Na madrugada do dia 19 de agosto, após 3 anos de seu último lançamento, a cantora e compositora Liniker lançou o álbum “Caju” que, já nas primeiras 24 horas de lançamento, teve seis milhões de reproduções. Revelado em um momento de profunda introspecção e inovação, o disco marca uma mudança na carreira da artista e na atual cena musical brasileira, entrelaçando experiências pessoais com uma estética única.
Com letras que exploram temas de identidade, amor e resiliência, “Caju” não é apenas uma evolução musical, mas também um testemunho de força e autenticidade, oferecendo uma visão íntima do universo de Liniker, enquanto desbrava novas fronteiras sonoras, combinando elementos de soul, funk e MPB, criando um ambiente que reflete tanto suas raízes culturais quanto suas aspirações contemporâneas.
De faixa em faixa com AGEMT
A primeira faixa “CAJU", que dá nome ao álbum, é uma peça central que encapsula muitos dos temas abordados ao longo do disco. A música explora questões de identidade, memória e afeto, utilizando a figura do caju como uma metáfora rica em significados. A música se destaca pela sua delicadeza que gera uma atmosfera calorosa e íntima, e pela fusão de elementos do MPB, soul e ritmos afro-brasileiros. O uso de instrumentos como o violão e teclados suaves, combinado com uma percussão leve, reforça a sensação de aconchego e conexão com a natureza, remetendo à simplicidade e à beleza do caju como símbolo.
Em “TUDO”, a segunda faixa, lançada como single, Liniker faz uso de batidas envolventes e empolgantes enquanto adiciona um refrão vicioso. A letra é embargada do sentimento de amor e de querer estar com a outra pessoa, utilizando o filme “Um amor para recordar” – baseado no livro de Nicholas Sparks – para romantizar o amor sem ensaio: o amor espontâneo. Entretanto, a parte mais importante, e a que nomeia a faixa, é o último verso que verbaliza como a protagonista não se diminuirá para caber em relações pequenas já que sua vontade de amar é tudo.
"VELUDO MARROM", com 7 minutos de duração, se destaca por sua suavidade e intensidade emocional. A canção explora novamente temas relacionados ao amor, intimidade, e vulnerabilidade, fazendo isso através de uma combinação de letra poética e arranjos musicais cuidadosamente construídos. A faixa começa com uma introdução suave, marcada por acordes delicados e aveludados (como o próprio título sugere), que criam uma atmosfera íntima e acolhedora. Essa junção permite que o foco principal seja a voz de Liniker. A letra é profundamente simbólica e evocativa. O "veludo marrom" do título pode ser interpretado como uma metáfora para algo precioso, raro, e confortante. O veludo é um tecido que remete ao toque, à suavidade e ao luxo, sugerindo uma relação que é ao mesmo tempo acolhedora e envolvente.
"AO TEU LADO", faixa com colaboração da dupla ANAVITÓRIA, é uma celebração da intimidade e da conexão profunda entre duas pessoas. A música, com sua melodia suave e arranjo aconchegante, reflete a simplicidade e a beleza do amor genuíno. A interpretação vocal de Liniker é o ponto alto da faixa, transmitindo a segurança e o afeto que vêm de estar ao lado de alguém especial. Essa canção é um dos momentos mais ternos e sinceros do álbum, demonstrando a habilidade de Liniker em capturar as nuances do amor e da relação humana.
"ME AJUDE A SALVAR OS DOMINGOS" aborda a melancolia e a solidão associadas ao fim de semana, especialmente ao domingo, tradicionalmente conhecido como um dia de descanso. A música se destaca pela forma como trata das emoções complexas de maneira íntima e vulnerável. A produção é delicada, com arranjos que utilizam piano, violão, e alguns toques eletrônicos sutis para criar uma atmosfera contemplativa. O ritmo é lento e cadenciado, refletindo o tom melancólico da canção, e o desânimo sentido aos domingos. Essa faixa é uma expressão de um desejo profundo de encontrar conforto e companhia em um dia que, para muitos, é solitário e emocionalmente pesado. O domingo aqui é retratado como um momento em que a ausência e o vazio são mais percebidos, principalmente quando alguém se encontra sozinho ou em um estado de reflexão.
