Para Mércia Cristina, a ausência do celular trará um aproveitamento melhor dos conteúdos educacionais
por
Laila Santos
Tamara Ferreira
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09/06/2025 - 12h

Em 13 de janeiro deste ano, foi sancionada a lei nº 15.100/2025 pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que limita o uso de celulares em escolas das redes pública e privada. O objetivo é diminuir os impactos negativos deste aparelho, como o vício em tecnologia, a falta de concentração e os prejuízos à saúde mental dos jovens. Não está proibido portar os dispositivos eletrônicos nas classes, mas sua utilização é apenas para emergências, necessidades de saúde e atividades pedagógicas que necessitam deles. Tudo fica sempre sob supervisão do professor. Essa 'brecha' tem levado muitos alunos a tentar burlar as regras, afirma Mércia Cristina de Freitas Andrade, inspetora de alunos em uma escola da rede pública, em entrevista à AGEMT. 

Com foco em diminuir o cyberbullying, que causa dificuldades nas relações interpessoais e no desempenho escolar, além dos problemas de sono e das questões psicológicas, as instituições de ensino tiveram que definir as estratégias de implementação da lei, inclusive em recreios e intervalos entre as aulas.   

Estudante com um celular em sala de aula
Estudante com um celular em sala de aula. Foto/Agência de Notícias Yonhap

Com a dependência em inteligências artificiais (IAs) atualmente, a funcionária do Educandário comentou se notou alguma diferença na aprendizagem dos alunos com a utilização desenfreada da internet e o acesso à inteligência artificial: "O uso de celulares e a utilização da IA, de certa forma, fez com que os alunos fizessem o uso demasiado de respostas e pesquisas prontas. Dessa forma, a aprendizagem e o aprimoramento da bagagem cultural foram seriamente comprometidos", ressalta. 

São Paulo foi o primeiro estado a adotar a medida, antes mesmo da criação da lei federal. Os regulamentos mais detalhados da implementação da legislação ficaram ao cargo do CNE (Conselho Nacional de Educação), órgão consultivo do Ministério da Educação (MEC), que decidiu dar autonomia aos colégios na maneira de armazenar e lidar com os aparelhos. Para Mércia, a proibição foi uma medida tardia, mas necessária e, com isso, os estudantes poderão fazer melhor uso do tempo e se concentrar melhor nos estudos. Ela cita: “Notei uma ligeira melhora nas relações humanas. Uma atenção mais direcionada às disciplinas, mas ainda uma resistência à proibição…" 

A entrevistada: Mércia Cristina
A entrevistada: Mércia Cristina de Freitas Andrade. Foto/Arquivo Pessoal

Essa atitude reflete um relacionamento não saudável com um dispositivo que era, praticamente, parte do material escolar e que está cada vez mais presente na vida social. Quando foi proibido, causou uma onda de irritação nos jovens, relata a inspetora.   

A partir de 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) começou a reconhecer a dependência do celular e em outros meios digitais como um transtorno chamado nomofobia. Um estudo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) diz que cerca de 25% dos adolescentes brasileiros são viciados na internet. Além disso, a Opinion Box traz os dados de que 95% das crianças do país, entre 10 e 12 anos, têm acesso a pelo menos um smartphone.  Com essa medida, espera-se que a escola volte a ser um ambiente de interação, que os estudantes voltem a ter uma aprendizagem mais fluida e que desenvolvam uma relação mais equilibrada com a tecnologia. 

Apontada como uma ferramenta no combate às mudanças climáticas, a nuclearização envolve questões colaterais complexas
por
Vítor Nhoatto
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30/05/2025 - 12h

O setor de energia respondeu em 2024 por 68% de toda a emissão de CO2 no mundo, segundo relatório da United Nations Environment Programme (UNEP). O gás é o principal causador do aquecimento global e precisa diminuir drasticamente nos próximos anos, apontando para a necessidade da chamada transição energética e descarbonização. Mudar a forma como se produz energia é um desafio, e a nuclearização ressurge como uma possível resposta.

A produção de energia a partir de material nuclear é antiga, e de forma simplificada funciona em algumas etapas. O combustível radioativo (urânio) tem seus átomos divididos no processo de fissão, liberando uma grande quantidade de energia que aquece a água em torno do reator e o vapor gerado acaba movimentando turbinas na usina que geram a energia. 

O que chama a atenção para a modalidade é a produção de grandes quantidades de energia com pouco material e baixa pegada de carbono em comparação aos combustíveis fósseis. De acordo com dados de 2020 da German Environment Agency levantados pela organização holandesa fundada em 1978, World Information Service on Energy (WISE), para cada Kwh gerado por usinas nucleares, cerca de 117 gramas de CO2 são emitidos. No caso do carvão e do gás natural as médias giram em torno de 950 e 440 gramas respectivamente. 

Cláudio Geraldo Schön, doutor em Ciências Naturais pela Universität de Dortmund, mestre em Engenharia Metalúrgica pela Universidade de São Paulo (USP) e professor titular na instituição destaca o potencial e a evolução nuclear com o passar dos anos. "Expandi-la poderia substituir as usinas termelétricas, diminuindo a geração de gases de efeito estufa [...] “o processo é continuamente atualizado, e resulta em avanços mesmo sendo uma tecnologia consolidada”.

Foi na extinta União Soviética que a primeira usina nuclear para uso doméstico começou a funcionar para contextualização, a Obninsk em 1954. Em seguida vieram outras, como a de Calder Hall no Reino Unido em 1956 e Shippingport nos Estados Unidos da América (EUA) em 1957. No Brasil, a usina Angra I foi a pioneira, com operações iniciadas em 1985.

Cinza e não verde

No entanto, o cinzento urânio traz um efeito não tão expressivo. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), se a capacidade de produção nuclear triplicasse, a redução na emissão de CO2 do setor de energia seria cerca de apenas 6% devido principalmente à grande quantidade de carbono liberada na construção de reatores e usinas, que exigem grandes quantidades de recursos e décadas até começarem a funcionar, e para a mineração do urânio também. 

Além disso, a pegada de carbono das principais fontes renováveis de produção de energia são bem mais baixas que a nuclear. Ainda de acordo com o levantamento de 2020 da German Environment Agency, no caso da solar, cada Kwh emite algo em torno de 30 gramas de CO2, para a eólica a cifra é inferior a 10 e para a hidrelétrica de apenas 4 aproximadamente. 

Para o especialista sênior em energia nuclear e integrante da WISE International, Jan Haverkamp, a energia nuclear não é efetiva e nem tem a emergência climática como foco. “O uso do argumento climático é uma cobertura para outros interesses [...] os países com uso tradicional de energia nuclear não a desenvolveram devido às alterações climáticas, o fator inicial foi militar como EUA, China, Rússia e Brasil. Já para outros países era um sinal de importância, como no caso da Romênia, Bulgária e Coreia do Sul. Ou ainda visando a redução da dependência do petróleo como na Alemanha e Reino Unido, ou ainda uma tentativa fracassada de desenvolver uma fonte barata de energia como na Suécia e Canadá”.

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Última usina nuclear na Alemanha começou a ser demolida em 2023, mas novo governo de extrema-direita avalia reativar a base; “resumindo, para alguns é geopolítica” comenta Jan Haverkamp - Foto: Thomas Frey / DPA / Picture Alliance

Atualmente existem 437 reatores nucleares em funcionamento no mundo, que representam 14% de toda a energia gerada no mundo, de acordo com a World Nuclear Association (WNA). Os EUA ocupam a primeira posição do ranking com 96 unidades, com França, China e Rússia em seguida com 56, 55 e 37 cada, respectivamente. O país asiático tem planos inclusive de se tornar uma potência nuclear, e até 2035 ter o dobro da capacidade atual dos EUA. 

No caso do Brasil, a geração nuclear responde por apenas 2% da matriz energética, produzidos nas usinas Angra I e Angra II. Ambas fazem parte da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, ao lado da Angra III, ainda em obras, e o complexo começou a ser construído durante a ditadura militar no país.  

Aquilino Senra Martinez, doutor em Ciências da Engenharia Nuclear pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia da Presidência da República explica as nuances da modalidade: “O seu uso para geração de eletricidade depende do contexto de cada país. Em lugares com alta demanda e poucos recursos renováveis, a sua expansão pode ser estratégica. No cenário das mudanças climáticas, ela não pode ser descartada, mas também não deve ser tratada como solução única".

Com dimensões continentais e clima tropical, o Brasil se destaca no cenário mundial justamente pelo seu potencial de produção energética renovável, e hoje é referência no quesito. O Balanço Energético Nacional (BEN) de 2024, feito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) em parceria com Ministério de Minas e Energia (MME), constatou que foi de 49% o índice de energia proveniente de fontes renováveis. 

Mesmo assim, no fim do ano passado a usina Angra I teve seu licenciamento para operação renovado por mais 20 anos pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão do Governo Federal, e demandará investimento de R$3,2 bilhões nos próximos 3 anos. A continuação das obras de Angra III seguem em análise, mesmo com a administradora das usinas, a empresa de capital misto Eletronuclear, tendo uma dívida de R$6,3 bilhões com a Caixa e o Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). 

As operações no terceiro reator foram paralisadas em 2015 e voltaram somente em 2022 após reajuste do orçamento, com 65% das obras concluídas. Isso demandou um investimento até então de R$7,8 bilhões, e apesar da conclusão não ter sido incluída no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado em 2023, estima-se cerca de R$20 bilhões necessários para tal.

Para Rárisson Sampaio, porta-voz da Frente de Transição Energética do Greenpeace Brasil, essas cifras revelam como a nuclearização desvia dinheiro necessário das fontes renováveis e ameaça um desenvolvimento sustentável e acessível. “O investimento em usinas nucleares não se conecta com a realidade do país, que poderia direcionar tais recursos para outras áreas, fortalecendo políticas como o Luz para Todos, que garante acesso a fontes de energia limpa, segura e barata, combatendo a pobreza energética e alinhando-se aos ODS da Agenda 2030”, diz Sampaio. 

Criado em 2003, o programa do Governo federal tem como intuito universalizar o acesso à energia no país, especialmente em áreas afastadas e periféricas e já impactou 17,5 milhões de pessoas. Para essa nova fase, uma das frentes é justamente possibilitar a instalação de placas solares em domicílios de baixa renda. 

