A Lei Maria da Penha, uma medida de prevenção e punição em caso de violência doméstica, foi sancionada em 7 de agosto de 2006. Dezessete anos depois, em 2023, o Brasil ainda é o quinto país com mais casos de violência contra mulher, com 3.181 denúncias contra parceiros e parentes.
A Lei determina que todo caso de violência dentro de casa e por familiares é crime, sendo julgados nos Juizados Especializados de Violência Doméstica Contra a Mulher. Nos últimos cinco anos, houve pelo menos oito coberturas incluídas no projeto, dentre elas, o afastamento imediato da vítima do ambiente de violência sem a prescrição doboletim de ocorrência (B.O.) e a proteção de mulheres transgêneras.
Mas, afinal, quem é Maria da Penha?
Maria da Penha Maia Fernandes foi vítima de duas tentativas de feminicídio em 1983. Na primeira, enquanto dormia, seu então marido atirou contra a suas costas, o que a deixou paraplégica. Quatro meses após uma recuperação intensiva da tragédia intencionada que quase tirou a sua vida, o ex-parceiro tentou eletrocutá-la durante o banho, enquanto a mantinha em cárcere privado. Depois de muita luta, a família e os amigos de Maria conseguiram tirá-la de casa e das mãos do agressor.
O caso de Maria da Penha levou ao todo 19 anos e seis meses de disputas judiciais. O agressor chegou a ser sentenciado à prisão duas vezes, com penas de 10 e 15 anos, mas nenhuma das sentenças foi cumprida por falhas na justiça. Na primeira, em 1991, os advogados do réu anularam o julgamento e, na segunda, em 1996, o réu foi condenado a dez anos e seis meses, mas recorreu e acabou passando apenas cerca de dois anos preso.
Origem da Lei
Após um ultimato da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), em 1998, o Estado Brasileiro foi denunciado e responsabilizado por “negligência, omissão e tolerância” em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras.
O caso de Maria de Penha passou a ser tratado como uma violência contra a mulher por razão de gênero, mas, em 2002, foi formado um Consórcio de ONGs Feministas para reivindicar a elaboração de uma lei especializada no combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Depois de debates e reivindicações dentro dos tribunais, o Projeto de Lei n. 4.559/2004, da Câmara dos Deputados, chegou ao Senado Federal (Projeto de Lei de Câmara n. 37/2006) e foi aprovado por unanimidade em ambas as Casas. A Lei Maria da Penha (Lei N. 11.340) foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Como uma das recomendações do CIDH foi uma reparação simbólica e material à Maria da Penha, o Estado do Ceará pagou uma indenização a ela e o Governo Federal nomeou a lei em reconhecimento e homenagem à sua luta contra a violação dos direitos humanos das mulheres.
Em 2015, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que a Lei Maria da Penha diminuiu em 10% a taxa de feminicídio cometidos pelos agressores dentro da residência das vítimas.
A legislação trouxe avanços e amparos para as mulheres brasileiras. Além de tipificar a violência doméstica, ela oferece medida protetiva com o afastamento do agressor da vítima e seus familiares, proíbe aplicação de penas pecuniárias, (ou seja, não pode ser paga por multas ou doações de cestas básicas), oferece auxílio para a mulher caso ela seja financeiramente dependente do agressor e amplia a pena do agressor de um a três anos de cadeia caso a mulher vítima seja deficiente.
Mudanças e inclusões
Desde 2019, outras medidas foram acrescentadas à Lei Maria da Penha, entre elas:
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Lei nº 13.827/19, que permitiu a adoção de medidas protetivas de urgência e o afastamento do agressor do lar pelo delegado;
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Lei nº 13.836/19, tornando obrigatório informar quando a mulher vítima de agressão doméstica ou familiar é pessoa com deficiência;
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Lei nº 13.871/19 determina como responsabilidade do agressor o ressarcimento dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados;
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Lei nº 13.894/19, que atribuiu ao Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a ação de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável. A norma também estabeleceu a prioridade de tramitação dos procedimentos judiciais em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar;
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Lei nº 13.984/20, estabelecendo obrigatoriedade referente ao agressor, que deve frequentar centros de educação e reabilitação e fazer acompanhamento psicossocial;
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Lei nº 14.132/21 inclui um artigo no Código Penal (CP) para tipificar os crimes de perseguição (stalking);
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Lei n° 14.164/21, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para incluir conteúdo sobre a prevenção à violência contra a mulher nos currículos da educação básica, além de instituir a Semana Escolar de Combate à Violência Contra a Mulher, a ser celebrada todos os anos no mês de março;
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No primeiro semestre de 2022, a Sexta Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a Lei Maria da Penha seria aplicada também em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgêneras.
