A capital pode ser uma cidade hostil, mas tem solução
por
Rafael Luz Assis
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11/06/2024 - 12h

Os olhos já pesados do tempo estão cerrados enquanto verificam a entrada do portão da vila onde mora na zona sul de São Paulo. Maria José tem 84 anos e reside no mesmo local há 33 anos, a casa foi conquistada a duras penas através da Lei de Usucapião. O senhorio que recebia o aluguel ainda em 1990 faleceu e nenhum de seus filhos se interessou pelo imóvel, havia outros bens mais valiosos. A idosa que havia acabado de chegar à cidade vinda do Rio de Janeiro com seus então 7 filhos e uma neta ficou morando lá e nunca saiu.  

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Dona Maria é natural de Santa Rosa - Sergipe e mora em São Paulo a 33 anos. Foto arquivo pessoal/ Facebook

Hoje ela mora com apenas um filho nessa residência a muitos anos, 3 morreram, outros seis e sua neta já se casaram. Quando chegou em São Paulo foi só trabalho, eram muitas bocas e o emprego era escasso, mas conseguiu alimentar todos até que foram “cuidar de suas próprias vidas”.  

Dona Maria que era doméstica não registrada a vida inteira, conseguiu se aposentar em 2009 através da Lei Orgânica Da Assistência Social (LOAS), e como nunca chegou a contribuir para a previdência, recebe o equivalente a um salário-mínimo, hoje R$1.412,00. Não reclama do valor e se sente feliz por ter conseguido o benefício, “É pouco, só dá para o sustento e as vezes nem dá. Eu até pouco tempo tinha cartão de crédito e conseguia parcelar algumas coisas. Minha televisão nova foi comprada assim. Mas fui roubada no fim de 2022 e levaram meu cartão, aí tive que cancelar e os bancos não fazem outro para mim porque sou velha”, diz Maria quando perguntei se o valor era suficiente para viver. 

Os familiares escassearam as visitas com o tempo. Maria diz que antes até conseguia visitá-los e fazer passeios sozinha, mas agora tem muita dificuldade de andar de ônibus por causa da idade e pouco sai. Conta que quando aposentou, chegava a pegar dois ônibus até o Parque Estadual do Jaraguá (32km ou 3 horas de ônibus), sentava-se em um banco e conversava com alguém que se juntasse a ela, ficava umas duas horas lá e voltava, sempre sozinha. Agora só o médico que é sagrado, toda semana está cuidando da saúde. “Toda semana vou no posto. Como sou velha, toda semana tem um médico diferente. É do olho, do coração e da diabetes. Esses últimos tempos minha filha quando me visitou achou que eu estava triste e fez eu contar para o médico, agora tomo mais remédio que o psicólogo passa”. Ela fala que entende a distância dos filhos é compreensível, o difícil é olhá-la e perceber que essa é uma coisa em que Maria não está sendo sincera consigo mesmo. 

Do outro lado da cidade, na zona leste, visitei a Casa de Clara. Inaugurada em 1996 para contribuir com o processo de envelhecimento ativo e saudável de idosos, a instituição franciscana recebe idosos de toda a cidade para compartilhar os dias com diversas atividades. 

Encontrei Dona Ritinha, que é a frequentadora mais antiga do projeto. Ela tem 72 anos e a mais de 10 participa do projeto. Ritinha conta que mora sozinha e recebe também um salário-mínimo de aposentadoria, ela conta que aproveita algumas oficinas da Casa de Clara para aprender a fazer coisas que podem lhe render uma “grana extra”. Meus vizinhos me falam: Vai trabalhar. Eles nem sabem que aqui eu já aprendi tricô que faço para vender, sabão que faço para vender e até bijuteria que faço e eles compram. Eu me divirto e ainda ganho dinheiro.”

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Dona Ritinha que é a frequentadora mais antiga da Casa de Clara, diz que muita coisa melhorou, mas ainda tem muita coisa a fazer. Foto: Vitória da Silva

Segundo ela era mora com o filho, mas esse trabalha viajando e fica meses sem aparecer. Fica a maior parte do tempo sozinha: “eu moro com meu filho. Ele trabalha viajando lá para os lados de Minas. Bem dizer eu nem vejo ele. Mas tudo bem, ele tem a vida dele e me ajuda quando pode.”.  

Lá também conheci o Sr. Tadeu, mais conhecido entre os frequentadores como “o namorador”. O idoso que frequenta o local a aproximadamente um ano e conta como aquelas atividades mudaram sua forma de viver a velhice. “Eu trabalhei por muito tempo como dirigente do Corinthians, quando me aposentei, meus filhos já estavam tudo criado e tinha suas famílias. Então eu encontrava meus amigos no bar para jogar dominó. Era jogando dominó o dia todo. Quando recebi um convite e vim para cá, no primeiro dia conheci a Miriam, aí a gente se conheceu melhor e estamos namorando desde então. Aqui é legal, até aprendi teatro, nem sabia que podia fazer um teatro”. 

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Sr. Tadeu sentado ao centro e contando as aventuras de sua vida. Foto: Victória da Silva

Nossa terceira visita foi o Instituto Melhor Idade Estação Vida, no baile da terceira idade. Senhores e senhoras de toda a São Paulo vão aos sábados para a reunião regrada a muita dança e paqueração. Lá conversei com um casal que se conheceu 8 anos antes no próprio baile. Vou manter o sigilo dos nomes e a pedido deles que dizem ser donos de seus próprios narizes, mas que a família não gosta de saber que frequentam o local. 

O homem do casal diz que é viúvo e que os filhos não moram em São Paulo, recorreu ao baile pois desde sempre gostou de dançar e logo nas primeiras paqueras conheceu a moça. A mulher disse que é “casada”, mas que não tem nada com o marido a muito tempo e descobriu no baile que não estava morta: “Estou viva querido, e só comecei a perceber isso depois que envelheci e comecei a vir aqui”.

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Desde 1995 o Instituto Melhor Idade Estação Vida, reúne pessoas na melhor idade para um dia muita dança e socialização. Foto: Matheus Assis

 

O Brasil está crescendo, e sua população de idosos cresce ainda mais rápido. Diante de todos esses relatos, o que fica bastante evidente é que precisamos pensar e falar sobre qualidade de vida na terceira idade. Porque assim como disse nossa entrevistada, eles estão  vivos e tem necessidades próprias de público. A solidão na terceira idade também é preocupante, aqui o interesse não é dar uma solução e sim propor um diálogo: Será que estamos pensando uma cidade para a nossa população mais longeva? 

