Por Laura de Almeida Melo
Quem nunca abriu um site qualquer e se deparou com uma grande mensagem dizendo que este site utiliza cookies e, ao continuar navegando, você aceita essa política? Mas, afinal, o que são esses cookies e o que eles estão armazenando? De acordo com a advogada Cristina Cantú Prestes em seu artigo “Privacidade e Intimidade: A Legalidade dos Cookies e Spam”, cookies são pequenos arquivos armazenados em nossos navegadores e dispositivos que contém dois pedaços de informação: um identificador do consumidor e um identificador da página. Derivando do conceito de “Magic cookies” (biscoitos mágicos), ela afirma que cookies são capazes de armazenar dados como passes para localizar cada usuário e fornecer maior facilidade para navegação e propagandas mais direcionadas, como os spams que chegam ao email em segundos. Mas você sabe o que acontece depois que seu navegador é fechado?
Existem três tipos de cookies: de sessão/transitórios; permanentes/persistentes e os maléficos. Cookies de sessão são apagados do seu dispositivo assim que o seu navegador é fechado, eles não coletam nenhum dado pessoal ou informações do computador, apenas armazenam informações que identifiquem o usuário. Os cookies permanentes, no entanto, permanecem no seu dispositivo até serem excluídos manualmente ou quando sua data de validade é expirada – que pode ser em um dia ou mil anos. Ao contrário dos cookies de sessão, os permanentes coletam informações do usuário como, por exemplo, sites que ele visitou anteriormente e seus favoritos, para construir a preferência daquele usuário. Já os cookies maliciosos, como diz o próprio nome, são os mais perigosos e os que devemos nos preocupar. Esse tipo de cookie, além de coletar informações do usuário como os cookies permanentes, acompanham toda a sua atividade online, rastreiam e montam um perfil do usuário, que podem ser vendidos e utilizados para qualquer propósito, além de captarem informações pessoais e sensíveis, como senhas de bancos ou até sua religião. É por causa deste último e mais outros casos que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) entrou em vigor no Brasil em setembro de 2020, pois esses, também conhecidos por serem pequenos arquivos rastreadores, violam a privacidade e intimidade do titular dos dados, agora ilegal pela sanção da lei.
“Depois de escândalos como o dos Estados Unidos de vazamento de dados, se entendeu que era necessário um limite de legislação. A gente sabe que a internet é um ambiente autorregulado muito positivo e útil, mas o direito vem para impor limites. Crime é crime, dentro ou fora das redes.”, comenta Cristina. “Só o fato de o Brasil reconhecer a proteção de dados já é muito positivo, pois o coloca como um País sensível e confiável quanto à essa problemática internacional.”. Tendo como principal referência a General Data Protection Regulation (GDPR) da Europa, a LGPD possui uma agência regulatória - a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) para fiscalizar e aplicar multas quando necessário. Além disso, a lei foi incorporada no Código de Defesa do Consumidor, podendo ser atendida tanto pela ANPD quanto pelo PROCON.
Mesmo com todo cuidado da lei, ainda há especialistas que a acham pouco eficaz, como o doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Josué de Oliveira Rios. “Se fosse levada à risca, os cookies quase deixariam de existir”, argumenta. “Falta transparência, pois só apresenta para o titular dos dados (usuário) uma possibilidade – concordar com os cookies. A maioria das pessoas, pensando que perderão o acesso ao site, concordam, mesmo não sabendo do que se trata. Deve-se esclarecer a finalidade para o titular consentir conscientemente.”. Para excluir os dados recolhidos por cookies, o titular deve entrar em contato com o controlador do site, normalmente indicado na Política de Privacidade, ou excluir remotamente do seu dispositivo nas configurações na opção limpar dados de cachê e cookies.
