Richarlyson, ex-jogador, que jogou na série A do Brasileiro pelo São Paulo, Atlético Mineiro e na seleção brasileira, declarou no segundo episódio do podcast Nos Armários dos Vestiários, que é bissexual, se tornando o primeiro jogador masculino não hétero a atuar na primeira divisão do campeonato brasileiro e na seleção.
Além dele outros jogadores de outras ligas e do futebol feminino já se assumiram, como Jake Daniels, jogador do Blackpool, time que atualmente joga pela segunda divisão inglesa, que assumiu ser homossexual aos 17 anos em 1990, Marta, que já conquistou seis vezes o título de melhor futebolista do mundo seis vezes, sendo cinco consecutivas, Justin Fashanu, jogador inglês que é considerado o primeiro jogador a se assumir dentro do futebol, sendo capa do jornal The Sun após sua declaração. Fashanu jogou em diversos clubes da primeira divisão inglesa como West Ham e Manchester City, o jogador de futebol americano, Carl Nassib, que o primeiro atleta da NFL abertamente homossexual, além do ex-jogador da NBB (Novo Basquete Brasil), principal liga de basquete no país, Jefferson Campos, que falou sobre seu relacionamento com o humorista Joaquim Chicó em suas redes.
Um tempo depois Walter Casagrande, ex-jogador do Corinthians e comentarista esportivo para a Folha e UOL, comentou no podcast Café da Manhã, da Folha, sobre o caso, afirmando que Richarlyson é único e se assumiu por conta de não conseguir mais sem ser verdadeiro consigo mesmo e por isso se assumiu, mas que ele desacredita que outros jogadores farão o mesmo a curto prazo, pois o ambiente do futebol é muito conservador, machista, homofóbico e racista e que na opinião dele um jogador que se entende como membro da comunidade LGBTQIA+ será constrangido, dentro e fora de campo, além de esses jogadores não quererem ser “vidraças para levarem pedradas”.
Segundo Gabriel Cordeiro, de 17 anos, estudante de jornalismo e corintiano, a importância do ato do comentarista está em inspirar outros jogadores e pessoas a também conseguirem se abrir sobre si mesmas e mostrar para o torcedor que o esporte é para todos e que outros jogadores possam se sentir a vontade de se abrirem neste meio machista. Giulia Cicirelli, também de 17 anos estudante de jornalismo e torcedora do Palmeiras, comentou que acredita que “o meio do esporte é um ambiente hostil para atletas que possuem opiniões, características ou posicionamentos que são considerados fora dos "padrões tradicionais”. Para ela, o medo e a insegurança do que pode acontecer após se assumirem cria um paralelo com a ideia de Casagrande sobre os atletas não querem se colocar como vidraças, visto que o ambiente fora do campo, tanto dentro do time como a torcida fazem os jogadores se retraíram e não se abrirem sobre o assunto.
Apesar do padrão conservador, homofóbico, machista e racista no cenário do futebol brasileiro apresentado por Walter Casagrande, tanto Cordeiro como Cicirelli acreditam que a representação de figuras do esporte na comunidade LGBTQIA+ são de extrema importância para quebrar os preconceitos e avançar a luta pelos direitos desses grupos, pois sem essa representação tanto os jogadores quanto os torcedores são prejudicados, os primeiros por não poderem ser verdadeiros consigo mesmo, por medo de se prejudicarem e aos torcedores destas comunidades, que sentem que não pertencem aquele espaço e acabam cedendo para quem mantem essa estrutura conservadora dentro do esporte.
A inclusão de personagens LGBTQIA+ nos desenhos animados é cada vez mais presente nas telas. Animações como She-Ra e as Princesas do Poder e Steven Universe fazem questão de abordar a situação de escolha de gênero com naturalidade e respeito, possibilitando que jovens se identifiquem com situações não heteronormativas. No primeiro exemplo, a Netflix, produtora do desenho, fez questão de modernizar na animação, roteiro, e, principalmente, na inclusão de personagens LGBTQIA+, incluindo a She-Ra, protagonizando um romance com a vilã do desenho.
Além disso, a animação da Netflix é um reboot do desenho dos anos 80, em que She-Ra é a irmã gêmea de He-Man, e foi feita para ampliar o universo dos brinquedos da Mattel para as meninas.