 

Esta matéria foi produzida como parte integrante das Atividades Extensionistas do curso de Jornalismo da PUC-SP. 

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Lucca Cantarim dos Santos
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06/06/2024 - 12h

Influenciados por conhecidos, buscando uma fuga da monotonia diária ou simplesmente curiosos, cada vez mais pessoas são agarradas pelos tentáculos do mundo das drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas, foi o caso de Antônio Almeida, que no seu aniversário de 14 anos limpo, conta sua experiência com as substâncias.

Assim como muitas pessoas, as influências externas foram o principal fator para que ele começasse a usar drogas: “eu comecei a usar no embalo, pra fazer parte de uma galera [...] eu via os meninos da rua e parecia que era mais legal aquele estilo de vida, mas não tinha nada de errado na minha vida, eram coisas que eu colocava na cabeça”

Além disso, uma quebra de expectativa fez com que Antônio acreditasse que poderia se controlar e que não entraria em apuros: “Sempre ouvi em casa que droga mata, que quem usa droga é criminalizado. Mas da primeira vez que eu usei droga (álcool e maconha) nada disso aconteceu comigo, inclusive foi muito legal, dei risada, me socializei, consegui trabalhar no dia seguinte...” mas o que ele não esperava, é que a situação progredia: “Eu achava que podia usar só de vez em quando, em alguns eventos. Eu sempre falava na época que a droga não pode te controlar, você quem deve controlar a droga.”

No entanto, as coisas começaram a piorar quando ele percebeu que apesar de só fazer uso nos finais de semana, Antônio já passava seus dias na expectativa da sexta-feira, para poder usar as substâncias.

Teve sua primeira experiência com cocaína aos 19 anos, e se assustou após fazer uso excessivo em uma festa e misturar com bebidas destiladas, e inclusive conseguiu ficar até os 26 anos sem fazer uso dessa droga em específico, apesar de continuar fazendo uso da maconha e do álcool: “Aquela ilusão de que a droga não ia me controlar era só da boca pra fora, pra poder justificar meu uso, já que eu pagava minhas contas e trabalhava.”

Os tentáculos das drogas se estreitaram em volta de Antônio por volta dos 27 anos de idade: “Foi quando eu comecei a misturar a maconha com outras drogas... Isso dava uma sensação de alívio pra uma vida que por falta de responsabilidade minha já não era mais confortável, meus amigos que não usavam droga focaram em estudar fora, se especializar, e eu fiquei usando drogas.”

“Quando eu comecei a misturar a maconha assim, o fundo de poço veio primeiro.”, ele chegou ao ponto de se envolver com o crack e passar a noite fora de casa usando a droga, Antônio conta que só não chegou a morar na rua pois sua mãe o deixava usar dentro de casa. Além disso, confessa dolorosamente que chegou ao ponto de cometer pequenos furtos, como roubar diesel de caminhões para vender e comprar a droga. “Eu me tornei alguém que eu nunca imaginei ser, eu sou uma pessoa de boa índole! E ainda assim, no final do meu uso eu cometia pequenos furtos, são coisas que eu me envergonho de falar sobre, são coisas que eu jamais pensei que faria.”

A situação se tornou ainda mais triste, quando mesmo com filha pequena em casa, ele ainda estava, com suas próprias palavras, isolado em sua laje, saindo apenas para pegar mais drogas: “Eu tentava ser pai, e lembro que mamadeira dava sono, e como estava ansioso para que ela dormisse, tinham dias que eu dava 5 mamadeiras de leite quente pra ela, sem me preocupar se aquilo faria mal para a criança, minha preocupação era fazê-la dormir logo para poder me drogar em paz.”

Mas uma pergunta fatídica fez Antônio começar a repensar sua situação e refletir sobre uma possibilidade de mudança: “Me perguntaram qual era a coisa que eu mais amava no mundo, e sem pensar duas vezes eu disse que era minha filha, e o terapeuta virou pra mim e disse: resposta errada, a coisa que você mais ama na vida é a droga, lembro até de ter ficado indignado, de tentar debater com ele.” Foi essa sessão que o fez perceber que ficava mais ansioso pra sua filha dormir e ele poder se drogar, do que para a droga acabar e ele ficar com a filha. “Eu não era esse cara, a droga que me fez assim, eu faço o possível pra ser o melhor pai do mundo.”

É aí que começa a jornada para uma vida melhor, aos seus 30 anos, Antônio é cercado por seus melhores amigos, seus primos e sua mãe, e recebe uma escolha: “A gente pesquisou uma clínica pra você, juntamos 15 pessoas pra pagar sua internação, e seu contrato está aqui, mas você só vai se você quiser. [...] Lembro vividamente desse dia, a primeira coisa que eu pensei foi na minha filha... Eu nunca vi droga na minha casa e ainda assim me tornei nóia, se ela crescer com um pai assim, imagina o que vai ser dela? Eu não posso deixar isso acontecer.” Ele escolheu ir para a clínica, e chegou no ambiente no dia 18 de maio de 2010, o último dia em que fez uso de drogas.

“Eu passei seis meses internado, mas no momento que entrei, eu já tomei a decisão de nunca mais voltar a usar drogas. Eu sabia que tinha alguém cuidando da minha filha, alguém pagando minhas contas e muita gente se dedicando pra me dar esse tratamento, então eu não ia desperdiçar.” Apesar da experiência desanimadora de viver no ambiente, cercado de pessoas que iam e vinham da clínica, devido à discrepância entre pessoas que se mantinham em recuperação, e pessoas que recaíam, Antônio diz que já viu muita gente sair e voltar semanas depois, mas ainda assim se manteve motivado, e conseguiu receber sua alta.

As estatísticas no Brasil são tristes, segundo pesquisas da Organização Mundial da Saúde, cerca de 6% da população brasileira faz uso de drogas, contabilizando aproximadamente mais de 12 milhões de pessoas.

A situação fica ainda mais deprimente ao se analisarem os dados de recuperação e recaídas, segundo um artigo publicado no site Clínica Bella, cerca de 95% dos dependentes químicos internados em clínicas sofrem recaídas após sua liberação. É necessário amparo e muita força de vontade por parte da pessoa dependente para sair por completo das drogas.