Os números não param de crescer
Em 2023, o Brasil registrou 1.463 casos de feminicídio, crime em que o assassinato de uma mulher ocorre pelo simples fato de ser mulher, ou seja, uma mulher a cada seis horas era assassinada. No mesmo ano, a cada 24 horas, oito mulheres foram vítimas de violência doméstica, segundo o boletim "Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver".
De acordo com a ONU, sete a cada 10 mulheres no mundo já foram ou serão vítimas de violência de gênero em algum momento da vida. No mundo, de acordo com a OMS e a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, a estimativa é de que 35% dos feminicídios são cometidos por seus parceiros, ao passo que 5% dos homicídios de homens são praticados por suas parceiras.
O salão do Palácio do Planalto esteve movimentado na última segunda-feira (18). O presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, uniu a bancada do seu governo e a imprensa para a primeira reunião ministerial do segundo ano de mandato do petista.
A apresentação foi realizada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, que fez o balanço geral dos eixos sociais, divididos em: cuidando das pessoas, cuidando da cidade, do urbano e do rural, economia e investimentos e democracia.

O presidente, na sua primeira fala, afirmou que “essa recuperação é apenas o início, mas isso não basta. Nós vamos fazer com que as pessoas consigam alcançar um degrau da classe social desse país”.
Lula comentou sobre as mudanças feitas ao longo do último ano no corpo ministerial. Dos 38 ministros presentes, quatro cadeiras foram alteradas desde a reforma ministerial:
Gonçalves Dias, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que pediu para ser afastado após boatos de envolvimento com a invasão de um dos prédios da Praça dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro de 2023. Daniela Cordeiro, ex-ministra do Turismo, que constituiu a cota do partido União Brasil, pediu desfiliação da sigla alguns meses depois, e Ana Moser, ex-ministra do Esporte, que foi exonerada após ser desaprovada em discussões sobre investimentos com esportes eletrônicos. Por último, Flávio Dino, que liderava o ministério da Justiça e Segurança Pública, foi promovido à cadeira do Supremo Tribunal Federal (STF), por escolha de Lula, e quem o sucedeu foi Ricardo Lewandowski, ex-político dos outros governos do petista.
O presidente falou sobre os acontecimentos que envolveram a tentativa de golpe em Brasília em 8 de janeiro do ano passado e os últimos resultados das investigações que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro e próximos a ele.
“Nós precisamos resolver uma questão mais séria que é a consolidação do processo democrático. A democracia precisa ser uma coisa fundamental na nossa vida. É preciso ter respeito com as instituições e com a nossa Constituição, que foi a mais participativa na história desse país.”, afirma.
Outra questão abordada foram as metas do Governo até 2026: a relação harmônica entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário; e a demonstração prática de que democracia não é só para quem está na política e o povo com melhores condições de estudo e alimentação. Lula é convicto: “eu tenho certeza que nós cumpriremos com a nossa meta até o fim do mandato”.
As principais mudanças no último ano foram:
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retomada de programas sociais (Bolsa Família, Minha casa Minha vida, Farmácia Popular, Bolsa Atleta, bolsa de pesquisa e pós-graduação);
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aumento pelo segundo ano consecutivo do salário-mínimo, que foi aprovado para R$1.412 e;
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Volta do Ministério da Cultura e iniciativas públicas e privadas para a movimentação do setor.

BALANÇO DO PRIMEIRO ANO EM EIXOS
Os dados apresentados por Rui Costa declararam a menor taxa de desemprego desde 2014, além do retorno da política de valorização do salário mínimo - o maior desde o plano real - e a retomada do Bolsa-Família (BF), com a aprovação de transferência de renda para familiares.
