Acusados de colaborarem com 'trabalho forçado do regime cubano', servidores do programa têm vistos revogados
por
Victória Rodrigues
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18/08/2025 - 12h

 

O governo Trump revogou na última quarta-feira (13) os vistos de  dois brasileiros, que participaram da criação do Programa Mais Médicos em 2013. Mozart Júlio Tabosa, secretário do Ministério da Saúde do Brasil, e Alberto Kleiman, ex-funcionário do governo brasileiro, foram os alvos das sanções.

Em nota divulgada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, a justificativa apresentada foi que ambos teriam colaborado para um “esquema coercitivo de exportação de mão de obra” do governo cubano através do programa Mais Médicos, privilegiando o governo de Cuba às custas dos profissionais da saúde e cidadãos do país. 

O programa Mais Médicos foi uma iniciativa criada no governo de Dilma Rousseff, a fim de levar atendimento médico à áreas remotas e com maior vulnerabilidade. Dentro do programa, podem participar tanto profissionais brasileiros quanto estrangeiros, desde que cumpram com as exigências propostas, como formação com diploma e registro profissional. 

Entre 2013 e 2018 foram contratados profissionais cubanos, com uma parceria intermediada pela OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde). Nesse acordo, os participantes recebiam 30% do valor de sua remuneração, que na época chegava a 10 mil reais, os outros 70% eram destinados ao governo de Cuba.

Em 2015, o Mais Médicos, contava com cerca de 14 mil profissionais, dos quais 11,4 mil eram cubanos. No entanto, em 2018, após a eleição de Jair Bolsonaro, a parceria foi encerrada. 

Segundo Marco Rubio, secretário do Departamento de Estado estadunidense, as contratações para o programa não cumpriam a regulamentação impostas pelo próprio governo brasileiro. Também acusou o programa de contornar as sanções dos EUA contra Cuba. 

Rubio ainda justificou as medidas dizendo que o regime cubano estava exportando seus médicos para trabalhar de forma forçada e com isso estava deixando de cuidar da saúde de seus próprios cidadãos. “Esse esquema enriquece o corrupto regime cubano e priva o povo cubano de cuidados médicos essenciais”.

Além do Brasil, autoridades de países africanos, Cuba e Granada também foram alvos das restrições de vistos por cooperarem com o programa Mais Médicos.

Bruno Rodríguez, Ministro de Relações Exteriores de Cuba, criticou a decisão do governo dos EUA. “Isso mostra imposição e adesão à força como nova doutrina de política exterior a esse governo", disse. Também afirmou que Cuba continuará enviando médicos em missões à outros países. 

Nas redes sociais, Mozart Júlio Tabosa defendeu o programa de saúde, e manifestou sua insatisfação com a situação: "Essa sanção injusta não tira minha certeza de que o Mais Médicos é um programa que defende a vida e representa a essência do SUS, o maior sistema público de saúde do mundo - universal, integral e gratuito".

Essa decisão do governo de Donald Trump segue uma sequência de retaliações contra o Brasil. Desde o mês de julho, o país recebeu taxações em produtos exportados e sanções contra o Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. 

Presidente estadunidense evita divulgação da lista de Epstein e população levanta possibilidade de seu nome estar nela
por
Daniella Ramos
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14/08/2025 - 12h

 

Donald Trump foi eleito em 2024 tendo como uma de suas promessas a divulgação de uma suposta lista que teria o nome de todos os investigados por possível envolvimento com Jeffrey Epstein em crimes de pedofilia.

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Trump e Epstein juntos em uma festa em 1992. Foto: Reprodução/NBC

A cobrança em cima do presidente dos Estados Unidos para a divulgação da lista de investigados no caso, o levou a declarar para a imprensa que o caso era uma maneira de desviar a atenção para algo que é uma “besteira”, nas palavras dele.

“O fato de Trump não cumprir com o que prometeu pode ser pelo rumo que a política tomou… além do fato dele estar ou não envolvido”, comenta o doutor em Ciência Política da PUC-SP, Igor Fediczko. Segundo o Wall Street Journal, Donald Trump foi avisado no início do ano que seu nome estava nos documentos relacionados ao caso de Epstein, a Casa Branca respondeu dizendo se tratar de uma fake news. 

Além da indignação de eleitores a Trump sobre a falta de compromisso com a promessa de exposição dos documentos do processo de Jeffrey, os opositores também se manifestam nas redes sociais. Em sua conta no X, a deputada democrata Alexandra Ocasio-Cortez relacionou a demora na divulgação dos arquivos com supostas acusações de crimes sexuais cometidos pelo republicano. 

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Publicação feita no X pela deputada Alexandra Ocasio-Cortez. Foto: Reprodução/@AOC

 

Índices do Google Trends apontam que as pesquisas envolvendo o nome de Donald Trump e Jeffrey Epstein aumentaram no início de Junho e final de Julho, mesmo período em que o presidente estadunidense começou a distribuir altas tarifas para o mundo todo. 

“Talvez isso tenha feito com que a comunicação ou política do Trump tenha se tornado ainda mais radical”, comenta Igor Fediczko analisando que o tarifaço possa ser uma ”cortina de fumaça” para a polêmica de Epstein.

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Gráfico de pesquisa dos nomes de Donald Trump e Jeffrey Epstein. Foto: Reprodução/Google Trends

 

Apesar das hipóteses sobre a ligação do atual presidente dos Estados Unidos, os nomes que mais chamaram atenção recentemente sobre a proximidade com Epstein foram Bill e Hillary Clinton, que irão depor em outubro, e o príncipe Andrew, que aparentava ser amigo pessoal pelos e-mails trocados com Jeffrey. Assim como Trump, existe a comprovação de que eles já andaram no jato particular com Jeffrey Epstein e possivelmente tinham amizade. 

Jeffrey Epstein era um bilionário, empresário e financista americano, que ficou conhecido pela rede de tráfico sexual de menores ao qual tinha ligação. Seu trabalho com investimento fez com que construísse ligação com o ex-presidente Bill Clinton, Donald Trump, o príncipe britânico Andrew e outras celebridades. 

Em 2008, os pais de uma garota de 14 anos declararam à polícia do Estado americano da Flórida que Jeffrey Epstein havia a molestado. Naquele ano, ele firmou um acordo judicial com a promotoria, mas fotos de crianças foram encontradas por toda sua casa em Palm Beach causando sua condenação por exploração sexual de menores. Escapou de denúncias federais que poderiam causar prisão perpétua, conseguindo um acordo de 13 meses de prisão e indenização às vítimas. 

Onze anos depois, houve uma nova acusação de administração de uma rede sexual com meninas menores de idade. Logo foi preso e, enquanto aguardava o julgamento, se suicidou no presídio.

As investigações desses dois casos criminais geraram uma série de documentos que incluem transcrições de entrevistas com as vítimas e testemunhas e objetos confiscados nos imóveis de Epstein. A ex-namorada de Jeffrey, Ghislaine Maxwell, foi condenada em 2021 por associação criminosa de tráfico sexual de meninas.

As Forças de Defesa de Israel confirmaram a autoria do atentado
por
Annanda Deusdará
Maria Mielli
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13/08/2025 - 12h

Uma ofensiva de Israel matou seis jornalistas que estavam instalados em uma tenda de imprensa próxima ao hospital Al-Shifa, na Faixa de Gaza, no último domingo (10). Dentre as vítimas, quatro eram funcionários da agência de notícias Al Jazeera: dois cinegrafistas, Ibrahim Zaher e Mohammed Noufal, e dois repórteres Mohammed Qreiqeh e Anas al-Sharif. Ambos rostos conhecidos pelo êxito em denunciar diariamente o genocídio palestino. 

Minutos antes de morrer, Qreiqeh esteve no ar pela última vez, cumprindo mais um dia de trabalho. Al-Sharif havia postado em suas redes sociais, também pouco antes de se tornar mais um dos milhares de palestinos assassinados, que um ataque israelense estava acontecendo. “Oh Deus, concede-nos a paz, concede-nos a paz. Bombardeio israelense pesado e concentrado com faixas de fogo visando as áreas leste e sul da cidade de Gaza”, lamentou em sua conta no X.