E Antônio é um exemplo perfeito de força de vontade. Após sair da clínica, uma frase ressoava em sua mente, ele não podia dar férias pro vício, seu tratamento nunca acabaria, e foi com isso na cabeça que ele buscou uma reunião de uma irmandade anônima de 12 passos, frequentando as reuniões até hoje: “Eu acredito que é frequentando o maior número de reuniões possível que eu consigo me manter limpo só por hoje, como costumamos dizer lá, há 14 anos. Hoje é um dia muito especial pra mim, é meu aniversário de 14 anos limpo, costumo comemorar esse dia mais do que meu aniversário, pois o dia que eu nasci eu não escolhi, mas hoje eu escolhi.”

Atualmente, Antônio continua frequentando as reuniões anônimas e se mantendo completamente afastado de qualquer droga, trabalha em dois empregos, faz trabalhos sociais, está casado há 10 anos e procura sempre ser o melhor pai possível para sua filha. “Eu sei que pra esse sucesso continuar, é preciso continuar a fazer minha parte, pra mim é uma alegria falar que apesar das estatísticas não serem animadoras, é possível viver sem drogas e se recuperar.”

 

*Os nomes nessa reportagem foram alterados para preservar a identidade e anonimato do entrevistado.

Esta matéria foi produzida como parte integrante das Atividades Extensionistas do curso de Jornalismo da PUC-SP. 

 

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Passado quase um ano, liderança indígena Yanomami fala sobre atual momento de seu povo, após Ministério da Saúde declarar Estado de Emergência de Saúde Pública na região
por
Artur Maciel
Bianca Abreu
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23/11/2023 - 12h

 

Em 20 de janeiro deste ano, o território Yanomami foi declarado em Estado de Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional pelo Ministério da Saúde brasileiro. Concentrados em uma região Amazônica entre o Brasil e a Venezuela, com cerca de 30,4 mil habitantes, Yanomamis sofrem com a intensa atividade de garimpos ilegais no local. Epidemias - como gripe e malária - insegurança alimentar, morte sistemática de crianças indígenas e destruição do meio ambiente são provenientes das ações dos extrativistas na região.

Em entrevista por telefone ao repórter Artur Maciel, da Agência Maurício Tragtenberg (AGEMT), o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami (Condisi) e representante do Conselho de Saúde Indigena (SESAI), Júnior Hekurari Yanomami, fala sobre a importância da atuação do poder público no combate ao genocídio provocado pela extração ilegal de minérios.

 

Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental
Junior Hekurari Yanomami momentos antes do IV Fórum das Lideranças Yanomami e Ye’kuana. Foto: Fabricio Araújo/ @Socioambiental

 

“A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”. Júnior Hekurari Yanomami

A fim de combater a desassistência sanitária no território Yanomami, o Ministério da Saúde instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE - Yanomami) - cuja gestão está sob a responsabilidade da SESAI. Segundo a pasta, ao chegar na terra Yanomami, o órgão “se deparou com crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição grave, além de muitos casos de malária, infecção respiratória aguda (IRA) e outros agravos”.

“Durante 6 meses, muita gente voluntária. Médicos. Enfermeiros. Farmacêuticos. De São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba”, explica Júnior Hekurari, quando questionado sobre o suporte atual na região após declarada crise sanitária. “A ajuda aos Yanomami deu esperança de poder olhar de novo. Olhar o sol brilhante na floresta que estava no escuro”.

Segundo ele, “antes não tínhamos uma visão, apenas medo. O garimpeiro poluindo nossas terras. Nossas águas. Interrompendo nossos rituais. Culpa do governo ladrão de jóias. As crianças voltaram a brincar e andar depois das ações”. “Eu tinha medo do povo morrer. Sem o Lula, o povo Yanomami ia morrer. Em 2020, 2021, 20 mil garimpeiros destruíram nossas vida” desabafa, citando o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e a atuação do Estado na crise humanitária. Mas pontua com veemência que “ainda tem muita coisa a melhorar”.

Quando perguntado sobre como era tratado o impacto ambiental na região, em relação ao lixo gerado pela atividade garimpeira, o presidente do Condisi declara que “os garimpeiros não respeitam. Desmatam e tiram a terra de nossa vida”. “Durante 4 anos, fomos abandonados pelo governo brasileiro. Por um governo ladrão de jóias. Agora o governo voltou e os profissionais de saúde estão apagando o fogo das emergências pensando em uma restauração”, completa. Ele se refere ao governo do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), que não raras vezes, ao longo de sua vida pública, legitimou publicamente as atividades ilegais dos garimpos.

 

Doença, fome e violência: genocídio em prática

As doenças, a insegurança alimentar, a violência e a morte passaram a fazer parte do cotidiano dos Yanomami diante da negligência do Estado em frear a extração indevida de minérios na região. De acordo com levantamento do Malária Journal, o aumento do número de casos de malária - causa recorrente de mortes de crianças indígenas - na região Yanomami saltou de 2.559, em 2010, para 18.765, em 2020. Sobre a presença da doença na região, o representante da Sesai afirma que a doença contamina até mesmo quem vai em seu combate. “Muitos dos médicos 'adoeceu'. Pegou malária e voltaram (para casa)”, conta. “Mas o importante é que a maioria 'desse' profissionais viram Roraima. Viram o Brasil!”, completa, demonstrando, em sua voz, um misto de preocupação pela saúde dos profissionais e esperança diante da visibilidade à situação de seu povo.

Outro aspecto da presença dos garimpeiros na região é o acúmulo de lixo nas proximidades das comunidades. Por conta disso, os indígenas locais entram em contato com elementos provenientes de fontes aquém da natureza - produzidos com materiais que não se reintegram àquele território. Pelo contrário, o desequilibram e o prejudicam. “Hoje tem lama em todo lugar, os garimpeiros deixaram lixo em todo lugar. Máquinas, latas e lixo”.

O que nos leva a outro problema que compõe esse efeito dominó no descaso com a saúde Yanomami: a fome. A alimentação indígena é, primordialmente, garantida pela natureza por meio da caça, pesca e consumo de frutas. Diretamente afetada pelo uso de mercúrio no garimpo, a água foi contaminada. Com isso, peixes mortos, impróprios para consumo, perdem-se nos rios onde a atividade garimpeira está. “O garimpo destruiu nossos rios. Nossas vidas. As mulheres não iam pescar. Não tinha peixe nem camarão para comer. Mataram tudo, não tinha alimento”, aponta Junior. E questiona, em seguida: “que dia vamos voltar a comer peixe? Voltar a comer camarão? O povo não tem”.