Jan Haverkamp, da WISE, defende como em muitos países o investimento na energia nuclear desvia efetivamente o foco e dinheiro para medidas concretas no combate às mudanças climáticas, o que não é verídico: “As fontes de energia renováveis ​​produzem atualmente mais energia do que a nuclear em todo o mundo, e essa quantidade continua aumentando. A geração nuclear está mais ou menos estável há 3 décadas. A Finlândia, por exemplo, está atrasada na implementação de energia eólica desde que decidiu construir a usina Olkiluoto 3, que sofreu um atraso significativo”.

Segurança x planejamento

De acordo com estimativas de 2024 da Agência Internacional de Energia, a demanda energética global aumentará 4% ao ano entre 2024 e 2025, cifra bem maior que os 2,5% registrados em 2023. Os principais impulsionadores serão o maior uso de ar-condicionado devido justamente às mudanças climáticas, a progressiva eletrificação da frota de veículos, imprescindível na descarbonização do setor, e pelo avanço das Inteligências Artificiais (IA). 

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Demanda por energia pelas big techs só cresce, tal qual o uso de água potável para resfriamento dos computadores, o que aponta para uma necessidade de consciência ao usar IAs e a internet -  Foto: Microsoft / Divulgação

Os data centers deverão mais que duplicar as suas necessidades de energia até 2030 segundo a AIE, ultrapassando em alguns anos a energia consumida pelo Japão. Corroborando com esses indicativos, o Ministério de Minas e Energias realizou um estudo que aponta para um aumento de 25% na necessidade de produção energética brasileira até 2034. Nesse cenário, uma questão levantada na transição energética é a segurança e expansão necessárias para a manutenção sadia da sociedade.

Carlos Schön argumenta sobre o papel da energia nuclear, portanto, e as questões em relação ao clima: “Nós produzimos muita energia, mas ainda é pouco considerando o tamanho do país [...] a energia nuclear é a principal aliada das fontes renováveis, justamente porque essas dependem de fatores extrínsecos (sol na geração fotovoltaica, vento na geração eólica) que por sua própria natureza são flutuantes”.

Uma vez extraído do solo, o urânio pode abastecer por décadas uma usina nuclear, as quais em média podem funcionar por 40 anos, com a possibilidade de extensão, como no caso de Angra I, em funcionamento desde 1985 e renovada até 2044. Tudo isso acontece também sem depender de fatores externos como o vento, que pode danificar as hélices das turbinas eólicas, as nuvens que afetam a produção solar e a variação dos reservatórios que impactam as hidrelétricas. 

Contudo, Ana Fabiola Leite Almeida, professora do Departamento de Engenharia Mecânica e Produção da Universidade Federal do Ceará (UFC) e Mestre em Química pela instituição, destaca que o problema reside no planejamento energético. Mesmo que a produção diminua, é algo manejável com vontade. “O risco não está nas renováveis em si, mas na falta de planejamento. Em cenários críticos, pode haver queda média de 20 a 40% na produção energética dependendo da região, mas com previsibilidade climática, diversificação geográfica e sistemas híbridos conseguimos mitigar esses efeitos”, explica Almeida.

Em períodos como de ondas de calor em que a demanda energética aumenta, fontes como as termelétricas passam a ter maior participação na produção de energia, e como são mais caras que as hidrelétricas, a conta de luz pressiona o bolso da população. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no acumulado de 2023 o aumento na tarifa foi de 9,52%, bem acima da inflação, de 4,62% no mesmo período. 

Relatório de 2024 do Tribunal de Contas da União (TCU) em parceria com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Empresa de Pesquisa Energética aponta que a nuclearização não resolveria justamente essa questão. A energia nuclear produzida em Angra III aumentará em 2,9% a conta de luz por ano e custará à população até 77 bilhões em despesas na contratação se a obra for concluída.

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“Existe todo um investimento que pode ser perdido, mas não justifica a continuidade de Angra III. É o resultado do  mal planejamento e desalinhamento com a política energética aponta Rarisson do Greenpeace - Foto: Eletrobras / Divulgação

O mesmo estudo do TCU destaca que as despesas com a obra “parada” chegam a R$2 bilhões por ano e uma desistência definitiva custaria cerca de R$13 bilhões, menos que o montante necessário para conclusão. Países como Áustria, Portugal e Dinamarca não classificam a energia nuclear como uma fonte limpa, e Itália e mais recentemente Alemanha, desativaram seus reatores ainda em funcionamento.

No caso do Brasil em relação ao setor de energias, as renováveis se destacam em várias frentes. Segundo o “Atlas Eólico” de 2022 do governo do Espírito Santo em parceria com a Embaixada Alemã, o potencial de geração pelo vento somente no estado é de 160 GWh, quase um terço da demanda anual do país hoje.

A energia solar também é outro enorme potencial, levando em consideração que o Brasil é o país que mais recebe irradiação solar no mundo, até então desperdiçado. Em 2023 a companhia de consultoria BloombergNEF apontou que se as políticas de incentivo à modalidade permanecerem iguais, em 2050 a capacidade de geração será de 121 GW por ano. Na ocasião, o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar (Absolar), Ronaldo Koloszuk, defendeu que isso pode acontecer ainda em 2040 com apoio e expansão do setor. 

Ana Fabiola destaca: "O Brasil tem um dos maiores potenciais renováveis do mundo, mas para isso precisamos investir em inovação, infraestrutura de rede, armazenamento e educação técnica [...] é preciso ter suporte de armazenamento, interligação entre regiões e tecnologias de resposta à demanda. As fontes renováveis podem sim suprir a demanda crescente se houver vontade política e investimento contínuo", afirma. 

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Maior parque solar do mundo fica em Minas Gerais e foi inaugurado em 2023, fazendo com que a capacidade do estado chegue a 8 GW por ano - Foto: Solatio / Divulgação

Potencial radioativo denso

Falando em demandas futuras e recursos para sanar problemas sem gerar mais, uma outra implicação da energia nuclear gira em torno dos resíduos perigosos da atividade. A World Nuclear Association aponta que o resíduo nuclear equivalente à demanda de uma pessoa por um ano é do tamanho de um tijolo. Pode não parecer tanto de início, mas o problema está na radioatividade do material. 

A meia vida do urânio 235, o tempo que o material leva para se desintegrar e deixar de ser extremamente radioativo, gira em torno de 700 milhões de anos. Durante esse tempo as substâncias líquidas e sólidas precisam ficar armazenadas e isoladas do mundo, seja em reservatórios subterrâneos, piscinas gigantes ou toneis de chumbo. Não existe hoje uma solução para esse material, e como os primeiros usos são do século passado apenas, respostas sobre o comportamento dele também não foram encontradas. 

Isso em si já acende um alerta pois relega uma questão das gerações passadas às futuras, e a possível fuga de material radioativo das usinas pode colocar em risco a segurança nacional com a produção de bombas. Mas olhando para a história mais uma vez, a situação se complica. Em 1986 ocorreu na atual Ucrânia o famigerado desastre nuclear de Chernobyl, zona até hoje inabitável. A explosão da usina contaminou uma área de milhares de quilômetros ao seu redor, causou milhares de mortes e adoeceu os que resistiram. Um caso mais recente foi em Fukushima no Japão em 2011, que apesar de menor e diferente, reforça o cuidado exigido. 

Aquilino Senra afirma que a questão é muito relevante no debate atual, mas avanços foram feitos e que não deve ser a única levada em consideração: “É essencial que seja considerado dentro de um contexto histórico e tecnológico, à luz dos avanços obtidos nas décadas subsequentes e da comparação com outras fontes de geração de energia, como as fontes fósseis, que também provocam milhares de mortes anuais em decorrência da poluição atmosférica”.

A Organização das Nações Unidas estima que por ano a poluição atmosférica mata entre 7 e 8 milhões de pessoas ao redor do mundo. Somente no ano de 2021, 8,1 milhões de pessoas morreram, além do fator contribuir decisivamente para o desenvolvimento de câncer de pulmão e doenças respiratórias. 

Fazendas de turbinas eólicas, sítios de placas solares e usinas hidrelétricas também estão sujeitas a acidentes e impactam o meio ambiente, mas em um grau muito menor. Além dos grandes desastres, existe a possibilidade de vazamento de material radioativo. No Brasil, por exemplo, a Comissão Nacional de Energia Nuclear constatou um caso em 2022 na unidade de Angra I, no qual a água contaminada chegou ao mar. Na ocasião, a Eletronuclear foi multada em mais de R$2 milhões de reais pelo órgão

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ONG fez protestos em frente a usina de Angra I e relembrou o desejo ilegal de milhões de litros de água contaminada pela usina em 1986 - Foto: Greenpeace Brasil / Divulgação

Rárisson do Greenpeace destaca: “a energia nuclear não tem lugar em um futuro seguro, limpo e sustentável. A energia nuclear é cara e perigosa. Apesar de oferecer energia não intermitente, há outras soluções no país que podem ser mais eficientes, seguras e baratas [...] só porque a poluição nuclear é invisível não significa que seja limpa, nessa conta toda, a energia nuclear é inexpressiva”.

Mesmo assim, nos últimos anos empresas e nomes do vale do silício floresceram no cenário da nuclearização em defesa dos chamados Small Modular Reactors (SMR), em tradução livre, pequenos reatores modulares. Segundo a Agência Internacional de Energia, as unidades menores podem ser uma solução para a demanda crescente por energia dos data centers, e por serem menores, construídos em uma fábrica e depois enviados ao local de destino, podem baratear os custos.

Com um tempo de construção diminuído para cerca de 5 anos em comparação aos reatores convencionais e cinco vezes menores em tamanho, o primeiro SMR instalado no mundo data de 2023 na China, o Linglong One. A capacidade do reator será de 1 GW quando entrar em operação regular segundo a Corporação Nacional de Energia Nuclear da China. Mesmo assim, de acordo um estudo independente da Universidade de Stanford que avaliou os dados preliminares da empresa norte-americana NuScale Power, mais lixo radiativo é gerado e há maior dispersão de energia no interior dos SMRs.

Os principais projetos na área ainda vão levar tempo também, com expectativa de começarem a operar em meados da próxima década apenas, como o da britânica Rolls Royce. Ainda existe a startup de Bill Gates, Terra Power, com expectativa que o seu reator em Wyoming, o estado menos populoso do país, entre em operação no começo de 2030. No entanto, nessa data as emissões de CO2 na atmosfera já deverão ter caído 42% para que o aquecimento fique em 1,5 graus celsius de acordo com o relatório de 2024 da United Nations Environment Programme.

