A ascensão das plataformas digitais como palco central da nova política e o desafio da polarização
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
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27/11/2025 - 12h

 

A imagem conceitual representa a polarização política. FONTE: Shutterstock / Imagem Conceitual

O cenário político contemporâneo foi drasticamente redefinido pela ascensão das redes sociais. O que antes era um mero canal de comunicação secundário transformou-se no principal palco de debate, engajamento e, por vezes, de acirrada polarização. Líderes e figuras públicas, de todas as ideologias, utilizam plataformas como X (antigo Twitter), Instagram, Facebook e TikTok não apenas para disseminar informações, mas para construir narrativas, interagir diretamente com eleitores e moldar a opinião pública.

A Onipresença Digital: Vantagens e Riscos

A presença massiva de políticos nas redes oferece uma série de vantagens:

  • Acesso Direto: Permite uma comunicação sem intermediários com o eleitorado, humanizando a figura pública e criando um senso de proximidade.

  • Mobilização: Ferramenta poderosa para organizar movimentos, manifestações e campanhas de forma rápida e eficiente.

  • Quebra de Monopólio: Diminui a dependência da mídia tradicional, permitindo que políticos e partidos estabeleçam suas próprias agendas.

No entanto, essa "democratização" da comunicação não está isenta de riscos e desafios:

  • Polarização e Bolhas: Os algoritmos das redes tendem a criar "bolhas" de informação, reforçando crenças existentes e expondo os usuários a conteúdo que confirma seus vieses, o que contribui para a polarização.

  • Desinformação (Fake News): A velocidade de propagação e a falta de filtros rigorosos tornam as redes um terreno fértil para a disseminação de notícias falsas, boatos e manipulação de informações, com sérias consequências para o debate público e a democracia.

  • Discurso de Ódio: A anonimidade e a falta de moderação eficaz em algumas plataformas facilitam a proliferação de discursos de ódio, ataques pessoais e campanhas difamatórias.

Foto de uma tela de celular com vários ícones de redes sociais misturados. Fonte: Depositphotos / Mídia Social e Política

Estratégias Digitais em Constante Evolução

A "nova política" é inerentemente digital. Políticos e suas equipes investem pesadamente em estratégias de marketing digital, análise de dados e criação de conteúdo. O uso de memes, vídeos curtos e transmissões ao vivo (lives) são táticas comuns para viralizar mensagens e engajar diferentes faixas etárias.

Observa-se também a profissionalização das equipes digitais, com especialistas em análise de sentimentos, SEO (Search Engine Optimization) e gestão de crises online. A capacidade de responder rapidamente a eventos e narrativas em tempo real tornou-se um diferencial competitivo crucial.

O Futuro da Política e das Redes

O fenômeno dos políticos nas redes sociais é irreversível. O desafio para as democracias é encontrar mecanismos para regular e fiscalizar o ambiente digital sem cercear a liberdade de expressão, garantindo que as plataformas sirvam como ferramentas de fortalecimento do debate público e não de sua deterioração. A busca por um equilíbrio entre a liberdade, a responsabilidade e a moderação de conteúdo continuará a ser um dos temas centrais dos próximos anos, moldando não apenas a política, mas a própria sociedade.

 

Unanimidade da 1ª Turma confirma preventiva e abre caminho para execução imediata da pena de 27 anos
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
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26/11/2025 - 12h

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, manter a prisão preventiva do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro. A decisão, referendada na segunda-feira (24), confirmou o decreto do ministro Alexandre de Moraes que converteu a prisão domiciliar do ex-presidente em preventiva no último sábado (22).

A manutenção da prisão ocorre no momento em que o processo final de condenação do ex-presidente na Ação Penal (AP) 2668 se aproxima do trânsito em julgado, permitindo que o ministro relator determine o início imediato do cumprimento da pena. Bolsonaro está detido na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília.

 

Ministro Alexandre de Moraes discursando na bancada. Fonte: STF (Supremo Tribunal Federal)

 

Argumentos da Corte e Motivação da Prisão Preventiva

A decisão unânime dos ministros da 1ª Turma (Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin) considerou que a prisão preventiva é imprescindível para garantir a ordem pública, assegurar a aplicação da lei penal e coibir o reiterado desrespeito às medidas cautelares impostas.

Os fatores centrais que motivaram a conversão da prisão domiciliar para preventiva são:

  1. Violação da Tornozeleira Eletrônica: A Polícia Federal apontou que o equipamento de monitoramento eletrônico foi violado intencionalmente pelo ex-presidente. Moraes classificou o ato como uma violação "dolosa e consciente", após o próprio Bolsonaro admitir ter usado um ferro de solda na tornozeleira, alegando ter agido sob "surto" e efeito de medicamentos.

  2. Risco de Fuga e Obstrução: O ministro relator citou o risco concreto de fuga, intensificado pela violação do equipamento e pela convocação pública para uma "vigília" em frente à residência de Bolsonaro, feita por um familiar. A Corte avaliou que essa mobilização poderia criar tumulto e facilitar uma eventual evasão.

