Cientistas brasileiros deixam o País em busca de melhores oportunidades no mercado científico
por
Brenda Martins
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19/11/2024 - 12h

Por Brenda Costa Martins

 

Enquanto nossos melhores pesquisadores são acolhidos por laboratórios estrangeiros e embarcam em direção aos países que valorizam a academia e a ciência, ficamos à margem das grandes inovações e descobertas científicas, como espectadores de um progresso que poderíamos estar liderando. A formação de cientistas no Brasil enfrenta uma crise profunda, marcada não por apenas dificuldades estruturais como a escassez de equipamentos em Universidades e laboratórios, mas também pela falta de incentivo à estudantes para que sigam na área acadêmica de pesquisas, além das oportunidades limitadas desse marcado no país. Nos últimos anos, temos assistido a uma crescente “fuga de cérebros” — fenômeno em que profissionais qualificados, principalmente cientistas e pesquisadores, optam por desenvolver suas carreiras no exterior, sendo atraídos por melhores condições de trabalho e valorização profissional. Fuga que tem sido alimentada pela escassez de investimentos no campo da ciência e da tecnologia no país.

Desde 2015, cortes orçamentários intensos afetaram diretamente a manutenção de bolsas de estudo, o financiamento de projetos de pesquisa, bem como a continuidade de programas de pós-graduação em diversas áreas. Com menos verbas, muitos laboratórios foram fechados e projetos interrompidos, situação que acabou por criar um ambiente de insegurança e instabilidade para jovens pesquisadores que desejam contribuir com o avanço científico no país.

Nos centros de excelência, como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e a Universidade Federal do ABC (UFABC) doutores e mestres formados com alto nível de competência se deparam com um mercado de trabalho retraído. Apesar de contar com instituições de ensino que formam profissionais altamente capacitados, os cortes e as limitações severas no mercado de trabalho continua a fazer com que esses cérebros embarquem para o exterior buscando oportunidades de maior rentabilidade e visibilidade pois para muitos desses cientistas, o ambiente brasileiro se mostra inviável para o desenvolvimento de suas carreiras.  Mesmo entre os profissionais que conseguem uma colocação, as condições de trabalho são frequentemente limitadas, com infraestrutura insuficiente e salários que não condizem com o nível de formação e as exigências da carreira científica.

Esse êxodo de cientistas gera impactos econômicos e sociais observados em longo prazo. Ao investir na formação desses profissionais e, em seguida, vê-los partir para outros países, o Brasil perde o retorno desse investimento, bem como a possibilidade de desenvolver inovações e avanços tecnológicos que poderiam impulsionar setores como saúde, agronegócio e tecnologia. Fato que evidencia outro problema: Não é preciso investir apenas na educação básica e incentivo aos jovens cientista se, no futuro, eles não terão um lugar nas grandes corporações, já que as poucas que existem no país continuam não oferecendo benefícios tão competitivos quantos os de vagas alocadas no exterior, sedes dessas empresas.

Para cientistas como Paula Rezende, doutora em Biomedicina, a decisão de deixar o Brasil é dolorosa, mas necessária. Após anos lidando com infraestrutura insuficiente e atrasos em recursos para pesquisa, ela aceitou uma proposta de trabalho na Alemanha, onde encontrou o ambiente ideal para continuar seu trabalho. Casos como o de Paula são cada vez mais comuns, o que ilustra como o cenário nacional tem se tornado um impeditivo para o progresso da ciência e da carreira dos profissionais brasileiros. A falta de oportunidades no Brasil também gera uma lacuna na academia e nas universidades, onde a quantidade de concursos e oportunidades para docentes e pesquisadores é insuficiente para absorver os doutores formados a cada ano. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que cerca de 25% dos doutores no Brasil ficam fora do mercado de trabalho adequado à sua formação, o que leva muitos a buscar alternativas no exterior, onde há mais estabilidade e reconhecimento.

Elisabeth Balbachevsky, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e coordenadora científica do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP, tem outra visão. A professora tenta analisar um lado positivo desse fenômeno da "fuga de cérebros", as mentes que vão embora do Brasil buscando melhores oportunidades podem "se inserir em redes de pesquisa internacionais, o que poderá ter um impacto extremamente positivo, porque irão se tornar lideranças brasileiras e, uma vez de volta ao Brasil, trarão novas expertises e abordagens para o País", diz a pesquisadora. Uma vez que esses cientistas brasileiros conseguem cada vez mais se estabelecer nas gigantes da tecnologia, por exemplo, o país indiretamente está ganhando reconhecimento, o que pode fazer com que os olhos dessas grandes corporações se voltem ao Brasil. Ainda que a "fuga" desses pesquisadores seja prejudicial no início, com mais profissionais produzindo ciência de qualidade em um ambiente no exterior que comporta suas necessidades, podemos colher frutos no futuro. Afinal, para que grandes corporações se desenvolvam no país, é preciso ver que a população tem capacidade de produzir recursos que possibilite sua expansão.

Outro fator que importante ser destacado é a busca pelo incentivo ao empreendedorismo desses jovens cientistas. Grandes empresas como o Facebook e a Amazon surgiram de um pequeno projeto de seus fundadores enquanto ainda eram estudantes, desenvolvendo uma start-up na garagem de suas casas. É claro que, a qualidade de ensino de ciências nas Universidades americanas possibilitam que seus alunos desenvolvam o pensamento empreendedor, enquanto no Brasil, os alunos são incentivados a bucar emprego fora, em empresas já estabelecidas, fator resultado do cenário de instabilidade não apenas do mercado científico, mas também do empreendedorismo. Algumas escolas de redes particulares no país contam com matérias de empreendedorismo e educação financeira, por outro lado, escolas da rede pública e estaduais se encontram em um cenário totalmente diferente. Ainda há um grande caminho a trilhar para que o acesso à uma educação de qualidade seja uma realidade igualitária entre todos os estudantes do país.

Propostas como a criação de um fundo nacional para Ciência e Tecnologia, que garanta recursos contínuos para a pesquisa, são defendidas por entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Outra alternativa é fortalecer as parcerias entre universidades e empresas, criando oportunidades de inovação e desenvolvimento em conjunto com o setor privado, o que poderia abrir novas frentes de trabalho para cientistas dentro do Brasil.

Enquanto não houver um comprometimento estrutural e financeiro com a ciência, o Brasil permanece vulnerável à saída de seus talentos. A fuga de cérebros se torna um símbolo das dificuldades enfrentadas pela ciência brasileira, limitando o potencial de avanço científico e tecnológico do país. A valorização da ciência e o investimento em condições de trabalho são essenciais para que o Brasil não apenas forme cientistas, mas também consiga retê-los e fortalecer sua base científica para o desenvolvimento nacional e reconhecimento internacional.

Produzir orgânicos é um desafio que envolve altos custos, manejo artesanal e um compromisso com a sustentabilidade.
por
NINA JANUZZI DA GLORIA
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12/11/2024 - 12h

Por Nina J. da Glória

 

No coração de uma pequena fazenda nos arredores de São Paulo, a paisagem exibe fileiras simétricas de verduras, um campo verde que mais parece um quadro pintado com paciência e precisão. Cada folha simboliza uma promessa livre de químicos, cultivada à mão, mas também testemunha de um trabalho árduo, invisível ao consumidor final. Esse é o cotidiano de Mariana Silva, uma agricultora que decidiu, há quase uma década, abandonar a produção convencional para dedicar-se ao orgânico. No início, acreditava que seria um retorno ao básico, uma reconexão com a natureza. Mas a realidade mostrou-se mais densa e complexa do que o imaginado. O solo, como um organismo vivo, exigia constantes cuidados e uma compreensão que ia além dos métodos tradicionais. Cada semente carregava uma incerteza, e cada colheita trazia consigo os riscos de uma produtividade menor, vulnerável a pragas e intempéries. "O solo não aceita pressa", sua frase parece pairar na atmosfera ao redor das hortas, impregnada de paciência e resignação.

Nas redondezas, em outra propriedade de São Roque, Paulo Mendes compartilha a mesma visão, mas com uma trajetória que o levou ao orgânico por caminhos distintos. Ao contrário de Mariana, ele vem de uma família que cultivava com agroquímicos, mas sempre sentiu a necessidade de transformar as práticas de cultivo. Para ele, o orgânico é como um resgate da essência da terra, uma escolha que exige mais do que habilidades tradicionais. É um compromisso com o solo, com o ciclo de nutrientes e com o futuro. Paulo vê o campo como um delicado organismo, onde a compostagem e a rotação de culturas são essenciais, mas também um desafio financeiro. Cada safra se transforma em uma experiência quase artesanal, onde a eficácia do manejo natural precisa competir com a tentação das facilidades químicas. Esse processo, para ele, é como uma dança cuidadosa com a natureza, em que observar e respeitar o ritmo das estações torna-se tão vital quanto qualquer técnica de plantio.

