Documentário I’m Not a Robot instiga o telespectador a refletir sobre a evolução das máquinas
por
Vítor Nhoatto
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08/04/2025 - 12h

Não sou um robô, uma etapa de checagem comum ao navegar na internet e uma sentença obviamente verdadeira, ou talvez não. O curta-metragem de co-produção holandesa e belga de mesmo nome, problematiza o chamado teste Captcha, quando a protagonista Lara (Ellen Parren, produtora musical, entra em uma crise existencial ao não conseguir provar sua humanidade.

Logo de cara o enredo de Victoria Warmerdam, também diretora da obra,  pode parecer apenas cômico, e a interpretação de Parren colabora para essa atmosfera. Os diálogos curtos e a indignação diante de uma suposta certeza de Lara prendem a atenção do telespectador ao fazer com que haja identificação com a situação. Provavelmente todos nós já erramos um destes testes simples em algum momento.

A história com pouco mais de 20 minutos continua com a indicação que a personagem tem a chance de ser 87% um robô, segundo um quiz online, e a essência incômoda da ficção científica começa a reluzir. Conversas entre humano e máquina existem há cerca de 60 anos, com a criação do chatbot Eliza, e com o avançar dos anos é cada vez mais comum, de fato.

Seja aquele número para marcar consultas ou o serviço de atendimento ao cliente das operadoras, a Inteligência Artificial rodeia as esferas da vida cotidiana e vem evoluindo rapidamente. Tome como exemplo o robô humanoide que já foi capa de revista e é considerada cidadã saudita, Sophia, da Hanson Robotics desenvolvido em 2015. Ou ainda os influencers virtuais com milhões de seguidores do Instagram hoje como a carismática Lu da empresa de varejo brasileira, Magazine Luiza.

Robô Sophia
Sophia foi inclusive ao Talk Show do apresentador norte-americano Jimmy Fallon - Foto: Hanson Robotics / Divulgação

Parece que a barreira entre o físico e digital, natural e artificial vem sendo quebrada, como aborda a obra de Margareth Boarini, “Dos humanos aos humanos digitais e os não humanos”, lançada em julho do ano passado pela editora Estação das Letras e Cores. O primeiro livro da doutora em tecnologias da inteligência e mestre em comunicação se aprofunda nesses casos de coexistência entre robôs e pessoas, porém, até onde se sabe as diferenças entre máquinas e humanos são perceptíveis, ainda. 

Mas como uma boa teoria de ficção científica, o documentário explora justamente um possível futuro da humanidade, em que máquinas e humanos serão indistinguíveis, A saga de Lara por respostas acaba com a revelação de que Daniël (Henry van Loon), marido da personagem, a encomendou sob medida há alguns anos, como se faz com uma roupa hoje.

Suas memórias, sentimentos e até mesmo relações com outras pessoas, ou robôs, são todas fabricadas, como uma versão muito mais avançada do robô Sophia. A comédia permeia a narrativa um tanto quanto impensável aos olhos de hoje, mas curiosa. A seriedade da executiva da empresa que fabricou Lara, Pam (Thekla Reuten) cria uma atmosfera cômica ao assunto, completada pela tranquilidade que Daniël fala sobre sua “aquisição”.

Parren entrega uma atuação que transborda indignação, e o trabalho cinematográfico é inteligente, com cortes que acompanham a visão de Lara. Sobre o ambiente que o filme se passa, todas as gravações foram no CBR Building em Bruxelas, e a ambientação feita com cores vibrantes e apenas carros de época no estacionamento propõe um contraste entre antigo e moderno, frio e robótico, quente e humano. 

O desfecho se dá com o desejo da protagonista de ser dona do próprio destino, relegando o fato de não poder morrer antes de seu “dono”. Isso pode ser visto talvez como uma negação em aceitar a única coisa que a diferencia de um humano, ou como uma mensagem da autora da obra sobre uma rebelião das máquinas.

Fato é que Lara se joga do topo do prédio, em um take muito inteligente por parte da direção ao filmar de cima, e que apesar de pesado e grotesco consegue ser engraçado e não desagradável aos olhos. Tal qual uma morte comum, há muito sangue saindo do corpo, as necessidades fisiológicas também são como de humanos, mas após alguns instantes a robô volta à vida.

Lara e Daniel em um Volkswagen Fusca azul
Com cinematografia cativante e enredo inesperado, é um Sci-Fi cômico e dramático - Foto: Indie Shorts Mag / Reprodução

Incômodo e perspicaz são boas palavras para definir a quinta produção de Warmerdam, que a fez faturar uma série de prêmios internacionais incluindo o Oscar de Melhor Curta-metragem deste ano. Sua produção também se destaca por ser carbono neutro, com o plantio de uma agrofloresta na Holanda para compensar as emissões de gás carbônico (CO2) da obra.

I’m Not a Robot está disponível de forma gratuita no YouTube desde o dia 15 de novembro de 2025 no canal The New Yorker, com legendas apenas em inglês ou holandês. Mesmo com essa barreira linguística, o choque final é inevitável, e a reflexão provavelmente também, se o seu cérebro não estiver se perguntando se você pode ser também um robô.

Cientistas brasileiros deixam o País em busca de melhores oportunidades no mercado científico
por
Brenda Martins
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19/11/2024 - 12h

Por Brenda Costa Martins

 

Enquanto nossos melhores pesquisadores são acolhidos por laboratórios estrangeiros e embarcam em direção aos países que valorizam a academia e a ciência, ficamos à margem das grandes inovações e descobertas científicas, como espectadores de um progresso que poderíamos estar liderando. A formação de cientistas no Brasil enfrenta uma crise profunda, marcada não por apenas dificuldades estruturais como a escassez de equipamentos em Universidades e laboratórios, mas também pela falta de incentivo à estudantes para que sigam na área acadêmica de pesquisas, além das oportunidades limitadas desse marcado no país. Nos últimos anos, temos assistido a uma crescente “fuga de cérebros” — fenômeno em que profissionais qualificados, principalmente cientistas e pesquisadores, optam por desenvolver suas carreiras no exterior, sendo atraídos por melhores condições de trabalho e valorização profissional. Fuga que tem sido alimentada pela escassez de investimentos no campo da ciência e da tecnologia no país.

Desde 2015, cortes orçamentários intensos afetaram diretamente a manutenção de bolsas de estudo, o financiamento de projetos de pesquisa, bem como a continuidade de programas de pós-graduação em diversas áreas. Com menos verbas, muitos laboratórios foram fechados e projetos interrompidos, situação que acabou por criar um ambiente de insegurança e instabilidade para jovens pesquisadores que desejam contribuir com o avanço científico no país.

