“Lobby do Batom” surgiu em 1986 como uma aliança nacional de 26 mulheres que foram eleitas por voto direto. Elas revolucionaram um espaço masculino e atuaram na Constituição de 1988 com a inserção afirmativa de direitos femininos representativos. Até a década de 1980, o espaço conquistado pelo Lobby era de Carlota Pereira, a única mulher participante da Assembleia Constituinte de 1934.
Até 2022, a parcela ocupada por mulheres na Câmara dos Deputados era de 15% e no Senado, 14%, de acordo com o site do Congresso Nacional. Há 36 anos, a porcentagem era muito menor: 5,3% do corpo parlamentar. Apesar do número inferiorizado, para aquela época, a conquista da participação parlamentar de advogadas, médicas, jornalistas, professoras e outras profissionais dentro do Congresso foi expressiva.

Maria Ruth dos Santos, Comba Marques Porto e Benedita da Silva, que já eram atuantes e estudiosas do movimento feminista no Brasil, foram convidadas a participar de um Congresso patrocinado pela Organização das Nações Unidas (ONU), realizado no Rio de Janeiro, nos anos 1970, uma década antes da criação do Lobby do Batom.
O evento reuniu feministas e militantes da causa para discutirem o papel feminino dentro da sociedade brasileira. O sucesso foi grande e, ao longo dos anos, as intelectuais criaram grupos de estudo para revisar o Código Civil vigente desde os anos 1920 e participaram de sindicatos por todo o país.
CRIAÇÃO DO NOME
O “Lobby do Batom” foi idealizado satiricamente por jornalistas homens do Jornal do Brasil, que nomeavam o batom como a única representação respeitada de uma mulher.
As primeiras ondas feministas procuravam se distanciar da feminilidade estruturada pelo salto alto e maquiagem. Por isso, algumas integrantes ainda atuantes não concordaram com o nome do movimento, mesmo que ele tenha revolucionado a participação feminina na política. Isso porque a referência a batom remetia a um símbolo de fragilidade.
“Fui uma feminista contra o sistema, contra uma mentalidade, mas, principalmente, contra uma realidade”, afirma Silvia Pimentel, professora de filosofia do Direito da PUC-SP e integrante do movimento feminista nos anos 1980. A intelectual conta como a experiência de conhecer mulheres de tantas regiões do Brasil permitiu que as reivindicações de cada uma fossem incluídas na Carta Constituinte. “Elas me perguntavam, ‘O que vocês vieram fazer aqui no Sertão da Bahia, querer ouvir da gente?’, e era muito bonita a experiência porque eu dizia que ‘a gente veio ouvir de vocês, o que é que as mulheres brasileiras do Sertão precisam’”, conta a integrante do Comitê para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher na ONU durante os anos de 2005 e 2016.
As pautas de 1975, como foram chamadas as reivindicações levantadas naquela época, colocaram em questão, além da resistência pela luta do direito ao voto - defendida pela primeira onda do feminismo -, temas como a violência doméstica, a concepção hierárquica familiar e direitos reprodutivos, inclusive a descriminalização do aborto.
Nas votações diretas de 1986, dos 559 deputados eleitos, 26 cadeiras foram compostas pelo grupo feminino. Após 20 anos de regime autoritário, a Constituição estava em processo de revisão e foi o momento prático em que as ativistas conquistaram espaço na elaboração da nova Carta.
Com o sucesso das lutas e dos congressos ao redor de todo o Brasil, elas conquistaram um Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres (CNDM), projeto federal que reforçou o nome feminino na Assembleia Constituinte e serviu de subsídio para mais de mil mulheres no dia 26 de agosto de 1986 elaborarem a Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes.
Dentro e fora do Congresso, o CNDM organizou a campanha “Mulher e Constituinte”, que tinha o slogan “Constituinte Pra Valer Tem Que Ter Palavra De Mulher”. Assim, ao ganhar reconhecimento, o órgão trabalhou junto aos parlamentares constituintes pela reivindicação da eleição de mais mulheres para a elaboração da nova Carta Magna, e incluiu as 26 eleitas no processo, em 1987.