Na área da saúde, o número de médicos em UBSs cresceu 85%, de 13.726 para 25.421. Houve também a volta do Farmácia Popular, com preços acessíveis e gratuidade de remédios, além da ampliação de repasses de recursos aos estados e municípios em 20%.
Na educação, o reajuste no valor da merenda escolar para municípios e estados saltou para quase 5.300 milhões de reais, equivalente a 48%.
O incentivo à cultura pela Lei Rounet evoluiu para 255% propostas numéricas financiadas pelas empresas públicas e privadas. Também houve aumento da Bolsa Atleta em 22% e da Bolsa Pós-Graduação e Pesquisa (CNPQ e CAPES) em 41%.
Sobre o cuidado da cidade, do campo e do ambiente, o ministro apresentou dados de redução de pelo menos 41% do desmatamento na Amazônia. No entanto, o Governo enfrenta dificuldade na fiscalização dos biomas mais afetados, como o Cerrado, com o desmatamento e o garimpo. Exibiu também o novo Plano Safra, com aumento de 11%, equivalente a 344 bilhões de reais investidos em exportação do agronegócio e agricultura familiar.
Os investimentos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) deram o que falar entre os ministros com a retomada do orçamento público e os incentivos das empresas comentado por Rui Costata. O ministro Rui Costa afirma que a relação do setor privado nos aportes à infraestrutura, ciência e tecnologia e ao agronegócio firmará “o maior investimento da série histórica brasileira”.
Outra promessa feita pelo Governo é o aumento de 80% no padrão de qualidade nas rodovias federais. Em 2023, houve um aumento de 52%.
Sobre a democracia brasileira, dados apresentaram a diminuição de 52% da violência contra jornalistas. “O respeito à imprensa é o pilar da democracia”, afirmou o presidente da República.
O ministro-chefe da Casa Civil também frisou a importância do posicionamento do governo brasileiro em assuntos internacionais. Segundo ele, retomar as relações sociais com o exterior "aumenta a qualidade da sociedade no geral”.
Rui Costa finalizou a reunião garantindo que o corpo ministerial trabalhará para que, em janeiro do ano que vem, os investimentos e as mudanças que, segundo ele, o presidente coordena para o crescimento do Brasil sejam apresentados em gráficos completos.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) concordou com a penalização do uso ou do porte de qualquer substância que tenha potencial de dependência química, em votação simbólica, na última quarta-feira (13). Apoiado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o relatório de Efraim Filho (União Brasil-PB) irá ao plenário da Casa, órgão máximo de decisões, e, caso seja aprovado, passará pela Câmara dos Deputados. Essa é uma reação ao Supremo Tribunal Federal (STF), que está discutindo a descriminalização da maconha para uso pessoal e a distinção dos termos “traficante” e “usuário” para diferenciação das penalizações.
O texto do Projeto de Emenda Constitucional insere na Constituição um trecho da Lei de Drogas de 2006 e estabelece que usuários não serão presos por utilizar ou transportar drogas, mas estarão cometendo um crime sujeito a penas alternativas julgadas pelo Judiciário. Foram contra a aprovação Humberto Costa (PT-PE), Fabiano Contarato (PT-ES), Jaques Wagner (PT-BA) e Marcelo Castro (MDB-PI).

A decisão da proposta impacta na relação política entre o Legislativo e o Judiciário. A AGEMT reportou a última sessão realizada no STF sobre o tema, na semana passada. Apesar da paralisação temporária a pedido do ministro Dias Toffoli, a votação acabou 5 a favor da descriminalização da maconha com regras determinadas e 3 contra.
Enquanto no Senado, o relator do PEC retoma a sua opinião. “É preciso coibir o que for possível, que exploda o consumo através da liberação. Também é nocivo a questão da segurança pública. A gente sabe que a aquisição da droga é feita no tráfico e o tráfico financia o crime organizado, que é responsável pela escalada da violência, hoje, na sociedade. Por esse motivo, o parecer é contrário à descriminalização das drogas e esperamos ter essa ampla maioria para sua aprovação”.
Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) argumenta sua posição contrária: "Nós temos uma população carcerária no Brasil que saltou de 58,4% para 68,2% de pessoas pretas e pardas. Nós temos fontes que um branco no Brasil, para ser definido como traficante, tem que ter 80% a mais de substância do que um negro. É o Estado criminalizando a pobreza e a cor da pele”. O parlamentar se refere aos números dos estudos da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), que analisa ocorrências envolvendo posse de drogas em São Paulo.
A diferenciação dos termos “traficante” e “usuário” para determinar a personalização das penas - uma das pautas no STF -, tem movimentado o debate social e racial. A discussão começou na Casa Alta Judiciária, depois da falta de acordo legal para determinar a classificação quantitativa da maconha para uso e tráfico, além de reforçar o histórico racista presente nesse tema, na tentativa de cumprir com a seguridade social.
A “guerra às drogas”, termo cunhado nos EUA durante a governança de Richard Nixon, que declarou “o uso abusivo de drogas é o inimigo número um dos Estados Unidos”, se popularizou pelo mundo. No Brasil, essa condição estabeleceu que a militarização e o alto índice de violência funcionariam como estratégias para alcançar um dos maiores desafios do Estado: “a Segurança Pública no combate ao crime organizado”, fala do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva durante entrevista coletiva sobre ações na área de Segurança Pública no Rio de Janeiro e em São Paulo, no Palácio do Planalto, em 1º de novembro de 2023.

Números do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram a atuação dos policiais diante de apreensões de acusados do tráfico ou posse de drogas. O perfil da pessoa privada de liberdade é negro, entre os 18 e 34 anos e do sexo masculino. Além disso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou, em outubro do ano passado, que negros são mais alvos de prisões por tráfico de drogas em casos flagrantes feitos a partir de rondas policiais, alegando “indivíduo com atividade suspeita”.
O ministro de Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, comentou o assunto na Organização das Nações Unidas (ONU), em fevereiro do ano passado: “Temos que tratar isso como uma questão de saúde pública, como uma questão que não se resolve por meio do encarceramento, com prisão e com punição”. Ele acrescentou que enxerga a descriminalização das drogas como uma forma de diminuir a pressão do sistema carcerário brasileiro, que enfrenta superlotação a cada ano. Em 22 anos, o número de presos aumentou 257%, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.
A Câmara dos Deputados elegeu 19 presidentes para as 30 comissões permanentes, em sessão realizada em Brasília, na última quarta-feira (6). Um dos resultados que mais chamou a atenção foi a escolha do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) como presidente da Comissão de Educação. Ele recebeu 22 votos favoráveis de um total de 37, com 15 votos em branco, e irá presidir uma das Comissões mais importantes da Câmara por um ano, substituindo o deputado Moses Rodrigues (União-CE).
As Comissões
As Comissões Permanentes da Câmara são constituídas por deputados para discutir e avaliar projetos de lei referentes a cada tema, além de fiscalizar e acompanhar as ações administrativas. O objetivo das Comissões Permanentes é garantir o rápido trâmite das propostas de lei e assegurar que elas sejam compatíveis com a Constituição Federal e com as legislações locais, trazendo também qualidade ao processo legislativo.
Antes das propostas irem para o Plenário, cada comissão envia um parecer sobre elas, mas, em alguns casos, ela é avaliada e quem constitui a comissão decide se será aprovada ou rejeitada, sem necessidade de encaminhar ao Plenário da Casa.
Os líderes dos partidos políticos indicam os membros que possuem representação nas Casas Legislativas, mantendo um equilíbrio em cada comissão. Estar na presidência das comissões é importante, pois o presidente irá pautar as propostas que serão avaliadas.

Comissão da Educação
A Comissão de Educação (CE) é uma das mais importantes da Casa. O objetivo é atribuir pautas sobre assuntos importantes relacionados à educação num contexto geral, falar sobre a política e o sistema educacional, os aspectos funcionais, legais e estruturais, além de tratar sobre o direito à educação e os recursos, tanto financeiro quanto humano, no setor.
Em 2023, a CE aprovou projetos que garantem equipamentos para a educação digital nas escolas públicas e a instalação de laboratórios de informática, matemática e ciência nas instituições de ensino. Além disso, foi aprovada a proposta de lei que estimula professores da educação básica a se especializarem ou tornarem-se mestres e doutores. Segundo o projeto, as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) devem ofertar pelo menos 20% das vagas em cursos de pós-graduação para esse grupo.