Com a participação de BaianaSystem, a faixa “NEGONA DOS OLHOS TERRÍVEIS” traz a valorização dos corpos femininos, especialmente o corpo negro. Com ritmos corriqueiros da música baiana, a faixa traz a símbolos da cultura afro-brasileira, com a representação da sereia, a “lavagem no Bonfim”, o “Abaeté”. Liniker, como uma mulher candomblecista, enaltece sua cultura e a feminilidade. Assim acontece com a próxima faixa, "MAYONGA", que também se destaca pela abordagem da ancestralidade, identidade e espiritualidade, mesclando ritmos afro-brasileiros e elementos contemporâneos e criando uma música com uma riqueza cultural intensa, que explora o conceito africano Sankofa – a importância de olhar o passado para construir o presente. O próprio nome da obra faz referência a religião afro-brasileira. “Mayonga” pode ser interpretada como uma figura mítica, representando a conexão com as raízes ancestrais e a força espiritual que advém dessa conexão, ou ainda como uma bebida tradicional que carrega consigo o poder de cura e proteção.
A oitava faixa do álbum, “PAPO DE EDREDOM”, com a colaboração da cantora e compositora soteropolitana, Melly, revela o afeto que, como cantam, esquenta como se fosse verão. O encontro dessas duas potências cancerianas traz o fervor da atração na letra e na melodia. Com o ritmo mais lento, a música transmite a complexidade da sensualidade, as vozes das duas artistas se misturam e tornam-se únicas. É a segunda vez que Liniker e Melly colaboram em um trabalho, no álbum de estreia da Melly, o Amaríssima, as duas cantoras dividem suas potências na faixa “10 minutos”, outra incrível amostra do talento que elas possuem juntas.
“POPSTAR” e “POTE DE OURO” são faixas que se complementam. Trazendo ritmos brasileiríssimos, Liniker mostra o lado do amor que mais importa: o amor próprio. As músicas exalam a autoconfiança que é facilmente deixada de lado em muitos discos românticos, é o olhar para si mesmo e perceber que merecem mais carinho e atenção do que estão recebendo. “Pote de ouro” conta com a participação da cantora Priscila Senna, dona dos hits mais tocados nas rádios recifenses como “Te Beijo Chorando”. As duas músicas apresentam a supervalorização da personagem principal, a colocando como “tesouro raro” e até “pote de ouro”.
E não tem como falar de ritmos brasileiros sem falar de samba. É desse gênero, tão amado pelos brasileiros, que “FEBRE”, a décima faixa do álbum, se apropria. A música é extremamente dançante e gostosa de escutar, a sensação que exala dela é de um fim de tarde de um domingo no qual a vontade de amar aperta. E é nessa vibe dançante que “DEIXA ESTAR” se encontra, com a participação de Lulu Santos e Pabllo Vittar. A música, com seu estilo Boogie Woogie, deixa de lado a dúvida e passa a mensagem de que o dia está acabando e a personagem principal está pronta para o que vier.
A penúltima faixa de CAJU, “SO SPECIAL”, com colaboração do duo de DJs Tropkillaz, começa com um barulho de chaves e uma porta de um carro batendo: o indício de que o fim está próximo. Liniker canta com um inglês poético, a batida eletrônica carrega a leveza que so special transmite. Perfeita para uma balada, a artista mostra mais uma vez sua versatilidade musical. Os últimos segundos da música são um vazio, mas um vazio barulhento. Um eco após a Liniker exclamar “You so special” que se estende por vinte segundos perfeitos que relembram como um “acordar”.
A última faixa “TAKE YOUR TIME AND RELAXE”, que, em uma tradução livre, seria o mesmo que dizer “espere e relaxe”, Liniker recita uma carta. De Caju para Caju. A faixa traz jús ao nome, é relaxante e traz esperança em sua letra. De todas as canções do álbum, essa é a que mais reproduz a necessidade de liberdade, de se entender como pessoa grande, mesmo com os altos e baixos da vida. Enfim, o álbum proporciona o conhecimento de Caju, e mostra o seu auto conhecimento.
