Temáticas são abordadas desde os anos 60 no Japão e continuam exploradas até hoje
por
LUCCA CANTARIM DOS SANTOS
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16/06/2025 - 12h

“O sonífero”, projeto criado por Lucca Cantarim, estudante de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) , tem por objetivo combater a visão reacionária a respeito de temas de gênero no entretenimento.

Trazendo a história da presença de personagens de diversas sexualidades e gêneros nos mangás e animes dentro da mídia japonesa, o autor trás uma reflexão leve, descontraída, porém importante a respeito de uma representatividade tão importante.

Os sete artigos que compõem o projeto estão disponíveis para serem lidos no site “Medium”, no perfil autoral de Lucca. Os textos contém entrevistas com pesquisadores, fãs e até mesmo leitores de dentro da comunidade LGBT que se identificam e se abrem sobre a importância da representatividade para eles.

Disponível em: https://medium.com/@luccacantarim/list/o-sonifero-d19af775653e

 

Um lugar onde a leitura também é um gesto de resistência
por
Nicole Domingos
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16/06/2025 - 12h

A literatura sempre foi um território de disputa simbólica, um espaço onde narrativas dominantes se impõem, mas também onde vozes dissidentes encontram brechas para existir. No caso da literatura LGBTQIAPN+, essas brechas são preciosas. O site palavras em trânsito, feito por Nicole Domingos, trata exatamente disso, desses pequenos espaços que já existiram e que existem hoje. É um lugar dedicado ao estudo, à crítica e à celebração da literatura LGBTQIAPN+.

Ao longo do site, vamos tratar especialmente sobre os corajosos que escrivam e gritavam dentro de deus próprios livros, ainda que estivessem dentro dos períodos de repressão, como a ditadura militar brasileira — esses autores utilizaram a palavra como forma de resistência.

A literatura não apenas narra experiências — ela reescreve a história a partir de corpos e afetos antes excluídos. Ela cura feridas simbólicas, questiona heranças opressoras e cria novos imaginários de existência. Ao nos colocar diante de personagens que amam, sofrem, resistem e sonham fora da norma, ela nos lembra de algo fundamental: toda existência merece ser narrada. E lida.

Para acessar esse mundo, basta clicar no link abaixo:

https://literatura-lgbt.my.canva.site/

 

 

Alunas da UFABC e USP compartilharam suas vivências e desafios na luta por inclusão e equidade no meio acadêmico
por
Pedro da Silva Menezes
Maria Dantas Macedo
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09/06/2025 - 12h

No mês do Orgulho, podcast investiga as cotas trans nas universidades brasileiras a partir de relatos de duas estudantes trans: a Gabriela, aluna de Letras na USP,  e a Ellie, gestora do Centro acadêmico de Humanidades da UFABC, faculdade que aderiu as cotas trans em 2019. Elas expõem dificuldades, lutas e avanços, revelando por que essa política de cotas é urgente para garantir inclusão e respeito.

Influenciadora é chamada de "homem" por espectadora; confusão gerou vaias, atraso no espetáculo e intervenção policial
por
Carolina Zaterka
Manoella Marinho
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15/04/2025 - 12h

 

Malévola Alves, influenciadora digital e mulher trans, denunciou ter sido vítima de transfobia no Teatro Renault, em São Paulo, no dia 26 de março de 2025, ao ser tratada pelo pronome masculino e chamada de “homem” por uma espectadora. O incidente ocorreu antes do início do musical “Wicked”. Malévola, com mais de 840 mil seguidores, publicou trechos do episódio em suas redes, que rapidamente viralizaram.

Segundo relatos de testemunhas e da própria vítima, a confusão começou quando Malévola esperava uma nota fiscal e a mulher atrás dela mostrou impaciência. As duas trocaram palavras e, ao se afastar, a mulher teria gritado "isso é homem ou mulher?" em sua direção. A vítima então se sentiu ofendida e levou a denúncia à plateia, apontando a espectadora como autora do ataque transfóbico, causando um tumulto que paralisou a plateia.

A reação do público foi de imediato apoio a Malévola, com vaias à agressora e pedidos para que ela fosse retirada do teatro. “A gente não vai começar a assistir a um espetáculo que é extremamente representativo para a diversidade com uma mulher dessa aqui. Não faz o menor sentido”, afirmou um dos espectadores durante o protesto.