 

Os Argumentos da Defesa

A defesa do ex-presidente apresentou recursos e pedidos que foram, em grande parte, rejeitados ou considerados prejudicados pela decretação da prisão preventiva.

  • Prisão Domiciliar Humanitária: O principal pleito da defesa foi a prisão domiciliar humanitária, citando o quadro de saúde frágil de Bolsonaro, que inclui gastrite, esofagite e crises de soluços. No entanto, o ministro Moraes considerou este pedido prejudicado com a prisão preventiva, embora tenha determinado o atendimento médico em regime de plantão na PF.

  • Contradições na Condenação: Nos recursos apresentados contra a condenação na AP 2668, a defesa alegou que a decisão foi baseada em provas frágeis e contradições no acórdão, e que o ex-presidente não teve participação direta nos atos que levaram à denúncia.

  • Inexistência de Risco: Advogados argumentaram que a prisão preventiva não se justificava, pois a situação já estava controlada pela prisão domiciliar, e Bolsonaro não representaria um risco iminente à sociedade.

Ex-presidente Jair Bolsonaro em evento público (imagem de arquivo). Fonte: Agência Brasil / EBC

 

A Condenação na Ação Penal 2668 e Execução da Pena

Jair Bolsonaro foi condenado pelo STF a 27 anos e 3 meses de prisão em regime inicial fechado, além de multa (124 dias-multa no valor de dois salários mínimos à época dos fatos), na Ação Penal (AP) 2668.

  • Crimes: O ex-presidente foi condenado, majoritariamente, por ser o líder da organização criminosa que articulou planos para impedir a posse do governo eleito em 2022, sendo réu pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

  • Trânsito em Julgado: O prazo para a defesa apresentar o último recurso contra a condenação encerrou-se nessa segunda-feira (24). Com isso, a Corte confirmou o trânsito em julgado para Bolsonaro.

  • Próximo Passo: O ministro Alexandre de Moraes está liberado para, a qualquer momento, determinar a expedição da guia de execução penal, documento que formaliza o início do cumprimento da pena em regime fechado. A sede da PF é apenas o local inicial da custódia, sendo o Complexo Penitenciário da Papuda, ou outra unidade compatível com sua condição de ex-presidente, o destino mais provável para o cumprimento da sentença.

Nova ferramenta deve integrar informações socioeconômicas relacionadas ao gênero
por
Marcela Rocha
Jalile Elias
Isabelle Maieru
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25/11/2025 - 12h
Foto: José Cruz/Agência Brasil
Ativistas participam da 5ª edição da CNPM. Foto: José Cruz/Agência Brasil

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A 5ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres (CNPM), ocorreu em Brasília entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro. Durante o evento foi anunciada a plataforma DataMulheres, criada pelo governo federal através do Ministério das Mulheres.

Desenvolvida entre uma parceria do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero e a Dataprev (empresa vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos), a tecnologia deve integrar informações de gênero e auxiliar procedimentos de pesquisas, observatórios, projetos e demais iniciativas de gestores públicos e instituições nacionais.

O encontro contou com a presença de 4 mil participantes de coletivos, movimentos sociais, deputadas, ministras e outras autoridades, além do oferecimento de palestras, redes de diálogo e stands para a exposição de livros e artesanatos produzidos por mulheres de todo o Brasil.

Na plenária final do evento foram aprovados o relatório de propostas para o novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e 33 moções, com 98% dos votos favoráveis. O resultado quase unânime reflete a assertividade de diálogos previamente realizados nas instâncias municipais e estaduais.

Com o intuito de reconhecer a pluralidade das 100 milhões de mulheres que vivem no Brasil, o texto do relatório foi dividido em 15 temas, entre eles a questão do fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho, igualdade salarial, desigualdades econômicas e raciais, fortalecimento da participação política de mulheres, autonomia econômica e o enfrentamento à violência de gênero.

Durante o evento, a Ministra das Mulheres, Márcia Lopes, afirmou que “a luta não acaba nunca”, sendo necessário construir “não somente o Brasil, mas a América Latina, o Caribe, um mundo de paz”, para que as mulheres sejam livres e em que não haja nenhum tipo de violência contra elas.

Mudanças incluem teto para operadoras, repasse mais rápido e interoperabilidade
por
Antônio Bandeira e Fábio Pinheiro
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24/11/2025 - 12h

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou no dia 11 de novembro o decreto que moderniza as regras do vale-refeição e vale-alimentação dentro do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). As mudanças criam um teto para as taxas cobradas pelos operadores, reduzem prazos de repasse aos estabelecimentos e definem novas obrigações para empresas e bandeiras do setor.

Entenda as mudanças mais importantes:

Redução de taxa: O texto fixa limite de 3,6% para a taxa cobrada dos restaurantes e outros estabelecimentos. Atualmente, segundo o governo, esse percentual chega a 15% em alguns casos. As empresas terão 90 dias para se adequar à nova regra. O decreto também estabelece teto de 2% para a tarifa de intercâmbio e proíbe cobranças adicionais.

