Apontada como uma ferramenta no combate às mudanças climáticas, a nuclearização envolve questões colaterais complexas
por
Vítor Nhoatto
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30/05/2025 - 12h

O setor de energia respondeu em 2024 por 68% de toda a emissão de CO2 no mundo, segundo relatório da United Nations Environment Programme (UNEP). O gás é o principal causador do aquecimento global e precisa diminuir drasticamente nos próximos anos, apontando para a necessidade da chamada transição energética e descarbonização. Mudar a forma como se produz energia é um desafio, e a nuclearização ressurge como uma possível resposta.

A produção de energia a partir de material nuclear é antiga, e de forma simplificada funciona em algumas etapas. O combustível radioativo (urânio) tem seus átomos divididos no processo de fissão, liberando uma grande quantidade de energia que aquece a água em torno do reator e o vapor gerado acaba movimentando turbinas na usina que geram a energia. 

O que chama a atenção para a modalidade é a produção de grandes quantidades de energia com pouco material e baixa pegada de carbono em comparação aos combustíveis fósseis. De acordo com dados de 2020 da German Environment Agency levantados pela organização holandesa fundada em 1978, World Information Service on Energy (WISE), para cada Kwh gerado por usinas nucleares, cerca de 117 gramas de CO2 são emitidos. No caso do carvão e do gás natural as médias giram em torno de 950 e 440 gramas respectivamente. 

Cláudio Geraldo Schön, doutor em Ciências Naturais pela Universität de Dortmund, mestre em Engenharia Metalúrgica pela Universidade de São Paulo (USP) e professor titular na instituição destaca o potencial e a evolução nuclear com o passar dos anos. "Expandi-la poderia substituir as usinas termelétricas, diminuindo a geração de gases de efeito estufa [...] “o processo é continuamente atualizado, e resulta em avanços mesmo sendo uma tecnologia consolidada”.

Foi na extinta União Soviética que a primeira usina nuclear para uso doméstico começou a funcionar para contextualização, a Obninsk em 1954. Em seguida vieram outras, como a de Calder Hall no Reino Unido em 1956 e Shippingport nos Estados Unidos da América (EUA) em 1957. No Brasil, a usina Angra I foi a pioneira, com operações iniciadas em 1985.

Cinza e não verde

No entanto, o cinzento urânio traz um efeito não tão expressivo. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), se a capacidade de produção nuclear triplicasse, a redução na emissão de CO2 do setor de energia seria cerca de apenas 6% devido principalmente à grande quantidade de carbono liberada na construção de reatores e usinas, que exigem grandes quantidades de recursos e décadas até começarem a funcionar, e para a mineração do urânio também. 

Além disso, a pegada de carbono das principais fontes renováveis de produção de energia são bem mais baixas que a nuclear. Ainda de acordo com o levantamento de 2020 da German Environment Agency, no caso da solar, cada Kwh emite algo em torno de 30 gramas de CO2, para a eólica a cifra é inferior a 10 e para a hidrelétrica de apenas 4 aproximadamente. 

Para o especialista sênior em energia nuclear e integrante da WISE International, Jan Haverkamp, a energia nuclear não é efetiva e nem tem a emergência climática como foco. “O uso do argumento climático é uma cobertura para outros interesses [...] os países com uso tradicional de energia nuclear não a desenvolveram devido às alterações climáticas, o fator inicial foi militar como EUA, China, Rússia e Brasil. Já para outros países era um sinal de importância, como no caso da Romênia, Bulgária e Coreia do Sul. Ou ainda visando a redução da dependência do petróleo como na Alemanha e Reino Unido, ou ainda uma tentativa fracassada de desenvolver uma fonte barata de energia como na Suécia e Canadá”.

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Última usina nuclear na Alemanha começou a ser demolida em 2023, mas novo governo de extrema-direita avalia reativar a base; “resumindo, para alguns é geopolítica” comenta Jan Haverkamp - Foto: Thomas Frey / DPA / Picture Alliance

Atualmente existem 437 reatores nucleares em funcionamento no mundo, que representam 14% de toda a energia gerada no mundo, de acordo com a World Nuclear Association (WNA). Os EUA ocupam a primeira posição do ranking com 96 unidades, com França, China e Rússia em seguida com 56, 55 e 37 cada, respectivamente. O país asiático tem planos inclusive de se tornar uma potência nuclear, e até 2035 ter o dobro da capacidade atual dos EUA. 

No caso do Brasil, a geração nuclear responde por apenas 2% da matriz energética, produzidos nas usinas Angra I e Angra II. Ambas fazem parte da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, ao lado da Angra III, ainda em obras, e o complexo começou a ser construído durante a ditadura militar no país.  

