Voluntários se reúnem quinzenalmente para apoiar pessoas em situação de vulnerabilidade na capital paulista
por
FABIANA CAMINHA
JOÃO VICTOR ESPOSO GUIMARÃES
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25/09/2025 - 12h

Domingo, 7h da manhã. Enquanto a cidade ainda desperta, a fila já contorna os fundos do Shopping da Lapa, zona oeste de São Paulo. Essa cena se repete a cada 15 dias. Antes mesmo da chegada dos voluntários do Ondas de Amor, quem deseja receber os kits já sabe onde se posicionar. Pessoas com mobilidade reduzida são prioridade. Todos aguardam organizados quando chega o primeiro carro carregado com os itens que serão distribuídos. 

 

Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa
Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa. ​​​​Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Criado em 2019, o grupo distribui, a cada ação, cerca de 180 kits de café da manhã, além de água e itens de higiene, como sabonetes, absorventes e papel higiênico. Ocasionalmente, também são oferecidos produtos adicionais, como escovas e pasta de dente, aparelhos de barbear e desodorantes.

Em dias frios, a entrega inclui cobertores e toucas de lã. Além de suprir necessidades básicas, a iniciativa oferece também mensagens de acolhimento inspiradas na doutrina espírita a quem quiser ouvir.

A ideia nasceu de uma dinâmica com adolescentes em um centro espírita da Vila Romana, bairro da zona oeste. Desafiados a elaborar um projeto de caridade, os jovens sugeriram o nome Ondas de Amor e propuseram oferecer não apenas alimentos básicos, mas itens que consideravam “gostosos”, como sanduíches, bolachas recheadas, doces e achocolatado. O projeto não foi adiante com os adolescentes, mas duas das educadoras, Marildes Esposo e Valéria Vareta, decidiram colocá-lo em prática.

No início, as limitações eram grandes. Somente cerca de 20 kits eram distribuídos, por falta de recursos e voluntários. Com o tempo, a ação ganhou força. Nem mesmo a pandemia interrompeu o trabalho. Com adaptações, máscaras, luvas e distanciamento, o Ondas manteve as distribuições em um período em que a vulnerabilidade de quem vive nas ruas se agravou.

 

Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos.
Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Hoje, aproximadamente 130 kits são entregues na Lapa e o restante é oferecido nos arredores da Avenida General Olímpio da Silveira, sob o Minhocão. Nessa segunda etapa, os voluntários percorrem as barracas, chamando as pessoas pelo nome e demonstrando os vínculos construídos ao longo dos últimos anos.

O senhor José, em situação de rua, é um exemplo dessa relação. Há anos recebe os kits do grupo sob o viaduto e, a pedido dele, o projeto passou a incluir livros, dispostos de forma acessível a qualquer interessado. Sempre que possível, são distribuídos sacos de rações para animais e quando há doações de roupas e calçados, esses itens também são entregues a quem precisar.

Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária.
Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Mas a atuação do grupo vai além da entrega de alimentos, livros e vestimentas. Em alguns casos, é possível fazer uma diferença ainda maior, como no de Ana, que vivia em uma barraca sob o Minhocão quando os voluntários perceberam que estava grávida.

Com sua permissão, Marildes, Eloisa Cestari e Márcia Aoki, outras colaboradoras do projeto, se mobilizaram para garantir o acompanhamento médico de Ana. Desde então, ela passou a viver na Associação Amparo Maternal, centro de acolhida para gestantes, mães e bebês apoiado pela Prefeitura de São Paulo.

O caso evidencia como a iniciativa pode transformar vidas, especialmente quando atua em parceria com outras instituições. Segundo Marildes, o projeto busca ir ainda mais longe. “Nosso sonho é criar uma rede de apoio que nos permita ampliar e qualificar o acolhimento dos que precisem desse tipo de ajuda”, afirma.

Uma operação com um impacto tão grande exige um esforço quase proporcional. A preparação para o domingo começa cerca de uma semana antes. Alguns voluntários cuidam das compras, outros montam os lanches e organizam as sacolas. Atualmente, cerca de 20 pessoas atuam diretamente na logística para que tudo esteja pronto no dia da ação, além daqueles que contribuem indiretamente com doações e apoio financeiro. 

Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários.
Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

“O trabalho voluntário é isso, é dar e fazer o que é possível, mesmo que sejam 10 minutos na ação ou 10 reais doados.”  afirma Marildes, que reforça a importância do esforço coletivo. É possível encontrar mais detalhes sobre o trabalho do grupo e outras formas de contribuir com o projeto no site https://ondasdeamor.com.br/social 

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Maior evento europeu do setor continua na rota por novidades eletricas e mais concorrência a cada ano
por
Vítor Nhoatto
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22/09/2025 - 12h

Ocorrido entre os dias 9 e 14 de setembro, o IAA Mobility recebeu mais de 500 mil visitantes, superando a sua última edição em 2023. Estiveram presentes as germânicas Audi, BMW, Mercedes, Opel, Porsche e Volkswagen, mas Fiat, Peugeot e nenhuma japonesa compareceu. Com isso, mais uma vez uma grande parte de Munique foi palco para as chinesas se consolidarem e expandirem.

Com o lema “It’s all About Mobility”, em tradução livre, “É Tudo Sobre Mobilidade”, o foco da mostra se manteve em soluções inteligentes e inovadoras. Startups como a Linktour com  seus micro carros elétricos, e marcas de bicicletas e motocicletas elétricas estavam por todos os lados do München Expo Center. E repetindo o formato aplicado desde 2021, com o chamado “Open Space”, uma área de experiências interativas gratuitas ao ar livre, os visitantes podiam experimentar tudo isso.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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 Além disso, a inovação tecnológica foi tema de muitos debates e coletivas de imprensa com representantes da indústria. Fornecedoras como a Bosch, Aisin e Revolt, além de empresas de carregadores como a Charge X e E-Mobilio e a gigante de baterias CATL foram só alguns dos mais de 750 expositores presentes. 

Setor premium atento

Falando em eletricidade, ela estava no centro das atenções de todas as marcas, apesar das vendas de carros elétricos (BEV) terem sido prejudicada na Europa no ano passado. O fim ou diminuição de subsídios governamentais e metas de descarbonização estagnadas na União Europeia foram os principais motivos segundo o Global EV Outlook 2025 da International Energy Agency (IEA). No entanto, as projeções para esse ano e os próximos são de crescimento.

De olho nisso a BMW lançou o novo iX3, modelo mais importante em anos ao inaugurar uma nova era para a alemã. A segunda geração do modelo estreia uma plataforma sob medida e exclusiva para elétricos de nova geração, chamada de Neue Klasse. O destaque fica com a nova bateria de 108.7kWh de capacidade integrada ao chassi, compatível com carregamento ultrarrápido de até 800V - ganha 372km em apenas dez minutos - e autonomia de 805km em uma carga segundo o ciclo WLTP. 

No quesito design a ruptura com o passado é ainda mais evidente, com uma nova linguagem visual, inspirado nos modelos da BMW dos anos 80. No interior foi inaugurado o Panoramic iDrive, com o painel de instrumentos correndo ao longo de todo o para-brisa, um novo volante de quatro raios e um multimídia com inteligência artificial de 17,5 polegadas. “A Neue Klasse é o nosso maior projeto futuro e marca um grande salto em termos de tecnologias, experiência de condução e design”, frisou o presidente do conselho de administração da marca, Oliver Zipse.