Interoperabilidade: Em até 360 dias, qualquer maquininha deverá aceitar cartões de todas as bandeiras. A medida, conforme o Ministério do Trabalho, amplia a concorrência e facilita o uso do benefício pelos trabalhadores e pelos estabelecimentos.

Prazo de repasse aos comerciantes: Os restaurantes e supermercados passarão a receber em até 15 dias após a transação. Antes das novas regras, o pagamento ocorria em cerca de 30 dias, podendo chegar a 60.

Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert
Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert

As regras incluem ainda a abertura dos chamados “arranjos fechados”. Empresas que atendem mais de 500 mil trabalhadores terão 180 dias para migrar para sistemas abertos. A mudança deve reduzir a concentração de mercado e permitir que mais credenciadoras participem do sistema.

Além disso, o decreto proíbe práticas consideradas abusivas, como deságios, descontos indiretos, bonificações e vantagens financeiras não relacionadas à alimentação.

De acordo com o governo, mais de 22 milhões de trabalhadores e cerca de 330 mil empresas cadastradas no PAT serão afetados. O valor do benefício não muda e segue exclusivo para compra de alimentos.

Para o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, o decreto corrige distorções que vinham sendo cobradas por restaurantes, mercados e padarias. Ele afirmou que o governo discutiu o tema por dois anos com empresas e representantes do setor, mas não houve consenso para um acordo.

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados, João Galassi, disse que a medida aumenta a concorrência e deve melhorar o valor final disponível para o trabalhador. Segundo Galassi, a redução da intermediação permitirá que mais pequenos estabelecimentos aceitem os vales.

O decreto cria ainda um comitê gestor para acompanhar a implementação das novas regras, fiscalizar práticas abusivas e definir parâmetros técnicos para o funcionamento do sistema.

Congresso irá analisar nesta quinta-feira (27), os 63 vetos feitos pelo presidente Lula
por
CRISTIAN FRANCISCO BUONO COSTA
Antônio Bandeira de Melo Carvalho Valle
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24/11/2025 - 12h

A votação dos vetos ao novo marco do licenciamento ambiental virou um dos temas centrais da agenda do Congresso para novembro. Deputados e senadores se reúnem no dia 27 para decidir se mantêm ou derrubam os 63 trechos barrados pelo presidente Lula na lei sancionada em agosto. O resultado importa porque define até onde o país flexibiliza ou reforça o controle sobre atividades que causam impacto ambiental.

O licenciamento sempre foi o principal instrumento de fiscalização ambiental no Brasil. Ele estabelece quais estudos cada empreendimento precisa apresentar; quais riscos devem ser controlados e quais condicionantes precisam ser cumpridas. O processo costuma ser longo e heterogêneo entre estados, e por isso o Congresso discute há anos uma lei geral que dê mais previsibilidade.

A proposta aprovada em maio deste ano avançou justamente nessa direção: criou regras nacionais, previu modalidades mais simples — como a licença única (LAU) e a licença por adesão e compromisso (LAC) — e dispensou determinadas atividades do processo formal de licenciamento.

Os vetos do governo miraram pontos considerados sensíveis. O Planalto argumenta que alguns trechos ampliavam exageradamente as dispensas, reduziam a fiscalização e fragilizavam compromissos ambientais assumidos pelo país. A justificativa foi a mesma em outras áreas: garantir proteção ambiental sem abandonar a segurança jurídica para o setor produtivo. Entre os vetos estão dispositivos que tratavam da dispensa de licenciamento para obras de manutenção em estradas, linhas de transmissão e linhas férreas, e regras mais amplas para empreendimentos agropecuários.

Parlamentares contrários aos vetos dizem que as restrições prejudicam obras estruturantes e atrasam investimentos. Para eles, trechos barrados pelo Executivo traziam justamente o alívio burocrático que falta para modernizar o setor. O debate ganhou ainda mais força porque a lei entra em vigor em fevereiro de 2026 e o Congresso quer definir o texto final antes disso. Também pesa o cenário político: o tema aparece na agenda de eventos internacionais de clima, e o governo tenta apresentar avanços em governança ambiental.

A votação deve mostrar qual será o equilíbrio escolhido pelo Legislativo para os próximos anos. Manter os vetos significa reforçar o papel fiscalizador do licenciamento, enquanto derrubá-los abre espaço para uma lei mais permissiva, com processos mais rápidos e menos pontos de controle. Para estados, municípios, empreendedores e órgãos ambientais, o resultado define como novos projetos, como o de hidrelétricas, estradas, etc, serão avaliados a partir de 2026.