“O que foi notável é que a luta não se limitou a nós mulheres, não às suas especificidades, elas mostraram que essa conquista nos coloca dentro de um contexto mais amplo das questões gerais da Democracia que interessam a todos, homens e mulheres”, conta Silvia sobre a importância da participação das mulheres no texto jurídico. Ela afirma que essa conquista foi “a mais ampla e profunda articulação reivindicatória feminina brasileira".
Um marco histórico da política da mulher grandemente influenciada pela teoria e práxis feministas dos 10 anos anteriores a 1986, conduziu a representação da mulher urbana e a mulher rural; a mulher dos meios acadêmicos, a semi analfabeta e a analfabeta; a branca e a negra; a jovem, a madura e a idosa; a trabalhadora e a dona de casa; patroa e empregada; a casada, a companheira e a mãe solteira; a bem assalariada e a explorada.
MUDANÇAS IMEDIATAS
Silvia relembra com muita facilidade de alguns feitos realizados pelas militantes logo após a promulgação da Constituição de 1988: “Nós conseguimos repetir no artigo 226, no caderno matrimonial, que homens e mulheres tivessem igualdade na condição na família. Que mulheres não fossem designadas apenas ao trabalho doméstico. Inserimos no parágrafo oitavo deste artigo, a responsabilidade e obrigação do Estado coibir qualquer tipo de violência doméstica”. Outras também foram relevantes, como a licença-maternidade de 120 dias, ações para combater a violência doméstica, igualdade salarial entre homem e mulher e o direito à posse da terra igual ao homem e à mulher.
Na escritura da Carta, as mulheres apresentaram 3.321 emendas – 5% em relação ao total apresentado por todos os deputados e senadores (62 mil aproximadamente). Entre as conquistas da questão feminina, 80% foram aprovadas.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 1.463 mulheres foram assassinadas em 2023 em decorrência, principalmente, de violência doméstica. Em comparação ao ano anterior, no mesmo período, o aumento deste tipo de crime foi de 1,6%.
Desde 2015, quando a Lei foi sancionada, 10.655 mulheres perderam a vida.

O relatório ainda aponta que o estado mais violento para uma mulher foi o Mato Grosso, enquanto que os com menores índices foram São Paulo e Amapá. O Ceará, apesar de líder das mais baixas taxas do crime de feminicídio do país, passa por uma crise de subnotificações, em que casos estão sendo registrados apenas como homicídio, distorcendo a realidade dos dados. Essa situação agrava o real mapeamento da situação e compromete a eficácia da Lei.
Já em São Paulo, apesar de menores ocorrências em comparação às outras unidades federativas, houve um aumento de 13,3% quando comparado ao ano de 2022. Isso coloca a região sudeste como a que mais avançou negativamente no assunto.

O que é feminicídio?
Segundo a legislação, é considerado feminicídio o assassinato de mulheres cis em decorrência de violência doméstica, familiar, menosprezo ou discriminação à condição de ser mulher.
A pena varia entre 12 a 30 anos e é considerado um crime hediondo, isto é, de natureza grave, sem possibilidade de anistia, fiança, graça ou indulto.
Infelizmente, apenas a Lei Maria da Penha compreende as mulheres trans - o que também é um direito conquistado recentemente (em janeiro deste ano).
Estado, substantivo masculino e opressor
Em meio a este cenário, cada vez mais preocupante e aterrorizador, é preciso que medidas efetivas sejam tomadas e que culpados sejam nomeados e responsabilizados. A começar pelo Governo.
Apesar do aumento do número de feminicídios, o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas, congelou os investimentos destinados ao combate à violência contra a mulher. Essa decisão não só não freou os índices de mortes, como pode ter contribuído ativamente para o aumento de casos de estupro, também em alta nos últimos anos.