                                                            Comunidade de pessoas que trabalham juntas na agricultura para cultivar alimentos

Para Mariana e Paulo, a colheita orgânica traz consigo um custo invisível ao olhar do consumidor. A vulnerabilidade às pragas, por exemplo, é uma preocupação constante. Sem pesticidas convencionais cada infestação é uma batalha natural que, muitas vezes, se perde. A introdução de insetos benéficos para conter pragas ou o uso de biofertilizantes representa um custo adicional, tornando a logística do manejo um quebra-cabeça financeiro. Além disso, há as certificações rigorosas exigidas para que o produto receba o selo de orgânico, que Mariana descreve como "um segundo trabalho", com visitas e inspeções que, embora necessárias, absorvem ainda mais recursos.

No centro dessa cadeia está Cláudia Ramos, proprietária de uma loja de produtos orgânicos em São Paulo. De seu ponto de vista privilegiado, ela percebe o esforço e as dificuldades de seus fornecedores, mas também o descompasso entre o preço desses produtos e a percepção dos consumidores. Em cada item das prateleiras, Cláudia vê um microcosmo de esforço e idealismo, mas, ao explicar as diferenças entre orgânico e convencional, enfrenta um público que ainda considera o orgânico um luxo. Ela afirma que cada produto é uma história de sacrifício, e explica que o custo mais alto representa a vulnerabilidade da produção orgânica, que exige cuidados permanentes e colheitas menos previsíveis.

                                                                                           Close-up de plantas verdes na estufa

A produção orgânica, então, emerge como uma complexa equação de valores, sacrifícios e riscos. Cada um dos envolvidos—do campo à prateleira—carrega uma parte dessa carga, como se fosse um ciclo contínuo de compromissos, onde o ideal e o real se encontram e se confrontam. A busca pela pureza e pelo cuidado no cultivo se mescla a um cotidiano cheio de dificuldades, e o produto final se transforma numa espécie de narrativa silenciosa sobre perseverança e dedicação ao que se acredita ser o melhor para o futuro do planeta e do ser humano.

A jornada dos entregadores não se limita ao trajeto, mas envolve obstáculos que vão da segurança no trânsito às incertezas de um dia de trabalho autônomo.
por |
12/11/2024 - 12h

Por Thais Oliveira 

 

Se antigamente era comum esperar dias ou semanas para que um pedido chegasse, hoje a demanda por rapidez e eficiência exige uma operação logística reforçada. O dia começa antes do sol nascer, com o medo e a ansiedade tomando conta de Joice Alves, mãe solteira de 50 anos que precisou se reinventar após um divórcio e o enfraquecimento das vendas em seu comércio de plantas. Seus cabelos longos e quase grisalhos carregam histórias de uma mulher forte que devido a gravidez, parou os estudos na quinta série. Tudo que aprendeu é resultado de suas vivências.

A tecnologia dominou o mundo e os seres humanos. Para Joice isso não passava de uma grande perda de tempo, até que tudo mudou em sua vida e a tecnologia virou sinônimo de estabilidade financeira e independência. Conseguir realizar uma entrega parece fácil aos olhos dos que recebem em casa. O suor do trabalho de prestadores de serviço das grandes empresas está presente em cada pacote entregue.

Os desafios começam à frente da seleção. Um aplicativo viabiliza para os entregadores os percursos disponíveis, juntamente ao valor a receber, e cada um seleciona o de sua preferência. Mas o número de prestadores é maior do que os de entregas e, às vezes é necessário passar horas olhando as atualizações no celular. Há dois meses o aparelho eletrônico, que não passava de uma ferramenta de comunicação com a família, amigos e clientes, se tornou o principal equipamento do trabalho de Joice. Foram semanas aprendendo a usar o mapa, abrir e fechar aplicativos, escrever mensagens mais rápidas e, principalmente, a contabilizar os resultados do seu novo emprego. No início de sua trajetória, Lucas, o filho mais velho, acompanhou a mãe em todos os percursos e assim, ela ganhou confiança para trabalhar sozinha. 

Desde a adolescência, Joice foi diagnosticada com TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada) e comenta que essa logística piora os sintomas diariamente. O seu conforto é o chá de camomila colhido diretamente dos vasos sobrepostos na janela do sexto andar e do calmante recomendado pela cardiologista. Ao conseguir uma corrida, agradece a Deus pela oportunidade e pula o café da manhã, colocando tudo que precisa dentro de uma bolsa térmica. De acordo com o aplicativo fornecido pela empresa, cada percurso tem a duração de 4h e 6h e os valores são correspondentes a estes horários. Explica que foi acordado entre a empresa e os prestadores de serviço que todas as entregas contariam com, no máximo, 45 pacotes e 40 paradas. 

Ao chegar no Centro de Distribuição, Joice recebe a rota com 52 paradas, 65 pacotes amarelos e o medo de não conseguir finalizar dentro do prazo estipulado. É necessário entregar todas as mercadorias para receber os valores completos, independente da chuva, dos ventos de 100km/h, dos postes desligados e das ruas escuras. Joice sai de Mauá com o seu destino traçado em um papel com nomes de pessoas desconhecidas diretamente para a cidade de São Paulo. Na travessa da Avenida Vila Ema e nas mãos Joice, o primeiro pacote foi entregue para a Renata, uma mulher simpática que desejou um bom dia para a entregadora.

Dentro do carro, o estômago de Joice espera por um alimento desde às 9h00min, porém os donos dos 50 pacotes pendentes têm prioridade na fila e as refeições ficam em segundo plano, sendo necessário seguir o caminho ingerindo apenas uma banana. A falta de hidratação e de nutrientes causa cansaço excessivo, perda de cabelo e, consequentemente, ausência de vitaminas importantes para o funcionamento do corpo. Relata, que praticava uma rotina saudável, alimentando-se bem e correndo na rua todos os dias de manhã com os seus filhos, porém precisou abrir mão do estilo de vida para arcar com os novos custos, como por exemplo o aluguel. A infraestrutura básica é uma questão: nas cidades grandes, com quilômetros percorridos entre um ponto e outro, muitas vezes não há onde parar para descansar ou usar o banheiro. A cidade se torna um palco de correria constante, onde não há tempo ou lugar para uma pausa, justifica Joice, ao informar que não consegue ingerir ao menos 200ml de água durante a jornada de trabalho. 

O futuro do setor aponta para uma integração cada vez maior entre tecnologia e logística, com inovações que prometem transformar ainda mais a experiência de compra e aproximar o e-commerce dos consumidores. Embora a constante evolução esteja dominando o cenário, não há direitos trabalhistas ou benefícios assegurados, como convênio médico ou seguro de saúde. Se houver algum acidente ou emergência, o entregador precisa arcar com os custos e lidar com as consequências sozinho. 

Dentro do aplicativo de entregas é possível saber que, dependendo do nível, o entregador terá acesso a mais pedidos, melhores comissões e suporte especializado. A grande corporação criou um sistema de níveis que funciona como uma espécie de escada, onde cada degrau alcançado representa mais oportunidades, e consequentemente, mais pressão. Estar em um nível mais alto pode significar, por exemplo, maior acesso a entregas em horários de pico ou de longa distância, que pagam melhor. Joice é prata, mas conta que demorou meses para alcançar a nomenclatura, afinal qualquer queda no desempenho pode significar uma descida de nível. Cancelamentos, avaliações ruins ou atrasos podem rebaixar o entregador, retirando seus, quase que invisíveis, benefícios. 

Joice conseguiu dois percursos no mesmo dia, isso significa que a corrida contra o tempo é primordial para finalizar o primeiro, voltar ao Centro de Distribuição e recolher as próximas encomendas. Ao sair, os clientes recebem notificações de que o produto está a caminho, causando ansiedade e desconfiança dos que aguardam em suas casas. Durante a noite as entregas são realizadas das 18h00 às 22h00 e Matheus, o filho mais novo, auxilia a mãe ligando para os clientes e entregando os pacotes enquanto ela separa os próximos. Em meio à movimentação, Matheus recebe uma mensagem de uma mulher que estava aguardando o produto há 30 minutos e precisava dormir. Era sexta-feira, 19h39min, quando os insultos começaram e mudaram a rota da família. Cada pacote recebe uma numeração de envio, o itinerário e os dados relevantes do consumidor, em consequência das mudanças Matheus e Joice aumentam a duração do percurso e os quilômetros rodados no carro. A quantidade de remessas no período da noite é majoritariamente maior, entretanto os consumidores não sentem confiança em recebê-las e, frequentemente, rejeitam a tão esperada aquisição. 

