Em São Paulo, a rotina de um motorista de aplicativo revela como o trabalho passou a ser guiado por notificações, cansaço digital e um cotidiano moldado pelo brilho constante do celular
por
Carolina Hernandez
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24/11/2025 - 12h

 

Por Carolina Hernandez 

O celular vibra antes que qualquer clarão toque os prédios da Mooca, e essa vibração curta, metálica e insistente desperta Jonas de um sono leve, como se fosse uma convocação, um chamado que não permite adiamentos. Ele estende a mão ainda no escuro, alcança o aparelho, observa a luz que se espalha pelo quarto e lê a notificação do aplicativo que já anuncia alta demanda, fluxo intenso, oportunidade. Nos últimos anos, aprendeu a acordar assim, preso ao brilho do celular antes mesmo de sentir o chão frio sob os pés. O trabalho começa na tela, e não na rua.

No carro, um sedan prata que carrega o desgaste dos dias longos, Jonas encaixa o celular no suporte. O gesto é tão automático que parece parte do ritual de ligar o motor, como se o carro só funcionasse plenamente depois que o aplicativo estivesse ativo. A tela mostra a cidade em azul e amarelo, um mapa vivo onde cada área fervilha com informações que determinam para onde ele deve ir, quanto irá ganhar, quanto tempo deve esperar. O aplicativo calcula rotas, horários, riscos e recompensas, e Jonas respira fundo antes de seguir, como quem aceita que o destino do dia será guiado por aquele retângulo luminoso.

A primeira corrida aparece em menos de quinze segundos. Ele aceita. O carro avança devagar pelas ruas que ainda não despertaram, e Jonas observa o céu sem forma, as luzes dos postes refletidas no capô, o reflexo da tela pressionando seus olhos desde a madrugada. Logo, o trânsito cresce, e a cidade parece surgir inteira de dentro dos celulares dos próprios motoristas, porque ninguém conduz apenas pelas ruas, todos conduzem pelos mapas, pelas notificações, pelas coordenadas enviadas de longe.

A dependência da tela dita o ritmo. Jonas percebe isso a cada minuto. Ignorar uma notificação pode significar perder corridas, perder pontos, perder visibilidade diante do algoritmo. Ele sabe que o sistema registra cada movimento, cada segundo parado, cada mudança de rota, cada hesitação. Uma espécie de patrão silencioso observa sua velocidade, suas notas, seus cancelamentos, suas escolhas. Não há voz, não há rosto, mas há controle. Ele comenta que antes achava que dirigia para pessoas, e hoje sente que dirige para um conjunto de cálculos invisíveis.

O cansaço começa sempre pelos olhos. A luz azulada se infiltra pelas pálpebras como um grão de areia persistente. Mesmo nos poucos minutos de pausa, ele sente o celular vibrar no bolso, chamando de volta, lembrando que há demandas próximas. A Pesquisa TIC Domicílios mostra que o celular tornou-se o principal dispositivo de acesso à internet para a maioria dos brasileiros, mas, para motoristas de aplicativo, é mais que isso, é ferramenta, ponte, segurança, salário e vigilância. Jonas passa mais tempo olhando para a tela do que para qualquer rosto durante o dia.

Os passageiros entram no carro sempre com pressa, sempre conectados a outra conversa que não está ali. Há estudantes que assistem aulas no banco traseiro, executivos que participam de reuniões por vídeo, mães que equilibram sacolas e chamadas, jovens que respondem mensagens durante trajetos de poucas quadras. O carro se transforma em cápsula de passagens breves, onde cada um leva sua própria tela, e Jonas conduz tantas luzes simultâneas que, às vezes, o interior do carro parece mais iluminado durante a noite do que durante o dia.

Ele já ouviu histórias que não estavam destinadas a ele, conversas que vazavam das telas para o espaço do carro, lágrimas silenciosas de quem lia mensagens difíceis, risadas altas de grupos que relembravam memórias por vídeos compartilhados. Jonas sempre percebe que as pessoas falam menos com ele e mais com seus celulares, que olham menos pela janela e mais para notificações. Nos raros momentos de silêncio, apenas as telas respiram, emitindo luzes diferentes em intervalos variados.

No fim da tarde, quando o corpo já pesa, o aplicativo avisa aumento de demanda. Jonas pensa em parar, mas o aviso insiste, promete ganhos extras, sinaliza movimento crescente. Ele encosta em um posto para comprar um café, tenta alongar as costas, tenta piscar devagar para aliviar a ardência nos olhos. O celular vibra antes da primeira golada. Ele volta para o volante. Recusar seria uma escolha, mas uma escolha com consequências. Descanso e trabalho, na lógica do aplicativo, nunca estão em equilíbrio.

A madrugada avança e a cidade se torna uma paisagem de luzes espaçadas, com corredores vazios e poucos ruídos. Jonas leva um jovem que saiu do trabalho no shopping, e o rapaz passa o trajeto inteiro olhando para o celular enquanto mensagens surgem em sequência. Jonas também observa o seu próprio aparelho, que marca a rota até o destino. O carro segue pelas avenidas escuras com apenas as duas telas iluminando o interior, criando um silêncio que parece suspenso no ar.

Quando chega em casa, Jonas desliga o carro, depois o aplicativo, e por fim o celular, que insiste em vibrar com atualizações e resumos do dia. A sala escura o acolhe em um silêncio que chega a parecer estranho, como se o mundo tivesse diminuído de volume. Ele se recosta no sofá e sente o peso acumulado do dia, não apenas o peso físico, mas o peso da luz constante, da atenção exigida, da vigilância permanente que o acompanha desde o amanhecer. O corpo quer descanso, mas a mente ainda repassa rotas, mensagens, barulhos de notificação que permanecem mesmo após a tela apagar.

Amanhã, muito antes de a luz do sol tocar a janela, o celular irá vibrar novamente, e Jonas atenderá, não por escolha, mas por necessidade. Ainda assim, enquanto respira profundamente, sente uma dúvida surgir devagar, como quem desperta de um sonho longo. Ele se pergunta se ainda guia o carro, se ainda conduz o trajeto, ou se apenas segue o ritmo imposto pela tela que nunca dorme. E essa pergunta, ele sabe, continuará voltando. Porque, na madrugada das grandes cidades, o trabalho e a vida estão cada vez mais presos ao mesmo brilho.