O exército israelense acusou o jornalista de ser membro de uma das células do Hamas, mas sem apresentar provas. “Terrorismo em colete de imprensa ainda é terrorismo. Anas al-Sharif não estava apenas documentando para Al Jazeera. Ele era um membro do Hamas, desde 2013”, declararam em postagens feitas no Instagram oficial. A agência de notícias Al Jazeera, por outro lado, nega veementemente as acusações e afirma que o ataque foi uma estratégia israelense de silenciar um dos grandes nomes do jornalismo local. “Nós sabíamos que Anas era o alvo… Ele era nossa voz”, lastimou o jornalista independente Mohammed Qeita no site oficial da agência, após o ataque. Apesar de ter confirmado o planejamento e execução de al-Sharif, o governo de Israel não se manifestou sobre as outras cinco vítimas.

Não é a primeira vez que ataques a jornalistas ocorrem na Faixa de Gaza. Em julho de 2024, o jornalista Ismail al-Ghoul e o cinegrafista Rami al-Rifi tiveram seu carro bombardeado por um míssil enquanto cobriam o assassinato do chefe político do Hamas também para a Al Jazeera. As Forças de Defesa de Israel (FDI) confirmaram as mortes e alegaram que Ismail integrava as forças Nukhba, divisão militar de elite do Hamas. O noticiário para o qual os profissionais trabalhavam negou as acusações e fez um apelo para que fossem tomadas ações imediatas: “Insistimos que as instituições jurídicas internacionais responsabilizem Israel por seus crimes hediondos e exijam o fim do alvo e do assassinato de jornalistas,” declarou em nota a emissora à época.

No mês passado, quando acusado de ser membro do Hamas pelas FDI, al-Sharif negou toda e qualquer ligação com o grupo. Reafirmou que era um jornalista sem afiliações políticas e que sua única missão era relatar a verdade. “Num momento em que uma fome mortal assola Gaza, falar a verdade tornou-se, aos olhos da ocupação, uma ameaça”, concluiu em postagem na rede social. 

Em mensagem final preparada para o caso de sua morte e publicada postumamente por seus colegas, al-Sharif pede “que não se deixem silenciar por correntes, nem sejam impedidos por fronteiras, e que sejam pontes para a libertação da terra e de seu povo, até que o Sol da dignidade e da liberdade brilhe sobre nossa pátria ocupada”, e finalizou: “Não se esqueçam de Gaza… E não se esqueçam de mim em suas orações sinceras por perdão e aceitação”. 

Silenciamento de jornalistas 

O bloqueio que ocorre em Gaza também limita o acesso e a produção de notícias no local. Os meios de comunicação internacionais são proibidos de circular pela região, a não ser que estejam acompanhados pelo exército israelense. Atualmente, a única maneira de se ter acesso ao que acontece na região, além do relatado por Israel, se dá através das reportagens feitas por jornalistas palestinos.

De acordo com o Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ), 192 jornalistas foram assassinados desde outubro de 2023, quando começou o conflito. Esse número é maior do que a soma das mortes ocorridas nas duas guerras mundiais (69). Além das mortes, 90 profissionais foram presos por Israel no exercício de sua profissão. 

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Gráfico sobre o assassinato de profissionais de comunicação por razões políticas. IArte: Annanda Deusdará/Agemt

 

Ainda segundo a CPJ, em 2024 ao menos 124 jornalistas e outros trabalhadores de comunicação foram mortos; destes, 85 foram vítimas da guerra de Israel contra a Palestina. O número ultrapassou o recorde de 2007, durante a guerra do Iraque, de 113 mortes. O Comitê alerta que o crescimento da violência contra este grupo prejudica a circulação de informações.

Quem eram os seis jornalistas assassinados

Anas al-Sharif, 28 anos, pai de 2 filhos. Segundo a Al Jazeera, um dos rostos mais conhecidos por denunciar o genocídio em Gaza. Nasceu num campo de refugiados em Jabalia, no norte da região, e se formou na Al-Aqsa University Faculty of Media. Seu pai foi morto por Israel em um bombardeio na casa da família em dezembro de 2023.

Mohammed Noufal, 29 anos, era cinegrafista da Al Jazeera. Também de Jabalia, perdeu a mãe e um irmão em ataques de Israel. Seu outro irmão, Ibrahim, também trabalha no veículo. 

Ibrahim Zaher, 25 anos, também era cinegrafista e paramédico voluntário. Nasceu no mesmo campo de refugiados que seus colegas de trabalho.

Mohammed Qreiqeh, 33 anos, fez sua última aparição ao vivo um pouco antes de ser assassinado. Nasceu em Gaza em 1992 e viveu na vizinhança de Shujayea. Formou-se jornalista na Islamic University of Gaza. Israel matou seu irmão, Karim, em março, num bombardeio. 

Moamen Aliwa, 23 anos, era estudante de engenharia e cinegrafista independente.

Muhammad Al-Khalidi, 33 anos, era um jornalista independente que produzia vídeos para o Youtube documentando o conflito em Gaza.

 

Sob pretexto de "verdades econômicas", Trump usa tarifas para punir decisões judiciais do Brasil e ignora a lógica comercial
por
Victória Rodrigues
Maria Clara Palmeira
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13/08/2025 - 12h

 

Começou a valer na última quarta-feira (6) o tarifaço com taxas de 50% impostas pelos Estados Unidos sobre os produtos brasileiros. Itens como suco, polpa de laranja, combustíveis, minérios, fertilizantes, aeronaves para uso civil, polpa de madeira, celulose, metais nobres e produtos de energia, foram isentos de taxas. Em contrapartida, café, frutas e carnes serão afetados pelo teto tarifário, 50%. 

O tarifaço anunciado por Donald Trump em abril propunha a taxação de países de acordo com o déficit da nação com os EUA. Para o Brasil estava previsto tarifas de 10% sobre os produtos exportados. No entanto, em julho deste ano, após a cúpula dos BRICS, Trump enviou uma carta ao chefe da nação brasileira aumentando o valor.

Em parte por causa dos ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres e à violação fundamental da liberdade de expressão dos norte-americanos, a partir de 1º de agosto de 2025, cobraremos do Brasil uma tarifa de 50% sobre todas e quaisquer exportações brasileiras enviadas para os Estados Unidos.” escreveu o presidente.

Uma de suas alegações na carta, foi o julgamento do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL). Segundo Trump, Bolsonaro está sofrendo “acusações criminais injustificadas”. Além disso, as ações do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a rede social X também o motivou na imposição de taxas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou, no domingo (3), que não tem a intenção de “provocar os Estados Unidos”, mas que o Brasil não deve ser visto como uma nação insignificante e não desistirá de usar moedas alternativas ao dólar.

Em entrevista a AGEMT, a internacionalista Julia Masquieto conta que será difícil implementar uma nova moeda. "Na prática é complicado efetivar essa nova moeda do BRICS, pois o dólar é usado há muito tempo em trocas comerciais. Mas acho que é uma oportunidade para os países do Brics intensificarem o comércio entre si, já que as barreiras são mais livres e não tão rígidas como o Trump está fazendo". 

A profissional comenta que o fortalecimento do bloco político exige uma ação global do mercado. "Com a instabilidade geopolítica que vivemos, é uma tendência que talvez os países procurem outros mercados, mas essa mudança exige um padrão global difícil de alcançar, entretanto, o BRICS poderia ter um alcance regional interessante." completa Julia. 

As taxas impostas pelo presidente americano não interferem diretamente sobre os preços no mercado do consumidor brasileiro. A princípio, pela baixa demanda para exportação, os preços cairão no mercado interno. No entanto, com uma menor demanda de venda externa, a produção também diminuirá, resultando em uma possível alta novamente. 

Para tentar minimizar os efeitos dessa medida, Lula se encontrou nesta segunda-feira (11) com o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin.

Lula e Alckmin em julho de 2025. Reprodução: Adriano Machado
Lula e Alckmin em julho de 2025. Reprodução: Adriano Machado

O objetivo foi alinhar os últimos detalhes de um plano de contingência contra o tarifaço norte-americano, que será divulgado nesta quarta (13), em cerimônia de divulgação no Palácio do Planalto.