Diante da pressão da plateia, a apresentação atrasou cerca de 30 minutos. A mulher acusada acabou saindo do teatro sob escolta policial, levada à  delegacia para realizar um boletim de ocorrência, recebendo aplausos e vaias dos demais presentes. Miguel Filpi, presente no evento, celebrou nas redes sociais: “Justiça foi feita!! Obrigado a todo mundo nessa plateia que fez a união para que isso acontecesse.”

Carlos Cavalcanti, presidente do Instituto Artium (Produtor do musical), pediu desculpas pelo ocorrido antes de dar início ao espetáculo: “Peço desculpas por esse acontecimento e por esse atraso. Tudo o que a gente pode admitir, é bom que a gente admita na vida, mas transfobia em Wicked, não dá”. A atriz Fabi Bang, também se manifestou durante e após o espetáculo: “Transfobia jamais” - uma improvisação durante a música “Popular”.

 

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Fabi Bang, atriz que interpreta Glinda, em apresentação do musical. Foto: Blog Arcanjo/Reprodução

Viviane Milano, identificada como a espectadora acusada, negou as acusações em um pronunciamento, alegando que a confusão na fila da bombonière não foi sobre identidade de gênero, mas sobre uma tentativa de furar fila. Ela afirmou: “Perguntei em voz alta: ‘Era o homem ou a mulher que estava na fila?’”, dizendo que sua pergunta foi mal interpretada.

A produção de Wicked e membros do elenco reiteraram seu compromisso com a diversidade e repudiaram o incidente. A nota oficial da produção destacou: “Nosso espetáculo é e continuará sendo um espaço seguro para todas as pessoas, independentemente de identidade de gênero ou orientação sexual.”

Participante do BBB23, Fred Nicácio, reconhecido por seu engajamento em questões de saúde pública e direitos humanos, apesar de usar categorias, ela expressa inclusão e visibilidade
por
Rainha Matos
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28/06/2024 - 12h

A expansão da sigla no movimento LGBTQIA+ pode até causar confusão, mas não para Fred Nicácio, médico brasileiro reconhecido por seu engajamento em questões de saúde pública e direitos humanos. Ele defende que, "embora o ideal fosse não categorizar, a nomenclatura atual é crucial para inclusão e visibilidade". Fred enfatiza que esse reconhecimento não deveria ser necessário no futuro, quando esperamos que todos sejam vistos simplesmente como pessoas.

Ele apontou avanços na representação LGBTQIA+ na mídia, mas também criticou "o persistente tabu que limita a aceitação de atores LGBT em papéis principais, por medo de repercussões na carreira". Ele sublinha a importância de valorizar o talento e personalidade das pessoas, independentemente de sua orientação sexual.

Nem tudo é otimismo. Fred Nicácio destacou a gravidade dos índices de LGBTfobia e mencionou sua própria experiência com testemunhos de violência. Ele ressalta a necessidade de políticas públicas e leis rigorosas para proteger a comunidade e reduzir esses crimes.

Como figura pública, o médico precisa lidar com críticas, e por isso adotou uma postura de positividade, aceitando críticas construtivas apenas daqueles que têm algo construtivo a oferecer. Ele enfatizou a importância de uma crítica fundamentada em realizações pessoais e ignorou críticas vazias e infundadas.

Além de sua atuação na saúde e na visibilidade LGBTQIA+, Fred ganhou destaque nacional ao participar do reality show "Big Brother Brasil 23" (BBB23), ampliando sua plataforma para discutir questões de grande relevância social. Sua voz continua sendo uma importante influência tanto na esfera pública quanto nas redes sociais, onde ele continua a promover o debate e a conscientização sobre direitos e igualdade.

Estudantes da PUC-SP organizaram roda de conversa sobre a presença da comunidade trans na universidade, no mercado de trabalho e nas políticas públicas
por
Beatriz Barboza
Giuliana Zanin
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15/11/2023 - 12h

No final de outubro, a XXIII Semana Acadêmica de Ciências Sociais da  PUC-SP apresentou a palestra “Transvivências: a relação das identidades de gênero no meio social”. O evento foi mediado por estudantes do curso, que receberam a jornalista Dani Avelar, o escritor Jonas Maria e o multiartista Dante Olivier. As pautas discutidas perpassaram a presença da comunidade trans nas instituições de ensino, a adoção de banheiros sem a marcação de gênero e a vivência trans no ambiente digital.