Após rumores de cancelamento, o presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) acatou ao pedido aceito no dia 26 de abril
por
Giuliana Barrios Zanin
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23/05/2023 - 12h

Pelos próximos seis meses, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito irá apurar fatos e suspeitos envolvidos na invasão à Sede dos Três Poderes em Brasília no começo deste ano. A solicitação foi realizada pelo deputado André Fernandes (PL-CE) e será composta por 32 titulares, divididos igualmente entre membros da Câmara e do Senado.

A maioria dos partidos já confirmou presença. Entre os blocos parlamentares, comparecerão: Resistência Democrática (PSB, PT, PSD e Rede); União, PP, Federação PSDB Cidadania, PDT, PSB, Avante, Solidariedade e Patriota; MDB, PSD, Republicanos, Podemos e PSC. 

Até agora, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou 795 réus e outros 1.045 estão com o caso em aberto. Outras 220 pessoas foram acusadas de incitarem falas golpistas, tanto nos QGs em frente ao Exército, quanto em redes sociais (dados da Agência Brasil). 

Após dois dias da vitória de Lula, atos contra o resultado das eleições cresceram em 14 capitais brasileiras. Vestidos com a camiseta do Brasil e levantando bandeiras escritas “Intervenção Militar”, opositores do atual presidente, inconformados  pela derrota de Jair Bolsonaro (PL), por meio de grupos do Whatsapp, arquitetaram um plano de invasão à estrutura da política nacional.

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Os estragos feitos pelos golpistas estão sendo reconstruídos mesmo depois de 4meses. Foto:Gabriela Biló.

De acordo com uma pesquisa realizada pelo Estadão, apenas 21% dos que responderam compactuam com essa ideologia. E o resto? Qual o problema?

No mês passado, após a divulgação de imagens do atual ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)  do Governo Lula, general Gonçalves Dias, dentro do Palácio do Planalto durante os ataques de 8 de janeiro. Desde então, a busca por novos nomes infiltrados cresceu. O autor da criação da CPMI, André Fernandes (PL), também esteve entre os participantes da violação à Praça dos Três Poderes. 

De acordo com o Art. 359-M da Constituição,  “Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído” é considerado crime contra as instituições democráticas e pode levar de 4 a 12 anos de prisão.

Entre contradições, a importância do início à discussão das práticas que levaram à uma manifestação criminosa em Brasília não é construída apenas para o julgamento dos atos. É, também, o esclarecimento à população que viveu com medo a tentativa de descredibilização democrática nos primeiros dias de janeiro. 

Entenda a história do PCC e como a polícia militar executou centenas de civis inocentes durante conflito com a facção criminosa
por
Laura Teixeira
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17/05/2023 - 12h

O dia 15 de Maio de 2006 ficou marcado por um cenário de terror. As ruas da cidade de São Paulo pareciam fantasmas depois de um toque de recolher divulgado pelo PCC. Os dados oficiais mostraram que após vários embates entre a PM e a facção, mais de 500 pessoas foram mortas e apenas 30 processos seguiram no ministério público.

No mesmo mês, mais de 700 presos foram transferidos de cadeia, incluindo Marcos Willians (popularmente chamado de Marcola e líder que revolucionou o PCC) com foco em dissipar parceiros da facção e evitar uma possível rebelião que a secretaria do estado de São Paulo já estava ciente. Entretanto, essa movimentação não deixou que o PCC desse início a uma série de atos violentos contra agentes e espaços publicos e que rebeliões em presídios de fato acontecessem.

A partir dos primeiros homicídios de policiais militares o Estado reagiu com ainda mais força. Em entrevista para a Folha de São Paulo, um dos policiais vítima dos ataques da facção afirmou que “ [as mortes] foram uma defesa dos policiais, se agente ficasse esperando, iríamos só receber” entendendo que a forma de preservar a vida deles era responder com ainda mais violência. O ouvidor da polícia do Estado de São Paulo, Julio Cesar Neves, afirmou que essa reação vinda dos PMs era baseada em um sentimento de vingança, assassinando centenas de pessoas inocentes.

Um toque de recolher foi imposto em São Paulo que ficou parecendo mais uma cidade fantasma. Débora Maria da Silva, criadora do movimento “mães de maio”, afirmou que recebeu ligações de policiais alertando que quem estivesse na rua seria considerado bandido e, consequentemente, morto. Ao todo 556 pessoas foram executadas - a maioria da periferia -  com apenas 30 denúncias feitas pelo ministério público. O restante dos casos foi arquivado. 

Ato em SP reivindica justiça e memória pelos crimes de maio de 2006 / Acervo Movimento Independente Mães de Maio

No documentário “As feridas de Maio” gravado pela Folha de São Paulo, diversas mães relatam como seus filhos foram executados nesse conflito entre o PCC e a PM. Uma delas foi a Vera Gonzaga, mãe de Ana Paula que estava grávida quando foi abordada pela polícia militar  indo comprar vitamina junto ao seu namorado Eddie Joey. Segundo Vera, o policial ao abordar sua filha foi informado pelo Joey que ela estava grávida. Mesmo assim o disparo foi feito e ao chorar pela morte de sua namorada gestante, Joey foi baleado nas costas. 