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Alemã aproveitou o evento para apresentar o futuro Sedan i3, que seguirá o capítulo iniciado pelo SUV iX3,  irmão de plataforma. Foto: BMW Group / Divulgação 

Do outro lado do pavilhão, a Mercedes-Benz fez um movimento parecido, lançando a segunda geração do GLC elétrico. O modelo foi o primeiro elétrico da marca, ainda em 2018 como EQC. Mas pelas vendas baixas havia sido descontinuado no ano passado, e agora retorna com o nome “GLC With EQ Technology”, para evidenciar as mudanças. Rival direto do iX3, segue a linguagem de design inaugurada no novo CLA no ano passado, aqui com uma grade iluminada e enormemente proeminente.

Construído sob a inédita plataforma elétrica MB.EA Medium, independente do GLC, a combustão portanto, possui carregamento de até 800V e uma bateria de 94kWh, traduzidos em 713 km de autonomia. No interior, o SUV inaugura o “Hyperscreen”, transformando o painel inteiro em uma tela de 39.1 polegadas. O interior pode ser todo vegano e certificado, e a comunicação Car-to-X - que coleta e envia dados para comunicar outros veículos - se destaca no quesito segurança. O preço inicial deve girar em €60 mil quando chegar às lojas ainda esse ano, tal qual o rival.

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Faróis possuem tecnologia Matrix, e sob o capô há um espaço de 128 litros para bagagens. Foto: Mercedes-Benz / Reprodução

Mas nem só de SUVs o mercado premium é formado, e a Polestar compareceu a Munique para o lançamento mundial do seu novo modelo de topo, o sedã 5. A marca do grupo Geely, divisão de performance da Volvo até 2017, aposta em sustentabilidade e alta performance, estreando a nova plataforma PPA do grupo. São 872 cavalos, tração integral, aceleração de 0 a 100 em 3,2 segundos e ausência de janela traseira, tal qual no crossover 4.

Um presente e futuro elétrico

Nas duas últimas edições do Salão de Munique, ambientalistas protestaram em frente ao evento em defesa de uma mudança sistêmica da indústria, o que se repetiu. As ONGs Extinction Rebellion e Attac levaram placas pedindo por mais investimento em transporte público e justiça social, jogando atenção para uma mentalidade individualista e o preço dos elétricos. 

Em relação a essa questão, um estudo da empresa de consultoria, Gartner, mostra que até 2027 os BEVs serão mais baratos de produzir que os carros a combustão (ICEVs), e o Grupo Volkswagen promete preços competitivos para sua nova geração de elétricos. 

Foram revelados no evento quatro modelos para o segmento B baseados na plataforma MEB Entry do conglomerado. O principal deles foi o ID.Polo da Volkswagen, com previsão de início de vendas em maio na casa dos € 25 mil. Como o seu nome sugere, é a versão elétrica do hatch Polo, e contará com baterias de 38 e 56 kWh, com uma autonomia de 350 e 450 km respectivamente. Uma versão GTI do modelo será também comercializada, com 223 cavalos.

Continuando o apelo esportivo que a versão encurtada da plataforma em que os modelos do segmento C, ID.3 e ID.4, são construídos, a espanhola Cupra mostrou a versão de produção do Raval. Com dimensões e motorizações basicamente iguais às do ID.Polo, promete continuar a expansão da nova marca do grupo, antigamente uma divisão de performance da Seat.

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Cupra Raval, ID.Polo e ID.Polo GTI  (direita) serão lançados em março do ano que vem, enquanto os SUVs Epiq e ID.Cross (esquerda) chegarão no segundo semestre. Foto: Volkswagen AG / Divulgação

Como era de se esperar pela relação do Polo com o T-Cross, sua versão SUV, o conceito ID.Cross foi mostrado. Com o mesmo tamanho do modelo que substituirá em 2026, integra o segmento disputado dos B-SUV elétricos, formado por nomes como Peugeot e-2008, Renault 4 e Volvo EX30. Focando em espaço e ergonomia, marca a volta de botões físicos no volante e do ar condicionado, além de um maior uso de materiais reciclados. 

Por fim, a Skoda apresentou a sua versão do SUV, denominada Epiq. Tal qual os irmãos de plataforma, será construído em Pamplona, na Espanha, e contará com a capacidade de carregar dispositivos externos como eletrodomésticos (V2L). A velocidade de carregamento é de até 125 kW, indo de 10% a 80% em 20 minutos, e o modelo estreará uma nova identidade visual para a tcheca no ano que vem.

Ascensão chinesa continua 

Aprofundando essa questão dos preços, são as marcas chinesas que se destacam globalmente, como destaca a IEA. Com grandes reservas dos minérios utilizados nas baterias, as fábricas para construí-las e anos de investimento estatal na tecnologia, seguiram com sua expansão em solo alemão. 

A BYD, maior marca chinesa em números, marcou presença com o recém lançado Dolphin Surf - a versão europeia do Dolphin Mini. Avaliado com cinco estrelas pelo Euro NCAP, é um dos BEVs mais baratos hoje à venda na Europa, custando cerca de € 20 mil. No campo dos híbridos plug-in (PHEV) a Station Wagon do segmento D, Sealion 06, foi lançada, focada em conforto e tecnologia com até 1.092 km de autonomia combinada.

Outra marca com novidades foi a Leapmotor, que já vende o hatch subcompacto T03 e o D-SUV C10 no continente, de lançamento marcado para o Brasil ainda em 2025. Pertencendo 20% à Stellantis, que controla a sua operação internacional, apresentou o inédito hatch B05, rival de Volkswagen ID.3 e BYD Dolphin. Sob a mesma plataforma do C-SUV B10, terá cerca de 400 km de autonomia e início de vendas para o ano que vem por cerca de € 30 mil.

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"O B05 (direita) reflete nosso compromisso com a inovação, acessibilidade e a capacitação da próxima geração de motoristas em toda a Europa e além", declarou o CEO global da marca, Zhu Jiangming. Foto: Leapmotor / Divulgação

Munique foi para além de um lugar de novos modelos, mais uma vez o palco de marcas inteiras debutando em solo europeu. A marca AITO, do grupo Seres, que usa a tecnologia da Huawei, se lançou no mercado internacional com os SUVs 9, 7 e 5. Mirando as marcas premium alemãs nos segmentos E e D, podem ser tanto BEVs ou elétricos com extensor de autonomia (REEV), repetindo a abordagem da Leapmotor com o C10.

O grupo Changan Auto iniciou as operações da sua marca Deepal com os SUVs de apelo jovem e esportivo S05 e S07, ambos com opções de serem elétricos ou PHEVs. No campo de luxo, a marca Avatr da gigante chinesa mostrou seu primeiro concept car, o Xpectra, além dos modelos 06, 07 e 12, já comercializados em alguns países europeus e com planos de chegarem a 50 mercados em breve.

A premium Hongqi esteve presente e revelou o C-SUV elétrico EHS5, além de anunciar planos de expansão com 15 modelos e 200 pontos de venda pela Europa nos próximos anos. E aumentando a sua aposta no evento, a Xpeng teve um stand dentro do pavilhão e apresentou a nova geração do P7, sedã que começou a ser comercializado na Europa no IAA Mobility 2023.

Além disso, a recém chegada ao Brasil, GAC, estreou no velho continente levando cinco modelos para a mostra. Seguindo com o “European Plan Market” anunciado no ano passado, lançou como modelos de topo o novo GS7, um SUV grande híbrido plug-in, e a MPV híbrida (HEV) E9. Mas os destaques da marca foram o hatch AION UT, rival de BYD Dolphin, e o D-SUV rival de Tesla Model Y, o AION V.

