Gigantes do pop surpreendem público com parceria inédita
por
Khauan Wood
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06/09/2024 - 12h

Lançado em 16 de agosto, o single ‘Die With A Smile’ - ‘Morra Com um Sorriso’, em tradução livre - trouxe pela primeira vez a parceria da dupla no cenário musical. Os indícios  do dueto vieram desde o início da semana do lançamento, quando ambos fizeram postagens em suas redes sociais usando camisetas com o nome e rosto do outro.

Com uma sonoridade envolvente e emocionante, a música romântica traz uma mistura de pop, soul e folk. Nenhum dos dois economizou nas exibições vocais e na interpretação cênica da letra, que retrata a importância de pequenos momentos e como não estamos preparados para despedidas, principalmente quando se tem amor envolvido. A letra ainda relata que, no fim do mundo, o casal tem a intenção de estar junto para morrer com um sorriso, daí o trecho que dá nome à canção.

O casal retratado no eu-lírico da canção mostra uma paixão mútua intensa, algo que Gaga e Bruno demonstram de forma ímpar em sua exibição e trazem ao público uma apoteótica química, o que nos mostra o motivo de serem um dos maiores sucessos atuais na música internacional.

O clipe da música traz os dois ao centro de um palco do que seria um programa de televisão americano dos anos 1970. Bruno com uma guitarra e Gaga com um teclado, ambos com roupas combinando em tons de azul e vermelho, ela ao melhor estilo Dolly Parton e ele com um figurino que se assemelha a um cowboy forasteiro.

Essa parceria não poderia render números baixos. O clipe tem mais de 50 milhões de visualizações no YouTube, já no Spotify são cerca de 65 milhões de streams, estando no top global da plataforma por duas semanas consecutivas. A música também figura no ranking Hot 100 da revista Billboard desde o seu lançamento, ocupando atualmente a sexta colocação.

Em resumo, os artistas dão ao público uma experiência única ao ouvir o single, uma interpretação diferente do que costumam lançar. Cada trecho dos quatro minutos e doze segundos vale a pena, tanto para quem está apaixonado, quanto para quem vivenciou uma desilusão amorosa, ou só para quem  apenas deseja ouvir uma boa música.

Clique aqui para ouvir a música completa:

O segundo álbum como artista independente de Liniker entrou no topo das plataformas e marcou a brasilidade da cantora
por
Wanessa Celina
Inaiá Misnerovicz
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04/09/2024 - 12h

 

Na madrugada do dia 19 de agosto, após 3 anos de seu último lançamento, a cantora e compositora Liniker lançou  o álbum “Caju” que, já nas primeiras 24 horas de lançamento, teve seis milhões de reproduções. Revelado em um momento de profunda introspecção e inovação, o disco marca uma mudança na carreira da artista e na atual cena musical brasileira, entrelaçando experiências pessoais com uma estética única.

Com letras que exploram temas de identidade, amor e resiliência, “Caju” não é apenas uma evolução musical, mas também um testemunho de força e autenticidade, oferecendo uma visão íntima do universo de Liniker, enquanto desbrava novas fronteiras sonoras, combinando elementos de soul, funk e MPB, criando um ambiente que reflete tanto suas raízes culturais quanto suas aspirações contemporâneas.

 

De faixa em faixa com AGEMT

 

A primeira faixa “CAJU", que dá nome ao álbum, é uma peça central que encapsula muitos dos temas abordados ao longo do disco. A música explora questões de identidade, memória e afeto, utilizando a figura do caju como uma metáfora rica em significados. A música se destaca pela sua delicadeza que gera uma atmosfera calorosa e íntima, e pela fusão de elementos do MPB, soul e ritmos afro-brasileiros. O uso de instrumentos como o violão e teclados suaves, combinado com uma percussão leve, reforça a sensação de aconchego e conexão com a natureza, remetendo à simplicidade e à beleza do caju como símbolo. 

 

Em “TUDO”, a segunda faixa, lançada como single, Liniker faz uso de batidas envolventes e empolgantes enquanto adiciona um refrão vicioso. A letra é embargada do sentimento de amor e de querer estar com a outra pessoa, utilizando o filme “Um amor para recordar” –  baseado no livro de Nicholas Sparks – para romantizar o amor sem ensaio: o amor espontâneo. Entretanto, a parte mais importante, e a que nomeia a faixa, é  o último verso que verbaliza como a protagonista não se diminuirá para caber em relações pequenas já que sua vontade de amar é tudo.

 

                                   

 

"VELUDO MARROM", com 7 minutos de duração, se destaca por sua suavidade e intensidade emocional. A canção explora novamente temas  relacionados ao amor, intimidade, e vulnerabilidade, fazendo isso através de uma combinação de letra poética e arranjos musicais cuidadosamente construídos. A faixa começa com uma introdução suave, marcada por acordes delicados e aveludados (como o próprio título sugere), que criam uma atmosfera íntima e acolhedora. Essa junção permite que o foco principal seja a voz de Liniker. A letra é profundamente simbólica e evocativa. O "veludo marrom" do título pode ser interpretado como uma metáfora para algo precioso, raro, e confortante. O veludo é um tecido que remete ao toque, à suavidade e ao luxo, sugerindo uma relação que é ao mesmo tempo acolhedora e envolvente.

 

"AO TEU LADO", faixa com colaboração da dupla ANAVITÓRIA, é uma celebração da intimidade e da conexão profunda entre duas pessoas. A música, com sua melodia suave e arranjo aconchegante, reflete a simplicidade e a beleza do amor genuíno. A interpretação vocal de Liniker é o ponto alto da faixa, transmitindo a segurança e o afeto que vêm de estar ao lado de alguém especial. Essa canção é um dos momentos mais ternos e sinceros do álbum, demonstrando a habilidade de Liniker em capturar as nuances do amor e da relação humana. 

 

"ME AJUDE A SALVAR OS DOMINGOS"  aborda a melancolia e a solidão associadas ao fim de semana, especialmente ao domingo, tradicionalmente conhecido como um dia de descanso. A música se destaca pela forma como trata das emoções complexas de maneira íntima e vulnerável. A produção é delicada, com arranjos que utilizam piano, violão, e alguns toques eletrônicos sutis para criar uma atmosfera contemplativa. O ritmo é lento e cadenciado, refletindo o tom melancólico da canção, e o desânimo sentido aos domingos. Essa faixa é uma expressão de um desejo profundo de encontrar conforto e companhia em um dia que, para muitos, é solitário e emocionalmente pesado. O domingo aqui é retratado como um momento em que a ausência e o vazio são mais percebidos, principalmente quando alguém se encontra sozinho ou em um estado de reflexão.