Além da malária e da fome, os indígenas ainda precisavam se proteger de outro perigo. Júnior Hekurari Yanomami denuncia que os crimes cometidos pelos garimpeiros também se estendem à violência sexual. Deixando, ainda mais evidente, o risco que a presença desse grupo não-indígena e extrativista provoca na população local. “O que aconteceu aqui foi muito traumático. Meninas de 12 anos grávidas. Estupradas por garimpeiros. Estamos agregando trauma de mães com luta dos filhos. Deram tiros nas crianças”, expõe a liderança. “Destruíram meu povo. Tem cicatrizes grandes até hoje e vai demorar para curar. Talvez em 50 anos. Quem sabe se cura”, conclui, reflexivo.

 

*Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.

Os impactos das mudanças no dia-a-dia dos pacientes e profissionais de saúde
por
Bianca Novais
Maria Eduarda Camargo
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20/11/2023 - 12h

Por Bianca Novais (texto) e Maria Eduarda Camargo (audiovisual)

 

Em um mundo pós-pandemia de Covid-19, os cuidados com a saúde deixaram de fazer parte de uma seção especial dos jornais e passaram a figurar entre os assuntos principais do cotidiano. Com a popularização dos nomes e marcas das indústrias farmacêuticas que desenvolveram e comercializam vacinas contra o coronavírus, a população passou a ficar mais atenta a outras informações sobre os produtos de saúde que consomem, em especial, medicamentos.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou em 12 de dezembro de 2022 a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 768, que estabelece novas regras para rotulagem de remédios. Kim Gonçalves, coordenador de Assuntos Regulatório de uma multinacional farmacêutica, nos conta como tem sido o processo de atualização.

 

 

Apesar da Covid-19 ter trazido mais foco para a indústria da saúde e sua regulamentação, a atualização da rotulagem era uma pauta da ANVISA há muitos anos e foi justamente a pandemia que atrasou esse processo.

 

 

 

Uma das novidades que pode ser mais perceptível ao consumidor é a "substituição" da bula de papel pelo código bidimensional: um tipo de código de barras que possui capacidade melhor de armazenar dados, inclusive dados maiores, do que códigos lineares - algo como o CPF de cada unidade do medicamento, um número de identificação próprio -, que poderá ser acessado pelo paciente através da internet.

Este é um ponto de atenção para Kim, uma vez que o acesso às tecnologias digitais no Brasil está longe do ideal. Apesar disso, a substituição é viável para a estrutura informacional que temos no país hoje:

 

 

Outro legado da pandemia, infelizmente, é o uso incorreto de medicamentos e a automedicação. Para além dos conflitos políticos e ideológicos travados durante o período da doença, que vitimou mais de 700 mil brasileiros até a redação desta reportagem, segundo o DataSUS, o perigo do mal uso de remédios não se limita ao indivíduo, mas a toda sua comunidade. A atualização das rotulagens de medicamentos também ajuda pacientes e profissionais da saúde - médicos, farmacêuticos, enfermeiros, cuidadores, psicólogos e muitos outros - a combaterem os efeitos desta outra pandemia - a de desinformação.

 

 

 

 

Os centros acadêmicos mobilizaram um ato de paralisação do corpo estudantil, com apoio da bateria Psicolata e de professores, para reclamar os direitos de formação na Reitoria e em frente à Fundasp
por
Artur dos Santos
Giuliana Zanin
João Curi
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20/10/2023 - 12h

Na última quarta-feira, 18, estudantes e professores dos cursos de Psicologia, Fonoaudiologia, Fisioterapia e Engenharia Biomédica da PUC-SP se mobilizaram contra o bloqueio dos estágios nos equipamentos de saúde do SUS (Sistema Único de Saúde) para o próximo ano. Em nota informativa, formalizada pela Comissão Aberta sobre os Estágios no SUS, estudantes independentes lideram a reivindicação de acesso, com apoio do corpo docente - com direito a aula pública - e a presença de figuras políticas no ato. 

 

É nosso dever reivindicarmos nossos direitos de formação, que é o estágio no SUS, [...] é nosso dever garantir, através da luta política, investimentos pesados em saúde, seguridade social e um ensino popular, pensado pela e para a classe trabalhadora”, declara a Comissão Aberta, em nota.

 

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Alunos dos cursos de saúde da PUC-SP se reuniram na prainha. Foto: Giuliana Zanin

 

Enquanto ecoavam “A nossa luta é todo dia, o nosso estágio não é mercadoria”, os manifestantes estenderam faixas e cartazes em frente ao prédio da Fundasp e também ocuparam a Reitoria da universidade. 

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Os universitários protestam contra a precarização da educação e do sistema de saúde. Foto: Giuliana Zanin

O problema foi gerado a partir de um impasse entre a PUC-SP e a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) quanto às contrapartidas oferecidas por instituições de ensino ao órgão. Apesar da entrega de R$176.162,23, a Secretaria determinou que a PUC-SP, por ser uma universidade privada,  deveria pagar R$306.000,00 em materiais e equipamentos hospitalares. A medida vai contra o que normalmente é requisitado de instituições filantrópicas, como é o caso da Pontifícia. 

 

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Estudantes se concentram em frente à Fundação São Paulo (Fundasp). Foto: Giuliana Zanin

Numa tentativa de negociação, a Universidade promoveu a ampliação dos serviços acadêmicos, incluindo disciplinas de graduação, pós-graduação e cursos de educação continuada, além de eventos e projetos educacionais. O objetivo é atender aos requisitos da Escola Municipal de Saúde/SMS, responsável pela promoção dos estágios dos cursos focados no segmento.

Segundo  o atual presidente do Centro Acadêmico de Psicologia (CAPSI), André Sanches, o bloqueio de estágios no SUS é parte de um projeto maior de precarização da saúde pública, que visa colocar o ensino em uma lógica mercantilizada. Para ele, isso “vai contra tudo que nós defendemos aqui na PUC”. O estudante também afirmou à Agemt que a mobilização estudantil no ato representa a urgência do assunto e o descontentamento com o atual ritmo das negociações por parte da Reitoria e da Fundação São Paulo, mantenedora da PUC-SP.