Por ser de fácil acesso e ter um visual atrativo, comparado aos desenhos da atualidade, o seriado teve altos índices de audiência, além de boas notas em sites de reviews, como a de Camila Sousa, do site Omelete, em que avaliou She-Ra e as Princesas do Poder como uma “uma encantadora história de amadurecimento, cheia de lições importantes e que combina muito bem com as novas gerações.” Com isso, jovens conseguiram se identificar com a representatividade racial, além da questão de gênero, caso de Mell Mengui (18), estudante de Relações Internacionais na FURG.
Mengui comenta a importância do seriado para a escolha de gênero: “She-Ra para mim foi o primeiro desenho que eu assisti que eu realmente me vi representada em questão de sexualidade nos personagens, o desenho trata com a naturalidade que o assunto deve ser tratado, e não como um tabu”. Além disso, a universitária reafirma a necessidade do tratamento do assunto, “São personagens assim que colaboram para a criação de outros e assim vai ganhando mais espaço nas telas e ajuda que as próximas gerações não sejam tomadas por um preconceito que muitas pessoas se sintam representadas ao ponto de verem que sua sexualidade ou gênero não é algo errado”
Porém, a abordagem nem sempre foi a mais adequada para a situação. Alguns desenhos estereotipavam os personagens de maneira que, sua única característica fosse sua sexualidade e nada mais, além de usar roupas completamente diferentes e ter uma voz na maioria das vezes engraçada e chamativa de maneira negativa, além de não terem relevância o suficiente e serem tratados como o alívio cômico da animação, esse tipo de "representatividade" na verdade apenas desfavorecia e prejudicava aquilo que deveria ser a verdadeira mensagem, felizmente, é algo que não acontece mais hoje em dia ou pelo menos acontece com baixa frequência.
É curioso perceber a reação de algumas pessoas e usuários na internet em relação a representatividade LGBTQIA+ em desenhos e filmes animados. Apesar de ser algo que ajuda e influência as crianças e adolescentes de maneira positiva, muitas pessoas repudiam as cenas e personagens que fazem parte da comunidade. Além do mais, qualquer demonstração de inclusão por parte de Hollywood é repudiada por aqueles que preferem o mais próximo à definição estereotipada do que é certo e moral. Como o filho de Clark Kent, o Superman, ser bissexual, um alarme na comunidade que se diz fã da empresa. Contudo, o cenário vem permitindo cada vez menos esses discursos, e abraçando a presença de todos, com cada vez menos intolerância e mais respeito.
"Precisamos representar personagens contando nossas histórias através de nossos próprios corpos”, afirma Gabriel Lodi, ator e dublador trans. Existem muitos desafios se tratando da identidade de gênero dissidente em um país transfóbico como o Brasil. E, ao contrário do que muitos pensam, o mundo das artes não é diferente. “O cinema não é só transfóbico, ele é misógino, branco, racista, elitista; ser transfóbico é só mais uma questão dentro do universo hierárquico que é o universo do cinema.” Desse modo, não só Lodi, mas todos os atores e atrizes trans encontram diversas questões relacionadas aos seus corpos e suas identidades durante suas trajetórias como artistas.
A representatividade trans no mundo artístico ainda é bastante escassa e, muitas vezes, mesmo que existente, é realizada por pessoas cisgêneras. Em diversas narrativas trans, ocorre o que se conhece como transfake, termo usado para se referir à prática de pessoas cis representando pessoas trans no audiovisual. Essa é uma prática bastante utilizada e gera um apagamento sistemático da comunidade trans, explica Lodi, afinal há representatividade trans se não são essas próprias pessoas representando suas histórias?
O transfake é reflexo do imaginário social que a cisgeneridade tem sobre a vivência da transgeneridade, trazendo uma falsa representatividade nas produções. São ideias muitas vezes deturpadas ou até mesmo distorcidas sobre a realidade trans, que costuma ser representada como miserável, baseada em situações de vulnerabilidade emocional, social e econômica, sempre às margens da sociedade. Assim, o ponto de vista cis sobre o tema reforça estigmas que já se tem sobre a comunidade trans, sendo limitante quanto às suas vivências que, na verdade, são diversas e pertencentes à múltiplas realidades.
