Em São Paulo, a rotina de um motorista de aplicativo revela como o trabalho passou a ser guiado por notificações, cansaço digital e um cotidiano moldado pelo brilho constante do celular
por
Carolina Hernandez
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24/11/2025 - 12h

 

Por Carolina Hernandez 

O celular vibra antes que qualquer clarão toque os prédios da Mooca, e essa vibração curta, metálica e insistente desperta Jonas de um sono leve, como se fosse uma convocação, um chamado que não permite adiamentos. Ele estende a mão ainda no escuro, alcança o aparelho, observa a luz que se espalha pelo quarto e lê a notificação do aplicativo que já anuncia alta demanda, fluxo intenso, oportunidade. Nos últimos anos, aprendeu a acordar assim, preso ao brilho do celular antes mesmo de sentir o chão frio sob os pés. O trabalho começa na tela, e não na rua.

No carro, um sedan prata que carrega o desgaste dos dias longos, Jonas encaixa o celular no suporte. O gesto é tão automático que parece parte do ritual de ligar o motor, como se o carro só funcionasse plenamente depois que o aplicativo estivesse ativo. A tela mostra a cidade em azul e amarelo, um mapa vivo onde cada área fervilha com informações que determinam para onde ele deve ir, quanto irá ganhar, quanto tempo deve esperar. O aplicativo calcula rotas, horários, riscos e recompensas, e Jonas respira fundo antes de seguir, como quem aceita que o destino do dia será guiado por aquele retângulo luminoso.

A primeira corrida aparece em menos de quinze segundos. Ele aceita. O carro avança devagar pelas ruas que ainda não despertaram, e Jonas observa o céu sem forma, as luzes dos postes refletidas no capô, o reflexo da tela pressionando seus olhos desde a madrugada. Logo, o trânsito cresce, e a cidade parece surgir inteira de dentro dos celulares dos próprios motoristas, porque ninguém conduz apenas pelas ruas, todos conduzem pelos mapas, pelas notificações, pelas coordenadas enviadas de longe.

A dependência da tela dita o ritmo. Jonas percebe isso a cada minuto. Ignorar uma notificação pode significar perder corridas, perder pontos, perder visibilidade diante do algoritmo. Ele sabe que o sistema registra cada movimento, cada segundo parado, cada mudança de rota, cada hesitação. Uma espécie de patrão silencioso observa sua velocidade, suas notas, seus cancelamentos, suas escolhas. Não há voz, não há rosto, mas há controle. Ele comenta que antes achava que dirigia para pessoas, e hoje sente que dirige para um conjunto de cálculos invisíveis.

O cansaço começa sempre pelos olhos. A luz azulada se infiltra pelas pálpebras como um grão de areia persistente. Mesmo nos poucos minutos de pausa, ele sente o celular vibrar no bolso, chamando de volta, lembrando que há demandas próximas. A Pesquisa TIC Domicílios mostra que o celular tornou-se o principal dispositivo de acesso à internet para a maioria dos brasileiros, mas, para motoristas de aplicativo, é mais que isso, é ferramenta, ponte, segurança, salário e vigilância. Jonas passa mais tempo olhando para a tela do que para qualquer rosto durante o dia.

Os passageiros entram no carro sempre com pressa, sempre conectados a outra conversa que não está ali. Há estudantes que assistem aulas no banco traseiro, executivos que participam de reuniões por vídeo, mães que equilibram sacolas e chamadas, jovens que respondem mensagens durante trajetos de poucas quadras. O carro se transforma em cápsula de passagens breves, onde cada um leva sua própria tela, e Jonas conduz tantas luzes simultâneas que, às vezes, o interior do carro parece mais iluminado durante a noite do que durante o dia.

Ele já ouviu histórias que não estavam destinadas a ele, conversas que vazavam das telas para o espaço do carro, lágrimas silenciosas de quem lia mensagens difíceis, risadas altas de grupos que relembravam memórias por vídeos compartilhados. Jonas sempre percebe que as pessoas falam menos com ele e mais com seus celulares, que olham menos pela janela e mais para notificações. Nos raros momentos de silêncio, apenas as telas respiram, emitindo luzes diferentes em intervalos variados.

No fim da tarde, quando o corpo já pesa, o aplicativo avisa aumento de demanda. Jonas pensa em parar, mas o aviso insiste, promete ganhos extras, sinaliza movimento crescente. Ele encosta em um posto para comprar um café, tenta alongar as costas, tenta piscar devagar para aliviar a ardência nos olhos. O celular vibra antes da primeira golada. Ele volta para o volante. Recusar seria uma escolha, mas uma escolha com consequências. Descanso e trabalho, na lógica do aplicativo, nunca estão em equilíbrio.

A madrugada avança e a cidade se torna uma paisagem de luzes espaçadas, com corredores vazios e poucos ruídos. Jonas leva um jovem que saiu do trabalho no shopping, e o rapaz passa o trajeto inteiro olhando para o celular enquanto mensagens surgem em sequência. Jonas também observa o seu próprio aparelho, que marca a rota até o destino. O carro segue pelas avenidas escuras com apenas as duas telas iluminando o interior, criando um silêncio que parece suspenso no ar.

Quando chega em casa, Jonas desliga o carro, depois o aplicativo, e por fim o celular, que insiste em vibrar com atualizações e resumos do dia. A sala escura o acolhe em um silêncio que chega a parecer estranho, como se o mundo tivesse diminuído de volume. Ele se recosta no sofá e sente o peso acumulado do dia, não apenas o peso físico, mas o peso da luz constante, da atenção exigida, da vigilância permanente que o acompanha desde o amanhecer. O corpo quer descanso, mas a mente ainda repassa rotas, mensagens, barulhos de notificação que permanecem mesmo após a tela apagar.

Amanhã, muito antes de a luz do sol tocar a janela, o celular irá vibrar novamente, e Jonas atenderá, não por escolha, mas por necessidade. Ainda assim, enquanto respira profundamente, sente uma dúvida surgir devagar, como quem desperta de um sonho longo. Ele se pergunta se ainda guia o carro, se ainda conduz o trajeto, ou se apenas segue o ritmo imposto pela tela que nunca dorme. E essa pergunta, ele sabe, continuará voltando. Porque, na madrugada das grandes cidades, o trabalho e a vida estão cada vez mais presos ao mesmo brilho.

Com o avanço do sistema de pedágio eletrônico nas rodovias paulistas, motoristas vivem a combinação entre fluidez no trânsito e incertezas sobre tarifas, prazos e adaptação ao novo modelo.
por
Inaiá Misnerovicz
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25/11/2025 - 12h

Por Inaiá Misnerovicz

 

Dirigir pelas rodovias da Grande São Paulo já não é mais como antes. Com a chegada do sistema free-flow - o pedágio eletrônico sem cancelas -, muitos motoristas sentem que atravessam uma fronteira invisível: não há mais a cancela para frear o carro, mas também não há a certeza imediata de quanto vão pagar. Para Jerônimo, motorista de carro, morador da zona leste de São Paulo que faz quase todos os dias o trajeto até Guararema a trabalho, essa sensação de fluxo e incerteza convive em cada viagem.