Em entrevista a Agemt, José Arbex Jr, jornalista formado pela USP, entende que a mídia teve um papel importante para o pânico mantido na cidade, principalmente para aumentar o medo de jovens periféricos como maneira amenizar os atos cometidos pelos PMs. Ao ser perguntado sobre os assassinatos, o jornalista afirmou que “ foi criado um pânico, na minha opnião, proposital  pela mídia pra criar essa sensação de que os pobres negros da periferia são uma ameaça para nós, classe média branca“, corroborando para o argumento de que as mortes fizeram parte do extermínio da periferia por parte da polícia militar.

Cláudio Lembo, governador do Estado de São Paulo durante o conflito, entende que os homicídios  foram genuínos. “Não acredito [que tenha ocorrido muitas mortes]. Foi tudo legítima defesa” afirma. Além disso, ele entende que o governo fez o que podia para entender a causa das mortes de inocentes e que os 526 casos arquivados não foram bem explicados pelo Ministério Público.

O massacre do carandiru

"Você não sabe como é caminhar com a cabeça na mira de / Uma HK/ Metralhadora alemã ou de Israel / Estraçalha ladrão que nem papel”. Para entender maio de 2006, é preciso relembrar outubro de 1992. Os versos da música “Diário de um Detento”, dos Racionais, explicam de maneira clara a política de violência que era imposta na Casa de Detenção de São Paulo (chamada de Carandiru). 

Com 7257 presos e 7 pavilhões, os policiais utilizam armamentos pesados. O clima era de guerra. No dia 02 de Outubro de 1992, uma rebelião começou e o Estado respondeu com um banho de sangue. Esse episódio marcou a sociedade brasileira e, segundo especialistas, deu início a um crescimento das facções criminosas dentro das cadeias.

(Nenhum policial foi ferido durante o massacre do Carandiru/ reprodução)

O pavilhão 9 era destinado a presos de primeira viagem ou que estavam aguardando julgamento. Após uma briga entre os detentos em um campeonato de futebol, uma rebelião começou já deixando alguns mortos. A PM (polícia militar) foi chamada para acalmar o caos. 

O Dr.Drauzio Varella, autor do livro “ Carandiru” fala que a situação poderia ter sido acalmada pela própria administração da cadeia, não era necessário que a PM invadisse  com metralhadoras, os presos não possuíam arma de fogo e ninguém tinha sido feito refém. O médico trabalhava na penitenciária desde 1989 e conhecia não só os encarcerados, mas também a equipe que cuidava deles como o próprio diretor. 

O livro relata que em situações como aquela a medida a ser tomada deveria ser cortar a luz e água dos presos e então realizar uma negociação. Entretanto, os militares receberam ordem da secretaria de segurança para invadirem o pavilhão nove. Acredita-se que por ser ano de eleição, foram tomadas as decisões que resultaram no massacre e na morte de 111 presos - a autópsia revelou que 70% deles atingidos por bala na cabeça ou tórax. Nenhum  policial foi morto. 

O Primeiro Comando da Capital

Depois do massacre alguns encarcerados foram realocados para casa de Custódia de Taubaté, popularmente chamado de “Piranhão”. A transferência foi uma forma de castigo àqueles que se rebelaram no dia 8 de outubro de 1992, já que o local era extremamente hostil. Uma das pessoas transferidas foi o José Márcio Felício, apelidado de Geleião, o primeiro líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), 

Um campeonato de futebol foi organizado no Piranhão, lá havia uma rivalidade entre os presos vindo da capital e do interior. O time de São Paulo foi chamado de PCC, liderado por Geleião, que utilizou o torneio para se vingar do outro time, matando e esfaqueando todos os rivais. No dia 31 de Agosto de 1993 o PCC nasceu com 6 membros, seu foco era vingar o massacre do Carandiru e culpar o Estado pela corrupção que ocorria no sistema carcerário.

Depois de conflitos internos, a liderança da facção mudou, o novo comandante era Marcola. Foi ele quem mudou o direcionamento do PCC, a  organização se estabeleceu como principal organização criminosa no país, com foco na venda de cocaína plantada na Bolívia e enviada para Europa e Ásia, além de controlar o tráfico de drogas em São Paulo. 

Arbex entende que a dinâmica implementada dentro das cadeias pela facção auxilia na organização dos detentos dentro das penitenciárias: "O PCC conseguiu criar uma norma de conduta dentro das cadeias que deu a possibilidade da estrutura presidiária se manter”. Segundo Arbex, esse domínio se expande para além das casas de detenção, indo para as ruas. Ao ser perguntado sobre como essa organização se mantém, o jornalista afirma: “ [O PCC] vai fazendo acordos com o governo do estado, claro que extraoficiais, e eles são visíveis pelo efeito que têm, evitando que um grau de desordem retorne”.