Nos centros de excelência, como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e a Universidade Federal do ABC (UFABC) doutores e mestres formados com alto nível de competência se deparam com um mercado de trabalho retraído. Apesar de contar com instituições de ensino que formam profissionais altamente capacitados, os cortes e as limitações severas no mercado de trabalho continua a fazer com que esses cérebros embarquem para o exterior buscando oportunidades de maior rentabilidade e visibilidade pois para muitos desses cientistas, o ambiente brasileiro se mostra inviável para o desenvolvimento de suas carreiras.  Mesmo entre os profissionais que conseguem uma colocação, as condições de trabalho são frequentemente limitadas, com infraestrutura insuficiente e salários que não condizem com o nível de formação e as exigências da carreira científica.

Esse êxodo de cientistas gera impactos econômicos e sociais observados em longo prazo. Ao investir na formação desses profissionais e, em seguida, vê-los partir para outros países, o Brasil perde o retorno desse investimento, bem como a possibilidade de desenvolver inovações e avanços tecnológicos que poderiam impulsionar setores como saúde, agronegócio e tecnologia. Fato que evidencia outro problema: Não é preciso investir apenas na educação básica e incentivo aos jovens cientista se, no futuro, eles não terão um lugar nas grandes corporações, já que as poucas que existem no país continuam não oferecendo benefícios tão competitivos quantos os de vagas alocadas no exterior, sedes dessas empresas.

Para cientistas como Paula Rezende, doutora em Biomedicina, a decisão de deixar o Brasil é dolorosa, mas necessária. Após anos lidando com infraestrutura insuficiente e atrasos em recursos para pesquisa, ela aceitou uma proposta de trabalho na Alemanha, onde encontrou o ambiente ideal para continuar seu trabalho. Casos como o de Paula são cada vez mais comuns, o que ilustra como o cenário nacional tem se tornado um impeditivo para o progresso da ciência e da carreira dos profissionais brasileiros. A falta de oportunidades no Brasil também gera uma lacuna na academia e nas universidades, onde a quantidade de concursos e oportunidades para docentes e pesquisadores é insuficiente para absorver os doutores formados a cada ano. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que cerca de 25% dos doutores no Brasil ficam fora do mercado de trabalho adequado à sua formação, o que leva muitos a buscar alternativas no exterior, onde há mais estabilidade e reconhecimento.

Elisabeth Balbachevsky, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e coordenadora científica do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP, tem outra visão. A professora tenta analisar um lado positivo desse fenômeno da "fuga de cérebros", as mentes que vão embora do Brasil buscando melhores oportunidades podem "se inserir em redes de pesquisa internacionais, o que poderá ter um impacto extremamente positivo, porque irão se tornar lideranças brasileiras e, uma vez de volta ao Brasil, trarão novas expertises e abordagens para o País", diz a pesquisadora. Uma vez que esses cientistas brasileiros conseguem cada vez mais se estabelecer nas gigantes da tecnologia, por exemplo, o país indiretamente está ganhando reconhecimento, o que pode fazer com que os olhos dessas grandes corporações se voltem ao Brasil. Ainda que a "fuga" desses pesquisadores seja prejudicial no início, com mais profissionais produzindo ciência de qualidade em um ambiente no exterior que comporta suas necessidades, podemos colher frutos no futuro. Afinal, para que grandes corporações se desenvolvam no país, é preciso ver que a população tem capacidade de produzir recursos que possibilite sua expansão.

Outro fator que importante ser destacado é a busca pelo incentivo ao empreendedorismo desses jovens cientistas. Grandes empresas como o Facebook e a Amazon surgiram de um pequeno projeto de seus fundadores enquanto ainda eram estudantes, desenvolvendo uma start-up na garagem de suas casas. É claro que, a qualidade de ensino de ciências nas Universidades americanas possibilitam que seus alunos desenvolvam o pensamento empreendedor, enquanto no Brasil, os alunos são incentivados a bucar emprego fora, em empresas já estabelecidas, fator resultado do cenário de instabilidade não apenas do mercado científico, mas também do empreendedorismo. Algumas escolas de redes particulares no país contam com matérias de empreendedorismo e educação financeira, por outro lado, escolas da rede pública e estaduais se encontram em um cenário totalmente diferente. Ainda há um grande caminho a trilhar para que o acesso à uma educação de qualidade seja uma realidade igualitária entre todos os estudantes do país.

Propostas como a criação de um fundo nacional para Ciência e Tecnologia, que garanta recursos contínuos para a pesquisa, são defendidas por entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Outra alternativa é fortalecer as parcerias entre universidades e empresas, criando oportunidades de inovação e desenvolvimento em conjunto com o setor privado, o que poderia abrir novas frentes de trabalho para cientistas dentro do Brasil.

Enquanto não houver um comprometimento estrutural e financeiro com a ciência, o Brasil permanece vulnerável à saída de seus talentos. A fuga de cérebros se torna um símbolo das dificuldades enfrentadas pela ciência brasileira, limitando o potencial de avanço científico e tecnológico do país. A valorização da ciência e o investimento em condições de trabalho são essenciais para que o Brasil não apenas forme cientistas, mas também consiga retê-los e fortalecer sua base científica para o desenvolvimento nacional e reconhecimento internacional.

Produzir orgânicos é um desafio que envolve altos custos, manejo artesanal e um compromisso com a sustentabilidade.
por
NINA JANUZZI DA GLORIA
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12/11/2024 - 12h

Por Nina J. da Glória

 

No coração de uma pequena fazenda nos arredores de São Paulo, a paisagem exibe fileiras simétricas de verduras, um campo verde que mais parece um quadro pintado com paciência e precisão. Cada folha simboliza uma promessa livre de químicos, cultivada à mão, mas também testemunha de um trabalho árduo, invisível ao consumidor final. Esse é o cotidiano de Mariana Silva, uma agricultora que decidiu, há quase uma década, abandonar a produção convencional para dedicar-se ao orgânico. No início, acreditava que seria um retorno ao básico, uma reconexão com a natureza. Mas a realidade mostrou-se mais densa e complexa do que o imaginado. O solo, como um organismo vivo, exigia constantes cuidados e uma compreensão que ia além dos métodos tradicionais. Cada semente carregava uma incerteza, e cada colheita trazia consigo os riscos de uma produtividade menor, vulnerável a pragas e intempéries. "O solo não aceita pressa", sua frase parece pairar na atmosfera ao redor das hortas, impregnada de paciência e resignação.