 

Com a participação de BaianaSystem, a faixa “NEGONA DOS OLHOS TERRÍVEIS” traz a valorização dos corpos femininos, especialmente o corpo negro. Com ritmos corriqueiros da música baiana, a faixa traz a símbolos da cultura afro-brasileira, com a representação da sereia, a “lavagem no Bonfim”, o “Abaeté”. Liniker, como uma mulher candomblecista, enaltece sua cultura e a feminilidade. Assim acontece com a próxima faixa, "MAYONGA", que também se destaca pela abordagem da ancestralidade, identidade e espiritualidade, mesclando ritmos afro-brasileiros e elementos contemporâneos e criando uma música com uma riqueza cultural intensa, que explora o conceito africano Sankofa – a importância de olhar o passado para construir o presente. O próprio nome da obra faz referência a religião afro-brasileira. “Mayonga” pode ser interpretada como uma figura mítica, representando a conexão com as raízes ancestrais e a força espiritual que advém dessa conexão, ou ainda como uma bebida tradicional que carrega consigo o poder de cura e proteção.   

 

A oitava faixa do álbum, “PAPO DE EDREDOM”,  com a colaboração da cantora e compositora soteropolitana, Melly, revela o afeto que, como cantam, esquenta como se fosse verão. O encontro dessas duas potências cancerianas traz o fervor da atração na letra e na melodia. Com o ritmo mais lento, a música transmite a complexidade da sensualidade, as vozes das duas artistas se misturam e tornam-se únicas. É a segunda vez que Liniker e Melly colaboram em um trabalho, no álbum de estreia da Melly, o Amaríssima, as duas cantoras dividem suas potências na faixa “10 minutos”, outra incrível amostra do talento que elas possuem juntas.

                                 

 

“POPSTAR” e “POTE DE OURO” são faixas que se complementam. Trazendo ritmos brasileiríssimos, Liniker mostra o lado do amor que mais importa: o amor próprio. As músicas exalam a autoconfiança que é facilmente deixada de lado em muitos discos românticos, é o olhar para si mesmo e perceber que merecem mais carinho e atenção do que estão recebendo. “Pote de ouro” conta com a participação da cantora Priscila Senna, dona dos hits mais tocados nas rádios recifenses como “Te Beijo Chorando”. As duas músicas apresentam a supervalorização da personagem principal, a colocando como “tesouro raro” e até “pote de ouro”.

 

E não tem como falar de ritmos brasileiros sem falar de samba. É desse gênero, tão amado pelos brasileiros, que “FEBRE”, a décima faixa do álbum, se apropria. A música é extremamente dançante e gostosa de escutar, a sensação que exala dela é de um fim de tarde de um domingo no qual a vontade de amar aperta. E é nessa vibe dançante que  “DEIXA ESTAR” se encontra,  com a participação de Lulu Santos e Pabllo Vittar. A música, com seu estilo Boogie Woogie, deixa de lado a dúvida e passa a mensagem de que o dia está acabando e a personagem principal está pronta para o que vier.

 

A penúltima faixa de CAJU, “SO SPECIAL”, com colaboração do duo de DJs Tropkillaz, começa com um barulho de chaves e uma porta de um carro batendo: o indício de que o fim está próximo. Liniker canta com um inglês poético, a batida eletrônica carrega a leveza que so special transmite. Perfeita para uma balada, a artista mostra mais uma vez sua versatilidade musical. Os últimos segundos da música são um vazio, mas um vazio barulhento. Um eco após a Liniker exclamar “You so special” que se estende por vinte segundos perfeitos que relembram como um “acordar”. 

 

A última faixa “TAKE YOUR TIME AND RELAXE”, que, em uma tradução livre, seria o mesmo que dizer “espere e relaxe”, Liniker recita uma carta. De Caju para Caju. A faixa traz jús ao nome, é relaxante e traz esperança em sua letra. De todas as canções do álbum, essa é a que mais reproduz a necessidade de liberdade, de se entender como pessoa grande, mesmo com os altos e baixos da vida. Enfim, o álbum proporciona o conhecimento de Caju, e mostra o seu auto conhecimento.

 

Sensações finais

 

Liniker mostrou, outra vez, o motivo de ter sido imortalizada na Academia Brasileira de Cultura. Em um mundo cada vez mais rápido, onde o neoliberalismo transforma o cenário em fábricas de som com no máximo 2 minutos de duração e poucas faixas, a artista dá um salto à frente e relembra o gosto de apreciar a música. CAJU, um álbum extenso de uma hora de duração, não há como ser apenas escutado,  é preciso entendê-lo. 

 

A autoestima e o carinho que ressoam no álbum são o  que explica os 30 milhões de streamings em apenas 4 dias após seu lançamento. É a versatilidade de Liniker, que atravessa por gêneros musicais diferentes, e o seu trabalho de compositora, produtora, cantora e estudiosa musical, que traz a música brasileira a patamares altos. CAJU atingiu o  6º lugar no álbum debut global no Spotify e vem subindo cada vez mais nos charts, mostrando sua relevância.

 

Suzanne Collins, autora da saga, diz só publicar livros quando tem algo a dizer
por
Manuela Schenk Scussiato
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20/06/2024 - 12h

O livro “A cantiga dos pássaros e das serpentes”, publicado em 19 de junho de 2020, ganhou sua adaptação para o cinema no dia 15 de novembro do ano passado. A história se passa 64 anos antes dos primeiros jogos de Katniss e 10 anos após o fim da rebelião dos distritos contra a capital de Panem, quando os jogos foram criados. Desta vez, ela segue o jovem Coriolanus Snow - presidente do país durante a trilogia original - e sua experiência como mentor da tributo feminina do distrito 12, Lucy Gray Baird. 

Poster do Filme Reprodução: Adoro Cinema
Poster do filme/Divulgação

A história

O longa se passa em um cenário pós guerra. O país fictício Panem ainda sofre com as consequências da destruição causada pela rebelião dos distritos, o luto, além de traumas acumulados e o lastro de destruição econômica, política e social. 

Nesse cenário, são criados os Jogos Vorazes. Idealizados por Dean Casca Highbottom e coordenados pela Doutora Gaul, são uma punição para os cidadãos dos distritos pela rebelião, e consistem em sortear um menino e uma menina entre 12 e 18 anos de cada distrito, para lutarem entre si em uma arena televisionada. O intuito é lembrar às gerações futuras dos erros cometidos por seus antepassados, e relembrá-los dos perigos de ir contra as regras impostas pelo capital, que rege o país.