Por unanimidade, o deputado federal e ex-procurador da Lava Jato perde seu mandato.
por
Maria Fernanda Müller
Artur Maciel
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17/05/2023 - 12h

Nesta terça-feira (16), o Tribunal Superior Eleitoral cassou o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR). Ele que foi anteriormente o procurador encarregado de organizar a força-tarefa da Operação Lava Jato no Ministério Público paranaense. 

A cassação é baseada na Lei de Ficha Limpa, que por sua vez impede políticos condenados por algum crime ocuparem cargos públicos. Segundo o relator do caso, o ministro Benedito Gonçalves, Dallagnol se absteve de eventuais punições, passíveis de demissão, ao sair do Ministério Público Federal (MPF). Isto quer dizer que o deputado teria fraudado a Lei de Ficha Limpa. A pela cassação foi foi unânime.

Tribunal Supremo Eleitoral (TSE)

Enquanto ainda respondia por processos internos, Dallagnol pediu exoneração do cargo de procurador da República. A irregularidade cometida pelo deputado foi reconhecida pelos ministros do TSE. 

O ex-procurador ainda pode recorrer da decisão ao Supremo Tribunal Federal (STF). A ação do TSE não tornou Dallagnol inelegível, mas a perda do mandato teve efeito imediato. 

Benedito Gonçalves, junto aos ministros do TSE julgaram que Deltan Dallagnol deixou a carreira "com o propósito de frustrar a incidência da inelegibilidade". O agora ex-deputado estava passando por 15 procedimentos administrativos do Conselho do MPF. Isso poderia render um processo administrativo disciplinar (PAD), o tornando inelegível. 

A defesa de Dallagnol afirmou que o ex-procurador já havia respondido por "Dois PADs processados, julgados e ainda pendente de decisão definitiva, mas perante o STF". Além disso, a defesa também argumenta que o pedido veio sem nenhuma base. 

O caso repercutiu bastante nas redes, o senador federal Sérgio Moro postou no Twitter: “Estou estarrecido por ver fora do Parlamento uma voz honesta na política”. A presidente do PT Gleisi Hoffmann diz que a “Agora Deltan Dallagnol tem um powerpoint para chamar de seu! Cassado!", fazendo referência a apresentação que o deputado apresentou contra o ,na época, ex-presidente Lula. "Eita que dia hein?!" Finalizou Hoffman.

 

Deltan Dallagnol apresentando o “powerpoint” como recurso de acusação contra Lula.

O Deputado disse pelo Twitter :"Meu sentimento é de indignação com a Vingança sem precedentes em curso no Brasil [...] nenhum obstáculo vai me impedir de continuar a lutar pelo meu propósito de vida de servir a Deus e ao povo brasileiro"

Quem mandou matar Marielle? Ailton Barros, ex-major do Exército, afirma saber
por
Giovanna Takamatsu
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12/05/2023 - 12h

Durante a Operação Venire, investigação da Polícia Federal (PF) sobre suposta falsificação do cartão de vacina de Jair Bolsonaro, familiares e assessores, informações relevantes para o caso Marielle Franco foram reveladas. Nas mensagens apreendidas pela PF, Ailton Barros, um dos seis presos na operação, diz saber quem é o mandante da morte da vereadora. “Eu sei dessa história da Marielle, toda irmão, sei quem mandou” escreveu para Mauro Cid, outro alvo pela PF, na mesma operação.

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Mensagens de Ailton Barros divulgada pela PF. Imagem: Reprodução.

Operação Venir

A investigação, nomeada a partir da frase “Venire contra factum proprium” (vir contra seus próprios atos, vedando ações contraditórias) do Direito Civil, é referente à inserção de dados falsos em relação à vacina da Covid-19, no sistema do Ministério da Saúde (MS). Está sendo investigada a fraude de informações das vacinações do ex-presidente Jair Bolsonaro, sua filha Laura, Mauro Cid e sua família.

No sistema do Ministério da Saúde consta que Bolsonaro tomou a 1ª dose no dia 14 de agosto de 2022 e a 2ª dose no dia 13 de outubro do mesmo ano. Entretanto, essas informações só foram colocadas no sistema no dia 21 de dezembro, 09 dias antes de sua viagem à Florida, EUA, pelo secretário municipal do Governo de Duque de Caxias. Até 11 de maio desse ano, era obrigatório a apresentação de comprovante de vacina contra o Coronavírus para entrar nos Estados Unidos. Bolsonaro, portanto, chegou ao país antes dessa medida cair; dessa maneira, sem imunização completa, ele não poderia entrar.

Na última quarta-feira (3), ao ter sua casa revistada pela PF, o ex-presidente anunciou que nem ele nem sua filha foram imunizados “Eu não tomei a vacina. Foi uma decisão pessoal minha, depois de ler a bula da (vacina) Pfizer”. Na mesma ocasião, ele também afirmou que ninguém pediu comprovante de vacina enquanto estava nos EUA, e justifica dizendo que como ainda era Chefe de Estado, ele estava isento de apresentar qualquer comprovante.