Aquilino Senra Martinez, doutor em Ciências da Engenharia Nuclear pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia da Presidência da República explica as nuances da modalidade: “O seu uso para geração de eletricidade depende do contexto de cada país. Em lugares com alta demanda e poucos recursos renováveis, a sua expansão pode ser estratégica. No cenário das mudanças climáticas, ela não pode ser descartada, mas também não deve ser tratada como solução única".

Com dimensões continentais e clima tropical, o Brasil se destaca no cenário mundial justamente pelo seu potencial de produção energética renovável, e hoje é referência no quesito. O Balanço Energético Nacional (BEN) de 2024, feito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) em parceria com Ministério de Minas e Energia (MME), constatou que foi de 49% o índice de energia proveniente de fontes renováveis. 

Mesmo assim, no fim do ano passado a usina Angra I teve seu licenciamento para operação renovado por mais 20 anos pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão do Governo Federal, e demandará investimento de R$3,2 bilhões nos próximos 3 anos. A continuação das obras de Angra III seguem em análise, mesmo com a administradora das usinas, a empresa de capital misto Eletronuclear, tendo uma dívida de R$6,3 bilhões com a Caixa e o Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). 

As operações no terceiro reator foram paralisadas em 2015 e voltaram somente em 2022 após reajuste do orçamento, com 65% das obras concluídas. Isso demandou um investimento até então de R$7,8 bilhões, e apesar da conclusão não ter sido incluída no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado em 2023, estima-se cerca de R$20 bilhões necessários para tal.

Para Rárisson Sampaio, porta-voz da Frente de Transição Energética do Greenpeace Brasil, essas cifras revelam como a nuclearização desvia dinheiro necessário das fontes renováveis e ameaça um desenvolvimento sustentável e acessível. “O investimento em usinas nucleares não se conecta com a realidade do país, que poderia direcionar tais recursos para outras áreas, fortalecendo políticas como o Luz para Todos, que garante acesso a fontes de energia limpa, segura e barata, combatendo a pobreza energética e alinhando-se aos ODS da Agenda 2030”, diz Sampaio. 

Criado em 2003, o programa do Governo federal tem como intuito universalizar o acesso à energia no país, especialmente em áreas afastadas e periféricas e já impactou 17,5 milhões de pessoas. Para essa nova fase, uma das frentes é justamente possibilitar a instalação de placas solares em domicílios de baixa renda. 

Jan Haverkamp, da WISE, defende como em muitos países o investimento na energia nuclear desvia efetivamente o foco e dinheiro para medidas concretas no combate às mudanças climáticas, o que não é verídico: “As fontes de energia renováveis ​​produzem atualmente mais energia do que a nuclear em todo o mundo, e essa quantidade continua aumentando. A geração nuclear está mais ou menos estável há 3 décadas. A Finlândia, por exemplo, está atrasada na implementação de energia eólica desde que decidiu construir a usina Olkiluoto 3, que sofreu um atraso significativo”.

Segurança x planejamento

De acordo com estimativas de 2024 da Agência Internacional de Energia, a demanda energética global aumentará 4% ao ano entre 2024 e 2025, cifra bem maior que os 2,5% registrados em 2023. Os principais impulsionadores serão o maior uso de ar-condicionado devido justamente às mudanças climáticas, a progressiva eletrificação da frota de veículos, imprescindível na descarbonização do setor, e pelo avanço das Inteligências Artificiais (IA). 

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Demanda por energia pelas big techs só cresce, tal qual o uso de água potável para resfriamento dos computadores, o que aponta para uma necessidade de consciência ao usar IAs e a internet -  Foto: Microsoft / Divulgação

Os data centers deverão mais que duplicar as suas necessidades de energia até 2030 segundo a AIE, ultrapassando em alguns anos a energia consumida pelo Japão. Corroborando com esses indicativos, o Ministério de Minas e Energias realizou um estudo que aponta para um aumento de 25% na necessidade de produção energética brasileira até 2034. Nesse cenário, uma questão levantada na transição energética é a segurança e expansão necessárias para a manutenção sadia da sociedade.

Carlos Schön argumenta sobre o papel da energia nuclear, portanto, e as questões em relação ao clima: “Nós produzimos muita energia, mas ainda é pouco considerando o tamanho do país [...] a energia nuclear é a principal aliada das fontes renováveis, justamente porque essas dependem de fatores extrínsecos (sol na geração fotovoltaica, vento na geração eólica) que por sua própria natureza são flutuantes”.