Sensações finais
Liniker mostrou, outra vez, o motivo de ter sido imortalizada na Academia Brasileira de Cultura. Em um mundo cada vez mais rápido, onde o neoliberalismo transforma o cenário em fábricas de som com no máximo 2 minutos de duração e poucas faixas, a artista dá um salto à frente e relembra o gosto de apreciar a música. CAJU, um álbum extenso de uma hora de duração, não há como ser apenas escutado, é preciso entendê-lo.
A autoestima e o carinho que ressoam no álbum são o que explica os 30 milhões de streamings em apenas 4 dias após seu lançamento. É a versatilidade de Liniker, que atravessa por gêneros musicais diferentes, e o seu trabalho de compositora, produtora, cantora e estudiosa musical, que traz a música brasileira a patamares altos. CAJU atingiu o 6º lugar no álbum debut global no Spotify e vem subindo cada vez mais nos charts, mostrando sua relevância.
O livro “A cantiga dos pássaros e das serpentes”, publicado em 19 de junho de 2020, ganhou sua adaptação para o cinema no dia 15 de novembro do ano passado. A história se passa 64 anos antes dos primeiros jogos de Katniss e 10 anos após o fim da rebelião dos distritos contra a capital de Panem, quando os jogos foram criados. Desta vez, ela segue o jovem Coriolanus Snow - presidente do país durante a trilogia original - e sua experiência como mentor da tributo feminina do distrito 12, Lucy Gray Baird.

A história
O longa se passa em um cenário pós guerra. O país fictício Panem ainda sofre com as consequências da destruição causada pela rebelião dos distritos, o luto, além de traumas acumulados e o lastro de destruição econômica, política e social.
Nesse cenário, são criados os Jogos Vorazes. Idealizados por Dean Casca Highbottom e coordenados pela Doutora Gaul, são uma punição para os cidadãos dos distritos pela rebelião, e consistem em sortear um menino e uma menina entre 12 e 18 anos de cada distrito, para lutarem entre si em uma arena televisionada. O intuito é lembrar às gerações futuras dos erros cometidos por seus antepassados, e relembrá-los dos perigos de ir contra as regras impostas pelo capital, que rege o país.
Snow vive na Capital com sua prima Tigris e sua avó. A família enfrenta problemas financeiros, apesar de fazer parte da alta classe da capital, os Snow foram muito afetados pela guerra após a morte do pai em batalha. Durante o filme, a família tenta esconder sua situação atual para a sociedade.
Outro personagem incorporado na narrativa é Sejanus Plinth. Nascido no distrito 2, ele e sua família são presenteados com a vida na alta sociedade pelo trabalho de seu pai contra as forças rebeldes durante os tempos de guerra. Porém, desde sua primeira aparição, Sejanus discorda das ideias da Capital, desprezando também o preconceito contra os distritos.
Na trama, o número dos distritos também importa: divididos em 12, cada um produz artigos e possui uma qualidade de vida maior se comparados ao número seguinte. Por exemplo, enquanto o distrito 1 é produtor de artigos de luxo, o distrito 2 lida com os processos militares, distritos como o 9, o 11 e o 12, realizam um trabalho mais pesado - plantação de grãos, indústria têxtil e mineração - e também são locais racializados, onde se encontram famílias de origem indígena e afro americana.
A jovem Lucy Gray, moradora do distrito 12 é descrita como estranha e pequena, mas devido ao seu carisma e talento musical, Snow, seu mentor, a transforma na favorita para os jogos da 10ª edição, garantindo sua vitória.
Entretanto, essa vitória também é atrelada a sua trapaça: a menina leva veneno de rato para a arena com a ajuda de Snow, que é punido, passando a trabalhar como militar, também chamado de pacificador, no distrito 12, junto de Sejanus. O mentor e a vitoriosa embarcam em um romance após o fim da edição.