O primeiro possui bateria de 60 kW/h com 430 km de autonomia e previsão de início da comercialização em 2026 na casa dos € 30 mil. Já para o segundo, comercializado no Brasil por R$214.990, o preço de € 35.990 foi anunciado, muito competitivo para o segmento. Com 510km de autonomia e cinco estrelas no teste do Euro NCAP - com mais ADAS que o brasileiro - será o primeiro a chegar às lojas, já em setembro em mercados como Portugal, Finlândia e Polônia. O plano é que a marca venda em todos os países europeus até 2028.

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Estava ainda em Munique o carro elétrico voador GOVI AirCab (ao fundo) buscando mostrar os avanços da indústria chinesa, segundo a empresa. Foto: GAC Group / Divulgação

Eletrificação em todos os níveis 

Para além das novatas, ícones do mercado aproveitaram os holofotes da feira para se renovarem completamente. Esse foi o caso da única francesa presente, a Renault, que lançou a sexta geração do hatch Clio, o segundo carro mais vendido no continente em 2024.

Construído sob a mesma plataforma que o seu predecessor, mantém o motor 1.2 TCe e uma opção movida a GPL, mas as semelhanças acabam por aqui. No powertrain, estreia um novo sistema full-hybrid (HEV) formado por um motor 1.8 e dois elétricos, resultando em 160 cavalos e modo de condução elétrico na cidade. Conforme a estratégia da marca, o Clio não terá versão elétrica, papel delegado ao hatch de estilo retrô, o 5.

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Hatch cresceu 6 centímetros em comprimento, evocando uma silhueta mais esportiva e afilada. Foto: Renault Group / Divulgação

No quesito design, o carro rompe por inteiro com a geração anterior, o oposto do que havia acontecido com a quinta geração em relação à quarta. A frente ostenta uma nova assinatura em DRL, que forma o símbolo da Renault, e a traseira possui lanternas duplas, nunca vistas em um Clio. O interior é todo novo também em relação ao antecessor, mas com o mesmo layout e sistema operacional do Google do irmão elétrico 5.

A Volkswagen foi outra que debutou no IAA uma nova geração de um best-seller, o T-Roc. Em sua segunda encarnação, também não terá versões elétricas, sendo o último novo carro a combustão desenvolvido pela marca. Haverão pela primeira vez no SUV opções micro-híbridas (MHEV), já conhecidas dos irmãos de plataforma como o Golf e A3, além de um novo sistema HEV, com 134 e 168 cavalos. Não haverá, pelo menos por ora, versões PHEV, sendo o único modelo sob a MEB Evo sem essa possibilidade, no entanto.

Seu exterior é uma evolução da primeira geração, mantendo linhas semelhantes e o seu apelo descolado, descrito pela marca. As dimensões aumentaram, 12 centímetros em comprimento, chegando a 4.37 metros, o colocando alinhado a rivais como o Toyota CH-R e Mazda CX-30. Por dentro a abordagem continua, com telas maiores e mais itens de conectividade e segurança assistida, mas com uma disposição de elementos clássica, vista nos últimos Golf e Tiguan.

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Modelo construído em Portugal foi o quinto carro mais vendido na Europa no ano passado. Foto: Volkswagen Group / Divulgação

Concorrência de todos os lados

Além das chinesas em franca expansão nos últimos anos no continente, outras concorrentes vêm se destacando na corrida pelos elétricos principalmente. A coreana Kia compareceu ao evento e mostrou ao público os novos integrantes da família EV, o EV4 e o EV5. 

O primeiro é um hatch do segmento C, acompanhado de uma variante sedã. Já o último se trata de um modelo lançado em 2023 - inclusive a venda no Brasil desde o ano passado - mas que chega só agora à União Europeia como a versão elétrica do Sportage. Sua conterrânea e marca irmã também esteve em Munique com o Concept 3, prevendo o futuro Hyundai Ioniq 3, equivalente do EV4.

Mas nem só da Ásia as novidades chegam, com a primeira marca turca de automóveis elétricos, a Togg, debutando em solo alemão a sua ofensiva no continente europeu. Fundada em 2018 e com a primeira fábrica inaugurada em 2022, apresentou o C-SUV T10X e o sedã T10F ao público. A pré-venda dos modelos começará em 29 de setembro na Alemanha, e no ano que vem a empresa pretende iniciar seus trabalhos na França e Itália, com meta de ter até 2030 um milhão de veículos em toda a Europa.

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Preços ainda não foram divulgados, mas devem ficar em torno de € 40 mil tomando como base as cifras no mercado turco. Foto: Togg / Divulgação

Construídos sob uma plataforma elétrica, ambos receberam nota máxima no Euro NCAP recentemente, com mais de 9% de proteção para adultos e 80% nos ADAS. A respeito do desempenho, a bateria possui 88.5 kWh de capacidade, e autonomias de até 500 e 600 km para o SUV e o sedã respectivamente. 

“Nossos modelos proporcionam uma experiência de mobilidade voltada para o usuário e voltada para o futuro”, comentou Gürcan Karakaş, CEO da marca durante o evento. A marca anunciou ainda que trabalha no terceiro de cinco modelos que irá lançar até o fim da década, o B-SUV T8X. Karakaş finalizou destacando que prepara para introduzir baterias de pirofosfato de lítio (LFP), e que a indústria deve estar preparada para as mudanças e maior concorrência.

Deslocamento diário afeta qualidade de vida e desempenho profissional
por
João Luiz Freitas
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18/09/2025 - 12h

Muitas vezes se imagina que o desgaste mental de um trabalhador nasce apenas de pressões internas do ambiente corporativo. No entanto, ele pode começar muito antes, ainda no trajeto até o local de trabalho. Congestionamentos, longa espera entre um transporte público e outro, atrasos constantes e até mesmo a convivência com o estresse de outros passageiros são alguns dos fatores que tornam o percurso diário um desafio silencioso.

A psicóloga Sandra Oliveira de Freitas explica: “Podemos pensar na sensação de desumanização como se as pessoas fossem apenas mais um número dentro do sistema, o que afeta sua autoestima e a percepção de valor pessoal. É como se muitos acreditassem que, por serem trabalhadores, precisam aceitar situações desgastantes no transporte público”.

Esse sentimento, reforçado pela lógica de trabalhar para sobreviver, não apenas fragiliza a forma como os trabalhadores se enxergam na sociedade, como também influencia diretamente sua rotina. O esgotamento acumulado nos deslocamentos diários pode comprometer tanto a saúde mental quanto o desempenho no trabalho, tornando o desgaste uma extensão não tão evidente da jornada.

Freitas alerta ainda para os reflexos dentro dos ambientes de ofício: “A produtividade e as relações interpessoais no ambiente de trabalho podem ser impactadas diretamente. Quando o funcionário já chega cansado ou irritado, sua energia para se concentrar em tarefas simples diminui. Isso compromete também a criatividade, a motivação e a capacidade de colaborar com colegas”.

Esse cenário mostra que o problema vai além do transporte em si: ele expõe como a estrutura urbana e a forma de organização social interferem na vida de quem depende diariamente do transporte público.

A fisioterapeuta intensivista Laís Aparecida Silva, 27 anos, leva pelo menos duas horas para chegar ao hospital em que trabalha. Metade do percurso é feita no ônibus e a outra metade no metrô.  “É cansativo e imprevisível. Muitas vezes o transporte vem lotado, tem atrasos e preciso sair de casa bem mais cedo para não correr o risco de me atrasar. Às vezes até sinto que já começo o dia esgotada só pelo trajeto”, conta.

Trânsito congestionado na cidade de São Paulo
Trânsito congestionado nas de São Paulo — Foto: Chris Faga (Getty)

 

De acordo com uma pesquisa realizada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica), usuários de transporte público gastaram em média  duas horas e 47 minutos por dia nos deslocamentos pela cidade em 2024.

