Em 2023, nenhuma outra violência contra a mulher cresceu como a psicológica. Entre as atitudes que enfraquecem a saúde mental feminina está o stalking, comportamento abusivo 34,5% mais incidente no último ano
por
Bianca Abreu
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12/11/2024 - 12h

Por Bianca Abreu

 

Reta final do segundo semestre de 2024, sexta-feira, nove e meia da noite. Data e horário propícios para os estudantes de Jornalismo se encontrarem para curtir o final de mais uma semana rumo às férias. Após sair da aula na unidade Monte Alegre da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, um grupo desce as escadas da saída da universidade que desemboca na rua Ministro Godói. Ali se concentram os bares onde os Puquianos costumam confraternizar - e foi na frente de um deles em que esses universitários pararam e se reuniram.

Alguns bebem, outros comem e todos conversam. Trabalhos finais, estágio (a rotina ou a falta dele), futebol e família são alguns dos assuntos. Conversa vai, conversa vem, em dado momento, entre esse grupo majoritariamente feminino, o papo afunilou em torno da perseguição masculina. Em todas as histórias naquela noite, os algozes eram estudantes do sexo masculino - em alguns momentos, reincidentes, com mais de um relato que os envolvia. O assunto surgiu porque um deles passou próximo delas fazendo menção de se aproximar, fato que as deixaram apreensivas. Elas desviaram seus olhares e viraram o corpo, como que criando um escudo contra a aproximação que foi parcialmente repelida, visto que se aproximaram por instantes mas acabaram se afastando em seguida, indo ao encontro de outras colegas que estavam por ali.

Quando um dos algozes se afastou, Marcela, a primeira estudante a compartilhar a situação que ocorreu consigo, contou que chegou a receber chamadas de vídeo durante a madrugada, via WhatsApp, em que dois estudantes insistiam em falar com ela. Foram recusados e, em dado momento, cessaram as tentativas. Na relação entre ela e a dupla que estava do outro lado da linha nunca houve afinidade, sua intenção era apenas nutrir uma boa convivência. O que, para a estudante, não justificava receber uma ligação deles altas horas da madrugada. Ainda mais por considerar que, provavelmente, eles estariam alcoolizados naquele momento, já que se tratava de um final de semana. Outro fator que a fez, de primeira, desconsiderar atender a ligação foi o fato de que o comportamento de ambos, nos momentos de interação ainda no ambiente acadêmico, a deixava desconfortável - são intrusivos e se aproximam corporalmente de maneira exagerada, sem respeitar seu espaço pessoal e tampouco o afastamento que ela própria provoca em resposta a essas atitudes.

Mas as investidas não pararam nas ligações. Marcela evita ocupar o mesmo espaço que qualquer um dos dois estudantes e, por isso, quando coincide de sair da universidade no mesmo horário que eles, ela retarda sua chegada ao ponto de ônibus para que haja tempo hábil deles terem ido embora. Assim não precisa se preocupar em passar por situações desconfortáveis mais uma vez, principalmente se estiver sozinha. Só que agora, em vez do celular, o caminho para casa se tornou o ambiente em que ela seria novamente abordada. Um dos indivíduos da dupla passou a esperar por ela no ponto de ônibus à noite. Esse comportamento foi percebido pelo fato de que ele a viu saindo ao mesmo tempo que ele, vários coletivos subiram a Rua Cardoso de Almeida e, quando ela chegou para aguardar o transporte, ele ainda estava lá, e fez questão de se juntar a ela durante o caminho, mesmo que Marcela tenha demonstrado desinteresse pela sua companhia. Na estação de Metrô, parada em comum, ela se despediu e desviou seu caminho, a fim de aguardar que ele entrasse na próxima locomotiva para, em seguida, ir sozinha na seguinte, evitando a situação indesejada. Para sua surpresa, quando olhou para a plataforma antes de descer as escadas, ele continuava lá. Outros vagões passaram por aqueles trilhos e ele lá permanecia - aliás, permaneciam, pois Marcela também não se moveu. Após longos minutos naquela situação, ele finalmente embarcou e ela pôde, já tarde da noite, enfim seguir o caminho para casa. Enquanto ela contava o que aconteceu, sua amiga Fernanda confirmava tudo, acenando com a cabeça. Elas estavam juntas quando, uma vez mais, isso aconteceu. Exatamente nos mesmos moldes, com a única diferença de que, desta vez, elas estavam juntas. Fernanda também foi contatada pela amiga quando as ligações na madrugada aconteceram. Com os acontecimentos, a presença de qualquer um dos dois indivíduos causa mal-estar emocional a Marcela.

A perseguição pessoal e virtualmente vivida pela estudante é tipificada pelo Código Penal (CP) brasileiro como stalking. O artigo 147-A explica que essa é a atitude de “Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade” - foram 77.083 casos apontados em 2023, representando um crescimento de 34,5% em relação ao ano anterior, de acordo com dados do 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. O documento também expôs que o Brasil registrou aumento de todas as modalidades de violência contra mulheres no ano passado. Mas a que mais cresceu foi a psicológica - onde enquadra-se o stalking. Foram 38.507 registros, 33,8% a mais que em 2022. Por meio do artigo 147-B, o CP define a violência psicológica contra a mulher a atitude de “Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação”. E não é só Marcela, entre o grupo ali reunido, quem está passando pelo desconforto de ser pressionada a tolerar uma presença masculina indesejada. Assim que ela terminou de contar sua história, outra de suas colegas compartilhou que também não vinha se agradando da insistência por atenção que um desses mesmos estudantes cobrava por parte dela.

Com frequência, os mesmos grupos de universitários se reúnem em frente à PUC-SP e curtem a sexta-feira à noite. Todas as vezes que Joana está lá com seus amigos, com quem tem real afinidade, um dos estudantes presente no relato de Marcela se achega junto ao grupo e busca forçar sua inclusão - principalmente, junto à Joana. Ela, assim como a colega, convive com o outro estudante, mas não alimenta nenhuma relação afetuosa que justifique a busca pela proximidade em momentos de descontração fora do ambiente acadêmico. Quando eles se movem e trocam de lugar, ele os segue. Mesmo quando se despedem, ele novamente se aproxima. Certa vez, quando ela estava entrando em um carro por aplicativo para ir para outro lugar com outro grupo de amigos, ele insistiu por longos minutos para ir junto, mesmo não tendo sido convidado - pelo contrário, Joana falou para ele, com todas as letras, que nem ela, nem o restante do grupo, levariam ele junto pois sua presença, por unanimidade, não era desejada junto aquelas pessoas. Ela entrou no carro, fechou a porta e foi embora, deixando-o falando sozinho, pois ele ainda insistia. Quando é confrontado por seu comportamento, ele coloca no álcool a culpa por suas atitudes, mas seu comportamento intrusivo também se manifesta em dias e ambientes onde ninguém está bebendo - como foi com Marcela. E assim como ela, a preocupação e o desconforto se tornaram sentimentos constantes, mesmo em momentos em que o relaxamento deveria ser a lei.

Colocar a culpa de comportamentos abusivos em fatores externos, como a ingestão do álcool, em algum acontecimento pontual ou questionar a reação da vítima ao ser importunada são atitudes comuns entre os homens que praticam essas ações. Sem autocrítica, eles perpetuam a reprodução de comportamentos nocivos que respingam em todo o cotidiano da mulher afetada, pois introduz a aflição, a ansiedade, a angústia, a insegurança e os demais sentimentos de preocupação que possam vir nesse combo. Não sendo respeitada, a mulher se vê na posição de tentar evitar, a todo custo, passar por situações onde seu espaço pessoal seja invadido, seu corpo seja tocado ou sua mente, perturbada. E isso acarreta mudanças no trajeto, no comportamento, nas companhias e em todos os demais detalhes que dizem respeito às suas escolhas individuais - ou seja, opta por tolher sua própria liberdade em nome de resguardar sua integridade física e mental. 

A inquietação diante do desrespeito é um sentimento coletivo entre as mulheres no Brasil. Uma pesquisa nacional realizada em 2023 pelo instituto DataSenado, em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência (OMV), mostra que 46% das brasileiras acreditam que as mulheres não são respeitadas no Brasil. Em São Paulo, 48% das cidadãs paulistas consideram que as mulheres não são tratadas com respeito no país e 59% delas reforçam que a formação social brasileira é muito machista.

Em uma de suas aulas na universidade, Fabio Fernandes destacou a seus alunos do sexo masculino a importância de que eles, enquanto homens, façam uma leitura séria e comprometida de suas atitudes. Pois a masculinidade é formada a partir de elementos que estão intrínseco ao cotidiano masculino, o que lapida e direciona muitas de suas ações, pensamentos e atitudes. Sem isso, eles estão fadados a reproduzir comportamentos abusivos e nocivos contra as mulheres que encontram no caminho. As histórias contadas por Marcela, Joana e Fernanda reforçam que, enquanto as bases do patriarcado não são atacadas, o gênero masculino encontra caminhos abertos para, despretensiosamente, importunar, assediar, incomodar e atrapalhar o cotidiano das pessoas do sexo feminino em nome das suas vontades - como historicamente sempre fizeram.
 