Com o avanço do sistema de pedágio eletrônico nas rodovias paulistas, motoristas vivem a combinação entre fluidez no trânsito e incertezas sobre tarifas, prazos e adaptação ao novo modelo.
por
Inaiá Misnerovicz
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25/11/2025 - 12h

Por Inaiá Misnerovicz

 

Dirigir pelas rodovias da Grande São Paulo já não é mais como antes. Com a chegada do sistema free-flow - o pedágio eletrônico sem cancelas -, muitos motoristas sentem que atravessam uma fronteira invisível: não há mais a cancela para frear o carro, mas também não há a certeza imediata de quanto vão pagar. Para Jerônimo, motorista de carro, morador da zona leste de São Paulo que faz quase todos os dias o trajeto até Guararema a trabalho, essa sensação de fluxo e incerteza convive em cada viagem.

Antes da implantação do free-flow, Jerônimo parava em praças de pedágio, esperava, conferia o valor, calculava se valia a pena seguir por um trecho ou desviar. Hoje, ao cruzar os pórticos da Via Dutra ou de outras rodovias, ele simplesmente segue adiante. Só depois, no no aplicativo, descobre quanto foi cobrado, isso quando ele lembra de conferir a fatura. Para quem tem TAG, o débito cai automaticamente, mas para quem não tem, o sistema registra a placa e envia a cobrança que deve ser paga em até 30 dias, sob pena de multa, como prevê a regulamentação da CCR RioSP.

Esse modelo evita paradas e acelera o tráfego, especialmente nas pistas expressas. Segundo a concessionária Motiva/RioSP, quem trafega pelas marginais da Via Dutra (sem acessar a via expressa) não é tarifado. Mas Jerônimo ressalta que essa economia de tempo nem sempre vem acompanhada de previsibilidade de custo: “só sabendo depois quanto foi cobrado, ainda dependo de consultar o site para ver se registrou todas as passagens”, ele diz. A tarifa depende do horário e do dia da semana, pode variar, e para quem usa TAG há desconto de 5%. 

Para tornar essa transição mais suave, a RioSP intensificou ações de orientação nas margens da rodovia e em pontos públicos de Guarulhos. Na capital, promotores usam realidade virtual para explicar como os pórticos funcionam, há vídeos e atendimentos nos postos de serviço. Mais de 500 pessoas já participaram de eventos para esclarecer dúvidas sobre o funcionamento, formas de pagamento e salto entre pistas expressas e marginais.

As novas tarifas também entraram em vigor recentemente: desde 1º de setembro de 2025, os valores para veículos leves nas praças da Via Dutra foram reajustados pela ANTT, e nos pórticos do free-flow os preços também foram atualizados. No caso das rodovias geridas pela Concessionária Novo Litoral - especificamente a SP-088 (Mogi-Dutra), SP-098 (Mogi-Bertioga) e SP-055 (Padre Manoel da Nóbrega) - os valores por pórtico variam de R$ 0,57 a R$ 6,95 para veículos de passeio, dependendo do trecho.

Essa lógica de cobrança por trecho, sem a presença física de praças, exige do motorista algo além de atenção na pista: exige educação para se entender onde entrou, onde passou e quanto isso custou. Para Jerônimo, isso é mais difícil do que simplesmente parar e pagar. Ele admite que, apesar da melhoria no fluxo, teme que algum pórtico não tenha sido registrado, ou que haja diferença entre o que ele acredita ter passado e o que vai aparecer na fatura.

Além disso, há risco real para quem não paga no prazo. A CCR RioSP adverte que a não quitação da tarifa em até 30 dias configura evasão de pedágio, o que pode gerar infração de trânsito, multa fixada e até pontos na carteira. Para muitos, essa penalidade ainda parece pesada diante da novidade e da complexidade do sistema.

Por outro lado, o free-flow traz ganhos concretos para a mobilidade: ao eliminar paradas bruscas nas praças, reduz o risco de acidentes por frenagem repentina e melhora o desempenho das rodovias. A tecnologia permite modernizar a gestão do tráfego, e os pórticos com sensores garantem identificação precisa por TAG ou leitura de placa. Ainda assim, a transformação não se resume à pista. Ela repercute no cotidiano de quem vive dessa estrada, como Jerônimo, e também na forma como a concessionária se relaciona com os motoristas. A campanha de orientação mostra que há consciência de que nem todos se adaptarão imediatamente. As ações de atendimento por WhatsApp, aplicativo, site, totens e até no posto de serviço reforçam a aposta na transparência. 

Há também a perspectiva de que esse modelo se torne cada vez mais comum. Segundo planejamento de concessões futuras, mais pórticos free-flow poderão ser instalados nas rodovias paulistas até 2030, o que tornaria esse tipo de cobrança mais frequente para usuários regulares da malha estadual. Mas para que ele seja efetivamente equitativo, será preciso manter a educação viária, oferecer canais de pagamento amplos e garantir que os motoristas não sejam penalizados por simples falhas de entendimento.

Para Jerônimo, a estrada continua sendo um espaço de tensão e de liberdade. Ele ganha tempo, mas precisa vigiar sua fatura. Ele cruza Guararema, volta para São Paulo, e vive uma experiência nova: a de rodar e pagar depois, sem parar, mas sempre com a incerteza de que quanto passou pode não ser exatamente quanto será cobrado. A cancela desapareceu, mas o pedágio segue presente, só que disfarçado em números, e não em uma barreira física. 

Colunista Marcelo Leite revela que a área perde cada vez mais influência no país
por
Giovanna Britto
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24/11/2025 - 12h

 

Durante a pandemia de Covid-19, o Brasil se reinventou em assuntos a respeito de hábitos higiênicos, debates sobre saúde mental e destacou a importância do jornalismo científico, área  responsável por comunicar à população a respeito das vacinas, o avanço ao combate do vírus e outros assuntos de saúde pública. Entretanto, três anos após o fim do estado emergencial causado pela pandemia, a falta de adesão do público à ciência tem ameaçado o trabalho dos jornalistas desse segmento.

Entre 2020 e 2022, os profissionais da mídia foram expostos ao desafio de comunicar a incerteza científica, traduzir termos e conscientizar a sociedade sobre a pandemia. Muitos jornalistas já eram especializados na área, outros aprenderam a falar sobre ciência devido a alta demanda de notícias para divulgar. A pandemia serviu como ponto de virada para o jornalismo científico - que já existia no Brasil, mas ganhou repercussão graças à necessidade de dar foco ao assunto que ditou o estilo de vida de um mundo inteiro.

Nomes como Atila Iamarino, Natália Pasternak e Álvaro Pereira Júnior se destacaram como grandes vozes da divulgação do jornalismo de ciência. Em entrevista à AGEMT, Marcelo Leite, jornalista e colunista da Folha de São Paulo especializado na área de ciência e ambiente, comenta sobre esse período: “Nunca se valorizou tanto do ponto de vista de espaço, de tempo, de audiência, a divulgação de informações científicas de base para entender o que estava acontecendo.” Hoje, o espaço de fala e a repercussão em temas científicos são menores, uma vez que as pessoas estão cada vez menos interessadas em saber de que forma isso implica em suas vidas pessoais.