Sejanus Plinth se junta a um grupo rebelde durante seu período de trabalho, gerando problemas maiores: em um embate, Snow mata dois rebeldes, entre eles a filha do prefeito do distrito. Snow e Lucy acabam escapando, mas Plinth é sentenciado à morte. Após o falecimento do amigo, o casal foge para o norte.
Durante o caminho, os dois se desentendem, fazendo com que Lucy fuja após uma briga, enquanto seu mentor a ameaça e atira projéteis em sua direção. Coriolanus volta para a Capital, é perdoado e convidado para trabalhar na direção do evento. Ao retornar, Snow apaga todos os registros de Lucy Gray, incluindo a gravação de sua edição dos jogos. Anos depois, Snow se torna presidente do país.
O enredo de Lucy Gray ainda é um mistério, sendo incerto se ela realmente teria sido atingida ou não. A única menção à Lucy na trilogia principal acontece no segundo livro, quando há uma vitoriosa feminina no 12 além de Katniss, porém não se sabe seu nome e se ela já teria falecido. A verdade é que cabe ao leitor realizar sua própria interpretação da história e tomar suas conclusões sobre o paradeiro de Lucy.
O pobre garoto Plinth
Sobre o personagem Sejanus, é interessante explicar que nunca foi pobre - já que até nos distritos existia uma divisão de classes evidente - mas conhecia as dificuldades, vivia perto delas e, ao se mudar para um ambiente onde elas deixam de existir, percebe a bolha em que estará inserido para o resto de sua vida. Essa mudança repentina o faz perceber seu novo ambiente de privilégio.
Ao escolher lutar pelo que acredita, o jovem encontra dificuldades de lidar com o conservadorismo de seu novo lar. Um lugar onde pensar que jovens não deveriam pagar com suas vidas pelas ações de seus antepassados é considerado uma opinião absurda. Um paralelo ao mundo real pode ser criado com a situação do Brasil durante o governo Bolsonaro. Os grupos de extrema direita tiveram uma taxa de adesão exponencial durante os 4 anos de mandato do ex-presidente, fazendo com que a população tivesse que enfrentar com um retrocesso evidente, crescimento de preconceitos contra vários grupos, invisibilização de uma grande parcela dos brasileiros, e o pior de tudo, uma população censurada em suas lutas.
Rebeldes forçados a performar
É fácil associar Lucy Gray como um espelho de Katniss, protagonista da saga principal. Porém, quando se atenta aos detalhes, pode-se perceber que seu paralelo no prequel é com o personagem Sejanus. Os dois personagens são guiados pelas emoções, muitas vezes agindo de forma precipitada, causando problemas para si próprios e para as pessoas em sua volta.
Durante a 10ª edição, Sejanus é colocado para mentorear o tributo do distrito 2, sua terra natal. Quando Marcus, a quem mentoria, morre, ele invade a arena para realizar um ritual de passagem do corpo. Esse ato, sem más intenções de sua parte, se torna um símbolo da rebelião, o que leva Sejanus a ser punido, culminando em sua ida ao distrito 12 como pacificador.
Na edição de Katniss, ela adota um ritual semelhante após a morte de Rue, outra participante dos jogos, que ficou conhecido como o início da segunda rebelião, pois desencadeia uma onda de protestos violentos por parte dos distritos.
Pode-se ver que ambos os atos foram despretensiosos e geraram cenários muito piores do que os personagens presumiam. Apesar deles possuírem ideais fortes mostrados constantemente durante suas respectivas histórias, os dois não estão preparados para encarar as consequências de seus atos. São rebeldes, não realizam uma performance.
Performáticos forçados a serem rebeldes
Se Lucy Gray não é conectada a Katniss, então é Peeta Mellark, vitorioso do 74º Jogos Vorazes junto à protagonista. Os dois são personagens desligados de toda a questão social no início de suas jornadas e mais racionais do que a dupla oposta.

Quando Peeta volta para a 75ª edição dos jogos, durante as entrevistas com os tributos, ele mente que teria se casado com Katniss e que ela estaria carregando seu filho. A história foi criada na tentativa de parar o evento, pois Peeta sabia que a população estaria mais preocupada com um possível filho, por terem sido personagens queridos nos jogos anteriores, do que com os outros tributos.