Secretário de Estado americano, Antony Blinken, está em Tel Aviv para pressionar andamento de negociações de trégua
por
Pietra Nelli Nóbrega Monteagudo Laravia
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20/08/2024 - 12h

Desde o início do conflito na Faixa de Gaza, diversas tentativas de cessar-fogo foram realizadas, refletindo a complexidade das negociações e a persistência das partes envolvidas. Anteriormente, os esforços para interromper as hostilidades foram marcados por intensos diálogos entre os mediadores e um contínuo desgaste das condições em campo. No entanto, essas tentativas ainda não conseguiram estabelecer uma trégua duradoura.

Na última segunda-feira (19), o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, anunciou um novo desenvolvimento significativo: o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, aceitou uma proposta de cessar-fogo formulada pelos mediadores dos EUA, Catar e Egito. Esta proposta foi apresentada durante a rodada mais recente de negociações realizada em Doha, no Catar.

Blinken, que está em Tel Aviv desde domingo (18), informou que se reuniu com Netanyahu para discutir o novo plano. De acordo com a declaração de Blinken, a proposta dos EUA visa "resolver as lacunas restantes" nas negociações e permitir uma "rápida implementação" se for aceita por todas as partes envolvidas. Embora os detalhes da proposta ainda não tenham sido divulgados, o clima entre os negociadores é de otimismo após as conversas da semana passada.

Até o momento, o Hamas ainda não se pronunciou oficialmente sobre a nova proposta. As negociações deverão continuar ao longo desta semana, e Blinken expressou a expectativa de que o Hamas se comprometa com a proposta para avançar nas discussões. O secretário de estado dos EUA também alertou que esta pode ser uma oportunidade crucial para a devolução dos reféns mantidos pelo Hamas e para alcançar um desfecho mais amplo do conflito.

 O governo israelense informou que o Hamas ainda detém 111 pessoas sequestradas desde o ataque de 7 de outubro de 2023, que iniciou a guerra na Faixa de Gaza. A proposta de cessar-fogo enfrenta desafios significativos, incluindo a exigência de Israel pela destruição total do Hamas e a demanda do grupo terrorista por um cessar-fogo permanente, em vez de uma trégua temporária. Divergências também permanecem em relação à presença militar de Israel em Gaza, à movimentação dos palestinos e à identidade e quantidade de prisioneiros a serem libertados em uma possível troca.

 Em resposta a essas complexas questões, Netanyahu afirmou que busca a libertação do "máximo de reféns vivos" durante a primeira fase do novo plano de três etapas proposto pelos EUA. Após sua reunião com Netanyahu, Blinken confirmou que o primeiro-ministro se comprometeu a enviar uma delegação para as novas negociações, previstas para esta semana em Doha ou no Egito. Blinken também estará presente nas discussões. Paralelamente, os confrontos continuam em Gaza, com uma nova operação israelense em Khan Yunes e um atentado reivindicado pelo Hamas em Tel Aviv no domingo, evidenciando a fragilidade e a intensidade do conflito em curso.

 

Manifestantes e familiares de mortos por violência de Estado fizeram atos simbólicos em São Paulo no aniversário de 60 anos do golpe militar no Brasil
por
Sophia Linares
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28/05/2024 - 12h

A força de segurança brasileira passa ser formada em 1827 com a chegada de Dom João VI, para equivaler a Guarda Real de Polícia de Lisboa no Rio de Janeiro. Ao longo do tempo se estabeleceram no resto do país. Nos seus mais de 190 anos, foi “organizada e reinventada diversas vezes” como diz a linha do tempo disponibilizada no site da Polícia Militar, com a criação de ramificações que compuseram e compõe a estrutura da instituição como o Corpo Policial Permanente, o Corpo de Bombeiros, a Radiopatrulha Aérea, Guarda Civil, Força Expedicionária Brasileira, entre outros.

Quando houve a queda do sistema escravista em 1888, no mesmo ano, é criado o 1º Batalhão de Polícia de Choque. “Abolição da escravidão. A partir de agora o Brasil tem um só povo em plena igualdade de direitos. O efetivo da Polícia Militar é triplicado nesse ano, chegando a 1480 homens.” 

Em 1906, o governo do Estado de São Paulo convida militares franceses para modernizar as práticas “aliando a estética militar ao serviço de policiamento ostensivo voltado para as necessidades comunitárias” e diz que o conjunto de ideais estabelecidos “liberdade, igualdade e fraternidade que se traduzem no respeito à dignidade da pessoa humana e na defesa intransigente dos direitos humanos, persiste nos dias atuais, mantendo na Polícia Militar uma visão humanista, voltada para a formação moral e patriótica do policial militar, com dedicação incansável à instrução, para bem servir à comunidade paulista e brasileira.” 

No ano de 1932 civis armados lutaram "ao lado das tropas regulares do Exército e da milícia paulista” contra o governo de Getúlio Vargas. 

A polícia ainda nomeada Força Pública em 1964, há 60 anos tinha o dever “garantir a ordem pública e a estabilidade da nação” sob o comando do eleito governador de São Paulo Adhemar de Barros, deposto dois anos depois pelo governo militar por desejar o fim do período de ausência democrática. A partir do AI-5 em 1968 “coube à Força Pública garantir a paz social e proteger a sociedade paulista”. 1969: é construído o edifício que sediou o departamento de repressão vinculado ao governo militar, DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna), para perseguir integrantes de guerrilhas armadas, pessoas que poderiam ter pouca ou muita vinculação a movimentos comunistas e aqueles que se opunham ao regime.

Em 1970, a Polícia Militar é formalizada a partir da união da Guarda Civil e Força Pública. 

Instaurada em 2012, a Comissão da Verdade instituída em países que passaram por supressão de direitos individuais democráticos, investigou crimes cometidos pelo Estado brasileiro durante o período militar e identificou mais de 8 mil indígenas mortos e pelo menos 434 mortos e desaparecidos políticos. Um estudo de 2019 da Human Rights Watch calculou 20.000 pessoas torturadas. E a pesquisa publicada neste ano de Gilney Viana, pesquisador colaborador da UnB desvelou mais de 1.600 camponeses mortos e desaparecidos nos 21 anos que perdurou a ditadura civil-militar.

O tempo que militares estavam no poder, acabou em 1985. A instituição permanece realizando a fiscalização de uma ordem na sociedade, e de lá acumulou histórico de ocasiões que marcaram o país, relembre algumas delas: 

SP 1992, Massacre do Carandirú

111 detentos mortos

RJ 1993, Chacina da Candelária

8 crianças e adolescentes mortos

Um mês depois, o caso de assassinato de 4 policiais na Praça Catolé do Rocha, resultou na morte de 21 civis inocentes.

RJ 1998, Duque de Caxias

24 mortos

RJ 2005, Chacina da Baixada

Depois depois da troca de comandante do batalhão, policiais saíram em direção ao município de Queimados, atiraram indiscriminadamente o que resultou na morte de 29 civis. 11 policiais foram denunciados, 5 deles liberados.

SP 2006, Crimes de Maio

505 pessoas mortas pela polícia depois que o Primeiro Comando da Capital (PCC) chacinou 59 pessoas.

RJ 2007, Complexo do Alemão

24 civis mortos

RJ 2021, Chacina do Jacarezinho

Após 1 policial ser morto,

28 civis foram mortos.

SP 2023-2024, Operação Verão

56 civis mortos. Entre pessoas do crime organizado e aquelas que segundo relatórios da PM teriam entrado em confronto com os agentes, estão: uma cabeleireira, mãe de seis crianças; dois vizinhos que conversavam na rua, um deles de muleta; dois jovens no interior de uma casa onde familiares tomavam café na sala, um deles era deficiente visual e possuía um dos olhos com 20% da visão e o outro cego.

Outros eventos ocasionaram mortes decorrentes de confrontos com a força pública de segurança, que resultaram cicatrizes em muitas famílias. Em comparação com 2022, os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostraram que em 2023 a letalidade policial cresceu 18% no estado de São Paulo e chegou a 313 civis mortos, também cresceu em 63% a taxa de policiais militares que tiraram a própria vida, foram 31 suicídios de agentes enquanto 16 morreram em confronto, segundo dados obtidos através da LAI (Lei de Acesso à Informação) pela Ponte.

A virada de março para abril deste ano, marcou 60 anos do dia que os cidadãos brasileiros perderam durante 21 anos seus direitos democráticos. Grupos da sociedade fizeram atos em São Paulo, pela memória das pessoas mortas e desaparecidas por ação de forças do Estado brasileiro durante a ditadura até os dias atuais. Familiares e amigos seguraram os corpos em forma de cartazes e caminharam pelas ruas da cidade. 