A perspectiva cisgênera sobre narrativas trans também inibe a possibilidade que muitas pessoas teriam de se identificar e ganhar potência através da arte. Além disso, impede com que a própria comunidade se expresse através dela e exponha seu desejo de avanço em relação à sua qualidade de vida e à sua integração na sociedade. O uso de narrativas que envolvem positivamente a transgeneridade pode dar mais força às vozes do movimento.
Surge então a importância da interpretação de papéis trans por parte de pessoas que tenham, de fato, vivências identitárias em sua bagagem. A interpretação de outros tipos de papéis por parte de atores e atrizes trans também se faz importante no cinema, pois é uma forma de inclusão desses artistas, que permite com que falem de suas experiências como parte de uma minoria, mas não sendo o único contexto em que personagens trans apareçam nas produções. E, a inclusão envolve os próprios conteúdos cinematográficos e a participação na direção da construção de narrativas e execução de filmes, inclusive em cargos importantes e proeminentes.
No cenário atual, avanço não seria a palavra mais adequada para definir a realidade dos artistas trans. Gabriel explica: "Tivemos pequenas conquistas e eu comemoro cada uma delas. De tanto a gente lutar, dar nossa cara a tapa e fazer manifestações para falar da nossa existência, surgiram mais oportunidades de trabalho, mas ainda não pertencemos a esse espaço”. Para o ator não há um avanço social ainda e, ele completa, “Acredito que quando a gente avançar socialmente tudo vem junto.” Discutir o tema é essencial para gerar conscientização e mobilização por parte da sociedade como um todo.
O uso do pronome Neutro vem sendo disseminado pela comunidade LGBTQIA+ e se popularizando, porém, seu uso nas mídias sociais acaba causando polêmicas sobre a necessidade e importância da norma verbal culta. "A reinvindicação é importante e certa, é o direito das pessoas, ela sente a necessidade de se expressar dessa forma através da linguagem", comenta Bruno Sangiorgio professor de línguas formado pela universidade de São Paulo (USP).
De modo geral, os pronomes são um conjunto de palavras que tem a função de substituir ou nomear um substantivo ou adjetivo, então, esse conjunto é classificado por gênero masculino ou feminino. O neutro surge como uma categoria gramatical que incluí diferentes gêneros que não se identificam nem com o masculino, nem com o feminino.
Os embates ocorrem a partir do momento em que o uso do pronome neutro começa a se difundir e se torna uma base de mudanças. Para o professor, o problema começa na falta de informação: “As pessoas têm muito preciosismo com a língua portuguesa, mesmo sem estudá-la, é um assunto muito complexo”, e complementa “a língua é viva e acontecem mudanças nela conforme a sociedade a utiliza”.
No ano passado, o Museu da Língua Portuguesa fez uma postagem de boas vindas pós pandemia em suas redes sociais, utilizando além de "todas" e "todos" o "todes" como representação do pronome neutro, gerando uma repercussão tanto negativa como positiva, sobre o questionamento de uma possível inserção na norma ortográfica padrão.
Os apoiadores da utilização do pronome acreditam que ele possa ser necessário para uma mudança positiva de inclusão de minorias na sociedade e já o utilizam, porém em muitos casos a “transformação” na forma de fala e escrita, incomoda conservadores e estudiosos. No Latim o artigo neutro existia, porém sua terminação coincidia com as terminações masculinas e com o passar do tempo elas foram se unindo e se formou uma só. Por isso, a inexistência de um pronome neutro nos dias atuais é possível, mas para Sangiorgio isso não se justifica: “Usar o masculino plural como neutro só por ser uma herança do patriarcalismo é errôneo, existem sociedades que o neutro é o feminino plural e não significa que a sociedade seja matriarcal”.
“Mas apesar do preciosismo que eu disse anteriormente, vemos uma presença forte da cultura norte-americana na nossa língua que é tratada com normalidade, palavras como ‘Break’ ou ‘brainstorming’ já estão inseridas na nossa sociedade” cita o professor, como um processo de afastamento e marginalização da sociedade LGBTQIA+, sendo um dos fatores que mais contribui para desvalidar este discurso.