Além disso, as delegacias da mulher sofreram para operar com apenas 3% do valor que deveria ter sido entregue conforme a Lei Orçamentária Anual, isto é, R$ 24 milhões.
Quem somos nós?
Os dados mais recentes que analisam o perfil das vítimas são do ano de 2022. Nele, ficou comprovado que a maioria das mulheres assassinadas tem entre 18 e 44 anos, cerca de 71,9% do total analisado.
Além disso, mulheres pretas e pardas continuam em um lugar de maior vulnerabilidade e constituindo a maioria das vítimas.
Quem são eles?
Os assassinos quase sempre são companheiros atuais ou ex-namorados/esposos. A minoria deles é desconhecida pela mulher, o que nos leva a perceber que em nossos lares, onde mais deveríamos nos sentir seguras, é onde mora o maior perigo - literalmente.
o Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta que, quando mortas por estranhos, quase sempre a vítima veio a óbito após o estupro.
Além disso, é preciso analisar também as armas usadas para que crimes como esses aconteçam com tanta frequência. Apesar de muitos continuarem lutando pela liberação e ampliação do porte de armas, elas continuam sendo os instrumentos mais usados para nos matar.
Em 68,6% dos casos, as mulheres foram mortas à tiros.
Como se proteger
Na maioria dos casos, feminicídios decorrem de relações abusivas. Por isso, estar atenta aos mínimos sinais é fundamental para garantir sua segurança.
Em entrevista à AGEMT, a psicóloga Marta dos Reis Marioni, especialista em psicologia clínica e mediação de conflitos, explica como atitudes tóxicas e controladoras se manifestam dentro das relações até que cheguem no estopim da violência física.
“Eu me referiria a alguns exemplos, no qual começam de forma sútil e em escalada de mudanças de postura no sentido ações e reações mais agressivas, criação e necessidade da implantação de ideias ou fantasias que tem que ser aceito pela outra pessoa de qualquer forma. Estas situações vão levando ao empoderamento, no sentido negativo, de uma das pessoas envolvidas, e a um desempoderamento de posicionamento da outra”, explica.
Nesta fase, é importante perceber que já existe violência psicológica e que consequências mais duras já podem ser sentidas pela vítima.
“A pessoa em situação de desempoderamento pode começar a perceber mudanças emocionais, comportamentais , cognitivas, físicas e sexuais que levam a um sofrimento psíquico muitas vezes com um não reconhecimento das causas e origens”, pontua.
Por isso, ao se sentir dessa forma ou perceber sinais de alerta, procure por ajuda e denuncie.
Onde encontrar suporte
180
O Ligue 180 é um serviço de utilidade pública destinado ao enfrentamento à violência contra a mulher. Além de receber denúncias de violações contra as mulheres, a central encaminha o conteúdo dos relatos aos órgãos competentes e monitora o andamento dos processos. Além disso, ainda é possível se informar sobre os direitos da mulher, sobre a legislação vigente acerca do tema e até mesmo buscar por redes de atendimento e acolhimento.
App SOS Maria da Penha

O aplicativo SOS Maria da Penha conta com botões de emergência que permitem acionar instantaneamente a polícia além de disponibilizar informações sobre redes de apoio próximas à sua residência, como abrigos seguros e possibilidade de assistência jurídica especializada.
App S.O.S Mulher
Desenvolvido pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, destina-se mais especificamente às mulheres que já possuem medida protetiva, também permitindo o acionamento 24h da polícia.
Delegacia da Mulher
Tratam-se de delegacias especializadas no atendimento de mulheres em situação de vulnerabilidade ou exposição à violência doméstica, familiar e crimes sexuais.
Apesar da demora frequente para atendimento e, por vezes, a desumanização da vítima, é um espaço preparado para realizar o exame de corpo de delito, solicitar por transporte ou escolta para que possa retirar itens de sua casa sem correr maiores riscos e realizar denúncias.