 

Escada interna de onde funcionou o aparelho de repressão militar DOI-Codi (1970-1976) em São Paulo.
Escada interna da construção onde funcionou o aparelho de repressão militar DOI-Codi (1970-1976) em São Paulo, aos fundos do 36° Distrito Policial na Vila Mariana que na porta, manifestantes da 4ª Caminhada do Silêncio se concentraram para ir em direção ao Monumento aos Mortos e Desaparecidos Políticos - Foto: Sophia Linares

 

Portas: à esquerda entrada para uma das salas de tortura e à direita uma das celas.
DOI-Codi: à esquerda entrada para uma das salas de tortura e à direita uma das celas - Foto: Sophia Linares

 

DOI-Codi: sala de tortura localizada no segundo andar
DOI-Codi: sala de tortura localizada no segundo andar, a menor onde não há porta, é o local que o hoje jornalista e escritor Ivan Seixas, preso quando tinha 16 anos, após ter sido tirado do pau-de-arara pode ter visto seu pai na cadeira do dragão — poltrona com condução elétrica para choque em todo o corpo — e que foi morto durante uma das sessões de tortura. Os gritos podiam ser ouvidos dia e noite em todas as celas, assim como na vizinhança - Foto: Sophia Linares

 

Emilio Ivo Ulrich, ex-preso político no DOI-Codi e autor do livro “Tortura não tem fim”
Emilio Ivo Ulrich, ex-preso político no DOI-Codi e autor do livro “Tortura não tem fim” - Foto: Sophia Linares

 

Familiares seguram cartazes de parentes na 4a Caminhada do Silêncio
Familiares seguram cartazes de parentes na 4ª Caminhada do Silêncio - Foto: Sophia Linares

 

Mulher caminha em direção ao Monumento aos Mortos e Desaparecidos Políticos
Foto: Sophia Linares

 

Na Avenida Brasil, manifestante mostra cartazes para carros parados no semáforo próximo ao Monumento aos Mortos e Desaparecidos
Na Avenida Brasil, manifestante mostra cartazes para carros parados em semáforo próximo ao Monumento aos Mortos e Desaparecidos - Foto: Sophia Linares

 

Mães e familiares de pessoas mortas durante os Crimes de Maio em caminhada do Cordão da Mentira
Mães e familiares de pessoas mortas durante os Crimes de Maio no Cordão da Mentira, passeata que saiu do Centro Maria Antonia, na Consolação, e seguiu para o antigo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) que hoje abriga o Memorial da Resistência - Foto: Sophia Linares

 

Participante vestida de morte salta caçambas com entulho em ato Cordão da Mentira.
Pessoa vestida de morte acompanhou policiais que realizaram a fiscalização da passeata Cordão da Mentira - Fotos: Sophia Linares

 

Performance artística no Cordão da Mentira
Performance artística no Cordão da Mentira - Foto: Sophia Linares

 

Participantes de ato pela memória dos mortos e desparecidos da ditadura civil-militar que ocorria à frente, na entrada da Universidade de Direito da USP no Largo São Francisco
Participantes de ato pela "defesa da democracia e por aqueles que lutaram contra a ditadura militar no Brasil" que ocorria em frente, na entrada da Faculdade de Direito da USP no Largo São Francisco - Foto: Sophia Linares

 

Sancionada em 2006, o dispositivo é responsável por proteger vítimas da violência doméstica e acrescentou medidas nos últimos anos
por
Amanda Furniel
Giuliana Zanin
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20/03/2024 - 12h

A Lei Maria da Penha, uma medida de prevenção e punição em caso de violência doméstica, foi sancionada em 7 de agosto de 2006. Dezessete anos depois, em 2023, o Brasil ainda é o quinto país com mais casos de violência contra mulher, com 3.181 denúncias contra parceiros e parentes. 

A Lei determina que todo caso de violência dentro de casa e por familiares é crime, sendo julgados nos Juizados Especializados de Violência Doméstica Contra a Mulher. Nos últimos cinco anos, houve pelo menos oito coberturas incluídas no projeto, dentre elas, o afastamento imediato da vítima do ambiente de violência sem a prescrição doboletim de ocorrência (B.O.) e a proteção de mulheres transgêneras.

 

Mas, afinal, quem é Maria da Penha?

Maria da Penha Maia Fernandes foi vítima de duas tentativas de feminicídio em 1983. Na primeira, enquanto dormia, seu então marido atirou contra a suas costas, o que a deixou paraplégica. Quatro meses após uma recuperação intensiva da tragédia intencionada que quase tirou a sua vida, o ex-parceiro tentou eletrocutá-la durante o banho, enquanto a mantinha em cárcere privado. Depois de muita luta, a família e os amigos de Maria conseguiram tirá-la de casa e das mãos do agressor.  

 

O caso de Maria da Penha levou ao todo 19 anos e seis meses de disputas judiciais. O agressor chegou a ser sentenciado à prisão duas vezes, com penas de 10 e 15 anos, mas nenhuma das sentenças foi cumprida por falhas na justiça. Na primeira, em 1991, os advogados do réu anularam o julgamento e, na segunda, em 1996, o réu foi condenado a dez anos e seis meses, mas recorreu e acabou passando apenas cerca de dois anos preso. 

 

Origem da Lei 

Após um ultimato da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), em 1998, o Estado Brasileiro foi denunciado e responsabilizado por “negligência, omissão e tolerância” em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. 

O caso de Maria de Penha passou a ser tratado como uma violência contra a mulher por razão de gênero, mas, em 2002, foi formado um Consórcio de ONGs Feministas para reivindicar a elaboração de uma lei especializada no combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Depois de debates e reivindicações dentro dos tribunais, o Projeto de Lei n. 4.559/2004, da Câmara dos Deputados, chegou ao Senado Federal (Projeto de Lei de Câmara n. 37/2006) e foi aprovado por unanimidade em ambas as Casas. A Lei Maria da Penha (Lei N. 11.340) foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.  

Como uma das recomendações do CIDH foi uma reparação simbólica e material à Maria da Penha, o Estado do Ceará pagou uma indenização a ela e o Governo Federal nomeou a lei em reconhecimento e homenagem à sua luta contra a violação dos direitos humanos das mulheres.  

Em 2015, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que a Lei Maria da Penha diminuiu em 10% a taxa de feminicídio cometidos pelos agressores dentro da residência das vítimas. 

A legislação trouxe avanços e amparos para as mulheres brasileiras. Além de tipificar a violência doméstica, ela oferece medida protetiva com o afastamento do agressor da vítima e seus familiares, proíbe aplicação de penas pecuniárias, (ou seja, não pode ser paga por multas ou doações de cestas básicas), oferece auxílio para a mulher caso ela seja financeiramente dependente do agressor e amplia a pena do agressor de um a três anos de cadeia caso a mulher vítima seja deficiente.  

 

Mudanças e inclusões 

Desde 2019, outras medidas foram acrescentadas à Lei Maria da Penha, entre elas:  

  • Lei nº 13.827/19, que permitiu a adoção de medidas protetivas de urgência e o afastamento do agressor do lar pelo delegado;   

  • Lei nº 13.836/19, tornando obrigatório informar quando a mulher vítima de agressão doméstica ou familiar é pessoa com deficiência;  

  • Lei nº 13.871/19 determina como responsabilidade do agressor o ressarcimento dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados; 

  • Lei nº 13.894/19, que atribuiu ao Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a ação de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável. A norma também estabeleceu a prioridade de tramitação dos procedimentos judiciais em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar;

  • Lei nº 13.984/20, estabelecendo obrigatoriedade referente ao agressor, que deve frequentar centros de educação e reabilitação e fazer acompanhamento psicossocial;

  • Lei nº 14.132/21 inclui um artigo no Código Penal (CP) para tipificar os crimes de perseguição (stalking);

  • Lei n° 14.164/21, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para incluir conteúdo sobre a prevenção à violência contra a mulher nos currículos da educação básica, além de instituir a Semana Escolar de Combate à Violência Contra a Mulher, a ser celebrada todos os anos no mês de março;

  • No primeiro semestre de 2022, a Sexta Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a Lei Maria da Penha seria aplicada também em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgêneras. 

 

Os números não param de crescer

Em 2023, o Brasil registrou 1.463 casos de feminicídio, crime em que o assassinato de uma mulher ocorre pelo simples fato de ser mulher, ou seja, uma mulher a cada seis horas era assassinada. No mesmo ano, a cada 24 horas, oito mulheres foram vítimas de violência doméstica, segundo o boletim "Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver".

​De acordo com a ONU, sete a cada 10 mulheres no mundo já foram ou serão vítimas de violência de gênero em algum momento da vida. No mundo, de acordo com a OMS e a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, a estimativa é de que 35% dos feminicídios são cometidos por seus parceiros, ao passo que 5% dos homicídios de homens são praticados por suas parceiras.

 

Com três mesas de conversa, o veículo independente de jornalismo investigativo debate sobre o papel do setor na democracia
por
Artur Maciel
Carol Rouchou
Geovana Bosak
Leticia Falaschi
Marina Jonas
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19/03/2024 - 12h

Na última quarta-feira, 13, a Agência Pública, em parceria com o curso de Jornalismo e a Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes da PUC-SP (FAFICLA), realizou o evento “Pública 13 anos: O jornalismo na linha de frente da democracia” para celebrar seus 13 anos de jornalismo investigativo. Com três mesas redondas, o evento foi sediado no Tucarena, auditório do Teatro da Universidade Católica de São Paulo (TUCA), e reuniu expoentes do jornalismo, da antropologia e da ciência do clima para discutir temas como desinformação, populismo digital, polarização dentro e fora das redes, inteligência artificial, crise climática e, por fim, a defesa da democracia. 

Fundada em 2011 por repórteres mulheres, a Agência Pública é a primeira agência de notícias sem fins lucrativos do Brasil. Seu compromisso é com o jornalismo independente de qualidade e com a promoção da defesa dos direitos humanos, do discurso democrático e do direito à informação. Em comunhão com os valores da PUC-SP, que foi e ainda é palco de luta e resistência pelo Estado Democrático de Direito, a Pública escolheu o auditório próximo à instituição para celebrar o aniversário de treze anos de trabalho.