Uma vez extraído do solo, o urânio pode abastecer por décadas uma usina nuclear, as quais em média podem funcionar por 40 anos, com a possibilidade de extensão, como no caso de Angra I, em funcionamento desde 1985 e renovada até 2044. Tudo isso acontece também sem depender de fatores externos como o vento, que pode danificar as hélices das turbinas eólicas, as nuvens que afetam a produção solar e a variação dos reservatórios que impactam as hidrelétricas. 

Contudo, Ana Fabiola Leite Almeida, professora do Departamento de Engenharia Mecânica e Produção da Universidade Federal do Ceará (UFC) e Mestre em Química pela instituição, destaca que o problema reside no planejamento energético. Mesmo que a produção diminua, é algo manejável com vontade. “O risco não está nas renováveis em si, mas na falta de planejamento. Em cenários críticos, pode haver queda média de 20 a 40% na produção energética dependendo da região, mas com previsibilidade climática, diversificação geográfica e sistemas híbridos conseguimos mitigar esses efeitos”, explica Almeida.

Em períodos como de ondas de calor em que a demanda energética aumenta, fontes como as termelétricas passam a ter maior participação na produção de energia, e como são mais caras que as hidrelétricas, a conta de luz pressiona o bolso da população. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no acumulado de 2023 o aumento na tarifa foi de 9,52%, bem acima da inflação, de 4,62% no mesmo período. 

Relatório de 2024 do Tribunal de Contas da União (TCU) em parceria com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Empresa de Pesquisa Energética aponta que a nuclearização não resolveria justamente essa questão. A energia nuclear produzida em Angra III aumentará em 2,9% a conta de luz por ano e custará à população até 77 bilhões em despesas na contratação se a obra for concluída.

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“Existe todo um investimento que pode ser perdido, mas não justifica a continuidade de Angra III. É o resultado do  mal planejamento e desalinhamento com a política energética aponta Rarisson do Greenpeace - Foto: Eletrobras / Divulgação

O mesmo estudo do TCU destaca que as despesas com a obra “parada” chegam a R$2 bilhões por ano e uma desistência definitiva custaria cerca de R$13 bilhões, menos que o montante necessário para conclusão. Países como Áustria, Portugal e Dinamarca não classificam a energia nuclear como uma fonte limpa, e Itália e mais recentemente Alemanha, desativaram seus reatores ainda em funcionamento.

No caso do Brasil em relação ao setor de energias, as renováveis se destacam em várias frentes. Segundo o “Atlas Eólico” de 2022 do governo do Espírito Santo em parceria com a Embaixada Alemã, o potencial de geração pelo vento somente no estado é de 160 GWh, quase um terço da demanda anual do país hoje.

A energia solar também é outro enorme potencial, levando em consideração que o Brasil é o país que mais recebe irradiação solar no mundo, até então desperdiçado. Em 2023 a companhia de consultoria BloombergNEF apontou que se as políticas de incentivo à modalidade permanecerem iguais, em 2050 a capacidade de geração será de 121 GW por ano. Na ocasião, o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar (Absolar), Ronaldo Koloszuk, defendeu que isso pode acontecer ainda em 2040 com apoio e expansão do setor. 

Ana Fabiola destaca: "O Brasil tem um dos maiores potenciais renováveis do mundo, mas para isso precisamos investir em inovação, infraestrutura de rede, armazenamento e educação técnica [...] é preciso ter suporte de armazenamento, interligação entre regiões e tecnologias de resposta à demanda. As fontes renováveis podem sim suprir a demanda crescente se houver vontade política e investimento contínuo", afirma. 

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Maior parque solar do mundo fica em Minas Gerais e foi inaugurado em 2023, fazendo com que a capacidade do estado chegue a 8 GW por ano - Foto: Solatio / Divulgação

Potencial radioativo denso

Falando em demandas futuras e recursos para sanar problemas sem gerar mais, uma outra implicação da energia nuclear gira em torno dos resíduos perigosos da atividade. A World Nuclear Association aponta que o resíduo nuclear equivalente à demanda de uma pessoa por um ano é do tamanho de um tijolo. Pode não parecer tanto de início, mas o problema está na radioatividade do material. 

A meia vida do urânio 235, o tempo que o material leva para se desintegrar e deixar de ser extremamente radioativo, gira em torno de 700 milhões de anos. Durante esse tempo as substâncias líquidas e sólidas precisam ficar armazenadas e isoladas do mundo, seja em reservatórios subterrâneos, piscinas gigantes ou toneis de chumbo. Não existe hoje uma solução para esse material, e como os primeiros usos são do século passado apenas, respostas sobre o comportamento dele também não foram encontradas. 