O impacto vai além do tempo perdido nas conduções. Aparecida explica que o percurso interfere diretamente no desempenho de suas atividades profissionais: “Eu chego no trabalho já meio desgastada. Em alguns dias, parece que gasto a minha energia no transporte e não nas minhas atividades. Isso afeta meu rendimento, principalmente no começo do plantão”, afirma.

Mas o reflexo do trajeto diário não para no ambiente de trabalho. A fisioterapeuta relata que sua vida pessoal também acaba sendo atingida. “Chego em casa muitas vezes sem ânimo para sair, conversar ou brincar com meus familiares. O tempo que passo no trânsito poderia ser aproveitado com a minha família ou até para descansar melhor, realizar uma atividade física”, desabafa.

Para ela, melhorias estruturais no transporte público poderiam transformar a rotina de milhares de trabalhadores. “Gostaria que tivesse mais pontualidade, veículos em melhores condições e menos lotação. Isso já faria muita diferença. Também ajudaria se tivesse mais opções de linhas, para reduzir o tempo de deslocamento”, diz.

Como psicóloga, Sandra Oliveira de Freitas reforça que esse desgaste não pode ser ignorado e aponta algumas práticas que podem ajudar a reduzir o estresse no trajeto. “Ouvir músicas relaxantes, podcast, ler um livro ou até mesmo praticar exercícios de respiração. A respiração diafragmática ajuda. Pode parecer coisa simples, mas que ajuda, ajuda bastante”, afirma.

Segundo ela, é importante também prestar atenção ao corpo durante a viagem, evitando tensões acumuladas: “Às vezes você deixa o seu corpo tão tenso que não percebe. Perceber o quanto a sua mandíbula está travada, o quanto as suas costas estão pesadas e tentar dar uma relaxada”.

Plataforma do metrô lotada em São Paulo
Plataforma do metrô lotada em São Paulo - Foto: Marcelo Mora/G1

 

Além dos cuidados no trajeto, Freitas recomenda criar pequenos rituais antes e depois da jornada: tomar um café tranquilo, conversar com pessoas queridas, priorizar o sono e uma boa alimentação. Ela reforça, acima de tudo,  a importância da saúde mental.

“Eu sempre falo e indico: fazer terapia. Porque ajuda, e ajuda muito. O transporte público está deixando o trabalhador muito estressado, sim. Então, acredito que a terapia vai ajudar não só a lidar com esse transporte caótico, como [vai ser útil] para a sua vida no geral.”

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Último final de semana do evento ficou marcado por performances que misturaram passado, presente e futuro
por
Jessica Castro
Vítor Nhoatto
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16/09/2025 - 12h

A segunda edição do festival The Town se despediu de São Paulo com um resultado positivo e bastante barulho. Durante os dias 12, 13 e 14 de setembro, pisaram nos palcos do Autódromo de Interlagos nomes como Backstreet Boys, Mariah Carey, Ivete Sangalo e Katy Perry.

Realizado a cada dois anos em alternância ao irmão consolidado Rock In Rio, é organizado também pela Rock World, da família do empresário Gabriel Medina. Sua primeira realização foi em 2023, em uma aposta de tornar a cidade da música paulista, e preencher o intervalo de um ano do concorrente Lollapalooza.

Mais uma vez em setembro, grandes nomes do cenário nacional e internacional atraíram 420 mil pessoas durante cinco dias divididos em dois finais de semana. O número é menor que o da estreia, com 500 mil espectadores, mas ainda de acordo com a organizadora do evento, o impacto na cidade aumentou. Foram movimentados R$2,2 bilhões, aumento de 21% segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Após um primeiro final de semana marcado por uma apresentação imponente do rapper Travis Scott no sábado (6), único dia com ingressos esgotados, e um domingo (7) energético com o rock do Green Day, foi a vez do pop invadir a zona sul da capital. 

Os portões seguiram abrindo ao meio dia, tal qual o serviço de transporte expresso do festival. Além disso, as opções variadas de alimentação, com opções vegetarianas e veganas, banheiros bem sinalizados e muitas ativações dos patrocinadores foram pontos positivos. No entanto, a distância entre o palco secundário (The One) e o principal (Skyline), além da inclinação do terreno no último, continuaram provocando críticas.

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Segundo estudo da FGV, 177 mil litros de chope e 106 mil hambúrgueres foram consumidos nos 5 dias de evento - Foto: Live Marketing News / Reprodução

Sexta-feira (12)

Jason Derulo animou o público na noite de sexta com um espetáculo cheio de energia e coreografias impactantes. Em meio a hits como “Talk Dirty”, “Wiggle” e “Want to Want Me”, o cantor mesclou pop e R&B destacando sua potência vocal, além de entregar muito carisma e sensualidade durante a apresentação.

A noite, aquecida por Derulo, ganhou clima nostálgico com os Backstreet Boys, que transformaram o palco em uma viagem ao auge dos anos 90. Ao som de clássicos como “I Want It That Way” e “As Long As You Love Me”, a plateia virou um grande coral emocionado, enquanto as coreografias reforçavam a identidade da boyband. Três décadas depois, o grupo mostrou que ainda sabe comandar multidões com carisma e sintonia.

Com novo visual, Luísa Sonza enfrentou o frio paulista com um figurino ousado e um show cheio de atitude no Palco The One. Além dos próprios sucessos que a consagraram no pop, a cantora surpreendeu ao incluir releituras de clássicos da música brasileira, indo de “Louras Geladas”, do RPM, a uma homenagem emocionante a Rita Lee com “Amor e Sexo”. A mistura de hits atuais, performances coreografadas e referências à MPB agitou a platéia.

E completando a presença de potências nacionais, Pedro Sampaio fez uma apresentação histórica para o público e para si, alegando que gastou milhões para tudo acontecer. A banda Jota Quest acalentou corações nostálgicos, e nomes em ascensão no cenário do funk e rap como Duquesa e Keyblack agitaram a platéia. 

Sábado (13)

No sábado (13), o festival reuniu diferentes gerações da música, com encontros que alternaram festa, emoção e mais nostalgia. Ivete Sangalo levou a energia de um carnaval baiano para o The Town. Colorida, divertida e sempre próxima da multidão, fez do show uma festa ao ar livre, com direito a roda de samba e participação surpresa de ritmistas que incendiaram ainda mais a apresentação. O repertório, que atravessa gerações, transformou a noite em um daqueles encontros em que ninguém consegue ficar parado.

Mais íntimo e afetivo, Lionel Richie trouxe outro clima para a noite fria da cidade da música. Quando sentou ao piano para entoar “Hello”, parecia que o festival inteiro tinha parado para ouvi-lo. A emoção foi tanta que, dois dias depois, o cantor usou as redes sociais para agradecer pelo carinho recebido em São Paulo, declarando que ainda sentia o amor do público brasileiro.

A diva Mariah Carey apostou no glamour e em seu repertório de baladas imortais. A performance, embora marcada por certa distância, encontrou momentos de brilho quando dedicou uma música ao público brasileiro, gesto que foi recebido com emoção. Hits como “Hero” e “We Belong Together” reafirmaram o status da cantora como uma das maiores vozes do pop mundial.

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Vestindo as cores do Brasil, Mariah manteve seu estilo pleno, o que não foi positivo dessa vez - Foto: Ellen Artie

O festival também abriu espaço para outras vozes marcantes. Jessie J emocionou em um show acústico intimista, feito apesar de estar em tratamento contra um câncer de mama — e que acabou sendo o único da cantora na América do Sul após o cancelamento das demais datas na América do Norte e Europa. 