Snow vive na Capital com sua prima Tigris e sua avó. A família enfrenta problemas financeiros, apesar de fazer parte da alta classe da capital, os Snow foram muito afetados pela guerra após a morte do pai em batalha. Durante o filme, a família tenta esconder sua situação atual para a sociedade.

Outro personagem incorporado na narrativa é Sejanus Plinth. Nascido no distrito 2, ele e sua família são presenteados com a vida na alta sociedade pelo trabalho de seu pai contra as forças rebeldes durante os tempos de guerra. Porém, desde sua primeira aparição, Sejanus discorda das ideias da Capital, desprezando também o preconceito contra os distritos. 

Na trama, o número dos distritos também importa: divididos em 12, cada um produz artigos e possui uma qualidade de vida maior se comparados ao número seguinte.  Por exemplo, enquanto o distrito 1 é produtor de artigos de luxo, o distrito 2 lida com os processos militares, distritos como o 9, o 11 e o 12, realizam um trabalho mais pesado - plantação de grãos, indústria têxtil e mineração - e também são locais racializados, onde se encontram famílias de origem indígena e afro americana.

A jovem Lucy Gray, moradora do distrito 12 é descrita como estranha e pequena, mas devido ao seu carisma e talento musical, Snow, seu mentor, a transforma na favorita para os jogos da 10ª edição, garantindo sua vitória.

Entretanto, essa vitória também é atrelada a sua trapaça: a menina leva veneno de rato para a arena com a ajuda de Snow, que é punido, passando a trabalhar como militar, também chamado de pacificador, no distrito 12, junto de Sejanus. O mentor e a vitoriosa embarcam em um romance após o fim da edição.

Sejanus Plinth se junta a um grupo rebelde durante seu período de trabalho, gerando problemas maiores: em um embate, Snow mata dois rebeldes, entre eles a filha do prefeito do distrito. Snow e Lucy acabam escapando, mas Plinth é sentenciado à morte. Após o falecimento do amigo, o casal foge para o norte.

Durante o caminho, os dois se desentendem, fazendo com que Lucy fuja após uma briga, enquanto seu mentor a ameaça e atira projéteis em sua direção. Coriolanus volta para a Capital, é perdoado e convidado para trabalhar na direção do evento. Ao retornar, Snow apaga todos os registros de Lucy Gray, incluindo a gravação de sua edição dos jogos. Anos depois, Snow se torna presidente do país. 

O enredo de Lucy Gray ainda é um mistério, sendo incerto se ela realmente teria sido atingida ou não. A única menção à Lucy na trilogia principal acontece no segundo livro, quando há uma vitoriosa feminina no 12 além de Katniss, porém não se sabe seu nome e se ela já teria falecido. A verdade é que cabe ao leitor realizar sua própria interpretação da história e tomar suas conclusões sobre o paradeiro de Lucy.

 

O pobre garoto Plinth

Sobre o personagem Sejanus, é interessante explicar que nunca foi pobre - já que até nos distritos existia uma divisão de classes evidente - mas conhecia as dificuldades, vivia perto delas e, ao se mudar para um ambiente onde elas deixam de existir, percebe a bolha em que estará inserido para o resto de sua vida. Essa mudança repentina o faz perceber seu novo ambiente de privilégio.

Ao escolher lutar pelo que acredita, o jovem encontra dificuldades de lidar com o conservadorismo de seu novo lar. Um lugar onde pensar que jovens não deveriam pagar com suas vidas pelas ações de seus antepassados é considerado uma opinião absurda. Um paralelo ao mundo real pode ser criado com a situação do Brasil durante o governo Bolsonaro. Os grupos de extrema direita tiveram uma taxa de adesão exponencial durante os 4 anos de mandato do ex-presidente, fazendo com que a população tivesse que enfrentar com um retrocesso evidente, crescimento de preconceitos contra vários grupos, invisibilização de uma grande parcela dos brasileiros, e o pior de tudo, uma população censurada em suas lutas.

 

Rebeldes forçados a performar

É fácil associar Lucy Gray como um espelho de Katniss, protagonista da saga principal. Porém, quando se atenta aos detalhes, pode-se perceber que seu paralelo no prequel é com o personagem Sejanus. Os dois  personagens são guiados pelas emoções, muitas vezes agindo de forma precipitada, causando problemas para si próprios e para as pessoas em sua volta.

Durante a 10ª edição, Sejanus é colocado para mentorear o tributo do distrito 2, sua terra natal.  Quando Marcus, a quem mentoria, morre, ele invade a arena para realizar um ritual de passagem do corpo. Esse ato,  sem más intenções de sua parte, se torna um símbolo da rebelião, o que leva Sejanus a ser punido, culminando em sua ida ao distrito 12 como pacificador. 

Na edição de Katniss, ela adota um ritual semelhante após a morte de Rue, outra participante dos jogos, que ficou conhecido como o início da segunda rebelião, pois desencadeia uma onda de protestos violentos por parte dos distritos.

Pode-se ver que ambos os atos foram despretensiosos e geraram cenários muito piores do que os personagens presumiam. Apesar deles possuírem ideais fortes mostrados constantemente durante suas respectivas histórias, os dois não estão preparados para encarar as consequências de seus atos. São rebeldes, não realizam uma performance.

 

Performáticos forçados a serem rebeldes

Se Lucy Gray não é conectada a Katniss, então é Peeta Mellark, vitorioso do 74º Jogos Vorazes junto à protagonista. Os dois são personagens desligados de toda a questão social no início de suas jornadas e mais racionais do que a dupla oposta. 

Lucy Gray, interpretada por Rachel Zegler, performando durante a colheita Reprodução: The Cosmic Circus
Lucy Gray, interpretada por Rachel Zegler, performando durante a colheita / Divulgação 

Quando Peeta volta para a 75ª edição dos jogos, durante as entrevistas com os tributos, ele mente que teria se casado com Katniss e que ela estaria carregando seu filho. A história foi criada na tentativa de parar o evento, pois Peeta sabia que a população estaria mais preocupada com um possível filho, por terem sido personagens queridos nos jogos anteriores, do que com os outros tributos. 

Já no prequel, durante a colheita (cerimônia de sorteio dos participantes dos jogos), Lucy Gray também atrai os olhares dos telespectadores. A protagonista já estava preparada para ver seu nome sendo sorteado, por ter tido desentendimentos com a família do prefeito – que burlava as regras da colheita com frequência. Ela leva uma cobra escondida e a coloca dentro das roupas de uma das integrantes da família, performando a música  “Nothing you can take from me”, que aborda sobre as pessoas só poderem tirar dela aquilo que não tem real significado.

Logo, fica claro que ambos personagens usam de suas habilidades com o público a seu favor, se transformando em pessoas amadas pela Capital. Os dois estão realizando uma performance em meio a uma rebelião.