Já no prequel, durante a colheita (cerimônia de sorteio dos participantes dos jogos), Lucy Gray também atrai os olhares dos telespectadores. A protagonista já estava preparada para ver seu nome sendo sorteado, por ter tido desentendimentos com a família do prefeito – que burlava as regras da colheita com frequência. Ela leva uma cobra escondida e a coloca dentro das roupas de uma das integrantes da família, performando a música “Nothing you can take from me”, que aborda sobre as pessoas só poderem tirar dela aquilo que não tem real significado.
Logo, fica claro que ambos personagens usam de suas habilidades com o público a seu favor, se transformando em pessoas amadas pela Capital. Os dois estão realizando uma performance em meio a uma rebelião.
Natureza humana
O livro “A cantiga dos pássaros e das serpentes” utiliza das teorias contratualistas de Hobbes, Locke e Rousseau para mostrar pontos de vista diferentes da história. O longa anteceder os acontecimentos da trilogia principal é crucial para entender o ponto de vista da autora sobre a situação.
Na 10ª edição dos jogos, a Capital tinha dificuldades de manter a tradição viva pois os jogos eram muito brutais e pouco atrativos para a população. Isso mostra a ideia de Jean-Jacques Rousseau de que não é oriundo da natureza humana se sentir atraído por tamanho sofrimento, ou seja, o ser humano não é ruim por natureza, o sistema o corrompe.
Após algumas mudanças como assinar mentores para os tributos, fazer entrevistas com os sorteados, torná-los produtos a serem vendidos, a sociedade passa a acolher o evento, mostrando mais uma vez que a bondade da sociedade pode sim ser corrompida pelo sistema.
Porém, a teoria de Rousseau não é a única vista ao decorrer da história. Em conversa entre Snow e Dra Gaul, eles compartilham da visão de que a massa necessita de uma figura de autoridade regendo-a, assim, impondo a imagem de que a natureza humana é ruim e é preciso que exista um líder para apaziguar os conflitos, se assemelhando as ideias expostas por John Locke, em que a maldade natural do ser humano só pode ser controlada por uma figura autoritária.
“Vou buscar um pouco de Katniss”
O nome da protagonista da trilogia principal também tem um grande significado ao decorrer do filme. Na cena final de Lucy Gray, antes de desaparecer, ela deixa a cabana dizendo sua última frase no filme “Vou buscar um pouco de Katniss”. No universo, o nome Katniss é proveniente de uma espécie de raiz comestível, como uma batata.
A frase é simbólica pois a personagem foi a última fonte de rebeldia antes de sumir. Por 64 anos, até a edição de Katniss, os distritos vivem submissos à Capital, sem nenhuma esperança de pôr fim ao regime. O movimento só ganha força quando Katniss decide tomar a frente dos rebeldes e se tornar o rosto da revolução. Então, quando Lucy Gray desaparece, ela apenas foi buscar a pessoa que daria fim à ditadura de Snow.
O tordo
As simbologias não param por aí. Além do nome da protagonista, o pássaro tordo, grande imagem da revolução de Katniss, também faz aparições no prequel. O pássaro fictício é um híbrido entre o Jabberjay, espécie oriunda do distrito 12, e o mockingbird, uma besta criada pela Capital capaz de repetir a voz humana para espionar grupos rebeldes. O acasalamento das duas espécies resultou no tordo, um pássaro capaz de reproduzir apenas melodias. Em conversa entre o casal do novo longa, Lucy Gray comenta que “nada está acabado até o tordo cantar”. A frase da personagem é um paralelo não só com o seu fim mas com o de Snow e o de Plinth.

Quando Sejanus é levado para cumprir sua sentença, em um ato desesperado por estar frente a frente com a morte, o garoto grita por sua mãe. Ao ouvir seus berros, os pássaros repetem a melodia. Quando Plinth é calado pela corda em seu pescoço, apenas pode-se ouvir dos tordos cantando suas últimas palavras em meio ao silêncio da plateia que se juntou embaixo da árvore forca.