 

Mesa 1: “Desinformação e Populismo Digital” 

Em ano de eleições - tanto municipais no Brasil, quanto presidenciais ao redor do mundo - é de extrema importância avaliar os impactos e os riscos do desenvolvimento da tecnologia no processo eleitoral, desde as campanhas políticas até às urnas. Diante disso, a primeira mesa “Desinformação e Populismo Digital" tratou sobre a dimensão da tecnologia no presente cenário político e social. 


Neste primeiro momento do evento, os principais tópicos abordados foram a onda de desinformação online, gerada principalmente por grupos de extrema direita - como é o caso dos grupos de Whatsapp e Telegram do bolsonarismo. Além disso, a mesa abordou a regulamentação do uso da inteligência artificial (IA), e o poder das “big techs” e de sua arquitetura algorítmica dentro do sistema comunicacional.

 

Ecologia de mídia e desinformação

Natalia Viana, co-fundadora e diretora-executiva da Agência Pública, foi a mediadora da mesa “Desinformação e o Populismo Digital” e iniciou o debate relacionando a manifestação convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, no dia 25 de fevereiro deste ano, com a ecologia de mídia, um conceito que descreve como a tecnologia afeta diversos aspectos da sociedade - campos político, social, cultural ou demográfico.


Viana argumenta que o ato bolsonarista, realizado no início do ano, é um exemplo de como a desinformação online migra para a vida offline em velocidades e escalas inimagináveis. Ela explica que tanto conteúdos mais elaborados, como deep fakes, quanto aqueles mais simples, como fake news, complementam-se e participam da ecologia de mídia, que retroalimenta a desinformação. No dia 25 de fevereiro, o protesto, que aconteceu na Avenida Paulista, contou com um público que varia de 185 mil pessoas, segundo divulgado em pesquisa da Universidade de São Paulo (USP), até 600 mil, de acordo com estimativas da Secretaria de Segurança Pública (SSP). Segundo a mediadora da mesa, os participantes tendem a basear suas decisões em fake news recebidas através de canais diretos de mensagem. Viana ainda completa dizendo que, uma vez questionados, os manifestantes pareciam não compreender exatamente o motivo de estarem presentes.

 

IA e as eleições 

Nina Santos, pesquisadora na área de comunicação e informação, explica que o uso da inteligência artificial (IA) em período de eleições ainda é recente, mas representa um aspecto tecnológico promissor. No entanto, a ferramenta também carrega um potencial significativo de danos, a depender da forma como for usada, principalmente para produzir e disseminar fake news

Para Santos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desempenha um papel crucial na mitigação dos riscos que surgem com a utilização da IA em momentos decisivos da esfera política. O órgão é responsável por instituir a regulamentação adequada do recurso tecnológico em questão frente às possíveis influências distorcivas que ele pode trazer, mas isso pode não ser suficiente. Em entrevista à AGEMT, a pesquisadora reforça a necessidade de “um processo legislativo na Câmara, no Senado, em que os deputados e as deputadas mobilizem as suas bases, façam discussões amplas e construam a política para lidar com a inteligência artificial em todos os momentos da nossa vida, e não só das eleições”.

No encerramento da mesa, Natalia Viana levanta uma questão fundamental: “em um ambiente em que todo mundo participa ativamente da construção do debate público, qual é o papel do cidadão?” 

Leticia Cesarino, antropóloga e assessora especial de Educação e Cultura em Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, responde à questão enfatizando que, embora não exista um caminho único de atuar no mundo, o importante é que todos estejam comprometidos com os princípios democráticos.  

“É fundamental pensar em soluções que unam ações individuais e coletivas, construindo fontes de informações confiáveis e acompanhando coletivamente discussões em diversos ambientes sociais, seja no trabalho, na escola ou no seu próprio bairro”, completa a pesquisadora Nina Santos.

 

Mesa 2: “Como cobrir o governo de maneira equilibrada”

A segunda mesa do evento trouxe atenção à cobertura política dos governos e discutiu maneiras de fazê-la de forma equilibrada e justa. As convidadas foram as repórteres Juliana Dal Piva e Fabiana Moraes, que também atua como pesquisadora, enquanto a mediação foi realizada por Rubens Valente, repórter, colunista e também autor da Agência Pública. 

Confira, a seguir, a transmissão na íntegra. 

 

Mesa 3: “Colapso Climático e o Antropoceno”

A terceira e última mesa do evento, apresentada à noite, teve como recorte temático o "Colapso Climático e o Antropoceno", com participações do ambientalista e filósofo Ailton Krenak, do climatologista Carlos Nobre, da jornalista Daniela Chiaretti, e a mediadora Giovana Girardi, chefe da cobertura socioambiental da Agência Pública. Os convidados discutiram as problemáticas e também as soluções que permeiam o novo cenário ambiental. 

 

A Emergência Global 

"As mudanças climáticas não afetam a democracia, a democracia que afeta as mudanças climáticas”. Essa foi a sentença que o climatologista Carlos Nobre usou para introduzir a conversa. A reflexão esbarrou nas questões sistemáticas que levam ao esgotamento do planeta, já que o modo de vida e os sistemas de produção não são os únicos componentes alteráveis na remediação dos efeitos climáticos. As estruturas políticas e sociais são a base desse problema, segundo relembra o escritor, filósofo e futuro imortal da Academia Brasileira de Letras, Ailton Krenak. As democracias populistas foram colocadas como um agravante quando se trata de emissões de GEEs (gases do efeito estufa). A China, atualmente, é a maior emissora, seguida dos Estados Unidos, da Índia e da Rússia. Apesar de tanto barulho, os convidados reiteram que as causas climáticas não são pautas que elegem ou sequer movimentam escolhas políticas, em qualquer esfera, o tanto que deveriam.  

Foi discutido, também, como a onda de ascensão da extrema direita afeta a luta pela causa. É um enorme desafio combater as manobras do extremismo e do negacionismo, ainda mais quando atacam um tópico de vulnerabilidade em questão de apoio efetivo da população.  

Ailton destacou algumas posições contraditórias de órgãos públicos mundiais em relação à proteção do meio-ambiente. “Enquanto selecionam novas reservas de biosfera em uma semana, na outra, a UNESCO patrocinou uma reunião em Paris para discutir formas de mineração em outras reservas”. 

A jornalista Daniela Chiaretti, referência em coberturas e reportagens sobre o tema, aponta que “o capitalismo tenta se colocar como bússola para um problema que ele mesmo causou”.  A jornalista também alertou para o fenômeno que já é uma realidade e aquece discussões entre os profissionais de saúde mental. Segundo ela, as consequências dessa “falsa busca” têm causado à população, principalmente aos jovens, uma angústia diferente das outras, e em massa: a “ansiedade climática”.  

Os convidados enfatizaram, constantemente, que as consequências da intensificação do aquecimento global não impactam igualmente a população. O racismo ambiental foi um fator importante da mesa. Pessoas em situações de marginalização social e econômica são afetadas de um modo muito pior, estando submetidas à falta de recursos para lidar com eventos que podem chegar aos casos extremos. Os refugiados climáticos também foram um ponto importante. O termo é designado para um grupo de indivíduos que é obrigado a abandonar seu local de habitação devido a irregularidades radicais que impedem sua permanência - irregularidades essas causadas pelos efeitos do aquecimento global. 

Durante o pouco tempo de abertura para perguntas, a AGEMT perguntou à mesa, dado a celebração dos 13 anos do órgão comunicativo, como o jornalismo poderia ser um meio efetivo na luta. Os convidados responderam que a insistência em inserir os temas em tudo, e saber infiltrar a informação nos núcleos conservadores, que insistem na manipulação e no negacionismo, é uma das formas. 

 

O Antropoceno 

Não se pode separar este componente do anterior. O Antropoceno é uma proposta de marcação de uma nova era geológica (delimitação de tempo que se divide com base em como o planeta e os seres vivos reagem a determinada configuração geofísica e ambiental). Essa proposta foi feita por um grupo amplo de cientistas, geólogos e especialistas em mudanças climáticas, que defendem que a presença do ser humano e seu modo de produção já alteraram as estruturas do planeta em um período curto (comparando-se a outras eras geológicas). O embate na comunidade científica se encontra na dificuldade de enquadrar a ação humana como potencializadora das mudanças, ou como causa. “Não é a geologia que provoca o antropoceno, é o sapiens”, demarca Ailton Krenak. 

A terceira mesa encerrou o evento com o lembrete de que as mudanças climáticas são uma realidade irreversível. Cabe à humanidade liderar as mudanças nos sistemas, estruturas e no modo de sobrevivência da população. 

Livro Encarceramento em massa inspira produção sonora
por
Gabriel Aragão, Hiero de Lima e Rodrigo Mendonça
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23/11/2021 - 12h

Por meio de um podcast, Gabriel Aragão, Hiero de Lima e Rodrigo Mendonça, apresentam parte do livro “Encarceramento em Massa”, de Juliana Borges, tratando da origem deste problema tão atual, além de dados, impactos e exemplos de casos dentro do tema. Para ouvir o conteúdo, clique aqui. 

Obra da escritora e antropóloga Juliana Borges ajuda a entender a situação do Sistema Prisional Brasileiro
por
Danilo Zelic
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22/11/2021 - 12h

A obra “Encarceramento em Massa” da escritora e antropóloga Juliana Borges, lançado no ano de 2019, trás para o público pouco familiarizado com o debate sobre o sistema prisional brasileiro um olhar atento e assertivo: não podemos deixar de analisar o cenário das prisões brasileiros, antes de tudo, sem passar pelo crivo do debate racial.