Nikolas, que foi eleito em 2022 com o maior número de votos do país, é ligado a pautas conservadoras e já esteve envolvido em acusações de transfobia, apoio a discursos golpistas e muitos outros episódios polêmicos. Agora, tem o dever de atuar em uma área em que não tem familiaridade desde que assumiu seu mandato.
Opiniões divergentes
Houve muitas manifestações referentes à indicação de Nikolas para a presidência da Comissão.
A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) alegou ser inconcebível ele ocupar esse cargo. “Ele é réu no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em função de um vídeo que ele gravou de uma estudante de 14 anos que estava utilizando o banheiro.[...] Ele atentou aos direitos de uma criança, inclusive, ferindo o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]”.
Fernanda Melchionna, deputada pelo PSOL-RS, fortaleceu os argumentos de sua colega contra a decisão, relembrando que Nikolas foi condenado em primeira e segunda instância por transfobia e finaliza: “é grave que a Comissão da Educação, que trata de tantos temas importantes, esteja presidida pelas trevas”.

O deputado Marco Feliciano (PL-SP) defendeu seu colega de partido, afirmando que Nikolas não é inimigo da educação como disseram, mas “inimigo da esquerda, do mimimi e daqueles que querem a legalização das drogas”.
Também apoiando o atual presidente da Comissão, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) enfatiza que o PT (Partido dos Trabalhadores) teve a oportunidade de indicar um membro para o colegiado da Educação, porém, optou por representar a Comissão da Saúde. “Eu tenho certeza de que o deputado Nikolas, o nosso indicado do partido, vai ter diálogo com todos, vai respeitar o governo, vai respeitar o Partido dos Trabalhadores, e a pauta será consensual, até porque senão a comissão não andaria.”, concluiu.
Diversos sindicatos que atuam pelos interesses de docentes de vários estados brasileiros como Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro repudiaram a eleição do deputado mineiro. O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) publicou uma nota de repúdio, afirmando que a educação, sendo um tema prioritário para o Brasil, não pode ter no comando um deputado que defende pautas extremistas e misóginas. “Compete ao presidente de uma Comissão dessa magnitude pautar e debater as grandes e inadiáveis questões de nosso, já há muito debilitado e preterido, sistema educativo, do fundamental ao superior. O eleito, neste caso, além de desconhecer nossos desafios educacionais, faz deboche e agride o bom senso de quem tem compromisso com a educação”, diz a publicação.
A Frente Parlamentar Mista da Educação (FPME), que é composta por deputados federais e senadores e atua defendendo a qualificação do ensino público aos cidadãos brasileiros, promovendo debates de políticas públicas nacionais e legislações em conjunto com órgãos públicos e representantes da sociedade, também demonstrou preocupação com a eleição de Nikolas Ferreira para o cargo.
De acordo com o comunicado divulgado, “o parlamentar não tem atuação na área ou profundidade para conduzir os trabalhos em um tema que é central para o desenvolvimento do País.” A FPME acrescenta que o ano de 2024 será importante na educação, pois matérias como o Novo Ensino Médio serão debatidas e o presidente da Comissão deve ser comprometido com a urgência e a seriedade dos temas. A Frente Parlamentar finaliza a mensagem ressaltando seu compromisso com a educação de qualidade para todos: “o momento exige um diálogo construtivo e ações afetivas que estejam alinhadas com as necessidades reais do País.”
Os planos do novo presidente
Logo após ser empossado na presidência da CE, Nikolas Ferreira anunciou algumas pautas que pretende priorizar em seu mandato. O deputado falará sobre o homeschooling, termo em inglês para ensino domiciliar, e o Plano Nacional da Educação. Ele também citou que irá fiscalizar a educação no governo atual, tratará da violência nas escolas e que serão realizadas audiências públicas, contando com a presença da sociedade. “Nós vamos fazer uma comissão bastante plural no debate de ideias e pensamentos, acredito que seja muito importante”, finaliza.