As embalagens amarelas recusadas devem atravessar a cidade e voltar à corporação até às 23h00min, horário de finalização dos serviços diários. Joice retorna com o peso da consciência de classe descendo em seus cabelos, refletindo sobre o comportamento interpessoal dos consumidores, do egoísmo e da falta de empatia. O mundo não é mais o mesmo e as pessoas estão preocupadas com as futilidades expostas nas prateleiras invisíveis dos comércios online. Não se importam se a voz que clama do lado de fora da residência está enfrentando a maior chuva do ano na cidade ou se está com um prazo apertado, o importante é aconchego e a novela das 21h00min. 

Após 15 horas, Joice finalmente chega em casa, sentindo-se cansada, fraca e estressada. O dia foi longo, repleto de entregas que exigiam rapidez, atenção e resistência. Cada pedido, cada quilômetro percorrido, parecia se arrastar em meio à chuva, ao trânsito caótico e à pressão por cumprir os prazos apertados. Como muitos entregadores, Joice não tem garantia de descanso ou segurança no trabalho, e mesmo ao chegar em casa, a sensação de que poderia ter feito mais, ou o medo de não atingir o número de entregas esperado, a acompanha. Mas para Joice, o trabalho nunca termina realmente. Ela reflete sobre o que poderia ter feito para ser mais rápida, ou se valeu a pena o esforço de correr contra o relógio. Em sua mente, os desafios que ela enfrentou ao longo do dia continuam vivos, a insegurança nas ruas, o risco de acidentes, a exaustão física e emocional. Mas amanhã, o caminho se repete, enfrentando as mesmas dificuldades em nome de um dia melhor, ou, quem sabe, uma coroa de ouro na guerra contra a logística desumana.

Os chamados cibercrimes são considerados um tipo de violência contra o idoso, e a campanha Junho Violeta busca conscientizar à população sobre a violência patrimonial
por
Alice Di Biase
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11/11/2024 - 12h

Por Alice di Biase

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a população acima de 60 anos no Brasil deve crescer em ritmo acelerado, quase triplicando até 2050. Dados como esse expõem o crescente aumento da população idosa, além de um novo perfil de envelhecimento que requer atenção especial em políticas públicas. Adriana Horvath, diretora voluntária de captação de recursos da Casa Ondina Lobo, relata que a principal queixa dos residentes da Casa é a invisibilidade, a visão estereotipada do “vovozinho” de cabelo branco e ingênuo, e adiciona que os idosos querem ser vistos como seres humanos que ainda tem muito a oferecer.

A Casa de Repouso Ondina Lobo é uma instituição de longa permanência para idosos em situação de vulnerabilidade social, o projeto é sustentado por doações filantrópicas. A missão da organização é promover o bem-estar e a integração do idoso na sociedade, por meio de atividades plurais. Ela relata que muitos dos idosos residentes da Casa já passaram por alguma violência ou situação de preconceito e atribui isso a forma como a sociedade olha os idosos, relacionando-o com a finitude da vida. E adiciona que é preciso entender que a velhice é apenas mais uma fase. Além disso, ela também cita a importância de campanhas de conscientização contra a violência ao idoso, como o Junho Violeta.

Existem vários tipos de violências direcionadas aos idosos, uma delas é a violência patrimonial. Com o avanço tecnológico, os mais velhos se tornaram mais vulneráveis para a violência patrimonial, por meio dos chamados golpes. O Disque 100, do governo federal, registrou, nos cinco primeiros meses de 2023 mais de 15 mil denúncias de violações financeiras ou materiais contra idosos; 73% a mais do que no mesmo período de 2022. Cada vez mais conectada, a terceira idade tem sido um dos principais alvos de quadrilhas especializadas em crimes cibernéticos que comprometem o patrimônio da vítima.

Ondina Lobo e Image Magica

“Mãe, mudei de número, salva esse contato aqui”, assim começa uma das formas mais comuns de fraudes financeiras contra os idosos, a foto de perfil é a mesma que o filho utiliza no seu número próprio e logo em seguida são solicitadas as transferências. Cláudia, aposentada de 66 anos relata como caiu no phishing - tipo de golpe realizado por e-mails, redes sociais e sites que utilizam uma “isca” para fazer a vítima fornecer informações pessoais. Uma loja conhecida com descontos extravagantes, a propaganda era feita por celebridades como Gisele Bündchen e a apresentadora Angélica que recomendavam a promoção. Tudo feito com inteligência artificial. O valor perdido não foi alto, como conta Claúdia, com alívio, no entanto, a sensação de ter sido enganado com facilidade pelos golpistas causa constrangimento.

O constrangimento também é um dos motivos que leva os idosos a se tornarem um alvo fácil dos golpistas. Envergonhados de demonstrar a fragilidade e, de certo modo, alimentar os estereótipos de ingenuidade que a sociedade cria em relação a faixa etária, muitos idosos não contam aos familiares a situação e deixam o ciclo de golpes se estender. Em 2024, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos já recebeu mais de 21 mil denúncias de violações deste tipo contra idosos, destes 80% dos casos são denunciados por terceiros, e não pela própria vítima.

A psicóloga e psicanalista Moema Sarmento compartilha suas perspectivas sobre a saúde mental na terceira idade, ela argumenta que a falta de respeito e os maus tratos podem levar ao isolamento e depressão, o que faz que muitos idosos que sofrem esses abusos patrimoniais não procurem ajuda, assim os casos só chegam aos familiares e autoridades quando já estão em estágios alarmantes.

Com o intuito de alterar esse cenário, a Casa Ondina Lobo em pareceria com a ONG Image Mágica, levou o Circuito Cultura e Inclusão para as mulheres da Casa. As aulas de inclusão digital e fotografia buscam conscientizar os moradores a respeito dos golpes digitais, resgate da autoestima e criar intimidade com o meio tecnológico.
 

Ondina Lobo e Image MagicaOndina Lobo e Image Magica

Como comenta Horvath, a velhice é só mais uma fase da vida que envolve atenção e deve ser aproveitada com qualidade de vida e isso envolve a liberdade de consumir a Internet com segurança.

Entre ícones do passado, referências do presente e caminhos para o futuro, veja como foi a edição deste ano
por
Vítor Nhoatto
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22/10/2024 - 12h

Ocorrido entre os dias 14 e 20 de outubro na capital francesa, o Mondial de l'Auto contou com mais de 500 mil visitantes, além de recados importantes para a indústria automobilística. As donas da casa — Alpine, Peugeot, Renault e Citroen — estiveram presentes, mas, mesmo assim, a presença chinesa continuou e chamou a atenção do público, das autoridades e das rivais. A DS, da Stellantis, foi a única francesa que não compareceu ao evento. 

Temas como sustentabilidade, acessibilidade e segurança no trânsito foram amplamente abordados nas coletivas de imprensa, e traduzidos em parte nos lançamentos. Ao todo, 41 fabricantes de automóveis participaram do evento, o qual trouxe o brilho de volta à Bienal, tal qual como no Salão de Munique, em 2023.

Eletrificação em diferentes níveis

Antenado às ânsias do público e da indústria, houveram lançamentos de vários modelos eletrificados, em diferentes níveis e formatos. Nos últimos meses, as vendas de elétricos oscilaram negativamente na Europa, por conta de uma série de fatores, como altos custos de aquisição e o fim de incentivos governamentais. 

Com isso, marcas como Volkswagen, Ford e mesmo Volvo, reviram seus planos de eletrificação total — apesar da meta da União Europeia de banir os modelos movidos a combustão, já em 2035. O conglomerado Stellantis, por exemplo, investe em plataformas multi-energéticas, capazes de produzirem tanto híbridos, quanto elétricos, e apresentou seus últimos modelos em Paris. 

Construído sobre a e-CMP, — mesma base dos recém lançados no Brasil, Peugeot 2008 e 208 — o Alfa Romeo Junior Ibrida fez sua estreia ao público. Com a mesma motorização dos irmãos, motor 1.2 PureTech em conjunto a uma bateria de 48V, gerando 136 cavalos, o modelo complementa a linha do SUV urbano, disponível como 100% elétrico desde o começo do ano. 