Jornalista Marcelo Leite posando para câmera
Formado em jornalismo pela USP, Marcelo também atuou na Revista Piauí e é autor do livro “Psiconautas: Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira”. Foto: Divulgação/Unicamp.

 

Marcelo relembra que o jornalismo científico já sofria com ameaças à sua credibilidade, com falsos especialistas, médicos sem conduta ética e  com o presidente da época, Jair Bolsonaro, reproduzindo falas que levantavam mais dúvidas e ondas de ódio. “Foi um período terrível, e talvez a parte principal, que me deixa mais frustrado, é que o público se dividiu em dois. Uma parte passou  a desconsiderar as informações que a gente, do jornalismo científico, se esforçava por apresentar como informações objetivas, fundadas em dados, com a qualidade que se espera da ciência ", completa.

Na fase posterior à pandemia, após o declarado fim do período emergencial do coronavírus em 5 de maio de 2023, foi possível observar as consequências e heranças que a abundância de informações equivocadas, negacionistas e falsas deixaram na rede de informação, seja online ou offline. Os movimentos anti vacinas, impulsionados durante o Covid, emitiram um alerta para a Organização Mundial de Saúde. Dados divulgados pelo jornal Humanista da UFRGS evidenciam que a cobertura de vacinas contra poliomielite, HPV e sarampo estão em constante queda e sequer atingem a meta em lugares como Norte e Nordeste. 

No anuário de Vacinas de 2025 da Unicef, os dados indicam que até 14 de julho de 2025, a cobertura vacinal dos grupos prioritários permanecia abaixo da meta de 90%: crianças de seis meses a seis anos com 39,5%, idosos com 53,2% e gestantes com 29,8%, correspondendo a menos da metade do público-alvo.

A questão ambiental também é desconsiderada por muitas pessoas. Marcelo afirma que há muitos temas pelos quais o jornalismo científico lutou pelo progresso e que atualmente são banalizados. “se houve alguma dúvida no passado, há 20, 30 anos atrás, hoje não há mais nenhuma dúvida sobre os impactos que estão vindo e virão da mudança climática, cada vez mais sérios. Mas ainda tem gente que questiona.”

Recentemente, casos de metanol que alertaram a população em outubro deste ano, trouxeram uma onda de informações falsas que prejudicaram profissionais da área jornalística e médica, motivando o pronunciamento deles a respeito. Vídeos tentando realizar testes caseiros para identificar a presença da substância nas bebidas, sem comprovação científica, viralizaram nas redes sociais.

Essa situação se assemelha com as polêmicas envolvendo o uso da cloroquina na pandemia. Um levantamento realizado por pesquisadores do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da USP (Cepedisa) em colaboração com a Conectas Direitos Humanos, mostra que, entre março de 2020 e janeiro de 2021 houve pelo menos quatro medidas federais promovendo diretamente ou facilitando a prescrição do medicamento. Jair Bolsonaro foi um dos maiores promotores da cloroquina na época e quem motivou o uso para a população. Apesar de ter sido associada no combate ao Covid, a cloroquina é um medicamento que atua contra doenças inflamatórias crônicas e no combate a parasitas e cuja eficácia de uso para o coronavírus não é comprovada.

O estudo que deu início a essa ideia foi inicialmente publicado na revista científica International Journal of Antimicrobial Agents e assinado por mais de 10 profissionais. Hoje, a editora da revista, Elsevier, anunciou a retratação deste artigo após uma pesquisa aprofundada, com o apoio de um “especialista imparcial que atua como consultor independente em ética editorial”.

Os profissionais continuam exercendo seu trabalho com excelência, alguns optando pela mídia tradicional, outros inovando nas redes através de vídeos curtos. Mas é inegável a forma com que o jornalismo científico perdeu a influência e como falta apoio em todas as áreas. “É muito triste, porque eu dediquei minha vida inteira ao jornalismo científico, para ver isso acontecer no fim da minha carreira” conclui o jornalista.

Após sete anos, evento volta ao calendário impulsionado pelo avanço dos carros eletrificados
por
Fábio Pinheiro
Vítor Nhoatto
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22/11/2025 - 12h

O Salão Internacional do Automóvel de São Paulo, um dos eventos mais tradicionais do setor automotivo brasileiro, está de volta após um hiato de sete anos. A edição de 2025 acontece entre os dias 22 e 30 de novembro, em um contexto de profundas transformações na indústria e impulsionada pela expansão de veículos eletrificados, entrada de novas marcas no país e a necessidade das montadoras de reconectar consumidores às experiências presenciais.

De acordo com a RX Eventos, organizadora da mostra bienal, a volta acontece em razão da reestruturação e aquecimento do mercado. A última edição havia sido realizada em 2018 e contou com cerca de 740 mil visitantes, mas devido a pandemia de COVID-19 o Salão de 2020 foi cancelado. Nos anos seguintes, a volta do evento ficou só na especulação. Segundo a Associação Nacional de Fabricantes Automotores (Anfavea), a pausa também pode ser atribuída à crise de matéria-prima, à retração econômica deste então e ao formato caro para as montadoras que estavam distantes do público.

Embora as duas últimas edições tenham sido no São Paulo Expo, esta acontece no Complexo do Anhembi, casa oficial do evento desde 1970. A mudança foi celebrada por expositores e pelo público, já que o Anhembi permite maior fluxo de visitantes, oferece áreas amplas para test-drive e atividades externas, recuperando a identidade histórica do salão. O retorno também faz parte da estratégia de reposicionar o evento como uma grande vitrine de experiências automotivas, com pistas, ativações e zonas imersivas distribuídas pelo pavilhão.

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Renault anuncia o seu novo carro “Niagara” - Foto: Fábio Pinheiro

Entre as montadoras que vão expor, estão nomes de peso que apostam na ocasião para apresentar novidades ao consumidor brasileiro. A BYD leva ao Salão uma linha reforçada de elétricos e híbridos, aproveitando o crescimento expressivo da marca no Brasil, além de lançar no evento a marca de luxo do grupo, Denza. A rival chinesa GWM também estará presente, com o facelift do SUV H6, o jipe Tank 700 e a minivam Wey 09.

Em relação às marcas tradicionais, a Stellantis vai em peso para o Anhembi. A Fiat, apesar de não ter apresentado nenhum modelo novo, trará o Abarth 600, um SUV elétrico esportivo. A Peugeot terá os 208 e 2008 eletrificados e, principalmente, o lançamento da nova geração do 3008 para o mercado nacional, equipado com o tradicional motor THP. 