Crise na pauta educacional
O cientista político e professor no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) Rafael Cortez entende que, no momento, o tema “educação” talvez seja o que mais separa governo e oposição. “O debate sobre questões educacionais ganhou um certo cunho moralista e se conecta com outros pontos que intervieram para a direita criticar a esquerda, a partir das emergências do bolsonarismo”. Para ele, a educação como política pública não diz respeito somente ao aperfeiçoamento do ensino público brasileiro ou a caminhos para subir nos rankings de avaliação, mas ganhou espaço nos debates públicos referentes a essas questões “por ser uma caixa de ressonâncias dessas diferenças de abordagem no campo moral, que ficaram mais fortes ao longo do governo Bolsonaro.”
O professor comenta que a tendência é ter conflitos mais abrangentes entre governo e oposição na Comissão, já que o deputado Nikolas Ferreira, um dos grandes representantes do bolsonarismo, irá presidi-la. É plausível considerar também que o Partido Liberal (PL) tenha indicado o mineiro justamente por ele ter o histórico em enfrentar as pautas da oposição. “Me parece ser uma forma de aumentar a visibilidade pública dos acontecimentos da Comissão. [...] Pode estar presente a estratégia do partido em colocá-lo na presidência da Comissão e eventualmente prepará-lo para voos eleitorais em 2026”, destaca.
Com as opiniões contrárias à eleição do deputado, Rafael acredita que Nikolas deverá se adaptar a essa pressão, dependendo também de quem irá compor o colegiado, para entender até onde os conflitos podem ser mais tumultuados. “Olhando o ponto de vista dos movimentos sociais, das organizações de interesse, a tendência é um cenário bastante conflituoso ao longo de 2024”, finaliza o cientista político.
Nessa sexta-feira, dia 08 de março, centenas de manifestantes estiveram presentes na Avenida Paulista para protestar durante o Dia Internacional da Mulher. A pista sentido Consolação foi tomada por mulheres e apoiadores da causa, segurando cartazes e realizando cantos que reforçam a necessidade da luta da mulher e o reconhecimento de seus direitos.
O protesto teve início às 17h em frente ao MASP, e a diversidade de pessoas presentes chamou a atenção: cidadãos comuns não organizados politicamente se juntavam aos militantes de movimentos sociais de gênero, raça e de luta por moradia. Organizações ligadas à juventude e à defesa de uma educação de qualidade também compunham o ato para além de parlamentares de diferentes partidos políticos.
Entre as bandeiras, um novo chamado aparece, pelo cessar-fogo em Gaza e em apoio às mulheres palestinas. Ao final da tarde ouvia-se cantos como: “mulheres livres, do Brasil à Palestina. Não vai ter morte, vai ter luta!”
Legalização do aborto
A ação interseccional dos movimentos sociais presentes foi destaque, desde carcerários femininos, sindicais, pastorais e de estudantes. Isabela Reis, universitária de Relações Internacionais pela PUC-SP, atua no coletivo Juntas!:
“Somos um coletivo feminista antirracista de corrente marxista, fundado por mulheres, como a deputada Sâmia Bomfim. Atuamos pela legalização do aborto, uma luta internacional e que aqui no Brasil vem sendo muito atacada, principalmente no Estado de São Paulo, por conta do Hospital Cachoeirinha. A gente sabe que a luta pela libertação das mulheres inclui a libertação das mulheres palestinas e da população palestina, que sofre com os ataques em Gaza.”
O Hospital Vila Nova Cachoeirinha citado por Isabela, é referência em aborto legal em São Paulo em casos em que a motivação da gestação ocorre por crimes de violência sexual, quando há o diagnóstico de anencefalia (isto é, quando o cérebro do feto é subdesenvolvido), ou quando há risco à vida da mulher.
No ano de 2023 a prefeitura determinou que o atendimento no local para abortos legais fosse suspenso, alegando necessidade de aumentar a capacidade para outros tipos de cirurgias. O hospital era o único a oferecer os serviços de aborto legal após 22 semanas de gestação. Desde então, os serviços correm risco de serem descontinuados.
Mulheres em situação de cárcere
A coordenadora da Pastoral Carcerária, Rosilda Ribeiro, explica que a dificuldade das mulheres no sistema prisional ocorre principalmente por motivação de gênero, e que o movimento Pastoral acolhe também mulheres transexuais: “Para provar que está menstruada, por exemplo, o sangue tem que escorrer entre as pernas. As mulheres trans sofrem discriminação. Elas são privadas de sorrir, de cantar, de abraçar… é muito triste. A maior dor delas é a saudade. Então a gente pede isso, que elas sejam livres. Lutamos pelo desencarceramento das mulheres.”