Encarceramento em Massa - Juliana BorgesDividido em três partes, a autora faz um recorte sucinto, porém elaborado com muitos detalhes, sobre o passado, presente e futuro daqueles que se encontram sob privação de liberdade, pensando também como a engrenagem que corrobora para o funcionamento do sistema prisional é baseada, principalmente, na raça e no gênero daqueles que integram o sistema prisional. Como também, segundo a perspectiva da autora, os mesmos visados e colocados em um lugar de suspeitos para adentrar as prisões brasileiros, de acordo com as leis e ideologias culturais do Estado brasileiro.

 Na primeira parte, “Breve história – Punição e aprisionamento. Qual a ideologia?”, a autora elabora um relato sobre o surgimento do sistema de justiça criminal, observando suas mudanças até o presente recente. Detalhando como o Estado cuida de situações que envolvem pessoas que ultrapassam as regras e pactos sociais propostos e impostos para uma sociedade, portanto, são apontados como transgressores e culpados diante dos delitos que cometem, isso tudo na perspectiva do Estado, a autora transcorre seus argumentos diante de questionamentos dos quais são essenciais para pensar o sistema prisional brasileiro, apontados no prefácio e no capítulo em questão. São eles:

  • De onde e com quais motivações se estrutura esse sistema de justiça criminal como conhecemos hoje?
  • Como se estabelece crime e criminoso?
  • Como e sob quais interesses se define o que deve ser tornado ilegal e criminalizado?
  • Como se estabelece e se constitui esse sistema que, ao surgir com a proposta de controle e de sanções, se articula no emaranhado sistema vigente de reprodução de desigualdades?
  • Que ideologia se esconde nas propostas e nas modificações pelas quais o sistema penal passou ao longo dos anos?
  • Direitos e avanços ou simples reorganização e reestruturação de punição?
  • As prisões estão sendo espaços de real ressocialização como se propõe?
  • Como surge essa ideia da privação de liberdade como uma pena para quebra de convenções e contratos sociais?
  • São as prisões as únicas formas de tratar certas quebras de acordos sociais?
  • Quem define o que é crime e quem é criminoso?
  • Por que o fato de considerar que um indivíduo não está, supostamente, sendo útil à sociedade garante o argumento para intervenções e criminalização desse cidadão?
  • Quem e onde é definido o parâmetro de utilidade social? E com quais propósitos?
  • E no Brasil? Como esse processo foi inserido em um contexto totalmente diferente do europeu, operado pela lógica colonialista e tendo na escravidão, baseada na hierarquização racial, um eixo fundamental de exploração?

Em “Brasil: ideologia racista e sistema de justiça criminal”, Borges defende o que toda e qualquer pessoa que se interessa pela temática precisa ter em mente: abordar o sistema de justiça criminal brasileiro é, sobretudo, tratar da cultura racial e, segundo ela, da “ideologia racista” do país. Perguntas formuladas pela autora, como “Porque falamos no racismo como ideologia fundante da sociedade brasileira?”, “Qual a ideologia por trás desse gigantesco complexo que se expande e se aprofunda no mundo todo?” e “Por que são as populações negras e indígenas – esses últimos com pouquíssimos dados sobre sua situação carcerária – as mais afetadas por esse complexo prisional?”, ajudam a compreender melhor quais são as intenções do sistema prisional e os motivos por trás do aprisionamento da população mais afetada por esse regime, as populações negras e indígenas.

Além da questão racial, o debate sobre o sistema prisional deve ser pautado também sobre a política de drogas que o país passou adotar ao longo dos anos como uma instituição democrática. Interrogações apresentadas por Borges como “Quem define se uma pessoa é usuária ou traficante?”, “Quais são as chances de uma mulher negra, com uma pequena quantidade de substância ilícita, ser considerada traficante ou usuária?”, “Quais as influências sociais, políticas territoriais, raciais e de gênero para a definição dessa diferenciação?”, “Qual a periculosidade real dessas pessoas à sociedade, se a maioria dos seus delitos é de microtráfico e considerados não violentos?”, são necessárias para assimilar o debate sobre a “guerra às drogas” com o encarceramento em massa que segue constante no país. “Gênero, raça e classe e guerra às drogas: estruturas de manutenção das desigualdades” é a parte da obra que fundamenta o que Borges pensa sobre o sistema prisional, apontando os tópicos que deveriam ser reformulados ou, até mesmo, extintos do eixo que faz parte dessa política de encarceramento no Brasil.

DADOS SOBRE O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), do Departamento Penitenciário Nacional, de 2019, o número de pessoas em privação de liberdade no país é de 748.009, correspondendo a 3ª maior população carcerária do mundo. Desse número total, 362.547 e 133.408 estão em Regime Fechado e Semiaberto, respectivamente. 25.137 se encontram em Regime Aberto e 222.558 em Regime Provisório. Sob Tratamento Ambulatorial são 250 presos e 4.109 estão em Medida de Segurança. Quando se trata do aumento de pessoas encarceradas no Brasil ao longo dos anos, Borges traz um dado que exemplifica muito didaticamente os motivos pelos quais especialistas do sistema de justiça criminal e temáticas que estão ligadas a ele, principalmente sob a perspectiva da “Lei de Drogas”, apontam como um sistema falho e que exige uma reformulação imediata. “De 2006 a 2014, quando temos dados oficiais pelo InfoPen, o número de encarcerados aumentou em mais de 200 mil pessoas em um período de oito anos, sendo que de 1990 a 2005, um período de 15 anos, houve cerca de 27 mil pessoas encarceradas”. O ano escolhido pela escritora, 2006, não por acaso foi o período que a lei 13.343/2006, mais conhecida como “Lei de Drogas”, foi implementada, impulsionando o encarceramento no país.

RECORTE DE GÊNERO

A questão central que a escritora aborda no livro é o recorte de gênero dentro desse sistema. De acordo com a autora, “68% das mulheres encarceradas são negras, e três em cada dez não tiveram julgamento”, ou seja, estão em Regime Provisório. Analisando sob o ponto da escolaridade dessas mulheres, “50% não concluíram o ensino médio e 50% são jovens, sendo essa média de mulheres em torno de 20 anos”, completa Borges. Comparando com outros países, lembra a autora, temos a quinta maior população de mulheres encarceradas do mundo, com 37.380 mulheres em situação prisional. O Brasil só fica atrás de Estado Unidos, atingindo a marca de 205.400 mulheres, China, com um total de 103.766, Rússia, sendo 53.304 mulheres encarceradas e Tailândia, com 44.751.

Analisando os dados da população carcerária masculina, “poderíamos refletir sobre esse dado como uma informação de que esse número não é tão alarmante”, aponta Borges. Porém, de acordo com suas apurações, “entre 2006 e 2014, a população feminina nos presídios aumentou em 567,4%, ao passo que a média de aumento da população masculina foi de 220% no mesmo período”.

Quando se trata do encarceramento de mulheres, os temas que devem ser pensados nem sempre passam por quem os formula, segundo a escritora, questões relacionadas à saúde pessoal, maternidade e de seu posicionamento diante de uma sociedade baseada em valores patriarcais. “No caso das mulheres, enquanto que visibilizamos a violência doméstica no debate público, não trazemos para o centro do debate a invisibilidade e a situação de extrema violência no cárcere. As prisões dependem da violência para funcionarem. E esse contexto de intensa violência, adquirindo contornos de violência psicológica contra as mulheres de forma muito mais intensa, corrobora o ambiente perverso de relacionamentos abusivos”, diz Borges.

Levantamentos da escritora corroboram com estudos que demonstram como o sistema prisional brasileiro é insalubre, ainda mais se tratando de mulheres encarceradas. “No Brasil, segundo dados do InfoPen [Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias], há apenas 32 profissionais ginecologistas para atender todo o universo de mulheres encarceradas. Apesar de terem assegurado o acesso ao pré-natal, fica evidente nos dados que muitas delas interrompem acesso regular à Saúde”, lembra Borges. Sobre o pré-natal, a autora completa dizendo que é “notadamente violado, além dos graves relatos de partos realizados com mulheres algemadas, que ainda persistem, sendo que, em 2016, a Comissão de Constituição e Justiça aprovou, em caráter terminativo, a proibição desse procedimento”.

Do ponto de vista social, relata a autora, “esse cenário de encarceramento é a realidade de penas mais duras para mulheres, principalmente negras, ao adicionarmos o elemento racista, frente a delitos mais leves. Segundo ela, “das mulheres encarceradas, 635 têm penas de até oito anos”. Pensando em que posição na sociedade está essa mulher, sendo muitas delas mães, como lembra a autora, “45% delas cumprem penas em regimes fechados”. Dessas mulheres, completa Borges, “40,6% estavam desempregadas, e em 96,5% dos autos de prisão há referências ao uso de drogas, reforçando uma narrativa de drogas como problemas, invertendo a lógica de que, na verdade são as vulnerabilidades sociais que levam ao uso abusivo de substâncias”. Outro dado que assusta é a escolaridade, chegando a 72% das mulheres encarceradas que não concluíram o Ensino Médio, e, como afirma Borges, “apesar da Lei de Execução Penal determinar que é dever do Estado fornecer assistência educacional, tanto instrução escolar quanto profissional, apenas 25,3% das mulheres em situação prisional estão envolvidas em atividade educacionais formais”.