Na cena em que a garota desaparece, Coriolanus está sozinho na floresta e escuta apenas os tordos ecoando a melodia cantada por ela, dando a entender que a história de Lucy Gray foi completa, pois o tordo cantou.
Já em “A Esperança”, Katniss, que por ser o rosto da revolução recebeu o apelido de tordo, é a pessoa escolhida para executar o então presidente Snow por seus crimes contra a população de Panem. Sua vida termina com o cantar do tordo, a flecha de Katniss no coração de Snow, que finaliza a trama.
O espírito de Lucy Gray
A personagem se mantém presente mesmo após seu fim trágico. Durante sua cena final é possível perceber um arco-íris passando pela tela. Lucy Gray ficou conhecida como “a menina do vestido arco-íris”, pela saia colorida que utilizou na arena, um sinal de que o espírito da garota continuaria a assombrar Snow enquanto vivesse.
As músicas compostas por ela também se mantêm vivas. A trilha sonora mais famosa da trilogia original, “Hanging tree”, é apresentada para os telespectadores como de autoria de Lucy Gray, escrita como uma mensagem para Snow, para que os dois se encontrassem embaixo da árvore forca ao amanhecer. Em "A Esperança”, a música vira símbolo de resistência da rebelião, sendo usada em propagandas rebeldes e cantada por Katniss como sinal de alerta durante ataques. Essa é mais uma maneira de Suzanne Collins mostrar a seu público que o ódio que o presidente Snow nutria por Katniss não era apenas pela ameaça que ela causava a sua autoridade, mas sim pela figura que ela indiretamente representava.
A história gira em torno do casal Margot (Marieta Severo), e Antônio (Zécarlos Machado), uma das maiores atrizes do Brasil e um escritor premiado portador de Alzheimer no estágio avançado. No decorrer da história, Margot recebe o diagnóstico com a mesma doença e se vê paralisada pela incerteza de seu próprio futuro. Enquanto lida com a condição, a personagem enfrenta a dura realidade onde sua memória, grande aliada de sua carreira e vida pessoal, está se deteriorando. Ao mesmo tempo, a relação com seus filhos, antes distante devido às exigências de sua carreira e o foco em seu marido, começa a se transformar. O longa Domingo À Noite estreou nesta quinta-feira (04) nos cinemas brasileiros.
Zé Carlos, apesar das poucas falas durante o filme, mostra que é capaz de usar seu instrumento principal, o corpo, com muita habilidade, ao entregar uma performance visceral e emocionante. Sua parceira de cena, Marieta, se comunica através das emoções e transita entre elas com bastante facilidade, sem se perder em um limbo caricato.
A obra apresenta boas performances, mas peca na trilha sonora: a presença limitada de um único som de piano, que toca esporadicamente ao longo da narrativa, deixa um vazio que poderia ser preenchido por outras músicas instrumentais. Uma diversidade nesse aspecto traria um ritmo mais harmonioso à história.
A fotografia exibe as belas paisagens litorâneas da cidade do Rio de Janeiro, e traça um paralelo com a natureza verdejante ao redor. O diretor parece brincar com diversos tipos de enquadramentos da câmera, transitando entre tomadas em grande angular e planos mais fechados, capturando detalhadamente cada expressão e movimento dos protagonistas com precisão.
A família é disfuncional, assim como grande parte das brasileiras e das ao redor do mundo, e não força uma imagem unilateral da união e do amor incondicional. Os filhos, Francine (Natália Lage), também é atriz, e Guto (Johnnas Oliva), é um empresário no ramo do mercado financeiro.
A devoção de Margot ao cuidar diariamente do marido que se encontra em degradação por causa do Alzheimer reflete como o amor pode se manifestar na terceira idade, servindo como uma espécie de declaração sincera sobre a essência do compromisso conjugal. Trata da responsabilidade de cuidar não como um fardo, mas com leveza, mesmo diante das adversidades e dos momentos desafiadores que a vida lhe impôs. Quando descobre que está tendo lapsos de memória, Margot luta contra o tempo para conseguir terminar seu último projeto no cinema e resolver as questões pendentes com seus filhos, para então brilhar em um novo palco, em que a luz eterna reserva o seu ato final.