Isso em si já acende um alerta pois relega uma questão das gerações passadas às futuras, e a possível fuga de material radioativo das usinas pode colocar em risco a segurança nacional com a produção de bombas. Mas olhando para a história mais uma vez, a situação se complica. Em 1986 ocorreu na atual Ucrânia o famigerado desastre nuclear de Chernobyl, zona até hoje inabitável. A explosão da usina contaminou uma área de milhares de quilômetros ao seu redor, causou milhares de mortes e adoeceu os que resistiram. Um caso mais recente foi em Fukushima no Japão em 2011, que apesar de menor e diferente, reforça o cuidado exigido. 

Aquilino Senra afirma que a questão é muito relevante no debate atual, mas avanços foram feitos e que não deve ser a única levada em consideração: “É essencial que seja considerado dentro de um contexto histórico e tecnológico, à luz dos avanços obtidos nas décadas subsequentes e da comparação com outras fontes de geração de energia, como as fontes fósseis, que também provocam milhares de mortes anuais em decorrência da poluição atmosférica”.

A Organização das Nações Unidas estima que por ano a poluição atmosférica mata entre 7 e 8 milhões de pessoas ao redor do mundo. Somente no ano de 2021, 8,1 milhões de pessoas morreram, além do fator contribuir decisivamente para o desenvolvimento de câncer de pulmão e doenças respiratórias. 

Fazendas de turbinas eólicas, sítios de placas solares e usinas hidrelétricas também estão sujeitas a acidentes e impactam o meio ambiente, mas em um grau muito menor. Além dos grandes desastres, existe a possibilidade de vazamento de material radioativo. No Brasil, por exemplo, a Comissão Nacional de Energia Nuclear constatou um caso em 2022 na unidade de Angra I, no qual a água contaminada chegou ao mar. Na ocasião, a Eletronuclear foi multada em mais de R$2 milhões de reais pelo órgão

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ONG fez protestos em frente a usina de Angra I e relembrou o desejo ilegal de milhões de litros de água contaminada pela usina em 1986 - Foto: Greenpeace Brasil / Divulgação

Rárisson do Greenpeace destaca: “a energia nuclear não tem lugar em um futuro seguro, limpo e sustentável. A energia nuclear é cara e perigosa. Apesar de oferecer energia não intermitente, há outras soluções no país que podem ser mais eficientes, seguras e baratas [...] só porque a poluição nuclear é invisível não significa que seja limpa, nessa conta toda, a energia nuclear é inexpressiva”.

Mesmo assim, nos últimos anos empresas e nomes do vale do silício floresceram no cenário da nuclearização em defesa dos chamados Small Modular Reactors (SMR), em tradução livre, pequenos reatores modulares. Segundo a Agência Internacional de Energia, as unidades menores podem ser uma solução para a demanda crescente por energia dos data centers, e por serem menores, construídos em uma fábrica e depois enviados ao local de destino, podem baratear os custos.

Com um tempo de construção diminuído para cerca de 5 anos em comparação aos reatores convencionais e cinco vezes menores em tamanho, o primeiro SMR instalado no mundo data de 2023 na China, o Linglong One. A capacidade do reator será de 1 GW quando entrar em operação regular segundo a Corporação Nacional de Energia Nuclear da China. Mesmo assim, de acordo um estudo independente da Universidade de Stanford que avaliou os dados preliminares da empresa norte-americana NuScale Power, mais lixo radiativo é gerado e há maior dispersão de energia no interior dos SMRs.

Os principais projetos na área ainda vão levar tempo também, com expectativa de começarem a operar em meados da próxima década apenas, como o da britânica Rolls Royce. Ainda existe a startup de Bill Gates, Terra Power, com expectativa que o seu reator em Wyoming, o estado menos populoso do país, entre em operação no começo de 2030. No entanto, nessa data as emissões de CO2 na atmosfera já deverão ter caído 42% para que o aquecimento fique em 1,5 graus celsius de acordo com o relatório de 2024 da United Nations Environment Programme.

 “Não é surpresa que tecno-oligarcas como Gates, Musk, Zuckerberg e Bezos sejam especialmente atraídos pelas ideias por trás de pequenos reatores nucleares modulares. Mas eles não percebem que essas tecnologias são fundamentalmente diferentes da internet ou mesmo das estruturas de energia renovável, incluindo armazenamento, com custos mais elevados em comparação com sistemas totalmente renováveis, tempos de desenvolvimento muito mais longos e sérios riscos”, alerta Jan Haverkamp da WISE International.