Na Peugeot, as novidades foram maiores, apesar de nenhum modelo totalmente novo, diferente das compatriotas Alpine, Citroen e Renault. Em Paris, foi lançado o novo E-408, versão 100% elétrica do crossover baseado no 308. Sob a plataforma EMP2, compartilha o conjunto mecânico com o hatch, tanto nas versões a combustão quanto na novidade elétrica, e não muda visualmente. Além disso, foram apresentadas as versões Long Range dos E-3008 e E-5008. As autonomias passam de cerca de 500 km para 700 km, segundo o ciclo WLTP.

Em uma abordagem diferente, focada em modelos elétricos separados dos seus semelhantes a combustão, a Volkswagen apresentou o novo Tayron. Com expectativa de ser vendido no Brasil, é a versão Allspace do novo Tiguan, mas agora com nome próprio. O SUV de sete lugares estará disponível em duas versões diesel, gasolina, e híbridas plug-in, além de uma híbrida leve.

Volkswagen Tyron de frente branco ao lado de um Tayron de trás roxo
O Tayron é o sexto SUV a combustão da Volkswagen na Europa, entre Tiguan e Touareg. Foto: Divulgação/Volkswagen

As motorizações são as mesmas do Tiguan de nova geração, construído sobre a MQB evo. Isso se reflete em uma autonomia combinada de até 850 km nas versões plug-in, além de uma autonomia em modo 100% elétrico de cerca de 100 km, graças a uma bateria de 19.7 kWh.

Em uma abordagem semelhante em alguns aspectos a Volks, a britânica de coração, mas de propriedade alemã, a Mini, apresentou os seus novos JCW elétricos. Os primeiros modelos da divisão de desempenho da marca serão o Cooper, um hatch de três portas, e o crossover Aceman. Ambos são construídos sobre a plataforma desenvolvida em conjunto com a chinesa GWM, e prometem a emoção de um esportivo com seus mais de 250 cavalos, mas sem emissão de CO2.  

Mais uma ofensiva chinesa 

Sobre as construtoras chinesas, o Paris Expo Porte de Versailles foi novamente o palco para a estreia de modelos do país asiático, e até marcas inteiras. A GWM não compareceu desta vez, como era de se esperar após o anúncio de reestruturação europeia e fechamento do escritório na Alemanha em agosto deste ano. 

No entanto, a sua principal rival, a Build Your Dreams, brilhou, repetindo a estratégia de 2022. Seu estande contava, desta vez, com modelos já conhecidos do público, como Dolphin e Seal, mas também com o totalmente novo, Sealion 7, apresentado ao mercado europeu, e com um vislumbre da versão que será vendida no Brasil em breve.

Segundo a vice-presidente da marca, Stella Li, o novo SUV cupê do segmento D, reflete em como a BYD reage e escuta às demandas dos seus consumidores europeus, prometendo design, performance e autonomia de ponta.

E com uma estratégia ousada, que busca rapidamente conquistar o mundo, a Leapmotor debutou em Versailles. Com o amparo da Stellantis, — com quem fechou uma parceria bilionária pela administração global da marca — apresentou quatro elétricos. Carlos Tavares, CEO do conglomerado até 2026, esteve no evento e comentou que as montadoras têm mais a ganhar com a estratégia de se aliar às chinesas, ao invés de brigar com elas. Antes disso, ele visitou o estande da BYD, chamando a atenção da imprensa.  

O primeiro deles é um hatch subcompacto vendido por menos de 20 mil euros, o T03, o segundo é o C10, um SUV médio, por cerca de 36 mil euros. Ambos modelos com condução semi autônoma de nível 2 e confirmados para o Brasil. A versão de sete lugares, C16 também esteve no evento, ao lado do inédito B10, revelado no evento. O SUV do segmento C tem como rivais BYD Atto 3 (Yuan Plus no Brasil) e Volvo EX40, e estará disponível já no próximo ano na Europa.

Estande da Leapmotor rodeado de pessoas
Os modelos C16 (roxo), B10 (azul), C10 (verde) e T03 (turquesa) prometem agitar o mercado. Foto: Divulgação/LeapMotor

Para além das duas marcas, a Seres (com operações paralisadas no Brasil até então), a Xpeng, o grupo GAC e a Hongqi ocuparam o complexo de exposições francês. A última chamou a atenção com a estreia do sedã de luxo Guoya, rival dos alemães Classe S, Série 7 e A8. Enquanto isso, a GAC optou por uma abordagem mais demonstrativa de suas tecnologias, sem pretensões diretas de venda no continente. 

A história não se compra

Frente à concorrência cada vez maior das chinesas, eis o contra-ataque europeu, baseado amplamente no legado das marcas, algo com o qual as novatas não podem competir. No último Salão de Munique, o CEO do Grupo Volkswagen, Oliver Blume, destacou que o histórico estilístico das marcas é algo que não pode ser adquirido nem comprado, e será a principal chave para o público comprar os modelos europeus. 

Dito isso, nomes como BMW e Renault também vêm investindo em uma abordagem retrô futurista. Em relação à alemã premium, os conceitos Neue Klasse sedã e SUV foram apresentados pela primeira vez juntos. Com designs que remetem aos modelos dos anos 80, preveem a nova geração de elétricos da marca, esperados para 2025 e 2026.

Porém, foi no estande da Renault que a vibe passado e futuro, misturado com o charme e a funcionalidade, atraiu mais os olhares. Após o lançamento do aguardado R5, um hatch elétrico inspirado no icônico R5 dos anos 90, foi a vez do novo R4 voltar à vida.

Novo Renault 4 E-Tech azul em um fundo colorido
O novo Renault 4 E-Tech continua investido no passado da marca como diferencial. Foto: Divulgação/Renault

Construído sob a plataforma AmpR Small, é a versão SUV do R5, com quem compartilha a motorização e equipamentos. Com 4.14 metros de comprimento, funcionará como a versão 100% elétrica do Captur, contando com uma autonomia de mais de 400km no ciclo WLTP, carregamento rápido, todos os assistentes à condução modernos e muitas referências ao R4 dos anos 70. 

Construído na França, atraiu até mesmo os olhares do presidente francês, Emmanuel Macron. O político esteve no evento no dia de abertura ao público (15), e causou um leve tumulto ao fechar o estande em que visitava. Ele cumprimentou os executivos da marca e entrou no novo modelo, esse com expectativas de custar na casa dos 30 mil euros. 

Na ideia da ofensiva irreverente e estilosa, bem ao estilo francês, o protótipo do novo Renault Twingo esteve no evento. Agendado para ser lançado em 2026 (possivelmente no próximo Salão de Paris), promete tornar a mobilidade elétrica realmente acessível, com um preço na casa dos 20 mil euros no formato de um subcompacto, uma espécie em extinção.

Uma mobilidade de fato acessível?

Mas, ao se tratar de acessibilidade e democratização da eletricidade, outras marcas têm mais a dizer e entregar. Dentro do Grupo Renault, é a romena Dacia a representante de baixo custo. Se o nome da empresa não é conhecido aos brasileiros, com certeza seus modelos são. A fabricante de Sandero, Logan e Duster, vendidos sob o nome da Renault na América Latina e Turquia, apresentou em Paris o mais novo Bigster.  

O SUV é a aposta da marca para conquistar o segmento C, com 4.57 metros de comprimento e preços menores de 30 mil euros, cifra que hatches do segmento B atualmente custam. Baseado na mesma plataforma de Clio e Duster, a CMF-B, contará com opções a micro-híbridas de 48V, híbridas convencionais com baterias de 1.4 kWh, e versões movidas a GPL, populares em países como Espanha e Itália. 

Do outro lado do muro, a resposta da Stellantis ao sucesso da Dacia, — dona do modelo mais vendido da Europa em Julho deste ano na Europa, o Sandero — é a Citroën. A marca que já passou por muitas fases, desde o luxo e conforto do DS original, até a originalidade do Xsara e C4 Cactus, por exemplo, agora investirá no mercado de acesso. 

Estiveram no evento os novos C3 e C3 Aircross, bem diferentes das versões vendidas no Brasil, mas ainda na casa dos 20 mil euros. A reestilização do quadriciclo Ami foi apresentada, uma opção de locomoção elétrica por menos de 8 mil euros. E fechando os facelifts, os remodelados C4 e C4X (versão sedã do hatch compacto) foram lançados em Paris, agora com a nova identidade visual da marca.