Mesmo assim, o cartão de vacina ainda é obrigatório para entrada no Brasil, segundo a Anvisa. Bolsonaro retornou ao país em um período que já não era mais Presidente, portanto seu argumento não é pertinente. Se ele conseguiu entrar em dois países nos quais é obrigatório apresentar cartão de vacinação, mesmo afirmando que não foi imunizado, ou os documentos foram forjados, ou Bolsonaro está mentindo sobre sua vacinação.

Ao total, 6 pessoas foram presas, sendo a maioria do círculo íntimo de Bolsonaro. São elas: 

  • Mauro Cid Barbosa, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
  • João Carlos de Sousa Brecha, secretário municipal do Governo de Duque de Caxias
  • Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-major do Exército e referido por Bolsonaro como seu “2º irmão” 
  • Max Guilherme Machado de Moura, ex-sargento do Batalhão de Operações Especiais e segurança de Bolsonaro
  • Sérgio Cordeiro, militar do exército e segurança de Bolsonaro 
  • Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército e era funcionário de Mauro Cid 

O ex-presidente, entretanto, não foi preso.

Possível relação com assassinato de Marielle Franco

Após as prisões e investigação das mensagens dos suspeitos, foi revelado uma possível relação com o assassinato da vereadora. De acordo com a PF, Mauro Cid, procurou Marcello Moraes Siciliano, ex-vereador do Rio de Janeiro, que já foi apontado como testemunha no caso Marielle, para uma troca de favores. 

Cid entrou em contato com Siciliano, interessado na emissão de um certificado de vacina falsificado, de Duque de Caxias, para sua esposa, Gabriela Santiago Ribeiro Cid, para que ela pudesse entrar nos Estados Unidos. Em troca, Marcello pediu ajuda para resolver seu problema de obtenção do visto americano, já que, como tinha histórico de envolvimento com o assassinato, não poderia entrar no país.  

Nessa situação, Ailton Barros, que concorreu ao cargo de deputado nas eleições de 2022, pelo PL, além de se referir como “01 de Bolsonaro” durante sua campanha, entra em cena. Ele foi procurado por Cid para ajudar com o problema do visto do ex-vereador, tentando intermediar um encontro entre Siciliano e o cônsul dos EUA no Brasil. 

Em uma das mensagens apreendidas pela PF, Barros e o ex-ajudante discutem sobre a situação de Siciliano, e Ailton afirma que Marcello foi erroneamente acusado e que seu envolvimento com o assassinato foi fabricado por um agente da PF. “Esse garoto, Marcello Siciliano era um que vereador do Rio de Janeiro e que foi acusado de ser o mandante da morte da Marielle. Aí depois o camarada confessou que inventou essa história (o cara da polícia federal)” escreve o ex-major para Cid. É nessa mesma mensagem que Barros afirma saber quem mandou matar Marielle, entretanto não cita nenhum nome.

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Mensagens de Ailton Barros divulgada pela PF. Imagem: Reprodução.

Ariosvaldo de Goes Costa Homem, amigo e defensor de Ailton, afirmou à TV Globo que visitou o ex-major no presídio em Benefica, na quinta-feira (4), e que discutiram essas falas. Segundo Ariosvaldo, o que foi falado nas mensagens foi apenas uma “bravata”, que Barros queria apenas impressionar Cid, e chamar atenção de Bolsonaro e aliados, a fim de suceder em sua campanha eleitoral. 

O assassinato da vereadora Marielle Franco, e seu motorista, Anderson Gomes, ocorreu há 5 anos, e ainda continua em aberto. Será que finalmente teremos respostas, ou relatos falsos foram produzidos, a fim de lucrar em cima da crueldade cometida? Pelo histórico do clã Bolsonaro e aliados, é possível perceber uma repetição de padrões: mentiras e falcatruas sendo a forma que esse grupo opera. A mentira contada quando afirmou que a compra dos 51 imóveis não foi feita com dinheiro vivo, mesmo tendo provas que foi. Ou quando mentiu sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas, jurando que elas não eram seguras, mesmo não tendo nenhuma evidência. Esses são apenas alguns exemplos, mas nos fazem questionar a veracidade das falas desse grupo. 

Falta de integração nas inteligências policiais impede monitoramento adequado de CACs
por
Artur dos Santos
Guilherme Gastaldi
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09/05/2023 - 12h

O SIGMA (Sistema de Gerenciamento Militar de Armas), responsável pelo registro de armas de Colecionadores, Atiradores e Caçadores Desportivos (CACs), não consegue rastrear antecedentes criminais com efetividade. Segundo Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “se o antecedente criminal é em Minas e ele vai comprar uma arma em São Paulo, não vai aparecer no sistema porque não tem integração entre as informações das polícias estaduais”.