Esclarecendo dúvidas sobre os riscos em uma conversa com Luiz Padulla
por
Clara Dell'Armelina
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05/05/2025 - 12h

O mundo está farto de plástico. Estão presentes em utensílios, móveis, roupas e, agora, também nos alimentos, mas não para por aí, estudos recentes, como o feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), comprovam a existência de plástico acumulado no corpo humano. Estamos falando de microplásticos, pequenas partículas de plástico com dimensões inferiores a 5 milímetros causadoras de danos tóxicos aos seres vivos. 

A presença de plástico nos oceanos foi detectada pela primeira vez na década de 70 e só em 2004, com o pesquisador Richard Thompson, que tivemos o conhecimento dos "microplásticos". Entre 2010 e 2020 foi quando  identificaram a presença de microplástico em toda a cadeia alimentar, mas só a partir de 2023 que as pesquisas se voltaram para mapear seus impactos na saúde humana. O professor, biólogo, doutor e autor do blog "Biólogo Socialista", Luiz Fernando Padulla, conversa sobre o assunto com a repórter da AGEMT. Confira!

Pressão do governo Trump sobre instituições de ensino provoca medo sobre fuga de cientistas
por
João Paulo Moura
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05/05/2025 - 12h

Instabilidade é um rótulo que nenhuma nação deseja carregar. Seja na economia ou na educação, viver em um lugar de incertezas gera apreensão a todos. E, embora Donald Trump tenha recém completado 100 dias no cargo de presidente, graças às medidas adotadas, os cientistas se encontram em um mar de insegurança nunca vivido nestas últimas décadas. Columbia, Princeton e a Universidade da Pensilvânia sofreram com os cortes e ameaças de Donald Trump. Columbia teve US$ 400 milhões em subsídios federais suspensos devido à casos de assédio a estudantes judeus. Harvard foi uma das universidades que negou as demandas da Casa Branca.

Em consequência, no dia 14 de março, o Departamento de Educação anunciou o congelamento de US$ 2,3 bilhões em subsídios para a instituição. "Uma das grandes vantagens comparativas que os EUA tinha era sua capacidade de atração e fixação de cérebros de pesquisadores de outros países, principalmente do Sul Geopolítico”, diz Cristina Pecequilo, doutora em ciência política pela USP e professora de relações internacionais da UNIFESP. Assim, se os EUA deixarem de ser atrativos, os pesquisadores se moverão a outras nações, e com isso haverá uma perda de conhecimento de ponta”, ressalta Pecequilo em entrevista à AGEMT.    

As ações tomadas pelo governo Trump provocaram um temor generalizado entre os cientistas com medo de uma possível fuga de cérebros. O termo se refere ao processo de migração de pesquisadores, cientistas e profissionais altamente qualificados. Em pesquisa realizada pela revista Nature, dos 2000 pesquisadores consultados no levantamento, 75% consideram sair do país nos próximos anos. Desde que assumiu a presidência dos Estados Unidos no dia 20 de janeiro e, em seu primeiro dia de mandato, revogou 78 ordens executivas do governo anterior, retirou o país da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do acordo de Paris. Durante os três meses seguintes, as ações tomadas pelo governo se intensificaram, principalmente no setor econômico.  

Donald Trump segurando decreto no salão oval da casa branca
Donald Trump exibe decreto assinado no dia 20 de janeiro. Foto: Anna Moneymaker/Getty Images 

No dia 2 de abril, intitulado pelos republicanos como o “dia da libertação”, iniciou-se uma guerra comercial entre os EUA e o mundo. Com a meta de corrigir o déficit comercial internacional do país, o governo norte-americano impôs taxas a 185 países. As altas porcentagens geraram respostas das nações, principalmente por parte da China que revidou com um grande pacote de alíquotas sobre as commodities americanas. Mas as medidas não pararam somente no setor econômico. Dentro das universidades do país, o temor do corte de financiamento e da fiscalização do conteúdo dos cursos aumentou.

A tensão entre o governo Trump e as instituições de ensino superior se elevou a partir do mês de março. Investigações de programas de diversidade e inclusão foram abertas em 45 universidades, com exigências sobre a auditoria de conteúdos e as condutas de alunos em favor da Palestina. Em resposta a esse cenário, instituições e países ao redor do mundo começaram a se movimentar para atrair os cientistas que se encontram nos EUA. A Universidade de Aix-Marselha, localizada na França, lançou uma iniciativa chamada Safe Place for Science, que investirá 15 milhões de euros para apoiar 15 pesquisadores. A União Europeia lançou a campanha Choose Europe for Science, como um refúgio para a liberdade acadêmica. Bélgica, Holanda e países nórdicos vêm oferecendo bolsas e infraestrutura de ponta para pesquisadores norte-americanos. 