Estande da Citroën rodeado de pessoas
A Citroën se reinventou com novos C3, C3 Aircross, C4, C4X e o protótipo verde do C5 Aircross 2026. Foto: Divulgação/Citroën

Além disso, o protótipo da nova geração do Citroën C5 Aircross foi revelado. Segundo a empresa, o modelo de produção será 95% igual ao conceito. No quesito motorização, será construído sobre a nova plataforma STLA Medium, que estreou com o novo 3008, e servirá de base para o novo Compass também. Suas principais vantagens incluem a possibilidade de versões híbridas e elétricas, com maior eficiência e autonomia de até 700 km, além de menores custos de produção pela sua modularidade.

Atendendo às demandas do mercado

Uma das principais ânsias da indústria é a diminuição dos custos na fabricação de elétricos, principalmente após a chegada das chinesas. No entanto, nem só de  grandes grupos é formado o setor, e parcerias são mais bem vindas que nunca. A Ford, por exemplo, se uniu à Volkswagen para produzir seus elétricos para a Europa, se prevenindo da taxação que Tesla, Volvo e Mini tentam evitar  com a fabricação dos seus modelos na China.

A americana/britânica apresentou ao público pela primeira vez o novo Capri, um SUV coupe construído sobre a plataforma MEB dos Volkswagen ID.3 e ID.4. O modelo continua o resgate de nomenclaturas clássicas da marca, como Puma e Mustang Mach-E, além da transmutação desses em SUVs, o que agrada ao mercado em geral, mas não tem a mesma reação aos mais saudosistas.

Do outro lado do globo, a sul-coreana Kia também busca conquistar o mercado europeu dos elétricos, sem dividir os custos com várias marcas. O mais novo lançamento do grupo Hyundai-Kia é o SUV urbano EV3, rival do Jeep Avenger, Peugeot e-2008 e Renault 4. 

Novo Kia EV3 verde de frente em um fundo branco
O EV3 é a aposta elétrica da Kia para o segmento B, o maior em vendas na Europa. Foto: Reprodução/InsideEVs

Os preços devem começar na casa dos 30 mil euros, o que não é barato para um carro do segmento B, mas é compatível aos rivais citados. O chamariz da marca, para além dos sete anos de garantia, é a tecnologia, refinamento e comodidade do modelo, quase como uma versão menor do SUV grande EV9, indicado ao prêmio Carro do Ano Europeu em 2024.

E em um segmento acima, mas em uma faixa de preço parecida, a checa Skoda, — essa sim de um grande conglomerado, a Volkswagen — apresentou o novo Elroq. Rival de modelos como BMW iX1 e Ford Explorer, começara na casa dos 33 mil euros, com uma autonomia de 560 km no ciclo WLTP.

Tentativas e erros

Paris ainda foi o palco para marcas menores, ou com menor relevância na Europa. No primeiro caso, a francesa Alpine que tomou os holofotes com o concept car A390 Beta, que antecipa o segundo modelo independente da Renault. 

Com um design agressivo, inspirado nos alpes, e com referências aos modelos de competição da empresa, será um crossover 100% elétrico construído sobre a plataforma do Nissan Aryia. Mesmo assim, a dinamicidade e performance única da marca, que hoje vende apenas o cupê A110, será mantida no carro de produção, anunciado para o ano que vem. 

Em meio aos europeus e chineses, ainda houve espaço para as estadunidenses Tesla e Cadillac. A empresa de Elon Musk deixou a desejar, sem um estande propriamente dito, ou sequer um tapete e divisórias entre seus modelos. Já no quesito novidade, nada de concreto. A picape Cybertruck foi apresentada oficialmente em solo europeu, mas nenhuma conformação de sua comercialização, ou lançamento do esperado Model Y remodelado e do táxi autônomo Cybercab, revelado três dias antes.

Já em relação a Cadillac, que tentou engatar nas vendas na União Europeia algumas vezes, as coisas foram diferentes. Desta vez focada na eletrificação, a empresa do Grupo General Motors trouxe o SUV de luxo Lyriq, além de lançar o Optiq, um pouco menor e com design menos extravagante na traseira. 

Novo Cadillac Optiq vermelho de frente no estamde da marca
Cadillac mira o Tesla Model Y com o novo Optiq, um SUV do segmento D com 4.82 metros. Foto: Reprodução/GM Authority

O Paris Motor Show 2024 certamente ficará para a história centenária do evento como um recálculo necessário e exitoso de rota. Marcas voltaram à mostra, lançamentos importantes ocorreram e o público compareceu. Além disso, mais uma vez o rumo que a indústria se encaminha foi destacado, um cenário crítico de reinvenção e reajustes.

A tecnologia é usada por criminosos em casos variados
por
Lucas Allabi
Guilherme Gastaldi
|
22/11/2023 - 12h

Por Lucas Allabi (texto) e Guilherme Gastaldi (audiovisual)

O termo deepfake, traduzido do inglês, é uma mistura de “deep learning” e “fake”. Ou seja, é um sistema de aprendizado constante de uma inteligência artificial que visa criar vídeos e imagens falsas com cada vez mais semelhanças à realidade. A tecnologia teve início no ano de 2017. Usuários do Reddit usaram os softwares Keras e TensorFlow para criar uma IA que mapeia rostos e os substitui por outro qualquer. O software consegue até imitar expressões faciais e movimentos labiais.

Isso facilitou o uso de qualquer um a esse tipo de tecnologia, já que ela deixou de ser manual, substituindo frame por frame o vídeo selecionado, e automatizou completamente o processo. A tecnologia, com nenhuma regulação sob ela, logo se popularizou e começou a ser utilizada para diversas finalidades. Se tornou comum vídeos pornográficos serem feitos com rostos de pessoas que nunca fizeram parte de nenhum vídeo erótico.

No começo era uma espécie de fetichização da pessoa, visando dar prazer para quem tinha desejo por alguém que nunca fez pornografia. O uso criminoso dessa tecnologia, entretanto, logo surgiu. Diversos relatos da época revelaram tentativas de suborno feitas por criminosos que ameaçavam publicar deepfakes de civis. A vítima deveria pagar ao infrator para que um vídeo pornográfico com seu rosto não fosse publicado como verdadeiro.

A quantidade de usos de deepfakes para fins criminosos cresceu com a crescente facilidade do público de acessar essa tecnologia. Com um rápido google achamos ferramentas gratuitas como o aplicativo Reface, os sites DeepSwap e DeepFakes Web e os programas FaceApp e DeepFaceLab.

deepfake
 Site que oferece gratuitamente a tecnologia do deepfake.

Com a evolução do acesso ao deepfake, também aumentaram os crimes relacionados à tecnologia. É possível forjar um vídeo para criar um álibi, um depoimento para convencer que uma pessoa defende um determinado ponto de vista ou mesmo uma situação de crime, de modo a incriminar alguém. Tudo depende da criatividade do editor e de quantos vídeos da pessoa estão disponíveis na internet.

Um exemplo é que, nos Estados Unidos, ganhou projeção um golpe que usou o rosto do influenciador mais popular do mundo, MrBeast, que tem 201 milhões de inscritos no seu canal do YouTube. O vídeo usa um clone de James Stephen Donaldson, o dono do canal MrBeast, que oferecia iPhones 15 em troca de quantias irrisórias de dinheiro no Tik Tok. O que seria uma abordagem implausível, ganha em persuasão ao se considerar que ele se tornou famoso ao distribuir prêmios a quem supera desafios em seu canal.

No ano de 2022, com as eleições presidenciais no Brasil, notou-se um crescimento no uso da ferramenta, dessa vez, com o objetivo de manipular falas e criando narrativas tendenciosas com o objetivo de favorecer um lado, ao mesmo tempo em que prejudicava o outro. Além disso, a suscetibilidade de grande parte da população brasileira de acreditar favorece o uso de ferramentas que promovem a disseminação de desinformação.

Em pesquisa divulgada em janeiro de 2022 pela Kaspersky, empresa tecnológica russa especializada na produção de softwares de segurança à Internet, em parceria com a Corpa, a maior parte dos brasileiros não sabem reconhecer quando um vídeo foi editado usando o deepfake. Segundo o estudo, 66% dos brasileiros ignoram a existência dessa técnica. O relatório revela também que a maioria dos entrevistados brasileiros (71%) não reconhece quando um vídeo foi editado digitalmente usando essa técnica. 

Na mesma linha, a professora da PUC-SP Lúcia Santaella elenca alguns motivos pelos quais identificar um deepfake pode ser difícil, especialmente para pessoas sem conhecimento tecnológico. A pesquisadora lembra que as teorias da percepção revelam que o ser humano não pode duvidar daquilo que vê, ou seja, vídeos costumam ser tomados como verdade. Em segundo lugar, as peças audiovisuais manipuladas normalmente são consumidas a partir da tela de um smartphone, o que, pelo tamanho reduzido, dificulta a identificação de detalhes que denunciem a edição. 