 

Natureza humana

O livro “A cantiga dos pássaros e das serpentes” utiliza das teorias contratualistas de Hobbes, Locke e Rousseau para mostrar pontos de vista diferentes da história. O longa anteceder os acontecimentos da trilogia principal é crucial para entender o ponto de vista da autora sobre a situação. 

Na 10ª edição dos jogos, a Capital tinha dificuldades de manter a tradição viva pois os jogos eram muito brutais e pouco atrativos para a população. Isso mostra a ideia de Jean-Jacques Rousseau de que não é oriundo da natureza humana se sentir atraído por tamanho sofrimento, ou seja, o ser humano não é ruim por natureza, o sistema o corrompe.

Após algumas mudanças como assinar mentores para os tributos, fazer entrevistas com os sorteados, torná-los produtos a serem vendidos, a sociedade passa a acolher o evento, mostrando mais uma vez que a bondade da sociedade pode sim ser corrompida pelo sistema.

Porém, a teoria de Rousseau não é a única vista ao decorrer da história. Em conversa entre Snow e Dra Gaul, eles compartilham da visão de que a massa necessita de uma figura de autoridade regendo-a, assim, impondo a imagem de que a natureza humana é ruim e é preciso que exista um líder para apaziguar os conflitos, se assemelhando as ideias expostas por John Locke, em que  a maldade natural do ser humano só pode ser controlada por uma figura autoritária.

 

“Vou buscar um pouco de Katniss”

O nome da protagonista da trilogia principal também tem um grande significado ao decorrer do filme. Na cena final de Lucy Gray, antes de desaparecer, ela deixa a cabana dizendo sua última frase no filme “Vou buscar um pouco de Katniss”. No universo, o nome Katniss é proveniente de uma espécie de raiz comestível, como uma batata.

A frase é simbólica pois a personagem foi a última fonte de rebeldia antes de sumir. Por 64 anos, até a edição de Katniss, os distritos vivem submissos à Capital, sem nenhuma esperança de pôr fim ao regime. O movimento só ganha força quando Katniss decide tomar a frente dos rebeldes e se tornar o rosto da revolução. Então, quando Lucy Gray desaparece, ela apenas foi buscar a pessoa que daria fim à ditadura de Snow.

 

O tordo

As simbologias não param por aí. Além do nome da protagonista, o pássaro tordo, grande imagem da revolução de Katniss, também faz aparições no prequel. O pássaro fictício é um híbrido entre o Jabberjay, espécie oriunda do distrito 12, e o mockingbird, uma besta criada pela Capital capaz de repetir a voz humana para espionar grupos rebeldes. O acasalamento das duas espécies resultou no tordo, um pássaro capaz de reproduzir apenas melodias. Em conversa entre o casal do novo longa, Lucy Gray comenta que “nada está acabado até o tordo cantar”. A frase da personagem é um paralelo não só com o seu fim mas com o de Snow e o de Plinth.

Vestido de tordo usado por Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) no filme “Em Chamas” Reprodução: Loja mundo Geek
Vestido de tordo usado por Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) no filme “Em Chamas”/ Divulgação 

Quando Sejanus é levado para cumprir sua sentença, em um ato desesperado por estar frente a frente com a morte, o garoto grita por sua mãe. Ao ouvir seus berros, os pássaros repetem a melodia. Quando Plinth é calado pela corda em seu pescoço, apenas pode-se ouvir dos tordos cantando suas últimas palavras em meio ao silêncio da plateia que se juntou embaixo da árvore forca.

Na cena em que a garota desaparece, Coriolanus está sozinho na floresta e escuta apenas os tordos ecoando a melodia cantada por ela, dando a entender que a história de Lucy Gray foi completa, pois o tordo cantou.

Já em “A Esperança”, Katniss, que por ser o rosto da revolução recebeu o apelido de tordo, é a pessoa escolhida para executar o então presidente Snow por seus crimes contra a população de Panem. Sua vida termina com o cantar do tordo, a flecha de Katniss no coração de Snow, que finaliza a trama.

 

O espírito de Lucy Gray

A personagem se mantém presente mesmo após seu fim trágico. Durante sua cena final é possível perceber um arco-íris passando pela tela. Lucy Gray ficou conhecida como “a menina do vestido arco-íris”, pela saia colorida que utilizou na arena, um sinal de que o espírito da garota continuaria a assombrar Snow enquanto vivesse.

As músicas compostas por ela também se mantêm vivas. A trilha sonora mais famosa da trilogia original, “Hanging tree”, é apresentada para os telespectadores como de autoria de Lucy Gray, escrita como uma mensagem para Snow, para que os dois se encontrassem embaixo da árvore forca ao amanhecer. Em "A Esperança”, a música vira símbolo de resistência da rebelião, sendo usada em propagandas rebeldes e cantada por Katniss como sinal de alerta durante ataques. Essa é mais uma maneira de Suzanne Collins mostrar a seu público que o ódio que o presidente Snow nutria por Katniss não era apenas pela ameaça que ela causava a sua autoridade, mas sim pela figura que ela indiretamente representava.

 

Filme traz elucidação importante sobre a finitude e o Alzheimer
por
Giovanna Montanhan
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05/04/2024 - 12h

A história gira em torno do casal Margot (Marieta Severo), e Antônio (Zécarlos Machado), uma das maiores atrizes do Brasil e um escritor premiado portador de Alzheimer no estágio avançado. No decorrer da história, Margot recebe o diagnóstico com a mesma doença e se vê paralisada pela incerteza de seu próprio futuro. Enquanto lida com a condição, a personagem enfrenta a dura realidade onde sua memória, grande aliada de sua carreira e vida pessoal, está se deteriorando. Ao mesmo tempo, a relação com seus filhos, antes distante devido às exigências de sua carreira e o foco em seu marido, começa a se transformar. O longa Domingo À Noite estreou nesta quinta-feira (04) nos cinemas brasileiros.

Zé Carlos, apesar das poucas falas durante o filme, mostra que é capaz de usar seu instrumento principal, o corpo, com muita habilidade, ao entregar uma performance visceral e emocionante. Sua parceira de cena, Marieta, se comunica através das emoções e transita entre elas com bastante facilidade, sem se perder em um limbo caricato.

A obra apresenta boas performances, mas peca na trilha sonora: a presença limitada de um único som de piano, que toca esporadicamente ao longo da narrativa, deixa um vazio que poderia ser preenchido por outras músicas instrumentais. Uma diversidade nesse aspecto traria um ritmo mais harmonioso à história. 