Além das universidades europeias, China e Índia se consolidam como potenciais concorrentes dos pesquisadores estadunidenses. “Eu destacaria a China como uma potencial concorrente, até porque basta lembrar que todos estes outros países, principalmente a França tem problemas com forças políticas conservadoras anticiência. Além dela, mencionaria igualmente a Índia, que tem investido pesadamente em ciência e tecnologia”, completa Pecequilo. 

Nos últimos anos, a China despontou como a líder mundial em número de artigos científicos publicados. Segundo Ministério de Ciência e Tecnologia da China, em 2024, o país destinou mais de US$ 496 bilhões para pesquisa e desenvolvimento. Esse valor corresponde a 2,68% do Produto Interno Bruto (PIB) chinês, sendo o segundo maior investidor mundial em pesquisas, atrás apenas dos Estados Unidos. 

A Índia também tem se destacado como uma potência emergente em ciência e tecnologia, apesar de ainda apresentar desafios estruturais. O país investe 0,64% de seu PIB em pesquisa e desenvolvimento. Entretanto, esse investimento tem crescido de forma constante, dobrando na última década. O governo indiano é o principal financiador, respondendo por mais da metade do total, com destaque para agências como o DRDO (Defesa), o Departamento de Espaço e o Departamento de Energia Atômica. 

Apesar das incertezas internas e das ameaças que pairam sobre o sistema científico dos Estados Unidos, a ciência mundial está encontrando novos centros. Essa reconfiguração global do conhecimento pode redefinir o papel dos EUA como epicentro da inovação e da produção científica.

Documentário I’m Not a Robot instiga o telespectador a refletir sobre a evolução das máquinas
por
Vítor Nhoatto
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08/04/2025 - 12h

Não sou um robô, uma etapa de checagem comum ao navegar na internet e uma sentença obviamente verdadeira, ou talvez não. O curta-metragem de co-produção holandesa e belga de mesmo nome, problematiza o chamado teste Captcha, quando a protagonista Lara (Ellen Parren, produtora musical, entra em uma crise existencial ao não conseguir provar sua humanidade.

Logo de cara o enredo de Victoria Warmerdam, também diretora da obra,  pode parecer apenas cômico, e a interpretação de Parren colabora para essa atmosfera. Os diálogos curtos e a indignação diante de uma suposta certeza de Lara prendem a atenção do telespectador ao fazer com que haja identificação com a situação. Provavelmente todos nós já erramos um destes testes simples em algum momento.

A história com pouco mais de 20 minutos continua com a indicação que a personagem tem a chance de ser 87% um robô, segundo um quiz online, e a essência incômoda da ficção científica começa a reluzir. Conversas entre humano e máquina existem há cerca de 60 anos, com a criação do chatbot Eliza, e com o avançar dos anos é cada vez mais comum, de fato.

Seja aquele número para marcar consultas ou o serviço de atendimento ao cliente das operadoras, a Inteligência Artificial rodeia as esferas da vida cotidiana e vem evoluindo rapidamente. Tome como exemplo o robô humanoide que já foi capa de revista e é considerada cidadã saudita, Sophia, da Hanson Robotics desenvolvido em 2015. Ou ainda os influencers virtuais com milhões de seguidores do Instagram hoje como a carismática Lu da empresa de varejo brasileira, Magazine Luiza.

Robô Sophia
Sophia foi inclusive ao Talk Show do apresentador norte-americano Jimmy Fallon - Foto: Hanson Robotics / Divulgação

Parece que a barreira entre o físico e digital, natural e artificial vem sendo quebrada, como aborda a obra de Margareth Boarini, “Dos humanos aos humanos digitais e os não humanos”, lançada em julho do ano passado pela editora Estação das Letras e Cores. O primeiro livro da doutora em tecnologias da inteligência e mestre em comunicação se aprofunda nesses casos de coexistência entre robôs e pessoas, porém, até onde se sabe as diferenças entre máquinas e humanos são perceptíveis, ainda. 

Mas como uma boa teoria de ficção científica, o documentário explora justamente um possível futuro da humanidade, em que máquinas e humanos serão indistinguíveis, A saga de Lara por respostas acaba com a revelação de que Daniël (Henry van Loon), marido da personagem, a encomendou sob medida há alguns anos, como se faz com uma roupa hoje.