Esse pacote deve incluir linhas de crédito para empresas afetadas, o adiamento do pagamento de tributos federais por até dois meses e compras públicas de produtos perecíveis, como peixes, frutas e mel. A sobretaxa impacta cerca de 36% das exportações brasileiras para os EUA, mesmo assim, 694 produtos, como suco de laranja e aeronaves, continuam com tarifas reduzidas de 10%, estabelecida em abril

Sobreviventes relembram o ocorrido e alertam sobre o risco dos atuais conflitos no Oriente Médio e Europa.
por
Annanda Deusdará
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07/08/2025 - 12h

Em agosto de 1945, os Estados Unidos bombardearam as duas cidades. Em decorrência da explosão e dos efeitos da radiação, cerca de 200 mil pessoas morreram. A expectativa com os ataques era fazer o governo Japonês se render - único país do Eixo que faltava ser derrotado - e, desta forma, terminar a 2° Guerra Mundial que ocorria desde 1939. 

Nos dias 6 e 9 deste mês, o Japão realiza um evento anual em Hiroshima e Nagasaki com o objetivo de relembrar ao mundo dos horrores causados pelos ataques e da importância de evitar que esse tipo de tragédia volte a se repetir.

Com expectativa da participação de aproximadamente 180 países convidados, as celebrações contam com homenagens às vítimas, discursos contra o armamento nuclear e exigências para que o Estado reconheça as necessidades das vítimas sobreviventes e forneça os auxílios necessários.

 

Contexto dos bombardeios

Em 1942, o Japão atacou a base naval americana de Pearl Harbor, o que levou os EUA a entrarem na guerra como forma de retaliação. Três anos depois, no dia 26 de julho, o presidente Harry Truman exigiu a rendição do Japão, sob ameaça de “destruição total e imediata”. Apesar de não haver menção ao uso de bombas nucleares, o armamento fazia parte do Projeto Manhattan e integrava o arsenal dos EUA, que pretendia encerrar o conflito com o uso delas, se fosse necessário.

Como o presidente do Japão não se rendeu, Hiroshima, que até então tinha escapado dos bombardeios, foi atacada na manhã de 6 de agosto de 1945. A explosão gerou uma onda de calor de mais de 4.000 °C em um raio de aproximadamente 4,5 km ². Estimativas apresentam números que entre 50 mil e 100 mil mortos no mesmo dia e cerca de 60 mil edifícios destruídos.

No dia 9, foi a vez da cidade de Nagasaki, que não era o alvo inicial devido ao seu terreno montanhoso e a proximidade de um campo de prisioneiros aliados de guerra. Entretanto, devido ao mau tempo em Kokera, que impossibilitou a visão dos pilotos, foi feita uma mudança de planos. Apesar da explosão ter sido mais forte que em Hiroshima, as montanhas da cidade ajudaram a diminuir o impacto, que destruiu 7,7 km². Após ambos os ataques, o Imperador Hirohito declarou sua rendição em 15 de agosto de 1945. O documento que confirmava sua decisão foi assinado em 2 de setembro, encerrando assim a 2° Guerra Mundial.

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​​Estátuas e construções, após a bomba atingir a cidade de Nagasaki. Imagem: Foto/Getty Imagens

Em 1946, o Japão adotou a “Constituição da Paz”, na qual se comprometeu a não entrar em outras guerras e em 1967, embora não tenham sido os japoneses a lançar uma bomba nuclear sobre um território, o país implementou os “Princípios Não Nucleares”, que consistem na rejeição da posse e importação de armamentos nucleares.

Apesar de terminado o conflito, os sobreviventes viveram sequelas. A exposição à radiação causada pelas bombas ocasionou náuseas, vômitos, sangramento e queda de cabelo em milhares de pessoas.

Com o passar do tempo, algumas pessoas também tiveram problemas de longo prazo como catarata e diversos tipos de câncer. De acordo com pesquisas do Life Span Study (LSS), os casos de leucemia entre os moradores de ambas as cidades aumentaram significativamente após os ataques.

 

Como estão as cidades atualmente?

Diferente da cidade soviética de Chernobyl, que até hoje segue inabitável após o famoso acidente em sua usina nuclear, Hiroshima e Nagasaki foram reconstruídas e povoadas em segurança. Segundo John Luxat, especialista em segurança nuclear da Universidade McMaster, em entrevista à BBC Mundo, isso foi possível por dois fatores cruciais, o tipo de reação química que houve nos dois eventos e a altitude. 

A bomba atômica tem uma fissão de cadeia rápida entre os explosivos com o intuito de causar mais estragos, o que torna a vida útil da radiação menor, quando comparada à provocada pela usina de Chernobyl, que teve uma reação mais lenta. Outro fator foi a altura em que as bombas foram detonadas, o fato disso ter ocorrido acima da cidade, permitiu que as partículas de radiação se dissipassem na atmosfera, ao invés de penetrarem na terra, como ocorreu em Chernobyl, onde a explosão aconteceu no nível do solo. 

Sendo a 11ª cidade com mais moradores no Japão, Hiroshima tem 905,08 km² e uma população estimada em dois milhões de habitantes. A região é um polo industrial com empresas que vão desde indústrias pesadas, como a construção naval, até setores de ponta, como máquinas elétricas e peças eletrônicas. Desde 1947, o Sino da Paz toca no dia 6 de agosto às 8h15 (dia e horário em que a bomba estadunidense atingiu a cidade), uma cerimônia também é realizada em homenagem às vítimas nesta data. 

Em 1949, foi aprovada uma lei que permitia a construção de novas casas em Nagasaki, entretanto, alguns escombros foram deixados para lembrar o ocorrido. Em homenagem às vítimas, nos anos 1990, foi fundado o Museu da Bomba Atômica, que conta a história da Guerra e do uso de armas nucleares.

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Memorial da Paz de Hiroshima, o domo foi destruído pela bomba mas foi mantido desta forma como lembrança dos horrores do ataque. Imagem: Foto/ Pixabay

 

Memória e os desafios da reparação

Milhares de moradores de Hiroshima e Nagasaki que estavam nas cidades nos dias dos ataques dos EUA, não são reconhecidos de maneira oficial como vítimas dos bombardeios atômicos. O motivo é o Estado japonês só considerar quem estava próximo ao centro do impacto, onde a radiação foi mais intensa. A decisão negou e nega acesso gratuito a cuidados médicos para os demais afetados. 

A justificativa do governo é que essas pessoas que estavam em pontos mais afastados não sofreram sequelas e, por isso, não têm direito aos benefícios como as vítimas oficiais. A decisão é interpretada como discriminação geográfica.

De acordo com o prefeito de Nagasaki, Shiro Suzuki, a argumentação não têm sentido, pois todas as pessoas que estavam em um raio de até 2 Km do ponto de impacto foram afetadas pela radiação. Durante as comemorações, as vítimas exigem que as autoridades corrijam este equívoco. A associação Hidankyo, que reúne os sobreviventes e recebeu o Prêmio Nobel da Paz no ano de 2024, também fez esse apelo neste ano.

Toshiyuki Mimaki, copresidente da associação, comentou alertou sobre as guerras que estão ocorrendo em países com poder nuclear como Rússia e Israel e o perigo que isso representa. A comunidade pede que os países lutem pelo fim do armamento nuclear com base nos relatos das vítimas e fomentando e frequentando espaços como o do Memorial, que conta a história desse período histórico.

Os sobreviventes temem que, com a falta da lembrança viva dos horrores causados pelos ataques atômicos, o mundo volte a fazer uso desse tipo de armamento. O prefeito de Hiroshima, Kazumi Matsui, também endossou as preocupações do grupo e reiterou que a busca de potências mundiais para aumentar seu poder bélico em busca de amedrontar outros países e resolver conflitos, prejudica a conquista da paz mundial.

A cerimônia, que ocorreu nesta quarta-feira (6) em Hiroshima, contou com representantes de 120 países e regiões, segundo autoridades locais. No entanto, países com armamento nuclear como China e Paquistão não enviaram equipes.

Neste sábado (9), outra cerimônia aconteceu na cidade de Nagasaki com um grande número de países presentes, incluindo a Rússia, que não participava do encontro desde a invasão da Ucrânia, em 2022. 

A recente aprovação marca um momento histórico no conflito e muda o tom do posicionamento dos EUA em relação a Guerra
por
Luane França
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27/03/2024 - 12h

O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou, nesta segunda-feira (25), uma proposta de cessar-fogo imediato no conflito entre Israel e Hamas. A medida recebeu o apoio de 14 países, enquanto os Estados Unidos optaram pela abstenção. É a primeira resolução admitida após cinco meses e quinze dias de conflito que já deixou mais de 30 mil mortos apenas na Faixa de Gaza. 