Enquanto isso, a Toyota investe na divulgação de novidades híbridas flex, com a chegada do Yaris Cross para brigar com o recém-lançado HR-V, e os líderes Hyundai Creta e Chevrolet Tracker. Juntas, as marcas representam parte do movimento de transformação do mercado brasileiro, que tem apostado cada vez mais na eletrificação e em tecnologias avançadas para rivalizar com a expansão chinesa.

O Salão 2025 também será palco de novas marcas como a Leapmotor, parte do grupo Stellantis. O SUV C10 será o primeiro modelo a chegar às ruas, ainda neste ano, e conta com a versão elétrica (R$189.990) e com extensor de autonomia (R$199.990). O segundo modelo será e o C-SUV elétrico B10, por R$172.990, 60 mil a menos que o rival BYD Yuan Plus, e mais recheado de tecnologia, como teto panorâmico, nível 2 de condução semi autônoma, câmera de monitoramento do motorista e airbag central.

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Presidente da Stellantis para a América do Sul, Herlander Zola, anunciou os planos para o grupo - Foto: Stellantis / Divulgação

Já a britânica MG Motor, propriedade da chinesa SAIC, investirá em esportividade elétrica, além de custo-benefício. O modelo de maior volume de vendas deve ser o SUV S5, rival de Yaun Plus, e igualmente equipado ao B10. Em seguida, o MG 4 chega para rivalizar com Golf GTI e Corolla GR, com mais de 400 cavalos, tração integral, pacote de ADAS completo, e pela metade do preço dos rivais. Por fim, o Roadster será o chamariz de atenção no estande, com portas de lamborghini e em homenagem à tradição da marca. 

O grupo CAOA também fará a estreia da nova marca que trará ao Brasil a Changan, com a chegada prevista para 2026 com os modelos de super-luxo elétricos Avatr 11 e 12, além do SUV UNI-T, rival do Compass e Corolla Cross. 

O pavilhão do Anhembi contará com pistas de test-drive, áreas dedicadas a modelos clássicos como o McLaren de Senna, e até mesmo uma área do CARDE Museu. No Dream Lounge estarão presentes super carros como Ferrari e Lamborghini, além da Racing Game Zone para os amantes de videogame e simuladores de corrida. 

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Área externa do Anhembi terá pista de slalom, frenagem e test-drive de dezenas de modelos - Foto: Salão do Automóvel / Divulgação

Apesar da ausência de marcas como Chevrolet, Ford, Mercedes, Volvo e Volkswagen, 2520 montadoras estarão presentes, incluindo Chery, Hyundai, Mitsubishi e Renault. O Salão espera receber cerca de 700 mil visitantes e a edição 2027 já está confirmada. Os ingressos custam a partir de R$63 (meia-entrada) nos dias de semana.

Projeto aprovado pelo Congresso libera R$ 22 milhões do Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)
por
Helena Barra
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17/11/2025 - 12h

Por Helena Barra

 

No dia 4 de agosto de 2025, o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou o Projeto de Lei 847/2025. O plano, aprovado pelo Congresso brasileiro, regulamenta o uso dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), liberando o valor de R$ 22 bilhões para investimentos nas áreas da ciência e tecnologia.  O FNDCT é o principal instrumento de financiamento público da ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Ele apoia pesquisas científicas, a formação de recursos humanos qualificados, a inovação tecnológica nas empresas, a infraestrutura de pesquisa e o desenvolvimento de projetos estratégicos nacionais.

A professora de economia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Norma Cristina Brasil Casseb, explica que fundos como o FNDCT possuem legislação própria. No caso do FNDCT, segundo dados da FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), os recursos são provenientes de diversas fontes. A composição deles evidencia o importante papel do Estado tanto no direcionamento de incentivos diretos do orçamento público e do tesouro, quanto na garantia de que parte dos lucros obtidos pelas empresas do setor detentor e gerador de tecnologia retorne para a sociedade e permita que ela se desenvolva de forma mais igualitária.

Nas redes sociais, o presidente Lula, afirmou que a medida visa fortalecer a base industrial brasileira. “Com essa medida, vamos fortalecer a inovação nas seis missões da Nova Indústria Brasil e nas Instituições Científicas e Tecnológicas, levando infraestrutura, redes de pesquisa e oportunidades para todos os territórios do país. Investir em pesquisa e inovação é investir no futuro do Brasil”, comentou na divulgação.  Além disso, o projeto também tem como objetivo estimular o emprego qualificado em pesquisa e desenvolvimento, de maneira a ampliar o número de doutores em empresas, startups, parques tecnológicos e instituições de ensino. 

Para Norma Casseb, em um país como o Brasil, com alta desigualdade social e elevada concentração de renda, a liberação deste recurso é importante, não só para a sociedade, mas como para a economia nacional. “Neste contexto, o investimento em tecnologia e inovação, combinado a uma estratégia voltada para a industrialização do país, tem uma alta capacidade de geração de empregos de qualidade especialmente no setor produtivo, permitindo elevação na renda da população e, por consequência, maior expansão econômica”, informa a doutoranda. 

Segundo a Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), representante das instituições financeiras de fomento habilitadas a operar os recursos do fundo, a nova lei marca uma mudança de postura em relação ao uso dos fundos públicos voltados à inovação. Ao garantir previsibilidade e autonomia na aplicação dos recursos, o Brasil se alinha a boas práticas internacionais de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico. 

Em entrevista à Agência Brasil, a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, destacou que, apesar de o FNDCT ter sido criado em 1969, o fundo ganhou maior relevância nos governos do presidente Lula, inclusive no atual mandato. De acordo com o governo, nos últimos dois anos, os investimentos em ciência, tecnologia e inovação por meio do FNDCT aumentaram seis vezes. Saíram de R$ 2 bilhões, em 2021, para R$ 12 bilhões, em 2024. A previsão para 2025 é de cerca de R$ 14 bilhões.

A professora também reforça que o investimento em ciência e tecnologia é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento econômico e social de uma nação. Eles permitem adicionar valor agregado aos produtos brasileiros, além de elevar a produtividade e a competitividade da economia nacional, permitindo que sejam cada vez mais competitivos no comércio internacional.  Além disso, investimentos como o FNDCT podem tornar o País mais que um exportador de produtos de maior valor agregado, mas também um exportador de tecnologia para outros países, que muitas das vezes não possuem capacidade financeira ou de infraestrutura para desenvolverem suas próprias tecnologias.


 

 





 

Cada vez mais a moda digital vem aparecendo nas passarelas, em novas marcas e coleções
por
Beatriz Loss
Fernanda Fernandes
Julia Rugai
Vanessa Orcioli
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23/11/2021 - 12h

Você já se imaginou comprando uma roupa que nunca vai vestir? E assistindo um desfile sem modelos reais? Parece estranho, mas experiências como essas estão começando a ganhar espaço no mundo da moda. A moda digital vem aparecendo nas passarelas e em novas coleções de algumas marcas. Fazendo com que a inteligência artificial fique literalmente na moda. Mas afinal, quais são os benefícios e impactos dessa nova tendência? 