Suas memórias, sentimentos e até mesmo relações com outras pessoas, ou robôs, são todas fabricadas, como uma versão muito mais avançada do robô Sophia. A comédia permeia a narrativa um tanto quanto impensável aos olhos de hoje, mas curiosa. A seriedade da executiva da empresa que fabricou Lara, Pam (Thekla Reuten) cria uma atmosfera cômica ao assunto, completada pela tranquilidade que Daniël fala sobre sua “aquisição”.

Parren entrega uma atuação que transborda indignação, e o trabalho cinematográfico é inteligente, com cortes que acompanham a visão de Lara. Sobre o ambiente que o filme se passa, todas as gravações foram no CBR Building em Bruxelas, e a ambientação feita com cores vibrantes e apenas carros de época no estacionamento propõe um contraste entre antigo e moderno, frio e robótico, quente e humano. 

O desfecho se dá com o desejo da protagonista de ser dona do próprio destino, relegando o fato de não poder morrer antes de seu “dono”. Isso pode ser visto talvez como uma negação em aceitar a única coisa que a diferencia de um humano, ou como uma mensagem da autora da obra sobre uma rebelião das máquinas.

Fato é que Lara se joga do topo do prédio, em um take muito inteligente por parte da direção ao filmar de cima, e que apesar de pesado e grotesco consegue ser engraçado e não desagradável aos olhos. Tal qual uma morte comum, há muito sangue saindo do corpo, as necessidades fisiológicas também são como de humanos, mas após alguns instantes a robô volta à vida.

Lara e Daniel em um Volkswagen Fusca azul
Com cinematografia cativante e enredo inesperado, é um Sci-Fi cômico e dramático - Foto: Indie Shorts Mag / Reprodução

Incômodo e perspicaz são boas palavras para definir a quinta produção de Warmerdam, que a fez faturar uma série de prêmios internacionais incluindo o Oscar de Melhor Curta-metragem deste ano. Sua produção também se destaca por ser carbono neutro, com o plantio de uma agrofloresta na Holanda para compensar as emissões de gás carbônico (CO2) da obra.

I’m Not a Robot está disponível de forma gratuita no YouTube desde o dia 15 de novembro de 2025 no canal The New Yorker, com legendas apenas em inglês ou holandês. Mesmo com essa barreira linguística, o choque final é inevitável, e a reflexão provavelmente também, se o seu cérebro não estiver se perguntando se você pode ser também um robô.

Cientistas brasileiros deixam o País em busca de melhores oportunidades no mercado científico
por
Brenda Martins
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19/11/2024 - 12h

Por Brenda Costa Martins

 

Enquanto nossos melhores pesquisadores são acolhidos por laboratórios estrangeiros e embarcam em direção aos países que valorizam a academia e a ciência, ficamos à margem das grandes inovações e descobertas científicas, como espectadores de um progresso que poderíamos estar liderando. A formação de cientistas no Brasil enfrenta uma crise profunda, marcada não por apenas dificuldades estruturais como a escassez de equipamentos em Universidades e laboratórios, mas também pela falta de incentivo à estudantes para que sigam na área acadêmica de pesquisas, além das oportunidades limitadas desse marcado no país. Nos últimos anos, temos assistido a uma crescente “fuga de cérebros” — fenômeno em que profissionais qualificados, principalmente cientistas e pesquisadores, optam por desenvolver suas carreiras no exterior, sendo atraídos por melhores condições de trabalho e valorização profissional. Fuga que tem sido alimentada pela escassez de investimentos no campo da ciência e da tecnologia no país.

Desde 2015, cortes orçamentários intensos afetaram diretamente a manutenção de bolsas de estudo, o financiamento de projetos de pesquisa, bem como a continuidade de programas de pós-graduação em diversas áreas. Com menos verbas, muitos laboratórios foram fechados e projetos interrompidos, situação que acabou por criar um ambiente de insegurança e instabilidade para jovens pesquisadores que desejam contribuir com o avanço científico no país.

Nos centros de excelência, como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e a Universidade Federal do ABC (UFABC) doutores e mestres formados com alto nível de competência se deparam com um mercado de trabalho retraído. Apesar de contar com instituições de ensino que formam profissionais altamente capacitados, os cortes e as limitações severas no mercado de trabalho continua a fazer com que esses cérebros embarquem para o exterior buscando oportunidades de maior rentabilidade e visibilidade pois para muitos desses cientistas, o ambiente brasileiro se mostra inviável para o desenvolvimento de suas carreiras.  Mesmo entre os profissionais que conseguem uma colocação, as condições de trabalho são frequentemente limitadas, com infraestrutura insuficiente e salários que não condizem com o nível de formação e as exigências da carreira científica.