Dani Avelar, formada em Relações Internacionais pela USP e mestre em Jornalismo pelo programa Erasmus Mundus, é a primeira jornalista trans da Folha de S. Paulo. Dani se sente solitária no jornalismo em razão da ausência de pessoas trans e travestis dentro das redações. “Reviso trabalhos para apontar incoerências porque não existe um preparo, dentro das faculdades de jornalismo e das redações, de como os repórteres devem se referir às pessoas trans”, relata.  

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“Precisamos de um jornalismo que fale sobre a realidade das pessoas trans com dignidade", declarou Dani Avelar, a primeira jornalista trans da Folha de S. Paulo. (Foto: Giuliana Zanin)

A jornalista cobre especialmente guerras e conflitos, mas também se dedica às pautas que corroboram para a construção de um “jornalismo trans e travesti”. Quanto à presença da comunidade no mercado de trabalho, Dani ressalta que “nenhuma mudança acontece porque as instituições estão interessadas, mas porque existe uma pressão organizada por pessoas do movimento que reivindicam que pessoas trans também sejam contempladas nas políticas de ações afirmativas”.

Jonas Maria, formado em letras pela UFSJ (Universidade Federal de São João Del-Rei), é criador de conteúdo na internet e se dedica a um curso de pós-graduação em Mídia, Informação e Cultura pela USP.  Há cerca de dez anos, criou um blog para documentar sua transição e relatar a dificuldade de conseguir suporte médico. Hoje, Jonas apresenta o podcast “Degenerados” e faz análises, em seu canal no YouTube, sobre a transexualidade representada na mídia.

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“Fazemos parte da vida social. O que atravessa a comunidade trans também atravessa outras pessoas”, ressalta Jonas Maria, escritor e criador de conteúdo na internet. (Foto: Giuliana Zanin)

Sobre sua experiência na internet, Jonas desabafou: “Eu recebo trabalhos por ser trans. Se você tem um conteúdo extremamente militante, as suas chances de conseguir um job diminuem. É comum que comunicadores trans falem sobre a transsexualidade com vídeos de humor, não com um conteúdo extremamente político. Caso contrário, você só consegue trabalho em janeiro [mês da visibilidade trans] ou em junho [mês da visibilidade LGBTQIAPN+]".

Dante Olivier é natural de Recife, mas reside em São Paulo. Atualmente, trabalha na produção de conteúdo para a internet, mas já exerceu outras atividades. Ele se define como “multiartista” e faz vídeos de humor sobre assuntos cotidianos da comunidade LGBTQIAPN+. Dante relembrou o momento histórico de ver a primeira travesti na Ordem dos Advogados do Brasil, Márcia Rocha, em 2017.  “É muito louco pensar que estamos em 2023 e, somente em 2017, eu vi uma pessoa trans ocupando esse espaço. Por que a gente não existe nesses lugares? Estamos evoluindo a passos pequenos”, afirma.

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“Quero existir, quero que saibam que eu existo e, quem sabe, ajudar outras pessoas”, afirmou Dante Olivier, criador de conteúdo na internet. (Foto: Giuliana Zanin)

 

PRESENÇA TRANS NA UNIVERSIDADE

"Qual o motivo da ausência de pessoas trans na universidade?”, questionou Flora, uma das organizadoras e mediadora do evento. A pergunta introduziu a discussão sobre o acesso da comunidade trans à educação. 

Segundo dados da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), 56% das pessoas trans não possuem o ensino fundamental completo, 28% completaram o ensino médio e apenas 0,02% estão no ensino superior.

Jonas Maria destacou que existem poucos dados sobre as pessoas trans no Brasil. Apenas ONGs têm se organizado para coletar números sobre a comunidade. O escritor ressaltou que, no último censo (2022), foi a primeira vez que o Instituto de Geografia e Estatística (IBGE) perguntou sobre identidade de gênero e sexualidade.