Nas redondezas, em outra propriedade de São Roque, Paulo Mendes compartilha a mesma visão, mas com uma trajetória que o levou ao orgânico por caminhos distintos. Ao contrário de Mariana, ele vem de uma família que cultivava com agroquímicos, mas sempre sentiu a necessidade de transformar as práticas de cultivo. Para ele, o orgânico é como um resgate da essência da terra, uma escolha que exige mais do que habilidades tradicionais. É um compromisso com o solo, com o ciclo de nutrientes e com o futuro. Paulo vê o campo como um delicado organismo, onde a compostagem e a rotação de culturas são essenciais, mas também um desafio financeiro. Cada safra se transforma em uma experiência quase artesanal, onde a eficácia do manejo natural precisa competir com a tentação das facilidades químicas. Esse processo, para ele, é como uma dança cuidadosa com a natureza, em que observar e respeitar o ritmo das estações torna-se tão vital quanto qualquer técnica de plantio.

                                                            Comunidade de pessoas que trabalham juntas na agricultura para cultivar alimentos

Para Mariana e Paulo, a colheita orgânica traz consigo um custo invisível ao olhar do consumidor. A vulnerabilidade às pragas, por exemplo, é uma preocupação constante. Sem pesticidas convencionais cada infestação é uma batalha natural que, muitas vezes, se perde. A introdução de insetos benéficos para conter pragas ou o uso de biofertilizantes representa um custo adicional, tornando a logística do manejo um quebra-cabeça financeiro. Além disso, há as certificações rigorosas exigidas para que o produto receba o selo de orgânico, que Mariana descreve como "um segundo trabalho", com visitas e inspeções que, embora necessárias, absorvem ainda mais recursos.

No centro dessa cadeia está Cláudia Ramos, proprietária de uma loja de produtos orgânicos em São Paulo. De seu ponto de vista privilegiado, ela percebe o esforço e as dificuldades de seus fornecedores, mas também o descompasso entre o preço desses produtos e a percepção dos consumidores. Em cada item das prateleiras, Cláudia vê um microcosmo de esforço e idealismo, mas, ao explicar as diferenças entre orgânico e convencional, enfrenta um público que ainda considera o orgânico um luxo. Ela afirma que cada produto é uma história de sacrifício, e explica que o custo mais alto representa a vulnerabilidade da produção orgânica, que exige cuidados permanentes e colheitas menos previsíveis.

                                                                                           Close-up de plantas verdes na estufa

A produção orgânica, então, emerge como uma complexa equação de valores, sacrifícios e riscos. Cada um dos envolvidos—do campo à prateleira—carrega uma parte dessa carga, como se fosse um ciclo contínuo de compromissos, onde o ideal e o real se encontram e se confrontam. A busca pela pureza e pelo cuidado no cultivo se mescla a um cotidiano cheio de dificuldades, e o produto final se transforma numa espécie de narrativa silenciosa sobre perseverança e dedicação ao que se acredita ser o melhor para o futuro do planeta e do ser humano.

A jornada dos entregadores não se limita ao trajeto, mas envolve obstáculos que vão da segurança no trânsito às incertezas de um dia de trabalho autônomo.
por |
12/11/2024 - 12h

Por Thais Oliveira 

 

Se antigamente era comum esperar dias ou semanas para que um pedido chegasse, hoje a demanda por rapidez e eficiência exige uma operação logística reforçada. O dia começa antes do sol nascer, com o medo e a ansiedade tomando conta de Joice Alves, mãe solteira de 50 anos que precisou se reinventar após um divórcio e o enfraquecimento das vendas em seu comércio de plantas. Seus cabelos longos e quase grisalhos carregam histórias de uma mulher forte que devido a gravidez, parou os estudos na quinta série. Tudo que aprendeu é resultado de suas vivências.

A tecnologia dominou o mundo e os seres humanos. Para Joice isso não passava de uma grande perda de tempo, até que tudo mudou em sua vida e a tecnologia virou sinônimo de estabilidade financeira e independência. Conseguir realizar uma entrega parece fácil aos olhos dos que recebem em casa. O suor do trabalho de prestadores de serviço das grandes empresas está presente em cada pacote entregue.

Os desafios começam à frente da seleção. Um aplicativo viabiliza para os entregadores os percursos disponíveis, juntamente ao valor a receber, e cada um seleciona o de sua preferência. Mas o número de prestadores é maior do que os de entregas e, às vezes é necessário passar horas olhando as atualizações no celular. Há dois meses o aparelho eletrônico, que não passava de uma ferramenta de comunicação com a família, amigos e clientes, se tornou o principal equipamento do trabalho de Joice. Foram semanas aprendendo a usar o mapa, abrir e fechar aplicativos, escrever mensagens mais rápidas e, principalmente, a contabilizar os resultados do seu novo emprego. No início de sua trajetória, Lucas, o filho mais velho, acompanhou a mãe em todos os percursos e assim, ela ganhou confiança para trabalhar sozinha. 

Desde a adolescência, Joice foi diagnosticada com TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada) e comenta que essa logística piora os sintomas diariamente. O seu conforto é o chá de camomila colhido diretamente dos vasos sobrepostos na janela do sexto andar e do calmante recomendado pela cardiologista. Ao conseguir uma corrida, agradece a Deus pela oportunidade e pula o café da manhã, colocando tudo que precisa dentro de uma bolsa térmica. De acordo com o aplicativo fornecido pela empresa, cada percurso tem a duração de 4h e 6h e os valores são correspondentes a estes horários. Explica que foi acordado entre a empresa e os prestadores de serviço que todas as entregas contariam com, no máximo, 45 pacotes e 40 paradas. 

Ao chegar no Centro de Distribuição, Joice recebe a rota com 52 paradas, 65 pacotes amarelos e o medo de não conseguir finalizar dentro do prazo estipulado. É necessário entregar todas as mercadorias para receber os valores completos, independente da chuva, dos ventos de 100km/h, dos postes desligados e das ruas escuras. Joice sai de Mauá com o seu destino traçado em um papel com nomes de pessoas desconhecidas diretamente para a cidade de São Paulo. Na travessa da Avenida Vila Ema e nas mãos Joice, o primeiro pacote foi entregue para a Renata, uma mulher simpática que desejou um bom dia para a entregadora.

Dentro do carro, o estômago de Joice espera por um alimento desde às 9h00min, porém os donos dos 50 pacotes pendentes têm prioridade na fila e as refeições ficam em segundo plano, sendo necessário seguir o caminho ingerindo apenas uma banana. A falta de hidratação e de nutrientes causa cansaço excessivo, perda de cabelo e, consequentemente, ausência de vitaminas importantes para o funcionamento do corpo. Relata, que praticava uma rotina saudável, alimentando-se bem e correndo na rua todos os dias de manhã com os seus filhos, porém precisou abrir mão do estilo de vida para arcar com os novos custos, como por exemplo o aluguel. A infraestrutura básica é uma questão: nas cidades grandes, com quilômetros percorridos entre um ponto e outro, muitas vezes não há onde parar para descansar ou usar o banheiro. A cidade se torna um palco de correria constante, onde não há tempo ou lugar para uma pausa, justifica Joice, ao informar que não consegue ingerir ao menos 200ml de água durante a jornada de trabalho. 