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Os estudantes percorreram as ruas de Perdizes com cartazes e cantos de união. Foto: Giuliana Zanin

A presença de preceptores nos estágios de psicologia também é uma problemática reivindicada pelos estudantes. No início deste ano, os estágios do curso passaram a ser obrigatoriamente acompanhados por preceptores - que atuam na supervisão das sessões realizadas por estagiários -, sob ameaça de processo aos administradores que não os incluíssem em seus turnos. Além disso, os estudantes reclamam da perda de autonomia e da interferência nos métodos utilizados no acompanhamento de pacientes na e condução de casos.

A assessoria de comunicação da PUC encaminhou a reportagem para a Direção da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde (FCHS) da universidade, que declarou em nota ter retomado as negociações com a Secretaria Municipal da Saúde.

"Informamos que reestabelecemos, com bom entendimento, o contato com a Prefeitura Municipal de São Paulo e Secretaria Municipal de Saúde e, ao longo da próxima semana, teremos reuniões para solucionar a questão dos estágios nos campos da SMS".

Procurada, a pasta municipal não respondeu até o fechamento desta edição. O espaço segue aberto para a SMS. 

O estigma social dos medicamentos antidepressivos
por
Cristiane Santos Gabriel
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18/09/2023 - 12h

Por Cristiane Gabriel (texto)

 

Quando se examina a trajetória histórica, desde tempos antigos até o presente, torna-se evidente a existência de analogias entre o que era denominado "melancolia" e a atual definição de depressão. Antes, a melancolia era conceituada por Hipócrates como "melankholia," que se originava de "mêlas," significando negro, e "kholê," referindo-se à bile. Ela era vista como um dos humores presentes no corpo humano, ao lado da bile amarela, do sangue e da fleuma. Qualquer desequilíbrio entre esses elementos corporais poderia potencialmente resultar em "distúrbios."

Se antes era considerada apenas uma alteração de humor, hoje, a depressão é reconhecida como uma questão de saúde pública e denominada a “Doença do Século”, se manifesta por meio de sintomas como perda de interesse e falta de energia, afetando diretamente o bem-estar do paciente e podendo gerar obstáculos no ambiente de trabalho, nos estudos e nos relacionamentos interpessoais. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que um mínimo de 121 milhões de indivíduos sofrem com essa condição.

Os antidepressivos surgiram como uma abordagem terapêutica para a depressão, porém, não representam a única solução para essa situação. Esses medicamentos agem nos neurotransmissores, uma vez que há evidências de que desequilíbrios nesses compostos estejam associados à depressão.

São muitos os sintomas de quem tem depressão. Alguns podem ter vários, outros podem sentir apenas alguns. Mas, talvez o mais comum seja a indiferença repentina. “Eu me sentia constantemente triste e desmotivado, e até mesmo as atividades que costumavam me trazer alegria não pareciam mais ter significado”, diz um paciente que relutou a usar antidepressivos.

Além do estigma que as doenças mentais carregam, com o medicamento acontece o mesmo. Pacientes têm medo de usar pela disseminação de informações erradas, acreditando que um medicamento diário e que atinja seus neurotransmissores pode mudar sua personalidade: “No início, tomar antidepressivos foi um desafio. Lembro-me de sentir preocupação sobre os efeitos colaterais possíveis e sobre como isso poderia afetar minha identidade”. Não há comprovação científica de que os efeitos colaterais da medicação podem alterar a personalidade de um ser humano.

Outro ponto levantado por pacientes que necessitam dos antidepressivos, é o medo de parecer “fraco” perante a sociedade, como se eles tivessem perdido uma batalha para a própria mente: “É como se fosse um exagero o uso de medicamento, algo psicologicamente ruim, que fosse tirar a realidade do paciente, tirar a limpeza. Usar medicamentos parece fraqueza”, relata a psicóloga Cinthia Souza.

Além do preconceito social para com o uso de medicamentos contínuos, há também quem use os antidepressivos na esperança de que ele, sozinho, vá resolver todos os problemas do paciente: “A medicação destina-se a modular as sensações, mas se a causa do problema segue ativa, o efeito será sempre passageiro. Isso sem falar nos efeitos colaterais. É como você tomar um analgésico, e porque a febre fica controlada, achar que a infecção vai desaparecer. A psicoterapia apoia e provoca mudanças, estas sim, capazes de curar definitivamente os sintomas”, completa a Dra Ana Luiza Ferreira, psiquiatra residente em São Paulo.

Em conversa informal com outra paciente em estado depressivo, ela conta que por acreditar que o antidepressivo por si só resolveria seus problemas, quase desacreditou do tratamento psicológico: “Eu estava convencida de que os antidepressivos eram a solução mágica para todos os obstáculos que enfrentei, no entanto, à medida que os meses passaram, percebi que minha vida não estava se transformando da maneira que eu esperava”, disse ela.

Bloquear canais de recaptação dos neurotransmissores para que eles não voltem ao neurônio que os secretou para a fenda sináptica, que é como agem os antidepressivos, apenas proporcionam a remissão completa dos sintomas, isto é, mantêm a depressão controlada.“Foi nesse momento que minha terapeuta me fez perceber que os antidepressivos eram apenas uma parte do tratamento. Eles eram uma ferramenta valiosa para estabilizar meu humor, mas eu precisava abordar os aspectos fundamentais da minha vida que estavam contribuindo para minha depressão”, seguiu relatando a paciente.

“Com o apoio da terapia, comecei a trabalhar nas áreas problemáticas da minha vida, buscando soluções práticas para meus problemas financeiros e aprendendo habilidades de enfrentamento para lidar com o estresse no trabalho. Gradualmente, percebi que a combinação de tratamento medicamentoso e terapia era o caminho certo para minha recuperação”, finalizou ela.

Podemos dizer que a psiquiatria se iniciou no final do século 18, quando o médico francês Philippe Pinel começou a classificar os doentes separando o que seria um desvio social de uma enfermidade mental. Ele passou a criar uma linguagem que configuraria a nova especialidade da Medicina. Mesmo com centenas de anos de  desenvolvimento e pesquisas, ainda há muita desinformação e discriminação social com as doenças psicológicas, o que atrasa o diagnóstico e tratamento de muitos, perpetuando um sofrimento desnecessário.  A educação e a compreensão são fundamentais para romper esse ciclo prejudicial e proporcionar às pessoas que sofrem com a depressão o apoio necessário para uma recuperação completa e sustentável.