A fotografia exibe as belas paisagens litorâneas da cidade do Rio de Janeiro, e traça um paralelo com a natureza verdejante ao redor. O diretor parece brincar com diversos tipos de enquadramentos da câmera, transitando entre tomadas em grande angular e planos mais fechados, capturando detalhadamente cada expressão e movimento dos protagonistas com precisão.

A família é disfuncional, assim como grande parte das brasileiras e das ao redor do mundo, e não força uma imagem unilateral da união e do amor incondicional. Os filhos, Francine (Natália Lage), também é atriz, e Guto (Johnnas Oliva), é um empresário no ramo do mercado financeiro. 

A devoção de Margot ao cuidar diariamente do marido que se encontra em degradação por causa do Alzheimer reflete como o amor pode se manifestar na terceira idade, servindo como uma espécie de declaração sincera sobre a essência do compromisso conjugal. Trata da responsabilidade de cuidar não como um fardo, mas com leveza, mesmo diante das adversidades e dos momentos desafiadores que a vida lhe impôs. Quando descobre que está tendo lapsos de memória,  Margot luta contra o tempo para conseguir terminar seu último projeto no cinema e resolver as questões pendentes com seus filhos, para então brilhar em um novo palco, em que a luz eterna reserva o seu ato final. 

O cinema brasileiro necessita urgentemente de tramas mais envolventes e profundas, que criem uma conexão real com o espectador, que sejam capazes de desafiar o predomínio de comédias ‘pastelão’ que, embora populares, raramente se aprofundam em questões atuais relevantes. Essas produções, com maior objetivo de atingir números, muitas vezes negligenciam a importância de refletir e discutir as complexidades das questões acerca da sociedade contemporânea. Nesse contexto, "Domingo À Noite" se destaca como uma obra de grande impacto, mergulha na essência da velhice sem embelezamentos e posiciona idosos como os personagens centrais do enredo. Ao fazer isso, o filme não só desafia o etarismo prevalente, que tende a marginalizar as gerações mais velhas em favor de histórias voltadas para o público jovem. A presença desses protagonistas vivendo a maturidade nas telas é um lembrete valioso da diversidade de experiências humanas. Portanto, visto que o longa já estreou, é uma oportunidade imperdível de apoiar e divulgar um cinema nacional que se aventura além do trivial, merecendo ser visto, revisto e celebrado por todos os amantes da sétima arte. 

 

Em cartaz no Tucarena, Kiko Mascarenhas fala sobre temas sensíveis em peça aclamada de McMillan e Donahue, com tradução de Diego Teza
por
Giovanna Montanhan
|
13/03/2024 - 12h

Na última sexta-feira (08), o intérprete carioca desembarcou em São Paulo, mais especificamente, no Tucarena, após uma temporada de sucesso no Rio de Janeiro, no Teatro Poeira, para apresentar o espetáculo “Todas as Coisas Maravilhosas”, sob direção de Fernando Philbert. 

A trama se concentra em um garoto de sete anos que, ao notar que sua mãe está lutando contra a depressão, cria uma lista e enumera tudo o que, aos seus olhos, é maravilhoso. Seu objetivo é ajudá-la a reencontrar a alegria de viver. Conforme ele cresce, acaba sendo confrontado com os impactos que o estado mental de sua mãe teve sobre ele, refletindo sobre como isso o afetou. 

A interação entre ator e espectador se mostra bastante evidente, e é justamente através dessa conexão que a performance evolui. Embora possa parecer um monólogo, a presença de Kiko somada à disposição da plateia em engajar-se na experiência, compõem e complementam as cenas, fazendo com que o ator improvise em diversos momentos. 

O espetáculo aborda temáticas desafiadoras e complexas, com muita delicadeza e de forma sutil, ao mesmo tempo que incorpora nuances de humor, às vezes em um sentido até autodepreciativo, e que enriquecem a narrativa ao longo de seus setenta minutos.

É necessário enaltecer o trabalho magistral de Kiko, que, apesar de sua estatura não muito alta, expande sua presença quando pisa no teatro de arena. Sua habilidade extraordinária em retratar todos os gestos e maneirismos de uma criança é impressionante, mesmo estando encapsulado num corpo de homem adulto. 

Por um lado, entrega uma performance que emociona, e por outro, arranca gargalhadas do público, e isso acontece quase que simultaneamente. 

“Todas as Coisas Maravilhosas” merece ser vista e revista. Dificilmente você entra na sessão e sai do mesmo jeito. A sensação é quase como estar em uma sessão de terapia - daquelas que te balançam e te arrebatam.  

Como a divulgação ‘’boca a boca’’ é sempre a mais eficaz, prestigiem este espetáculo e o divulguem. Mais pessoas merecem vivenciar essa experiência transformadora. 

Para se programar: de quinta a sábado, às 21h, aos domingos, às 18h. Os ingressos estão disponíveis para vendas online e presenciais, tanto no aplicativo do Sympla como na bilheteria do teatro. Alunos da PUC-SP, inclusive, têm direito a um preço exclusivo, basta se identificar com os dados solicitados.

 

A invisibilidade social é um fenômeno presente nas grandes cidades do mundo.
por |
05/11/2023 - 12h

Na correria rotineira presente na vida de mais de 12 milhões de paulistanos, muitos passam pelas ruas sem se darem conta do que está a sua volta. Dentre estas pessoas, comerciantes, moradores de rua e funcionários diversos só recebem a devida atenção quando são úteis para as vidas dos habitantes da cidade, caso contrário, passam despercebidos e invisíveis. Esse, senhoras e senhores, é o lado oculto do mundo:

 

Foto 1
Natural de Recife, morador reside a mais de dez anos nos redores da Estação Conceição (São Paulo), onde cozinha, cuida de seus cachorros e convive com outras pessoas. // Foto: Vinícius Evangelista

 

Foto 2
Diogenes trabalha com comércio de rua desde seus 17 anos // Foto: Vinícius Evangelista

 

Foto 3
Motoristas de ônibus se reúnem durante o intervalo de trabalho // Foto: Vinícius Evangelista
Foto 1
Dona Enelita trabalha ao lado de seu sobrinho na loja "Tia do Dog" // Foto: Vinícius Evangelista

 

Foto 5
Sua lojinha de cachorro quente existe a mais de 30 anos! // Foto: Vinícius Evangelista


 

Livro septuagenário explora o interno do homem contemporâneo
por
Maria Eduarda Camargo
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20/09/2023 - 12h

 

"Existe a expressão ‘pária’, que no mundo dos homens é utilizada para se referir a pessoas derrotadas, miseráveis ou perversas. Mas sinto como se eu fosse um pária desde o momento em que nasci."