Glória Groove incendiou o público com sua potência performática e visual, enquanto Criolo trouxe poesia afiada e versos de impacto, lembrando a força política do rap. MC Livinho levou o funk a outro patamar e anunciou seu novo projeto de carreira em R&B. Péricles encerrou sua participação em clima caloroso de roda de samba, onde cada espectador parecia parte de um grande encontro entre amigos.

Domingo (14)

Com Joelma, o The Town se transformou em um baile popular de cores, brilhos e danças frenéticas. A cantora revisitou sucessos da época da banda Calypso e apresentou a força de sua carreira solo, mas também abriu espaço para artistas nortistas como Dona Onete, Gaby Amarantos e Zaynara. 

O gesto deu visibilidade a uma cena muitas vezes esquecida nos grandes festivais e reforçou sua identidade como representante da cultura amazônica. Com plateia recheada, a artista mostrou que a demanda é alta.

No início da noite, em um horário um pouco melhor que sua última apresentação no Rock In Rio, Ludmilla mobilizou milhares de pessoas no palco secundário. Atravessando hits de sua carreira como “Favela Chegou”, “É Hoje” e sucessos do Numanice, entregou presença de palco e coreografias sensuais. A carioca também surpreendeu a todos com a aparição da cantora estadunidense Victória Monet para a parceria “Cam Girl”.

Sem atrasos, às 20:30, foi a vez então de Camila Cabello levar ao palco o último show da C,XOXO tour. A performance da cubana foi marcada pelo seu carisma e declarações em português como “eu te amo Brasil” e “tenho uma relação muito especial com o Brasil [...] me sinto meio brasileira”. Hits do início de sua carreira solo animaram, como “Bad Kind Of Butterflies” e “Never Be The Same”, além de quase todas as faixas do seu último álbum de 2024, que dá nome à turnê, como “HE KNOWS” e “I LUV IT”. 

A performance potente e animada, que mesclou reggaeton e eletrônica, ainda contou com o funk “Tubarão Te Amo” e uma versão acapella de “Ai Se Eu Te Pego” de Michel Teló. Seguindo, logo após “Señorita”, parceria com o seu ex-namorado, Shawn Mendes, ela cantou “Bam Bam”, brincando com a plateia que aquela canção era para se livrar das pessoas negativas. Vestindo uma camiseta do Brasil e com uma bandeira, encerrou o show de uma hora e meia com “Havana”.

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Com coreografia, grande estrutura metálica e vocais potentes, Camila entregou um show de diva pop - Foto: Taba Querino / Estadão

Para encerrar o festival, Katy Perry trouxe espetáculo em grande escala, mas não deixou faltar momentos de intimidade. A apresentação iniciada pontualmente às 23h15 teve direito a pirotecnias, muitos efeitos especiais e um discurso emocionante da cantora sobre a importância de trazer sua turnê para a América do Sul. 

Em meio a cenários lúdicos, trocas de figurino e um repertório recheado de hits, Katy Perry chamou o fã André Bitencourt ao palco para cantarem juntos “The One That Got Away”, o que levou o público ao delírio. O show integrou a turnê The Lifetimes World Tour, e deixou a impressão de que a artista fez questão de entregar em São Paulo um dos capítulos mais completos dessa jornada.

No último dia, outros públicos foram contemplados também, com o colombiano J Balvin, dono de hits como “Mi Gente”, e uma atmosfera poderosa com IZA de cleópatra ocupando o palco principal no início da tarde. Dennis DJ agitou com funk no palco The One e, completando a proposta do festival de dar espaço a todos os ritmos e artistas, Belo e a Orquestra Sinfônica Heliópolis marcaram presença no palco Quebrada. 

A cidade da música em solo paulista entregou o que prometia, grandes estruturas e um line up potente, mas ainda segue construindo sua identidade e se aperfeiçoando. A terceira edição já foi inclusive confirmada para 2027 pelo prefeito Ricardo Nunes e a vice-presidente da Rock World, Roberta Medina em coletiva na segunda-feira (15).

Cooperativa é a grande responsável por reerguer a população da Vila Nossa Senhora Aparecida após tragédia climática, reafirmando a máxima do “povo pelo povo”
por
Cecília Schwengber Leite
Laura Petroucic
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10/09/2025 - 12h

Em junho de 2025, um ano após a enchente que assolou o Rio Grande do Sul em 2024, o bairro Sarandi – um dos mais afetados de Porto Alegre – se viu novamente sob ameaça de cheias. Um intenso volume de chuvas causou alagamentos, transbordamento de dois bueiros e elevou o nível de água no dique do bairro, preocupando os moradores traumatizados com a catástrofe do ano passado. 

Localizado na periferia da zona norte da capital gaúcha, o bairro Sarandi é um dos mais populosos e abriga algumas comunidades, chamadas pelos moradores de Vilas. Desde março deste ano, famílias em situação de desemprego ou baixa renda viviam um impasse com a prefeitura devido a necessidade de sua remoção das casas em que viviam para a reforma do dique rompido durante a enchente. Houve negociação, e as obras de reforço estão em andamento. 

Em julho de 2025, moradoras da Vila Nossa Senhora Aparecida, localizada em Sarandi, relataram a situação da comunidade e destacaram o papel significativo das cooperativas lideradas por Nelsa Nespolo para a restabilização dos seus habitantes. “Aqui foi o povo pelo povo”, afirma Leonilda Quadros, aposentada que teve a sua casa inundada durante a enchente. 

Nelsa Nespolo é diretora-presidente das cooperativas Univens e Justa Trama, referência em Economia Solidária (modelo econômico baseado na cooperação, autogestão e distribuição equitativa de lucros). Ambas as entidades, assim como o banco comunitário Justa Troca, dividem o mesmo endereço na Vila Nossa Senhora Aparecida e, durante e pós enchente, tiveram e vêm tendo papel fundamental e central na recuperação das famílias da comunidade. 

A Rede de Algodão Agroecológico Solidário Justa Trama é um projeto que envolve cinco estados brasileiros e 700 cooperados e cooperadas, entre agricultores, tecelões, artesãs e costureiras. Atualmente, é a maior cadeia produtiva brasileira de economia solidária no setor de confecção. No RS, uma parte importante deste projeto acontece na cooperativa de costureiras Univens. Nelsa destaca o papel da cooperativa no empoderamento e geração de renda para mulheres, muitas vezes já de meia idade e sem estudo. 

O banco comunitário Justa Troca faz parte da Associação de Moradores da Vila e tem como moeda social o Justo. Suas administradoras de cursos, Adriana Nunes, e financeiro, Andreia Padilha, contam que a iniciativa vem sendo fundamental para dar apoio às famílias e organizar a economia da comunidade. A iniciativa se mantém por meio de parcerias com institutos e principalmente com a UNISOL (Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários), uma Organização da Sociedade Civil, sem fins lucrativos e de abrangência nacional. 

Por meio do Justo, que é aceito em quase todo o comércio da Vila (e possui fundo garantidor), o banco fornece microcréditos para moradores iniciarem um empreendimento, ou se reerguerem após algum ocorrido – como a própria enchente, ou uma situação de desemprego. Além disso, o Justa Troca promove doações de cestas básicas compostas por alimentos da agricultura familiar e MST, iniciativas de trocas de produtos, cursos variados de formação de microempreendedores e feiras de gastronomia e artesanato, que geram renda para os vendedores formados nos cursos. 

Adriana e Andreia contam que o espaço físico onde se encontram as cooperativas está localizado na única rua da comunidade que não foi completamente inundada durante a enchente. Assim, o local concentrou as iniciativas para assistir de todas as formas possíveis a sua população, tornando-se ponto de distribuição de produtos, doações e de muito trabalho voluntário e mobilização de recursos. As 1165 famílias da comunidade cadastradas receberam marmitas, água, roupas, cestas básicas, produtos de limpeza e higiene, e posteriormente alguns móveis e até mesmo brinquedos para as crianças. 