Antes da implantação do free-flow, Jerônimo parava em praças de pedágio, esperava, conferia o valor, calculava se valia a pena seguir por um trecho ou desviar. Hoje, ao cruzar os pórticos da Via Dutra ou de outras rodovias, ele simplesmente segue adiante. Só depois, no no aplicativo, descobre quanto foi cobrado, isso quando ele lembra de conferir a fatura. Para quem tem TAG, o débito cai automaticamente, mas para quem não tem, o sistema registra a placa e envia a cobrança que deve ser paga em até 30 dias, sob pena de multa, como prevê a regulamentação da CCR RioSP.

Esse modelo evita paradas e acelera o tráfego, especialmente nas pistas expressas. Segundo a concessionária Motiva/RioSP, quem trafega pelas marginais da Via Dutra (sem acessar a via expressa) não é tarifado. Mas Jerônimo ressalta que essa economia de tempo nem sempre vem acompanhada de previsibilidade de custo: “só sabendo depois quanto foi cobrado, ainda dependo de consultar o site para ver se registrou todas as passagens”, ele diz. A tarifa depende do horário e do dia da semana, pode variar, e para quem usa TAG há desconto de 5%. 

Para tornar essa transição mais suave, a RioSP intensificou ações de orientação nas margens da rodovia e em pontos públicos de Guarulhos. Na capital, promotores usam realidade virtual para explicar como os pórticos funcionam, há vídeos e atendimentos nos postos de serviço. Mais de 500 pessoas já participaram de eventos para esclarecer dúvidas sobre o funcionamento, formas de pagamento e salto entre pistas expressas e marginais.

As novas tarifas também entraram em vigor recentemente: desde 1º de setembro de 2025, os valores para veículos leves nas praças da Via Dutra foram reajustados pela ANTT, e nos pórticos do free-flow os preços também foram atualizados. No caso das rodovias geridas pela Concessionária Novo Litoral - especificamente a SP-088 (Mogi-Dutra), SP-098 (Mogi-Bertioga) e SP-055 (Padre Manoel da Nóbrega) - os valores por pórtico variam de R$ 0,57 a R$ 6,95 para veículos de passeio, dependendo do trecho.

Essa lógica de cobrança por trecho, sem a presença física de praças, exige do motorista algo além de atenção na pista: exige educação para se entender onde entrou, onde passou e quanto isso custou. Para Jerônimo, isso é mais difícil do que simplesmente parar e pagar. Ele admite que, apesar da melhoria no fluxo, teme que algum pórtico não tenha sido registrado, ou que haja diferença entre o que ele acredita ter passado e o que vai aparecer na fatura.

Além disso, há risco real para quem não paga no prazo. A CCR RioSP adverte que a não quitação da tarifa em até 30 dias configura evasão de pedágio, o que pode gerar infração de trânsito, multa fixada e até pontos na carteira. Para muitos, essa penalidade ainda parece pesada diante da novidade e da complexidade do sistema.

Por outro lado, o free-flow traz ganhos concretos para a mobilidade: ao eliminar paradas bruscas nas praças, reduz o risco de acidentes por frenagem repentina e melhora o desempenho das rodovias. A tecnologia permite modernizar a gestão do tráfego, e os pórticos com sensores garantem identificação precisa por TAG ou leitura de placa. Ainda assim, a transformação não se resume à pista. Ela repercute no cotidiano de quem vive dessa estrada, como Jerônimo, e também na forma como a concessionária se relaciona com os motoristas. A campanha de orientação mostra que há consciência de que nem todos se adaptarão imediatamente. As ações de atendimento por WhatsApp, aplicativo, site, totens e até no posto de serviço reforçam a aposta na transparência. 

Há também a perspectiva de que esse modelo se torne cada vez mais comum. Segundo planejamento de concessões futuras, mais pórticos free-flow poderão ser instalados nas rodovias paulistas até 2030, o que tornaria esse tipo de cobrança mais frequente para usuários regulares da malha estadual. Mas para que ele seja efetivamente equitativo, será preciso manter a educação viária, oferecer canais de pagamento amplos e garantir que os motoristas não sejam penalizados por simples falhas de entendimento.

Para Jerônimo, a estrada continua sendo um espaço de tensão e de liberdade. Ele ganha tempo, mas precisa vigiar sua fatura. Ele cruza Guararema, volta para São Paulo, e vive uma experiência nova: a de rodar e pagar depois, sem parar, mas sempre com a incerteza de que quanto passou pode não ser exatamente quanto será cobrado. A cancela desapareceu, mas o pedágio segue presente, só que disfarçado em números, e não em uma barreira física. 

Colunista Marcelo Leite revela que a área perde cada vez mais influência no país
por
Giovanna Britto
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24/11/2025 - 12h

 

Durante a pandemia de Covid-19, o Brasil se reinventou em assuntos a respeito de hábitos higiênicos, debates sobre saúde mental e destacou a importância do jornalismo científico, área  responsável por comunicar à população a respeito das vacinas, o avanço ao combate do vírus e outros assuntos de saúde pública. Entretanto, três anos após o fim do estado emergencial causado pela pandemia, a falta de adesão do público à ciência tem ameaçado o trabalho dos jornalistas desse segmento.

Entre 2020 e 2022, os profissionais da mídia foram expostos ao desafio de comunicar a incerteza científica, traduzir termos e conscientizar a sociedade sobre a pandemia. Muitos jornalistas já eram especializados na área, outros aprenderam a falar sobre ciência devido a alta demanda de notícias para divulgar. A pandemia serviu como ponto de virada para o jornalismo científico - que já existia no Brasil, mas ganhou repercussão graças à necessidade de dar foco ao assunto que ditou o estilo de vida de um mundo inteiro.

Nomes como Atila Iamarino, Natália Pasternak e Álvaro Pereira Júnior se destacaram como grandes vozes da divulgação do jornalismo de ciência. Em entrevista à AGEMT, Marcelo Leite, jornalista e colunista da Folha de São Paulo especializado na área de ciência e ambiente, comenta sobre esse período: “Nunca se valorizou tanto do ponto de vista de espaço, de tempo, de audiência, a divulgação de informações científicas de base para entender o que estava acontecendo.” Hoje, o espaço de fala e a repercussão em temas científicos são menores, uma vez que as pessoas estão cada vez menos interessadas em saber de que forma isso implica em suas vidas pessoais.

Jornalista Marcelo Leite posando para câmera
Formado em jornalismo pela USP, Marcelo também atuou na Revista Piauí e é autor do livro “Psiconautas: Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira”. Foto: Divulgação/Unicamp.

 

Marcelo relembra que o jornalismo científico já sofria com ameaças à sua credibilidade, com falsos especialistas, médicos sem conduta ética e  com o presidente da época, Jair Bolsonaro, reproduzindo falas que levantavam mais dúvidas e ondas de ódio. “Foi um período terrível, e talvez a parte principal, que me deixa mais frustrado, é que o público se dividiu em dois. Uma parte passou  a desconsiderar as informações que a gente, do jornalismo científico, se esforçava por apresentar como informações objetivas, fundadas em dados, com a qualidade que se espera da ciência ", completa.