A manifestação contou ainda com faixas contra a privatização da Sabesp, além do envolvimento de civis não organizados, como o caso de Samuel Santos, de 47 anos, que trabalha em um prédio comercial da Avenida Paulista e que viu a movimentação ainda de dentro da torre: “Vi tudo lá de cima (do prédio) e aí desci. É bom porque está bem pacífico. A Paulista é o centro da diversidade, né, então tudo acontece aqui! Eu acho legal.”

A presença de parlamentares em ano eleitoral
A causa das mulheres está presente no planejamento de mandato de muitas vereadoras e deputadas. Gleisi Hoffmann, atual presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, discursou de cima do carro de som pedindo pelo fim dos massacres em Gaza e em defesa da democracia. No caso de Juliana Cardoso, deputada federal também pelo PT, a parlamentar caminhou entre a população e tirou fotos com manifestantes. Em suas falas, Juliana saudou a conquista de direitos das mulheres e denunciou o aumento do número de casos de feminicídio no Brasil e os acontecimento na faixa de Gaza: “somos contra tudo o que tem acontecido contra o povo palestino.”
A deputada federal Sâmia Bomfim também esteve entre a população civil. Sâmia foi a parlamentar de esquerda com maior número de votos no ano de 2022, com leis nas áreas de direito reprodutivo, doméstico e de trabalho e cuidado. Apresentou coautoria no projeto que institui a Política Nacional de Promoção do Parto Humanizado, Digno e Respeitoso (PL 516/2022) e a Lei 14.245/21, baseada no caso Mari Ferrer, que visa o combate à revitimização de mulheres por parte do poder judiciário em crimes de caráter sexual, zelando assim pela integridade física e psicológica da vítima. Sâmia também sugeriu a lei que institui a igualdade salarial entre homens e mulheres no Brasil (PL 111/2023).
Ediane Maria, deputada estadual por São Paulo, fez aparição no ato. Ediane iniciou sua vida política por ser uma mulher preta, periférica e empregada doméstica. A desigualdade racial e de gênero faz parte de sua realidade, e hoje eleita, participa da Comissão de Defesa e dos Direitos das Mulheres na Assembleia Legislativa do Estado, além de continuar atuando no Raiz da Liberdade e no Mulheres em Movimento, coletivos do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
O comparecimento de parlamentares de diferentes partidos políticos, em pleno ano de eleição municipal, explica parte das motivações para além das próprias vivências, aproveitando o momento para angariar apoiadores para a campanha de seus pares e colaborar com as propostas de seus próprios mandatos.

Incômodo
Conflitos internos foram relatados. Um grupo de pessoas que estavam próximas ao carro de som, entre o MASP e a grade da via de ciclistas, relata ter sentido efeitos de gás lacrimogêneo. Enquanto os manifestantes se dispersaram para fugir da inalação do gás, os policiais presentes não se moveram.
Bianca Abreu, de 25 anos, estava no ato para fotografar para um trabalho da faculdade, quando começou a tossir: “Onde há policiamento a truculência pode acontecer, não fiquei surpresa com isso. O que me surpreendeu foi não ter uma justificativa para isso, para a inalação do gás, porque não teve um princípio de confusão, nenhum tipo de situação que pudesse justificar. Foi uma maneira deles causarem incômodo.”
Desfecho
Durante todo o ato, dezenas de viaturas da Polícia Militar fecharam os três quarteirões entre a Alameda Campinas, na esquina do Shopping Cidade, e a Rua Itapeva, até a esquina do MASP. Já a pé, na via de ciclistas, uma corrente de policiais era perceptível.

Às 18h uma forte chuva atingiu os manifestantes que continuaram com o ato entre cantos, batuques de instrumentos e carros de som, caminhando com as bandeiras até a Praça Roosevelt.
A concentração de pessoas provocou a interrupção da passagem de veículos e o desvio de trajetos das linhas de ônibus da Av. Paulista, Rua Augusta e Consolação, normalizando o trânsito por volta de 21h.