Ela ainda ressalta que nós estamos acostumados a ver filmes e vídeos dublados. Portanto, a atenção ao movimento labial é um hábito que nós não temos. A nossa atenção toda vai para a sequência visual do vídeo, para o que é contado, narrado ou apresentado.

No ano dessa eleição, foi produzido um vídeo de deepfake onde os âncoras do Jornal Nacional, William Bonner e Renata Vasconcellos, falavam que o candidato à presidência Lula (PT) e seu vice Geraldo Alckmin (PSB) eram “bandidos”. Visto o prestígio do programa e dos apresentadores, o vídeo passou como verdadeiro para vários espectadores, criando o perigo de manipular os votos para a eleição. Esses resultados são preocupantes e evidenciam como nossa sociedade ainda é muito vulnerável à essa nova tecnologia e como precisamos nos preparar e entender o seu funcionamento. 

Além disso, a apuração mostra como políticos e influenciadores podem ter grande sucesso utilizando a manipulação digital para favorecer campanhas de desinformação, principalmente nas redes sociais como Twitter e WhatsApp, onde esses vídeos recebem uma tração muito grande e são compartilhados em massa, tanto por pessoas que não sabem que o vídeo é mentira como pessoas tem plena consciência da falta de veracidade do conteúdo, mas compartilham da mesma maneira para favorecer pontos de vista particulares. 

 

 

 

Acompanhe como os algoritmos influenciam os usuários
por
Gabriel Cordeiro
Pedro Lima Gebrath
|
31/10/2023 - 12h

A internet é fundamental em nossas vidas, estamos conectados quase que inconscientemente a ela, seja jogando, conversando, postando nossas opiniões, buscando conteúdo ou diversas outras funções que a internet pode exercer, mas não podemos nos enganar ao pensar que possuímos total controle sobre ela, pois não possuímos. A internet muitas vezes passa a sensação de um oceano de possibilidades, o que não passa de uma ilusão criada pela própria, tudo que fazemos está sendo observado e condicionado e devido aos algoritmos estamos consumindo apenas o que é condizente com “nossa bolha”.

Esse espaço virtual possui uma vasta capacidade de armazenamento de dados e informações, e por isso ela é capaz de muitas vezes direcionar por meio de seu algoritmo o conteúdo que será apresentado para nós, muitas vezes filtrando nossos gostos e nos privando culturalmente, socialmente e até gastronomicamente, nos privando de muito conhecimento e impedindo uma possível ampliação cultural por conta dessa manipulação causada pelas grandes corporações, que conseguem realizar isso ao possuir um vasto acesso aos nossos dados, que liberamos ao realizar cadastros e respondendo questionários de gostos e personalidade em seus sites e redes.

As redes sociais também podem ter efeitos negativos, por sua grande influência na sociedade atual elas podem ser determinantes para importantes acontecimentos. Um grande exemplo das redes sociais sendo utilizadas de maneira maléfica é no caso das eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, no qual o candidato republicano Donald Trump foi eleito usando táticas antidemocráticas. O ex-presidente utilizou de uma manipulação dos algoritmos com base em dados pessoais que foram vendidos pelas empresas de meios de comunicação, convertendo muitos dos “indecisos” para votarem a favor de Trump, se utilizando de muitas das chamadas “fake news” (notícias falsas).

Essa prática não foi determinante apenas nessa eleição, esse esquema de manipulação também definiu a votação do Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), se utilizando desses dados pessoais dos usuários de redes sociais como o Facebook para a manipulação do indivíduo, se utilizando de uma estratégia de algoritmo com base na personalidade e traçando um perfil do eleitorado visando convencer os mais suscetíveis à se tornarem um possível voto favorável, essa estratégia foi desenvolvida pela empresa Cambridge Analytica.

De acordo com Brittany Kaiser, responsável pelas campanhas de empresa durante o período que compreendeu os dois períodos históricos acima, a ferramenta detida pela Cambridge Analytica não possuía apenas a função de melhorar o marketing da empresa, mas era capaz de manipular mentes de usuários que superava o simples uso das redes sociais; era impossível se libertar dessa influência, visto que ela já se via presente nas mais diversas esferas da sociedade mundial. A empresa reproduzia a verdade conveniente a quem lhe pagava, passando uma imagem distorcida a quem a via e gerando um sentimento de que uma simples tomada de decisão resolveria diversos dilemas impostos de maneira exacerbada na internet.

A vitória do republicano Donald Trump em 2016 foi o início de uma onda da extrema direita pelo mundo que teve impacto também em nosso país, com o resultado das eleições 2018 elegendo Jair Bolsonaro também com grande influência das redes sociais. O candidato e atual presidente da república foi acusado de manter uma rede de trafego de notícias falsas e tendenciosas por meio de grupos informais de conversas, no caso o aplicativo WhatsApp, atitude que pode tê-lo ajudado a ganhar a disputa contra o candidato Fernando Haddad, do PT.

O gráfico a seguir exemplifica as fake news sobre os candidatos do 2° turno nas eleições brasileiras de 2018:

https://cpop.ufpr.br/wp-content/uploads/Tabela-1-20.png

Segundo essa tabela da Agência Lupa e Projeto Comprova, é apontado que Bolsonaro foi bem mais beneficiado por fake news que seu concorrente Fernando Haddad, com 87,5% das notícias falsas sendo favoráveis ao mesmo. Além das fake news em maior quantidade que favorecem Bolsonaro os temas abordados também são menos genéricos e mais chocantes, podendo se concluir que se trata de um método de sua equipe e não somente coincidências.

 

Uma das fake news mais famosas propagadas pelo atual presidente, com mais de 400 mil compartilhamentos, foi sobre Fernando Haddad (PT) ter criado o “kit gay” para crianças de seis anos. É possível encontrar não só esse, mas também outros boatos acerca do mesmo tema. Além de acusarem Haddad de ter criado o “kit gay”, em outros boatos também o acusam de incentivar a pedofilia e o incesto. O “kit gay”, nesses boatos, teria a função de sexualizar as crianças precocemente e ensinar a elas a “ideologia de gênero”.

O assunto foi tão relevante que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ordenou que as publicações do ex candidato do PSL acusando o ex ministro da educação de distribuir o tal “kit gay” nas escolas públicas enquanto seu período no ministério fossem retiradas do ar, pois este kit nunca existiu

 

No topo das publicações mais compartilhadas está o perfil oficial do candidato Jair Bolsonaro, que reiteradamente se refere a Haddad como o “pai do kit gay” (Reprodução/TV Globo)

Foto de Jair Bolsonaro segurando o livro “Aparelho Sexual & Cia” no Jornal Nacional da Globo (Reprodução/TV Globo)

As noticias falsas atingiram principalmente os idosos, que possuem pouca familiaridade com a internet e redes sociais, normalmente com dificuldades de confirmar o que se vê nos espaços virtuais. Em entrevista com Maria Francisca, senhora de 79 anos, a mesma afirma ter participado de diversos grupos do aplicativo Whatsapp onde eram compartilhadas as noticias, onde se afirmava que haviam fraudes nas eleições de 2022 em relação as urnas. Também era incitado uma possível intervenção militar, o que motivou diversos acampamentos em frente aos quarteis generais, tudo organizado e fomentado nos grupos de Whatsapp e do  Telegram. Maria diz se sentir muito chateada por ter disseminado tanta desinformação e agradece ao Tribunal Superior Eleitoral e as agencias de checagem por informarem os fatos, mesmo que a grande maioria dos outros participantes não acreditem nas fontes e sigam com a versão compartilhada nos grupos.

 

Os paradigmas da presença tecnológica como ferramenta nas escolas
por
Khadijah Calil
Lais Romagnoli
|
01/11/2023 - 12h

Por Lais Romagnoli (texto) e Khadijah Calil (audiovisual)

 

Caio Silva atua na área da educação há 3 anos e atualmente é professor de duas escolas estaduais localizadas em São Paulo. Ele que foi estudante do ensino particular, sempre trabalhou em escolas públicas e percebe que o governo de São Paulo está intensificando o uso de tecnologias dentro das salas de aula, mas considera que os recursos não são implantados para que isso ocorra de maneira satisfatória, sobretudo pela quantidade de equipamentos disponíveis.

Em meio a sala de aula vazia, ele afirma que mesmo com a distribuição de tablets e computadores, os prazos costumam ser curtos para as realizações de provas e trabalhos. Além da quantidade de aparelhos não ser condizente com o número de alunos, parte deles não realizam suas tarefas a tempo nas datas solicitadas. 