Mas, afinal, qual é o risco do recolhimento de dados? E como isso infringe nossa privacidade? O caso mais famoso de mapeamento de perfis com base de dados recolhidos pelo Facebook foi o da Cambridge Analytica, que mapeou perfis de pessoas indecisas quanto ao voto das eleições de 2018 dos EUA e também no plesbicito do Brexit, na Inglaterra. A empresa de publicidade, ao mapear esses perfis com dados pessoais sensíveis, como raça, religião e posicionamento político, bombardeava cada pessoa com anúncios ou notícias falsas que a tiravam de cima do muro para votar no candidato da campanha. Assim, iniciou-se a caça à segurança dos dados e leis como a LGPD e a GDPR entraram em pauta no legislativo.
Por Lidiane Miotta
A Internet se transformou na espinha dorsal da modernidade, uma necessidade indiscutível que passou ressignificar tudo ao nosso redor. Contudo, para fazer parte dessa nova organização da sociedade é necessário ter equipamentos como celulares, computadores e tablets, e do serviço da Internet. Mas com uma desigualdade social tão grande como é o caso brasileiro, em que as pessoas têm dificuldade até de comprar comida, a desigualdade também chegou ao nível digital, passando a excluir e dificultar os indivíduos de participarem da vida virtual que se tornou tão importante no nosso cotidiano e passou a intervir em coisas essenciais para os brasileiros, principalmente nesse momento de pandemia, como a busca de emprego e o recebimento do auxílio emergencial por conta digital na Caixa Econômica Federal.
A último pesquisa do PNAD, realizada em 2019 e divulgada nesse ano pelo IBGE revela que 21,7% da população brasileira não tem Internet, isso é 39,8 milhões de pessoas não utilizam a rede mundial, e que o rendimento médio dos domicílios com Internet era de R$ 1.557, enquanto para os que não têm Internet é de apenas R$728. Quando perguntados pelo motivo de não utilizarem a Internet, um dos mais alegados no estudo, é que o serviço ou equipamentos eletrônicos são muito caros (18%).
Apesar disso, a desigualdade digital apresenta um novo elemento, que a desigualdade social não tem: ela não exclui só aqueles que não têm dinheiro, ela também exclui aqueles que por algum motivo não aprenderam a usar equipamentos, ou seja, não são alfabetizados digitais, que têm dificuldades ou que não têm interesse em utilizá-los. O número de pessoas que entram nessa categoria é 75,4% de acordo com a pesquisa do PNAD, e isso faz desses os motivos mais apontados como razão a não utilização da Internet, a não ser entre os estudantes.
A partir desse ponto o estudo demonstra que entre os estudantes e não estudantes os números têm uma grande diferença. Entre os estudantes a porcentagem de pessoas que utilizam a Internet chega a 88,1%, enquanto as dos não estudantes é de 75,8%, e o motivo de não saber usar a rede mundial é de apenas 16% entre os estudantes, enquanto entre os não estudantes é de 47,2%. A diferença porcentual dos motivos de não fazer uso da Internet também se torna grande: entre os não estudantes os principais motivo é não saber usar a Internet (47,2%) e não ter interesse em utilizá-la (33,1%). Enquanto entre os estudantes os principais motivos são o serviço de Internet ser caro (26,1%) e o custo alto dos equipamentos necessários (19,3%).
Quando entramos a fundo nesses aspectos percebesse que entre os estudantes a condição econômica ganha mais importância na desigualdade digital, reproduzindo a conhecida desigualdade social brasileira, pois entre estudantes da rede pública o uso da Internet é de 83,7%, mas nas Regiões Norte e Nordeste do Brasil esse número chega a apenas 64,4% e 77%, enquanto nas outras regiões varia entre 88,6% e 91,3%. Entretanto entre os estudantes da rede de ensino privada a de Internet fica acima de 95% em todas as regiões do Brasil e quase atinge a totalidade nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Dessa forma o estudo concluí que 95,9% dos estudantes que não tem acesso à Internet são da rede pública de ensino, resultado que foi escancarado durante a pandemia da Covid-19, onde o ensino teve que se tornar remoto e consequentemente muitos desses estudantes foram excluídos dos estudos por não terem como fazerem uso da rede mundial de computadores.