Até quando?
Infelizmente, a luta das mulheres na sociedade perpassa por diversas camadas. Equidade, igualdade salarial, direito de tomar decisões acerca de seu próprio corpo, viver em segurança e poder contar com políticas públicas são algumas delas.
Por isso, é importante que o dia 8 de março não seja apenas uma data comemorativa marcada em um calendário, fortemente influenciada pela indústria capitalista para a venda de presentes e flores.
Experimente, neste Dia das Mulheres, repensar atitudes, comportamentos e falas, juntando-se à nossa luta.
O sangue venezuelano sempre fora derramado em regimes ditatoriais. Ainda assim, é este mesmo sangue que faz pulsar a luta social e a sede de mudanças do país.
Em uma nação com uma democracia frágil, nasce então uma mulher forte.
Forte ao ponto de sustentar o peso de ser uma mulher negra, pobre, mãe solteira, militante, deputada, vereadora e sobrevivente de um estupro.

Argelia Laya nasceu em 1926. E com ela o feminismo latino-americano deu a luz à consciência de outras milhares de mulheres por décadas no país.
Laya vem de uma família composta por uma mãe militante da Agrupação Cultural Feminina e por um pai integrante de guerrilhas populares. Nesta época, se combateu fortemente a entrada do comunismo no país. Inclusive, o Presidente Juan Bautista Pérez foi acusado pelo Parlamento de permitir a circulação do primeiro Manifesto do recém formado Partido Comunista da Venezuela.
Quando completou 5 anos de idade, Argelia Laya vivenciou a prisão de seu pai. Acabou por isso, migrando para um bairro popular e sofrendo com a pobreza.
Em sua escola, a Escola Normal, pode provar que de normal mesmo não tinha nada. E que tão pouco aceitaria que a normalidade em seguir padrões lhe guiasse. Passou a fazer parte da União de Mulheres Jovens (organização do Partido Comunista), do jornal da instituição de ensino e tornou-se porta-voz de sua comunidade.
Ao se formar professora, com 19 anos, é vítima de crime sexual - e para piorar, acaba ficando grávida. Preferiu enfrentar então, mais uma vez, os julgamentos da sociedade, ao viver o resto de sua vida com o estuprador.
Para muitos, um escândalo. Para Laya, liberdade. E foi pelo anseio desta liberdade que lutou durante toda sua vida.
Em seus primeiros anos no Partido Comunista da Venezuela (PCV), resistiu ao ditador Marcos Pérez Jiménez, organizando mulheres na Junta Patriótica Feminina, lutando pelo sufrágio e divulgando manifestos.
E nesta mesma data, 8 de março, há 66 anos atrás, participou da comemoração do Dia Internacional da Mulher de 1958, no Novo Circo de Caracas, integrando a delegação do mesmo evento no ano seguinte. Anos depois, mobilizou junto a outras mulheres a Comissão Bicameral para os Direitos da Mulher no Congresso Nacional, criada para fiscalizar o cumprimento da Convenção Internacional para a Eliminação de toda Forma de Discriminação contra a Mulher.
Hoje, a Escuela Feminista Del Sur Argelia Laya, extende seu legado, oferecendo planos de parto humanizado, programas de formação, pesquisas de gênero e contribuições ao feminismo socialista. A história de Argela Laya continua viva em cada protesto e organização social venezuelana, transpassando gerações e democratizando o conhecimento.
Genocídio é uma palavra forte. Não à toa o chanceler de Israel declarou o presidente Lula como “persona non grata” ao seu Estado após a figura brasileira “dar nome aos bois” quando disse a respeito do exterminio que hoje ocorre na faixa de Gaza. Essa afirmação de fato incomoda, já que ser reconhecido desta forma não é das melhores.