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Os jogos de azar se tornaram um vício recorrente entre os que utilizam esse meio
por
Cristian Buono
Matheus Pogiolli
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02/10/2023 - 12h

Por Matheus Pogiolli (texto) e Cristian Buono (audiovisual)

 

Frequentador do “bar do Pica-Pau”, em São Paulo, Moisés, um homem de 57 anos costuma apostar nas máquinas enquanto joga partidas de sinuca. Ele diz que não pensa em parar de jogar, já que costuma apostar pouco dinheiro e fica satisfeito com o lucro recebido, ainda que pequeno. “Sorte” essa que os amigos do mesmo não possuem, já que muitos apostam o salário nos jogos de azar presentes no bar. Para Moisés, o vício começa na curiosidade.

Segundo o dicionário Aurélio, a definição de vício é "tornar mau, pior, corrompido ou estragado; alterar para enganar; corromper-se, perverter-se, depravar-se". A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o vício como uma doença de impactos físicos e psicoemocionais. Para muitas pessoas, não é algo que possa ser definido ou explicado, mas sim uma necessidade, algo sobre o qual não se tem controle. É sempre uma forma de compensação ou até mesmo a busca de um falso prazer imediato.


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Foto: Reprodução / Internet

 


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As apostas acontecem todos os dias...


Como pensar em parar...


Para Patrícia Pilan, 29 anos, psicóloga, esse comportamento diz muito sobre a necessidade da busca de prazeres, pois, segundo explica, nosso cérebro sempre buscará ter algum tipo de compensação mediante a esforços realizados e, quando isso não acontece de forma equilibrada, natural e saudável, o indivíduo passa a buscar isso em atividades que estimularão esse prazer, seja de forma induzida, através do uso de drogas lícitas ou ilícitas, ou através de atividades que ativam no cérebro o circuito de recompensa e liberam dopamina, gerando sensação de bem estar e prazer.

Uma rotina desequilibrada, a ausência de gestão emocional e a falsa promessa de um ganho rápido financeiro, no geral, são os grandes estimulantes para que uma pessoa entre no vício e permaneça nele. Assim, o que era de vez em quando apenas, acaba se tornando uma necessidade e a atividade causadora do vício vira o tema central da vida do indivíduo. Sobretudo quando se trata de apostas em tempo real.

Com o avanço tecnológico e as incertezas financeiras que tomaram conta de muitas famílias durante e pós-pandemia, os jogos de azar chegaram com mais força nas plataformas online

 

Foto: Reprodução / Internet

Mesmo com a grande frequência de pessoas em bares ou locais de apostas, a Internet também fez com que muitas pessoas se viciassem nesse âmbito sem ter que sair de casa: Um dos tópicos mais presentes no momento, são as apostas esportivas. Para Santa Fé, Beatriz e Arthur, assim como Moisés, o problema foi a curiosidade. Ela fez com que todos eles ficassem viciados em apostar, não importa qual fosse o esporte/tópico.

Com Santa Fé, de apenas 22 anos, o ponto inicial do vício foi apostar em equipes desconhecidas no futebol, puramente com o intuito de lucrar, não importa se com uma análise ou não. Segundo o mesmo, o vício foi aflorado por observar outros amigos ganhando muito dinheiro com apostas. Ele fala, inclusive, que se “emocionou” com os pequenos ganhos, fazendo que o "sarrafo aumentasse" e, consequentemente, ele perdesse dinheiro com tentativas mais ousadas. 


Como tudo começou...


Quanto tudo se aflorou...

 
Foto: Reprodução / Internet

Indo em direção do que disse Santa Fé, Arthur, de 23 anos, confirmou que a emoção por ganhar no começo, fez com que a vontade de apostar mais, aumentasse. Facilidade. Essa foi a palavra definida por ele. Isso porque com a evolução tecnológica, a facilidade em apostar aumentou. Arthur diz que, além de futebol, apostas em basquete, tênis e até mesmo corrida de cavalos se tornou recorrente, aumentando seu vício compulsivo em jogar esses tipos de jogos. 


Facilidade em apostar...


Para Beatriz, de 23 anos, a facilidade também definiu o vício. Sem tanto tempo para análises, a mesma se viu em "grupos de sinais", feitos por diversas pessoas que vendem seu trabalho de mentoria nas apostas esportivas, a fim de trazer diversas pessoas para seus grupos. Por conta desse caminho, aumentou seu tempo de apostas, sem sequer saber no que estava injetando seu dinheiro. O ponto de certeza no vício foi a falta de atenção com outras situações do cotidiano, como trabalhar, estudar ou dormir, por exemplo. 


Quando percebeu que estava viciada...


Facilidade em apostar...


Patrícia explica que a vivência do período pandêmico, o agravamento das incertezas financeiras, juntamente com o aumento do uso da Internet e da divulgação de tais jogos de atividades, aliados com o fácil acesso às formas de jogos que prometem um ganho após a sua utilização, aumentou a busca das pessoas por tais atividades. Hoje vê-se o uso sendo estimulado até mesmo em propagandas de TV aberta, induzindo o indivíduo, mesmo que seja por mera curiosidade, a buscar por esses aplicativos e, o que era para ser apenas uma diversão momentânea, torna-se um problema. 

Um ponto comum a ser ressaltado entre todos é a busca de um ganho financeiro fácil em um curto espaço de tempo, ademais, o indivíduo com a falsa ideia de perpetuar seus primeiros ganhos, os que muitas vezes são permitidos e estimulados por esses sistemas de apostas, e a busca por mais, acaba por convencer-se com a ideia errada de que, se prolongar sua permanência em tais aplicativos ou locais que possuem instrumentos de apostas, conseguirão mais ou, pelo menos, recuperar o dinheiro perdido.