O futuro do setor aponta para uma integração cada vez maior entre tecnologia e logística, com inovações que prometem transformar ainda mais a experiência de compra e aproximar o e-commerce dos consumidores. Embora a constante evolução esteja dominando o cenário, não há direitos trabalhistas ou benefícios assegurados, como convênio médico ou seguro de saúde. Se houver algum acidente ou emergência, o entregador precisa arcar com os custos e lidar com as consequências sozinho. 

Dentro do aplicativo de entregas é possível saber que, dependendo do nível, o entregador terá acesso a mais pedidos, melhores comissões e suporte especializado. A grande corporação criou um sistema de níveis que funciona como uma espécie de escada, onde cada degrau alcançado representa mais oportunidades, e consequentemente, mais pressão. Estar em um nível mais alto pode significar, por exemplo, maior acesso a entregas em horários de pico ou de longa distância, que pagam melhor. Joice é prata, mas conta que demorou meses para alcançar a nomenclatura, afinal qualquer queda no desempenho pode significar uma descida de nível. Cancelamentos, avaliações ruins ou atrasos podem rebaixar o entregador, retirando seus, quase que invisíveis, benefícios. 

Joice conseguiu dois percursos no mesmo dia, isso significa que a corrida contra o tempo é primordial para finalizar o primeiro, voltar ao Centro de Distribuição e recolher as próximas encomendas. Ao sair, os clientes recebem notificações de que o produto está a caminho, causando ansiedade e desconfiança dos que aguardam em suas casas. Durante a noite as entregas são realizadas das 18h00 às 22h00 e Matheus, o filho mais novo, auxilia a mãe ligando para os clientes e entregando os pacotes enquanto ela separa os próximos. Em meio à movimentação, Matheus recebe uma mensagem de uma mulher que estava aguardando o produto há 30 minutos e precisava dormir. Era sexta-feira, 19h39min, quando os insultos começaram e mudaram a rota da família. Cada pacote recebe uma numeração de envio, o itinerário e os dados relevantes do consumidor, em consequência das mudanças Matheus e Joice aumentam a duração do percurso e os quilômetros rodados no carro. A quantidade de remessas no período da noite é majoritariamente maior, entretanto os consumidores não sentem confiança em recebê-las e, frequentemente, rejeitam a tão esperada aquisição. 

As embalagens amarelas recusadas devem atravessar a cidade e voltar à corporação até às 23h00min, horário de finalização dos serviços diários. Joice retorna com o peso da consciência de classe descendo em seus cabelos, refletindo sobre o comportamento interpessoal dos consumidores, do egoísmo e da falta de empatia. O mundo não é mais o mesmo e as pessoas estão preocupadas com as futilidades expostas nas prateleiras invisíveis dos comércios online. Não se importam se a voz que clama do lado de fora da residência está enfrentando a maior chuva do ano na cidade ou se está com um prazo apertado, o importante é aconchego e a novela das 21h00min. 

Após 15 horas, Joice finalmente chega em casa, sentindo-se cansada, fraca e estressada. O dia foi longo, repleto de entregas que exigiam rapidez, atenção e resistência. Cada pedido, cada quilômetro percorrido, parecia se arrastar em meio à chuva, ao trânsito caótico e à pressão por cumprir os prazos apertados. Como muitos entregadores, Joice não tem garantia de descanso ou segurança no trabalho, e mesmo ao chegar em casa, a sensação de que poderia ter feito mais, ou o medo de não atingir o número de entregas esperado, a acompanha. Mas para Joice, o trabalho nunca termina realmente. Ela reflete sobre o que poderia ter feito para ser mais rápida, ou se valeu a pena o esforço de correr contra o relógio. Em sua mente, os desafios que ela enfrentou ao longo do dia continuam vivos, a insegurança nas ruas, o risco de acidentes, a exaustão física e emocional. Mas amanhã, o caminho se repete, enfrentando as mesmas dificuldades em nome de um dia melhor, ou, quem sabe, uma coroa de ouro na guerra contra a logística desumana.

Os chamados cibercrimes são considerados um tipo de violência contra o idoso, e a campanha Junho Violeta busca conscientizar à população sobre a violência patrimonial
por
Alice Di Biase
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11/11/2024 - 12h

Por Alice di Biase

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a população acima de 60 anos no Brasil deve crescer em ritmo acelerado, quase triplicando até 2050. Dados como esse expõem o crescente aumento da população idosa, além de um novo perfil de envelhecimento que requer atenção especial em políticas públicas. Adriana Horvath, diretora voluntária de captação de recursos da Casa Ondina Lobo, relata que a principal queixa dos residentes da Casa é a invisibilidade, a visão estereotipada do “vovozinho” de cabelo branco e ingênuo, e adiciona que os idosos querem ser vistos como seres humanos que ainda tem muito a oferecer.

A Casa de Repouso Ondina Lobo é uma instituição de longa permanência para idosos em situação de vulnerabilidade social, o projeto é sustentado por doações filantrópicas. A missão da organização é promover o bem-estar e a integração do idoso na sociedade, por meio de atividades plurais. Ela relata que muitos dos idosos residentes da Casa já passaram por alguma violência ou situação de preconceito e atribui isso a forma como a sociedade olha os idosos, relacionando-o com a finitude da vida. E adiciona que é preciso entender que a velhice é apenas mais uma fase. Além disso, ela também cita a importância de campanhas de conscientização contra a violência ao idoso, como o Junho Violeta.

Existem vários tipos de violências direcionadas aos idosos, uma delas é a violência patrimonial. Com o avanço tecnológico, os mais velhos se tornaram mais vulneráveis para a violência patrimonial, por meio dos chamados golpes. O Disque 100, do governo federal, registrou, nos cinco primeiros meses de 2023 mais de 15 mil denúncias de violações financeiras ou materiais contra idosos; 73% a mais do que no mesmo período de 2022. Cada vez mais conectada, a terceira idade tem sido um dos principais alvos de quadrilhas especializadas em crimes cibernéticos que comprometem o patrimônio da vítima.