Com um olhar de indignação ele acredita que esse tipo de situação não deve ocorrer em centros educacionais particulares, uma vez que há um cuidado muito rigoroso a essas questões. Alunos do ensino particular já possuem a tecnologia inserida na educação há muito tempo, já estão acostumados com salas de aula repletas de computadores e tablets.

Em relação ao uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, Caio acredita que a tecnologia pode auxiliar na compreensão dos conteúdos e na superação das dificuldades dos alunos além de proporcionar uma aula mais dinâmica do modelo tradicional. Ele também enfatiza que as ferramentas oferecidas pela escola e pelo governo são essenciais, mas aponta questões negativas sobre o uso.

Caio confessa que mesmo com a utilização em massa do celular em sala de aula para uso pessoal, como acessar o Instagram ou assistir vídeos de assuntos variados no Tiktok, muitos alunos ainda demonstram um desinteresse pelo uso da tecnologia quando atrelada a educação, principalmente os do ensino médio. 

Caio conta que os alunos entre 11 a 18 anos costumam aceitar a inserção da tecnologia em sala de aula. Ele acredita que cabe ao profissional uma reflexão com os estudantes para que compreendam aquilo como algo positivo. No entanto, o professor muitas vezes esbarra em uma cultura escolar, que já vem de décadas, que dificulta essa sensibilização por parte dos estudantes.

Questionado sobre a influência da era digital na educação, o profissional enfatiza que a tecnologia possibilita um acesso a informações que nunca tivemos em nossa história, mas é necessário pensar na forma que utilizamos essa ferramenta. É preciso um olhar crítico acerca da qualidade desses materiais que os jovens que estão saindo do Ensino Médio terão acesso.

A Internet pode sim ser positiva, com várias formas de se adquirir e transmitir conhecimento, conta. Mas também, com o advento das redes sociais, muitos estudantes acabam por perder o interesse em questões que realmente podem mudar a sua vida. A realidade é transportada para as redes sociais e tudo que se almeja é um cumprimento de padrões impostos pelas redes. Ele enfatiza que o fator principal para se entender o lado positivo e negativo é compreender com qual finalidade esse jovem vai utilizar a Internet e seus aparelhos eletrônicos. 

Os avanços tecnológicos passaram a ter domínio da sociedade de forma que os equipamentos se tornaram essenciais para o cotidiano, com benefícios e malefícios. Essa modernização atingiu o âmbito educacional, trazendo a tona um debate sobre a maneira que celulares e computadores podem ser contribuintes ou não na formação dos estudantes.

 

CienTec abre as portas para visitantes com exposições interativas e visitas guiadas
por
Marcela Rocha
Stefany Santos
|
13/11/2023 - 12h

Por Stefany Santos (texto) e Marcela Rocha (audiovisual)

O Parque da Ciência e Tecnologia (CienTec) seria um local de fácil acesso igual aos outros próximos de sua localização na maior região de mata da cidade de São Paulo como o jardim botânico e o zoológico de São Paulo, seria se não fosse a falta de informação e de placas indicando a chegada até o local, quase ninguém sabe dá uma informação sobre o espaço, que só tem um simples totem em uma avenida indicando o parque.

Na entrada do CienTec há um portão verde com grades, fechadura com correntes que dão voltas para proteger o portão. Ao lado do portão tem um pequeno espaço de abrigo onde fica o segurança aguardando os visitantes do parque e que pede para quem chegar a assinar a lista de presença e seguir as linhas amarelas, linhas essas que já estão quase apagadas pela poeira do dia-a-dia, devido ao tempo. Ao seguir as linhas observa-se um hipnotizante local do espaço geofísico, com réplicas de planetas do sistema solar e um enorme edifício branco ao final do caminho, em que estavam 3 voluntários estudantes aguardando os visitantes para guiá-los. Vestindo coletes azuis, os voluntários se apresentam como Gabriel, Mariana e Maria, todos da Universidade de São Paulo (USP).

Anos atrás, o local que hoje se apresenta como Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade de São Paulo, em 1932 era o Instituto Astronômico e Geofísico da USP, anteriormente localizado na Av. Paulista, que por conta dos tremores e ondas emitidas pela movimentação de pedestres, dos bondinhos e carros, acabou sendo mudado para uma região mais afastada do centro da cidade. Antes disso, a área era utilizada para plantio de café como propriedade de diversos fazendeiros, inclusive com parte do território pertencendo à Fazenda do Estado. Hoje o Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas está na Cidade Universitária da USP do Campus Butantã, o atual Parque CienTec teve seus prédios tombados como Patrimônio Arquitetônico e a área verde de conservação foi identificada como Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI), comportando para além do CienTec, também o Zoológico e o Jardim Botânico de São Paulo.

De acordo com o professor e Doutor em física pela Universidade de São Paulo, Mikiya Muramatsu, também coordenador da exposição, em 2007 quando o projeto surgiu a ideia inicial era fazer exposições móveis que percorressem todos os parques da cidade, o que funcionou por longo período, passando pelo Parque da Juventude, Parque do Ibirapuera etc. Agora fixas, as exposições estão instaladas no Parque CienTec por tempo indeterminado.

Os artefatos das exposições são em sua maioria interativos. O público pode tocar e se envolver com os objetivos, com formas de trazer conhecimento científico a partir de atividades lúdicas. Em sua maioria, as mostras são seccionadas em óptica, física e paleontologia. Na seção de paleontologia, as réplicas de fósseis de crânio de dinossauros têm tamanho adequado para pessoas de diferentes idades poderem interagir. Os moldes são feitos em gesso e acompanham as especificidades de cada espécie, como as fossas ósseas cranianas e as diferenças no formato da mandíbula e dos dentes. De acordo com os especialistas paleontólogos, os dentes em formato pontiagudo, semelhante a uma faca, provavelmente pertenciam aos grupos de dinossauros carnívoros e ajudavam a cortar e triturar a carne, encontrados normalmente em crânios grandes.

 

Marcela Rocha

Fósseis de dinossauros na seção de Paleontologia / Foto: Marcela Rocha

 

Os dentes retos e de crânio pequeno em relação ao restante do esqueleto corporal, que ao abocanhar tem-se a visualização de uma dentição semelhante a grades, pertenciam a dinossauros herbívoros, servindo para prender as plantas e folhas entre os dentes, facilitando a mastigação e a deglutição. Já os crânios com focinho alongado e dentes que contam com estruturas semelhantes a pequenas serras em cada um, pertenciam a dinossauros que se alimentavam sobretudo de peixes, sendo o focinho alongado adaptado para caçar em ambiente aquático (como fazem as atuais garças, pelicanos e flamingos, por exemplo). Todos os fósseis contam com folha explicativa de informações a respeito do contexto em que foram encontrados, datação, tamanho do indivíduo e informações sobre as espécies.

Na sala de óptica, a baixa iluminação marca presença. O ambiente conta com artefatos luminosos fluorescentes e objetos com pintura em espiral que provocam a ilusão do movimento. Os objetos hipnotizam sobretudo as crianças, por suas cores e sons diferentes. O professor de física Mikiya Muramatsu explica que a imagem que vemos através de nossos olhos demora um décimo de segundo para chegar ao nosso cérebro.  Sendo assim, o cérebro recebe a informação da imagem, e ao olharmos para outra imagem rapidamente, o cérebro pode ainda estar acostumado com a imagem de um décimo de segundo atrás. Dessa forma ocorrem as brincadeiras de ilusão de óptica e sensação de hipnose exploradas na exposição.


Marcela Rocha

Criança brinca com artefatos interativos da mostra/Foto: Marcela Rocha

Os dinossauros refletem a nós uma lição, em mostrar que não podemos deixar a terra ser destruída novamente. Um voluntário do parque, Marcos Felipe, formado em artes plásticas na FAAP e atualmente estudante de licenciatura em geociência ambiental na USP conta que se continuarmos sem cuidar do meio ambiente, assim como os dinossauros foram destruídos nós também seremos, demonstrando a importância e necessidade de tratar de questões ecológicas.

Artefatos e itens interativo

Exposição tecnlógica
Registro de equipamento luminoso. Artefato faz parte das peças expositivas da mostra/Foto: Marcela Rocha.

Para ir ao parque não é necessário realizar inscrição prévia, basta comparecer de segunda-feira a sábado das 9h00min às 16h00min, com entrada gratuita.