Foto: Reprodução / Internet

Isso também pode ser explicado de forma neurológica, visto que, em sua maioria, seja em ambientes físicos e virtuais, esses sistemas de apostas utilizam de estímulos cerebrais como músicas, atividades, imagens, entre outros, que manterão a pessoa cada vez mais fixada naquela atividade, fazendo com que a mesma perca não só o dinheiro, mas parte de seu tempo ali. Assim sendo, outras atividades da vida desses indivíduos começam a serem afetadas e é assim que o impacto do vício começa a ser sentido por quem o vive. É importante ressaltar que o vício, em sua maioria, é gerado por algum desequilíbrio vivido pela pessoa e não identificado, muito menos, tratado por ela, seja ele emocional ou financeiro, o que acarreta e contribui para que essa falsa compensação financeira e ideia de realização, prenda cada vez mais o indivíduo nisso.  No geral, esses aplicativos e ambientes de apostas, colocam essa atividade como uma “mera” tentativa, ou algo banal, mascarando o grande problema que eles têm gerado na vida de muitos indivíduos e famílias. 


Afim de buscar se desprender do vício, Moisés, Santa Fé, Arthur e Beatriz definem sua fase final no “mundo dos jogos”, como em uma palavra. 


Moisés, diz que continua, tendo em vista o baixo risco financeiro que impõe nos caça-níqueis. Perseverança.


Santa Fé diz que saiu dos jogos de azar por observar que mais perdia do que ganhava. Consciência.


Arthur relata que não conseguia, por muitas vezes, pagar contas. As apostas estavam complicando sua vida financeira. Complicações. 


Beatriz descreve que perdeu tempo com família e amigos, além de citar a perda de dinheiro.


Patrícia Pilan ressalta o fato de os indivíduos não conseguiram reconhecer que tais atividades são danosas até que elas comecem a gerar impactos nocivos que, em sua maioria, são no âmbito financeiro. É necessário alertar que o primeiro passo para o tratamento do vício é que o indivíduo reconheça que há um problema e que o discurso “eu paro quando quiser”, não é a realidade vivida pelo mesmo, visto que a intensidade do acesso aos aplicativos e ambientes de apostas aumenta de forma gradativa e rápida. Ademais, quando os assuntos são apostas online, os aplicativos seja através de aumento das promessas de ganhos e, alertas enviados aos usuários com falsos créditos para as apostas. 

Uma vez que esse problema passa a ser enfrentado pela pessoa, cabe ressaltar que ele jamais será vencido de forma solitária e não passará de um dia para o outro, discurso esse muito utilizado pelos que vivenciam tais problemas. Se não buscar a ajuda de um profissional competente, a chance dele voltar para o vício é significativa. 

O vício entra como uma forma de compensação e, na primeira dificuldade vivida pelo indivíduo, qualquer que seja ela, a tendência do mesmo a buscar aquela fonte de “prazer” novamente é altíssima, fazendo com que ele volte para os mesmos problemas vividos anteriormente. Com o auxílio de um profissional, a pessoa será devidamente instruída e capacitada lidar com todos os gatilhos que a fizeram e fazem buscar por esses programas de apostas e, assim, possa eliminar os mesmos e a pessoa volte a ter uma vida saudável e equilibrada. 

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Tema passou a ser mais abrangido nos últimos anos
por
Gabriel Dalto Borelli
|
18/09/2023 - 12h

A saúde mental é algo que passou a ter maior valorização e tratamento especial nos últimos anos, envolvendo maior procura de especialistas na área, juntamente com a busca por conhecimento e compreensão de transtornos. Com isso, causas relacionadas ao assunto foram escancaradas com a crescente do interesse popular.

Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a definição de saúde mental se concentra em ser um estado de bem-estar no qual o indivíduo realiza suas próprias habilidades, é capaz de lidar com o estresse normal da vida, pode trabalhar de forma produtiva e frutífera e é capaz de fazer uma contribuição para a sua comunidade. A partir disso, se têm os transtornos mentais, algo que é entrelaçado com a saúde mental, porém se trata de um aspecto “distinto” do ser-humano; são condições clínicas diagnosticadas que afetam o funcionamento psicológico, emocional e comportamental de uma pessoa. Alguns exemplos incluem depressão, ansiedade, esquizofrenia, transtorno bipolar, transtorno obsessivo-compulsivo, entre outros. Esses diagnósticos são caracterizados por sintomas específicos que podem causar sofrimento, disfunção e impactar negativamente a qualidade de vida de um indivíduo, geralmente requerendo intervenção médica.

Desde o surgimento da última pandemia de Covid-19, no Brasil, houve uma maior tendência de busca por saúde mental e o que a abrange. Segundo pesquisa realizada com dados provenientes da plataforma “Psicologia Viva”, entre junho de 2020 até o mesmo mês em 2021, foram feitos aproximadamente 925 mil agendamentos de consultas psicológicas, sendo que, dentre esses atendimentos o tema mais abordado foi o de ansiedade, com índice de procura acima de 20%. Além disso, também foram objeto de acompanhamento a depressão, com 6,5%; desenvolvimento pessoal (4,93%); psicologia clínica (3,27%) e finalmente, saúde mental de uma maneira geral fecha o ranking dos 5 tópicos mais buscados entre todas as idades.

Mesmo com a evidente valorização de temas relacionados ao bem-estar mental, ainda há um tabu quanto a esse assunto, e uma “omissão” por parte de chefes de estado e sociedade. Isso se dá devido ao tratamento para buscar compreender o funcionamento da mente humana, e o que a engloba além dos prós e contras que existem no processo. Um desses fatores que abrangem essa omissão, é o fator preconceito, que encara transtornos mentais, por exemplo, como algo “bobo”, ou até mesmo de “insano”, e que merece tratamento manicomial, um jeito de conduzir situações que se tornou ultrapassado. Uma alternativa no tratamento de situações como a de transtornos, é a realocação de indivíduos com diagnósticos do gênero que passaram a morar em ambientes onde a pessoa é tratada de forma mais humanizada, em que se busca compreender o lado emocional e as vontades do paciente. Esse ambiente é o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), órgão erguido pelo governo brasileiro que tem como objetivo substituir hospitais psiquiátricos - antes manicômios e hospícios - e vem sucedendo na missão, algo que era previsto desde a reforma psiquiátrica no Brasil, realizada no fim da década de 80.