A iniciativa, encabeçada por Moçambique, foi proposta por um grupo de países que integram os assentos rotativos na organização, incluindo Argélia, Coreia do Sul, Equador, Eslovênia, Guiana, Japão, Malta, Moçambique, Serra Leoa e Suíça. Por outro lado, China, França, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos representam os assentos permanentes do conselho, com direito a veto.

A resolução articulada tem como objetivo garantir um período de tranquilidade durante o restante do mês sagrado do Ramadã, iniciado em 11 de março deste ano e que se estenderá até 10 de abril, momento de significativa importância para os seguidores do Islamismo.

Durante o Ramadã, um período de reflexão e oração sagrada para os muçulmanos, sendo considerado um dos pilares do Islã, os fiéis jejuam diariamente do nascer ao pôr do sol, como uma forma de expressar devoção e buscar purificação espiritual.

Além disso, a proposta sugere uma interrupção imediata e duradoura do conflito, com o intuito de possibilitar a libertação de todos os reféns mantidos pelo Hamas e garantir o acesso à ajuda humanitária em Gaza. 

Contextualização do conflito entre Israel e Palestina em Gaza. 

Em meio a um histórico marcado por conflitos e tensões políticas, a disputa territorial entre Israel e Hamas se intensificou em 7 de outubro de 2023, após ataques terroristas cometidos pelo grupo islâmico palestino em território israelense. 

O grupo extremista lançou uma série de ataques de natureza variada, com o objetivo recuperar o território palestino ocupado por Israel. A ofensiva militar incluiu bombardeios em cidades israelenses, sequestros de reféns e ações que culminaram na morte de civis.    

Em resposta aos ataques, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu declarou que o país estava em guerra e, logo após, ordenou um bombardeio à Faixa de Gaza, território controlado pelo grupo Hamas. Isso resultou na morte de cidadãos palestinos que, predominantemente, residiam na região.  

O impacto humanitário diante dessas tensões crescentes e do conflito resultante tem sido profundo. Segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), o número de vítimas reflete a gravidade da situação. Este conflito prolongado entre Israel e o grupo terrorista foi identificado como o mais mortal em território israelense desde 2008 e o mais letal na Faixa de Gaza desde 2015.

O Ministério da Saúde palestino, controlado pelo grupo Hamas, divulgou, quatro meses após o início do conflito, a situação alarmante na Faixa de Gaza. Os contínuos ataques israelenses resultaram na perda de 27.708 vidas, incluindo mulheres e crianças, destacando a natureza devastadora do conflito. 

Adicionalmente, aproximadamente 67.147 pessoas foram gravemente feridas durante os confrontos. Isso reforça a urgente necessidade de intervenções humanitárias para aliviar o sofrimento da população afetada.

Mulher adulta e uma criança caminham de mãos dadas em meio a destroços. Foto: REUTERS/Dawoud Abu Alkas/CNN Conteúdo
Mulher adulta e criança caminham de mãos dadas entre destroços. ​​Foto: REUTERS/Dawoud Abu Alkas/CNN Conteúdo

 

O impacto prático da resolução de cessar-fogo na guerra

A ocupação do território palestino por Israel já dura 75 anos. Segundo Rodrigo Amaral, professor de Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), com foco na Política Internacional, esse fator, somado ao apoio dado pela comunidade internacional ocidental, violou profundamente a soberania e autonomia da Palestina e é um dos principais obstáculos a serem enfrentados para a resolução do conflito.

A proposta de cessar-fogo aprovada pelo Conselho de Segurança da ONU pode ser considerada um avanço significativo no campo diplomático, uma vez que é a primeira resolução a ser admitida durante o confronto. A aprovação demonstra o esforço conjunto da comunidade internacional em busca de uma solução para o conflito. 

Entretanto, apesar de aprovada pela maioria dos membros do Conselho de Segurança, Amaral acredita que a resolução não terá efeito imediato. O professor acrescenta que, a médio prazo, pode ser que ela inspire outras resoluções que levem ao fim do conflito, mas que nesse momento "a grande questão é em que medida ainda haverá tolerância da comunidade internacional às ações de crime humanitário".

Michel Gherman, doutor em História Social e professor no Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também não acredita que a resolução do Conselho de Segurança da ONU irá garantir um cessar-fogo imediato. 

“Israel e o Hamas, cada um em seu lado, têm se mostrado contrários a qualquer tipo de negociação que leve ao fim, porque o fim significa o fim da guerra e o fim da guerra significaria a substituição dos dois agentes importantes dessa guerra, que são o Hamas e o próprio Benjamin Netanyahu’, acrescenta Gherman . 

Com vitória expressiva, o mandatário fica no poder até 2030.
por
Artur Maciel Rodrigues
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19/03/2024 - 12h

O presidente, Vladimir Putin, de 71 anos, foi reeleito para o seu 5° mandato no último domingo (18), na Rússia. O mandatário disputou as eleições contra três candidatos escolhidos: Nikolai Kharitonov (Partido Comunista),  Leonid Slutsky (Partido Liberal) e Vladislav A. Davankov (New People). 

 

A votação ocorreu por todo território russo, incluindo parte da Ucrânia, país que tem territórios invadidos e ocupados pela Rússia desde fevereiro de 2022. A eleição ocorreu um mês após a morte de Aleksei  Navalny, principal opositor de Putin.

 

O resultado divulgado pela Comissão Eleitoral Central, ainda no domingo, indicou uma vitória esmagadora de Putin, que conquistou 87% dos votos válidos. A vitória do presidente russo foi contestada por opositores, entre eles, Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, que chamou Putin de “ditador” e a eleição russa de “farsa”.

 

“É claro para todos no mundo que este indivíduo, como tantas vezes aconteceu na história, está simplesmente doente de poder e está a fazer tudo o que pode para governar para o resto da vida. Não há mal que ele não cometerá para prolongar seu poder pessoal. E não há ninguém no mundo que esteja imune a isso”, disse Zelensky.


 

Rodrigo Amaral, Professor de Relações Internacionais da PUC-SP,  explicou que esse movimento já era esperado. “É evidente que existem visões bastante críticas a respeito da veracidade desses números, e com essa vitória, ele vai ser o maior líder russo desde Stalin o que demonstra essa hegemonia explícita, que reflete o contexto populista da Rússia”. 

 

Desde o fim da União Soviética em 1991, a Rússia teve oito mandatos presidenciais distribuídos entre 3 presidentes. Boris Yeltsin, que governou de 1991 a 1999 renunciou à presidência, após má popularidade durante o segundo termo. 

 

Quem assumiu após a renúncia foi o próprio Vladimir Putin, o primeiro-ministro da época. Depois de ser presidente interino, ele concorreu e ganhou as eleições de 2000, e se manteve na presidência até 2008. Durante o governo de Dmitry Medvedev (2008 até 2012) voltou ao cargo de primeiro- ministro e em 2012, reassumiu a presidência.  

 

O ex-agente da KGB, está no poder na Rússia há pelo menos 24 anos, com os resultados e com a recente mudança na constituição do país, ele pode concorrer (e ganhar) mais um termo se mantendo presidente até 2036. Caso isso se confirme, Putin irá ultrapassar o recorde de 29 anos do governo de Joseph Stalin. 

 

Eleições em tempo de guerra

 

Apesar das eleições no país, as ofensivas contra a Ucrânia não pararam. Em resposta aos ataques ucranianos antes das eleições no dia 15 de março, o país revidou com um ataque onde morreram 16 pessoas e outras 20 ficaram feridas. 

 

Destruição pelos ataques russos em Mykolaiv, Ucrânia. Foto: Serviço de imprensa do Serviço
de Emergência do Estado da Ucrânia na região de Mykolaiv / Reuters 


 

A guerra da Rússia contra a Ucrânia completou 2 anos em fevereiro. Com a adição da Suécia na OTAN ,e indicativos de tropas francesas na Ucrânia. A tensão está em um ponto crítico, com Putin falando do uso de armas nucleares: “Do ponto de vista técnico-militar, claro que nós estamos prontos, estamos constantemente em estado de alerta, é reconhecido que o nosso Tríade nuclear é o mais moderno”. 