Na fase posterior à pandemia, após o declarado fim do período emergencial do coronavírus em 5 de maio de 2023, foi possível observar as consequências e heranças que a abundância de informações equivocadas, negacionistas e falsas deixaram na rede de informação, seja online ou offline. Os movimentos anti vacinas, impulsionados durante o Covid, emitiram um alerta para a Organização Mundial de Saúde. Dados divulgados pelo jornal Humanista da UFRGS evidenciam que a cobertura de vacinas contra poliomielite, HPV e sarampo estão em constante queda e sequer atingem a meta em lugares como Norte e Nordeste. 

No anuário de Vacinas de 2025 da Unicef, os dados indicam que até 14 de julho de 2025, a cobertura vacinal dos grupos prioritários permanecia abaixo da meta de 90%: crianças de seis meses a seis anos com 39,5%, idosos com 53,2% e gestantes com 29,8%, correspondendo a menos da metade do público-alvo.

A questão ambiental também é desconsiderada por muitas pessoas. Marcelo afirma que há muitos temas pelos quais o jornalismo científico lutou pelo progresso e que atualmente são banalizados. “se houve alguma dúvida no passado, há 20, 30 anos atrás, hoje não há mais nenhuma dúvida sobre os impactos que estão vindo e virão da mudança climática, cada vez mais sérios. Mas ainda tem gente que questiona.”

Recentemente, casos de metanol que alertaram a população em outubro deste ano, trouxeram uma onda de informações falsas que prejudicaram profissionais da área jornalística e médica, motivando o pronunciamento deles a respeito. Vídeos tentando realizar testes caseiros para identificar a presença da substância nas bebidas, sem comprovação científica, viralizaram nas redes sociais.

Essa situação se assemelha com as polêmicas envolvendo o uso da cloroquina na pandemia. Um levantamento realizado por pesquisadores do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da USP (Cepedisa) em colaboração com a Conectas Direitos Humanos, mostra que, entre março de 2020 e janeiro de 2021 houve pelo menos quatro medidas federais promovendo diretamente ou facilitando a prescrição do medicamento. Jair Bolsonaro foi um dos maiores promotores da cloroquina na época e quem motivou o uso para a população. Apesar de ter sido associada no combate ao Covid, a cloroquina é um medicamento que atua contra doenças inflamatórias crônicas e no combate a parasitas e cuja eficácia de uso para o coronavírus não é comprovada.

O estudo que deu início a essa ideia foi inicialmente publicado na revista científica International Journal of Antimicrobial Agents e assinado por mais de 10 profissionais. Hoje, a editora da revista, Elsevier, anunciou a retratação deste artigo após uma pesquisa aprofundada, com o apoio de um “especialista imparcial que atua como consultor independente em ética editorial”.

Os profissionais continuam exercendo seu trabalho com excelência, alguns optando pela mídia tradicional, outros inovando nas redes através de vídeos curtos. Mas é inegável a forma com que o jornalismo científico perdeu a influência e como falta apoio em todas as áreas. “É muito triste, porque eu dediquei minha vida inteira ao jornalismo científico, para ver isso acontecer no fim da minha carreira” conclui o jornalista.

Após sete anos, evento volta ao calendário impulsionado pelo avanço dos carros eletrificados
por
Fábio Pinheiro
Vítor Nhoatto
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22/11/2025 - 12h

O Salão Internacional do Automóvel de São Paulo, um dos eventos mais tradicionais do setor automotivo brasileiro, está de volta após um hiato de sete anos. A edição de 2025 acontece entre os dias 22 e 30 de novembro, em um contexto de profundas transformações na indústria e impulsionada pela expansão de veículos eletrificados, entrada de novas marcas no país e a necessidade das montadoras de reconectar consumidores às experiências presenciais.

De acordo com a RX Eventos, organizadora da mostra bienal, a volta acontece em razão da reestruturação e aquecimento do mercado. A última edição havia sido realizada em 2018 e contou com cerca de 740 mil visitantes, mas devido a pandemia de COVID-19 o Salão de 2020 foi cancelado. Nos anos seguintes, a volta do evento ficou só na especulação. Segundo a Associação Nacional de Fabricantes Automotores (Anfavea), a pausa também pode ser atribuída à crise de matéria-prima, à retração econômica deste então e ao formato caro para as montadoras que estavam distantes do público.

Embora as duas últimas edições tenham sido no São Paulo Expo, esta acontece no Complexo do Anhembi, casa oficial do evento desde 1970. A mudança foi celebrada por expositores e pelo público, já que o Anhembi permite maior fluxo de visitantes, oferece áreas amplas para test-drive e atividades externas, recuperando a identidade histórica do salão. O retorno também faz parte da estratégia de reposicionar o evento como uma grande vitrine de experiências automotivas, com pistas, ativações e zonas imersivas distribuídas pelo pavilhão.

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Renault anuncia o seu novo carro “Niagara” - Foto: Fábio Pinheiro

Entre as montadoras que vão expor, estão nomes de peso que apostam na ocasião para apresentar novidades ao consumidor brasileiro. A BYD leva ao Salão uma linha reforçada de elétricos e híbridos, aproveitando o crescimento expressivo da marca no Brasil, além de lançar no evento a marca de luxo do grupo, Denza. A rival chinesa GWM também estará presente, com o facelift do SUV H6, o jipe Tank 700 e a minivam Wey 09.

Em relação às marcas tradicionais, a Stellantis vai em peso para o Anhembi. A Fiat, apesar de não ter apresentado nenhum modelo novo, trará o Abarth 600, um SUV elétrico esportivo. A Peugeot terá os 208 e 2008 eletrificados e, principalmente, o lançamento da nova geração do 3008 para o mercado nacional, equipado com o tradicional motor THP. 

Enquanto isso, a Toyota investe na divulgação de novidades híbridas flex, com a chegada do Yaris Cross para brigar com o recém-lançado HR-V, e os líderes Hyundai Creta e Chevrolet Tracker. Juntas, as marcas representam parte do movimento de transformação do mercado brasileiro, que tem apostado cada vez mais na eletrificação e em tecnologias avançadas para rivalizar com a expansão chinesa.

O Salão 2025 também será palco de novas marcas como a Leapmotor, parte do grupo Stellantis. O SUV C10 será o primeiro modelo a chegar às ruas, ainda neste ano, e conta com a versão elétrica (R$189.990) e com extensor de autonomia (R$199.990). O segundo modelo será e o C-SUV elétrico B10, por R$172.990, 60 mil a menos que o rival BYD Yuan Plus, e mais recheado de tecnologia, como teto panorâmico, nível 2 de condução semi autônoma, câmera de monitoramento do motorista e airbag central.