 “Não é surpresa que tecno-oligarcas como Gates, Musk, Zuckerberg e Bezos sejam especialmente atraídos pelas ideias por trás de pequenos reatores nucleares modulares. Mas eles não percebem que essas tecnologias são fundamentalmente diferentes da internet ou mesmo das estruturas de energia renovável, incluindo armazenamento, com custos mais elevados em comparação com sistemas totalmente renováveis, tempos de desenvolvimento muito mais longos e sérios riscos”, alerta Jan Haverkamp da WISE International.

Esclarecendo dúvidas sobre os riscos em uma conversa com Luiz Padulla
por
Clara Dell'Armelina
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05/05/2025 - 12h

O mundo está farto de plástico. Estão presentes em utensílios, móveis, roupas e, agora, também nos alimentos, mas não para por aí, estudos recentes, como o feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), comprovam a existência de plástico acumulado no corpo humano. Estamos falando de microplásticos, pequenas partículas de plástico com dimensões inferiores a 5 milímetros causadoras de danos tóxicos aos seres vivos. 

A presença de plástico nos oceanos foi detectada pela primeira vez na década de 70 e só em 2004, com o pesquisador Richard Thompson, que tivemos o conhecimento dos "microplásticos". Entre 2010 e 2020 foi quando  identificaram a presença de microplástico em toda a cadeia alimentar, mas só a partir de 2023 que as pesquisas se voltaram para mapear seus impactos na saúde humana. O professor, biólogo, doutor e autor do blog "Biólogo Socialista", Luiz Fernando Padulla, conversa sobre o assunto com a repórter da AGEMT. Confira!

Pressão do governo Trump sobre instituições de ensino provoca medo sobre fuga de cientistas
por
João Paulo Moura
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05/05/2025 - 12h

Instabilidade é um rótulo que nenhuma nação deseja carregar. Seja na economia ou na educação, viver em um lugar de incertezas gera apreensão a todos. E, embora Donald Trump tenha recém completado 100 dias no cargo de presidente, graças às medidas adotadas, os cientistas se encontram em um mar de insegurança nunca vivido nestas últimas décadas. Columbia, Princeton e a Universidade da Pensilvânia sofreram com os cortes e ameaças de Donald Trump. Columbia teve US$ 400 milhões em subsídios federais suspensos devido à casos de assédio a estudantes judeus. Harvard foi uma das universidades que negou as demandas da Casa Branca.

Em consequência, no dia 14 de março, o Departamento de Educação anunciou o congelamento de US$ 2,3 bilhões em subsídios para a instituição. "Uma das grandes vantagens comparativas que os EUA tinha era sua capacidade de atração e fixação de cérebros de pesquisadores de outros países, principalmente do Sul Geopolítico”, diz Cristina Pecequilo, doutora em ciência política pela USP e professora de relações internacionais da UNIFESP. Assim, se os EUA deixarem de ser atrativos, os pesquisadores se moverão a outras nações, e com isso haverá uma perda de conhecimento de ponta”, ressalta Pecequilo em entrevista à AGEMT.    

As ações tomadas pelo governo Trump provocaram um temor generalizado entre os cientistas com medo de uma possível fuga de cérebros. O termo se refere ao processo de migração de pesquisadores, cientistas e profissionais altamente qualificados. Em pesquisa realizada pela revista Nature, dos 2000 pesquisadores consultados no levantamento, 75% consideram sair do país nos próximos anos. Desde que assumiu a presidência dos Estados Unidos no dia 20 de janeiro e, em seu primeiro dia de mandato, revogou 78 ordens executivas do governo anterior, retirou o país da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do acordo de Paris. Durante os três meses seguintes, as ações tomadas pelo governo se intensificaram, principalmente no setor econômico.  

Donald Trump segurando decreto no salão oval da casa branca
Donald Trump exibe decreto assinado no dia 20 de janeiro. Foto: Anna Moneymaker/Getty Images 

No dia 2 de abril, intitulado pelos republicanos como o “dia da libertação”, iniciou-se uma guerra comercial entre os EUA e o mundo. Com a meta de corrigir o déficit comercial internacional do país, o governo norte-americano impôs taxas a 185 países. As altas porcentagens geraram respostas das nações, principalmente por parte da China que revidou com um grande pacote de alíquotas sobre as commodities americanas. Mas as medidas não pararam somente no setor econômico. Dentro das universidades do país, o temor do corte de financiamento e da fiscalização do conteúdo dos cursos aumentou.

A tensão entre o governo Trump e as instituições de ensino superior se elevou a partir do mês de março. Investigações de programas de diversidade e inclusão foram abertas em 45 universidades, com exigências sobre a auditoria de conteúdos e as condutas de alunos em favor da Palestina. Em resposta a esse cenário, instituições e países ao redor do mundo começaram a se movimentar para atrair os cientistas que se encontram nos EUA. A Universidade de Aix-Marselha, localizada na França, lançou uma iniciativa chamada Safe Place for Science, que investirá 15 milhões de euros para apoiar 15 pesquisadores. A União Europeia lançou a campanha Choose Europe for Science, como um refúgio para a liberdade acadêmica. Bélgica, Holanda e países nórdicos vêm oferecendo bolsas e infraestrutura de ponta para pesquisadores norte-americanos. 

Além das universidades europeias, China e Índia se consolidam como potenciais concorrentes dos pesquisadores estadunidenses. “Eu destacaria a China como uma potencial concorrente, até porque basta lembrar que todos estes outros países, principalmente a França tem problemas com forças políticas conservadoras anticiência. Além dela, mencionaria igualmente a Índia, que tem investido pesadamente em ciência e tecnologia”, completa Pecequilo. 

Nos últimos anos, a China despontou como a líder mundial em número de artigos científicos publicados. Segundo Ministério de Ciência e Tecnologia da China, em 2024, o país destinou mais de US$ 496 bilhões para pesquisa e desenvolvimento. Esse valor corresponde a 2,68% do Produto Interno Bruto (PIB) chinês, sendo o segundo maior investidor mundial em pesquisas, atrás apenas dos Estados Unidos. 

A Índia também tem se destacado como uma potência emergente em ciência e tecnologia, apesar de ainda apresentar desafios estruturais. O país investe 0,64% de seu PIB em pesquisa e desenvolvimento. Entretanto, esse investimento tem crescido de forma constante, dobrando na última década. O governo indiano é o principal financiador, respondendo por mais da metade do total, com destaque para agências como o DRDO (Defesa), o Departamento de Espaço e o Departamento de Energia Atômica. 

Apesar das incertezas internas e das ameaças que pairam sobre o sistema científico dos Estados Unidos, a ciência mundial está encontrando novos centros. Essa reconfiguração global do conhecimento pode redefinir o papel dos EUA como epicentro da inovação e da produção científica.

Documentário I’m Not a Robot instiga o telespectador a refletir sobre a evolução das máquinas
por
Vítor Nhoatto
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08/04/2025 - 12h

Não sou um robô, uma etapa de checagem comum ao navegar na internet e uma sentença obviamente verdadeira, ou talvez não. O curta-metragem de co-produção holandesa e belga de mesmo nome, problematiza o chamado teste Captcha, quando a protagonista Lara (Ellen Parren, produtora musical, entra em uma crise existencial ao não conseguir provar sua humanidade.

Logo de cara o enredo de Victoria Warmerdam, também diretora da obra,  pode parecer apenas cômico, e a interpretação de Parren colabora para essa atmosfera. Os diálogos curtos e a indignação diante de uma suposta certeza de Lara prendem a atenção do telespectador ao fazer com que haja identificação com a situação. Provavelmente todos nós já erramos um destes testes simples em algum momento.

A história com pouco mais de 20 minutos continua com a indicação que a personagem tem a chance de ser 87% um robô, segundo um quiz online, e a essência incômoda da ficção científica começa a reluzir. Conversas entre humano e máquina existem há cerca de 60 anos, com a criação do chatbot Eliza, e com o avançar dos anos é cada vez mais comum, de fato.

Seja aquele número para marcar consultas ou o serviço de atendimento ao cliente das operadoras, a Inteligência Artificial rodeia as esferas da vida cotidiana e vem evoluindo rapidamente. Tome como exemplo o robô humanoide que já foi capa de revista e é considerada cidadã saudita, Sophia, da Hanson Robotics desenvolvido em 2015. Ou ainda os influencers virtuais com milhões de seguidores do Instagram hoje como a carismática Lu da empresa de varejo brasileira, Magazine Luiza.

Robô Sophia
Sophia foi inclusive ao Talk Show do apresentador norte-americano Jimmy Fallon - Foto: Hanson Robotics / Divulgação

Parece que a barreira entre o físico e digital, natural e artificial vem sendo quebrada, como aborda a obra de Margareth Boarini, “Dos humanos aos humanos digitais e os não humanos”, lançada em julho do ano passado pela editora Estação das Letras e Cores. O primeiro livro da doutora em tecnologias da inteligência e mestre em comunicação se aprofunda nesses casos de coexistência entre robôs e pessoas, porém, até onde se sabe as diferenças entre máquinas e humanos são perceptíveis, ainda. 

Mas como uma boa teoria de ficção científica, o documentário explora justamente um possível futuro da humanidade, em que máquinas e humanos serão indistinguíveis, A saga de Lara por respostas acaba com a revelação de que Daniël (Henry van Loon), marido da personagem, a encomendou sob medida há alguns anos, como se faz com uma roupa hoje.

Suas memórias, sentimentos e até mesmo relações com outras pessoas, ou robôs, são todas fabricadas, como uma versão muito mais avançada do robô Sophia. A comédia permeia a narrativa um tanto quanto impensável aos olhos de hoje, mas curiosa. A seriedade da executiva da empresa que fabricou Lara, Pam (Thekla Reuten) cria uma atmosfera cômica ao assunto, completada pela tranquilidade que Daniël fala sobre sua “aquisição”.

Parren entrega uma atuação que transborda indignação, e o trabalho cinematográfico é inteligente, com cortes que acompanham a visão de Lara. Sobre o ambiente que o filme se passa, todas as gravações foram no CBR Building em Bruxelas, e a ambientação feita com cores vibrantes e apenas carros de época no estacionamento propõe um contraste entre antigo e moderno, frio e robótico, quente e humano. 