Por Gabriel Dutra
As últimas décadas apresentaram um enorme desenvolvimento dos processos tecnológicos em diversos campos da nossa sociedade. Avanços na área da saúde, da educação, dos negócios e em vários outros segmentos ocorreram por causa da tecnologia. E no mundo dos esportes não foi diferente, uma vez que se trata de uma área que passou (e continua passando) por inúmeras mudanças, tanto na forma como esses esportes são organizados e transmitidos, como na maneira que os clubes e os atletas vêm se preparando para as competições. A tecnologia promoveu diversas modificações nesse meio e a tendência é que continue promovendo cada vez mais.
No que diz respeito à organização das competições esportivas, um grande incremento da tecnologia é o uso de equipamento de auxílio aos árbitros. No futebol, por exemplo, o principal equipamento tecnológico é o árbitro de vídeo (Video Assistant Referee - VAR), que vem sendo utilizados nas principais competições pelo mundo desde 2017. E apesar de contestado por muitos devido à maneira como é utilizado, é difícil imaginar o futebol novamente sem a presença do VAR.
De qualquer maneira, o debate é amplo e há diferentes visões de especialistas a respeito do uso desta tecnologia no futebol. Paulo Vinícius Coelho, o PVC, por exemplo, revelou ao jornal "Lance!" que é a favor do uso do VAR no futebol, mas tem ressalvas. "Sou a favor. Mas acho que o VAR tem que ser usado como corretor, o que era sua função primordial. Tem que acabar com a polêmica. No momento, ele não tem feito isto. A forma como ele é utilizado está gerando ainda mais polêmica no futebol", disse PVC.
Já Walter Casagrande, comentarista esportivo, em entrevista ao mesmo jornal, se mostrou bastante desconfiado em relação ao impacto do uso do VAR no futebol. "Olha, eu ainda não consegui me acostumar ao VAR. Mas acho que é pela maneira como os árbitros se comportam em campo. A sensação é de que os juízes agora tiveram uma perda de convicção ao apitar faltas. Toda hora, eles usam o VAR como escudo. Parece que apitam primeiro o lance e, depois, esperam que o árbitro de vídeo dê seu veredicto", analisou Casagrande.
Além do futebol, outros esportes de destaque também possuem, há um bom tempo, sistemas tecnológicos de auxílio à arbitragem que são imprescindíveis para o bom andamento das competições, como o tênis e o futebol americano, com o sistema conhecido como desafio, e o vôlei, com o uso do Hawk-Eye (olhos de falcão).
Já com relação ao uso da tecnologia nas transmissões dos eventos esportivos, muitas evoluções também podem ser observadas. À medida que o interesse por esportes cresce ao redor do mundo, cresce também a demanda do público para acompanhar uma maior quantidade de partidas e torneios. Cinco décadas atrás acontecia a primeira transmissão ao vivo de um evento esportivo de longo alcance na América Latina: a Copa do Mundo de futebol no México, em 1970. É claro que a tecnologia utilizada naquela época na transmissão do mundial não é a mesma que utilizam nas transmissões esportivas da atualidade.
Naturalmente, nos últimos anos, a tecnologia necessária para realizar a transmissão de eventos esportivos de alta demanda, como copas do mundo e olimpíadas, cresceu abundantemente. Como exemplo, as distintas plataformas de streaming esportivo, tais como Dazn, Esporte Interativo Plus e SporTV Play, que permitem que o público acompanhe as competições por meio de diferentes dispositivos, como computadores, tablets e celulares, algo que era impossível 50 anos atrás.
A produtividade dos atletas é outro fator que mudou radicalmente com os avanços tecnológicos ocorridos no mundo dos esportes. Nesse quesito, a tecnologia vem sendo utilizada com a finalidade de promover evoluções no desempenho dos esportistas, para que, assim, eles possam alcançar o seu melhor rendimento e potencializar os seus resultados, através de uma preparação cada vez mais avançada e inovadora.