A inteligência artificial, também conhecida como IA, busca reproduzir a inteligência humana em computadores, e por meio de muitos dados as máquinas conseguem suprir necessidades que o ser humano nem sabia que tinha.

Hoje a IA está muito presente em quase tudo, e se tornou tão comum que o seu uso passa despercebido. Rico Malvar, um dos cientistas-chefe da Microsoft Research afirma que é uma tecnologia essencial, tão importante como a eletricidade. 

Cada vez mais, essa tecnologia está sendo implantada na Indústria e todos os seus setores, trazendo muitas novidades e questionamentos. Ela está na palma da sua mão, dentro da sua casa, nas operações bancárias, na área da saúde. E um dos setores que a IA está sendo aplicada e vem trazendo diferenciais é o da moda. 

Desde o ano passado, a IA vem se unindo à moda de uma forma bem futurista. Nos últimos meses pudemos observar o fenômeno das Fashion Weeks em formato digital em diversas partes do mundo.

A Shanghai Fashion Week foi o primeiro evento de moda a acontecer de forma totalmente digital em março de 2020. O evento tradicionalmente presencial havia sido inicialmente cancelado na China por conta da pandemia do covid-19, porém acabou acontecendo nesse novo formato. A semana aconteceu pela plataforma Tmall, marketplace de e-commerce chinês, contando com os desfiles e live shop, nova técnica de venda online.

No Brasil, surgiu, também no ano passado, o Brazil Immersive Fashion Week, exposição de roupas virtuais e desfiles em realidade aumentada com criações que misturam o “mundo real” com elementos do universo virtual. Uma das grandes atrações da edição 2021 foi a coleção do designer Lucas Leão, que também exibiu presencialmente em um galpão com cenário invisível a olho nu.

Com a popularização da IA e do metaverso, grandes empresas devem investir logo nesse próximo passo. “Quando o Facebook apareceu, era só uma brincadeira criada para falar quem era a mais bonita da faculdade, hoje o Mark Zuckerberg não para de falar nesse assunto. Não dá mais para acreditar que é algo irrelevante. Nessas primeiras edições, ainda estamos na fase de explicar para as pessoas o que são essas novidades”, disse Olívia Merquior, uma das idealizadoras do BRIFW, em entrevista à Veja São Paulo.

Na moda virtual, as roupas não são produzidas em tecidos ou qualquer outro tipo de material, são criadas a partir de softwares 3D, que não só ativam a movimentação dos tecidos, mas também estampa e diversifica modelagens de forma única e exclusiva. As roupas são inseridas digitalmente nas fotos ou vídeos do usuário. 

As tecnologias são as mais diversas e as marcas como The Fabricant, Dress X e The Replicant Fashion são pioneiras e já dispõem de várias peças e looks diários que estão em evidência nas redes sociais.

A marca The Fabricant, especializada em avatares virtuais, foi uma das primeiras da moda virtual, ela permite que o cliente crie seu próprio avatar e disponibiliza as peças digitais para aplicação. Em 2019, vendeu a primeira roupa digital de luxo do mundo, um vestido de pixels, que foi leiloado em Nova York por US $9.500, mais de R $53 mil, na cotação atual. A proposta da marca recém-nascida vai além, e passa pelo metaverso.

No Brasil, essa moda vem sendo aderida e roupas digitais estão começando a cair no gosto do público. A empresa Genyz é a precursora em criações de avatares no Brasil e passou a ser responsável por peças das influencers virtuais, chamadas de Mia Bot e Princess A.I. Essa marca também é a primeira da América Latina a oferecer um serviço de escaneamento corporal digital para fabricação de roupas físicas.

Studio Acci, também é uma marca nacional que faz roupas 3D a partir de desenhos, fotografias e ideias para empresas do setor, que podem usar as peças tanto em propagandas quanto em editoriais.

Com os avanços tecnológicos e rápidas adaptações - ainda mais após enfrentar um cenário pandêmico -  o mundo recebe de bom grado softwares e tecnologias inovadoras que geram mercados de consumidores mais conscientes e preocupados com o meio ambiente. Isto se dá pelo fato de que a utilização de algumas estratégias desenvolvidas pelo ramo da IA são capazes de traçar uma “previsão” de tendências, pois são desenhadas através do comportamento humano. 

Como exemplo, no Brasil, a marca de moda Amaro é conhecida no meio por armazenar dados de seus consumidores através de observações de suas preferências. Uma vez armazenados, os dados geram um algoritmo capacitado para o desenvolvimento de novas produções que se encaixem nas expectativas dos clientes. Desta forma, a produção tem mais chances de ser assertiva e, portanto, não há grande margem para excessos de produções que podem não sair da vitrine e virar resíduos.  

A partir de tudo o que já se conhece sobre a aplicação da IA no dia a dia, entende-se que, no mundo da moda, ela pode ser uma ferramenta útil para além da confecção de ideias e inspirações artísticas. Neste caso, a IA está se tornando uma forte aliada no segmento de estudos do mercado da moda. Isto é, mais uma ferramenta que se soma às análises de comportamento dos consumidores, além de ser uma das apostas para tornar essa indústria mais sustentável pois sabe-se que as produções têxteis são grandes geradoras de resíduos.

Uma conversa sobre educação e tecnologia
por
Giovanna Crescitelli
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23/11/2021 - 12h

Por Giovanna Crescitelli


O livro" A fábrica da educação: da especialização taylorista à flexibilização toyotista", de Antunes e Augusto Pinto reflete sobre a escola que vigorou ao longo do ‘século do automóvel’. Henry Ford (1863-1947) foi o grande precursor da ‘indústria de massa’ focada na produção em larga escala com o uso de linhas de montagem e padronização técnica. O fundador da empresa Ford, uma das indústrias mais importantes do capitalismo contemporâneo, foi considerado um obstinado pela produtividade do trabalho.  Teorizado por Taylor, o modelo de produção que despreza o conhecimento dos trabalhadores, realizou mudanças na organização do trabalho e influenciou o consumo e circulação dos produtos. 

O objetivo era limitar os conhecimentos, os saberes-fazeres e o poder de barganha dos trabalhadores usando especializações fragmentadas. Nesse modelo de educação, cuja principal função é a formação de força de trabalho para o mercado, o estudante deveria ser preparado para as tarefas segmentadas com um bom grau de disciplina e obediência para atender as demandas de sua linha de produção  sem  questionamentos. A partir do esforço de guerra nos Estado Unidos o  modelo  de treinamento foi propagado internacionalmente carregando uma metodologia de educação industrial dominada pelo caráter utilitário que fornece apenas o treinamento necessário para que o trabalhador atenda às demandas da produção.

