenimento, no divertimento e, sem sombra de dúvidas, no consumo. Tendo o smartphone como meio de submissão, as pessoas não só consomem, como também produzem informações, rendendo-se à chamada embriaguez de comunicação. Han acredita que na era das mídias digitais, “a esfera pública discursiva não é ameaçada por formatos de entretenimento nas mídias de massa, não pelo infoentretenimento, mas sobretudo pela propagação e proliferação viral de informações, a saber, pela infodemia”.
Exatamente nesta realidade de “guerra de informações”, a verdade acaba se desintegrando em meio à instabilidade temporal, o curto-prazo em que as informações circulam -- o que não traz nenhum benefício à democracia. A racionalidade é outro ponto importante. Na sociedade da informação, não há tempo para a ação racional, logo, informações com maior potencial de estimular acabam sobressaindo diante das que apresentam melhores argumentos. Atualmente, o X, antigo Twitter, é a principal rede social em que as fake news, notícias falsas, recebem mais atenção e engajamento do que artigos fundamentados. Quem nunca caiu em uma fake news pelo alto número de curtidas e compartilhamentos de uma publicação?
A própria acessibilidade simples à internet atua como um facilitador da propagação de notícias falsas, visto que, com pouco esforço e sem custos, praticamente qualquer pessoa pode criar uma conta no X ou um canal no YouTube -- diferentemente da era das mídias de massa, em que para produzir uma informação eram necessários diversos recursos e, consequentemente, maiores investimentos. O filósofo também acredita que a comunicação baseada nos famosos memes como contaminação viral “dificulta o discurso racional ao mobilizar, mais do que nada, afetos”. Isso pode ser explicado pela preferência dos usuários por conteúdos visuais ao invés de textuais nas mídias, à medida em que imagens são mais rápidas que textos, mas sequer argumentam ou fundamentam.
Han explica que essa propagação viral de informações, que busca engajamento e não argumentação, prejudica o processo democrático, visto que fundamentações não cabem em memes e tuites que circulam rapidamente. É possível afirmar, portanto, que a digitalização do mundo criou um fenômeno considerado praticamente irreversível: a verdade foi ultrapassada num piscar de olhos pelas informações.
A popularização das mídias digitais e a inserção dos grandes veículos de notícias em diversas plataformas da internet nos últimos 15 anos vem trazendo diversos benefícios para a população. O acesso mais fácil à informação, a abertura de novos espaços para debate, o lugar de fala (possibilitado a cidadãos com piores condições de vida) e o rápido compartilhamento de informações; a princípio podem parecer exclusivamente positivos para o funcionamento do sistema democrático. Mas, é necessário e urgente analisar o papel delas na polarização social, explorando como a cobertura mediática de questões políticas, culturais e sociais tem contribuído para a divisão da sociedade.
A mídia sempre desempenhou um papel fundamental na sociedade, moldando opiniões, informando o público e influenciando a forma como as pessoas veem o mundo ao seu redor. Essa postura de polarização extrema nas redes sociais só beneficia os donos das bigtechs, além de gerar bolhas específicas de opinião e ainda favorece que o algoritmo envie com mais precisão os conteúdos designados a cada grupo social. Outro fator importante é que para atingir o público desejado, o transmissor do conteúdo pode fazer uso das ferramentas mais eficientes para cada postagem. Dessa maneira, as fake news, frases tiradas de contexto, comparações desprovidas de sentido e teses comprovadamente equivocadas ganham força para alcançar aqueles receptores que aguardam por essas notícias.
Essa grande rede de manipulação prejudica o funcionamento da democracia em sua essência, pois o debate construtivo com os participantes sujeitos a uma possível mudança de opinião fundamenta o sistema democrática da maneira como o conhecemos nas sociedades atuais. É uma via de mão-dupla: os usuários das redes incentivam uma postura mais polarizadora da mídia, acessando apenas conteúdo que favoreçam suas opiniões e criticando veementemente qualquer tipo de postagem que vá contra aquilo que acredita ou que ao menos incentive uma reflexão. Xingamentos nos comentários, bloqueios em massa e o famoso ‘reclamar sem ler’ são medidas que refletem a incapacidade de interpretar e absorver informações de ambos os lados.
Em entrevista ao UOL, a jornalista Luciana Gurgel deu o nome de Fox News-ização a esse processo, devido à emissora que é responsabilizada por ter desencadeado um enorme sistema polarizador nos Estados Unidos antes das eleições presidenciais entre Donald Trump e Hillary Clinton em 2016: “A ‘Fox News-ização’ da mídia representa um perigo fatal para as democracias porque mina a base da harmonia civil e do debate público tolerante”.
Luciana completa: “Considerando que não é um erro a mídia expressar uma opinião, como acontece em editoriais, artigos de colunistas e programa de debates", mas isso não é prestação de serviço, mas opinião, que muitas vezes não favorece a democracia. Na obra ‘Infocracia’, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, fala muito sobre as técnicas de microtargeting e como esse processo é relacionado com uma divisão maior na sociedade. Todo o processo de psicometria é baseado na análise de dados e perfis pelas grandes empresas que controlam as redes (Google, Microsoft, Meta, Amazon, Apple, entre outras). O comportamento dos cidadãos em redes muitas vezes pode parecer puramente espontâneo, mas até mesmo os comentários mais ofensivos e genéricos são influenciados e manipulados em níveis inconscientes por esferas que desejam promover o ‘caos’ social para sua escalada.