Ondina Lobo e Image Magica

“Mãe, mudei de número, salva esse contato aqui”, assim começa uma das formas mais comuns de fraudes financeiras contra os idosos, a foto de perfil é a mesma que o filho utiliza no seu número próprio e logo em seguida são solicitadas as transferências. Cláudia, aposentada de 66 anos relata como caiu no phishing - tipo de golpe realizado por e-mails, redes sociais e sites que utilizam uma “isca” para fazer a vítima fornecer informações pessoais. Uma loja conhecida com descontos extravagantes, a propaganda era feita por celebridades como Gisele Bündchen e a apresentadora Angélica que recomendavam a promoção. Tudo feito com inteligência artificial. O valor perdido não foi alto, como conta Claúdia, com alívio, no entanto, a sensação de ter sido enganado com facilidade pelos golpistas causa constrangimento.

O constrangimento também é um dos motivos que leva os idosos a se tornarem um alvo fácil dos golpistas. Envergonhados de demonstrar a fragilidade e, de certo modo, alimentar os estereótipos de ingenuidade que a sociedade cria em relação a faixa etária, muitos idosos não contam aos familiares a situação e deixam o ciclo de golpes se estender. Em 2024, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos já recebeu mais de 21 mil denúncias de violações deste tipo contra idosos, destes 80% dos casos são denunciados por terceiros, e não pela própria vítima.

A psicóloga e psicanalista Moema Sarmento compartilha suas perspectivas sobre a saúde mental na terceira idade, ela argumenta que a falta de respeito e os maus tratos podem levar ao isolamento e depressão, o que faz que muitos idosos que sofrem esses abusos patrimoniais não procurem ajuda, assim os casos só chegam aos familiares e autoridades quando já estão em estágios alarmantes.

Com o intuito de alterar esse cenário, a Casa Ondina Lobo em pareceria com a ONG Image Mágica, levou o Circuito Cultura e Inclusão para as mulheres da Casa. As aulas de inclusão digital e fotografia buscam conscientizar os moradores a respeito dos golpes digitais, resgate da autoestima e criar intimidade com o meio tecnológico.
 

Ondina Lobo e Image MagicaOndina Lobo e Image Magica

Como comenta Horvath, a velhice é só mais uma fase da vida que envolve atenção e deve ser aproveitada com qualidade de vida e isso envolve a liberdade de consumir a Internet com segurança.

De acordo com pesquisa promovida pela Ilumeo, o uso de assistentes virtuais cresceu 47% no Brasil durante a pandemia, vista como a nova onda do mercado de tecnologia, o produto é controverso.
por
Luiza Fernandes
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28/09/2021 - 12h

Por Luiza Fernandes

 

O primeiro assistente virtual surgiu em 2011- quando a Apple lançou a "Siri". A tecnologia foi considerada revolucionária à época.  Um software que reconhece sua voz, obedece seus comandos e permite a ativação de diversos recursos em seu aparelho celular. Desde então, esse tipo de tecnologia evoluiu muito, passando para aparelhos exclusivos: Agora não mais em celular, os assistentes virtuais migraram para as caixinhas de som, que também reconhecem a sua voz e funcionam exclusivamente por esse comando. O sucesso do modelo fez com que todas as grandes empresas de tecnologia lançassem um tipo, os mais conhecidos são: "Alexa" da Amazon, "Google Assistente" e "Microsoft Cortana".

A Amazon vem sendo pioneira em expandir os comandos que a Alexa pode realizar e hoje é possível conectá-la com: cortinas, geladeiras, ar-condicionado, lâmpadas e TV´s. Foi promovendo a facilidade de poder controlar sua casa por voz, que a empresa vendeu 50 milhões de unidades desses smart speakers no ano de 2019, um crescimento de 70%, segundo dados da Strategy Analytics. Porém, o funcionamento desses produtos é considerado contraditório por inúmeros pesquisadores da área de tecnologia. Muito se questiona sobre como é o seu funcionamento e principalmente, como eles armazenam os dados que coletam.

Em meio a febre do conceito de “Casa Inteligente”, quando uma assistente virtual pode controlar seus aparelhos domésticos, vale o questionamento de como essas tecnologias de fato funcionam. Do ponto de vista técnico, os assistentes virtuais são um conjunto de microfones, ligados a um alto-falante, que são controlados por um processador que pode enviar e receber informações da nuvem, onde esses dados são processados. Com a ajuda de algoritmos de inteligência artificial, implementados na nuvem e sempre atualizados no processador, o aparelho traz respostas rápidas.

O Google define em seu site, o serviço prestado pelo seu aparelho "Google Assistente", da seguinte forma: “É uma assistente pessoal virtual desenvolvida pela Google que pode realizar tarefas do dia a dia, como ligar para pessoas, mandar mensagens, pesquisar, e ainda conversar com o usuário”

            Já a Apple, pioneira no cenário dos assistentes por voz, define a "Siri", que ainda é presente em todos os seus aparelhos, com o seguinte slogan: “A "Siri" faz mais. Mesmo antes de você pedir.” De acordo com a empresa, a "Siri" consegue fazer tudo mais rápido, define alarmes, timers, lembretes das atividades do dia e tudo isso sem que seja preciso tocar no aparelho.

A visão destas assistentes virtuais como facilitadoras do dia a dia, como são atualmente vendidas pela publicidade, é contraposta pelo que dizem muitos pesquisadores de tecnologia. De acordo com Luã Fergus Cruz, pesquisador da área de telecomunicações e direitos digitais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e integrante da Coalizão Direitos na Rede, é preciso ficar atento ao que os aparelhos coletam durante seu funcionamento. “Eles te vendem falsas facilidades, afinal, sempre foi possível apagar a luz com o interruptor, quando na verdade o pano de fundo por trás do produto é extrair informações do usuário, eles querem obter dados que é o que dá dinheiro a longo prazo”

Dados são todos os “rastros” que deixamos quando utilizamos algum serviço de Internet, desde fazer um cadastro pessoal com RG, CPF e cartão, ou até mesmo quando utilizamos o Google. A recente Lei Geral De Proteção de Dados (LGPD), define da seguinte forma: “É considerado dado pessoal qualquer informação que permita identificar, direta ou indiretamente, uma pessoa que esteja viva”.

Se popularizou a expressão de que os “dados são o novo petróleo", como forma de dimensionar seu valor econômico. Para Luã, a expressão tem um limite de dimensão, uma vez que “As empresas de tecnologia valem muito mais do que as de petróleo, por que uma riqueza vem da extração de algo não renovável, já os dados estão sempre se atualizando e se aperfeiçoando”, explica. Uma investigação do jornal Washington Post, de 2019, descobriu que a Amazon mantinha uma cópia de tudo o que a Alexa registrava depois de escutar o seu comando de ativação, o seu nome. Porém, à época, os usuários não eram avisados disso nas privacidades e não havia informações sobre como esses dados eram armazenados.