O final do século XX foi marcado pela crise do modelo fordista, resultado do limite da absorção dos excedentes de capital, levando a um regime de acumulação flexível e a um processo de formação de trabalhadores para processos de trabalho efêmeros.Nas décadas de 1950 e 1960, a expansão do modelo americano tornava obrigatório o aumento de produtividade no contexto global e a indústria japonesa passava por um processo de recuperação. No Japão a metodologia foi aprimorada pela empresa Toyota que inovou ao adicionar mecanismos, como o princípio de melhoria contínua e a flexibilidade na produção, que redesenharam a estrutura de educação. 

A expansão do toyotismo levou à flexibilização da produção mundial e das relações entre trabalhador e empresa. Isso gerou novos desafios para o sistema educacional. Elementos como polivalência e multifuncionalidade tornaram-se essenciais na educação dos trabalhadores porque, sob o nome de capital humano, o trabalhador passou a ser um meio de produção produzido obrigado a ocupar uma posição de trabalhador ‘empresário’. A pandemia representou uma aceleração na transição para o ambiente digital, sacudindo as relações de trabalho e pressionando a adoção de tecnologias que já eram conhecidas, mas engatinhavam. Até o final de 2019 a plataforma Zoom tinha 10 milhões de usuários ativos por dia, aṕos um ano de pandemia e isolamento social o número ultrapassa 300 milhões - um aumento espantoso de 3000%. 

Em junho de 2020 a Uninove demitiu mais de 300 professores por uma mensagem eletrônica na plataforma usada para ministrar as aulas de forma remota devido a pandemia global do coronavírus. Segundo informações do Sinpro (Sindicato dos Professores de São Paulo) as aulas online reduziram as barreiras físicas dos diferentes campi que a universidade possui e permitiram que um número maior de alunos pudessem acompanhar uma mesma aula. A lógica da demissão obedece a lógica do capital, ou seja, maximiza os lucros enquanto descarta os trabalhadores. 


Sérgio Feldmann de Quadros é doutorando na Faculdade de Educação da Unicamp. Sua área de estudo é a relação de trabalho e seu reflexo na educação. Sobre a situação que aconteceu ano passado ele comenta: “O exemplo das demissões na Uninove é bem representativo”. Para o pesquisador: “questiona-se que tipo de educação é essa em que um professor dá aula para 300 ou 400 alunos.” Ele explica que uma das características do trabalho plataformizado é justamente uma necessidade menor de professores para um mesmo número de alunos. 


Durante a pandemia uma parcela dos trabalhadores conseguiu atuar de dentro de casa. Sérgio coloca que os professores passaram a usar seus próprios recursos para darem aula. “Por um lado se era uma segurança, devido ao risco de contágio, por outro os trabalhadores passaram a assumir parte dos custos da produção. Por exemplo, os equipamentos são pessoais e quem paga as contas de luz etc. é o trabalhador”. Para ele os professores são um forte exemplo disso. 


Nenhuma das mudanças que observamos nos últimos 18 meses é exatamente nova, na verdade muitas das tecnologias usadas amplamente na pandemia já estavam disponíveis. Esses processos foram acelerados pelas condições impostas pelo avanço da COVID-19. Como exemplo, Sérgio fala dos trabalhadores de call center que já usam o modelo de trabalho remoto. Sobre como essas mudanças podem interferir na educação, Sérgio comenta que: “a formação dos trabalhadores demanda que eles se adaptem às novas tecnologias. O mercado demanda que os trabalhadores se adaptem às novas tecnologias. É possível que nas escolas aconteça uma formação voltada para esse trabalho, mas sempre lembrando que o capital necessita de capital de formações diversificadas, tendo em conta a divisão do trabalho uma divisão de formações diversificadas”.  Portanto, sempre terá espaço para que diversos modelos de educação coexistam.


Os autores Antunes e Augusto Pinto defendem uma reflexão sobre uma educação humanista e emancipatória. Para eles, os modelos de produção fordista e  toyotista influenciaram a formação da população mundial transformando-os em mercadoria. Dessa forma, o livro demonstra que a educação, historicamente, se subordina à lógica do capital. O pesquisador concorda com os autores e explica que a formação dos trabalhadores muda conforme o capital se transforma. Sérgio exemplifica que no processo de industrialização a formação dos trabalhadores foi elaborada e gerida pela burguesia industrial. Atualmente, o setor financeiro, com destaque para os bancos, tem liderado a produção de políticas educacionais, com base nos modelos de gestão empresarial do mercado financeiro. Os modelos de educação pensados por essa fração burguesa, além de contribuírem com a reprodução das desigualdades, se caracterizam pela formação de sujeitos submissos e que consentem com a sociedade burguesa neoliberal. 


 

Professora comenta os efeitos da exposição prolongada a dispositivos eletrônicos no desenvolvimento dos jovens
por
Carlos E. Kelm
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21/11/2021 - 12h

Por Carlos Daniel Englert Kelm

No livro “A fábrica de cretinos digitais”, Michel Desmurget descreve que pela primeira vez, filhos têm QI inferior ao dos pais. O neurocirurgião francês se baseia em diversos estudos para criticar os hábitos dos chamados ‘Nativos Digitais’. “Inúmeros especialistas denunciam a influência profundamente negativa dos dispositivos digitais atuais sobre o desenvolvimento”, afirma Desmurget.

A doutora em psicologia pela UFMG e professora, Carla Angeluci explica que os dispositivos digitais oferecem alguns riscos para a juventude, mas que não devemos nos precipitar: “É preciso entender que estamos vivendo um momento novo na história da informação, e diante de um fenômeno tão recente, não dá para concluir com precisão com o que estamos lidando. O que dá para dizer é que os dispositivos eletrônicos têm efeitos no desenvolvimento cerebral de crianças, por que já foram observados diversos fenômenos comportamentais novos ligados às telas”, frisa.

Teste de QI

Angeluci comenta os casos que têm sido observados: “Crianças que foram expostas a telas muito cedo, em alguns casos, confundem a interação física com a interação digital. O contato com telas é tão naturalizado que elas manuseiam objetos físicos como se fossem um celular mesmo, pressionando e passando os dedos nas paginas dos livros e outras superfícies”. No entanto, a psicóloga afirma que quase sempre casos como esses são passageiros: “Durante a infância, a criança passa por diversas fases, o cérebro está em constante mudança e aprendizado. Com o tempo, a criança vai conquistando uma compreensão mental e motora maior do mundo e essas questões geralmente são superadas”, explica.