O SIGMA e o SINARM (Sistema Nacional de Armas) são os dois sistemas responsáveis pelo registro de armas e armamentos no Brasil. Enquanto o SIGMA é associado ao exército e corresponde aos registros dos CACs, o SINARM é o sistema da Polícia Federal, responsável pelos registros de armas de “cidadãos comuns”, que vão atrás do registro por motivos de insegurança e eventuais ameaças que possam sofrer. 

Embora o SINARM tenha números e registros mais precisos, o mesmo grau de transparência não é observado nos registros do SIGMA. Estes, por exemplo, não têm uma definição exata de tipos de armamentos registrados.

Quando questionada sobre a disparidade das informações disponíveis nos dois sistemas, Samira Bueno afirma que: “quando veio a legislação que criou o estatuto [do desarmamento] em 2003, o que dizia? O que pedia, o que previa essa legislação? Primeiro a integração dos sistemas. Você tem um sistema que é regulado pela PF e um pelo exército. Só que eles não são também integrados. Cada um controla e cada um controla muito mal”, ressalta.

 

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Foto: gráfico 62 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.

 

A produção de lotes de munições também é um fator discutido dentro dessa problemática de acesso a armas. Antigamente, os lotes produzidos no Brasil eram menores, o que facilitava o monitoramento e investigações policiais nas quais cartuchos eram evidência. Com lotes menores, a busca por pessoas que compraram munições correspondentes é mais fácil. Com lotes grandes, a investigação é prejudicada.

“Quando a polícia começou a investigar o assassinato da Marielle Franco, descobriram que era um lote desviado da Polícia Federal. Então, o armamento utilizado, a munição utilizada para assassinar ela e o Anderson era desviado de um lote da polícia federal que, se eu não me engano, tinha um milhão de cartuchos. Um milhão”, comenta Samira.

A quantidade de munições adquirida por CACs em 2022 também alarmou o Fórum Brasileiro de Segurança Pública: “Aqui é a pessoa física que tem o registro, e sabe-se lá onde que ela está usando essa munição, porque 36 milhões de munições é muita coisa”. 36 milhões de munições adquiridas em um ano correspondem a aproximadamente 98.630 munições por dia. 

 

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Foto: tabela 72 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.

 

A falta de integração entre os sistemas e o aumento dos lotes de munição no país são mais um fator que engloba a problemática da disseminação do acesso às armas experienciado no Brasil nos últimos anos. Durante o governo Bolsonaro, mais de 50 decretos foram criados para que o acesso a armamentos fosse disseminado à população. Dentre eles está o Artigo 61 da Portaria 150 do COLOG de 2019, que autoriza o CAC a portar 1 arma curta quando em deslocamento para treinamento (chamado também de “Porte de Trânsito” e vulgarmente apelidado de “Porte Abacaxi”).

Além da facilidade de aquisição deste equipamento, durante os últimos quatro anos, quase todos os calibres que eram antes proibidos se tornaram permitidos. Através dos diversos decretos, aumentou-se o poder de fogo e as quantidades de munições e armas nas mãos da população.

Sobre esses equipamentos, Samira Bueno afirma que, durante o último governo, os preços baixaram, favorecendo assim, a compra desse armamento pelo crime organizado. Em suas palavras, “quando você tem uma legislação que permite que muita gente compre, e tem muitas marcas e calibres em circulação, agora legalmente, a tendência é que aquele armamento que antes era adquirido pelo crime por exemplo no mercado paralelo, agora ele vai ser comprado legalmente. Então o fuzil que custava 50, 60 mil reais, agora sai por 15. E você ainda compra com nota fiscal”.

“[O governo foi] criando uma bagunça jurídica para permitir que mais pessoas conseguissem licenças, que mais tipos de armamento fossem disponibilizados para essa população que então conseguiu um determinado tipo de registro, especialmente de posse, embora o porte tenha sido também flexibilizado”, conclui.

Nos últimos quatro anos, o número de Certificados de Registros (CR) ativos de CACs subiu de 197.390 a 673.818 - em 18 anos, o Brasil presenciou um aumento equivalente a 4.936% dessa modalidade. 

Para Roberto Uchoa, policial federal conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2017 o Brasil contava com 60 mil CACs, número que “não era relevante”. Hoje em dia, Uchoa afirma que a polícia “tem que lidar com o cidadão de bem que agora está armado” em situações de busca e apreensão. O policial relatou um caso de busca no qual uma pessoa se assustou com as luzes da polícia e saiu de casa atirando por achar que teria suas armas recolhidas.

 

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Samira Bueno, Diretora Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Foto: reprodução TV Cultura.
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Roberto Uchoa, Policial Federal e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. 
Foto: reprodução do twitter.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Para Samira Bueno e Uchoa, o ano de 2022 representou o final da corrida armamentista: “Todo mundo conseguiu licença. Então você tropeça, você anda no Rio de Janeiro na rua e é isso. Você acha que é um pet shop e você compra um fuzil no fundo da loja”, diz a Diretora sobre a venda de armas. “Muita gente foi atrás de armas em 2022 por conta do eventual cenário da derrota de Bolsonaro, na época”, diz Uchoa.