Mayara Maria Bermonte Rocha, 24, acompanhante comunitária em residências assistidas em São Paulo, relata satisfação com todo trabalho imposto pelo governo e CAPS: “As questões de medicamento, auxílio, tratamento com moradores e PTS’s (Projeto Terapêutico Singular) são muito satisfatórias e positivas”. Ao ser questionada sobre eventuais melhorias que podem ser praticadas na área, Rocha, natural de São Paulo menciona: “Seria necessário um maior número de empregados nesse setor, muitas vezes ocorrem imprevistos que impossibilitam a pessoa de vir trabalhar, férias e outros fatores, e esse serviço muitas vezes exige um maior acompanhamento. Também é preciso uma maior seleção por parte do governo ao escolher pacientes para serem acompanhados em residências como a que eu trabalho, pois alguns deles não tem condições de residir nesse local, são casos diferentes que requerem outro tipo de local assistido para essas pessoas”.

No Brasil, os direitos humanos das pessoas com transtornos mentais são protegidos pela Lei da Reforma Psiquiátrica, divulgada em 2001 e expressa como Lei nº10.261. O estatuto prevê um avanço significativo na proteção dos direitos humanos das pessoas com tais diagnósticos, e regula uma nova norma de tratamento à época; “Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”.

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.

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Ivo Vilela nunca foi assaltado no bairro da zona sul de SP, exaltado nas músicas dos Racionais MC´s
por
Livia Machado Vilela
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22/06/2023 - 12h

“Eu nunca fui assaltado no Capão Redondo, em quase 20 anos. A lama e o tomar tiro que eles diziam, sempre foi por parte dos fascistas”. Ivo Vilela (60), hoje dono de um laboratório ótico, conta a perspectiva de alguém que sobreviveu na periferia por 18 anos como um trabalhador sem a arte como válvula de escape.

Em Novembro de 2022 estreou a produção da Netflix “Racionais: Das ruas de São Paulo para o mundo”,
que conta a historia dos 30 anos do grupo de rap Racionais MC’s. No documentário, os integrantes
relembram a vida difícil no Capão Redondo, na Zona Sul da capital. “O Capão não tinha nada para oferecer
nessa época. A não ser lama e tomar tiro”, disse Mano Brown.

Como exemplo, Ivo lembrou a história de ‘Macaquinho’, que era como um ‘Robbin Wood’, roubava do
rico e ajudava o pobre. Estava sempre nos bailes, tomando Whiskey e ouvindo Al Green. Depois, o
noticiário anunciou que o Macaquinho, ladrão de banco, foi executado pela polícia. “Ninguém tinha medo do macaquinho dançando blues no baile, todos temiam ir embora e encontrar a ROTA no caminho de casa. Eu
conheci um ex-policial da ROTA, ele mesmo dizia que eram treinados para matar. Paravam algum jovem
voltando de uma festa, entregavam uma arma na sua mão e falavam: ‘ Você tem uma chance, troca tiro com
a gente pra ver se escapa’. Mas não tinha chance nenhuma. E isso tudo saía no dia seguinte no jornal com outra narrativa.”


Em um momento do filme Mano Brown relata: “A gente pegava o ônibus e demorava uma hora e meia pra
chegar até o centro. Era uma viagem quase espiritual, mano. Você saía da condição de miséria pra ir pra
onde todas as luzes tão acesas.” Ivo, que sempre trabalhou no centro de São Paulo, acrescenta: “É natural, você sentia que estava em outro mundo. Ele era músico e eu era um trabalhador mas nós sentíamos a mesma pobreza. Mas a galeria do rock era ponto de música, quem curtia era músico.”


Seus momentos de lazer não eram no centro, mas de volta à periferia, jogando futebol. “Eu não tinha
ambição nenhuma naquela época, meu prazer era ir pra várzea de final de semana jogar bola.” Explica que o dono de uma granja recrutava os melhores jogadores da periferia e realizavam torneios entre os bairros. Era
tudo pelo conforto que ele oferecia, algumas laranjas, o transporte, a chuteira que era providenciada.
Em conversa filmada para o documentário, o grupo dizia que não sabia de onde veio a consciência política
para compor suas letras. “Eles simplesmente cantavam o que eles viam, e eles viam o que eu tô te narrando
aqui”, acrescentou Ivo. A sua própria ideologia veio apesar do Capão, a cultura da periferia na época não era
estruturada, não era ainda formadora de opinião entre os jovens. O primeiro contato com seus ideais sociais
foi o movimento das Diretas Já, mas a maior influência é a Democracia Corinthiana. “Eles tinham poder de
voto, coisa que eu com 20 e poucos anos não conhecia como cidadão ainda”.


“Ninguém convivia muito com musica, o rap ainda não era acessível para a minha geração, e quase ninguém
tinha esse senso de revolução dos Racionais”. Na verdade, Ivo, que presenciou a mesma realidade que os
Racionais MC’s não consumia sua arte. “Eles viveram na mesma época que eu vivi, a vida deles era a minha.
Eu escuto e logo penso: A história do Guina deles, é o Macaquinho que eu conheci, em cada canto do Capão
tinha um. Mas quando o sucesso deles veio, eu já era adulto, e eles estavam cantando para a nova geração. É
a partir desses jovens que as coisas foram mudando.”

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Cigarros eletrônicos e narguilés são apontados como principais causadores do aumento do tabagismo em jovens
por
José Pedro dos Santos
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19/06/2023 - 12h

Segundo o Ministério da Saúde, na última década houve um aumento na proporção total de fumantes na faixa etária de 13 a 17 anos (6,6% em 2015 para 6,8% em 2019).

Um dos causadores desse aumento no consumo de produtos a base de nicotina ocorre por conta dos cigarros eletrônicos e dos Narguilés, que por terem um gosto mais agradável, acabam levando os jovens a experimentar e gostarem, o que faz com que consumam outros produtos de nicotina, como o tabaco orgânico e o cigarro tradicional. 

Todos os produtos a base de nicotina que utilizam a fumaça como forma de entrada no corpo causam a morte e problemas de saúde, como o câncer de pulmão, boca, laringe, esôfago, estômago, pâncreas entre outros, além de doenças respiratórias obstrutivas como a bronquite crônica e o enfisema pulmonar.

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Jovem enrolando um cigarro de tabaco. autor: José Pedro dos Santos
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Jovem acendendo cigarro em evento autor: José Pedro dos Santos
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Cigarro de tabaco orgânico, seda e isqueiro. Autor: José Pedro dos Santos
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Verso de um pacote de tabaco, onde é mostrado que ele é maléfico para as pessoas. autor: José Pedro dos Santos
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Cigarro de tabaco orgânico sendo enrolado. autor: José Pedro dos Santos