Os recursos tecnológicos possibilitam, por exemplo, que todas as informações referentes a um time ou atleta sejam coletadas e analisadas, através de um “Banco de Dados”, que permite o armazenamento dessas informações e, depois disso, a implementação de melhorias específicas quando necessário, tanto nos treinamentos como nas ferramentas utilizadas pelos atletas. A tecnologia também proporciona o surgimento de vestimentas que podem melhorar o rendimento, como roupas inteligentes, tênis de alta performance, além de equipamentos e acessórios modernos, como por exemplo raquetes de tênis e bolas de futebol com o uso da nanotecnologia, e relógios inteligentes (smartwatch). Os atletas, nos dias de hoje, possuem um rendimento amplamente superior em comparação aos de décadas atrás.
A tendência é que esses avanços ligados à tecnologia continuem cada vez mais presentes. Indubitavelmente, o mundo dos esportes depende cada vez mais de novos recursos tecnológicos para a melhoria de desempenho de atletas e profissionais ligados ao setor esportivo, e também para o desenvolvimento de novas formas de transmissão e das modalidades esportivas de uma maneira geral.
Por Maria Luiza Oliveira
No dia 4 de agosto de 2021, o garoto de 16 anos, Lucas Santos, se suicidou após um vídeo publicado na rede social TikTok. O fato acabou rendendo muitos comentários homofóbicos e maldosos. A mãe do garoto, Walkyria Santos, se pronunciou no Instagram afirmando que a Internet está doente. Após o acontecimento, o TikTok emitiu uma nota em sua conta oficial dizendo que lamentavam a tragédia e que a prioridade da empresa era ter um ambiente acolhedor e de bem-estar para todos os usuários. Mas como fazer isso se o uso das redes sociais é pautado como uma das principais causas de transtornos mentais?
A cantora Luisa Sonza, 22 anos, é atacada quase que diariamente por comentários machistas e misóginos em suas plataformas digitais de relacionamentos afirma que sua saúde mental está sendo afetada. Sonza chegou a adiar o lançamento do álbum “Doce 22” devido a isso, informando que se afastaria por um tempo daquele mundo. Em nota, a equipe de Luísa pede “(...) mais uma vez respeito e empatia pelo próximo”. A cantora até mesmo já foi xingada e acusada pelos juízes da Internet pela morte prematura do filho de seu ex marido, Whindersson Nunes.
Facebook, Instagram e outras plataformas são um enorme complexo de conexão, e ao mesmo tempo em que são postadas fotos de animais de estimação, há inúmeras pessoas recebendo “hate” gratuitamente. Os preconceitos ficaram evidentes e alarmantes, pois todos se expressam da forma que quiserem, “o fato de a pessoa não precisar se expor é muito mais fácil falar o que pensa (...) É como se de forma virtual a pessoa se sentisse mais protegida, mais imponente, mais forte, dentro do seu ambiente seguro” - explica a psicóloga Jacqueline Leite.
A influencer digital, Isabela Cantinelli (18) tem mais de 56 mil seguidores no Instagram e relata que já sofreu ataques virtuais. Em um episódio recente, expôs um caso de assédio que sofreu nos storys e recebeu muitos comentários maldosos e denúncias no seu perfil, que agora corre o risco de ter sua conta banida.
Em outro momento, Isabela relata que já teve sua autoestima afetada pelos comentários que recebeu. “Eu postei uma brincadeira em tom de ironia e o tanto de coisa que eu recebi e falaram, as pessoas destilam muito ódio na internet. Isso me marcou muito, porque afetou minha autoestima pelas coisas que eu recebi.”

Diferente de como muitos pensam, a vida virtual não é um espaço sem regras a serem seguidas, de acordo com a advogada Luiza Sato, atuante na área de proteção de dados, explica que a Internet não é um ambiente sem lei: “(...) isso é um total e absoluto desconhecimento da realidade, pois todas as normas que existem hoje, mesmo antes da internet, vigoram e valem para o ambiente digital.”