 

Amaral, argumenta que mesmo com a paz impossível, por causa das duas concepções de mundo distintas e guerra improvável, por que a chance de conflito nuclear é baixa, é algo caro para todos os lados. 

 

“Talvez seja o maior teste, através de uma guerra interestatal, uma guerra que envolve grandes potências. E existe essa questão do perigo nuclear,  ela sempre volta, mas que explicitamente é a história da Guerra Fria, particularmente, mostra que não existe”, complementa. 

 

Putin comenta sobre a morte de Navalny durante discurso 

 

Em seu discurso de domingo à noite, Putin rompeu o costume de não falar sobre a morte de Alexey Navalny, opositor do mandatário que morreu em fevereiro deste ano em uma colônia penal no Árctico. A família do e os apoiadores de Navalny acusaram Putin de ser o responsável, mas as alegações foram rejeitadas pelo Kremlin. 

 

“Quanto ao Sr. Navalny – Sim, ele faleceu. É sempre um acontecimento triste. E houve outros casos em que pessoas nas prisões faleceram. Isso não aconteceu nos Estados Unidos? Aconteceu, e nem uma vez”, disse.

 

Putin assumiu que poucos dias antes da morte de  Navalny foi informado uma proposta para trocá-lo por prisioneiros detidos em países ocidentais “A pessoa que falou comigo ainda não havia terminado a frase quando eu disse que concordo, mas, infelizmente, [a morte de Navalny] aconteceu, só  havia uma condição de trocá-lo para ele não voltar. Bem, essas coisas acontecem. Não há nada que você possa fazer sobre isso, isso é a vida”. 


 

Aleksei Navalny em Moscou, 2019. Foto: Sefa Karacan/Anadolu /Getty Images. 


 

Aleksei Navalny  durante anos demonstrou em seu blog as corrupções do Kremlin. Em 2021 ele fez uma reportagem onde ele falava do “maior suborno da história” uam mansão com o valor de 1,4 bilhões de dólares, localizado à beira do mar negro. Aleksei foi preso várias vezes, sofreu pelo menos 3 tentativas de envenenamento. E tentou concorrer à eleição na Rússia em 2018 mas foi impedido pelo Kremlin. 

 

A coligação de centro-direita conquistou a maioria das cadeiras no Parlamento, mas precisará fazer aliança para governar
por
Octávio Alves
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12/03/2024 - 12h
Luís Montenegro discursando
Líder da Aliança Democrática, Luís Montenegro, em discurso após as eleições portuguesas . Foto: Pedro Nunes/Reuters

 

Portugal elegeu, no último domingo (10), os deputados para a Assembleia da República, o Parlamento do país. A Aliança Democrática, coalizão de partidos de centro-direita, obteve a maior parte das cadeiras disponíveis (79) e superou a soberania do Partido Socialista (PS) que esteve à frente da Casa nos últimos nove anos. O PS conquistou 77 assentos nessas eleições.
Já foram contabilizados 99.01% dos votos, faltando apenas os votos do exterior que devem ser apurados até o fim da semana. 226 das 230 cadeiras já foram ocupadas. 

O partido de extrema-direita, Chega, liderado pelo político André Ventura conquistou 48 cadeiras. O resultado mostra uma ascensão da extrema-direita desde a última eleição, o número de deputados eleitos pela legenda quadruplicou neste ano. 

“Não sabemos ainda como é que esta noite ficará conhecida na história de Portugal, mas há um dado que já temos a certeza: esta é a noite em que acabou o bipartidarismo em Portugal”, disse Ventura após o resultado. 

Gráfico
Na última eleição o Chega, partido de extrema direita, tinha conquistado apenas 12 cadeiras. Fonte: Jornal Público Portugal/ Reprodução. 

As eleições legislativas estavam previstas, originalmente, para  2026, mas foram antecipadas após a renúncia do primeiro-ministro António Costa  (PS), acusado de corrupção pelo Ministério Público português. As acusações se mostraram infundadas uma semana depois e o MP veio a público dizer que o acusado não era o político socialista, mas um homônimo.

Como funciona as eleições em Portugal? 

O país vive sob um regime semipresidencialista. O presidente, Marcelo de Sousa, exerce a função de Chefe de Estado e governa juntamente com o primeiro-ministro.

Os votos são por partido e não por candidato, caso a legenda consiga eleger pelo menos 116 deputados ganha o controle do legislativo. Se isso não ocorrer, a sigla que conseguiu maior número de cadeiras  pode se agrupar com partidos menores até chegar no número mínimo de  assentos necessários. O primeiro-ministro poderá ser, inclusive, de um desses partidos. 

Os próximos passos

Os principais candidatos
Pedro Nuno Santos (PS), Luís Montenegro (PSD) e André Ventura (Chega) — Foto: Reuters

Como o Aliança Democrática, liderado por Luís Montenegro, não conseguiu o número de assentos necessários, a legenda precisará fazer alianças para governar.

O que pode se revelar um desafio, já que Montenegro havia mencionado que não faria alianças com o Chega e reiterou isso após o resultado: "Nunca faria a mim próprio, ao meu partido e à democracia portuguesa tamanha maldade que seria incumprir compromissos que assumi de forma tão clara” disse.

Por outro lado, Pedro Nuno Santos, líder do Partido Socialista disse que apesar de não impedir a constituição de um governo minoritário da AD, não irá contribuir para uma aliança entre as legendas:  "A AD que não conte com o PS para governar. Não é a nós que [os deputados da aliança] têm de pedir para suportar um governo [da AD]”, declarou. 

O líder do Chega, André Ventura, que se mostrou favorável à uma coligação de direita,  se manifestou sobre a recusa de Luís Montenegro à formação de uma aliança: " Só um líder e um partido muito irresponsáveis deixarão o PS governar quando temos na nossa mão a possibilidade de fazer um governo de mudança”. 

O presidente, Marcelo de Sousa, anunciou que irá convidar o líder do partido vencedor para tentar formar um governo. A consulta que teve início nesta terça-feira (12) se prolongará até 20 de março. Se até lá os partidos não apresentarem nenhuma aliança que garanta o número mínimo de assentos, o chefe de Estado pode convocar novas eleições. 

O direito ao aborto está na Carta Magna e passa a ser irreversível no país. França é o primeiro país a consolidar este direito.
por
Mohara Ogando Cherubin
Sônia Xavier
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08/03/2024 - 12h

 

A decisão de tornar o direito ao aborto constitucional foi tomada no ínicio dessa semana (4). A aprovação alcançou a maioria necessária de pelo menos três quintos dos votos dos parlamentares para que a Constituição de 1958 fosse revista e a lei de direito ao aborto incluída.

A inscrição “A lei determina as condições de que a mulher tenha a liberdade garantida de recorrer ao aborto” foi adicionada nesta sexta-feira (8), Dia Internacional da Mulher, no atrigo 34 da Constituição francesa em cerimônia ao ar livre em Paris. 

A decisão torna, agora, o direito ao aborto irreversível no país segundo Macron. Ainda durante seu discurso, o presidente anunciou que pretende lutar para que o direito se expanda pela União Europeia. 

Projeção na Torre Eiffel diz: Meu corpo minha escolha
Projeção  na Torre Eifel  diz: “Meu corpo, Minha Escolha” após votação na segunda-feira (4) para constitucionalização do aborto. Foto: Abdul Saboor/Reuters

 

Por que recorrer à constitucionalização do aborto?

O aborto é permitido na França desde 1975. A lei já teve seu texto alterado nove vezes, a última modificação, ocorrida em 2022, passou a permitir abortos até a 14ª semana de gravidez, financiados pelo sistema de seguridade social francês e sem necessidade de justificativas. 

A decisão de incluir o direito ao aborto na Constituição do país surgiu após a deliberação da Suprema Corte dos Estados Unidos de revogar o direito federal ao aborto, revertendo o julgamento de Roe v. Wade. A decisão da Corte norte-americana delegou a tribunais e autoridades estaduais o poder de restringir ou proteger o acesso das mulheres ao aborto legal. 

A advogada Juliana Tanno, explicou, em entrevista à AGEMT que “aquilo que é permitido perante a lei ainda pode ser questionável se violar os princípios e disposições da Constituição”. "A Constituição é a lei fundamental que define a estrutura do governo e os direitos fundamentais do cidadão, ou seja, é a lei suprema de um país", complementa. 