De acordo com o Museu do Holocasto Estadunidense, a expressão “genocídio” não existia antes de 1944; ela foi feita para denominar crimes que frisam eliminar a existência física de grupos. Quem desenvolveu o conceito foi Raphael Lemkin, advogado judeu, que juntou a palavra grega “geno”, que significa “raça”, com a expressão latina “cídio”, cuja tradução é “matar”.
É interessante que na raiz deste substantivo há a presença de uma derivação do latim, uma língua antiga que influenciou tantas românicas na América Latina - isso porque é uma região que sofreu ao extremo com colonizações que resultaram em extermínio de povos originários.
A Guatemala, na América Central, é um destes exemplos. Colonizada pelos espanhóis desde 1519, o país foi exposto a banhos de sangue e doenças europeias, estas, antes desconhecidas pelos povos ameríndios. Mesmo após sua independência, em 1821, o país segue colhendo frutos de um passado tenebroso.
Em situações de opressão não é incomum a existência de figuras de resistência; neste caso, Rigoberta Menchú é uma delas. Nascida em 9 de janeiro de 1959, a mulher é uma ativista fiel aos direitos humanos, principalmente dos povos indígenas. Descendente do grupo maia quiché, Rigoberta, em sua infância, viveu durante um período político turbulento, uma guerra civil que durou em média 40 anos.

Menchú foi vítima do conflito de diversas maneiras; uma delas, e talvez a mais brutal, tenha sido o assasinato de seus pais e irmãos, que foram perseguidos acusados de envolvimento com a resistência armada contra o regime vigente.
Aos vinte anos, Rigoberta se filiou ao Comité de Unidad Campesina, CUC, uma organização nascida em 1978 que rejeitava a militarização, a discriminação dos povos indígenas e tinha como objetivo melhores salários agrícolas - ela era formada principalmente por camponeses e trabalhadores da terra.
No início dos anos 80, Rigoberta se juntou à Frente Popular, um ato que chamou a atenção dos governadores da época, estes, que eram subordinados ao general e ex-ditador Efraín Ríos Montt. Em 2013, Efraín foi julgado pelo assassinato de 17.771 indígenas ixiles e maias, e foi condenado a 80 anos de prisão; entretanto, 10 dias depois, o veredito foi suspenso pela Corte de Constitucionalidade.
A militante se exilou no México e, lá, não se silenciou; muito pelo contrário, Menchú divulgou a situação em que a Guatemala se encontrava e influenciou outros indivíduos em situações precarizadas a lutar pelos seus direitos.
Durante sua estadia no país vizinho, a escritora venezuelana Elisabeth Burgos-Debray reconheceu sua história e a contou em um livro cujo título é: “Me llamo Rigoberta Menchú y así me nació la conciencia”, ou seja, “Me chamo Rigoberta Menchú e assim me nasceu a consciência”.
Rigoberta tentou voltar ao seu território natal pela primeira vez em 1988, mas não foi bem recebida no país; ela teve sua vida ameaçada e foi detida. Entretanto, após o episódio, conseguiu, aos poucos, retornar à Guatemala.
Em 1992, 500 anos após a chegada dos espanhóis às Américas, Rigoberta Menchú foi ganhadora do Prêmio Nobel da Paz “pela sua luta por justiça social e reconciliação étnico-cultural baseada no respeito aos direitos dos povos indígenas” (FUNDAÇÃO NOBEL, 1992). Já houveram 621 premiações de Nobel. Apenas 65 mulheres o venceram - e Menchú foi uma delas.

Após o recebimento do prêmio, foi aberta a “Fundación Rigoberta Menchú Tum”, uma organização que tem como função propagar a cultura da paz. De acordo com o site, “É guiado por princípios, valores humanos e cosmogônicos e pela diversidade étnica, cultural e política dos povos do mundo. Trabalhamos pela justiça, pela democracia, pelo pleno respeito pela Mãe Terra e pelos direitos humanos, especialmente dos povos indígenas.”.