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Palestra “Transvivências: a relação das identidades de gênero no meio social” (Foto: Giuliana Zanin)

 

Dani acrescenta a importância de incentivar a pesquisa dos índices sociais sobre pessoas transsexuais e travestis. “As ações afirmativas voltadas à comunidade trans não podem ser um copia e cola das soluções propostas pelo movimento negro. Existem particularidades na nossa comunidade, justamente por isso, é fundamental que exista a produção de dados sobre nós”.

Estudantes do curso aproveitaram o momento para alavancar reivindicações sobre banheiros unissex e cotas trans na PUC-SP. “Nome social, adoção de banheiro sem marcação de gênero e programa de cotas são elementos que incentivam pessoas trans a seguirem na educação, acessarem o ensino superior e se firmarem no mercado de trabalho", demarca Jonas. "São estímulos para que as suas vivências não sejam determinadas pela falta de acesso à educação, que ainda é uma forma de ascensão social no Brasil”, conclui.

 

ADOÇÃO DE BANHEIROS SEM MARCAÇÃO DE GÊNERO

Os estudantes manifestaram suas reivindicações a favor da adoção de banheiros sem a marcação de gênero pela instituição. Jonas Maria afirmou que a presença mais ou menos expressiva da comunidade trans dentro de um espaço não deve ser critério para a implementação. “Não se trata de números. Se tem poucas pessoas trans, o problema não é banheiro, mas sim a ausência da comunidade”, ressalta o escritor. 

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Jonas Maria, localizado à direita da imagem, conta o seu relato de ser um homem trans na internet   (Foto: Giuliana Zanin)

Os convidados se posicionaram contrários ao discurso que coloca os possíveis casos de violência como objeção à ação afirmativa. “Pessoas trans são vistas como uma ameaça, como as geradoras da violência dentro dos banheiros e a realidade, na prática, é que a comunidade trans é o alvo desses ataques”, alerta Dani Avelar. 

A jornalista ainda relata que, em uma balada, já foi agredida e expulsa por um segurança por usar o banheiro feminino. “Ele alegou que ‘aquele toilet não era para mim’, sob o pretexto de impedir que um ‘homem’ acessasse um espaço exclusivo para mulheres e cometesse alguma agressão. Isso foi, justamente, o que aconteceu: um homem agrediu uma mulher”. 

"Eu sempre faço um cálculo de segurança para acessar os lugares, sobretudo os banheiros", revela Dani Avelar. "Em qual local eu corro menos risco de sofrer uma agressão? Se eu usar um banheiro feminino, posso sofrer uma agressão verbal, se eu usar um banheiro masculino, posso sofrer uma agressão física”. 

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Alunes do curso de Ciências Sociais reivindicam cotas trans e banheiros unissex. (Foto: Natália Perez)

Os relatos são carregados de dúvidas. “Eu entendo a importância de reivindicar esses espaços para que pessoas trans se sintam seguras, mas prefiro lutar para ocuparmos um espaço que é deles e que é nosso também, sem que fomente essa ‘separação’, e sem que eu precise usar um toilet distante e isolado", declara Dante Olivier. "Estamos falando sobre usar um banheiro com dignidade”. 

LUTA COMPARTILHADA 

A roda de conversa contribuiu para explicitar que as vivências trans tangenciam as demais no meio social, portanto, merecem a atenção não só do Estado, como garantidor de acessos e políticas públicas, mas também dos simpatizantes à comunidade LGBTQIAPN+. Dante destacou que as pessoas cis aliadas devem manifestar seu apoio a partir da utilização de suas vozes e seus espaços para reivindicarem a presença de pessoas trans, seja na universidade, no mercado de trabalho, nas pautas jornalísticas ou nas ações afirmativas.

"Transfobia não se dirige apenas às pessoas trans. Pessoas cis também têm sua identidade de gênero moldada a partir de uma violência transfóbica. É essencial que essas pessoas também se engajem na luta contra a transfobia porque ela delimita o que é aceitável, em termos de expressão de gênero, não só para pessoas trans, mas também para pessoas cis, dentro ou fora da comunidade LGBT”, finalizou a jornalista. 