Mulheres segurando cartazes e faixas em manifestação a favor do aborto
Manifestação na França a favor da constitucionalização do aborto após decreto dos EUA. Foto: Reprodução/Reuters

 

Temendo que a França fosse influenciada por esse decreto dos Estados Unidos e pelo avanço da extrema-direita no país, feministas e políticos progressistas passaram a levantar a discussão a cerca da constitucionalização do aborto, com objetivo de assegurar o direito das mulheres de realizar o procedimento. Foram apresentados no Parlamento francês mais de cinco projetos de lei pela inclusão do direito na Carta Magna.

"Liberdade garantida" 

O projeto da presidente do La France Insoumise (LFI), Mathilde Panot, até então aprovado pela Assembleia Nacional no ano anterior, passou por alterações em seu texto em fevereiro de 2023. 

Através de ações de partidos de direita, o termo "direito" foi substituído por "liberdade" da mulher de realizar um aborto. Essa modificação no documento enfureceu os movimentos feministas do país, tendo em vista que o Governo francês poderia restringir o acesso ao procedimento com mais facilidade, pois a ação deixava de ser um direito.

O projeto de Panot demandaria novamente a aprovação da Assembleia, sem demais modificações, e por ser uma iniciativa do Parlamento, precisaria da validação de um referendo também. 

Após pressão dos movimentos feministas, o presidente Emmanuel Macron elaborou seu próprio texto, agora com o termo “liberdade garantida”. O projeto foi enviado ao Parlamento em outubro de 2023, a Assembleia Nacional aprovou em janeiro e o Senado no dia 18 de fevereiro. 

 

A luta pelo direito da mulher na França: um contexto histórico

A decisão de incluir o aborto na Constituição francesa é marcada por séculos de enfrentamento dos movimentos feministas. A busca por direitos iguais se inicia no século XV com a escritora Christine de Pizan, que defendia em suas obras os direitos das mulheres à educação, tal como a escrita e a independência feminina. 

Mais tarde, no século XVIII, a ativista Olímpia de Gouges proclamou na "Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã" que a mulher possuía direitos naturais idênticos aos dos homens e que, desse modo, tinha o direito de participar, direta ou indiretamente, da formulação das leis e da política em geral após a exclusão das mulheres da “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” durante Revolução Francesa. 

Em 1949, Simone de Beauvoir publicou a obra "O Segundo Sexo", que aborda um novo modelo de pensamento sobre a mulher na sociedade, juntamente à definição de feminismo moderno a partir da opressão sofrida pela figura masculina.

Confusão entre mulheres e policiais em marcha pelo aborto na França em 1972
Manifestação a favor da legalização do aborto na França em 1972. Foto: Reprodução/ Getty Images

 

No ano de 1971 foi realizado o “Movimento das 343”, divulgado pelo Nouvel Observateur, no qual centenas de mulheres assinaram uma petição para legalizar o aborto no país e adimitiram já ter interrompido ilegalmente uma gestação. 

Em 1973, surgiu o MLAC (Movimento pela Liberalização do Aborto e da Contracepção) que reúne tanto as feministas quanto os membros da classe médica que passam a praticar aborto seguro, ainda que ilegal. Posteriormente, em 1974, a Ministra da Saúde e sobrevivente do Holocausto, Simone Veil, aprovou um projeto de lei que descriminalizou o método de aborto no país, e por fim, em 1975, a interrupção voluntária da gravidez foi legalizada perante a lei francesa. A Lei Veil representou um avanço da legislação sobre o aborto na França e um vitória após anos de luta dos movimentos feministas.

Entenda o que é, como surgiu e de que modo funciona o grupo islâmico responsável pela ofensiva no início de outubro de 2023
por
Luan Leão
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06/05/2024 - 12h

No dia 07 de outubro de 2023, integrantes do grupo Hamas realizaram uma ofensiva contra Israel, com uma incursão pelo sul do país. O resultado foi a morte de cerca de mil israelenses e outros 200 foram feitos reféns. Em resposta, a contraofensiva israelense - que já dura mais de seis meses - resultou na morte de mais de 30 mil palestinos, além de um cerco à Faixa de Gaza.

Para entender o conflito de décadas, a AGEMT preparou uma série especial de quatro reportagens sobre o conflito Palestina e Israel. Nesta reportagem você vai ver como surgiu o grupo Hamas, a influência política e o impacto na resistência Palestina. Além do Hamas, vamos falar sobre o Hezbollah, grupo que atua no sul do Líbano, também contrário a Israel.

Grupo Hamas tem atuação política na Palestina
Hamas surgiu na década de 1980, com atuação pelo bem-estar social.
Foto: Mohammed Abed/Getty Images

Hamas: resistência armada, política e bem-estar social

O grupo tem origem ideológica na Irmandade Muçulmana, maior e mais antiga organização islâmica do Egito, e surgiu no contexto da Primeira Intifada, em 1987. Fundado pelo Xeque Ahmed Yassin e Abdel Aziz al-Rantissi, Hamas é um acrônimo para Harakat al-Muqawama al-Islamiya (Movimento de Resistência Islâmica), e significa zelo. No seu emblema, o Hamas tem o Domo da Rocha de Jerusalém, bandeiras palestinas e o contorno de um Estado palestino, incluindo o território de Israel.

No estatuto da sua criação, o Hamas definiu o território da Palestina histórica, incluindo a atual Israel, como terra islâmica. Segundo o documento, o grupo também exclui a possibilidade de paz permanente com o Estado de Israel. Ainda pelo estatuto, o Hamas é acusado de antissemitismo, já que trechos atacam aos judeus enquanto povo. No documento, por exemplo, o grupo palestino se comprometia com a destruição do Estado de Israel.

Inicialmente, o Hamas pretendia se fortalecer em duas frentes: o braço armado contra Israel, com as Brigadas Izz al-Din al-Qassam (IQB), e a promoção de bem-estar social aos palestinos como uma espécie de entidade social com construção de escolas, hospitais, distribuição de comida e etc. Na fundação, o grupo não demonstrava interesse em manter um braço político, o que aconteceu anos mais tarde.


Dawah

Apesar da forte associação com a luta armada, o Hamas possui um braço de serviços sociais chamado Dawah. A atuação se dá, em sua maioria, na região da Faixa de Gaza, região de alta concentração populacional e bastante empobrecida. O Dawah atua na gestão de escolas, orfanatos, restaurantes populares e clubes esportivos. Assim como feito pela Irmandade Muçulmana no Egito, o Hamas entende que a assistência social está na religião e é parte da resistência.

Dawah, em tradução literal, significa “chamado de Deus”. Pela religião, este chamado obriga os fiéis a ajudar uns aos outros por meio de obras de caridade. Para entender a atuação do Dawah, em 1990, cerca de 85% do orçamento do Hamas foi destinado para assistência social. Já em 2000, 40% das instituições sociais divididas entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, eram dirigidas pelo grupo.

Em 2005, a organização ajudava financeiramente cerca de 120 mil pessoas em Gaza. Dois anos depois, com apoio do Irã, o Dawah ofereceu um auxílio mensal de 100 dólares para 100 mil trabalhadores e 3 mil pescadores, impedidos de trabalhar por restrições de Israel à pesca. A concessão dos subsídios, no entanto, têm rigorosa avaliação de custo-benefício de como os beneficiados poderão apoiar o Hamas.


Brigadas Qassam

As brigadas Izz al-Din al-Qassam são o maior e mais organizado grupo armado palestino, mantendo atividades não apenas em Gaza, território em que hoje o Hamas atua, como também nos territórios ocupados na Cisjordânia. O braço militar foi fundado no começo da década de 1990, por Salah Shehadeh, morto por forças militares israelenses em um ataque aéreo em 2002. No início, se utilizou de diversos atentados suicidas para atacar Israel.

Em 1996, realizou uma série de atentados em ônibus, que culminou na morte de cerca de 60 israelenses. Os atentados foram uma resposta a morte de Yahya Ayyash, fabricante de bombas do Hamas, em 1995. A escalada de ataques do grupo foi tida como determinante para que o jovem político de direita Benjamin Netanyahu - contrários aos acordos de Oslo - fosse eleito primeiro-ministro de Israel, se distanciado das tratativas de paz na região e intensificando a expansão dos assentamentos israelenses e a repressão ao povo palestino.