 

É assim que Dazai, ou seu alter ego Yozo, descreve a si próprio. Nascido em 1909, no interior do Japão, Shūji Tsushima – mais conhecido por seu pseudônimo Osamu Dazai – é reconhecido por ser um dos maiores escritores da literatura japonesa no século XX. Tendo uma vida curta, o escritor acabou não finalizando sua última obra, “Guddo bai”, ou “Adeus” em português. Sua obra mais conhecida, escrita nos últimos anos de vida, “Declínio de um homem”, aborda sua obsessão com o suicídio, além de suas complicadas relações com mulheres – em virtude dos abusos que sofreu quando criança.

Retrato fotográfico do autor Osamu Dazai
Retrato tirado do autor Osamu Dazai em 1948. Foto: Shigeru Tamura.

 

Durante as 148 páginas, Dazai sangra suas tripas entre as linhas de um estudante de artes em Tóquio, Yozo. Ele relata, por meio do alter ego, os problemas que enfrenta com a bebida e, mais tarde, morfina, além do que ele chama de "uma tristeza doente". E na efemeridade da tristeza é onde mora o bucólico brutal e descritivo de Dazai – seu poder de descrever algo que, naquela época, não se entendia: a depressão. Ele vê seu mundo cair por diversas vezes, fruto dos próprios atos (ou o que julga que sejam) e revolve-se em um redemoinho de solidão sem fim e sem escapatória. 

O personagem se envolve com diversas mulheres, que parecem intensificar seu modo de vida moribundo cada vez mais. Dentre prostitutas e bebidas, o que degringola o livro – e que pode ser considerado um clímax dentro de si mesmo – é a tentativa de suicídio duplo do personagem com uma garçonete de restaurante que ele conhece ao longo da trama, da qual apenas ele acaba sobrevivendo. Após ser indiciado pela cumplicidade ao suicídio, Yozo se vê preso mais uma vez na própria vida, vítima de um sentimento de inutilidade e de atrapalho que o circunda de todas as maneiras.

Existe, na literatura do autor, um certo aconchego na tristeza, que nos motiva como leitores a entrar na mente do personagem e compreendê-lo. Dazai vê na tristeza algo como um conforto sórdido; talvez até mesmo uma maneira de lidar com as adversidades que enfrenta e com os traumas pelos quais passa. É meio como a picada da anestesia, um amortecedor para a única certeza inevitável: a morte.

 

“A ideia de morrer não me incomodava, mas tinha horror da possibilidade de me ferir, perder sangue, tornar-me aleijado ou coisas do gênero”.

 

A leveza com que o autor declara seu desprezo pela vida – na linha tênue da aceitação da própria morte e do desgosto – nos leva a questionar, por muito, as relações sociais que cultivamos e a individualidade no modo de se enxergar a vida. É como um sapo que ferve lentamente em uma panela d’água e que só repara que vai morrer quando já é tarde demais. E nessa tristeza doentia e congênita que o autor se conforta, a alergia pela felicidade – como uma língua estrangeira, uma incapacidade de absorver qualquer emoção positiva. 

 

“É que os covardes temem até mesmo a felicidade”.

 

O que faz a literatura de Dazai atemporal – mesmo 75 anos após a publicação do livro – é justamente o exercício de descrever o mais profundo e primitivo dos sentimentos. Mudam-se as palavras; trocam-se os olhos, a língua, as mãos; remodelam-se os trens, ônibus, carros; as vestes, os sapatos; transmuta-se tudo: ainda nos sobra a inerente e inata tristeza de carregar o fardo de ser humano.

Pioneiro do ‘True Crime’, programa da Globo está de volta em meio à ascensão do gênero no país
por
Lais Romagnoli
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28/06/2023 - 12h


Tendo tido seu auge no fim dos anos 90 e início dos anos 2000, quando foi líder de audiência, o programa “Linha Direta” voltou a ser exibido no dia 4 de maio pela TV Globo. Apresentado originalmente pelo jornalista Domingos Meirelles, o programa abordava casos criminais e sobrenaturais com um tom sombrio que permanece até hoje no imaginário dos telespectadores.


Inspirado em atrações americanas, como “Yesterday” e “The Unsolved Mysteries”, Linha Direta se tornou um sucesso ao misturar a realidade com a encenação de fatos. Por mais de uma década, prendeu a atenção do público com uma linguagem clara e elementos de suspense.

Comandada pelo jornalista Pedro Bial, a nova versão propõe exibir ocorrências policiais que repercutiram nacionalmente, retratando os acontecimentos com simulações e entrevistas. Além de abordar o desfecho judicial dos casos, no fim de cada episódio, imagens de foragidos pela justiça serão divulgadas.

No dia em que Eloá completaria 30 anos, o programa de estreia exibiu a tragédia que resultou na morte da jovem. O sequestro, que durou aproximadamente 100 horas, é um dos exemplos mais conhecidos de sensacionalismo midiático, um dos principais pontos abordados por Bial.

Além da reconstituição, reportagens da época e entrevistas com especialistas são fundamentais para o entendimento do impacto da imprensa sobre o caso. Ligações de apresentadores para o sequestrador, atuando como negociadores sem o mínimo preparo, e a transmissão do cárcere em tempo real são apresentados como fatores contribuintes para o trágico desfecho de um dos casos de feminicídio mais famosos do país.

Em entrevista à revista CartaCapital, a cineasta e pesquisadora Lívia Perez, diretora do documentário “Quem matou Eloá” (2015), opinou sobre a cobertura jornalística do caso: “Houve uma postura muito machista por parte da imprensa, que enalteceu a personalidade do criminoso e romantizou o tipo de crime”. A diretora afirmou que esse comportamento midiático colabora nos altos índices de casos de violência contra a mulher.

O segundo episódio de “Linha Direta” exibiu um caso que chocou a Paraíba, a invasão a uma festa de aniversário que resultou no estupro coletivo de cinco mulheres e no assassinato de duas delas. Após as investigações, concluiu-se que tudo havia sido planejado pelo aniversariante e seu irmão, com o intuito de abusar sexualmente das convidadas da festa.

Buscando por culpados, familiares das duas vítimas fatais seguiram a crença popular e colocaram uma moeda debaixo da língua dos cadáveres para que os corpos sangrassem se o assassino estivesse por perto. assim feito, com a presença dos próprios no velório, os corpos de Izabella e Michele sangraram. O momento, retratado no “Linha Direta”, repercutiu nas redes sociais.

Uma das entrevistadas foi a irmã de Izabella, Ismênia Monteiro, que mesmo receosa decidiu se manifestar. "Eu não queria estar aqui, fazendo isso. Eu sei que de alguma forma expõe demais. Expõe a minha imagem. Me deixa de certa forma insegura. Mas neste momento eu não posso silenciar pelo meu sangue que foi derramado.”