RECORTE RACIAL

“Nosso país foi construído tendo na instituição da escravização de populações sequestradas do continente africano um de seus pilares mais importantes”. Esta é a frase que a autora inicia para explicar a importância de relacionar no debate sobre o sistema prisional brasileiro a temática racial. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 56,10% da população brasileira se declara negra no país.

Ao falar sobre racismo, Borges cita a intelectual Beatriz Nascimento, que define o racismo como “um emaranhado de sutilezas”. Segundo a autora, Nascimento pensava “o fenômeno [racismo] e suas consequências não podem ser estudadas apenas na externalidade, mas também nos impactos da corporeidade e da subjetividade dos sujeitos oprimidos, ou seja, “o racismo é uma experiência que retira o sujeito de si mesmo”. No sistema prisional, 64% dessa população é negra, aponta a autora, “dois em cada três presos no Brasil são negros”. Quando se trata da faixa etária dessa população, 55% são jovens, de acordo com o Estatuto da Juventude, entre 18 e 29 anos. “Há, portanto, um alarmante dado que aponta para a juventude negra como foco de ação genocida do Estado Brasileiro”, afirma.

Outro dado que evidencia o racismo como ideologia dentro do sistema de justiça é a definição das penas comparadas entre brancos e negros que cometeram o mesmo crime. Segundo Borges, “dos acusados em varas criminais [segundo a página Jusbrasil, são responsáveis por processar e julgar aqueles acusados de cometerem crimes], 57,6% são negros, enquanto que em juizados especiais [de acordo com o portal do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os juizados especiais “servem para conciliar, julgar e executar causas de menor complexidade] que analisam casos menos graves, esse número se inverte, tendo uma maioria branca (52,6%)”.

No capítulo Brasil: ideologia racista e sistema de justiça criminal”, a autora faz um levantamento sobre dados raciais do sistema de justiça criminal, o que denomina como “Sistema de Justiça Criminal Brasileiro em cores”. São eles:

  • 84,5% dos juízes, desembargadores e ministros do Judiciário são brancos, 15,4% negros, e 0,1% indígenas;
  • 64% dos magistrados são homens, 36% das magistradas são mulheres;
  • 82% das vagas nos tribunais superiores são ocupadas por homens;
  • 30,2% de mulheres já sofreram reação negativa por serem do sexo feminino;
  • 69,1% dos servidores do Judiciário são brancos, 28,8% são negros, 1,9 amarelos;
  • 67% da população prisional é negra (tanto homens quanto mulheres);
  • 56% da população prisional masculina é jovem, 50% da população prisional feminina é jovem.

VÍDEOS COM A AUTORA SOBRE ENCARCERAMENTO EM MASSA

 

 

 

 

 

OBRAS E PORTAIS ACADÊMICOS E DE NOTÍCIAS PARA ENTENDER MELHOR O SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRO

Pelo fato de o Brasil ter a 3ª maior população carcerária do mundo, são muitas as produções audiovisuais, literárias e portais online sobre a temática. Para ajudar o leitor a compreender melhor a situação que enfrentamos no país, a reportagem separou algumas dessas produções sobre o Sistema Prisional Brasileiro e temas relacionados a ele.

PRODUÇÕES AUDIOVISUAIS

Deus e o Diabo em Cima da Muralha - https://www.youtube.com/watch?v=VbTMV1-0BTk

A partir do ponto de vista do médico e escritor Dráuzio Varella, que trabalhou como médico voluntário na Casa de Detenção de São Paulo, mais conhecida como Carandiru, por 13 anos, a produção lançada no ano de 2006 narra histórias e situações que aconteceram na penitenciária. Desativado e demolido a maior parte do prédio em 2002, ficou sob os holofotes da população brasileira após ocorrer o chamado “Massacre do Carandiru”, que, em 1992, resultou no assassinato de 111 encarcerados após a intervenção da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Tortura e Encarceramento em Massa no Brasil - https://www.youtube.com/watch?v=khplZUIRD_8&t=1s (parte 1), https://www.youtube.com/watch?v=cTSgBhSU-dI&t=2s (parte 2)

Produzido pela Pastoral Carcerária, o documentário relata, em duas partes, a tortura dentro do sistema prisional brasileiro e como ela atinge as mulheres que estão encarceradas, respectivamente.

Pelo Direito de Recomeçar - https://www.youtube.com/watch?v=YLrwdquiL4Y&t=1s

Promovido pela Defensoria Pública do Tocantins, a obra aborda a realidade do sistema prisional tocantinense, segundo a apresentação da DP-TO, apresentando “propostas para amenizar os problemas relatados e reinserir os detentos na sociedade através do trabalho”.

Falcão – Meninos do Tráfico - https://www.youtube.com/watch?v=B-s2SDi3rkY&t=1730s

Produzido pelo centro de audiovisual da Central Única das Favelas (CUFA), o documentário acompanha o produtor e fundador da Central Única das Favelas (CUFA), Celso Athayde, e o rapper e ativista social, MV Bill, que percorrem as favelas brasileiras atrás de histórias de meninos envolvidos no tráfico de drogas.

OBRAS LITERÁRIAS

Estação Carandiru; Carcereiros; e Prisioneiras

Estação Carandiru, Carcereiros e Prisioneiras

 

Escritos pelo médico e escritor Dráuzio Varella, as três obras abordam a experiência que o médico teve como voluntário em uma das casas de detenção mais conhecidas no Brasil, o Carandiru. Transitando entre um relato pessoal e profissional durante sua experiência, trata da temática com muita responsabilidade e de uma maneira pedagógica, sob um olhar atento as questões que fazem parte do sistema em questão.

Presos que Menstruam – A brutal vida das mulheres – tratadas como homens – nas prisões brasileira 

Presos que menstruam

 

Produzido pela jornalista Nana Queiroz, a obra dialoga com a produção de Juliana Borges, analisando a situação do sistema prisional feminino. Porém, do ponto de vista de relatos pessoais de mulheres encarceradas e de seus familiares, constrói uma narrativa mais instigante para quem as lê.

A Guerra – A ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil

A Guerra

 

Sob a pesquisa e produção do jornalista Bruno Paes Manso, e da socióloga Camila Nunes Dias, o livro aborda a maior facção criminosa do país, o PCC, analisando seu surgimento, desenvolvimento e a consolidação como uma das maiores distribuidoras de drogas do mundo. Traz relatos e diagnósticos do Sistema Prisional Brasileiro essenciais para adicionar nas questões levantadas por Borges.

Falcão – Meninos do Tráfico” e “Falcão – Mulheres e o Tráfico

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Do produtor e fundador da Central Única das Favelas (CUFA), Celso Athayde, e do rapper e ativista social, MV Bill, a partir de relatos coletados ao longo de anos e situações que os envolvidos no projeto vivenciaram – além de experiências próprias dos autores – as duas obras trazem para o leitor a realidade de meninos e mulheres, na maioria das vezes de classes socioeconômicas baixas, que se envolveram com o tráfico de drogas. Além disso, “Falcão – Meninos do Tráfico”, foi produzido em cima do documentário sob o mesmo título.

PORTAIS JORNALÍSTICOS E ACADÊMICOS

Ponte Jornalismo - https://ponte.org/

Site jornalístico independente especializado em direitos humanos, que aborda temáticas como Violência de Estado, Raça, Gênero e Cultura.

Agência Pública – Agência de Jornalismo Investigativo - https://apublica.org/

Uma das primeiras agências de jornalismo investigativo no país, a Agência Pública segue uma linha editorial pautada na investigação e produção de longas reportagens sobre temáticas relacionadas a questões sociais.

The Intercept Brasil - https://theintercept.com/brasil/

Conhecido pela “Vaza Jato”, o site Intercept Brasil, é antes de tudo, um meio jornalístico que acompanha e produz reportagens sobre diversas questões sociais que fazem parte do debate público no Brasil, como a situação da política de Segurança Pública no Brasil.

 Alma Preta- Jornalismo Preto e Livre - https://almapreta.com/

Lançado em 2015, o Alma Preta é uma agência de jornalismo especializado na temática racial. Produz um material que discute política, cultura e a situação do cotidiano da população brasileira, todos esses temas sob a perspectiva do recorte racial da população negra.

Memória Massacre Carandiru - https://www.massacrecarandiru.org.br/

Uma parceria do Núcleo de Estudo sobre o Crime e a Pena da FVG Direito SP (Fundação Getúlio Vargas) com a Andhep (Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-Graduação), o portal transmídia tem como objetivo apresentar documentos e materiais sobre o “Massacre do Carandiru”, a partir de analises acadêmicas, entrevistas, reportagens e documentos do próprio Estado sobre o ocorrido.

Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CeSeC) - https://cesecseguranca.com.br/

Fazendo parte da Universidade Candido Mendes, no Rio de Janeiro, é uma das instituições acadêmicas referências no tema sobre violência e segurança pública no Brasil.

Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) - https://forumseguranca.org.br/

Composto por acadêmicos e agentes de Segurança Pública do país, a ONG FBSP traz publicações robustas, a partir de dados e análises da temática, que ajudam a compreender melhor os problemas e desafios das políticas de Segurança Pública do país.

Monitor da Violência - https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/

Uma parceria entre o G1, o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) e o FBSP, o projeto tem como objetivo acompanhar a temática da violência e assuntos relacionados, produzindo um conteúdo que mescla o jornalismo e a academia.

- Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) - https://www.ibccrim.org.br/

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) é referência quando se trata da produção e divulgação acadêmica de temáticas relacionadas às Ciências Criminais.

Plataforma Brasileira de Políticas de Drogas (PBPD) - https://pbpd.org.br/

Trazendo questionamentos sobre a conjuntura da Política de Drogas adotada pelo Brasil e como é tratado a temática no país, a Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD) promove o debate a partir de uma perspectiva dos direitos humanos e da redução de danos sobre o uso e assuntos relacionados as drogas.

Agenda Nacional pelo Desencarceramento - https://desencarceramento.org.br/

Surgido em 2013 após um documento apresentado em audiência pública com o Governo Federal, a Agência Nacional pelo Desencarceramento (AGENDA) logo se consolidou como uma das principais ONGs que discutem o Sistema Prisional Brasileiro com grande participação da população que vivencia ou está presente, direta e indiretamente, dentro dele.

Pastoral Carcerária - https://carceraria.org.br/

Ligada a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Pastoral Carcerária (PCr) faz um trabalho dentro e fora do Sistema Prisional, produzindo relatórios e realizando ações visando a proteção dos encarcerados nas prisões espalhadas pelo Brasil.

Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) - https://ittc.org.br/

Criado em 1997 após uma visita na Casa de Detenção do Tatuapé, sob a denúncia de tortura a uma mulher grávida na unidade, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania promove relatórios e ações que ajudam a visibilizar a situação das prisões no país, focando principalmente na situação das mulheres encarceradas.

Núcleo de Estudos da Violência (NEV) - https://nev.prp.usp.br/

Logo após o fim da ditadura civil-militar no Brasil, no ano de 1987 docentes da Universidade de São Paulo (USP) e ativistas de Direitos Humanos criam o Núcleo de Estudos da Violência (NEV), após anos monitorando e produzindo relatórios sobre as violações de direitos humanos no regime militar. Até os dias atuais, é um dos principais difusores de conhecimento acadêmica sobre a questão de direitos humanos no país.

Conectas Direitos Humanos - https://www.conectas.org/

Surgida em 2001, a Conectas Direitos Humanos é uma ONG que acompanha de perto a situação de Direitos Humanos no Brasil, publicando relatórios, participando de ações judiciais e ajudando a pautar no debate público temáticas de Direitos Humanos.

124 anos depois, a resistência contra o ‘Corta Cabeças’ ainda persiste
por
Milena Camargo
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23/11/2021 - 12h

O idealismo iluminista da República soberana se faz esquecer da sujeira que esconde em baixo do tapete. O extermínio deliberado pelo Estado de aproximadamente 25 mil brasileiros comprova a insanidade inata encontrada na configuração da República brasileira. A guerra contra Belo Monte (Canudos), ocorrida há mais de 124 anos, ainda é extremamente atual, conforme afirma Sérgio Guerra, doutor em história com ênfase na guerra de Canudos: “O genocídio se deu em 1897, mas continua. Porque a população dos sertões continua sendo massacrada. Se você procurar ver as vítimas da Covid, são aqueles mesmos pretos, pardos e índios de sempre. Na realidade, o Brasil ainda vive essa política”. 

De acordo com um estudo feito em fevereiro desse ano pelas pesquisadoras Ligia Bahia e Jéssica Pronestino, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a taxa de letalidade varia de acordo com o nível de escolaridade, da cor da pele e do IDH dos municípios. Lugares com o IDH baixo tiveram 61,7% de mortes. Já os municípios com IDH muito alto ficaram com 32,9%. 56% dos pacientes brancos internados com síndrome respiratória morreram, contra 79% dos não brancos. Entre os pacientes sem escolaridade, 71,3% vão a óbito, contra 22,5% para os de nível superior. 

“O Brasil foi montado a partir da invasão dos brancos, do genocídio da população indígena e da escravização da população negra e é esse resultado que vivemos até hoje”  (Sérgio Guerra)

Canudos representou um, dentre inúmeros, massacres genocidas brasileiros. Em 1889, com a instauração da República na recente ex-colônia, poucos se sentiam realmente pertencentes a esse sistema. A realidade era uma via de mão única, que obrigava o pagamento de impostos sem nada em troca. O Líder religioso, Antônio Conselheiro, se recusava a pagar as taxas estatais, pois entendia que a República, por eles, nada fazia. E dessa forma, eram vistos como uma ameaça, que deveria ser combatida. 

A execução em Canudos ocorreu de diversões formas. Não só a violência física foi crucial para esse acontecimento, como também o abandono do Estado e a justificativa ideológica - processo que autoriza o uso da violência. A alusão de Anti República e marginalidade foi indispensável para a aceitação e legalização do assassinato em massa, bem como o roubo da identidade. A própria denominação, ‘Canudos’, é, em si, uma violência contra a população que, na verdade, se auto nominava ‘Belo Monte’.  Deslegitimar e fazer esquecer são as formas mais ferozes de atrocidar movimentos. 

“A partir dos jornais da época, fizeram de Canudos um reduto de rebeldes, pessoas que não tinham religião, não tinham leis, tabaréus, que estavam causando mal ao desenvolvimento do país. Ou seja, era preciso exterminar” afirma João Batista, historiador com ênfase em turismo. Além disso, outra artimanha de inverter os papéis - de vítimas a vilões - é taxa-los de violentos quando se defendem. Quanto a isso, afirma Guerra: “Não existe violência do escravo para o escravizador. Porque a violência que está instruída é a da repressão contínua. Então, o que você tem são movimentos de resistência a essa violência institucional. Não há violência do mais fraco contra o mais forte”.

“Quando se escolhe Moreira César, a ideia é causar esse impacto na população brasileira, ‘Canudos agora será dizimada, agora temos um comandante a altura dos jagunços, assassinos e bárbaros’” (João Batista).

Moreira César, mais conhecido como ‘Corta Cabeças’, foi o escolhido pelo então presidente, Prudente de Morais, para comandar as tropas contra Canudos. Esse representante violento é sempre uma ótima estratégia propagandista em prol da segurança patriota. Um líder destruidor, que degola vidas em prol do bem-estar do poder.   

“Patriota, a favor da família e que não tolera nada que destoe o patriarcal. O Bolsonaro representa esse ‘Corta Cabeças’. As cabeças representam a falta de investimento na educação, a liberação de mais agrotóxico, o nenhum centímetro a mais para os indígenas, tantas mulheres que são violentadas - por esse discurso machista que ele prega -, da comunidade LGBT e do povo negro que são perseguidos e assassinados pelo discurso homofóbico e racista e mais de 600 mil mortes pela negligencia da pregação da não vacinação. Até hoje ele não se vacinou”, conclui Batista.  

A cabeça de Antônio Conselheiro foi levada para o Exame Médico Legal, afim de que a ciência pudesse encontrar uma explicação para o que eles consideravam aberrações mentais. À época, se faziam grandes pesquisas com o intuito de descobrir as características físicas de um ‘delinquente’ anti-Estado. Essa antropologia criminal é aceita até hoje em discursos que tentam estereotipar criminosos por sua cor e etnia. O que representa uma forma de legalizar o genocídio de grupos de pessoas por suas características físicas.  

A chance de uma pessoa negra ser assassinada no Brasil é 2,6 vezes superior àquela de uma pessoa não negra. Os dados fazem parte do Atlas da Violência de 2021 – divulgado em agosto desse ano. O ato genocida, continua acontecendo, com inúmeros discursos traiçoeiros para justificar que seu alvo tem etnia, cor, religião e classe social específicas. 

Segundo Batista, “uma pauta sobre o que foi esse movimento [Canudos], é necessária para que as pessoas compreendam o que foi o Brasil de ontem, e o em que estamos inseridos hoje. [...] fazer com que as pessoas entendam que os erros do passado continuam sendo repetidos hoje, por conta dessas lideranças que são constituídas, e que são, infelizmente, colocadas pelo povo – de alguma forma”. 

 “A gente precisa superar os ‘os donos da história’” 

Euclides da Cunha, em seu livro ‘Os Sertões’ (1902), faz um panorama respeitado sobre o que foi a Guerra de Canudos. Sendo correspondente do jornal – O Estado de S. Paulo -, e tendo participado de uma parte da guerra, o então escritor constrói uma crítica humana ao acontecimento.  

Esse livro, tendo uma repercussão avassaladora – inclusive internacionalmente - foi o que deu a Euclides sua cadeira na Academia de Letras. Entretanto, segundo Guerra, “ninguém pode negar o mérito de Euclides da Cunha, mas além dele você tem 25 mil moradores de Belo Monte e 15 mil soldados envolvidos”. Cabe dizer, que esse livro parte de certa meia culpa pelo ocorrido. Euclides da Cunha foi membro do exército e integrante da imprensa – dois dos principais grupos responsáveis pelo massacre. 

A história precisa ser ouvida pelos vencidos, e por seus descendentes. Garantindo, assim, o lugar de fala, livre de projeções estereotipadas, dotadas de privilégios, hipocrisias e segundas intenções. “Os vencidos também merecem um lugar na história. A história de Belo Monte foi contada sob a ótica dos vencedores”, diz Batista. 

Preservar e divulgar a verdadeira história de Canudos, tendo como referência as narrativas dos descendentes conselheiristas é o principal objetivo do Instituto Popular Memorial de Canudos (IPMC). Atualmente, o grupo é uma das principais formas de estreitar a relação do que foi Belo Monte com os movimentos socias de hoje.  