O desfecho se dá com o desejo da protagonista de ser dona do próprio destino, relegando o fato de não poder morrer antes de seu “dono”. Isso pode ser visto talvez como uma negação em aceitar a única coisa que a diferencia de um humano, ou como uma mensagem da autora da obra sobre uma rebelião das máquinas.

Fato é que Lara se joga do topo do prédio, em um take muito inteligente por parte da direção ao filmar de cima, e que apesar de pesado e grotesco consegue ser engraçado e não desagradável aos olhos. Tal qual uma morte comum, há muito sangue saindo do corpo, as necessidades fisiológicas também são como de humanos, mas após alguns instantes a robô volta à vida.

Lara e Daniel em um Volkswagen Fusca azul
Com cinematografia cativante e enredo inesperado, é um Sci-Fi cômico e dramático - Foto: Indie Shorts Mag / Reprodução

Incômodo e perspicaz são boas palavras para definir a quinta produção de Warmerdam, que a fez faturar uma série de prêmios internacionais incluindo o Oscar de Melhor Curta-metragem deste ano. Sua produção também se destaca por ser carbono neutro, com o plantio de uma agrofloresta na Holanda para compensar as emissões de gás carbônico (CO2) da obra.

I’m Not a Robot está disponível de forma gratuita no YouTube desde o dia 15 de novembro de 2025 no canal The New Yorker, com legendas apenas em inglês ou holandês. Mesmo com essa barreira linguística, o choque final é inevitável, e a reflexão provavelmente também, se o seu cérebro não estiver se perguntando se você pode ser também um robô.

A história de milhões de brasileiros nasce na falta
por
Gabriela Figueiredo Rios
Victoria Leal
|
21/09/2023 - 12h

Por Gabriela Figueiredo (texto) e Victoria Leal (audiovisual)

Vento no rosto, uma pradaria em tonalidade verde queimada e muito suor. Esta era a visão de Zé Braz enquanto trabalhava na plantação com seu pai, ainda na pré-adolescência. A vida começa cedo para quem nasce na falta. Eram muitos irmãos e apenas algumas mãos para dar conta de toda a demanda da casa. Os semblantes cansados dos pais refletiam a falta de condições para manter a dignidade de uma família. Ainda mais comum do que se imagina, é dar um jeito de sobreviver à falta de emprego de carteira assinada e escolaridade do primário. O jeito foi mudar de Iapu, interior de Minas Gerais, para São Paulo, em um movimento migratório em busca da sorte, como os milhares que levantaram as estruturas e história da capital. Zé Braz está primeiro entre estes milhares.

Os bicos para arrumar dinheiro vieram antes das apostas, mas elas não deixaram de vir. Em suas próprias palavras “começou primeiro com a bebida, depois o cigarro... aí o jogo. O jogo é terrível. Eu sei que a gente não pode colocar a culpa na bebida, mas todo mundo fazia na época. Jogava truco, baralho, sempre valendo dinheiro, aí apareceram novos jogos... jogava na loteria também, fazia esses jogos de montante com os caras do bar sabe [...]. Joguei no bicho, sempre ganhava miudeza, qualquer dinheiro que entrava já era alguma coisa. Mas aí pegava e gastava no bar.”

Zé representa apenas uma pequena parcela das pessoas que tiveram problemas com apostas no Brasil. Apesar de ter experiências apenas com apostas em jogos de bares, casos semelhantes com apostas esportivas online vem se tornando algo comum na vida dos brasileiros. Tão comum, que segundo a pesquisa Industry Insights, feita pelo jornal O Globo, para 12% das pessoas que responderam, as apostas são a principal fonte de renda. Para 67% dos brasileiros, apostar hoje é entretenimento e para 43% é negócio. O risco está se tornando comum. 

As apostas esportivas online funcionam por casas de apostas, que são os modelos mais populares hoje e mais simples. As pessoas escolhem uma situação dentro de um evento esportivo e apostam nas probabilidades com maiores chances de se concretizar dentro do jogo. Seja desde o cavalo que vai disparar em primeiro em uma corrida, até a quantidade de pênaltis em uma partida de futebol. Se o resultado se concretizar, os jogadores recebem um pagamento com base nessas probabilidades.

 Em ritmo crescente no Brasil, essa modalidade já era muito comum em países europeus, que praticavam alternativas “rentáveis” para dinamizar ainda mais os jogos. Por ser uma questão emergente no País e que se acentuou ainda mais por conta da pandemia, o mundo das apostas online é a forma mais fácil de se lucrar. Desde que você não esteja do lado mais fraco da corda.

E o lado mais fraco da corda é formado pelos milhares dos quais, não só Zé Braz fez parte, mas Mateus Haidar, de 27 anos, advogado e empresário, também somou. Mas o verde que o Mateus enxergava deste lado, era o tecido da mesa de poker, que começou presencialmente, mas logo passou para o online, “em sites como pokerstars e partypoker, naquela época só existiam sites gringos. Percebi que estava viciado quando perdia rapidamente o dinheiro que recebia trabalhando para as casas”.

Segundo pesquisa do Datahub, publicada pela Máquina do Esporte, o crescimento de empresas de apostas esportivas digitais no Brasil foi de 360%, entre 2020 e 2022. E seguindo o movimento publicitário de todo novo comércio emergente, não demorou muito para que as casas começassem a patrocinar influencers, pagar por anúncios e até investissem em mídias offline - anúncios em estádios e telas espalhadas pelas cidades - para atingir seu público alvo. 

Em uma polêmica recente, no mês de junho deste ano, o youtuber e influenciador digital Felipe Neto foi questionado de continuar apoiando e divulgando a casa de cassinos e apostas “Blaze” - que fechou contrato com o comunicador em 2022 - após ser acusada de calote na Internet pelos usuários, por não pagar os clientes que obtinham lucros financeiros. Outros influenciadores de grande impacto, como a advogada Deolane Bezerra, ex-esposa do funkeiro, Mc Kevin, também faz parte do grupo de pessoas patrocinadas pela empresa. A advogada tem mais de 5 milhões de seguidores no Instagram e também recomendava a casa em suas redes sociais. 

Em declaração à Agência Mural, o diretor, André Gelfi, do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável, composto pelos grupos Bet365, Flutter, Entain, Betsson Group, Betway Group, Yolo Group, Netbet Group, KTO Group, Rei do Pitaco, Novibet, LeoVegas, Grupo OKTO e Pay4Fun, afirma que o instituto se preocupa com a proteção de menores de 18 anos na divulgação das casas de aposta que o compõe. 

O grupo desenvolveu uma nova cláusula que proíbe o direcionamento do conteúdo para menores de idade e a utilização de imagens de "pessoas ou personagens, reais ou fictícios, de relevância ou notoriedade pública que atraiam a atenção dos jovens”. Apesar da parcela significativa de casas de apostas que entendem e procuram minimizar o impacto negativo por meio da publicidade, não existe regulamentação oficial direcionada a publicidade de jogos para menores ou fiscalização de que a documentação cadastrada não seja de parentes maiores de idade, como também explicitado na reportagem da Agência Mural. 

DE OLHO NO PERIGO

Na pesquisa de perfil de apostadores do Panorama Mobile Time/Opinion Box, publicada em maio de 2023, foi identificado que o padrão médio dos jogadores é homem, jovem e de baixa renda. Na análise de faixa etária, 36% dos indivíduos no grupo de 16 a 29 anos já apostaram em plataformas de apostas esportivas e dos mais de dois mil entrevistados, 30% são das classes D e E.

O risco das apostas esportivas passa a existir no momento em que ela deixa de ser feita por entretenimento e começa a simbolizar algo vital, como a principal fonte de renda do indivíduo ou o lugar em que a fonte de renda é “investida” - que gera a sensação falsa de uma possibilidade segura de lucro. Em primeiro plano, porque as estatísticas esportivas não são baseadas em padrões fixos, mas probabilidades, como tendências históricas e estatísticas defensivas de um time, que podem variar a cada jogo. E em segundo plano, pelo aumento dos casos de manipulação de partidas de futebol, em que, segundo os dados da Sportradar, o futebol mundial registrou um aumento de 34% no número de partidas suspeitas, apenas em 2022.

Em terceiro plano, a psicóloga e analista Adriana Munford explica que o vício, ou seja, a incapacidade de deixar um padrão de lado, pela perda de autocontrole sobre a situação, é o que caracteriza a compulsão de jogadores que não conseguem deixar de apostar, mesmo depois da frustração da perda, inclusive com frequências variadas. 

 

Mas Adriana não é a única que alerta sobre os perigos de começar a apostar e transformar o jogo em uma parte essencial da vida. Mateus Haidar, depois de sobreviver às dificuldades de largar de vez o mundo das apostas, começou a criar conteúdos no TikTok e outras redes sociais para ajudar quem está endividado ou em situação extrema, correndo riscos de vida. 

“Todos os dias recebo mensagens de pessoas que estão flertando com o suicídio, fora os casos de suicídio consumados que aparecem na mídia, aparentemente o jogo patológico será um enorme problema de saúde pública muito em breve”. 

No fim, os atingidos pela expectativa da renda extra e lucro gerado pela efêmera probabilidade de ganhar algo que nunca tiveram, são os que nasceram na falta. Mais comum do que se imagina, é pensar que absolutamente nada pode nascer de uma falta, de algo que não existe. Mas foi ainda nessa vida que Zé Braz construiu a sua nova vida, antes de perder tudo. “Conheci minha ex-mulher, casamos, montamos uma casinha ali na Habitação [imóvel ofertado a pessoas de baixa renda em São Paulo] e eu segurei um pouco essa vida né [de apostas], arrumei um empreguinho registrado e comecei a pagar o INSS, mas a bebida continuou [vício], não deu pra parar não”. 

Zé Braz primeiro perdeu o amor, depois o emprego, uma parte do dinheiro, mas ficou com a casa, que era seu único abrigo, mesmo que só tivesse o físico. Mas não foi suficiente para preencher o vazio de não mais falar com a filha e dividir conselhos com alguém. Zé começou a refletir o semblante dos seus pais. “Fui e voltei pra vida do cão” o seguro desemprego virou jogo e antes de voltar para os bicos e tentar reconstruir a sua vida, fez lembranças no bar da Dona Lina. O bingo de Internet era mais fácil, bastava sacar 50 ou 100 cartelas de uma vez, com números prontos, para ver quem ganhou dessa vez. 