Em 1996 foi assinado um acordo de paz entre o governo e os guerrilheiros, o que pôs fim à maior guerra civil da América Latina. O envolvimento político e social de Menchú continuou mesmo depois do fim do embate.
Hoje em dia, Rigoberta Menchú é promotora da Década Internacional dos Povos Indígenas, um plano da UNESCO que incentiva a visibilidade para culturas indígenas; além disso, a mulher não parou de propagar seus ideais e luta, sempre com mais força, a favor de boas causas.
Não há muito o que comemorar no dia 8 de março. Afinal, as mulheres continuam vivenciando cenários de terror e opressão, dia após dia.
Em 2023, a Central de Atendimento à Mulher, do governo federal, recebeu quase 75 mil denúncias de violência pelo 180, aponta o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Além disso, no mesmo ano, o número de estupros aumentou em quase 14,9%. Foram 34.000 vítimas em apenas 6 meses, conforme o Fórum de Segurança.
Ainda assim, a AGEMT luta para que as pautas sobre mulheres não se limitem às tragédias, colocando a população feminina quase sempre como personagem secundário e indefeso de histórias tristes.
Por isso, vamos falar sobre mulheres latino-americanas que talvez você nem conheça - mas que se apresentaram como lideranças revolucionárias em suas lutas e defesa de seus ideais.
A primeira delas é Nísia Floresta.

A potiguar Nísia Floresta, pseudônimo para Dionísia Gonçalves Pinto, nasce em 12 de outubro de 1810 – e vem ao mundo como quem já tinha certeza de que poderia mudá-lo.
Pertencente à elite local, casou-se aos 13 anos de idade com o proprietário de terras Manuel Alexandre Seabra de Melo. Meses depois, decide romper os laços e retornar à casa de seus pais. Uma atitude praticamente impensável em sua época.
Mais tarde, com apenas 22 anos, escreve a obra "Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens", debruçando-se sobre as diferenças e opressões sociais às quais as mulheres são submetidas.
Nísia sabia que aquela que escreve é a mesma que deseja ensinar algo com o que diz.
E assim o fez: aos 28 anos, decide abrir uma escola para meninas, numa época em que o ser feminino era destinado apenas aos serviços domésticos, repassados nas instituições de ensino como saberes únicos e fundamentais.
A jovem, porém, se preocupou com o ensinamento da gramática, da escrita e leitura do português, do francês e italiano, das ciências naturais e sociais, da matemática, da música e até mesmo da dança.
O "Colégio Augusto", como fora nomeado, estava localizado no Rio de Janeiro, destino escolhido por Nísia Floresta após a explosão da Guerra dos Farrapos. Naquele momento, a feminista residia em Porto Alegre e teve inclusive a oportunidade de conhecer os revolucionários Anita e Giussepe Garibaldi.
Vale destacar que os embasamentos de Floresta foram influenciados pelo filósofo Augusto Comte, pai do positivismo. Assim, a autora teve a oportunidade de conviver com essa linha de pensamento, em que era fundamental que as mulheres fossem tidas como figuras sociais imprescindíveis para a evolução e crescimento das sociedades.
A imprensa, no entanto, tratou de condená-la fortemente ao longo de sua vida ativista, acusando-a de promíscua e deturpadora. O jornal O Mercantil, de 2 de janeiro de 1847, opinava:
“… trabalhos de língua não faltaram; os de agulha ficaram no escuro. Os maridos precisam de mulher que trabalhe mais e fale menos”.
Afinal, eles sabiam que a jornada de grandes mulheres em universidades e cargos de poder começava ali. Trata-se de um dos primeiros momentos de ruptura estrutural em um Brasil imperial.
Ainda assim, é importante considerar que, enquanto muitas garotas brancas da alta sociedade tiveram a chance de aprender com Nísia Floresta, outras mulheres negras ainda eram escravizadas no mesmo período.