O nome do braço militar é inspirado no combatente sírio Ezzedine Al-Qassam, que lutou contra colonizadores europeus durante o levante. Após ser expulso pelos franceses, assumiu a causa palestina, recorrendo à resistência armada contra judeus e colonizadores britânicos. Al-Qassam foi morto por autoridades britânicas em 1935, e acredita-se que a morte desencadeou a Revolta Árabe de 1936 a 1939. O atual comandante militar das Brigadas Qassam é Mohammed Deif, e o seu braço direito é Marwan Issa. 

Brigadas Qassam são responsáveis pelas ações militares do Hamas
Com cerca de 25 mil combatentes, a Brigada Qassam foi responsável pelo ataque de 07 de outubro.
Foto: Adel Hana/AP

De acordo com o CIA World Factbook - relatório das forças de inteligência dos Estados Unidos - estima-se que as Brigadas Qassam possuem entre 20 mil e 25 mil membros, um número não confirmado pelo grupo. O arsenal bélico do grupo não é publicamente conhecido, no entanto, os ataques são quase sempre realizados com granadas e foguetes improvisados.

Com a retirada das tropas israelenses de Gaza em 2005, o Hamas assumiu o controle político da região e desenvolveu a sua força militar. O Irã - potência militar da região - é tido, de maneira informal, como um financiador da evolução militar do grupo palestino. Recentemente o grupo também incorporou drones ao seu arsenal. Foi possível notar o uso dos equipamentos na ofensiva do último dia 07 de outubro.

Dados do Departamento de Estado dos Estados Unidos, em 2021, nos confrontos com Israel, as Brigadas Al-Qassam lançaram cerca de 4.400 foguetes. Os relatórios afirmam que o grupo palestino tem experiência com explosivos improvisados, e salientam que dependem de estratégia para os ataques. Além disso, o Hamas conta com uma poderosa estrutura de túneis que permite os combatentes se movimentarem sem serem detectados.


Massacre de Sabra e Chatila

Em 15 de setembro de 1982, a mando do então ministro da Defesa israelense, Ariel Sharon, o Tshal - força de defesa de Israel - cercou por inteiro o campo de refugiados de Sabra e Chatila, no Líbano. A ação foi uma resposta de Israel após um atentado de forças pró-Síria e pró-Palestina resultar na morte de cerca de 40 pessoas um dia antes. Sharon se reuniu com a milícia cristã-falange libanesa, para que invadissem o acampamento de refugiados.

Às 18h do dia 16 de setembro, cerca de 150 falangistas invadiram o campo de refugiados, armados com pistolas, facas e machados. A suposta missão do grupo era localizar guerrilheiros da Organização para a Libertação Palestina (OLP), mas não foi o que aconteceu. O grupo coordenou um massacre em sua maioria de mulheres, crianças e idosos.

A alegação do governo israelense, à época chefiado por Menachem Begin, era de que não sabiam o que se passava no acampamento. O jornal israelense Yedioth Ahronoth contradisse o governo e afirmou que oficiais israelenses sabiam sim do massacre. “Na quinta e na sexta-feira pela manhã, os ministros e funcionários (do governo de Israel) já sabiam da matança e nada fizeram para detê-la. O governo sabia desde a noite de quinta-feira e não moveu um dedo nem fez nada para evitá-la”, dizia o jornal. Além das mortes, os falangistas torturam e estupraram refugiados.

Os números de mortos no massacre não são exatos, mas números da Cruz Vermelha afirmam que pelo menos 2.400 pessoas morreram. O governo israelense foi pressionado a investigar e punir Ariel Sharon, no entanto, apenas o passou para a reserva.


Segunda Intifada

Em setembro de 2000, no dia 28 de setembro, o líder da oposição, Ariel Sharon, visitou a mesquita de Al-Aqsa escoltado por policiais e soldados israelenses fortemente armados. De acordo com o porta-voz do partido de Sharon, a visita foi para “demonstrar assim que, sob o governo do Likud, a Mesquita de Al-Aqsa permaneceria subjugada à soberania israelense”. A ação foi considerada uma afronta aos palestinos, que celebravam a memória dos dezoito anos do massacre de Sabra e Chatila, o mesmo em que Sharon foi responsabilizado pela conivência.

O resultado do descontentamento foi o segundo levante palestino contra Israel. A Segunda Intifada foi mais sangrenta que a Primeira, e durou de 2000 até 2005, quando foi declarado o cessar-fogo. Segundo o jornal israelense Haaretz, nos cinco anos de conflito, foram 3.300 mortes de palestinos e 1.330 mortes de israelenses.

Dentre as mortes, uma chamou a atenção do mundo. Em 30 de setembro, Muhammad Al-Durrah, de apenas 12 anos, foi assassinado por forças israelenses. Um vídeo registrou a criança com o seu pai, se abrigando de um tiroteio, o pai de Muhammad fazia sinais para que parassem os tiros. O cessar-fogo não aconteceu, e um dos disparos matou Muhammad Al-Durrah.


O Partido

Em 2004, o então primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, anunciou a intenção do governo de retirar as tropas e os colonos israelenses dos assentamentos - considerados ilegais pela Organização das Nações Unidas - na Faixa de Gaza. A saída de cerca de 8 mil colonos e o desmanche de 21 assentamentos aconteceu em agosto de 2005. Os militares israelenses saíram pouco mais de um mês depois, em 11 de setembro. A retirada das tropas marcou o fim de uma ocupação militar que durou 38 anos.

O Hamas organizou um desfile em Neve Dekalim, antiga capital dos colonos na Faixa de Gaza. Sem as tropas israelenses, a Palestina vivia uma situação inédita no território de Gaza, e a Autoridade Nacional Palestina (ANP) tinha um desafio pela frente. Mais da metade da população vivia abaixo da linha da pobreza e os movimentos armados - incluindo o Hamas - atraiam o apoio principalmente dos jovens.

Em 2006, com um resultado inédito, o Hamas derrotou o tradicional Fatah, de Abbas, e venceu as eleições para o legislativo palestino. Com a vitória do grupo, considerado terrorista por países como Estados Unidos, Israel, e blocos como a União Europeia, o então primeiro-ministro palestino, Ahmed Qorei, anunciou sua renúncia. A eleição foi acompanhada por observadores internacionais e considerada limpa, o resultado, no entanto, surpreendeu ao mundo.

Pelo resultado da eleição, o Hamas conquistou 76 dos 132 assentos do Conselho Legislativo Palestino, enquanto o Fatah alcançou apenas 43. Pouco depois do anúncio dos resultados, o presidente palestino, Mahmmoud Abbas - líder do Fatah e eleito pelo voto popular em janeiro de 2005-, disse em pronunciamento que continuaria com as negociações de paz com Israel. “Estou comprometido em implementar o programa para o qual vocês me elegeram no ano passado. É um programa baseado em negociações e um acordo pacífico com Israel”, disse Abbas em pronunciamento televisionado.

Sem ser reconhecido como governo, depois de conflitos internos, o Hamas expulsou o Fatah de Gaza, causando a divisão que conhecemos hoje. A Cisjordânia, que tem como capital Ramallah, segue sendo governada pela ANP, enquanto a Faixa de Gaza passou a ter o Hamas como representante político. Essa realidade, porém, trouxe uma série de bloqueios impostos por Israel e pelo Egito, que fazem fronteira com a região.


"O Fatah e o Hamas, eles se diferenciam por várias coisas, mas entre eles estavam numa disputa por corações e mentes e por uma agenda em conseguir popularidade e, lógico, conseguir apoio para as escolhas políticas que cada um fez", avalia Arturo Hartmann, pesquisador, doutor em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP, Unicamp e PUC-SP) e membro do Centro Internacional de Estudos Árabes e Islâmicos da Universidade Federal de Sergipe.