Michel DesmurgetO ‘Efeito Flynn’, citado por Desmurget em seu livro, diz respeito a um fenômeno observado nas últimas décadas: na população mundial há uma tendência na qual filhos que são submetidos ao mesmo teste de QI que os pais, em média, têm um desempenho melhor. O neurocientista explica que nos últimos anos se observou o efeito contrário. Pela primeira vez os filhos teriam desempenho inferior. Para Desmurget, a principal causa disso seria a exposição exagerada a dispositivos eletrônicos.

Angeluci afirma que o Efeito Flynn não deve ser usado como um índice de risco: “O Efeito Flynn é um fenômeno muito interessante, mas não é uma regra. Eventuais alterações podem acontecer. Mas essa mudança observada pode sim ser um aviso para os pais que são muito liberais com relação à internet e celulares”

Para a psicóloga, não há como negar que exista um risco: “Existe de fato um aumento significativo nos casos de TDAH entre crianças. A gente observa um número grande de crianças imperativas, ansiosas ou com algum problema de aprendizado, e talvez o meio digital tenha um papel nisso, mas não dá para afirmar com certeza”,  avalia.

“Algo que se tem observado, principalmente na área da educação, é que a geração digital tem maior dificuldade com a leitura. Mesmo que sejam muito bem alfabetizadas, muita gente tem dificuldade para se concentrar em textos mais longos. Os jovens estão muito habituados a receber informações pela internet, e o tipo de informação que você encontra em sites como o twitter, instagram, etc, é sempre rápida e fragmentada, diferente de um livro”, comenta a professora. Angeluci também recomenda o livro ‘A geração superficial: o que a internet está fazendo com os nossos cérebros’, do jornalista Nicholas Carr, para quem deseja se aprofundar.

A instituição expõe obras já conhecidas, preterindo as novas técnicas artísticas, porém dando destaque para o momento político atual
por
Rafaela Reis Serra
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21/11/2021 - 12h
Bienal
Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque Ibirapuera, onde acontece a 34ª Bienal. Foto: Rafaela Reis Serra

 

Por Rafaela Reis Serra

A 34ª Bienal Internacional de São Paulo conta com mais de 1100 obras de 91 artistas de todos os continentes, ao mesmo tempo em que, as tecnologias atuais mais inovadoras não foram utilizadas para compor a exposição, fazendo o uso de maior parte de quadros, esculturas e projeções audiovisuais, objetos frequentes há muito tempo no cenário cultural. Entretanto, seu objetivo foi focar no presente momento político em que o País vive, mostrando que a arte sobrevive frente ao sucateamento da cultura promovido pelo Governo Federal.

A arte geralmente é o retrato do momento atual e, concomitantemente, a face vanguardista do futuro. A edição da Bienal deste ano, conta com muitos quadros de artistas já consolidados no mundo artístico; outros mais recentes, como a artista Grace Passô e é a primeira edição com maior representatividade indígena, como Jaider Esbell (1979-2021). Porém, sem tecnologias atuais como realidade virtual, realidade aumentada ou NTFs, muito presentes na esfera pública no momento vigente.

“Na trajetória da arte contemporânea, o tipo de experiência que sai para além do olhar, é uma coisa que vem se tornando cada vez mais comum, por exemplo, a Lygia Clark. É algo que vem para ficar no sentido de que houve uma espécie de esgotamento da visão, e os artistas estão procurando trabalhar com outros sentidos”, diz o curador e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Marcus Vinicius Fainer Bastos, sobre a arte contemporânea.

O título “Faz Escuro, mas eu canto”, em alusão aos tempos de repressão no Brasil (1964-1985) e, por conseguinte sua resistência, conta com obras como de Hélio Oiticica (1937-1980), Lasar Segall (1889-1957) e Antonio Dias (1944-2018). Segundo o curador Jacopo Crivelli Visconti, em entrevista à PUC, o título ressoa muito nítido no momento em que se está e, mais ainda, por tudo que se vive nos últimos meses com a pandemia, se comparado a ocasião em que se estava quando escolheram o tema. “Ao falar de escuridão, essa metáfora que o poeta coloca, estamos pensando mais numa situação política e social, questão que são parte da história do Brasil desde a colonização. Veio a pandemia e agravou de maneira muito evidente todas essas questões e o título se tornou ainda mais forte.”

Visconti esclarece que no título, baseado no poema do autor Thiago de Mello (1926), claramente está se vivendo um momento extremamente tenso e problemático de inúmeros pontos de vista, mas que apesar das circunstâncias, defende a necessidade e o desejo de cantar. “Para gente era o contraponto essencial, porque queríamos fazer uma Bienal que fosse nitidamente em resposta a tudo que vemos ao redor, mas que também conseguisse ter a coragem de não se limitar àquilo.”

A curadora Stephanie Guarido afirma que existem bastantes obras atuais que poderiam ter sido utilizadas em alusão à resistência e ao momento político atual, como as que estão presentes na exposição: as de Jaider Esbell, Daiara Tukano e Paulo Nazareth. “Porém, é sempre necessário relembrar a obra de artistas como Antonio Dias, este que faleceu recentemente e teve grande parte de sua produção interpelada pela ditadura militar e seus efeitos. Olhar o presente também é relembrar o passado, que nunca pode ser esquecido.

Guarido defende que a grande estrela são as questões políticas e principalmente indigenistas, logo, não crê que a virtualidade esteja presente na mostra. “As tecnologias são importantes, mas as ideias por trás das obras devem ser o maior fator para seleção.

 

A questão tecnológica

Para não falar que não há inovações da época presente, a Bienal apresenta uma experiência imersiva no andar térreo, logo em sua entrada, onde o expectador utiliza fones de ouvido, sendo sons da natureza ao fundo e a orientação de uma voz feminina - muito parecida com as vozes robóticas de aplicativos como Google Tradutor ou Google Mapas - com comandos como: “ande sem alguém por perto”, “coloque as mãos para trás” entre outros, permitindo que o público tenha um experimento singular.

Marcus Bastos afirma que a ausência de quadros em certas exposições é devido a um período da arte contemporânea que os artistas pararam de fazê-los, mas que a relação com eles é inesgotável: “a pintura, escultura, todos os formatos mais clássicos da arte são inesgotáveis, as pessoas sempre vão ter experiências muitos ricas em relação a essas mídias. A arte contemporânea deixou de fazer pinturas com tanta freqüência e tudo tem que ser adequado ao contexto.”

 

O que é a Bienal

A Bienal surgiu a partir de obras trazidas por Francisco Matarazzo, o “Ciccillo”, em 1951, ao Brasil, promovendo em São Paulo a reunião de variadas obras de diferentes artistas mundiais. Foi baseada na Bienal de Veneza, criada em 1895. Há 70 anos, a segunda bienal mais antiga do mundo acontece em São Paulo e seu nome é devido ao fato da exibição acontecer a cada dois anos. Este evento foi responsável por inserir a cidade paulistana no circuito mundial da arte contemporânea.