“Deixava todo o dinheiro do auxílio lá no bingo, na cachaça, até que não me deixaram jogar mais, a Dona Lina disse que não ia vender mais pra mim. Hoje eu vivo de bico de pintor, passo textura, grafiato e pequenos reparos, tô vivendo de aluguel porque vendi a casa na habitação e o dinheiro foi todo pra mulher, cachaça e jogo".

Entre vídeos de um minuto e jogos online como é possível encontrar o valor pedagógico no mundo digital
por
Bianca Novais
Maria Eduarda Camargo
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18/09/2023 - 12h

Por Maria Eduarda Camargo (texto) e Bianca Novais (audiovisual)

 

Para Suelma Feitosa, mãe da Sofia de 8 anos, é difícil acompanhar o conteúdo que a filha vê na Internet. Como a menina estuda na Escola do Campo, no interior de Goiás, a rotina do nascer do sol e a longa distância até a escola se tornaram motivos para que o celular entrasse na mochila, e consequentemente no ambiente familiar. Desde vídeos no Youtube até jogos online, Sofia passa o entardecer no aparelho – que serve como um funil do universo infantil. Celebridades como Luccas Neto e Julia MineGirl, que hoje possuem um público de acesso majoritariamente infantil, fazem parte do interesse da garota pelo digital. Mas, na sala de aula, a rotina é outra: desenhos, massinha e brincadeiras ao ar livre fazem mais sucesso no ambiente.  Para minimizar esses efeitos negativos estão sendo usadas muitas estratégias pedagógicas.

 

 

Thaís Oliveira é professora do ensino fundamental na rede municipal de Guarulhos, em São Paulo. Em sua rotina de ensino entram jogos, atividades e pesquisas online mas ainda faltam recursos para que as tecnologias possam entrar com funcionalidade na classe. Mesmo assim, dentro de sala, as atividades manuais e escritas ainda são um dos pilares. A professora afirma que a falta da prática da escrita fora do ambiente escolar, fruto da facilidade ao acesso da tecnologia, é um dos pontos de perda desse novo mundo. O analfabetismo digital dos pais é um dos pontos de atenção para Thaís, que também se inclui em um grupo que tem dificuldade de acompanhar os avanços tecnológicos, mas que precisou correr atrás de se atualizar durante a pandemia de Covid-19.

 

A legislação mais recente sobre o tema, a Lei Federal 14.533 de janeiro de 2023, institui a Política Nacional de Educação Digital (PNED), prevendo o desenvovlimento da inclusão digital dentro da sala de aula, com investimento em infraestrutura e capacitação de educadores. O principal objetivo é deixar os alunos, de quaisquer níveis, a par dos avanços tecnológicos e familiarizados com as ferramentas digitais atuais. Já o desafio, é encontrar o equilíbrio entre os benefícios e os malefícios da exposição às telas, que ainda não estão completamente elucidados. 

 

Whatsapp, Instagram e TikTok. Esses são, em ordem, os sites mais utilizados por crianças e adolescentes na faixa dos nove aos 17 anos, de acordo com o CGI (Comitê Gestor da Internet). Em meros três minutos – o tempo máximo de vídeo permitido em todas as redes mencionadas – crianças pesquisam conteúdos como ajuda emocional e sexual, dietas e dicas para entrar em forma e tratamento de doenças. O mundo do curto prazo chegou aos pequenos, e com ele, a metamorfose da pedagogia teve que andar.

 

 

 

A pandemia de coronavírus, que durou de 2020 a 2023, forçou uma inclusão desorganizada de tecnologia nas salas de aula, visando minimizar o impacto que as medidas de distanciamento social causaram nos jovens em idade escolar. Segundo o relatório "O abismo digital no Brasil" da PwC, de 2022, 33,9 milhões de brasileiros não têm qualquer tipo de acesso à Internet, ao passo que 81% da população com 10 anos ou mais são usuários da rede mundial de computadores. Esse recorte etário se reflete na sala de aula de Maria de Lourdes Freitas, professora de ensino infantil na rede municipal de São Paulo, capital. Apesar de haver tablets para inclusão digital dos pequenos, a professora esclarece que a função do ensino infantil é o desenvolvimento de habilidades motoras e sociais.

 

 

Apesar disso, é comum em locais públicos como restaurantes ou shoppings observar crianças pequenas vidradas em telas. A estratégia é utilizada por pais que buscam "aquietar" os filhos, muitas vezes sem se preocuparem com os efeitos a longo prazo da exposição contínua a recursos tecnológicos de consumo passivo.

 

 

Fugindo da dicotomia de malefícios e benefícios, Thaís observa que o lugar da tecnologia na educação é, hoje em dia, sobre entender a possibilidade de acesso e como as ferramentas digitais podem se tornar aliadas no processo pedagógico.

 

 

A falta de acesso às tecnologias assistivas ainda atinge 90% da população com deficiência visual. 
por
Manuela Dias
Luísa Ayres
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18/09/2023 - 12h

Por Manuela Dias (audiovisual) e Luísa Ayres (texto)

Tecnologia é o nome dado a aparelhos, sistemas e métodos criados para facilitar tarefas do cotidiano humano. Desde a pré-história, diversas delas foram desenvolvidas.  

Do machado à espaçonave, o mundo foi se reinventando e tentando contemplar cada vez mais as necessidades evolutivas e modernas da sociedade. Mas será que as ferramentas criadas até aqui foram pensadas para todos?  

Tecnologia e falsa acessibilidade 

Apesar da evolução tecnológica presenciada nos últimos séculos, que já nos proporciona trabalhar com conceitos como nanotecnologia e inteligência artificial, nem toda a população global tem tido acesso aos meios mais simples de todos esses recursos.  

Segundo dados da Oxfam (Comitê de Oxford para o Alívio da Fome), o desenvolvimento tecnológico ainda exclui metade da população mundial. Quando recortes como raça e gênero são feitos em meio a essas estatísticas, os dados são ainda mais alarmantes. Cerca de 90% das mulheres habitantes dos países mais pobres não têm acesso à internet, conforme indica a ONU (Organização das Nações Unidas). Além disso, de acordo com a pesquisa feita pela TIC Domicílios, 65% da população negra possui acesso à internet apenas através do celular.  

A disparidade vista através desses dados e da chamada “exclusão digital”, dificultam a democratização da tecnologia e de diversos outros meios importantes ao funcionamento do mundo contemporâneo. Infelizmente, pensar em uma realidade acessível tecnologicamente a todos ainda parece utópico.  A educação de milhares de crianças, sobretudo durante a última pandemia, bem como o acesso da população carente aos tratamentos e vacinas, exemplificou diversas facetas de um mesmo problema: a desigualdade social e a falta de acesso à recursos hoje, já vistos como básicos.   

Em um mundo onde ter acesso aos meios e ferramentas significa ter o poder em suas mãos, a concentração de renda e posse desta tecnologia é pensada como forma de controle e autoridade perante àqueles que delas não podem usufruir. A inclusão social sempre estará distante enquanto espaços e direitos forem negados, seja através do preconceito e discriminação ou exclusão econômica e tecnológica. 

PCD’s  

Nessa mesma perspectiva, outro recorte social se faz necessário para o desenvolvimento da crítica ao ilusório conceito de integração e proximidade tecnológica que tanto se fala, principalmente com o advento das redes sociais e com o barateamento de aparelhos. É preciso pensar o lugar que pessoas com deficiência ocupam na sociedade moderna, que apesar de tantos recursos, ainda oferece meios de assistência e apoio limitados a esta parcela da população. 

Não é incomum ver estabelecimentos sem sinalizações em braile ou mesmo sem acessibilidade através de rampas ou elevadores. Estas são demonstrações mais evidentes dos desafios cotidianos enfrentados por pessoas com deficiências visuais severas. Porém, o problema da integração social desses indivíduos vai muito além destes aparelhos e métodos de alcançabilidade mais típicos.  

Em uma pesquisa apresentada no último seminário organizado pela Fiocruz, estimou-se que cerca de 16% da população mundial apresente algum tipo de deficiência. É importante lembrar que existem diversos tipos e graus de deficiência, variando entre visual, auditiva, intelectual, psicossocial e até mesmo múltipla.  

Bengalas, linguagem de sinais, cadeiras de roda e tantos outros aparelhos mais popularizados facilitam a vida cotidiana de muitas das pessoas com algum tipo de deficiência. Ainda assim, pensar em instrumentos tão simples e que dificilmente possuem adaptações específicas a cada indivíduo e suas necessidades, é desconsiderar a complexidade e pluralidade de corpos que compõem esses dados.  

Deficiência visual 

Segundo a Pan American Health Organization, aproximadamente 1.3 bilhão de pessoas vivem com alguma forma de deficiência visual, também variada em graus de complexidade.  

Com isso, os principais órgãos de saúde ao redor do mundo, incluindo a Anvisa, classificam os graus de deficiência visual e cegueira baseados na tabela de Snellen, do seguinte modo:  

Nem todo mundo me vê

Legenda: A perdão de visão varia entre “leve” à “cegueira total”, conforme aponta a tabela. Reprodução: Luísa Ayres. 
 

Tecnologia assistiva

Desde o ano de 1988, nos Estados Unidos, o termo “tecnologia assistiva” é utilizado dentro da sociedade comum, política e jurídica. No Brasil, também pode ser visto como “Ajudas Técnicas” ou “Tecnologia de Apoio”.  De qualquer forma que seja grafado, o termo remete ao uso de tecnologias que visam apoiar e integrar socialmente quaisquer pessoas com algum tipo de deficiência.   No caso dos deficientes visuais, os personagens principais deste texto, pode-se falar em aparatos mais difundidos, como as bengalas e escritas em braile, até aparelhos extremamente caros e de difícil acesso.  