Hamas surpreendeu ao vencer eleições de 2006
Vitória eleitoral do Hamas, em 2006, aconteceu por descontentamento da população com ações de Israel no território Palestino. Foto: Mohammed Saleh/Reuters (2021)

"O Hamas vinha crescendo, obviamente, toda a ação dentro da Segunda Intifada e como você vendia as suas ações, a noção da defesa da luta anticolonial palestina, tinha a questão religiosa e moral. [...] Eles ganharam com 60%. Então, muita gente votou como um voto de protesto, pessoas que talvez não necessariamente fossem muito simpatizantes da agenda do Hamas, não em relação à resistência, mas em relação à questão do tecido social", analisa Hartmann. "Foi um voto no Hamas para algumas pessoas, mas para outras foi um plebiscito contra o processo de paz e contra a solução que não só as lideranças israelenses e palestinas, mas que a comunidade internacional tinha endossado", conclui o pesquisador.

Quando venceu as eleições, Khaled Meshaal era o líder político do Hamas. Considerado um dos fundadores do Hamas e integrante do gabinete político desde a criação, Meshaal foi escolhido como líder após a morte do xeque Ahmed Yassin, em 2004. Em 1997, o Mossad, serviço secreto de Israel, tentou assassinar Meshaal por envenenamento na Jordânia. Na ocasião, o rei jordaniano, Hussein bin Tal, e o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, tiveram que convencer Benjamin Netanyahu, premiê israelense, a enviar o antídoto.

Khaled Meshaal, também conhecido como Abu Al-Walid, permaneceu como líder do gabinete político até 2017, quando foi substituído por Ismail Haniyeh. O escritório político do Hamas também conta com outras lideranças como Yahya Sinwar, criador do “Majd”, uma espécie de serviço de segurança interna do Hamas. O Majd evoluiu com o tempo e, de forma limitada, trabalha com rastreio dos serviços de inteligência israelense.

Sinwar foi preso três vezes e só foi libertado em 2011, após um acordo entre o governo de Israel e Hamas e Fatah, em uma troca pelo soldado Gilad Shalit. Na troca, mil prisioneiros foram soltos, dentre eles Sinwar. Em setembro de 2015, os Estados Unidos incluiu o político na lista “terroristas internacionais”.

Outra liderança do Hamas é Mahmoud Al-Zahar, formado em medicina geral pela Universidade Ain Shams, no Cairo, Egito. Al-Zahar exerceu suas funções em Gaza e na cidade de Khan Younis, mas foi demitido pelo governo israelense devido a suas posições políticas. Em 2003, as forças israelenses tentaram o assassinar com uma bomba de meia tonelada lançada de um avião F-16 sobre a sua casa, em Gaza. Al-Zahar teve ferimentos leves, mas seu filho mais velho morreu.

Com a vitória nas eleições de 2005, Zahar serviu como ministro das Relações Exteriores. Forte liderança intelectual, é autor do livro “O Problema da Nossa Sociedade Contemporânea… Um Estudo do Alcorão e Sem lugar sob o sol”. A publicação é tida como uma resposta ao livro “O Discurso político islâmico”, escrito por Benjamin Netanyahu.


Operação Al-Aqsa Flood

Em 06 de outubro de 1973, Egito e Síria conduziram uma ofensiva contra o Estado de Israel. O conflito ficou conhecido como a Guerra do Yom Kippur, em referência às comemorações do feriado judaico do dia do perdão - Yom Kippur, em hebraico. O feriado é o mais importante do calendário hebraico e o país estava paralisado para as celebrações.

O principal motivo da guerra foi a anexação de territórios sírios e egípcios por Israel durante a Guerra dos Seis Dias, em julho de 1967. A Guerra do Yom Kippur foi considerada o último grande conflito árabe-israelense. A ofensiva foi elaborada pelo presidente do Egito, Anwar Sadat, e Hafez Al-Assad, presidente da Síria. Ao todo, o conflito durou 18 dias e terminou na morte de 15 mil egípcios, 3.500 sírios e 2.600 israelenses.

No dia 07 de outubro de 2023,  exatos 50 anos e um dia depois do início da guerra do Yom Kippur, o Hamas fez uma ofensiva contra militares e civis no sul de Israel, eclodindo no conflito com mais mortes da história entre Palestina e Israel. A Operação Al-Aqsa Flood, ou dilúvio, se tornou o primeiro embate direto no território de Israel desde a primeira guerra árabe-israelense, em 1948. A ação coordenada pelo grupo islâmico entrou no território de Israel por mar, terra e ar, e foi considerada uma falha do sistema de defesa israelenses. “Este é o dia da maior batalha para acabar com a última ocupação da Terra”, afirmou Deif,  comandante das Brigadas Qassam. O grupo queria encorajar outras nações muçulmanas a se unir no ataque.

Horas após o ataque, o Primeiro-Ministro israelense, Benjamin Netanyahu, declarou guerra contra o Hamas. Essa foi a primeira vez que o Estado de Israel se colocou abertamente em guerra desde o conflito do Yom Kippur. Em resposta, os israelenses lançaram a Operação Espadas de Ferro.

O conflito atual já deixou 15.523 mortes do lado palestino, em Gaza, e 1.402 mortes do lado israelenses, além de cerca de 200 reféns que foram levados para o território da Faixa de Gaza. Apesar da surpresa pelo ataque, o decorrer do conflito mostrou o baixo potencial ofensivo do Hamas contra o Estado de Israel, que segue com os ataques e também com incursões por terra.


Ao norte volver

Na fronteira norte de Israel, região do sul do Líbano, outro grupo também desperta a atenção: o Hezbollah. Apesar de uma corrente religiosa diferente do Hamas - que é sunita - os grupos têm em comum o objetivo de combater o estado de Israel.

Com origem muçulmana xiita, o grupo teve sua primeira formação em 1982, sob o nome de Resistência Islâmica Libanesa. O surgimento do Hezbollah - que em árabe significa “Partido de Deus” - está associado à invasão israelense ao território libanês que aconteceu em dois momentos. O início em 1978 e, depois, com a incursão por terra, água e mar em 1982.


 

Hezbollah é parte do xadrez de tensões no Oriente Médio
Hezbollah conta com apoio de considerável parte da população libanesa.
Foto: Francisco Volpi/Getty Images

O grupo ganha o nome de Hezbollah em 1984, e se oficializa em 1985, com a divulgação de uma carta aberta com suas três ideias principais: combater tendências colonialistas, julgar membros da Falange - partido Libanês criado em 1936 - pelos crimes cometidos e estabelecer um estado muçulmano no Líbano.

A ligação entre o grupo e a causa Palestina data das origens do Hezbollah, como contextualiza Karime Cheaito, mestre em Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança pela Universidade Federal Fluminense (UFF), membro do Grupo de Estudos sobre Conflitos Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (GECI/PUC-SP) e pesquisadora de assuntos voltados ao Hezbollah e organizações armadas não-estatais.

“O principal objetivo do Hezbollah era a libertação das terras libanesas ocupadas, a retomada da soberania do Líbano e, neste documento (o manifesto de 1985), também ganha destaque a libertação de Jerusalém, sendo a causa Palestina central, então, desde a fundação da organização”, explica.

Em 1989, com o fim da guerra civil que havia começado em 1975, o Hezbollah passou a se organizar como um partido político, com o intuito de representar politicamente os xiitas, classe que, até então, era subrepresentada politicamente.

Os líderes do grupo foram, em grande parte, influenciados pelos ideais do aiatolá Khomeini - antigo líder supremo do Irã e idealizador da Revolução Iraniana em 1979. Os membros tiveram uma espécie de “formação” pela Guarda Revolucionária Iraniana. Assim como o Hamas, o Hezbollah é dividido entre atuação política, social e armada. O braço armado do grupo, por exemplo, é maior do que as Forças Armadas libanesas.

De acordo com o Departamento de Estado dos Estados Unidos, o Irã é responsável por financiar o Hezbollah com treinamentos, armamentos e explosivos. Em 2021, o líder do grupo, Sayyed Hassan Nasrallah, disse em uma entrevista que o braço militar do Hezbollah contava com cerca de 100 mil combatentes.

Apesar de alguns bombardeios na fronteira norte de Israel, não é possível afirmar que o Hezbollah entrou de fato no conflito. “Ainda não temos uma resposta oficial, nem uma indicação precisa. Tudo depende de como as negociações e decisões políticas vão se desdobrar. Até o momento, os atritos que tem se desenvolvido na região da fronteira entre Líbano-Israel são pontuais, geograficamente localizados e não tem caminhado para uma escalada”, analisa Cheaito.