Dados do Banco Justa Troca mostram número de famílias beneficiadas com doações.
Dados do Banco Justa Troca mostram número de famílias beneficiadas com doações. 

Em meados de agosto de 2024, o banco passou a promover cursos profissionalizantes para que os moradores da Vila retomassem suas atividades de geração de renda. Abriram grupos nas áreas de costura, gastronomia, beleza, construção civil e cuidadores de idosos. A parceria com a Instituição Gerações foi fundamental para a doação de equipamento para os participantes. Assistida pela cooperativa e aluna do curso de tricô, Leonilda Quadros destaca o trabalho intensivo e humano que salvou a comunidade durante e no pós enchente: sem essa ajuda, não sei o que teria sido de nós. 

Fachada da Cooperativa Univens em um dia de entrega de doações. Reprodução: acervo da cooperativa.
Fachada da Cooperativa Univens em um dia de entrega de doações. Reprodução: acervo da cooperativa.

Leonilda conta que, em sua rua, assim como na maioria das ruas da comunidade, o nível da água subiu a ponto de só ser possível passar de barco. A água não vinha somente do transbordamento do dique, vinha também de baixo para cima, saindo do esgoto. “Nós erguemos os móveis antes de sair, pensando que no dia seguinte voltaríamos e a água estaria batendo na canela… mas não sobrou nada”, relata a moradora, que viu a água atingir o telhado de sua casa. 

Vila Nossa Senhora Aparecida durante a enchente. Reprodução: acervo da cooperativa.
Vila Nossa Senhora Aparecida durante a enchente. Reprodução: acervo da cooperativa.

Demorou semanas até que Leonilda pudesse ao menos abrir a porta e, enquanto isso, precisou se deslocar para diversas casas de parentes. “Era desesperador… quando pensávamos que a água ia baixar, subia de novo”, relembra. Quando foi possível acessar sua casa, o cenário era pós-apocalíptico: um cheiro podre, de gente ou bicho morto, misturado com esgoto. Os móveis e utensílios estavam todos espalhados, os canos estourados. Tinham até mesmo cobras, lagartos e peixes pelos arredores. “Parecia um filme de terror”, afirma. 

Após semanas, Leonilda conseguiu voltar para casa, que ainda hoje está em reconstrução, assim como as de muitos moradores. “Quando abri a porta e vi que não tinha sobrado nada, o primeiro pensamento foi de dar meia volta, largar tudo e ir embora. Só pensava: acabou, não vou ficar aqui”. Atualmente, a Vila se vê cheia de “ruas-fantasma”, pois muita gente não voltou depois de perderem tudo. “Ninguém se preparou para a enchente, porque nunca tinha acontecido algo assim. A maioria das pessoas saiu de casa só com a roupa do corpo, e deixou tudo para trás”, comenta. 

Meses depois, ruas da Vila Nossa Senhora Aparecida ainda acumulavam entulho aguardando recolhimento. Reprodução: acervo da cooperativa.
Meses depois, ruas da Vila Nossa Senhora Aparecida ainda acumulavam entulho aguardando recolhimento. Reprodução: acervo da cooperativa. 

Entre os que seguiram morando na comunidade, a maioria carrega traumas, o que faz com entrem em pânico com as ameaças de novas cheias. Quando há chuvas prolongadas por mais de dois dias, já se iniciam movimentações desesperadas, preventivas. “Eu não consigo dormir a noite quando começa a cair muita água, já corro para a janela ver como está a rua”, relata Leonilda. 

O descaso da prefeitura com o bairro Sarandi em relação a Orla (que atrai turismo e investimento empresarial), rapidamente reconstruída após a enchente, é notório. Levou meses para que o poder público da capital gaúcha mobilizasse o recolhimento dos entulhos, realizasse as reformas necessárias e as limpezas pesadas. Para isso, foi preciso um levante popular no bairro, do qual moradores da Vila Nossa Senhora Aparecida participaram, exigindo dignidade. O curioso é que, apesar disso, o então prefeito Sebastião Melo (MDB) foi reeleito em 2024 com forte base eleitoral em Sarandi, segundo dados do TSE. 

Moradores protestam pela limpeza da Vila Nossa Senhora Aparecida. Reprodução: acervo da cooperativa.
Moradores protestam pela limpeza da Vila Nossa Senhora Aparecida. Reprodução: acervo da cooperativa. 

Apesar da tragédia sem precedentes, muitos danos à população poderiam – e deveriam – ter sido evitados com um programa de investimento em prevenção de enchentes, que foi gradualmente negligenciado pela prefeitura da capital durante o primeiro mandato de Sebastião Melo. Segundo dados do Portal da Transparência de Porto Alegre, em 2023 o dinheiro em caixa do departamento responsável era de R$ 428,9 milhões. Entretanto, não houve recursos destinados à melhoria no sistema contra cheias. Mesmo em um contexto de crise climática, a queda no investimento da prefeitura na prevenção de enchentes foi gritante: em 2021, a verba era de R$ 1,7 milhão. Já em 2022, caiu para apenas R$ 141 mil até que, em 2023, o orçamento foi nulo. 

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No meio da avenida mais movimentada do país, há arte e cultura espalhadas pela avenida Paulista
por |
02/06/2024 - 12h

Todo domingo na Avenida Paulista, o destino mais comum para aqueles que querem espairecer do caos do dia a dia paulistano, podemos desfrutar de diversas culturas e entretenimentos. Espalhados pelas ruas ou calçadas, encontramos "gente que faz trabalho de gente". Pessoas que colocam seu dom, seja vocal, corporal ou manual, em exposição à céu aberto e nos dá a honra de prestigiar.

 

Av. Paulista
Dia de domingo na Avenida Paulista, São Paulo | Foto: Beatriz Alencar


As ruas que diariamente são cheias de carros, ônibus, trânsito e fumaça, dão mais cor aos diversos tipos de cultura. Em meio a tantas barracas, encontramos a de Vitor Amra. Ele vende placas pirografadas e além disso, também é tatuador. A arte da pirografia, basicamente é um modo de desenho sob uma madeira, que utiliza uma ponta de metal aquecido para gravar a peça. Para saber mais um pouco desse processo e de como é trabalhar na avenida mais movimentada do país, acesse o vídeo abaixo. "É o trabalho e um pouquinho de festa ao mesmo tempo", de acordo com o Vitor. Venha conferir nesta cobertura no Instagram! 

 

 

 

Evento reúne entidades e trabalhadores em São Paulo para celebrar a solidariedade e conscientização sobre segurança no trabalho
por
Geovana Bosak
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01/05/2024 - 12h

No dia 28 de abril, a Praça Memorial Vladimir Herzog recebeu o evento "Todo mundo tem que falar, cantar e comer!", que acontece todo último domingo de cada mês. Dessa vez, o encontro "Ato e Canto pela Vida" reuniu diversas entidades, trabalhadores de diversas centrais sindicais em um ato unificado em memória às vítimas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, em homenagem ao dia mundial dessa causa. O encontro foi resultado de uma articulação significativa envolvendo 45 entidades, desde sindicatos até órgãos governamentais e organizações da sociedade civil. Entre elas estavam centros acadêmicos, federações, centrais sindicais, Ministério do Trabalho e Emprego, Fundacentro, Dieese, entre outras.

A reunião aconteceu a céu aberto, ao lado da Câmara Municipal de São Paulo, livre para todos que quisessem participar. O espaço estava decorado com faixas e cartazes trazidos pelas organizações e sindicatos, com mensagens e reivindicações de distintas origens. 

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Evento "Ato e Canto pela Vida", em praça pública.
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Pessoas reunidas em ato em memória às vítimas de acidentes de trabalho, na "Escadaria da Liberdade".
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Interação e integração entre trabalhadores, organizadores e participantes.
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Entrevistas para a cobertura do evento, realizada pelo Canal da Praça.

A celebração iniciou às 11 horas, com o encontro e reencontro dos participantes, familiares e entidades. Em seguida, o grupo "Inimigos do Batente", comandado pelo cantor Paulinho Timor, apresentou em uma roda de samba músicas ao vivo que representam o trabalhador. Além das discussões, interações e música, o evento também contou com um almoço no sistema "quem pode, paga, quem não pode, come", servindo o prato Baião de dois, preparado pelos "Cozinheiros da Liberdade". 

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"Cozinheiros da Liberdade" e pessoas se servindo no sistema "quem pode, paga, quem não pode, come"
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Por último, a artista plástica Laura Andreato conduziu uma intervenção artística coletiva, "A árvore da vida". A intervenção foi feita em uma lona, instalada próxima à Banca Livraria dos Jornalistas. Os participantes foram convidados a deixarem suas marcas carimbando suas mãos na lona, dando uma ideia de "folhas", criando assim uma imponente copa, simbolizando o compromisso com a vida e a solidariedade com as vítimas de acidentes de trabalho.

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Artista Laura Andreato pintando o tronco da "Árvore da vida".

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Para Danilo Zelic, estudante de Jornalismo, o evento foi especial. "É a primeira vez que eu vejo a praça super cheia. Por conta dessa articulação entre entidades e organizações, o evento foi grande. Comemorar esse ato do dia 28 lá na praça, que é um espaço público e unindo todas as centrais sindicais para um único propósito, é muito simbólico. O samba deu uma animada. O roteiro de músicas foi super importante porque reuniu sambas ligados ao trabalho e ao trabalhador, importante pensar isso. Fiquei bem feliz de ver o desenrolar do evento", comenta Danilo.

O “Todo mundo tem que falar, cantar e comer!” é uma realização do Instituto Elifas Andreato com apoio de Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP), Associação dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos de São Paulo, Banca Livraria dos Jornalistas Vladimir Herzog, Canal da Praça, Coletivo Café Sem Pauta, Coletivo Paulo Freire, Colibri & Associados Comunicações, FotosPúblicas.com, Instituto Paulo Freire, Instituto Premier, Instituto Vladimir Herzog, OBORÉ e Câmara Municipal de São Paulo. A Praça Memorial Vladimir Herzog – Espaço Cultural a Céu Aberto Elifas Andreato fica na rua Santo Antônio, 33-139, no bairro de Bela Vista, São Paulo. Para saber mais sobre o evento, assista o vídeo feito por José Mota, do Coletivo Paulo Freire Zona Norte, disponível no Canal da Praça.

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Trabalhadores, organizadores e participantes na "Escadaria da Liberdade", na Praça Vladimir Herzog

 

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Avenida Paulista: mais de 90 mil carros todos os dias. Domingos, sem o cinza da fumaça, pode ser admirada com olhos coloridos!
por
Beatriz Alencar
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08/05/2024 - 12h

 Na megalópole que conhecemos como São Paulo capital, não temos somente trânsito parado, buzinas a todo momento e ternos desfilando nas calçadas e faixa de pedestres. 

 Na Avenida Paulista, lugar onde se mais frequentam meios de transporte e abrigam maior parte dos prédios comerciais da cidade que fazem um peso na taxa da economia do país, também podemos ver arte, cor e diversidade. Se a arte é definida como uma maneira de ser ou de agir, aqui encontramos desde adultos voltando à infância, a crianças sem medo e preocupação com a finitude da vida.

A intenção em fotografar a paulista foi registrar, em poucos retratos que, quando ampliados ou ao menos ganhando mais de um minuto de atenção, consegue descrever o que a própria capital é e nos proporciona: uma pluralidade de povo, cultura e dons. E porque não, admirar um lado "romantizado" da vida? Arte é sentimento. Não um só. Mas pode ser resumida em amor. Então, afinal, podemos colocar que "existe amor em SP".

 

 

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A infância não devia acabar; a idade vem, mas antes brinca de tudo o que quer ser. E porque não continuar assim quando for grande? Um homem adulto formando uma enorme bolha de sabão brilhando com o sol, mas captura o reflexo da vida que é planejada para muitos: os prédios comerciais da grande São Paulo.
​​​​​​Foto: Beatriz Alencar
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Sem medos bestas: sendo feliz com coisas tão pequenas | Foto: Beatriz Alencar
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Sons que evocam a comunhão com a natureza; um chamar para o despertar. Da realidade, do preconceito, do processo da arte ancestral que vive | Foto: Beatriz Alencar
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Entre o antigo e o moderno, relíquias e cacarecos; toda a sorte de quem os guardou mas também a quem os comprou. Novos admiradores, novos donos, novas histórias, novos relíquias | Foto: Beatriz Alencar
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As ruas que abrigam veículos fumacentos todos os dias a todo momento, abre alas para que o povo, sua curiosidade e seu lazer tomem conta; novo cenário: seres humanos no lugar das máquinas de transporte
Foto: Beatriz Alencar 
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Confecção, concentração e admiração: a criação ainda nas mãos de seu autor | Foto: Beatriz Alencar
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Antigamente a areia era alojada dentro de ampulhetas para marcar o tempo toda vez que era colocada de cabeça para baixo. Agora, está disposta em diferentes formas e cores, não para que marque o tempo. Como reinventado, utiliza-se das horas que antes marcada, para formar arte | Foto: Beatriz Alencar
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Existem boas ilusões? Apesar de todos termos uma em particular, ver a mágica ainda nos provoca a sensação de mistério. Com apenas uma mão falsa e um martelo, o artista cria um universo de fantasia | Foto: Beatriz Alencar
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Coreografadas ou não, a expressão artística do corpo vai para além da saúde física, é uma forma de divertimento para o coração | Foto: Beatriz Alencar
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Pausas sem movimento, controle sobre o corpo: em meio a tantos deslocamentos, não lhe é preciso palavras para criar diversas emoções em seu veste branco como a paz | Foto: Beatriz Alencar
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Discos em telas. Música em forma visual. Partituras que tocam no cérebro ao remeter a imagem do artista no que seria o responsável por tocá-las | Foto: Beatriz Alencar
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Não necessita de presença em grandes palcos para aclamar. Pela rua, o "Porquinho da Paulista", Jonathan Oliveira, canta transformando o caos em musical | Foto: Beatriz Alencar 

 

Qualidade da água do rio continua muito ruim, mas margens recuperadas já trazem benefícios para a população
por
Lucas Gomes
Matheus Marcolino
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21/11/2023 - 12h

Por Lucas Gomes (texto) e Matheus Marcolino (audiovisual)

 

Jhonatan Barbosa cresceu e passou grande parte de sua vida adulta em Cidade Tiradentes, extremo da Zona Leste de São Paulo. O dia a dia na periferia não era fácil. Ele começou a trabalhar aos 14, em buffets nas festas dos ricos do centro da capital. Já que a rotina de horas e horas dentro do transporte público era extremamente desgastante, sonhava em viver em um grande centro. E esse sonho é antigo: quando criança, nos anos 1990, sua mãe costumava levá-lo a um consultório médico na avenida Paulista. No caminho, passavam por hospitais e grandes monumentos da cidade, além da Marginal Pinheiros, que margeia o rio. Ele via os prédios na região da Vila Olímpia com espanto. Parecia uma outra realidade. 