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A roda de conversa promoveu as reivindicações da comunidade de estudantes trans da universidade. (Foto: Rômulo Santana)

 

Mesmo com boa repercussão, séries centradas em mulheres "Queer" seguem sendo descontinuadas pelos streamings
por
Natália Perez
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29/09/2023 - 12h

As produções audiovisuais que abordam a temática LGBTQIAPN+ vêm crescendo nos grandes streamings, porém, em contramão, observa-se um cancelamento em massa de séries focadas em mulheres lésbicas ou bissexuais. “Não temos protagonismo, não temos final feliz, não temos mais temporadas e mesmo que cada vez mais filmes exaltando o romance entre dois homens cis padrões ganhem espaço na mídia, isso não está abrindo espaço para que outras histórias queer possam ser contadas”, relatou Kelly Cassiano, representante do portal Les Bi Honest focado em compartilhar informações sobre produções com representatividade sáfica.

Um exemplo famoso foi o caso da série “Warrior Nun”, cujo casal principal é composto por duas mulheres, Ava (Alba Baptista) e Beatrice (Kristina Tonteri-Young). Mesmo a série sendo bem recebida pelo público, ela foi cancelada na segunda temporada pela Netflix. Devido a uma grande mobilização dos fãs, a série irá voltar em forma de trilogia de filmes. Entretanto, esse caso se provou uma exceção, já que outras diversas produções com representatividade sáfica continuam sendo descontinuadas.

 

Casal protagonista da série Warrior Nun
Casal protagonista da série Warrior Nun. (Reprodução/Netflix)

 

Ao ser cancelada pouco tempo após sua estreia, First Kill (2022), uma série original Netflix, levantou questionamentos sobre quais seriam os fatores que ocasionaram o abandono de sua produção. Isso porque, mesmo com pouca divulgação, foram registradas mais de 97 milhões de horas assistidas, segundo o What´s on Netflix, durante o período em que se manteve entre as top 10 séries mais vistas da plataforma.

A indignação do público foi ainda maior ao descobrir que esse número foi quase o dobro do registrado por Heartstopper, produção centrada em um casal de homens, que foi renovada para mais três temporadas pouco depois de estrear. Apesar de toda a polêmica, a plataforma ainda não revelou o motivo pelo qual First Kill foi cancelada, deixando os fãs revoltados e entristecidos.

 

Poster de First Kill e Heartstopper, lado a lado, mostrando suas horas assistidas em uma semana
Horas assistidas de First Kill e Heartstopper em postagem oficial da Netflix nas redes sociais. (Divulgação/Netflix)

 

Um levantamento do site Autostraddle descobriu que 48 shows protagonizados por mulheres queer foram cancelados após uma única temporada, mesmo com altas taxas de aprovação em diferentes streamings. Isso representa cerca de 20% das séries inclusivas que, pensadas para mais de uma temporada, acabam por deixar a história em aberto, ou seja, sem conclusão ou final algum.

Para o Les Bi Honest, por sua vez, a razão é simples: “Lesbofobia ou simplesmente a aversão em ver duas mulheres tendo algo que não esteja ligado direta ou indiretamente a nenhum homem", aponta. "Se duas mulheres estão juntas como forma de fetiche para o olhar masculino, elas são exaltadas, mas se é voltado para o público feminino, é visto como errado.”

Pesquisa realizada pelo instituto GLAAD revela que representatividade LGBTQIAPN+ alcançou 21% no audiovisual em 2022, mas maioria é sobre homens gays
por
Natália Perez
Vitória Nascimento
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05/09/2023 - 12h

Nos últimos anos a presença de histórias LGBTQIA+ vem se tornando mais expressiva nas produções cinematográficas de mainstream. Antes o que conseguia ser mostrado quase que somente em filmes independentes, agora chega ao alcance do público geral, principalmente por meio das plataformas de streaming. No Índice Anual de Responsabilidade realizado pelo GLAAD (Gay & Lesbian Alliance Against Defamation) de 2021, que mapeia a quantidade de personagens LGBTQIAPN+ nos filmes lançados pelos maiores estúdios de Hollywood, como Disney e Warner Bros, mostrou que dos 77 filmes que estrearam naquele ano, 16 continham personagens queers, o que representa 21% do total.

“Com relação à representatividade, eu acho que nos últimos anos demos passos significativos. A indústria está entendendo a importância da luta por representatividade e vem abraçando isso cada vez mais. Hoje em dia, principalmente no streaming, vemos mais diversidade não apenas nas narrativas, mas também nas escalações. Mas acredito que esses avanços ainda estão acontecendo a passos de formiga.” comentou, para o Queer IG, o ator e roteirista Lucas Drummond.