O terceiro episódio contou a história de luta de um pai por justiça: o caso Henry, que impactou o país pela frieza da mãe e do padrasto do menino de apenas 4 anos. Ao ser entrevistado por Bial, o pai de Henry, Leniel, narrou detalhadamente o fim de semana fatídico e contou como tem sido sua vida após a tragédia. Lenielfundou a Associação Henry Borel, instituição com foco na proteção de crianças e adolescentes no Rio de Janeiro.

Simulando situações de violência à criança, o programa expôs a omissão da mãe, Monique, e a violência do padrasto, Jairinho. Além da troca de mensagens entre Monique e a babá de Henry, vídeos antigos mostraram lesões supostamente causadas pelo padrasto, em episódios anteriores à tragédia.

Com o processo ainda em curso, a Justiça do Rio censurou o episódio, preocupada com a exibição em canal aberto e a reação do júri popular. Entretanto, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou a medida e o “Linha Direta” exibiu a reconstituição daquela noite. Ainda enfatizou a luta do pai do menino, responsável pela aprovação da Lei Henry Borel, que tornou o homicídio de menores de 14 anos um crime hediondo.

 

O 2° disco de estúdio da artista constrói um novo repertório com sonoridade tipicamente brasileira, refletindo sua busca por religiosidade, amores e raízes ancestrais
por
Romulo Silva Santana
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17/05/2023 - 12h

"Maré de Cheiro" o segundo disco de estúdio da carioca Amanda Magalhães, conta com 8 faixas e foi lançado na última quarta (10), nas plataformas digitais. O disco transborda as expectativas criadas pelos visuais de divulgação. É escrito e produzido por Amanda e o engenheiro de som Tuto Ferraz. Conta com colaborações de Vico, Assucena, Lurdez da Luz, As Filhas de Baracho e da Banda Black Rio, fundada pelo avô da artista. O projeto é lançado com o selo "Boia Fria Produções" e conta com apoio da 5ª edição do programa de fomento à música do município de São Paulo.

Amanda representando Oxum
Amanda representando Oxum, deusa das águas. Imagem: Renato Stockler/Livia Mariah/Lydio Alexander. Reprodução Instagram

Amanda, 31 anos, ganhou destaque como atriz na série "3%", produção brasileira da Netflix. Formada pela Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (EAD-USP), começou sua carreira musical em 2018 com o single “Fazer Valer” com Rincon Sapiência e mais tarde em 2020, lançou “Fragma” seu primeiro disco autoral.

O projeto “Brasil em Brasa” do qual a gravação faz parte, foi contemplado pela 5ª edição do programa de fomento à música do município de São Paulo. Esse programa fomenta a criação de obras musicais, que serão apresentadas em centros culturais, por essa razão, a musicista fez apresentações gratuitas na Casa de Cultura do Campo Limpo e no Teatro Sérgio Cardoso.

Imagem: Renato Stockler/Livia Mariah/LydioAlexander - Reprodução Instagram
Amanda deitada na praia com um varal de roupas ao fundo. Imagem: Renato Stockler/Livia Mariah/Lydio Alexander. Reprodução Instagram

 

Composto por 8 faixas, o álbum é construído por uma produção intimista, com a proposta de apresentar o amadurecimento musical da artista. A gravação busca referências brasileiras de norte a sul, mescladas por elementos de música eletrônica. O repertório tropical tem instrumentação potente e vocais bem trabalhados, cheios de camadas e texturas, descrito por Amanda como "minha mais doce pira de verão" em publicação no seu Instagram.   

A faixa “Doce Encanto”, na qual Amanda evoca afetividade, amor e a guia Oxum, rainha das águas doces, inicia o álbum. O lead-single é a faixa principal do projeto e já conta com videoclipe.

Amanda  constrói um repertório novo, que fala sobre amor, ancestralidade e religiosidade de forma expressiva, bem construída e fiel a seus próprios sentimentos. A versatilidade encontrada nas canções é surpreendente, a diversidade identitária é construída faixa a faixa, como em “Queria te Ter”, onde os vocais da artista são mais inerentes, ou em “Com Ela Eu Vou”, colaboração com a Banda Black Rio, que encerra o disco em alto-astral.  


 

 

Mesmo depois de muitas décadas, o machismo continua presente em todos os âmbitos da vida humana
por
Bruna Galati e Letícia Galatro
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22/06/2021 - 12h

Por Bruna Galati e Letícia Galatro

A sociedade brasileira foi criada sob um viés machista, que acredita na superioridade masculina. Um dos primeiros traços da desigualdade aparece na educação, quando apenas na reforma educacional pombalina (1759) ocorreu a primeira tentativa de introduzir o ensino para as mulheres. Devido a esse tipo de pensamento preconceituoso, pessoas do gênero feminino vêm sofrendo há décadas.

 

As discriminações ocorrem de diversas formas, desde serem rebaixadas e diminuídas para servir e depender dos homens até serem agredidas fisicamente e virarem vítimas de feminicídio. O machismo enraizado se estende a todas as áreas da vida. Seja nas relações interpessoais, no acesso aos direitos fundamentais dos cidadãos ou nas ofertas de cultura e trabalho. 

 

Durante muitos anos a figura feminina foi proibida de trabalhar e estudar, sendo responsável pelo cuidado da casa e criação dos filhos. Embora a Lei de 15 de outubro de 1827, conhecida como Lei Geral, tratou de diversos assuntos, como a remuneração dos mestres, o currículo mínimo, a admissão de professores e as escolas para meninas. No entanto, as mulheres seguiram sendo discriminadas. Nem todas matérias eram ensinadas para elas, sobretudo as consideradas mais racionais, como geometria, e no lugar deveriam aprender as "artes do lar". 

 

Apenas durante a Primeira Guerra Mundial, por necessidade, as mulheres entraram no mercado de trabalho para exercerem o cargo de enfermeiras. O pós conflito, obrigou muitas delas a buscarem um emprego formal, como condutoras de bondes, garçonetes em cafés, funcionários de correio, etc, já que quem sustentava a casa havia morrido em combate. As condições de tratamento nesses ambientes eram péssimas e mesmo trabalhando muito, os salários eram escassos. Até hoje, em pleno 2021, mulheres ainda encontram dificuldades para alcançar posições de destaque e ganhos mensais iguais aos homens. 

 

Por mais que muitos avanços venham ocorrendo, algumas profissões como a de policial, ainda reforçam ações retrógradas. Patrícia Sales conta que quando entrou na polícia a 26 anos atrás, mulheres ficavam restritas às áreas administrativas. Isso só mudou em 1999. Mesmo assim, algumas situações machistas continuam acontecendo. 