Segundo Agnaldo Farias, curador da 29ª Bienal de São Paulo, “A Bienal é o lugar do não cotidiano, é o lugar da invenção, é o lugar da liberdade. Mostra o que está acontecendo agora, o quê é mais radical, o quê é mais transgressivo, o mais ousado, porque o resto, os museus não contam”, além de manifestar o futuro da expressão e o “amanhã” da arte.

Com o crescimento da estratégia de marketing, a tecnologia se mostra, mais uma vez, a maneira mais eficaz de se adequar aos novos parâmetros dos consumidores.
por
Ana Luiza Pêgo
Anna Beatriz da Matta
Giovana Yamaki
Sofia Luppi
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01/12/2021 - 12h

 

Empresas investem em atendimento virtual por meio de avatares
Empresas investem em atendimento virtual por meio de avatares. | Montagem

 

As assistentes virtuais são, definitivamente, uma sensação do marketing digital. Com a função de humanizar a relação entre cliente e marca, as personagens trazem informações, oferecem soluções e tiram dúvidas. Todavia, nem tudo que envolve essa tendência é positivo. O fato da maioria das assistentes serem mulheres abriu margem para um grande número de assédios, tanto morais quanto sexuais. Desse modo, a comunicação entre o consumidor e a empresa se torna mais ágil e eficiente, porém essa facilidade pode ser problemática também.

Na realidade, a ideia é criar um avatar que carregue os valores da empresa e que através dele, as pessoas se identifiquem com os produtos e se tornem potenciais clientes. Além disso, as assistentes podem servir como cartão de visitas de uma determinada marca e/ou podem atuar como influenciadoras digitais. O propósito é ter a imagem de como a marca seria se fosse um indivíduo, o que potencializa o reconhecimento da marca, já que o “rosto” da personagem estará sempre atrelado a alguma ação da empresa.

Em suma, é preciso que a personalidade do personagem agrade o público alvo. Atualmente, vender apenas produtos já não é mais suficiente, é preciso vender valores e para isso, é preciso uma figura humana, nem que ela seja apenas virtual.

Em decorrência da adesão popular desses personagens, as empresas estão, cada vez mais, investindo nesse suporte on-line. Na atualidade, há uma variedade delas, como a Bia, do Bradesco; CB, das Casas Bahia; Sam, da Samsung; Nat, da Natura e a Lu, da Magazine Luiza. 

Conforme informam os dados do Magazine Luiza, a estratégia tem dado certo. Afinal, analisaram que 60% dos indivíduos que entram em contato com a assistente não precisam dialogar posteriormente com o SAC.

Sob essa perspectiva, nota-se um crescimento e alcance significativos das assistentes virtuais. No ano passado, a Ilumeo, empresa de ciência de dados, fez uma pesquisa que contabilizou o aumento de 47% na utilização de serviços com assistentes virtuais por voz.

A Lu registrou 8,5 milhões de interações no primeiro semestre de 2020. Além disso, sua inteligência artificial evoluiu. Agora, conta com a plataforma IBM Watson Assistant, que possui uma variedade de programações capazes de executar diferentes serviços e passou por atualizações para englobar informações a respeito do rastreio de pedidos e curiosidades sobre ela mesma.

Outra robô influenciadora que teve a adesão do público no ciberespaço é a Mara, da Amaro. Contando com mais de seis mil seguidores no Twitter, ela compartilha, na rede social, informações sobre a marca e até mesmo utiliza memes e comenta sobre notícias que viralizam na internet.

Desde que as sessões de fotos presenciais com equipes foram suspensas, devido à pandemia da Covid, a fashiontech começou a buscar alternativas para produzir conteúdos remotamente. “A modelo virtual foi projetada para atender às demandas da equipe de marketing e produtos para a criação das campanhas e lookbook em tempos de isolamento social”, explica Luciana Cardoso, diretora de criação da Amaro, para a Harper’s Bazaar Brasil.

Tendo como intuito ajudar a empresa em diferentes atividades, a personagem Mara foi criada através de uma técnica mista que contou com o trabalho de diversos profissionais, como fotógrafos, modelos, designers e programadores.

A Amaro criou um perfil mais humanizado para a Mara, atribuindo data de aniversário, preferências e gostos. Inclusive, no site da marca é exposto que seu visual é baseado em dados e sua personalidade em seu mapa astral.

Uma outra estratégia com finalidade de gerar conexão com o público foi uma ação da marca de incentivo à autoestima. Através de uma enquete no Instagram da Amaro, a modelo virtual apresentou alternativas para mudar de visual. Cerca de 75% dos participantes optaram pela transição capilar da assistente. No decorrer do movimento, ela relatou nas redes como estava sendo o processo de deixar as químicas e aceitar sua nova versão.

Entretanto, precisamos ressaltar que o assédio virtual também é uma realidade. Um estudo chamado “I’d Blush If I Could” (“Eu ficaria corado se pudesse”), divulgado pela Unesco em 2019, revelou que ao serem assediadas verbalmente, as assistentes virtuais são passivas.

O fato dessa tecnologia ser interligada à figura feminina, acarreta muitas vezes que ela seja submetida à misoginia, tal como as mulheres reais. E, dependendo da área do negócio, a imagem feminina pode não ser vista como ideal, principalmente, em assuntos de cunho masculino. Empresas de finanças e investimentos usam vozes masculinas, pois o público dá mais credibilidade.

“Quando se pensa que o mundo da tecnologia tem um público majoritariamente masculino, branco, heterossexual, e muitas vezes, de uma classe econômica com um certo poderio econômico, essas questões estruturais para a sociedade não são tão relevantes para essas pessoas que estão construindo o chatbot.”, disse Livy Real, doutora em Linguística pela Universidade Federal do Paraná, ao Jornal da USP.

Em 2020, o Bradesco registrou 95 mil mensagens ofensivas para a Bia. Em campanhas publicitárias, o banco se posicionou contra o assédio que sua assistente recebeu, comunicando que ela não tolera mais esse tipo de ataque.

Valéria Vieira, fundadora da Startup Langue, apontou para o Jornal da USP que, ao utilizar uma voz feminina, as assistentes são associadas a um imaginário machista, que liga a mulher ao cuidado, afeto e a subserviência.

Por conta dessas situações, a Unesco, em 2020, lançou a campanha #HeyUpdateMyVoice (“Ei, atualize minha voz”), onde mulheres gravassem respostas às ofensas sofridas por assistentes virtuais. A instituição orientou que essas tecnologias respondessem de forma mais contundente, auxiliando na educação da sociedade contra o assédio.