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Presidente da Stellantis para a América do Sul, Herlander Zola, anunciou os planos para o grupo - Foto: Stellantis / Divulgação

Já a britânica MG Motor, propriedade da chinesa SAIC, investirá em esportividade elétrica, além de custo-benefício. O modelo de maior volume de vendas deve ser o SUV S5, rival de Yaun Plus, e igualmente equipado ao B10. Em seguida, o MG 4 chega para rivalizar com Golf GTI e Corolla GR, com mais de 400 cavalos, tração integral, pacote de ADAS completo, e pela metade do preço dos rivais. Por fim, o Roadster será o chamariz de atenção no estande, com portas de lamborghini e em homenagem à tradição da marca. 

O grupo CAOA também fará a estreia da nova marca que trará ao Brasil a Changan, com a chegada prevista para 2026 com os modelos de super-luxo elétricos Avatr 11 e 12, além do SUV UNI-T, rival do Compass e Corolla Cross. 

O pavilhão do Anhembi contará com pistas de test-drive, áreas dedicadas a modelos clássicos como o McLaren de Senna, e até mesmo uma área do CARDE Museu. No Dream Lounge estarão presentes super carros como Ferrari e Lamborghini, além da Racing Game Zone para os amantes de videogame e simuladores de corrida. 

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Área externa do Anhembi terá pista de slalom, frenagem e test-drive de dezenas de modelos - Foto: Salão do Automóvel / Divulgação

Apesar da ausência de marcas como Chevrolet, Ford, Mercedes, Volvo e Volkswagen, 2520 montadoras estarão presentes, incluindo Chery, Hyundai, Mitsubishi e Renault. O Salão espera receber cerca de 700 mil visitantes e a edição 2027 já está confirmada. Os ingressos custam a partir de R$63 (meia-entrada) nos dias de semana.

Projeto aprovado pelo Congresso libera R$ 22 milhões do Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)
por
Helena Barra
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17/11/2025 - 12h

Por Helena Barra

 

No dia 4 de agosto de 2025, o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou o Projeto de Lei 847/2025. O plano, aprovado pelo Congresso brasileiro, regulamenta o uso dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), liberando o valor de R$ 22 bilhões para investimentos nas áreas da ciência e tecnologia.  O FNDCT é o principal instrumento de financiamento público da ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Ele apoia pesquisas científicas, a formação de recursos humanos qualificados, a inovação tecnológica nas empresas, a infraestrutura de pesquisa e o desenvolvimento de projetos estratégicos nacionais.

A professora de economia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Norma Cristina Brasil Casseb, explica que fundos como o FNDCT possuem legislação própria. No caso do FNDCT, segundo dados da FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), os recursos são provenientes de diversas fontes. A composição deles evidencia o importante papel do Estado tanto no direcionamento de incentivos diretos do orçamento público e do tesouro, quanto na garantia de que parte dos lucros obtidos pelas empresas do setor detentor e gerador de tecnologia retorne para a sociedade e permita que ela se desenvolva de forma mais igualitária.

Nas redes sociais, o presidente Lula, afirmou que a medida visa fortalecer a base industrial brasileira. “Com essa medida, vamos fortalecer a inovação nas seis missões da Nova Indústria Brasil e nas Instituições Científicas e Tecnológicas, levando infraestrutura, redes de pesquisa e oportunidades para todos os territórios do país. Investir em pesquisa e inovação é investir no futuro do Brasil”, comentou na divulgação.  Além disso, o projeto também tem como objetivo estimular o emprego qualificado em pesquisa e desenvolvimento, de maneira a ampliar o número de doutores em empresas, startups, parques tecnológicos e instituições de ensino. 

Para Norma Casseb, em um país como o Brasil, com alta desigualdade social e elevada concentração de renda, a liberação deste recurso é importante, não só para a sociedade, mas como para a economia nacional. “Neste contexto, o investimento em tecnologia e inovação, combinado a uma estratégia voltada para a industrialização do país, tem uma alta capacidade de geração de empregos de qualidade especialmente no setor produtivo, permitindo elevação na renda da população e, por consequência, maior expansão econômica”, informa a doutoranda. 

Segundo a Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), representante das instituições financeiras de fomento habilitadas a operar os recursos do fundo, a nova lei marca uma mudança de postura em relação ao uso dos fundos públicos voltados à inovação. Ao garantir previsibilidade e autonomia na aplicação dos recursos, o Brasil se alinha a boas práticas internacionais de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico. 

Em entrevista à Agência Brasil, a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, destacou que, apesar de o FNDCT ter sido criado em 1969, o fundo ganhou maior relevância nos governos do presidente Lula, inclusive no atual mandato. De acordo com o governo, nos últimos dois anos, os investimentos em ciência, tecnologia e inovação por meio do FNDCT aumentaram seis vezes. Saíram de R$ 2 bilhões, em 2021, para R$ 12 bilhões, em 2024. A previsão para 2025 é de cerca de R$ 14 bilhões.

A professora também reforça que o investimento em ciência e tecnologia é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento econômico e social de uma nação. Eles permitem adicionar valor agregado aos produtos brasileiros, além de elevar a produtividade e a competitividade da economia nacional, permitindo que sejam cada vez mais competitivos no comércio internacional.  Além disso, investimentos como o FNDCT podem tornar o País mais que um exportador de produtos de maior valor agregado, mas também um exportador de tecnologia para outros países, que muitas das vezes não possuem capacidade financeira ou de infraestrutura para desenvolverem suas próprias tecnologias.


 

 





 

A tecnologia ajuda a identificar sinais de doenças que humanos não podem enxergar são detectados com facilidade
por
Rafaela Dionello
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04/10/2022 - 12h

Por Rafaela Dionello

 

A "Inteligência artificial" (IA) se refere amplamente a qualquer comportamento semelhante ao do humano apresentado por uma máquina ou sistema. Na forma mais básica da IA, os computadores são programados para “imitar” o comportamento humano usando dados extensivos de exemplos anteriores de comportamento similar. A inteligência artificial não para de evoluir, se tornando cada vez mais eficiente em potencializar o trabalho das pessoas e na medicina isso não vem sendo diferente. Seu funcionamento se baseia na combinação de grandes volumes de dados digitais e algoritmos inteligentes. Respectivamente, eles permitem ao sistema ler e interpretar padrões e informações para aprender automaticamente, esse sistema precisa ser alimentado com novos dados constantemente e para que esse processo aconteça é necessário  combinar diferentes tecnologias possibilitando à máquina a capacidade de imitar o raciocínio lógico de um humano.

Na medicina, ela tem sido celebrada pela sua alta capacidade de analisar dados e auxiliar no diagnóstico de doenças e na recomendação de tratamentos, com a ajuda da inteligência artificial, os pacientes e os médicos podem ser alertados sobre possíveis mudanças na saúde de pacientes meses ou até anos antes que os sintomas apareçam. Através de seu uso o diagnóstico precoce passa a ser uma realidade, aumentando a chance de cura, evitando tratamentos agressivos e aumentando a qualidade de vida do paciente, isso  também permite a redução do custo do tratamento, aliviando o já sobrecarregado sistema de saúde.