O filme Vermelho, Branco e Sangue Azul estreou sexta (11/08) no Prime Vídeo e vem se mantendo em primeiro em primeiro lugar das produções mais vistas da plataforma em vários países desde então. Na Netflix, a série Heartstopper, que saiu no dia 07/08, se tornou a primeira série queer a alcançar o TOP 1 mundial de acordo com medidor de audiência FlixPatrol.

Entretanto mesmo entre essas produções cheias de diversidade há uma desigualdade de representação. As duas obras mencionadas anteriormente, tem algo em comum: foco em um casal de homens. Essa visibilidade é importante, porém não deve ser a única. A disparidade entre a quantidade de obras de romance entre homens comparada com a entre mulheres é outra questão comumente discutida. Séries como Primeira Morte e Warrior Nun, cujo casal principal é lésbico além de menor visibilidade foram rapidamente canceladas como tantas outras produções com presença de relacionamento homoafetivo feminino. Segundo a Glaad dos 16 filmes inclusivos de 2021, 11 incluíam personagens masculinos gays ao passo que somente quatro incluíam personagens lésbicas, mostrando uma queda na porcentagem delas comparado a anos anteriores.

Alba Baptista e Kristina Tonteri-Young, respectivamente em Warrior Nun.
Alba Baptista e Kristina Tonteri-Young, em cena de Warrior Nun. Foto: Reprodução/Netflix

Essa não é a única diferença, mesmo entre as series delas, outra questão é a ainda menor existência de personagens transgêneros. Em todas as produções citadas até agora, somente Heartstopper conta com uma personagem trans com grande relevância ao plot. Assim, o índice relatou que a primeira vez em cinco anos que um personagem transgênero esteve presente em uma grande produção foi em Amor, Sublime Amor de 2021.

Sobre isso, em entrevista para o jornal Observer, a cineasta brasileira Eliane Caffé afirmou que as produções realizadas para o streaming são um reflexo do que é aceito socialmente: “Há um alinhamento ideológico para aquilo que é mais palatável, de certa forma, por exemplo, os gays brancos de classe alta representados em um drama familiar são totalmente diferentes de você assistir os gays negros da periferia ou países africanos. É muito mais chocante você ver dois homens trepando do que duas mulheres. A mulher trans ou o homem trans, se têm passibilidade, é mais palatável para o consumo. Os filmes e séries que passam pelos filtros dos streamings, é um jeito também de medir como um lado da sociedade que se identifica com a classe dominante, mesmo sendo pobres, estão assimilando esses novos valores, refletindo em quais produções estouram ou não.”

Ainda com espaço para evoluir, e mesmo que com passos desiguais entre as letras da sigla, é fundamental a presença queer no mainstreaming. Esses grupos se fazem cada vez mais presentes no audiovisual popular, normalizando sua existência e trazendo representatividade à próxima geração e conforto as anteriores que cresceram se sentindo invisíveis nas telas.

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo

Para Silvia Henz, em seu ”perfil LGBTQIAPN+ o L não é de linda, faz parte da minha identidade e faz parte do meu orgulho de resistência”
por
Livia Vilela
Giulia Dadamo
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28/08/2023 - 12h

Silvia Henz, jornalista e influenciadora que fala de moda sustentável nas redes sociais, foi vítima de uma chuva de comentários lesbofóbicos depois de postar foto de ano novo beijando a esposa. 

A influenciadora acumulou mais de 300 mil seguidores no Instagram e no TikTok dando dicas de styling, moda consciente e atemporal para mulheres. Apesar de nunca ter escondido sua orientação sexual ou seu relacionamento de seis anos com a jornalista Nadia Bochi, em janeiro de 2023, foi surpreendida com o que chamou de “limpa de homofóbicos”, perdendo mais de 30 mil seguidores e recebendo uma onda de comentários preconceituosos a respeito do seu casamento. 