Uma das maneiras pelas quais a mídia contribui para a polarização social é através do sensacionalismo e do uso de títulos sensacionalistas, comumente conhecidos como "clickbait". Os veículos de comunicação muitas vezes destacam histórias que provocam emoções intensas, como raiva, medo ou indignação, a fim de atrair mais espectadores ou leitores. Isso pode levar a uma visão distorcida da realidade, exagerando problemas e agravando as divisões sociais.
O livro ‘Infocracia’ também traz esse tema, demonstrando que o afeto se forma e se propaga com mais força e intensidade do que a racionalidade. Qualquer conteúdo que atinja o espectador pela emoção tende a criar um laço maior do que algo que exija a interpretação. Essa é uma característica marcante da sociedade da informação, que, pautada por um caráter de curto-prazo, não oferece ao seu cidadão o tempo necessário para tomar a ação racional.
Outra maneira pela qual a mídia contribui para a polarização é através de viés e seletividade na cobertura de notícias. Os veículos de comunicação podem favorecer certas perspectivas políticas ou ideológicas, retratando eventos de maneira tendenciosa. Isso pode criar uma bolha de informações onde as pessoas só são expostas a um ponto de vista, reforçando suas crenças e alienando aqueles que pensam de maneira diferente.
A polarização social é um desafio significativo que afeta muitas sociedades nos últimos anos, e a mídia desempenha um papel importante nesse fenômeno. O sensacionalismo, o viés, a seletividade e o uso de redes sociais desempenham um papel na criação de divisões na sociedade. No entanto, a mídia também pode ser uma força positiva na promoção do diálogo, da compreensão e da unidade. É crucial que a mídia e os consumidores de notícias sejam conscientes de seu papel na sociedade e trabalhem juntos para reduzir a polarização e promover uma comunicação mais equilibrada e construtiva.
Em agosto de 2022, o professor universitário Celso Unzelte, 55 anos, também conhecido por ser pesquisador de esportes, ex-repórter da revista PLACAR e atual comentarista da ESPN Brasil, palestrou em um curso da Faculdade Cásper Líbero (FCL) sobre a história do jornalismo esportivo e como exercê-lo de maneira profissional. Unzelte afirma que o “jornalismo esportivo é antes de tudo jornalismo”, de maneira que não deve só ser abordado como, dito por ele, uma “conversa de boteco”, mas sim com certa seriedade.
De acordo com o professor, “a produção jornalística esportiva passa pelos mesmos processos de qualquer outra editoria: pauta, apuração, redação e edição. Por isso, não basta ‘gostar’ do assunto, é preciso enxergá-lo como um objeto de trabalho”. Além desses requisitos, ele vai citar a ética e o interesse público como pontos chaves, no qual afirmam que o jornalismo no âmbito desportivo é tão sério quanto dos outros campos da profissão. Mas isso não quer dizer que seja um trabalho propriamente igual ao jornalismo tradicional, uma vez que o entretenimento está diretamente ligado ao esporte. “É um emprego que mexe com a paixão, mas não devemos deixar que isso nos comprometa e atrapalhe no profissionalismo”, diz Unzelte.
Porém, já está enraizado nos canais de mídia brasileiros o sensacionalismo exagerado das notícias, no qual o show é mais vendido do que a própria verdade. No meio futebolístico, esta espetacularização consegue ser ainda pior, visto que sua frequência é maior e altamente normalizada pelo público que se acostumou, de maneira manipulada, a este tipo de fazer jornalismo. Diversos canais da TV aberta propiciam a alienação da sociedade, por meio do entretenimento exacerbado e comprado, visando exclusivamente o lucro e a audiência.
De acordo com o jornalista José Arbex, autor do livro “Showrnalismo”, em entrevista dada para a TV Brasil, “jornalismo não se confunde com comunicação social em geral”. De acordo com ele, a profissão deveria ter objetivo de entregar a verdade ao público, porém esta tradição jornalística vem perdendo espaço para a espetacularização das coisas. “A informação virou entretenimento”, diz Arbex.
A exemplo disso, temos o programa de debates “Os Donos da Bola”, com o apresentador e ex-jogador que se denomina como “craque” Neto. O mesmo, mantém um personagem que usa o espetáculo para produzir um conteúdo informativo de maneira exagerada, buscando somente a audiência.
A obra Infocracia, do sul-coreano Byun Chul Han, traz alguns pontos que também podem ser relacionados com esta espetacularização dos canais de mídia, pois foca na manipulação midiática dos detentores da informação, que controlam o que será passado ao público. No caso do jornalismo esportivo, vemos que a cultura do espetáculo está servindo como arma manipuladora para prejudicar o senso crítico do telespectador.