O cinema brasileiro necessita urgentemente de tramas mais envolventes e profundas, que criem uma conexão real com o espectador, que sejam capazes de desafiar o predomínio de comédias ‘pastelão’ que, embora populares, raramente se aprofundam em questões atuais relevantes. Essas produções, com maior objetivo de atingir números, muitas vezes negligenciam a importância de refletir e discutir as complexidades das questões acerca da sociedade contemporânea. Nesse contexto, "Domingo À Noite" se destaca como uma obra de grande impacto, mergulha na essência da velhice sem embelezamentos e posiciona idosos como os personagens centrais do enredo. Ao fazer isso, o filme não só desafia o etarismo prevalente, que tende a marginalizar as gerações mais velhas em favor de histórias voltadas para o público jovem. A presença desses protagonistas vivendo a maturidade nas telas é um lembrete valioso da diversidade de experiências humanas. Portanto, visto que o longa já estreou, é uma oportunidade imperdível de apoiar e divulgar um cinema nacional que se aventura além do trivial, merecendo ser visto, revisto e celebrado por todos os amantes da sétima arte.
Na última sexta-feira (08), o intérprete carioca desembarcou em São Paulo, mais especificamente, no Tucarena, após uma temporada de sucesso no Rio de Janeiro, no Teatro Poeira, para apresentar o espetáculo “Todas as Coisas Maravilhosas”, sob direção de Fernando Philbert.
A trama se concentra em um garoto de sete anos que, ao notar que sua mãe está lutando contra a depressão, cria uma lista e enumera tudo o que, aos seus olhos, é maravilhoso. Seu objetivo é ajudá-la a reencontrar a alegria de viver. Conforme ele cresce, acaba sendo confrontado com os impactos que o estado mental de sua mãe teve sobre ele, refletindo sobre como isso o afetou.
A interação entre ator e espectador se mostra bastante evidente, e é justamente através dessa conexão que a performance evolui. Embora possa parecer um monólogo, a presença de Kiko somada à disposição da plateia em engajar-se na experiência, compõem e complementam as cenas, fazendo com que o ator improvise em diversos momentos.
O espetáculo aborda temáticas desafiadoras e complexas, com muita delicadeza e de forma sutil, ao mesmo tempo que incorpora nuances de humor, às vezes em um sentido até autodepreciativo, e que enriquecem a narrativa ao longo de seus setenta minutos.
É necessário enaltecer o trabalho magistral de Kiko, que, apesar de sua estatura não muito alta, expande sua presença quando pisa no teatro de arena. Sua habilidade extraordinária em retratar todos os gestos e maneirismos de uma criança é impressionante, mesmo estando encapsulado num corpo de homem adulto.
Por um lado, entrega uma performance que emociona, e por outro, arranca gargalhadas do público, e isso acontece quase que simultaneamente.
“Todas as Coisas Maravilhosas” merece ser vista e revista. Dificilmente você entra na sessão e sai do mesmo jeito. A sensação é quase como estar em uma sessão de terapia - daquelas que te balançam e te arrebatam.
Como a divulgação ‘’boca a boca’’ é sempre a mais eficaz, prestigiem este espetáculo e o divulguem. Mais pessoas merecem vivenciar essa experiência transformadora.
Para se programar: de quinta a sábado, às 21h, aos domingos, às 18h. Os ingressos estão disponíveis para vendas online e presenciais, tanto no aplicativo do Sympla como na bilheteria do teatro. Alunos da PUC-SP, inclusive, têm direito a um preço exclusivo, basta se identificar com os dados solicitados.
Na correria rotineira presente na vida de mais de 12 milhões de paulistanos, muitos passam pelas ruas sem se darem conta do que está a sua volta. Dentre estas pessoas, comerciantes, moradores de rua e funcionários diversos só recebem a devida atenção quando são úteis para as vidas dos habitantes da cidade, caso contrário, passam despercebidos e invisíveis. Esse, senhoras e senhores, é o lado oculto do mundo:




