A pandemia ainda nos mantinha confinados quando me pego ao abrir e fechar de páginas da internet. Os buscadores de imagens, como verdadeiros garçons, me serviam com fotos datadas da década de 70.
Embora não tenha vivido nenhum daqueles anos, não preciso lembrar o quão amargurada foi a política dessa época. A ditadura aqui instaurada apenas retocou na bandeira brasileira algo que já lhe havia sido concedido em tempos passados: a tristeza, atrelada à vergonha, e que contrastava com a expectativa de que tudo melhoraria.
Como uma metáfora de esperança, que provavelmente era fruto de mera coincidência, um reduto de cores podia ser visto em fotografias capturadas ao contorno do Calçadão de Copacabana. Fuscas das mais diferentes tonalidades faziam dali um estacionamento a céu aberto. As crias da engenharia encaravam o mar ao fundo, viam as “Garotas de Copacabana” desfilarem na areia da praia. Tão diferente de Brasília! Triste! Escura! Sob uma constante tempestade que, hoje perguntaria facilmente a um meteorologista, se, de fato, há de ter cessado.
Mas no Rio...Ah, no Rio! Havia espaço para o verde que moldava o Corcovado. Lá no alto, o azul e verde excessivos enchiam as janelas dos aviões que seguiam seus trilhos invisíveis rumo ao Galeão. Recepcionados de braços abertos pelo Cristo, não tardaria para que uma leva de gente trouxesse ao concreto carioca novas cores, cabelos e risadas.
Sendo assim, se tratando de cores, o Rio entende bem, contrapondo tons claros e escuros ao longo de seu território. Quem não se lembrará do preto ocasionado pela doença miserável? Ou do amarelo que passa como bala aos ares dos morros cariocas lhes conferindo o vermelho “cor de sangue”?
Mas, voltemos ao Rio cujas praias esbanjam cores, pés que sambam durante 365 dias, e televisões antenadas no Maracanã. O Rio de Janeiro, diziam eles, é alegria. É beleza, Pão de Açúcar, mulheres bonitas, carnaval. É uma aquarela. O resto? Que resto?
Se você é brasileiro, é praticamente impossível nunca ter escutado o nome do ícone Paulo Gustavo. Seja nas telas como Dona Hermínia no sucesso “Minha mãe é uma peça” - que rendeu três edições - ou em jornais e matérias que traziam o nome de um dos mais famosos humoristas brasileiros.
Na noite de segunda-feira (03/05), foi declarada a morte do ator, aos 42 anos, que estava internado desde o dia 13 março no Rio de Janeiro por complicações geradas devido ao vírus da COVID-19. Mas o que essa notícia tão triste e que abalou o Brasil, que está sob um momento de absoluta calamidade - representa?
A morte de Paulo Gustavo, marca o fim precoce e abrupto de uma carreira estelar, com poucos paralelos no nosso showbiz. Em pouco mais de 15 anos, o ator saiu do anonimato para o posto de maior chamariz de público do cinema brasileiro. A trilogia "Minha Mãe É uma Peça", estrelada por seu alter ego Dona Hermínia, vendeu cerca de 22 milhões de ingressos. O terceiro longa ostenta atualmente o título de maior bilheteria de filme nacional de todos os tempos, com uma renda bruta de R$143,9 milhões.
A notícia triste e inesperada para muitos ferveu nas redes sociais: só se fala de Paulo Gustavo, mas pouco se vê falando notícias esperançosas e positivas sobre o coronavírus; e muito se vê de “pequenas reuniões de amigos”, festas clandestinas e viagens incríveis. Este comportamento - recorrente nas redes - infelizmente nos incita a pensar o óbvio: as pessoas só passam a realmente ligar e se abalar com a pandemia quando os números viram pessoas; sejam próximas, conhecidas ou até idolatradas.
São mais de 400 mil mortes no Brasil, mas ninguém deu a mínima para o número espantoso. Paulo Gustavo faleceu e nas redes sociais havia milhares de pessoas fazendo “homenagem” à grande pessoa que ele era, mas não se lembraram que à mais de 2375 mortes por dia. Os fãs de Paulo Gustavo se comoveram com a notícia principalmente por ser tão inesperada; como é o caso de Gabriela, estudante de letras da PUC, que em entrevista realizada dois dias após a morte do ator afirma que "(...) mesmo com o estado dele se agravando e o tempo de UTI aumentando, eu nunca acreditei na possibilidade de que ele pudesse realmente morrer, isso parecia muito distante e abstrato".
Quando questionada sobre o motivo da morte do humorista, a resposta da estudante foi crucial. Em poucas palavras, Gabriela conta que o destino de Paulo Gustavo é apenas um retrato do que está de fato acontecendo na sociedade, e ainda comenta que inclusive, se ele não fosse quem ele é, teria partido ainda mais precocemente (...) mas não precisaríamos estar passando por isso ainda" e ainda completa: "quem de fato o matou não foi o vírus, foi a irresponsabilidade, negligência e desgoverno que o Brasil enfrenta hoje".
De fato, isso nos leva a pensar que a comoção que circunda o país desde esta segunda feira irá comover a população, e consequentemente, vão acabar se responsabilizando mais e tomando mais cuidado. Mas não é isso que futura profissional de letras conta, ao ser questionada a respeito do que se sucede a partir de agora, a estudante afirma: "(...) apenas comoção não vai ser o suficiente. O Brasil inteiro sentiu a morte de Paulo Gustavo e vai ainda sentir por muito tempo, mas o problema que estamos enfrentando hoje no país ultrapassa isso. Talvez agora se comovam mais com o número de mortes, mas não acredito que essa comoção trará reflexos diretos, como a redução de casos, por exemplo".
O recado que fica, é claro: se possível não saia de casa, e caso for necessário, tome todos os cuidados, use máscara e álcool em gel, não corra o risco de se contaminar. Podemos afirmar que a nossa saúde é o nosso bem mais precioso, nem o dinheiro compra a saúde.
Com a morte de Paulo Gustavo, fica o ensinamento para todo o Brasil, de que o Coronavírus não escolhe sexo, idade, classe social. Ele é um vírus letal. Com mais de um ano de pandemia, chegou a hora de respeitar e levar a sério as medidas restritivas. Paulo Gustavo com certeza marcou a história de nosso país para sempre. Deixou um legado que serviu de representação de vida para muitas famílias brasileiras, de um modo único e bem humorado.
Ele foi um símbolo de representatividade para a comunidade lgbtqia +, com os filmes “Minha mãe é uma peça”, ele conseguiu reunir o Brasil todo para ver um casamento entre dois homens de uma forma emocionante e engraçada.
Ele será eternizado, e com certeza mudou a vida de muitas pessoas, Paulo era amor, generosidade e humor. Um dos maiores artistas que tivemos a honra de ter. Portanto, se cuide. Cuide de quem você ama, da sua família e amigos. Cuide do próximo. Juntos somos mais fortes. Vamos passar por tudo isso de uma forma responsável e consciente.