 Recentemente no Brasil foi aprovada a Lei Geral de Proteção de Dados, lei n° 13.709, agosto de 2018, sua vigência iniciou-se em agosto de 2020. A partir dela, passa a existir um novo cenário sobre segurança jurídica na Internet quando falamos da captação de dados, existem agora normas e práticas que devem ser seguidas.

Luã comenta a importância da atuação do Estado, para que os dados possam ser protegidos: “A LGPD é um grande marco porque ela passa a abranger todo o tipo de atividade que envolva o tratamento de dados pessoais, toda e qualquer atividade precisa seguir uma lei e isso é muito importante para regular e para instigar o debate, em sociedade”, avalia.

Outro ponto controverso sobre o uso das assistentes pessoais é a possibilidade dessas informações serem obtidas ilegalmente. É preciso se preocupar com a forma como as empresas coletam e armazenam esses dados, mas também, é preciso pensar sobre o perigo de um microfone conectado à sua casa cair nas mãos erradas. “Não é difícil de se imaginar que um dispositivo como esse pode ser facilmente hackeado, é um tipo de tecnologia muito frágil e perigosa, frente às facilidades que eles vendem” argumenta Luã.

As políticas de privacidade encontradas nos sites das empresas Amazon, Google e Apple informam que os áudios só são registrados e gravados pelo aparelho quando o comando de voz é ativado e que essas gravações podem ser revistas e apagadas pelo usuário. Além disso, as três empresas oferecem alteração das opções de privacidade.  Mesmo assim, o juiz Jeffrey White, do Tribunal de Oakland, na Califórnia decidiu dar prosseguimento a uma ação coletivo contra a Apple. A acusação é de que a empresa grava conversas captadas pela "Siri" sem o comando de voz ser ativado e repassa essas informações para outras empresas. Google e Amazon também têm processos abertos por gravarem áudios quando os assistentes não foram chamados. A abertura desses processos coloca em xeque a proteção que as empresas afirmam ter, além de dar eco para os questionamentos feitos por especialistas em tecnologia.  

Máquinas de fliperama ainda fazem sucesso entre aficcionados pelo jogo
por
Marcela Foresti
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05/10/2021 - 12h

Por Marcela Foresti

A paixão por games abre museus, restaura jogos, cria novas versões, coleciona. O Pinball, que era encontrado apenas em fliperamas, hoje é artigo de decoração e coleção, em suas versões mais antigas até as  mais tecnológicas. O famoso jogo teve sua primeira versão criada pelo britânico Montague Redgrave, em 1869 nos Estados Unidos, e originalmente se chamava Bagatelle. 

Bagatelle
Bagatelle - Museu do Pinball de Itu.

As máquinas no estilo conhecido hoje e com o nome Pinball, surgiram em 1930 e fizeram da cidade de Chicago, nos EUA, até então, o centro das produções. Durante a grande depressão no país norte-americano, o jogo virou uma das fontes de entretenimento mais procuradas, já que era barato. Foi nessa época que houve o  boom das máquinas.

O pioneiro dos games, porém, teve que aprender a se reinventar ao longo dos anos para acompanhar as novas tendências e se manter entre os favoritos. Com o surgimento dos videogames, por volta dos anos 70, o jogo perdeu um pouco da popularidade e muitas fábricas acabaram fechando. As máquinas começaram a incorporar novas tecnologias e trazer como tema do jogo personagens e filmes do momento, tudo com o intuito de continuar chamando a atenção do público.

O jogo amado desde os anos 30  teve grande influência na cultura pop desde sua criação. Foi tema, em 1969, do  álbum “Tommy” de Ópera Rock (história narrada por músicas), do quarteto britânico “The Who”.  

O álbum conta a história de um menino traumatizado que não fala,  não enxerga e não ouve, mas é o gênio do Pinball. “Tommy” virou um filme estrelado pela própria banda, em pequenos clipes, com participação de nomes como Elton John. Também  foi transformado em musical pela Broadway nos anos 90 e, novamente, em 2019. 

No Brasil as máquinas chegaram por volta dos anos 30, mas ficaram proibidas por muito tempo por serem consideradas jogo de azar. O empresário Paulo Esteban, da fábrica Matic, explica que no início da empresa criada em 1972,  por seu pai Inocêncio Esteban Rodrigues, a importação era proibida no País e a fábrica surgiu da necessidade das operadoras de fliperama. 

Paulo Esteban
        Paulo Esteban.

No começo a fábrica produzia Pinballs eletromecânicos. “Antigamente as máquinas eram produzidas de forma artesanal e quase não tinham elétricos embarcados no produto", conta Esteban. 

O antecessor dos games passou por inúmeras mudanças. “No início eram apenas bolinhas sendo lançadas para cima, os “flipers” que rebatem as bolas para cima só foram acrescentados depois, assim como os sons com sirene de cobre”, explica.

Hoje as máquinas possuem microcontroladores e monitores e ainda esse ano há um projeto onde elas serão interligadas pela Internet. “Os jogadores poderão disputar partidas online, independente do local onde se encontram", prevê Esteban.

O jogo voltou a crescer em meados de 2015. “Alguns entusiastas estavam pegando máquinas antigas e novas para criar seus próprios Game Rooms”, conta o empresário.

Luis Culik
Luis Francisco Culik.

Luis Francisco Culik, por exemplo, dono do Museu do Pinball de Itu, começou com uma coleção pessoal e hoje abre para que amantes do jogo, assim como ele, possam se divertir. “Em 2015 resolvi fazer um aniversário aqui e todos falavam que parecia um museu do Pinball. E aí todo ano nós abrimos no meu aniversário, conforme o tempo foi passando e a procura aumentando começamos a abrir frequentemente”, conta Culik. 

Atualmente o museu conta com 112 máquinas funcionando e 40 em processo de restauração e  o dono do museu conta que sua paixão pelo jogo vem de anos. “O Pinball faz parte da minha vida desde sempre, quando comecei a jogar tinha 13 anos”, explica.

Para ele o jogo é importante porque ir aos fliperamas era mais do que só para jogar, era uma forma de conhecer e interagir com mais pessoas.

O Museu tem uma conta no Instagram onde mostram e explicam mais sobre cada máquina e um canal no Youtube onde fazem game play dos jogos.

Com o interesse de colecionadores nas máquinas novas e antigas, o empresário da Matic explica que muitos operadores estão voltando a adquirir as versões antigas do Pinball. “O retrô está na moda”. Esta paixão pelo jogo é algo de escala mundial, existem diversos clubes de colecionadores, restaurantes e bares temáticos em diversos países.