“Sempre que eu posto foto com a minha esposa eu sou ‘punida’ por isso em forma de perda de seguidores, mas dessa vez foi diferente. Eu achei que a minha orientação sexual estivesse clara, já que a Nadia sempre aparece nos meus stories, e postei uma foto no primeiro dia do ano. Eu não achei que fosse ter uma debandada tão grande”, afirmou em entrevista para a revista IstoÉ .“Eu demorei muito para chegar onde eu cheguei e parece que toda vez que eu bato um número grande de seguidores, eu sou cancelada por causa da minha orientação sexual. Será que 130 mil seguidores é o máximo que uma lésbica pode chegar?”, continuou. 

A reação de Silvia foi imediata: deletou as mensagens homofóbicas da sua postagem e bloqueou os usuários que realizavam os ataques. Além disso, fixou postagens com a esposa, incluindo uma foto posando com a bandeira LGBTQIAP+, para deixar claro este aspecto da sua vida pessoal e evitar outros possíveis ataques.

Silvia levantando uma bandeira LGBT
Silvia Henz em postagem do Instagram

Para o casal o mais inesperado foi a reação das seguidoras mulheres, com total falta de sororiedade.  “Ela é criadora de conteúdo e ajuda milhares de mulheres a aprender a se vestir, nunca imaginou que as próprias mulheres que a seguem pudessem ter uma reação homofóbica a um simples beijo.”, afirmou Nadia, que já foi repórter do programa Mais Você, da Rede Globo. 

Além disso, Silvia comentou sobre a dificuldade de garantir espaço de mulheres lésbicas no seu eixo. “Não tem grandes lésbicas da moda. Moda é minha área e eu não cresci vendo exemplos de sucesso. Sou a primeira influencer lésbica da [empresa] FHits e várias vezes sou a primeira lésbica dos espaços.” 

O diretor artístico de eventos e produtor, Ivan Oliveira, afirma em entrevista para a AGEMT, porém, que não vê tanta limitação, já que cada vez mais estão presentes todas as variáveis da representatividade LGBT.  

Como um homem gay, ele reconhece que a homofobia ainda é presente no dia a dia da população, visto que, o Brasil - pais de terceiro mundo, latino e patriarcal - possui padrões e paradigmas difíceis de quebrar. “Mas eu vejo cada vez mais a participação de pessoas da comunidade trabalhando em editoriais. As marcas têm tido políticas de inclusão e há uma aceitação muito maior do que antigamente.” 

Após trabalhar por quase 10 anos fazendo desfiles de moda para grandes marcas, incluindo a L´Oréal, percebeu que no caso de influencers, abre-se uma comporta para ‘haters’. “No meio digital existem pessoas que se escondem para comentar atrocidades anonimamente, muitas vezes a fim de conseguir visibilidade.”

“A violência existe, mas como uma consequência da educação do nosso país. Estamos longe de acabar com a homofobia, mas é um trabalho que precisa ser feito arduamente. Ninguém escolhe ser LGBTQIAP+, elas nascem desta forma. Elas são o que são.” 

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo

Surgindo para a diversão da elite, o futebol faz do preconceito uma de suas trágicas consequências
por
Vinícus Evangelista
Leonardo Gomes
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28/08/2023 - 12h

Foram 74 casos de LGBTfobia registrados no futebol brasileiro apenas no ano de 2022, um aumento de 76% em relação aos anos anteriores. Esse foi o dado levantado em relatório feito pelo coletivo de torcidas Canarinhos LGBTQ+, em parceria com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF): “O trabalho mostra uma triste realidade, que estamos lutando para acabar no futebol. A CBF vai sempre combater os preconceitos e trabalhar para que o futebol seja um lugar de inclusão, afirmou Ednaldo Rodrigues, Presidente da CBF, que é o primeiro negro e nordestino a comandar a entidade. 

 
Apesar da luta travada, a discriminação por orientação sexual no futebol é algo visto na prática a anos, com casos vindo à tona em todo momento. Os mais memoráveis têm a torcida do São Paulo como alvo, sendo, de forma pejorativa, estereotipada com características referentes a pessoas LGBT’s. A situação mais recente aconteceu em maio desse ano, quando em um clássico contra o Corinthians, na casa do rival, ouvia-se o canto: “Vamos, vamos Corinthians, dessas bichas teremos que ganhar”.  
 