Em 2019, Jhonatan conheceu sua atual esposa. Na época, ela morava numa kitnet em Santo Amaro, Zona Sul da capital. Com o início da pandemia, em 2020, ele decidiu se mudar para lá. O sul oferecia a Jhonatan o que o leste não tinha: além de conseguir morar perto do trabalho, agora ele e a companheira tinham opções de lazer, como as margens do Rio Pinheiros, que vive um processo de despoluição há quatro anos. Inaugurou-se um programa de casal: andar de bicicleta, caminhar, ou até mesmo fazer yoga no recém-inaugurado Parque Bruno Covas. Criou-se uma relação com um rio que estava morto.

O Rio Pinheiros sempre fez parte da história de São Paulo. Ele foi navegável até o início do século passado, quando o interesse do setor energético impulsionou uma mudança: o curso do Pinheiros mudou, e o rio passou a correr em direção à represa Billings, construída para servir como um reservatório para geração de energia hidrelétrica. Nos quase 100 anos que se passaram desde então, o Pinheiros foi um dos rios mais violentados pela população e pelo poder público, e se tornou sinônimo de sujeira, mau cheiro e descaso.

Em 2019, João Dória, então governador do Estado de São Paulo, fez uma promessa bastante ambiciosa: despoluir o Rio Pinheiros até o fim de 2022. O programa “Novo Rio Pinheiros” previa o investimento de mais de R$ 1,5 bilhão, que focaria no tratamento de esgoto para impedir que lixo e dejetos continuassem chegando ao rio. 

O mapeamento “Observando os Rios”, da ONG SOS Mata Atlântica, acompanha a situação do Rio Pinheiros e dá uma nota para a qualidade da água em três pontos de medição: Ponte João Dias, Ponte do Jaguaré e Ponte da Cidade Jardim. Desde o início do monitoramento mensal, em agosto de 2021, somente em duas vezes os pontos de medição não receberam a nota mínima (péssimo): em outubro de 2021, João Dias recebeu nota “ruim”, sendo o mesmo caso da Ponte Cidade Jardim, em janeiro deste ano. 

César Pegoraro, biólogo e integrante da Equipe de Água da SOS Mata Atlântica, conta que, passados quatro anos desde o início do programa Novo Rio Pinheiros, os avanços são inegáveis, mas a situação segue calamitosa. Foram registradas 650 mil ligações de domicílios à rede de esgoto, diminuiu-se a carga orgânica do rio, mas o estado da água do Pinheiros ainda é horrível. “A gente ressuscitou um rio e conseguiu devolver esse rio à UTI. Ele não é um rio saudável”, explica.  Na visão de César, João Dória cometeu um erro ao estipular uma data de entrega, já que a natureza tem um tempo próprio - e, às vezes, resultados concretos podem demorar a chegar.

A principal métrica usada no mundo para medir a limpeza de um rio é a de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio). Ela determina quanto oxigênio é consumido em cada litro de água por causa da poluição. Em 2022, a gestão Dória afirmou que a meta estava sendo cumprida. “Dos 13 pontos de monitoramento do rio, 11 já apresentaram o chamado DBO abaixo de 30 mg/L, quantidade mínima para que a água não tenha odor, melhore a turbidez e permita vida aquática”, relata, em nota, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (SEMIL) do Governo do Estado de SP. 

José Carlos Mierzwa, chefe do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica (POLI) da USP, conta que um DBO de 30 mg/L não é o ideal para um rio vivo. Segundo ele, para que haja vida aquática é necessário um DBO na faixa dos 5 mg/L. O projeto de despoluição é coordenado pela SEMIL-SP e conta com participações da Sabesp e da Cetesb. 

Os órgãos e empresas citadas foram procurados, mas não responderam até o fechamento da reportagem. 

O CHEIRO 

Jhonatan conta que sentiu uma melhora no odor vindo do rio Pinheiros durante os últimos anos. O cheiro não incomoda seu trajeto para o trabalho ou quando ele sai com sua companheira para caminhar no Parque Bruno Covas, por exemplo. Na estação Cidade Universitária, da Linha 9-Esmeralda, porém, a história é outra: um odor forte de esgoto é notado pelos usuários do transporte público. A estudante Ana Carolina diz que o cheiro se intensifica em dias de chuva ou de calor, que estão se tornando cada vez mais comuns na capital.

Pegoraro explica que as diferenças entre os diferentes pontos do rio se dão pelos muitos afluentes do Pinheiros e do processo de saneamento nas regiões atendidas por eles. Enquanto nos arredores do Parque Bruno Covas o rio é mais verde e o tratamento de esgoto é localizado e avançado, regiões como a da estação Cidade Universitária ou do Parque Villa-Lobos sofrem para tratar grandes quantidades de esgoto. Os rios Pirajussara e Jaguaré, principais afluentes dessas localidades, ainda têm uma carga orgânica maior - o que acaba deixando o cheiro mais forte.

A IMPORTÂNCIA DO RIO

Um rio vivo impacta a comunidade de seu entorno de muitas formas, mas duas são as mais destacáveis. O primeiro - e mais imediato - aspecto é o da oferta de lazer. O Rio Pinheiros, por exemplo, teve suas margens revitalizadas, e pessoas como Jhonatan e outros moradores da Zona Sul ganharam uma nova opção de convívio com a família, amigos e natureza, mesmo que nem todo ambiente esteja próprio para isso. A despoluição de rios é uma boa oportunidade para o setor de turismo, e o caso do Rio Sena, na Europa, chama atenção: antes tido como “morto”, o canal francês agora é favorito a receber competições de natação nas Olimpíadas de Paris, em 2024.
 

O segundo aspecto impactado por um rio vivo é a saúde física e mental da população. A baixa qualidade da água dos rios vem, principalmente, do mau tratamento de esgoto - que afeta especialmente os mais pobres. Um relatório da OMS, divulgado em 2013, apontou que cada dólar investido em saneamento gera 4,3 dólares de economia na saúde global. “Saneamento é qualidade de vida e saúde pública”, afirma José Carlos Mierzwa, que acredita que o investimento do poder público nesse sentido é extremamente necessário.

A saúde mental também não fica para trás. Publicado em 2010, um estudo da Universidade de Chiba (JAP) aponta que a convivência com áreas verdes reduz o estresse e a pressão arterial. “Teríamos muito mais saúde se tivéssemos rios mais limpos. (...) Ajudariam muito a melhorar a saúde mental das pessoas e a diminuir a violência urbana”, aponta Pegoraro. 

Apesar dos avanços tímidos nos quatro anos do Novo Rio Pinheiros, o poder público e a sociedade civil devem continuar engajados no processo de recuperação do rio. Assim, quem sabe, o próximo passo pode ser tirar o Pinheiros da UTI.
 

Mesmo aos domingos, a operação do metrô de São Paulo não para
por
Julia Barbosa
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13/11/2023 - 12h

Na correria do dia-a-dia ou envoltos por uma multidão que domina o metrô de São Paulo nos horários de pico, não é comum prestar atenção nos funcionários e nas figuras que movem a cidade. Possivelmente são essas algumas das pessoas que fazem acontecer seu deslocamento até o trabalho, faculdade, de volta pra casa ou pro passeio do final de semana.

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Motorista na linha-2 verde do metrô. Foto: Julia Barbosa

 

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Motorista do metrô em São Paulo. Foto: Julia Barbosa
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Bilheteria em um domingo de fluxo tranquilo. Foto: Julia Barbosa
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Parte de trás, sem condutor. Foto: Julia Barbosa
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Metrô chegando na estação das Clínicas. Foto: Julia Barbosa
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Condutor da linha-2 verde do metrô. Foto: Julia Barbosa
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Vagões indo em direção a estação Vila Prudente. Foto: Julia Barbosa