Em geral, existem cerca de 12 categorias de tecnologias assistivas, listadas a seguir:  

  • Auxílio para a vida diária: ferramentas mais básicas ligadas ao uso cotidiano mais básico e primeiras necessidades, como alimentação, tomar banho, se vestir, etc; 
  • Comunicação aumentativa e alternativa: permitem que pessoas mudas ou com limitações de fala possam se comunicar, como através das pranchas de comunicação ou vocalizadores; 
  • Recursos de acessibilidade ao computador: equipamentos eletrônicos como teclados especiais, softwares de leitores de tela, reconhecimento por voz e ditados que transformam falas em textos escritos; 
  • Sistemas de controle de ambiente: desenvolvidos para quem tem mobilidade reduzida, como aparelhos inteligentes que ligam e desligam luzes ou abrem portas, por exemplo; 
  • Projetos arquitetônicos acessíveis: são projetos pensados para pessoas com deficiência que necessitam de adaptações para que possam frequentar e usufruir dos espaços. É o caso das rampas, dos apoios ao lado de vasos sanitários em banheiros, etc; 
  • Órteses e próteses: trata-se de ferramentas ortopédicas que podem ajustar ou substituir partes do corpo; 
  • Adequação postural: produtos que promovem conforto e maior estabilidade no dia a dia, como encostos anatômicos para cadeiras de roda e posicionadores veiculares; 
  • Auxílios de mobilidade: O mais conhecido neste grupo é a cadeira de rodas. No entanto, os auxílios de mobilidade dizem respeito a qualquer veículo de auxílio, como andadores e scooters
  • Auxílio para pessoas cegas ou com deficiência visual: lupas, braille, leitores de tela ou até mesmo animais de estimação devidamente treinados como guias; 
  • Auxílios para pessoas surdas ou com deficiência auditiva: tradutores para línguas de sinais, telefones com teclado, sistemas de alerta visuais etc; 
  • Adaptações em veículos: rampas para cadeira de rodas, arranjos de pedais e demais utensílios que facilitem a direção de pessoas com deficiência; 
  • Esporte e Lazer: Para quem já assistiu as Paraolimpíadas ou aos jogos de GoalBall, sabe que diversos aparatos esportivos já estão sendo adaptados a pessoas com deficiência. As bolas que emitem sons, destinadas a pessoas com deficiência visual, as toucas com vibração, feitas para os nadadores saberem quando estão se aproximando das bordas das piscinas e até mesmo novas cadeiras de roda adaptadas e fabricadas pela BMW, são exemplos de que o esporte pode sim ser praticado por todos.  

No entanto, nem todas essas tecnologias e aparatos estão disponíveis para que todos ter uma melhor qualidade de vida.  

Segundo a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) mais de um bilhão de pessoas necessitam atualmente de meios assistivos. Apesar do aumento de produtos e da alavancagem do setor de bens e tecnologia na economia mundial, os preços ainda são demasiadamente elevados. China, Estados Unidos, Alemanha, Japão e Coreia do Sul se destacam como pesquisadores e produtores. Tudo isso contribui para que somente uma em cada dez pessoas no mundo tenha acesso aos produtos assistivos de que precisa. Assim, 90% da população com deficiência visual continua a viver sem os recursos cabíveis às suas condições e necessidades. 

Esse é o caso da Fernanda, estudante de direito e integrante há três anos da Associação dos Deficientes Visuais de Sete Lagoas - ADVISETE, fundada dia 01/10/1984, que tem por objetivo o desenvolvimento de ações de apoio, proteção, informação, orientação e encaminhamentos aos usuários e seus familiares através do Serviço da Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência Visual de Média Complexidade. Fernanda também tem deficiência visual, o que nunca a impediu de lutar por seu espaço no sistema educacional e na sociedade. 

Ela diz que chegou na Advisete por acaso. Enquanto procurava por um serviço foi atendida pela Tati, assistente Social da Advisete. Foi assim que começou a participar de todas as oficinas, principalmente as de Braille. Hoje, além de integrar a equipe de colaboradores da Advisete, ela tem aproveitado o seu tempo livre para aprender coisas novas que possam ajudar em seu dia a dia - como usar a bengala corretamente e aprofundar a leitura do Braille.

Na Advisete existem oficinas de artesanato, informática, Braille e música, de forma gratuita. O objetivo é a autonomia da pessoa com deficiência, garante a assistente social da entidade.

Tecnologias assistivas para pessoas com deficiência visual

Legenda: Na Advisete, os alunos com deficiência visual têm a oportunidade de utilizar os teclados em Braille disponíveis na oficina de informática . Reprodução: Internet. 

É direito 

Segundo a Câmara dos Deputados “o projeto de Lei 708/23 obriga órgãos públicos a garantir condições de acessibilidade a todos os cidadãos, oferecendo a pessoas com deficiência recursos de tecnologia assistiva ou profissionais com habilitação em Libras e Braile”. Essa proposta, criada pelo deputado Márcio Honaiser (PDT-MA), viria a modificar o Estatuto da Pessoa com Deficiência e já está sendo analisada. 

É fundamental lembrar, contudo, que o decreto Nº 10.645, de 11 de março de 2021 já propõe o debate acerca do Plano Nacional de Tecnologia Assistiva. Ele visa, através do apoio à produção, regulamentação e promoção de acesso aos bens assistivos, inclusive através do Sistema Único de Saúde (SUS), a “eliminação, redução ou superação de barreiras à inclusão social”, bem como a “promoção da inserção da tecnologia assistiva no campo do trabalho, da educação, do cuidado e da proteção social”. 

Apesar do Decreto atrelar tais responsabilidades aos Ministérios da Educação; Cidadania; Saúde; Ciência, Tecnologia e Inovações e ao antigo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o dever de implementação de tais tecnologias no dia a dia das pessoas com deficiência deve ser considerado em todos os demais setores da sociedade como direito básico delas.  

Teclado adaptado

Em um mundo cada vez mais digital, a acessibilidade se tornou uma pauta crucial na busca por inclusão, tendo a tecnologia como a sua maior aliada. Entre as diversas soluções inovadoras que têm surgido para melhorar a qualidade de vida de pessoas com deficiência visual, o "Teclado Adaptado" ganha destaque como uma ferramenta revolucionária para a alfabetização. 

Desenvolvido pelo engenheiro eletrônico Maicon Gonzaga, o Teclado Adaptado é um exemplo notável das tecnologias assistivas que estão transformando a maneira como os deficientes visuais interagem com o mundo digital. Segundo Gonzaga, a criação visa reduzir a curva de aprendizado de estudantes que enfrentam desafios de acessibilidade. Ele explica que o teclado que ele desenvolveu é específico para a alfabetização. Ele facilita e diminui a curva de aprendizado do estudante,.

Além do custo acessível que fica por volta dos sessenta reais, o Teclado para alfabetização em Braille possui um botão rotativo que permite ao usuário navegar pelo texto palavra por palavra ou caracter por caracter.  Assim, enquanto digita, o usuário consegue navegar e ouvir o texto. Ou seja, ele vai digitando e ouvindo as palavras simultaneamente.

Projetado para ser altamente intuitivo e de fácil uso, o Teclado Adaptado em Braille não é apenas para estudantes em processo de alfabetização, mas sim para pessoas de todas as idades.  

 

Tecnologias assistivas para pessoas com deficiência visual

Legenda: O teclado adaptado de Maicon, pertencente à marca Programatônica, leva dois dias para ser produzido. Reprodução: Maicon Gonzaga da Silva

Tecnologia X custos  

Enquanto as tecnologias assistivas têm desempenhado um papel vital na promoção da inclusão de pessoas com deficiência visual, um problema preocupante está surgindo como um obstáculo significativo: o custo. Embora esses dispositivos sejam projetados para facilitar a vida daqueles que dependem deles, seus preços muitas vezes inacessíveis estão criando barreiras financeiras que prejudicam a viabilização do produto e a inclusão dessas pessoas na sociedade. 

O engenheiro eletrônico Maicon Gonzaga, criador do Teclado Adaptado, têm se dedicado continuamente para a produção do seu eficiente dispositivo educativo, no entanto, devido à falta de apoio público e até mesmo particular, tem passado dificuldades para continuar com o projeto e compartilha sua preocupação. A ideia foi criar um kit completo para tornar independente a vida de alguém fisicamente desafiado pela cegueira dentro das escolas e universidades do Brasil, mas por conta da falta de verbas, esse serviço ficou praticamente inviável.

Na maioria das vezes, a aquisição de um teclado adaptado requer um investimento significativo, o que torna esses dispositivos fora do alcance de muitos. Isso, por sua vez, limita o acesso a oportunidades educacionais e profissionais, além de restringir a capacidade das pessoas com deficiência visual de participar plenamente da sociedade digital. 

A acessibilidade não deve ser um luxo, mas sim um direito de todos. A redução dos custos dos teclados adaptados para deficientes visuais é um passo crucial para garantir que a inclusão digital seja uma realidade para todos, independentemente de suas condições físicas ou financeiras. 

Legenda: Maicon explica melhor as funcionalidades e conceitos por trás do teclado assistivo. Reprodução: Maicon Gonzaga da Silva 

 
 

Como a tentativa do material 100% online nas escolas públicas escancarou a desigualdade digital
por
Fernanda Querne e Amanda Tescari
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03/10/2023 - 12h

Por Fernanda Querne (texto) e Amanda Tescari (audiovisual)


No final da Pré-História, na Idade dos Metais, ela já existia. Passou longe do Paleolítico e Neolítico. Era arte nas paredes. Emanava das necessidades e desejos daqueles que a pintavam. Essas são as pinturas rupestres. Assim, a escrita nasceu. Tanto para fins comerciais quanto  artísticos. E ela sempre evolui. Desenhos em rochas; manuscritos bíblicos, impressos de Gütenberg e, agora, em legendas do Instagram no smartphone

Desde então a civilização foi inundada por livros - a cada página que se passa, há edificação nos aprendizados de todos. Idosos, adultos, adolescentes e até crianças, ao serem alfabetizados, desfrutam da leitura. Entretanto, na nossa realidade Pós-Moderna, o Kindle ocupa o lugar do papel para a geração Tik-Tok. O digital não sairá da sociedade. Na verdade, a sociedade não sairá do digital por questão de sobrevivência. E, nesse sentido, a realidade vai sendo remodelada, criando novas dinâmicas de trabalho, de lazer e na educação.

A maior metrópole da América Latina não ficaria de fora de tais mudanças e aparentes avanços tecnológicos. No âmbito das políticas públicas relacionadas à educação, o que se teve foi a tentativa da implementação do material 100% digital na rede estadual de São Paulo. Por governança ou desgovernança de Tarcísio, o objetivo declarado era que esses equipamentos escolares “se adequassem ao currículo do Estado, mantendo a coerência pedagógica” - segundo a Secretaria de Educação de Estado. 