O escritor futurista australiano Ross Dawson presume que conforme a modernização dessa tecnologia a medicina que atualmente foca em tratar a doença passará a ser focada na prevenção de tais para que as mesmas nem se desenvolvam,  "A explosão de novas tecnologias e algoritmos desta década aprofundou o aprendizado sobre a inteligência artificial (IA), tornando-a mais eficiente que os humanos no reconhecimento de padrões", declarou em entrevista à BBC Brasil. Seguindo esse pensamento, pode-se perceber o crescimento de empresas focadas na área da prevenção. Uma dessas é a PreviNeo, uma empresa Brasileira localizada em Curitiba especializada na prevenção, diagnóstico e redução de riscos de incidência dos principais tipos de câncer que ocorrem no Brasil.

Para Rinaldo Luiz Guazzelli, um dos sócios da empresa, o que impulsionou a desenvolver o sistema foi a quantidade de diagnósticos tardios, que causam alta taxa de mortalidade, bem como a falta de acesso a serviços de atenção primária focados na prevenção de doenças. O objetivo é prevenir a mortalidade das doenças mais prevalentes e reduzir o custo do tratamento de saúde, através da prevenção e do diagnóstico precoce, conseguindo melhores desfechos clínicos e otimizando os recursos finitos da saúde no Brasil e no mundo.

 “Utilizamos algoritmos de inteligência artificial para estratificar o risco de desenvolvimento das principais doenças crônicas não transmissíveis (câncer de mama, próstata, cólon, pulmão e colo de útero, doenças cardiovasculares e problemas de saúde mental), através de um sistema web-based (cloud). Após a realização da anamnese online nosso sistema gera estratégias personalizadas para redução de risco (seja através da prevenção primária ou secundária), rigorosamente pautadas por rigor científico e, além disso, através de um sistema de Chatbot, navega o cliente para dentro do sistema de saúde para que se torne efetivamente uma pessoa saudável (com mudanças de hábito, realização de exames personalizados pelo seu risco e realização de consultas específicas quando necessário)”, explica.  

Cada paciente responde a um questionário com perguntas sobre seu histórico médico, hábitos e costumes. O sistema da PreviNeo aplica algoritmos com inteligência artificial para estratificar os riscos associados a este paciente, A empresa conta com dezenas de artigos científicos que embasam nossos resultados. “É importante mencionar que nossa ferramenta não apresenta um diagnóstico médico, mas sim uma forma de estimar probabilidades e atuar de forma preventiva. O resultado é fundamentado nos chamados “fatores de risco conhecidos” e que, uma vez existentes, aumentam a estimativa de risco de desenvolvimento da doença.”, ressalta Rinaldo. 

Ao terminar de utilizar o sistema, o paciente recebe um resumo personalizado que inclui os níveis de riscos, os exames recomendados e outras informações pertinentes, incluindo um plano de ação. Ainda, apresentamos uma escala (de 1 a 10) que indica o nível de atenção que o paciente deve dedicar ao plano de ação apresentado. O que a PreviNeo busca é induzir comportamento, a adoção de hábitos saudáveis, consultas médicas periódicas e a realização de exames preventivos são os passos que devem ser seguidos por todos os pacientes.

O mercado bilionário e ilegal que sustenta famílias ao redor do Brasil
por
Eshlyn Cañete
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29/09/2022 - 12h

Por Eshlyn Cañete

Entre o Brasil e o Paraguai, há um muambeiro. Por definição, é o indivíduo que, por profissão ou para equilibrar suas finanças, se dedica ao comércio de bens, contrabandeados ou não, sem pagar impostos. Mas, quando perguntam para Rose Luz de 50 anos o que ela ‘’faz da vida’’, ela sempre responde que é vendedora de importados. Já são mais de 25 anos nessa profissão instável e, segundo Luz, ela já foi do luxo ao lixo.

              Tudo começa com contatos. Um muambeiro sempre tem o celular cheio de clientes, geralmente donos de loja de eletrônicos na Santa Ifigênia, procurando por fornecedores. Um depende do outro, o empresário quer mercadoria sem imposto e o muambeiro precisa da comissão, geralmente de 15%, para sobreviver. Uma lista é feita com tudo que o comerciante deseja, celulares, notebooks e pen-drives são os mais pedidos. E, logo, fecham negócio, muitas vezes a compra é enorme e custa milhares de dólares.

               No início, um muambeiro precisa investir. Muitos começam com 2 a 5 mil reais e arranjam contatos com conhecidos. Quando o ‘’vendedor de importados’’ não mora em Foz do Iguaçu, ele tem que viajar até a cidade para poder atravessar a fronteira. No caso de Rose Luz, são 3 horas de viagem de carro. O dinheiro da gasolina é dividido entre outros muambeiros de Ubiratã-PR. A ida é a parte mais tranquila. Sem ansiedade, porém sempre em contato com o cliente para não comprar algo errado.

              Chegando em Foz, eles almoçam em um restaurante barato na Vila Portes, bairro mais perto da fronteira. Nesse tipo de trabalho, não há horário de almoço, muito menos vale-refeição. E, logo depois, já atravessam a Ponte da Amizade a pé. O caminho dura cerca de 20 minutos e já estão no Paraguai. Chegando lá, vão procurar a casa de câmbio mais barata para trocar o real em dólar. A cotação do dólar não preocupa só os investidores da Bolsa de Valores, todos os dias os compradores de eletrônicos no PY monitoram cada centavo e rezam pela queda da moeda estadunidense.

              Há várias lojas de tecnologias, mas umas são mais procuradas que outras. No caso dos muambeiros, a possibilidade de comprar mais barato em atacado chama bastante atenção. É o caso das lojas que ficam no Shopping LaiLai, dominada por donos árabes. Eles compram iPhones, iPads, Notebooks de última geração para seus clientes, coisas que dificilmente conseguem comprar para si mesmos. Depois de completarem todos os pedidos dos clientes, a separação é feita para levarem no máximo 500 dólares de cada vez. E, assim, vão e voltam de Kombi de Ciudad de Leste à Foz do Iguaçu. Separam os eletrônicos, escondem na Kombi em sacolas escuras, atravessam a ponte torcendo para nenhuma fiscalização parar. Na tentativa de esconder objetos pequenos, Jeferson Cabrel, 30, conta que já escondeu cartão de memória dentro da calça.

              Quando toda essa mercadoria chega no Brasil, eles vão guardando uma por uma em carros velhos, porque, caso a polícia pare, o prejuízo do carro não será tão grande. O esconderijo mais famoso é atrás do banco de passageiro e um verdadeiro jogo de quebra-cabeça é feito para tudo caber dentro de um Monza. A viagem é feita cheia de agonia e 3 horas até Ubiratã parecem demorar dias.

              Chegam no interior e já compram a passagem até São Paulo com o motorista camarada para colocar tudo dentro no bagageiro do transporte. São mais de 14 horas de viagem, e muito tempo na estrada é sinal de perigo. O inimigo continua sendo o policial, que ao fazer seu trabalho de acabar com o contrabando, tira o ganha pão de muitas famílias.