Ainda assim, seus adeptos lutam para uma maior aderência ao discurso, porém em um ambiente pouco propicio, a internet. Em média, o brasileiro passa quatro dias inteiros por semana conectado na internet, mas ainda sim, existe uma falta de aprofundamento de questões tão importantes como a do pronome neutro, um assunto recente e profundo que é tratado de maneira vaga e acelerada.
Sangiorgio porém, acredita que a implementação do pronome neutro como norma ortográfica é possível, mesmo em um processo lento e gradual “A partir do momento que a palavra é colocada no dicionário quem é mais afetado é a criança que está na escola, não o adulto que tenta combater seu uso. A mudança só é positiva a partir do momento que se consolide a ponto de ser ensinada nos níveis mais básicos da educação”. Ele finaliza: “A mudança na língua é apenas uma parte do necessário para ter um convívio social saudável para todos.”
Na medida em que chegam as eleições, começam a surgir as propagandas e os debates televisivos, além é claro, da incessante busca pelo candidato ideal por parte do eleitor, que tem em suas mãos a responsabilidade de exercer seu papel como cidadão e fazer a escolha certa. Maike Alves, 28, é tatuador e membro da comunidade LGBTQIA + e acredita que a possibilidade de escolher um representante político é um direito de grande importância. Em suas próprias palavras, “garante não só a possibilidade de participar da vida em sociedade como também é uma oportunidade de eleger alguém que garanta melhorias para mim e para as comunidades que pertenço”.
Dentre as propostas avaliadas pelos eleitores, a agenda atual da sociedade exige demandas, explicações, projetos e atenção extrema para pautas de inclusão de minorias e uma cada vez mais emergente preocupação com a questão da diversidade, de um modo geral. Alves acredita que na hora de selecionar o candidato, além de levar em consideração propostas relacionadas à saúde e educação, ter projetos que priorizem causas sociais e defender direito de minorias é essencial. Porém, quando se trata de pautas relacionadas à comunidade LGBTQIA +, Alves observa que políticos que representam uma porcentagem maior da sociedade não costumam falar sobre os direitos do movimento e dentre aqueles que de fato abordam tal temática, "a grande maioria das propostas são vazias, não se concretizam em ações”, disse.
A pauta LGBTQIA + vem sendo cada vez mais abordada e discutida entre a população e a busca por mudanças é notória, refletindo no aumento de candidatos LGBTQIA + em relação a 2018. De acordo com levantamento realizado pela organização VoteLGBT, para as eleições de 2022, 214 candidaturas LGBTQIA+, de 20 partidos diferentes, foram registradas na Justiça Eleitoral, para disputar a eleição deste ano. O número é maior que em 2018, quando foram registradas 157 candidaturas, mas ainda é pouco, sendo apenas 0,76% do total de candidaturas destas eleições. Para Alves, por mais que dentre os 99% vários sejam simpáticos à causa, por não viverem sua realidade, eles não entendem perfeitamente o que a comunidade passa, dificultando a realização de mudanças reais. Essas que na visão do tatuador, só virão com o aumento no número de candidatos que se identificam como LGBTQIA +.
Pedro Mazziero, 23, é ator e modelo, homem cisgênero e bissexual. Ele não “bota fé” nos planos de governo, mesmo dos candidatos aos grandes cargos, como Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, candidatos à presidência da República. Frisa sua desilusão e desesperança com a política em geral, apesar de reforçar seu desejo de extirpar a direita “louca e fascista”.
Ele destaca sua motivação por causa das poucas medidas públicas sistemáticas tomadas de 2018 para cá, além de dizer que “pelo nosso histórico, pode ser muito provável que os candidatos estejam mentindo. Estou bem neutro em relação ao que os políticos estão propondo”.
Pedro ressalta ainda que não enxerga possibilidade de haver medidas focadas na comunidade LGBTQIA +, justamente pelo fato de a representatividade da comunidade nas candidaturas ser baixíssima - menos de 1%. Para haver qualquer mudança significativa, seria necessária maior representatividade. “A classe política é, pelo menos abertamente, maioria esmagadora hétero. Não acho que o sistema vá mudar. Todo mundo fala e fala. Minha amiga, que é modelo trans, apanhou em um 99”, desabafa.