A proposta de inclusão do material digital veio, contudo, de uma ruptura com o Programa Nacional de Livros Didáticos, programa do Ministério da Educação junto ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Até então, foi este programa federal que se ocupou de levar o material didático de maneira adequada para cada nível educacional, desde a educação infantil até o ensino médio. 

Compreendida a importância de um material didático de qualidade para um bom desempenho escolar, a escolha desses livros passa por um processo minucioso até que seja efetivada. Nesse sentido, evidente que qualquer alteração na definição desses materiais deve seguir as mesmas cautelas, mas não foi a escolha do governador.

Segundo o governo estadual, a opção pela não adesão ao PNLD deu lugar à confecção de um material didático próprio, alinhado ao currículo do Estado. Diante disso, muitas questões foram levantadas por educadores, parlamentares e diversos setores da sociedade. Fica a dúvida sobre benefício do material 100% digital na rede pública estadual e a eficácia de se garantir a emancipação dos estudantes. Além disso, questionar o planejamento para os alunos que utilizarão esse material. São indagações sobre alguns dos pontos de dúvida dentro da nebulosidade de tal política. 

   

                                                               
                                                                                  Foto: Alexandre Lombardi/ Secom Sorocaba 

 

Em conversa no gabinete da vereadora Luana Alves (PSOL), que trabalhava depois das 19h00min, após uma entrevista ao Fantástico sobre a fala racista do então Camilo Cristófaro na Comissão Parlamentar de Inquérito dos aplicativos. Quando ouviu o nome de Tarcísio e o seu “plano infalível educacional”, os seus gestos mudaram. Antes, ouvia atentamente a pergunta. Depois, sua cabeça mexia para lá e para cá em sinal de reprovação ao projeto enquanto repetia sobre a falta de sentido do projeto.

E não pense que Alves compartilha dessa opinião por causa apenas do seu partido. Ela mencionou até que os aliados de Tarcísio desaprovaram o projeto aqui na Câmara Municipal. Há 28,2 milhões de pessoas acima de 10 anos sem acesso à Internet, de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. É incongruente aderir ao material online sem um estudo prévio da educação e acesso digital. Até a Suíça com os seus recursos disponíveis desistiu da didática proposta sem livros físicos. 

Entre os educadores, a opinião permanece. A infraestrutura da escola está com superlotação das salas de aula; excluindo estudantes que são Pessoas Com Deficiências (PCDs) sem apoio e falta de comunicação entre educadores e Secretaria de Educação - explicou a professora da rede municipal, Fernanda Guimarães. Destacou também o desinteresse governamental na estrutura colegial: pensa que há pouco ou zero interesse em realmente implantar algo que funcione, se conhecessem a realidade escolar, perceberiam que o problema não está nos livros físicos, que aliás, são muito mais funcionais do que os digitais. - enfatizou Guimarães.

A funcionalidade do material online de Tarcísio não está desempenhando como o esperado. Com erros gravíssimos didáticos. Mencionaram que o D. Pedro II foi quem assinou a Lei Áurea e citaram que o Jânio Quadros foi o prefeito de São Paulo. Após pressão da mídia, a Secretaria de Educação só afastou os servidores responsáveis pela polêmica. Alves e Guimarães compartilham do sentimento de insuficiência governamental ao solucionarem o problema. A vereadora logo disse que Renato Feder, secretário de Educação do Estado de São Paulo, deveria sair do cargo e tentar ganhar dinheiro em outro lugar.

O Renato Feder é sócio da offshore Dragon Gem LLC, detentora de 28,16% das ações da Multilaser - empresa de capital aberto brasileira no segmento de eletrônicos e informática. Feder se envolve muito nesse mundo tecnológico, já que o secretário de Educação levou em frente a narrativa do material 100% digital sem hesitação. Expôs, rapidamente, que não seguiria o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Assim, o governo logo providenciou os livros serão comprados da empresa Bookwire Brazil Distribuição de Livros Digitais LTD.   

O tema da educação é basilar para a formação de uma sociedade mais crítica e capaz de superar suas contradições. Garantido formalmente na Constituição Federal, esse direito fundamental precisa se traduzir a partir de políticas públicas de qualidade e que realmente busquem efetivar e materializar esse direito na vida de todos os cidadãos. 

Nesse sentido, mais do que a letra da lei garantindo o acesso à Educação, cabe à Administração Pública encarar a conjuntura na qual está inserida e a realidade do acesso à tecnologia e do letramento digital antes de uma proposta drástica de mudança. 

Diante do cenário nacional, a vereadora Luana Alves crê que não há alguma perspectiva dessa desigualdade digital na educação ser uma pauta de relevância para o governo federal - infelizmente. A movimentação percebida por ela é em relação ao combate às fake news, pois já virou uma reivindicação ideológica do Partido dos Trabalhadores (PT). Contudo, não percebe nenhuma pauta que tenha como objeto uma preocupação com o letramento digital dessa nova geração.

A vereadora refletiu sobre como uma educação de fato mais digital, tem que ter uma ideia e uma política de conseguir de fato uma espécie de letramento digital.  Principalmente, com os adolescentes brasileiros. Alves explicou sobre a importância de ensinar a nova geração a diferença entre: anúncio, propaganda, reportagem e até mesmo fake news - o que há muito nesse mundo Pós-Moderno, para não permitir a desvinculação  com a realidade.

 

Evento que aconteceu entre 5 e 12 de setembro foi marcado por protestos e grandes lançamentos
por
Vitor Nhoatto
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13/09/2023 - 12h

Com cerca de 500 mil espectadores durante 8 dias de evento, o IAA Mobility Show  – em sua segunda edição em Munique, na Alemanha – não decepcionou, mas acendeu, mais uma vez, um alerta para a indústria automotiva europeia, em declínio. Marcas tradicionais como Peugeot, Toyota e Volvo se ausentaram, enquanto as chinesas ganharam grande relevância em terras germânicas.

Abrangendo todas as esferas da mobilidade urbana, o Salão de Munique contou com expositores de bicicletas, motocicletas, softwares, baterias e de veículos. A feira teve como foco um futuro mais sustentável, seguro e digital, com destaque às iniciativas de reciclagem, uso de materiais veganos e ecológicos, aplicação da inteligência artificial na indústria automobilística e a sua descarbonização.

 

Greenwashing

Duas pessoas segurando cartazes com escritos em Alemão, dentro de um lago com três carros parcialmente submersos, ao fundo o centro de exposições do Salão de Munique 2023 com uma fila de bandeiras de vários países ate a entrada, a qual conta com uma placa divulgando o evento escrita em inglês.
Protesto da ONG Greenpeace contra a indústria automobilística em frente ao local do IAA 2023
Foto: Greenpeace/Divulgação

Apesar da roupagem “verde” que o evento busca transmitir desde 2021, não sendo mais apenas um salão de automóvel tradicional, mas sim um local de apresentação e debate de novas tecnologias e ideias para um futuro amigo do meio ambiente, protestos ocorreram. 

A ONG Greenpeace realizou um protesto no dia anterior à abertura do evento, dedicado à imprensa, no lago que fica em frente ao centro de exposições. O ato contou com dois ativistas segurando cartazes em meio a três carros submersos, em alusão às mudanças climáticas. A mensagem em inglês era “Encolha agora ou afunde mais tarde”, uma crítica ao modelo de negócios da indústria automobilística que visa vender cada vez mais carros de forma direta, ao invés de aderir a iniciativas de mobilidade sustentável, que o próprio evento prega.

Além disso, no mesmo dia, mas desta vez na ponte Georg-Brauchle-Ring, próxima à sede da BMW, um grupo de ativistas do movimento “Extinction Rebellion” protestou com cartazes e bandeiras. O grupo pedia por uma indústria com menor emissão de poluentes, e por menos carros, que estão cada vez maiores, mais pesados e menos eficientes.

Mobilizações dessa natureza já haviam ocorrido na edição de 2021 do evento, e de maneira geral se intensificaram nos últimos meses pela Europa. Isso se deu principalmente pela desistência da União Europeia em banir os motores a combustão do continente até 2035, em um pedido do governo alemão que é contra a medida, e a favor do uso de combustíveis sintéticos.

 

Futuro de luxo Alemão

Carro conceito da BMW na cor branca sob uma plataforma cinza escura, em um ambiente moderno com uma planta ao lado direito, uma cortina cinza ao fundo
Conceito Neue Klasse no Salão de Munique, modelo conta com inspiração de modelos do passado
Foto: Caradisiac/Reprodução

Sendo um dos grandes lançamentos do IAA 2023, o conceito Neue Klasse promete iniciar uma nova era para a BMW. Segundo Oliver Zipse, presidente do conselho de administração da marca, “O BMW Vision Neue Klasse combina nossa capacidade de inovar nas principais áreas de eletrificação, digitalização e circularidade”.

Prometendo autonomia 30% maior, e uma eficiência energética 25% melhor que os atuais elétricos da marca, o conceito apresenta uma nova plataforma modular que originará seis modelos a partir de 2025. Em relação ao design, que inicia uma nova identidade visual, a empresa diz que 90% do que foi visto estará presente na sua versão de produção. O interior, livre de couro e cromados, em sintonia com a proposta de sustentabilidade, apresenta o novo conceito minimalista Panoramic Vision. A marca bávara ainda garante redução da pegada de carbono do modelo e a alta reciclabilidade do veículo, apesar de não especificar porcentagens.

Carro conceito da Mercedes na cor vermelha, estático de frente, em um fundo amarelo com uma passagem para uma sala branca
Concept CLA no estande da Mercedes, sedã prevê o caminho que a marca seguirá
Foto: NetCarShow/Reprodução

Outra grande estrela alemã foi o Concept CLA, construído sobre a nova plataforma MMA, que prevê a próxima geração de veículos de entrada da Mercedes. A nova arquitetura promete 750 km de autonomia, tração 4x4, e quatro novos modelos a partir de 2025. Seu interior conta com o novo software MB OS, e é dominado por uma tela touch ao longo de todo o painel, apesar de não abandonar os controles físicos. A empresa frisa o uso de materiais sustentáveis, no entanto abusa do couro e de cromados. Além disso, a companhia alega redução de 40% na pegada de carbono do veículo, comparado ao atual CLA, mas não falou sobre índices de reciclagem.