              Rose Luz é uma mulher, mãe de dois filhos e ser muambeira é a única coisa que conseguiu fazer. Nascida no interior do Paraná, foi criada no meio rural. Não chegou a terminar o Ensino Fundamental, aprendeu o suficiente para saber ler, escrever e fazer cálculos básicos. ‘’Para ser muambeira, precisa ser boa em matemática, porque os donos de loja são bem espertinhos, estão sempre tentando dar calote na gente’’, afirma ela.

              A família Luz costuma dizer que a muamba está no sangue. Rose é a irmã mais velha de 6 irmãos, e todos, sem exceção, possuem a mesma profissão. E, atualmente, mais da metade dos filhos estão nesse mesmo meio.

              A história de Rose Luz já passou por altos e baixos. Em seus melhores anos, conseguiu construir a casa própria, tinha uma camionete vermelha e se vestia somente com roupas das melhores boutiques. Entretanto, em seu período mais complicado, ela foi presa, perdeu mais de 5 mil dólares e o carro que ela comprou para levar as mercadorias do Paraguay até sua cidade foi confiscado pela polícia. ‘’ Foi difícil ver minha mãe no jornal como uma criminosa’’, conta a filha de Rose, chamada Natália Luz de 24 anos, que na época tinha 14.

              Estampada no jornal impresso junto com bandidos, Rose afirma que se sentiu muito envergonhada. ‘’Me chamaram de contrabandista, não gosto desse termo, disseram que eu podia ficar muito tempo na cadeia. Sempre soube do risco, mas imaginei que isso só acontecia com quem levava cigarro’’, afirma. Porém, logo no dia seguinte, já foi liberada porque a família toda ajudou a pagar a fiança.

              Uma mãe ou um pai que sustenta sua família através do dinheiro que o contrabando permite é, consequentemente, um responsável ausente. Isso porque são horas de viagens por semana e os filhos acabam vendo os pais apenas nos intervalos de cada ida ao Paraguai. ‘’Lembro de passar minha infância com minha irmã mais velha. Quando minha mãe não estava no Paraguai, ela estava em São Paulo. Chorava de saudade e sentia muito medo de ela ser presa ou sofrer algum acidente na estrada’’, diz Natália Luz.

              O contrabando continua sendo um dos mercados mais lucrativos do país, conseguindo faturar bilhões por anos. No primeiro semestre de 2021, foram apreendidas mais de R$ 2,4 bilhões em mercadoria, ou seja, 64% maior que o ano de 2020. As práticas criminosas nocivas estão cada vez mais ganhando espaço no Brasil e um dos principais motivos também é o alto índice de desemprego.

A tecnologia veio para impactar a produção de alimentos orgânicos
por
João Pedro Lindolfo
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18/10/2022 - 12h

Por João Pedro dos Santos Lindolfo  

“O agricultor é um cientista”. A frase de Luís Barbieri, um dos idealizadores da Folio e cofundador da Raiar nunca fez tanto sentido, especialmente nos dias de hoje, em que, cada vez mais, o mercado de produtos orgânicos cresce e toma o espaço no dia a dia do consumidor brasileiro. O motivo por trás disso é principalmente pelo aumento da produção dos alimentos orgânicos e a facilidade de obtê-los atualmente e isso se deve ao fato de que a produção dos produtos no mercado orgânico e a tecnologia estão andando lado a lado, priorizando a diminuição da distribuição de produtos denominados transgênicos, ou seja, alimentos geneticamente modificados.

 O maior problema dessa inovação tecnológica na agricultura orgânica é a falta de auxílio para o produtor menor. Embora a tecnologia seja um amparo para os produtores, a posse de algo tão novo não é acessível a todos e é aí que quem se beneficia mais desse avanço tecnológico são os grandes produtores, já que possuem condições de arcar com os custos da compra de máquinas e não irão sofrer prejuízos com isso. Até porque, com a lei de oferta e demanda, a produção aumentada sempre irá causar uma diminuição nos preços dos alimentos. Para o produtor menor, que não possui qualquer forma de reduzir o custo da produção com a tecnologia, a diminuição dos preços resultará em um impacto forte em sua receita.

Se for resumir, existe duas lógicas na produção orgânica de alimentos. Primeiro a da produtividade, em que pouco importa qual tipo ou qual tecnologia se usa na produção, o que importa no final é apenas se a tecnologia conseguiu reduzir os custos operacionais e o lucro obtido no final. Ou seja, é como se esses benefícios da tecnologia ficassem apenas para o produtor. Por outro lado, tem a lógica da sustentabilidade, que se ver de um modo geral, é a mais focada em realmente mostrar o lado bom da agricultura orgânica. A tecnologia precisa ser vista como uma forma beneficente ao consumidor também, de um modo em que o consumidor sinta o benefício da tecnologia no alimento. Essa lógica é muito usada por produtores engajados em causas coletivas, em que o consumo de orgânico seja um importante fator e assim mostra ao produtor que a tecnologia já passou de um ponto de vista de sobrevivência e é na verdade um fator estratégico para se diferenciar na mente do consumidor e no mercado de orgânicos.

Para pequenos produtores, a tecnologia ajudou muito mais do que aparenta. Como afirma Ricardo Pedrosa, produtor de 42 anos, um aparelho pequeno como celular já pode ser considerada uma tecnologia de suporte aos produtores de orgânico, de forma que ajuda a divulgar o feirante que vende seus produtos e consequentemente ele recebe seu reconhecimento como o produtor daqueles alimentos. Ricardo diz que já usou sim aparelhos como chips, drones, mas que não se aprofundou muito e prefere ainda o método mais tradicional, que embora seja mais duradouro, para ele, é uma forma mais segura de seguir com seu trabalho. Para Ricardo, entre a roda de agricultores orgânicos, a maioria decidiu seguir pelo caminho da tecnologia e afirma que é inevitável que o mercado geral de orgânicos irá seguir pelo caminho da tecnologia. "No começo, quando comecei a usar o celular não apenas para uso pessoal e sim para o trabalho foi complicado, pois não estava nem um pouco acostumado com a tecnologia. Porém o tempo foi passando e percebi que esse pequeno aparelho não tinha outra função além de ajudar no meu trabalho. Comecei a divulgar nas redes sociais, usar como forma de contato com outros produtores e até questões como anotar pontos importantes do que estava acontecendo na produção", afirma Ricardo.

De um ponto de vista do futuro, a tecnologia possui muitas falhas presentes e visíveis na sociedade atual, porém, para a comunidade orgânica essas falhas não se encaixam, de forma que projeções só mostram como a tecnologia no futuro apenas irá auxiliar o produtor tanto pequeno quanto grande.