Mas diante de casos que acontecem como o da Luisa Sonza, Lucas Santos e tantos outros, é um questionamento comum o motivo pelo qual as plataformas digitais não tomam uma atitude de retirar esse tipo de conteúdo ofensivo do ar. Para isso, é importante compreender como essa relação funciona.
De acordo com o Marco Civil da Internet, os provedores (Instagram, Facebook, Twitter etc.), podem tirar um conteúdo do ar, mas só se tornam obrigados mediante ordem judicial, sendo exceção somente quando há a divulgação de imagens íntimas sexuais. “ (...) os provedores têm milhares de pedidos de retirada de conteúdo e na maior parte das vezes são coisas que não tem fundamento. Um concorrente querendo prejudicar o outro. Então eu acho interessante que haja um juiz que reflita sobre esse assunto.” - afirma Sato.
Além disso, a advogada afirma que caso a plataforma retire um conteúdo sem uma ordem judicial ela pode vir a sofrer uma ação por censura. Por isso, muitas preferem esperar uma decisão judiciária para estarem resguardadas na retirada de um conteúdo.
“A tecnologia não é culpada, é o uso que a gente faz dela. Então o problema sempre chega no ser humano, sempre foi feito mau uso da tecnologia pelos seres humanos” – conclui a advogada. O surgimento das redes sociais facilitou muitos processos, agora é possível mandar mensagens de uma forma mais rápida, diminuir distâncias em um ambiente conectado, compartilhar momentos. Mas o mau uso dela também pode ocasionar diversos transtornos na saúde mental, desde vício à tecnologia até mesmo para quem recebe diversos comentários maldosos.
Uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) demonstra que o uso excessivo desse tipo de realidade virtual está relacionado ao sentimento de se isolar do mundo real, o que contribui para doenças relacionadas à saúde mental, como depressão e ansiedade. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística já mostrou que a população brasileira é a segunda que mais gasta seu tempo na Internet, estando conectada cerca de 9 horas e 29 minutos por dia, sendo 40% do tempo gasto em sites de relacionamento.
A psicóloga explica que na Internet é mais fácil falar suas opiniões e demonstrar os seus “achismos”, independente se isso irá ou não afetar o outro, uma vez que ela sente sua privacidade e identidade protegida por um perfil que muitas vezes não é dela. “O olho a olho não existe, o que torna mais difícil dizer o que se pensa, pois, pessoalmente inúmeras variáveis estão presentes e no virtual não) ” – reforça Leite.
Hoje é comum a prática do cancelamento (quando alguém recebe inúmeros ataques e ameaças por ter tido uma atitude que não agradou a opinião pública) algo que Cantinelli pode vivenciar a qualquer momento uma vez que trabalha e quer crescer ainda mais nesse meio: “É uma coisa ridícula, todo mundo erra, ninguém é perfeito! Eles julgam muito o próximo e não olham para o próprio umbigo.”
A Internet e as redes sociais facilitaram muitos processos, de contato com outras pessoas e de acesso a conteúdos de uma maneira mais rápida, contudo, é um ambiente totalmente tóxico. Pelas pessoas terem um contato maior e esconderem suas identidades, acreditam que podem expor seus preconceitos, disfarçados de opinião, para qualquer um.
Por Dayres Vitoria
Com os filhos crescidos, os netos na escola e a família eventualmente distante, para muitos idosos o tempo pode parecer não passar. A rotina para alguns considerada monótona, geralmente da casa para o hospital e vice-versa, pode se tornar entediante. Entretanto, uma grande parcela dessa população está desfrutando do tempo livre sobrando para testar e compreender e fazer uso das novas tecnologias digitais. Porém, muitos deles descobriram que não é tão simples quanto imaginavam.