Durante a apresentação, Ola Kaellenius, presidente da Mercedes, ainda comentou sobre a sua visão de eletrificação, “Os custos variáveis de um carro elétrico são mais altos e continuarão sendo em um futuro próximo. Os que pesam sobre a produção dos elétricos incluem matérias-primas para baterias, desenvolvimento de software e preços da eletricidade”. Ele também destacou que a empresa focará na rentabilidade.

Sem nenhum grande lançamento, a Audi se limitou ao reestilizado Q8, e a um protótipo do aguardado Q6 e-tron. O novo SUV que por atrasos no desenvolvimento de seu software, viu seu lançamento ser adiado e teve apenas o seu interior mostrado.

 

Lançamentos de produção

Renault Scenic E-Tech na cor branca com o teto preto, de lateral parado em uma faixa de pedestre, com prédios ao fundo
Novo Renault Scenic E-Tech, crossover elétrico terá primeiras unidades entregues no inicio de 2024 Foto: Renault/Divulgação

Única representante francesa da mostra, a Renault fez a estreia mundial do novo Scénic E-Tech. O modelo baseado na mesma plataforma do Mégane E-Tech, – o qual será lançado no Brasil ainda esse ano – se apresenta na forma de um crossover elétrico, com cerca de 600 km de autonomia e recarga de 10% a 80% em apenas 30 minutos em um carregador super rápido.

O seu interior é 100% vegano e na versão Espirit Alpine, feito todo de tecido reciclado. Em consonância aos objetivos de sustentabilidade do programa Renaulution, a marca ainda destaca que 90% de todo o carro é reciclável, incluindo a sua bateria, fornecida pela LG, comprovando a possibilidade de uma cadeia de produção e uso de carros elétricos, ser circular e sustentável.

Novo Mini Cooper elétrico de lado na cor azul e teto branco a frente, e novo Mini Countryman ao fundo na cor cinza com teto dourado, ambos em um cenário totalmente branco
Novo Mini Cooper elétrico, e novo Mini Countryman, apresentado em sua versão elétrica - Foto: NetCarShow/Reprodução

Os modelos da MINI também foram destaque, com o salão sendo o palco dos novos Cooper e Countryman, ambos totalmente elétricos. O primeiro estreia uma nova plataforma dedicada aos elétricos desenvolvida em parceria com a GWM – marca que recentemente lançou na Europa e no Brasil o Ora 03. Na versão elétrica, ele estará disponível somente na versão de duas portas, enquanto a antiga geração continuará sendo comercializada com motores a gasolina, com duas ou quatro portas.

Já o novo Countryman, que compartilha a plataforma com o BMW X1, cresceu 13 centímetros no comprimento, se tornando o maior MINI de sempre. Tal como o hatch, o SUV apresenta a nova identidade da marca, minimalista. O interior é livre de produtos de origem animal, e conta com um novo sistema de infotenimento no topo do painel, feito de material reciclado. Foi apresentado na sua versão elétrica, mas variantes a gasolina e híbrida serão apresentadas posteriormente.

Por fim, o segundo modelo da nova era da smart, agora 50% da Mercedes e 50% da Geely, foi apresentado. O #3 é a versão esportiva do SUV #1, e segundo Dirk Adelman, CEO da smart Europe, o modelo é uma importante adição à linha de produtos da marca, “Estamos empolgados com o impacto que nosso primeiro SUV coupé terá no mercado europeu”.

 

Concorrência Chinesa

BYD Seal U a frente na cor azul de perfil e sedã Seal na mesma cor azul ao fundo, ambos no estande da marca no centro de exposições com um painel atrás escrito em inglês para diminuir a temperatura da Terra em um grau.
Estande da BYD no Salão de Munique com o SUV Seal U e o sedã Seal, elétricos foram lançados no evento - Foto: BYD Europe/Divulgação

Representando 40% de todos os expositores do IAA Mobility 2023, as marcas chinesas não param de crescer em número de vendas na Europa, preocupando as montadoras tradicionais. Tal soberania do país no cenário dos elétricos se deve a vários fatores, sendo o principal deles, a hegemonia na produção e propriedade dos minérios necessários às baterias. 

O principal alvo das marcas no evento foi a Tesla, então líder de vendas de elétricos no velho continente. A BYD, por exemplo, lançou o sedã Seal e o SUV Seal U, concorrentes diretos do Model 3 e Model Y, respectivamente. Ambos contam com cerca de 500 km de autonomia, muita tecnologia embarcada, e requinte digno de marcas premium.

SUV Xpeng G9 de frente na cor azul com um totem ao lado direito a frente, e sedã P7 de frente na cor verde clara com um totem ao lado, ambos ao ar livre com um monumento clássico ao fundo, e um painel escrito em inglês Olá Alemanha.
Estande da Xpeng no Open Space do IAA 2023 com o SUV G9 e o sedã P7 - Foto: Razão Automóvel/Reprodução

Além da Build Your Dreams, que também vem movimentando o mercado brasileiro, a Xpeng apresentou as suas respostas à marca de Elon Musk, o sedã P7 e o SUV G9 – que prometem tecnologia de ponta. "A Xpeng está entrando em um dos mercados mais competitivos do mundo, com clientes que esperam os mais elevados padrões. Pretendemos introduzir um novo patamar de sofisticação, com uma tecnologia impressionante capaz de definir uma nova era de mobilidade inteligente", disse Brian Gu, presidente da marca. 

Com grandes pretensões, a marca sino-americana SERES também esteve presente com os modelos elétricos 3, 5 e 7, SUVs do segmento C, D e E respectivamente. Os dois primeiros vendidos no Brasil. Outra marca que chamou a atenção foi a Avatr, propriedade da Changan, Huawei e CATL. A startup chinesa apresentou o elegante fastback 12. 

 

Resposta Norte-americana

Carro esportivo Ronin da marca Fisker a frente na cor prata, crossover PEAR logo atrás na cor azul, picape Alaskan ao fundo na cor laranja, e SUV Ocean do outro lado ao fundo na cor azul escuro, modelos estão em um estande prata com um telão ao fundo escrito Fisher
Estande da Fisker com os modelos Ronin a frente, PEAR em seguida, e Alaskan e Ocean ao fundo - Foto: Fisker/Divulgação

A californiana Fisker esteve presente e se destacou ao realizar no IAA 2023 a apresentação europeia dos seus três novos veículos elétricos, com previsões de entrega para 2025. Henrik Fisker, fundador da marca, afirmou que "Através de nossa combinação exclusiva de design, inovação e sustentabilidade, a Fisker está comprometida em trazer experiências únicas e emocionantes para os motoristas europeus que transcendem as categorias tradicionais de veículos”.

Com desempenho digno de superesportivo, o GT conversível de duas portas, Ronin foi o primeiro apresentado. Em seguida, com um design não convencional e com 35% menos peças do que um EV atual, para baixar os seus custos, o crossover PEAR fez sua estreia. Com 4,5m promete entregar versatilidade, autonomia e segurança por um preço acessível. Por fim, a picape Alaskan foi apresentada, ao lado do já lançado Ocean. De acordo com a empresa, será a mais leve e sustentável da categoria.

E face à ascensão das marcas chinesas no mercado europeu, em um pequeno estande, mas muito movimentado, a Tesla, que quase não participa de eventos desse tipo, marcou presença ao apresentar a versão atualizada do seu best-seller, o Model 3. O facelift conta com uma frente redesenhada, novas lanternas traseiras e melhorias no interior e equipamentos.

 

Legado e originalidade

Novo roadster MG Cyberster de lado na cor vermelha com a capota abaixada e os faróis acessos, em um fundo totalmente branco
Novo roadster elétrico Cyberster representa a volta às origens da marca - Foto: MG Media Centre/Divulgação

A inglesa MG, controlada pela chinesa SAIC desde 2008, realizou no evento a estreia europeia do novo Cyberster, primeiro esportivo da marca em décadas. O roadster, na versão com dois motores e tração integral, conta com 544 cavalos e aceleração de 0 a 100 em 3.2 segundos e remonta às origens da marca fundada em 1924, conhecida por seus modelos conversíveis e divertidos.

Carro conceito Volkswagen ID.GTI na cor branca do lado esquerdo de lado, Oliver Blume, CEO do Grupo Volkswagen, vestindo um terno cinza claro de mãos cruzadas ao meio, e carro conceito Cupra DarkRebel na cor cinza escuro ao lado direito de lado, ambos em um estande cinza com um grande tela ao fundo escrito em inglês o lema da coletiva de imprensa do grupo, Sucesso pelo Design
Volkswagen ID.GTI e Cupra DarkRebel juntos a Oliver Blume no estande do Grupo Volkswagen - Foto: Volkswagen-Group/Divulgação

Em uma coletiva de imprensa guiada pelo lema "Sucesso pelo Design", o Grupo Volkswagen apresentou vários modelos que refletem o seu slogan. A Porsche por exemplo, levou o conceito Mission X, sucessor dos icônicos 959, Carrera GT e 918 Spyder. O supercarro elétrico prevê o modelo de produção que será lançado nos próximos anos.

Mas a grande estrela do estande foi o Volkswagen ID.GTI. A versão esportiva do conceito ID.2all, tem produção confirmada para 2026 e promete emocionar. Segundo Thomas Schäfer, CEO da marca. “O GTI permanece esportivo, icônico, tecnologicamente progressivo e acessível, mas agora tem uma nova interpretação para o mundo de amanhã: elétrico, totalmente conectado e extremamente emotivo. Aqui, o prazer de dirigir e a sustentabilidade são uma combinação perfeita”.

O hot hatch é inspirado na primeira geração do Golf GTI, apresentada há 48 anos, e foi o maior exemplo da coletiva. De acordo com Oliver Blume, CEO do grupo, o legado histórico estilístico das marcas do conglomerado será a principal chave para conquistar a preferência do público, “é algo que não pode ser adquirido nem comprado”. Já a recém-emancipada Cupra, focará em originalidade e ousadia para cativar os compradores, como expresso pelo conceito DarkRebel. Fato é que diante de tantas concorrentes chinesas com produtos de qualidade invadindo o mercado, a indústria automotiva tradicional busca se reerguer, e tenta retomar as rédeas dessa nova era que já bate à porta, a qual já tem dono.