As tecnologias utilizadas pelos povos indígenas como maneira de perpetuar sua cultura e seus costumes
por
Isadora Verardo Taveira
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18/10/2022 - 12h

Na chegada dessa casa

Na chegada dessa casa

Foram todos aos meus cuidados

Eu abalei foi um pé de rosas

Que nunca foi abalado

 

Dia três de setembro de dois mil e vinte dois, Museu das Culturas Indígenas, São Paulo. Celebra o toante - uma canção de sua mãe - Josi para Yvoty, mulher indígena que vive no contexto urbano. "A gente está lá resistindo, todo dia, e reafirmando todo dia esse território que também é nosso. Território que cresceu e foi levantado por mãos indígenas, assim como o estádio do Morumbi.” Assim como Josi, outras cento e oitenta famílias vivem na comunidade Real Parque no bairro do Morumbi, zona sul da cidade de São Paulo - totalizando em média mil e cem pessoas. Ser indígena e viver rodeado de concreto, na quarta cidade mais populosa do mundo é a constante realidade de “Sofrer preconceito dentro de uma UBS, das pessoas acharem que direito é privilégio.” - relata Josi. Privilégio contraditório esse, que silencia e invisibiliza povos originários que carregam mais de quinhentos anos de história e resistência em um país marcado pela colonização e responsável pelo extermínio em massa de etnias desde a invasão.

De acordo com Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 11.918 indígenas vivem na zona urbana do município de São Paulo e 1.059 habitam a zona rural. A negligência de direitos básicos de qualquer cidadão é parte do cotidiano, desde pautas ligadas à educação até questões de saúde pública. Durante o período mais violento da pandemia do coronavírus, foram relatadas dificuldades de acesso às vacinas por comunidades indígenas, assim como episódios racistas dentro de Unidades Básicas de Saúde. Em depoimento para a página da Câmara Municipal do Estado de São Paulo, o advogado Augusto Pessin afirma que esse é um fato social da mais extrema gravidade, com o impacto em possivelmente centenas de milhares de pessoas que tiveram negado o acesso ao direito comprovadamente devido pelo STF. 

Lidar com o cotidiano e enfrentar a realidade cruel de um País estruturalmente racista e preconceituoso é a escalada constante de construção de tecnologias e mecanismos que possibilitem a sobrevivência, de maneira relutante para que a cultura e as tradições não se despedacem dia após dia - do mesmo modo que foi imposto durante muitos anos e ainda é. Mesmo vivendo em uma conjuntura política e social contrária de seu modo de vida, os povos indígenas batalham para que seus costumes não se percam mesmo dentro de um contexto urbano, utilizando os avanços tecnológicos para impulsionar e dar mais voz e visibilidade às comunidades. “É possível preservar grande parte dos costumes indígenas mesmo com interferência do mundo contemporâneo. O indígena está começando a usar o ciberespaço para fazer processos de retomada, registro, preservação e divulgação da sua cultura.” - afirma Alexsandro de Mesquita, mestre e doutor em tecnologias indígenas pela PUC-SP e indígena do povo Potiguara. 

Alex conta sobre o projeto em parceria com a ONG Thydêwá, um programa desenvolvido para que povos indígenas da região do nordeste brasileiro pudessem criar e desenvolver textos que manifestem seu modo de vida e também alcancem uma maior visibilidade através da Internet, em formato de livros digitais. “Lendo essas obras feitas pelos indígenas, é possível perceber que realmente eles vem fazendo um processo de retomada da sua história, registrando elas no meio digital e divulgando para todos aqueles que possuem acesso.” Além da possibilidade de preservar esses relatos históricos, o uso das tecnologias contemporâneas como meio de resgate de uma tradição secularmente apagada é extremamente essencial para perpetuar a cultura dos povos originários. “Esse projeto fez com que os jovens passassem a querer conversar mais com seus pais e com seus avós, para descobrir mais sobre a questão do modo de vida, de como é a história e como nós estamos aqui”, completa Alex. 

Muitas vezes, como forma de deslegitimar os conhecimentos originários, termos corriqueiros e formas de banalização são utilizadas para se referir às tecnologias e conhecimentos indígenas. Em entrevista para o jornal Outras Palavras, João Paulo Lima Barreto, do povo Yebamasã, afirma que o conhecimento indígena não é melhor nem pior: é diferente. “Mas nas universidades há uma relação assimétrica. Daí vem todo um palavreado que é criado para o nosso modelo de conhecimento”. Expressões como sagrado, espírito, rezador, benzedor, são constantemente utilizadas para reduzir o conhecimento a uma simples “alternativa”. “Não temos um conjunto de saberes tradicionais, temos medicina indígena”, exclama Barreto. 

 Metaverso, realidade virtual, carros de última geração, robôs que se confundem com seres humanos. Assim como a tecnologia avança e criações denominadas como “progresso e evolução”, dentro das florestas no coração do Brasil e inclusive em contextos urbanos, as tecnologias originárias encontram seu pedacinho de espaço como forma de resistir dentro de um sistema cruel. Sustentabilidade, medicina, espiritualidade, política, conhecimento sobre as mais complexas particularidades do universo, ciência em seu estado puro e bruto. Conhecimentos esses que são deslegitimados dia após dia, por um país que dizimou etnias e povos que perderam tudo e só queriam o direito de existir. Se adaptar assim como a humanidade é inerente a qualquer povo, independente de seus costumes ou tradições, e esperar que isso não aconteça é - mais uma vez - um olhar colonizador. Alex termina pontuando que “Toda cultura passa por transformações. Toda sociedade vai passar por transformações culturais, então o fato do indígena deixar de praticar uma ação que ele fazia há quinhentos anos atrás não faz com que ele perca suas características”. 

 

Com o domínio tecnológico portas para um mercado mais acessível se abriram
por
Jessica Midori
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18/10/2022 - 12h

Por Jessica Midori

A condenação da tecnologia, comum argumento para justificar inúmeros problemas sociais, é a prova de que muitos ainda estão alienados, ou em estado de negação, do domínio que ela tem sobre todos nós.  Esse fato gera um debate a respeito dos prós e dos contras da inserção das redes nas nossas vidas, que não deixa de fora o trabalho e o comércio. Se ouve falar sobre como a dependência digital é um caminho irreversível, podendo até ser prejudicial a longo prazo, principalmente ao trazermos à conversa o conceito de comprar sem precisar sair de casa, porém ao dialogar sobre um assunto que envolve milhares de pessoas, é necessário ouvir ambas as partes da pauta em questão e se perguntar “a tecnologia atrapalhou mesmo, de modo geral, o comércio?”.

Mayane Pinheiro, fundadora da loja virtual de roupas MTRINDADE STORE, quando iniciou o seu negócio era apenas uma estagiária, que no período de pandemia buscava uma fonte de renda extra. Sem experiência com vendas e recém-formada, a jovem encontrou no Instagram uma oportunidade de abrir a sua própria boutique, baseando-se nas lojas as quais ela mesma comprava e seguia em seu perfil pessoal. Conta que, como mulher, sempre estava comprando roupas novas, gostava de usar a moda do momento e se interessava pela ideia de tirar fotos para loja, então estudou pra começar e entender o que deveria ser feito. Nisso tudo, teve que escolher onde iria vender, e logo pensou no Instagram, pois, é uma plataforma imensa para qualquer mercado, e é onde as pessoas estão sempre conectadas, e ela sabia que veriam seu produto e também poderiam falar com ela através do WhatsApp.