Não foi a primeira vez que se foi usado de homofobia para provocar torcedores são paulinos. O hábito ganhou força em 2003, quando o então jogador do Corinthians, Vampeta, falou em entrevista coletiva como é o clima as vésperas de um clássico contra o rival: “semana de clássico não tenho nenhum amigo são paulino, tudo inimigo. Eles do lado de lá defendendo os ‘bambis’, e eu do lado de cá”, afirmou o ex-jogador. 
 
Recém completados 83 anos de história, Bambi é considerada uma das animações mais clássicas da história da Disney, contando a história de um pequeno filhote de cervo que tem características consideradas “feminizadas. Porém, aquilo que era para ser apenas o nome de um protagonista animal em uma fábula infantil, no futebol se tornou adjetivo para inferiorizar seres humanos a partir de sua sexualidade. 

 
PRECONCEITO CULTURAL E LEGITIMADO 
 

 

Foto: Felipe Siqueira / ge 

 

Segundo artigo publicado por Otávio Nogueira Balzano e João Alberto Steffen Munsberg no Portal da Câmara dos Deputados, o futebol tem, em sua estrutura, marcas de uma sociedade patriarcal ao surgir como esporte para a diversão da elite e ser costurado em torno da hegemonia masculina. Com isso, se tornou natural que os estádios fossem espaços para que a masculinidade fosse exaltada, e assim, ser comum ouvir das arquibancadas manifestações de caráter preconceituoso, mascarando-as como simples forma de “provocação” a torcedores rivais. 

 

Tal prática foi tão legitimada, inclusive por órgãos públicos, que foi apenas em 2019 que o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) passou a recomendar que os árbitros relatassem em súmula e documentos oficiais casos de LGBTfobia que acontecessem durante as partidas. Não demorou muito para que, em uma partida entre Vasco e São Paulo, o árbitro Anderson Daronco tivesse que paralisar a partida após um cântico uníssono ecoar nas arquibancadas do Estádio São Januário: Veado... Time de veado!”. 

 

“24 AQUI NÃO!” 
 
 

Foto: LUIS ROBAYO / AFP via Getty Images 

 

Outra polêmica institucional relacionada da LGBTfobia no futebol envolve o número 24 que, no Brasil, é associado a homossexualidade devido à forte influência do jogo do bicho, onde tal simboliza o animal veado. Nas camisas, foi só na Copa do Mundo de 2022 que o número foi utilizado oficialmente pela seleção brasileira masculina quando, na ocasião, o zagueiro Bremer o vestiu pela primeira vez. 

 

O tabu existente no Brasil acerca do número bateu na porta do volante colombiano Victor Cantillo. O atleta que sempre usou a camisa 24 por todos os clubes que passou em seu país, foi anunciado com a “8” ao ser contratado pelo Corinthians em 2020. Durante sua apresentação, o diretor do clube ao seu lado, hoje presidente, Duílio Monteiro Alves, explicou em tom de piada o porquê da camisa: “24 aqui não!, comentou o dirigente. 

 

Após a repercussão negativa da fala, Duílio se desculpou, explicando que o motivo do Cantillo usar a “8” é por ter sido usada pelo histórico, também volante colombiano com passagem pela equipe, Freddy Rincón, e que não tem nenhum problema com o número 24. O Corinthians é o time do povo, time das minorias, time de todos, que sempre usa sua marca a favor de campanhas contra qualquer tipo de preconceito, explica Duílio.  

Alguns dias após a polêmica, a camisa 24 foi cedida para o jogador, que ainda atua no clube usando a numeração. 
 
 
A RESISTÊNCIA 

 

Foto: Reprodução / Facebook / Bambi Tricolor 

 

Após a fundação da “Canarinhos LGBTQ+”, novos coletivos foram formados, somando um total de 16 grupos de torcidas LGBTQIA+ representando diferentes clubes pelo país, aliando forças e resistindo ao preconceito estruturado ao longo dos séculos pela cultura elitista do esporte, que até hoje deixa suas marcas por todo o país. “As torcidas LGBT’s são muito importantes porque pressionam os clubes a adotar práticas mais efetivas em relação ao assunto. Elas são as grandes responsáveis pelo fato dos times terem aberto os olhos para a homofobia”, comenta o jornalista João Abel, em seu livro denominado “Bicha! Homofobia estrutural no futebol”.