 

https://soundcloud.com/leticia-galatro/rua-da-patria-2

 

Pior do que a falta de conhecimento, é ser tratada como idiota e se sentir impotente. Situação que Morgana Weber, estudante e profissional da área de TI, vivenciou diversas vezes no ambiente de trabalho.  Ela escolheu trocar de roupa para não ser assediada, sem contestar que isso não tinha a ver com o que usava. Weber se sentiu frustrada quando seu chefe desenhou caminhões para explicar que a função deles era levar objetos de um lugar para o outro, sendo que ela havia perguntado algo sobre softwares.

 

https://soundcloud.com/leticia-galatro/whatsapp-audio-2021-04-22-at-150423-1

 

A falta de imposição de Weber pode ter acontecido por diversos motivos, mas o que ocorre com muitas mulheres é que elas não acreditam na força das suas vozes. Existem mulheres que tiveram oportunidade de crescer profissionalmente, mas a dificuldade de se expressar, de usar uma voz fraca e soar insegura na hora de resolver questões, foram grandes desafios em suas trajetórias. 

 

Um dos maiores ataques a voz da mulher aconteceu no nascimento da Inglaterra moderna, onde o termo "gossip", atualmente traduzido como "fofocar", que antes indicava amizade entre as mulheres, virou o posto e resultou na destruição da sociabilidade feminina.

 

No século XVI, a posição social das mulheres começou a se deteriorar e veio no lugar a guerra contra mulheres, especialmente das classes baixas, que costumavam ser acusadas de bruxaria e agressões contra esposas tidas como "rabugentas" e dominadoras. Nesse mesmo período, o significado bom de "gossip" começou a mudar, cada vez mais designando a mulher envolvida em conversas fúteis. 

 

Na Idade Média tardia, uma esposa ainda poderia confrontar seu marido, mas no fim do século XVI, ela poderia ser punida por apenas levantar a voz ou fazer críticas em relação a ele. A punição era usar a rédea ou freios das rabugentas, uma engenhosa sádica de metal e couro que rasgaria a língua da mulher se ela tentasse falar. 

 

Tratava-se de uma estrutura de ferro que circulava a cabeça, um bridão (utilizado em cavalos) de cinco centímetros de comprimento e dois centímetros e meio de largura projetado para dentro da boca e voltado para baixo sobre a língua, sendo impossível de falar. Muitas vezes, o instrumento era chamado de "gossip bridle", mostrando a mudança no sentido da palavra.

 

Esse foi apenas um exemplo resumido de alguns acontecimentos que impediam a mulher de ter sua própria voz, suas amizades e não depender de ninguém. É claro que nos dias atuais, a "gossip bridle" foi aposentada, mas as formas psicológicas de calar as mulheres ainda existem. 

 

Se a mulher cresce em uma família que a trata como um ser frágil, que precisa ser superprotegido do mundo perigoso, ela terá uma voz infantilizada ou existem criações que não reconhecem a liderança feminina e a mulher é adjetivada durante a vida como teimosa, briguenta, bocuda, mandona, etc, neste caso a voz perde sua potência e brilho. 

 

O Instituto Converse citou um exemplo desse acontecimento, uma mulher, com 38 anos, chegou com queixas de que seus funcionários não aceitaram suas ordens. Ela ocupava a chefia de um departamento na secretaria e a sua voz era "presa na garganta", quase sem projeção no ambiente. Ela não permitia a sua imposição, mesmo com a sua formação acadêmica, sendo a melhor entre todos os funcionários, o que por si só já facilitava uma postura de se impor. A pesquisa mostrou que no seu histórico familiar havia uma figura de um pai autoritário que não deixava as meninas da casa falarem. Através de exercícios vocais, em pouco tempo a insegurança foi colocada de lado e ela perdeu o medo de se posicionar com uma voz firme, argumentar suas necessidades, desejos, ideias e paixões.  

 

Trabalhando a autoconfiança, as mulheres conseguem se posicionar na sua vida profissional e é claro pessoal, mas o que acontece quando dentro do mercado de trabalho existe uma desigualdade de oportunidades e reconhecimento constante? Exercendo a mesma função de um homem, a mulher ainda ganha cerca de 70% do salário do homem. 

 

 

Infelizmente, cenários como esse no qual a profissão é predominada pela presença masculina e os tratamentos são feitos de formas diferenciadas são mais comuns do que deveriam. Um exemplo claro disso é o ramo da aviação civil. Segundo dados da Anac, dos mais de 70 mil profissionais de aviação com licenças ativas em 2018, contando comissários, pilotos e mecânicos, apenas 13% eram mulheres. Ao analisar apenas as mulheres presentes no setor de manutenção, o número cai para 3%.

 

Gregory Fabbri, piloto formado em 2020, conta que essa diferença discrepante pode ser notada desde a faculdade, onde a sala era majoritariamente formada por homens, assim como o grupo de docentes. O ambiente intimidador era reforçado por comentários machistas, que os próprios professores encaravam como piadas. 

https://soundcloud.com/leticia-galatro/gregory-reportagem

Nessa mesma área, podemos analisar o machismo por um outro lado. Iara Calegari, comissária a mais de 10 anos, conta que a sua profissão ainda é vista como o lugar ideal apenas para mulheres, que são maioria no setor. Essa ideia parte do pressuposto de que a figura feminina é a que deve servir e cuidar. Tal cargo surgiu da enfermagem, uma vez que devido a falta de tecnologia, os aviões vibravam muito e causavam náuseas nos passageiros. Porém, além de cuidar daqueles que estivessem passando mal, as profissionais ainda tinham e seguem tendo que se preocupar com os padrões estéticos impostos por cada companhia aérea. 

https://soundcloud.com/leticia-galatro/audio-iara

A verdade é que mesmo com as evoluções promissoras das últimas décadas, mulheres continuam sendo discriminadas das mais diversas formas em todos os espaços. Isso acontece porque como as sociedades vêm sendo criadas sob um viés machista a milênios, alguns pensamentos e ações estão tão naturalizados e enraizados na educação que fica difícil perceber a problemática em volta da questão.

Uma solução prática para resolver a começar a resolver o problema e alcançar a equidade é dar oportunidades para as mulheres alcançarem espaços de poder, seja em cargos públicos, nos mais diversos trabalhos ou sendo uma voz ativa de grande relevância para seu meio. Essas instituições são um reflexo da organização social na qual se encontram inseridas, mas ao contrário também é verdadeiro. É possível que com essas ações mais pontuais e efetivas alcancem e alterem toda a filosofia de vida de uma sociedade. 

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