Vanderlei Leite da Silva, morador da cidade de Canudos e coordenador do IPMC explica que “essa experiência da união e da organização dos grupos, é a estratégia que a gente tem para colocar em risco os privilégios dos grandes. Têm muitos poderosos que fazem de tudo para que isso não aconteça”.  

A romarias, são eventos abertos que acontecem anualmente – geralmente no mês de outubro -, desde 1988. É um evento aberto para a população de Canudos e pessoas de outras regiões que se interessem pelo assunto. Cada romaria possui um tema para debate, que é selecionado pela paróquia do IPMC e uma comissão dos movimentos atuais.  

“Fazemos uma relação do que estamos vivendo hoje, a atual conjuntura e a relação do que representou o movimento de Canudos. O tema deste ano foi: ‘O grito de Belo Monte em defesa da vida’. É o nosso grito hoje, né? De defender a vida, de nos proteger, contra esses retrocessos que vêm acontecendo com esse desgoverno bolsonarista”, reforça Silva. O IPMC pode ser encontrado através do instagram - @ipmcanudos - e no canal no Youtube - Instituto Popular Memorial de Canudos.  

O termo, criado em 1944, foi definido como crime internacional apenas no ano seguinte e reverbera até os dias de hoje.
por
João Curi
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22/11/2021 - 12h

A definição do dicionário Oxford é clara. “Extermínio deliberado, parcial ou total, de uma comunidade, grupo étnico, racial ou religioso”, e ainda complementa: “inclui outras formas de extermínio, como a prevenção de nascimentos, o sequestro sistemático de crianças dentro de um determinado grupo étnico, a submissão a condições insuportáveis de vida etc.”.

Genocídio é um termo formado pelo prefixo grego “geno” (raça ou tribo) e pelo sufixo latino “cídio” (referente à morte). O vocábulo foi criado em 1944, como sugestão do advogado judeu polonês Raphael Lemkin (1900-1959), que enfrentou intensas negociações com diplomatas para oficializar o cunho jurídico.

Depois de muita insistência, o que Lemkin definiu por “um plano coordenado, com ações de vários tipos, que objetiva à destruição dos alicerces fundamentais da vida de grupos nacionais com o objetivo de aniquilá-los”, foi enfim caracterizado pela Assembleia Geral das Nações Unidas como “crime contra o Direito Internacional", por meio da resolução 96, de 11 de dezembro de 1945.

Em 9 de dezembro de 1948, foi estabelecida a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, que hoje agrega mais de 140 Estados signatários, incluindo o Brasil. A declaração afirma o compromisso de “libertar a humanidade de flagelo tão odioso” e configura a cooperação internacional como uma necessidade.

A Assembleia Geral da ONU ainda proclamou o dia 9 de dezembro como o “Dia Internacional de Comemoração da Dignidade das Vítimas do Genocídio e Prevenção deste Crime”, sob aprovação unânime da resolução 69/323, adotada em 11 de setembro de 2015.

“O genocídio representa o pior da humanidade”, disse Adama Dieng, ex-Conselheiro Especial da ONU para a Prevenção do Genocídio. “Relembrar os eventos do passado e prestar homenagem àqueles que pereceram deve fortalecer a nossa vontade de fazer prevenção para que tais eventos não voltem a acontecer”.

Sob a liderança do líder radical Pol Pot, o Camboja sofreu um dos maiores extermínios da história.
por
Mariana Lopes
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24/10/2021 - 12h

        No Camboja, o jovem Saloth Sar, nascido em 1925, em uma família de camponeses que cultivava arroz, na vila de Prek Sbauv. Seu pai o levou para a capital Phnom Pehn para que ele pudesse frequentar a escola. Saloth cresceu estudando literatura  e história francesa, aprendeu sobre a revolução francesa de 1789 e o Reino do Terror. O Camboja, desde 1863, for um protetorado francês e fazia parte da colônia francesa da Indochina.

       Apesar de ser uma monarquia constitucional, quem realmente governava o Camboja eram os oficiais franceses. Porém, no país vizinho, o Vietnã, eles estavam com dificuldade de manter sua influência.  O exército francês estava em direto conflito com os vietnamitas e seu líder Ho Chin Minh no Vietnã. Na década de 1950, uma tendência política surgiu no mundo, além da independência, muitos países a buscaram através de revoluções comunistas, um movimento que se espalhou por grande parte da Indochina.


       Em solidariedade, os vietnamitas começaram a treinar militarmente cidadãos do Camboja e instiga-los a se engajar na luta por sua independência e em um modelo social baseado no comunismo. Saloth Sar, então com 20 anos no ano de 1945, fez uma peregrinação ao templo de Angkor Wat. O templo, local representativo na história do Camboja inspirou seu desejo pela independência do seu país e sua consciência política.

       Em 1949, em viagem a Paris, acompanhado de amigos cambojanos, Saloth chegou a uma conclusão; os países que estão conquistando sua independência tem algo em comum, seus revolucionários são comunistas. Além disto, Sar defendia a tomada de poder pela resistência armada. Estuda o pensamento de Karl Marx, porém se identifica com os textos de Joseph Stalin, e pelo resto da vida, ele defenderá o stalinismo, sua ênfase na industrialização, no governo totalitário e no culto de personalidade.


       Em 1951 se filia ao Partido Comunista e em 1953 retorna ao Camboja  totalmente comprometido com a revolução de seu país. Em viajem para o norte, se integra às forças  vietnamitas com o objetivo que de tornar o país livre dos franceses. Ainda em 1953 os vietnamitas derrotam os franceses que se retiram do Vietnã e também do Camboja. A solução institucional para o novo governo foi a designação de um rei como governante, e apesar da insistência de Sar, para que os vietnamitas continuassem a atacar, eles retiram suas forças do Camboja e fazem um acordo com o novo governante, Norodom Sihanouk.


       Após cinco anos de governo, um novo primeiro ministro é eleito. O partido comunista é banido do país e seus membros perseguidos e presos. Esta guinada política força Sar a se esconder nas florestas fora da cidade. Em seu refúgio, adota um novo nome, Pol Pot, e torna-se o líder do partido comunista no Camboja. O então primeiro ministro do país passa a chamar seu grupo de Khmer Vermelho.


       Novamente Pol Pot junta-se aos vietnamitas nas selvas do Camboja, porém, desta vez, lutavam contra os Estados Unidos e não a França. Durante o longo conflito, os EUA bombardearam o norte do Camboja inúmeras vezes, causando a morte de mais de 150 mil cidadãos cambojanos. A destruição causada pelos bombardeios provocou o fortalecimento da causa de Pol Pot, e logo, a ajuda vietnamita não era mais necessária, pois um exército revolucionário havia se formado em resposta à ação norte-americana.

       Diante do crescimento da força oposicionista, primeiro ministro é deposto por um golpe militar em 1970. Sua sobrevivência política foi pedir uma aliança com o Khmer Vermelho. O apoio das forças governistas faz as tropas de Pol Pot chegarem a 64 mil homens. Em dezembro de 1974, Pol Pot ataca a capital Phnom Penh e, em apenas cinco dias, a capital é rendida. A data de 17 de abril de 1975 marca o primeiro dia do novo governo. O nome do país muda para Kampuchea e seu novo governante, Pol Pot, comandaria o partido Kampuchea Democrático. Sua proposta ideológica era o país se desenvolver de uma sociedade socialista agrária para uma sociedade comunista.


       Logo, sua faceta política autoritária e radical é colocada em prática. Pol Pot ordena a evacuação da capital sob a justificativa da ameaça de bombardeio norte-americano. Mais de 2 milhões de pessoas foram evacuadas às pressas. Mas, na realidade, o novo governante estava iniciando sua estratégia de limpeza ideológica. Sob o pressuposto de igualitarismo completo, os cidadãos foram deslocados para trabalhar em fazendas coletivas. O dinheiro foi abolido, assim como todo tipo de entretenimento. Pensamentos e sentimentos privados não eram tolerados e todos tinham que usar uniformes pretos.


       O Estado passou a autorizar casamentos e aqueles suspeitos eram punidos com  espancamento e até a morte em público. A brutalidade aliada à fome e a doenças que se espalhavam pelo país, provocou a moirte de centenas de cidadãos diariamente. Pol Pot atribuía a falta de sucesso de seu governo a inimigos do partido e com isso iniciou uma perseguição generalizada no Camboja. Na prisão de Tuol Sleng, cidadãos, membros do partido suspeitos de traição e seus familiares eram  interrogados, torturados e mortos. Este local ficou conhecido internacionalmente como “Killing Fields” (Campos de Mortes). Aproximadamente 14 mil homens, mulheres crianças e idosos foram encarcerados. Apenas 7 sobreviveram.

       Após a expulsão dos norte-americanos do país, os vietnamitas voltaram sua atenção para o Camboja. Pol Pot temia uma aliança de seus soldados com exército vietnamita. O ditador levou sua campanha de terror para a fronteira com o Vietnã. Ao final, aproximadamente 2 milhões de cambojanos foram massacrados. Após o massacre de suas próprias forças cambojanas, as forças do Vietnã não tiveram dificuldade para invadir e pais e tomar sua capital, Phnom Pehn, em 1978. Pol Pot escapou dos conflitos, faleceu em sua casa no ano de1998 sem nunca ter sofrido consequências por suas ações.