 

 

 

Nos últimos anos, os produtores de conteúdo vem alterando drasticamente a essência das vendas online
por
Felipe Abel Horowicz Pjevac
Pedro Paes Barreto Monteiro
|
17/10/2023 - 12h

As redes sociais mudaram profundamente a maneira como as pessoas se relacionam no mundo real e virtual. Com esse crescimento das mídias nos últimos 15 anos, surgiram diversos produtores de conteúdos que se tornaram verdadeiras personas, mostrando aos seus seguidores uma “vida perfeita”, quando na realidade o que se passa no dia a dia é totalmente diferente do que é mostrado no Instagram, por exemplo. Infelizmente, esse é um fenômeno que tem crescido muito nessa era digital e acabou se tornando algo mais comum do que o esperado.

Plataformas digitais como Twitter, TikTok e Instagram são grandes palcos virtuais onde as pessoas podem exibir suas vidas da maneira que quiserem para que outros vejam. Os influenciadores têm um papel decisivo para esse ideal utópico onde tudo é lindo e maravilhoso. Através de fotos e vídeos com filtro, legendas muito bem elaboradas e com toda uma equipe por trás pensando em cada detalhe do perfil, a internet se tornou um ambiente fora da realidade que vivemos.

Uma linha do tempo em relação à produção e venda de conteúdo pessoal na internet pode esclarecer um pouco como chegamos até aqui: no final da década de 2000 e início da década de 2010, o YouTube começava a se destacar como uma soberana plataforma digital de vídeos. Como tudo ainda era ‘pouco explorado’, não existia um manual de comportamento a ser seguido pelos youtubers. Dessa maneira, muitos começaram a ter destaque publicando as próprias vidas de maneira quase literal. Por meio de vídeos opinativos, vlogs diários de rotina, transmissões jogando videogames ou até mesmo gravações de turismo, os conteúdos eram autênticos e espontâneos. Nas mídias de texto e imagem, o Facebook e o Twitter eram encarregados desse papel; enquanto o primeiro era mais elaborado, com portais de debates, compartilhamento de ideias e notas bem escritas, o segundo assumia um formato mais leve, com tuites curtos e diretos e uma proposta mais cômica.

Em entrevista para a AGEMT, a psicóloga e neurologista Eliane Duek falou sobre esse panorama: “Na primeira era digital das redes sociais, cada pessoa foi ‘jogada’ em um universo até então quase desconhecido e o conceito era trazer a pessoa da esfera material para o ambiente virtual. Por isso, a esmagadora maioria tanto dos usuários quanto dos primeiros produtores de conteúdo enxergaram uma possibilidade de apresentar suas vidas das mais diversas maneiras para que os outros pudessem assistir e comentar. Ali era criado um ambiente que tentava emular a vida real da maneira mais realista possível”, diz Duek.

No entanto, tudo começou a mudar com a ascensão do Instagram por volta de 2015, quando a rede de fotos começou a chamar à atenção do mundo. As legendas com hashtags compartilhadas já começavam a demonstrar um certo padrão (quem não se lembra do ‘Partiu!’) e as fotos já buscavam algum tipo de reconhecimento estético. “A grande questão do Instagram é que o fato do conteúdo ser transmitido principalmente em fotos ao invés de vídeos falados ou palavras escritas já tira um pouco da naturalidade e da espontaneidade do momento. Desde que os primeiros instrumentos de fotografia foram inventados, as imagens são pensadas e produzidas de certa maneira; a pessoa pensa no conteúdo que vai ser produzido antes de criá-lo. Além disso, com um maior número de cadastros, cada usuário começa a se sentir mais vigiado e, consequentemente, vulnerável, muitas vezes relutante em postar algo pessoal ou informal devido ao grande número de visualizações por amigos e familiares”, explica a psicóloga.

Mais recentemente, o Instagram criou os Stories, que consistem em vídeos ou fotos de pequena duração que ficam expostos por 24 horas a fim de que os usuários apresentem mais das suas próprias vivências ao invés de postar apenas o que é produzido. Mesmo assim, muitos famosos enxergaram nessa nova ferramenta um espaço para anúncios, propagandas, e mais interação com assinantes através da interpretação de um ‘personagem’. Para incrementar ainda mais a era volátil, nasceu o chinês TikTok.

Com o início da pandemia de Covid-19, o TikTok se tornou a rede social mais utilizada no planeta, trazendo vídeos curtos sobre os temas mais variados para diversos grupos de usuários. Esse aplicativo viralizou com produções que de fato vinham para apresentar o cotidiano da pandemia, as dificuldades (algo frequentemente escondido nessa era de padrões) e os reflexos do isolamento social. Porém, as famosas trends, correntes de repetição de algum vídeo popular ao redor da plataforma por milhões de usuários, surgiram e cresceram exponencialmente como um reflexo desse novo período no qual os produtores se adaptam às modas mais consumidas pelos fãs para viralizarem na plataforma.

“A internet está atravessando um momento que podemos definir como ‘era do algoritmo’. O reconhecimento e o sucesso nas redes sociais pode ser conseguido se o produtor de conteúdo consegue fazer uso das chaves de cada algoritmo; alguns conteúdos são mais divulgados do que outros, até mesmo por vontade do público consumidor. Aqueles que entendem a maneira de agir, o comportamento nos vídeos, as fotos postadas ou o conteúdo apresentado que rendem mais visualizações e likes conseguem se destacar e alavancar a própria carreira rapidamente”, afirma Duek.

Ela completa: “Um ponto negativo em relação a isso é que os grandes produtores estão deixando de ser reconhecidos por trabalhos autorais, pelas próprias ideias e até mesmo pela própria vida. Muitos youtubers que vendiam o seu dia-a-dia em geral para os fãs, hoje se rendem a trends, roteiros prontos e personagens que em nada lembram as características da própria pessoa”.

Esse comportamento acaba gerando uma dualidade ‘pessoa-personagem’ que acaba transportando essa metodologia até mesmo para outros espaços. Um exemplo é o youtuber Felipe Neto; relatos de fãs e até mesmo amigos afirmam que nos últimos anos, o influenciador age e se comporta de maneira diferente durante o seu cotidiano e até mesmo nos espaços sociais particulares devido a um processo de adaptação que sofreu em suas redes sociais desde 2017. As figuras públicas pensam em tudo antes de fazer um post ou um story, e escolhem cuidadosamente os momentos que devem ou não ser mostrados para a grande massa. Isso cria uma imagem de que todos os momentos vividos vão ser extraordinários, mas infelizmente a vida não é assim. Esse exagero é terrível para quem o acompanha nas redes, porque causa uma pressão desnecessária por uma perfeição que nunca vai ser atingida.

"A busca pela excelência tem consequências significativas para a saúde mental de quem quer atingir esse nível imaginário. A constante comparação entre o fã e o famoso que vemos online pode levar à ansiedade, depressão e baixa autoestima. Muitas pessoas se sentem inadequadas diante das imagens de felicidade constante e sucesso que inundam suas redes. A pressão social para manter essa imagem perfeita online pode ser avassaladora. Além disso, ela pode resultar em uma busca incessante por aprovação e validação em forma de curtidas e comentários, em vez de construir conexões significativas com outros", ressalta Duek.

Outro aspecto crítico é o papel do cyberbullying e da intimidação nas redes sociais, que pode ter repercussões devastadoras na saúde mental das vítimas. O anonimato proporcionado pela internet, frequentemente causa gatilhos e comportamentos prejudiciais, resultando em danos psicológicos graves e, em alguns casos, desfechos trágicos. "É importante ressaltar que a vida perfeita do Instagram é frequentemente uma ilusão; por trás das imagens brilhantes e estilizadas, há uma vida real, repleta de desafios e com muitos altos e baixos em diversas ocasiões", diz Duek.

As redes sociais mostram o que as pessoas escolhem compartilhar, mas raramente revelam os momentos difíceis e as imperfeições. Quando a tempestade chega, com notícias e fatos ruins acontecendo, o público não vê porque os “personagens” não ganham nada mostrando esse tipo de conteúdo. As pessoas que se tornaram "personagens" nas redes sociais são um reflexo da era digital em que vivemos. Elas exploram as possibilidades de se expressar, conectar-se com outros, apenas no intuito de alcançar seus objetivos pessoais e profissionais. No fim, o mais importante é entender que o conceito de ‘vida’ apresentado pelos produtores de conteúdo digital já deixou de ser algo realista e natural há muitos anos, e hoje em dia não há mais motivos para se espelhar no ‘ídolo do YouTube’ ou ‘naquele tiktoker que viaja o mundo inteiro’ para qualquer tipo de projeto pessoal. Compreender isso é um passo que torna a relação do usuário com as redes sociais em uma aproximação muito mais saudável.