No Estatuto do Idoso, criado pela Lei 10.741 em 1º de outubro de 2003, é previsto no primeiro parágrafo do Art. 21: “os cursos especiais para idosos incluirão conteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demais avanços tecnológicos, para sua integração à vida moderna”. Contudo, na prática não funciona bem assim. Por haver poucos cursos de inclusão digital para idosos (e os que já circulam normalmente não são muito divulgados) e com a falta de pessoas ou parentes para acompanhá-los durante esse processo de aprendizado, boa parte da população idosa acaba ficando de fora das novidades e facilidades conquistadas na contemporaneidade.
A era da TV
A televisão foi uma das primeiras tecnologias eletro-eletrônicas disponíveis. Inaugurada no Brasil em 1950, ela nunca deixou de ser inovada para que cada vez mais esteja no agrado dos telespectadores. Do “caixote” pesado com apenas imagens em preto e branco para televisores ultrafinos com imagens hipnotizantes (devido a tantas cores) e agora com um áudio com qualidade de cinema, esse é um dos itens tecnológicos mais amado pelos brasileiros sendo apenas 2,8% das casas no País que não possuem uma, segundo pesquisa do IBGE.
Seguindo sendo a mídia soberana no "país do futebol", a TV representa um dos maiores marcos da tecnologia digital. Para Cicero Cardoso Vieira, 70 anos, o aparelho foi uma das melhores invenções já criadas pelo homem. Contudo, ele afirma que até hoje não sabe lidar direito com o engenhoso aparelho. Vieira conta que na época de sua juventude poucas casas tinham TVs, somente as famílias com melhores condições financeiras. Por isso, sempre considerou o rádio um equipamento de comunicação mais simples e fácil de usar, principalmente, para quem morava no interior.
Conforme o tempo passou, a população (se comparado a antes) melhorou financeiramente. Ainda que a maioria não tenha enriquecido, a mudança já foi significativa. Assim, um produto que antes era restrito apenas às classes economicamente mais favorecidas, hoje ocupa um espaço especial nas estantes e paredes dos lares brasileiros. Embora ainda haja uma pequena parcela da população que não tenha, o aparelho já deixou, há algum tempo, de ser símbolo da elite e passou a ser um símbolo da democratização da comunicação brasileira.
Cardoso completou recentemente seis meses com a sua primeira TV. Ele explica que como sempre ouviu o rádio não enxergava a necessidade de adquirir uma, contudo, isso mudou ao longo do tempo: “Eu comecei a perceber que muita gente tinha televisão em casa, eu olhava para a casa dos vizinhos e achava bonito então inventei de comprar uma televisão também”, alega Cardoso.
Questionado se não se arrepende de não ter comprado uma antes Cicero afirma que sim, pois poder assistir aos programas, segundo ele, que gosta - inclusive dos apresentados “ao vivo” - o ajuda a descontrair além de ter se tornado parte de sua rotina. Como um bom brasileiro uma de suas grandes emoções é poder assistir as partidas de futebol do sofá de casa: “Na televisão eu não perco um jogo de futebol, sou muito fã de esporte”, diz o aposentado.
Internet para os idosos
Além das TVs, um dos principais meios para os idosos de se informar ou se comunicar com o mundo atualmente é através da Internet. Nos últimos anos, o acesso à rede mundial de computadores pelas pessoas com mais de 60 anos no Brasil avançou significativamente. De acordo com a pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) em parceria com a Offer Wise Pesquisas, o percentual de navegação entre eles cresceu de 68%, em 2018, para 97%, em 2021.
Ainda segundo a pesquisa, 61% utilizam a web para manter contato com outras pessoas. O WhatsApp é a rede social mais utilizada (92%), seguida do Facebook (85%) e Youtube (77%). Esse é o caso de Anario Soares da Cruz, 74 anos, que só tem notícias de sua família, espalhada pelo Brasil todo, por ter acesso à Internet e utilizar o WhatsApp: “Quando eu quero saber como é que um parente está eu já passo um “zap” ou se não eu ligo. Eu posso falar com a pessoa na hora, isso já dá uma tranquilidade não ter que esperar para saber”, assegura ele. De acordo com os dados, o smartphone é o principal aparelho de acesso, citado por 84% dos idosos que usam a Internet enquanto 37% usam notebook e 36% computador desktop.