 

 


 

Adaptando-se às demandas do mercado do entretenimento, o futebol também utiliza a tecnologia para reduzir os erros de arbitragem.
por
Guilherme Lima Alavase
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01/10/2021 - 12h

 Por Guilherme Lima Alavase

O futebol é o esporte mais popular do mundo e considerado uma paixão nacional. Nas últimas décadas foi se profissionalizando e virando um grande negócio financeiro. Os clubes  passaram a movimentar cifras astronômicas. Copiando o modelo europeu, vários clubes brasileiros deram uma guinada na forma de conduzir o futebol. O esporte para ser rentável e competitivo precisava ser eficiente, como uma empresa. Criou-se nos clubes a profissionalização dos dirigentes, contratando especialistas em diversas áreas para comandar o departamento de futebol.

A partir deste ponto, passou a ser pensado como uma mercadoria e ser vendida pelo melhor preço. Acabou a era das improvisações, das jogadas desconcertantes do futebol alegre. Na modernidade o que importa é vencer. Aos jogadores, para ganhar muito dinheiro, resta cumprir as determinações do treinador, baseadas em dados estatísticos, repetindo a mesma jogada ensaiada até que dê certo. Como mercadoria que precisava ser comercializada em todos os cantos do planeta, as emissoras de TV investiram muito dinheiro em equipamentos tecnológicos que mostravam os jogos com diversas câmeras posicionadas de forma a cobrir todos os espaços do campo.

A partir das transmissões de TV, os árbitros de futebol passaram a sofrer uma pressão fora do comum, sendo o erro, mostrado em detalhes, imperdoável. As empresas patrocinadoras dos times investiam altos valores e não aceitavam ser prejudicadas em suas estratégias comerciais por equívocos da arbitragem. Era preciso, assim como em outros esportes, investir em tecnologia para que os erros banais fossem eliminados dos jogos. Quem nunca ouviu falar da história do gol de mão do jogador argentino Maradona em jogo contra a Inglaterra nas quartas de final da Copa do Mundo de 1986.

A primeira experiência com uso de tecnologia para auxiliar a arbitragem no jogo foi a “tecnologia na linha do gol”, que consistia em um chip colocado dentro da bola que avisava o árbitro, através de seu relógio, se a bola havia ultrapassado ou não a linha do gol. Essa tecnologia foi utilizada, para avaliação, no torneio mundial de clubes de 2012 e implantado definitivamente a partir da Copa do Mundo de 2014, realizada no Brasil.

Implantado, a partir da Copa de 2018, na Rússia, o árbitro assistente de vídeo (VAR) consiste em uma equipe auxiliar, localizada em uma sala, que acompanha e analisa os lances do jogo através de monitores de vídeo. O operador do sistema pode ver o lance em vários ângulos, em câmera lenta, observando os detalhes da movimentação dos jogadores. Se o lance merece ser revisado, avisam o árbitro principal, através de um sistema de comunicação em tempo real, ou seja, são vários olhos (humanos e tecnológicos) observando tudo o que acontece durante o jogo.

Nos protocolos da FIFA, o VAR só pode ser utilizado, para confirmar ou anular um gol, para lances de pênalti, cartão vermelho direto e em momentos que o arbitro não consegue identificar jogadores que participaram de lances polêmicos sem que fossem observados. No caso de lances objetivos, como um impedimento, basta o VAR indicar para o árbitro para que ele acate a orientação. Em casos subjetivos, ou interpretativos, o árbitro é alertado para que veja o lance através de monitor instalado na lateral do gramado. Após assistir o lance, cabe a ele tomar a decisão.

Segundo dados da FIFA, o VAR foi utilizado 355 vezes nos 48 jogos da primeira fase da Copa da Rússia, sendo que todos os 122 gols foram verificados. O uso do VAR, com toda a sua demora, elevaram os acertos da arbitragem a 99,3% na Copa.

VAR brasileiro

No Brasil, o VAR foi usado experimentalmente no campeonato Pernambucano de 2017. No campeonato Brasileiro o VAR começou a ser utilizado a partir de 2019, colecionando muitos elogios e críticas por parte dos torcedores, dirigentes dos clubes e da mídia esportiva.

Após três anos de sua implantação, o VAR ainda levanta muitas discussões no futebol brasileiro, porém, contra fatos concretos os argumentos contrários ficam fragilizados. Gols, com erros grosseiros do árbitro, praticamente foram eliminados, lances violentos não estão ficando impunes, o agarra-agarra dentro da área nos escanteios diminuíram sensivelmente, o cai-cai para cavar um pênalti sumiu dos jogos, ou seja, a malandragem do futebol parece que ficou no passado.

A ex-árbitra de futebol e hoje comentarista de arbitragem da ESPN, Renata Ruel, em entrevista concedida ao jornalista Diogo Magri do “El País” foi didática em suas explicações para elucidar duvidas dos interessados pelo esporte. Observa que o VAR é uma poderosa ferramenta de auxílio da arbitragem, pois legitima o resultado de uma partida, porém, afirma que é preciso investir na formação dos profissionais da arbitragem. Opina que, "Se o VAR está precisando corrigir muitos lances é porque os erros estão sendo cometidos. Vemos alguns árbitros se escondendo atrás da ferramenta, usando como bengala".

O auxiliar (bandeirinha) Emerson Carvalho, que atuou nas últimas Copas do Mundo, participou do podcast “Hoje Sim” do locutor Cleber Machado e relatou que a principal dificuldade enfrentada pelos árbitros é o medo de errar, pois um erro individual em um jogo sem o suporte da tecnologia já é ruim para o prestígio do profissional, imagine um erro sendo cometido com todo o suporte tecnológico e com o auxílio de uma equipe remota o orientando na tomada de decisão. Esse medo faz o árbitro ver e rever o lance diversas vezes.

Como no futebol, quase tudo acaba em polêmica, alguns freqüentadores dos jogos nos estádios ficam angustiados esperando, às vezes, alguns minutos para saber se o grito de gol do locutor valeu ou foi anulado pela tecnologia.

 

Especialista analisa o sucesso do formato digital e o futuro tecnológico para o áudio
por
Daniel Seiti
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08/10/2021 - 12h

Por Daniel Seiti

 

Em 40 anos, a indústria fonográfica evoluiu drasticamente a partir do surgimento de novas tecnologias. Dos românticos discos de vinil, hoje rodeados por uma áurea nostálgica, ao uso diário das plataformas de streaming, a venda e o consumo de música se adequa a popularidade do mercado. Até meados dos anos 1980 era comum o hábito de, ao voltar das lojas de disco, deitar-se no chão de casa e ouvir a recente aquisição enquanto observava os detalhes do seu encarte.