O crescimento do comércio digital se deu exatamente pelo fato de que este é uma opção mais acessível, baseando-se na sua experiência pessoal, como comprador, é possível ter ideia o suficiente do que o mercado procura, como fazer uma divulgação do produto e como se comunicar com clientes. Ela destaca que as redes sociais são os lugares que os empreendedores estão colocando a cara pra divulgar seus produtos, assim como as pessoas que estão o tempo todo online também buscam o que desejam nessas plataformas digitais, porque querem ver o que é postado, o que é comentado, entre outras. Além disso, o baixo custo da venda online é uma grande vantagem para aqueles que estão começando um novo negócio ou estão entrando no mundo do empreendedorismo pela primeira vez.  Ainda, conta que naquele momento inicial o comércio online, pessoalmente, era o mais barato, porque a pouparia de alguns gastos, como aluguel, energia, água e etc… e ao vender online, poderia ter um estoque em um local que já estava sendo utilizado por ela, com a luz e água que já usava.

Com a tecnologia houve uma democratização do empreendedorismo, assim muitas pessoas que estavam desempregadas, insatisfeitas com o seu cargo atual ou até mesmo buscando uma fonte de renda extra, encontraram nas plataformas digitais a solução de seus problemas. Mayane acredita que hoje o empreendedorismo seja para todos, porém, é necessário coragem e persistência para entrar nesse mundo, porque será bem diferente do seu trabalho cotidiano, principalmente com uso da tecnologia. Uma das vantagens é que o comércio digital não se limita a uma área especifica ou depende de uma formação em particular, por isso que ele é tão inclusivo, queira seguir o ramo da gastronomia, moda, beleza, ou dos serviços, no mundo digital tudo é possível.

Alessandra Leite, advogada e fundadora da empresa de consultoria GLOBAL TO BE, encontrou nas plataformas digitais a oportunidade de deixar o seu cargo de muitos anos, como funcionária de uma empresa, para seguir o seu caminho de forma autônoma e abrir a sua própria companhia. Juntando sua experiência com a disponibilidade de divulgação que as redes sociais oferecem, nasceu um novo negócio. Sobre a empresa, ela conta que é um serviço autônomo que surgiu após quase 15 anos trabalhando como funcionária em consultoria, desde estagiária até diretora. Com a experiência que ganhou acreditou que poderia fazer a mesma coisa, mas dando um atendimento mais personalizado, com custos menores, sem a massificação do atendimento das grandes consultorias em que o consultor mais experiente atende apenas as grandes contas e os clientes menores são atendidos por pessoas em treinamento. Afirma que a incorporação das plataformas digitais foi uma forma de apresentar permanentemente o seu trabalho, por ela não ter um nome consolidado no mercado, e assim, criar uma identidade profissional. 

Nos tempos atuais, no contexto pós pandemia, será possível escutar de muitos que a possibilidade de comprar e vender online salvou as suas vidas durante os quase dois anos de isolamento social. A praticidade que a internet ofereceu, ampliou as portas do empreendimento, e nesse contexto muitos que estavam perdidos encontraram um ticket para adentrar um novo negócio, o seu próprio negócio.

Alessandra sugere, do seu ponto de vista, que o empreendedorismo cresceu como uma alternativa ao conceito de emprego que estávamos acostumados ao longo das décadas. Como muitas gerações nasceram e cresceram vendo seus pais trabalhando como funcionários de empresas de segunda à sexta em horário das 8 às 17, isso era o normal, e empreender era visto como uma opção àqueles que não tem mais emprego. Mas, com o avanço na área, muito também pela diminuição dos empregos formais, por causa da modernização e automação da produção, as pessoas se viram obrigadas a recriar e abrir seus próprios negócios, o que tem formado uma nova geração. Isso tudo vai moldando novos hábitos e um novo mercado de trabalho surge daí, no qual a tecnologia é essencial e ajuda a mapear negócios, estudar a distância, fazer contatos com clientes, etc, coisa que há alguns anos não era possível.

O sucesso dessa nova forma de comprar e vender foi tão visível, que mesmo após o fim das restrições sociais e a reabertura das lojas físicas, muitos vendedores optaram por manter a face virtual de seu negócio. Com alguns utilizando ambos os meios para desenvolver o seu comércio, e outros substituindo totalmente o espaço físico e adotando o espaço online como único meio, como ocorreu com muitos restaurantes que hoje só atuam através do serviço de delivery.

Thaisy Gomes, fundadora da loja VIPY COSMÉTICOS, além de conquistar autonomia ao deixar de trabalhar na loja do seu irmão e dar início no seu próprio empreendimento, encontrou nas redes sociais uma forma de elevar o seu comércio e ampliar a sua rede de consumidores. Ao disponibilizar, além da já existente loja física, o serviço de entrega para todo o Brasil, ela percebeu que o seu negócio ganhou mais visibilidade e a procura por seus produtos aumentou, com a praticidade da compra online. Relata que ideia surgiu através de uma pesquisa de mercado, na qual foi identificado que no bairro e região não tinha loja voltada para produtos de cosméticos, cuidados pessoais e beleza. Ela sempre acreditou que o comércio digital é um cenário positivo para todos os ramos e portes de empresas, pois ampliam oportunidades de venda, e foi com esse pensamento que decidiu criar um perfil no Instagram para a loja.

Com a sua experiência como consumidora, Thaisy foi aplicando seus conhecimentos e aprendizados pessoais no seu negócio, filtrando os pontos positivos e negativos de cada tipo de comércio, tanto o físico quanto o online, para então selecionar quais pontos gostaria de incorporar no seu empreendimento, visando satisfazer as vontades do cliente.

Ao analisar as diferenças da loja online para a física percebeu que ambas possuíam qualidades que poderiam ser somadas para criar um ambiente de compra e venda mais equilibrado, por exemplo, no virtual há a possibilidade de uma maior e mais rápida divulgação, trazendo visibilidade aos produtos, os custos e os investimentos necessários para tocar o negócio também são menores, a jornada de trabalho pode ser mais flexível e há a vantagem de atender uma área geográfica maior. O comércio físico traz um ar mais pessoal, mais acessível à loja, com os clientes sendo na maioria moradores do bairro e região, também há a possibilidade do contato físico do cliente com produto. Ao colocar essas diferenças lado a lado, é notável a vantagem que o digital possui, por isso que mesmo após a reabertura das lojas físicas ela escolheu manter a opção do atendimento online.

Pode-se afirmar que o comércio digital revolucionou o empreendimento, e a economia no geral, e é em tempos de isolamento, como a pandemia, que esse fato se torna mais incontestável. A prova dessa mudança é a permanência, e cada vez maior crescimento, dos comerciantes independentes que aparecem no nosso feed, seja no Instagram, Tik Tok, Facebook, e por todas as plataformas digitais. Esse novo mercado mudou os conceitos de quem pode e não pode ser dono do seu próprio negócio, e talvez essa possa ser uma das maiores e mais importantes mudanças atuais, pois não mudaram somente a vida de três mulheres brasileiras, mas de muitas pessoas no mundo inteiro.