Conforme a pesquisa, os aplicativos que os idosos mais usam nos celulares são as redes sociais (72%). O acesso às redes, como Facebook e WhatsApp, ajuda a combater o isolamento social e a se sentirem parte da comunidade, inclusive no meio digital. Para eles, é uma boa maneira de conhecer pessoas, socializar com amigos e familiares e não ficar para trás. Além disso, pesquisas realizadas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte apontam que o uso de celular pode gerar um ganho considerável ao bem-estar do idoso, além de ser um excelente aliado contra a solidão e a depressão por permitir a interação com outros indivíduos.
Apesar do grande acesso à Internet por parte dos idosos partir do uso de aparelhos como smartphones, eles ainda enfrentam barreiras de acessibilidade desde o uso de aplicativos quanto de equipamentos tecnológicos. Muitas vezes esses obstáculos derivam de características do próprio equipamento como letras pequenas e idiomas estrangeiros. Para Anario, por exemplo, isso também é um problema, o que inclusive dificulta o seu aprendizado em manusear totalmente tanto o produto eletrônico quanto seus programas: “Até hoje eu tenho dificuldades, principalmente para escrever. O que pra mim foi bom é que eu posso mandar um “zap” (referindo-se à opção de áudio) ou telefonar para alguém. Mas se for pra fazer transferência de uma conta de banco, essas coisas toda eu já não sei mexer ainda, estou tentando aprender. Mas comparado a antes as coisas melhoraram. Antes eu comunicava pelo telefone fixo, o celular facilitou porque você pode carregar ele para qualquer lugar e o telefone fixo não, para mim facilitou por esse motivo”, afirma o aposentado.

Embora alguns estejam contentes com o pouco que sabem e utilizam desses avanços tecnológicos, ainda há aqueles que não confiam totalmente nessas inusitadas formas de tecnologia. Taiuani Marquine Raymundo, terapeuta ocupacional de formação, realizou sua pesquisa de mestrado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP com 100 indivíduos com mais de 65 anos escolhidos ao acaso. Ela analisou o nível de aceitação da tecnologia por parte dos entrevistados e conforme suas pesquisas 24% relataram ter medo de utilizar as novas tecnologias, e 40% relataram ter receio de danificar o aparelho celular.
O sentimento de medo, para aqueles que responderam ter, cresce principalmente quando usam a Internet. Além disso, o medo de vírus e das redes sociais também é comum. Os resultados da pesquisa mostraram que, apesar das dificuldades encontradas, os membros do grupo avaliado relataram que superaram o medo após frequentarem cursos de inclusão digital. Vontade de aprender é o que não os falta.
Um aspecto de extrema importância e que de certa forma é responsável por essa conexão dos idosos com esse tipo de tecnologia (apesar do misto de sentimentos que eles sentem frente a esse avanço) é a influência da família para que adentrem cada vez mais a esse mundo virtual. Com a correria do dia a dia e por na maior parte do tempo familiares não conseguirem estar 100% presente acompanhando eles pedem para que esses idosos tenham ao menos um celular (na maioria das vezes dado de presente) para se comunicarem. Ter informações dos pais ou avós, sabendo que eles estão em segurança, gera um sentimento de tranquilidade.
Assim, frente ao que foi visto e entre tantos aspectos que rondam essa relação do idoso com a tecnologia digital, seria um absurdo afirmar que ela não tenha melhorado ou facilitado a vida e formas de convivência desse grupo. Embora essa relação não seja similar para todos, há uma construção, ainda que lenta, para que ela se torne mais acessível. Projetos de inclusão para idosos na nova era, inclusive voltadas para a tecnologia, já existem, porém, como já ressaltado anteriormente, não são muito divulgados e ainda são poucos.