Entretanto, o ato romântico e tátil no contato com a música, conduzido pela valsa nas rotações do LP, se perde em meio a automatização e evolução tecnológica, em que, cada vez mais, o indivíduo se distancia de um contato físico com produto – hoje, limitado a um breve e indiferente toque na tela do celular. Após a febre dos CD´s e dos reprodutores de MP3, o streaming se populariza e domina a maior parte do mercado fonográfico.

De acordo com dados da IFPI (Federação Internacional da Indústria Fonográfica), em 2020, as plataformas de música digital, lideradas por Spotify, Apple Music e Deezer, representam 62,1% de toda a receita global da indústria. Juntas, as três empresas acumulam 443 milhões de assinantes pagantes. “O streaming, no contexto popular, é melhor compreendido como um adendo ao smartphone, tal como um aplicativo e sobre seu uso em aspectos musicais. Eu prefiro me abster a comentar a vulgaridade ou mediocridade que isso possa representar em termos mercadológicos e de consumo”, afirma Sami Douek, engenheiro especialista em áudio.

Apesar das poucas diferenças no meio de gravação, Douek considera que fisicamente, a mudança está relacionada ao formato do registro sonoro. Assim, enquanto os modelos de gravação anteriores estão associados ao processo mecânico e analógico, no streaming a música perde essa característica ao se tornar um domínio numérico. O especialista também ressalta que a impulsão das inovações tecnológicas nesse setor está diretamente atrelada ao mercado e ao consumo.

Sami Douek
Sami Douek. Foto: Reprodução

“Se o assunto é música, o streaming é mais um bom mecanismo de busca do que uma oferta de conteúdo, pois o algoritmo implicado neste processo não está orientado para arte ou cultura, mas para o consumo”, explica. Diante dessa pauta, Douek afirma que o mercado fonográfico tem uma leve evolução tecnológica diante de uma boa evolução mercadológica. "Não teremos evoluções, mas comemorações no conhecido modelo de gravar, empacotar e distribuir um conteúdo cultural e musical”, analisa.

Em termos comparativos, entre o analógico e o digital, não é possível estabelecer critérios que determinem superioridade de formatos. Tratam-se de propostas e períodos diferentes. Essas diferenças, em combinação com as bagagens e vivências individuais, resultam na pluralidade de percepções e opiniões de cada um ao entrar em contato com a música, dependendo do formato utilizado. “Sobre a superioridade de um formato para o outro, não há regras que possam me sugerir absoluta sensatez, pois a interpretação depende de um contexto absolutamente humano, sensorial e neurológico. A qualidade percebida está relacionada também à memória e cultura de cada ouvinte", diz. Douek conta que este processo qualitativo tem uma construção social e política antes de ser estritamente técnica. "Não há como julgar qualidade de um formato sem reconhecer qualidade do conteúdo - muito variável - que não está mais relacionado com fidelidade da informação sonora com o registro fonte. Afinal, a nossa percepção auditiva é orgânica, pois não temos um par de microfones captadores associados ao cérebro”, observa o especialista.

Assim, no presente, ao ter contato com uma diversidade de formatos para o consumo de música, cabe ao ouvinte entender qual destes se adequa ao sentimento a provocações de sensações desejadas no momento. De um lado, a nostalgia dos meios do passado que carregam, não somente a história, mas uma experiência tátil com a música – uma espécie de herança romântica. Do outro, a evolução tecnológica das plataformas streaming que proporcionam o acesso um universo de possibilidades de maneira instantânea e permitem a busca por infinitos trabalhos em apenas um único aparelho remoto.

 

 

A utilização excessiva da Internet causa ansiedade nas pessoas por ficarem confinadas dentro de casa.
por
Leonardo Cavazana Nunez
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24/09/2021 - 12h

Por Leonardo Cavazana Nunez

Em período de isolamento um dos problemas mais comuns dessa geração aumentou consideravelmente: a dependência da tecnologia já que muitos utilizam gadgets como ferramenta para se distraírem durante o período confinado em casa. Segundo pesquisa do Laboratório Delete-Detox Digital e Uso Consciente de Tecnologias, da Universidade Federal do Rio De Janeiro (UFRJ), realizada entre novembro de 2020 e janeiro de 2021, 62,5% das pessoas usaram tecnologias por mais de três horas todos os dias, e 49,1% por mais de quatro horas, durante o período de isolamento.

Fonte: Acervo pessoal, Caio hideaki Yoshida 

Fonte: Acervo pessoal, Caio Hideaki Yoshida

Entre esses jovens está Caio Hideaki Yoshida, 19 anos, morador de Biritiba Mirim, estudante de Administração. Ele relata que utiliza a tecnologia de forma excessiva. “Eu passo grande parte do dia conectado em plataformas como Instagram e YouTube, e quando estou estudando é através do meu computador ou celular”, confessa.

Segundo Yoshida esse uso excessivo em frente a tela vem trazendo muitas consequências. “Então, a meu ver posso ter ficado mais ansioso passando tanto tempo olhando apenas para a tela” e ainda completa: “Talvez eu usasse isso como uma válvula de escape para o tédio e também resultado em maior procrastinação com estudos”, avalia.

Fonte: Acervo pessoal, Ruan Bintencourt Ramos

Fonte: Acervo pessoal, Ruan Bittencour Ramos

Outro jovem, Ruan Bitencourt Ramos (20), estudante de Psicologia da Universidade São Judas, a frequência do uso da tecnologia também aumentou. “Sim, o ser humano é, por evolução, um animal social, temos uma necessidade biológica de convivência, intimidade e trocas com outro indivíduo. As redes sociais possibilitam uma proximidade, em um período de isolamento social são indispensáveis para preencher tal necessidade humana”, afirma.

Ramos relata que dentro da sua área esse debate tem uma grande importância no combate desses vícios.“Por etimologia, vício é falta de algo, a psicologia, por meio de terapias e acompanhamentos procura controlar e descobrir a causa de tais faltas, curando desde o começo, desde as raízes dos vícios para uma melhor qualidade de vida do paciente”, define.

Os dois estudantes acreditam que há como combater esse problema que está entre a maioria dos jovens. Para o morador de Biritiba Mirim, sua visão é pessimista, mas afirma que acredita em uma solução. “De certa forma, talvez seja improvável que consigamos fugir das telas, pois elas estão cada vez mais presentes e funcionais em nossas vidas. Porém é muito importante que invistamos em nossas vidas reais para evitar problemas futuros”, considera. Já o estudante de psicologia acha maneiras viáveis de tratamento. "Por meio de terapias, aulas sobre a responsabilidade nas redes e conscientização da importância da saúde mental na vida e cotidiano da população”, finaliza.