Esse êxodo de cientistas gera impactos econômicos e sociais observados em longo prazo. Ao investir na formação desses profissionais e, em seguida, vê-los partir para outros países, o Brasil perde o retorno desse investimento, bem como a possibilidade de desenvolver inovações e avanços tecnológicos que poderiam impulsionar setores como saúde, agronegócio e tecnologia. Fato que evidencia outro problema: Não é preciso investir apenas na educação básica e incentivo aos jovens cientista se, no futuro, eles não terão um lugar nas grandes corporações, já que as poucas que existem no país continuam não oferecendo benefícios tão competitivos quantos os de vagas alocadas no exterior, sedes dessas empresas.

Para cientistas como Paula Rezende, doutora em Biomedicina, a decisão de deixar o Brasil é dolorosa, mas necessária. Após anos lidando com infraestrutura insuficiente e atrasos em recursos para pesquisa, ela aceitou uma proposta de trabalho na Alemanha, onde encontrou o ambiente ideal para continuar seu trabalho. Casos como o de Paula são cada vez mais comuns, o que ilustra como o cenário nacional tem se tornado um impeditivo para o progresso da ciência e da carreira dos profissionais brasileiros. A falta de oportunidades no Brasil também gera uma lacuna na academia e nas universidades, onde a quantidade de concursos e oportunidades para docentes e pesquisadores é insuficiente para absorver os doutores formados a cada ano. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que cerca de 25% dos doutores no Brasil ficam fora do mercado de trabalho adequado à sua formação, o que leva muitos a buscar alternativas no exterior, onde há mais estabilidade e reconhecimento.

Elisabeth Balbachevsky, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e coordenadora científica do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP, tem outra visão. A professora tenta analisar um lado positivo desse fenômeno da "fuga de cérebros", as mentes que vão embora do Brasil buscando melhores oportunidades podem "se inserir em redes de pesquisa internacionais, o que poderá ter um impacto extremamente positivo, porque irão se tornar lideranças brasileiras e, uma vez de volta ao Brasil, trarão novas expertises e abordagens para o País", diz a pesquisadora. Uma vez que esses cientistas brasileiros conseguem cada vez mais se estabelecer nas gigantes da tecnologia, por exemplo, o país indiretamente está ganhando reconhecimento, o que pode fazer com que os olhos dessas grandes corporações se voltem ao Brasil. Ainda que a "fuga" desses pesquisadores seja prejudicial no início, com mais profissionais produzindo ciência de qualidade em um ambiente no exterior que comporta suas necessidades, podemos colher frutos no futuro. Afinal, para que grandes corporações se desenvolvam no país, é preciso ver que a população tem capacidade de produzir recursos que possibilite sua expansão.

Outro fator que importante ser destacado é a busca pelo incentivo ao empreendedorismo desses jovens cientistas. Grandes empresas como o Facebook e a Amazon surgiram de um pequeno projeto de seus fundadores enquanto ainda eram estudantes, desenvolvendo uma start-up na garagem de suas casas. É claro que, a qualidade de ensino de ciências nas Universidades americanas possibilitam que seus alunos desenvolvam o pensamento empreendedor, enquanto no Brasil, os alunos são incentivados a bucar emprego fora, em empresas já estabelecidas, fator resultado do cenário de instabilidade não apenas do mercado científico, mas também do empreendedorismo. Algumas escolas de redes particulares no país contam com matérias de empreendedorismo e educação financeira, por outro lado, escolas da rede pública e estaduais se encontram em um cenário totalmente diferente. Ainda há um grande caminho a trilhar para que o acesso à uma educação de qualidade seja uma realidade igualitária entre todos os estudantes do país.

Propostas como a criação de um fundo nacional para Ciência e Tecnologia, que garanta recursos contínuos para a pesquisa, são defendidas por entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Outra alternativa é fortalecer as parcerias entre universidades e empresas, criando oportunidades de inovação e desenvolvimento em conjunto com o setor privado, o que poderia abrir novas frentes de trabalho para cientistas dentro do Brasil.

Enquanto não houver um comprometimento estrutural e financeiro com a ciência, o Brasil permanece vulnerável à saída de seus talentos. A fuga de cérebros se torna um símbolo das dificuldades enfrentadas pela ciência brasileira, limitando o potencial de avanço científico e tecnológico do país. A valorização da ciência e o investimento em condições de trabalho são essenciais para que o Brasil não apenas forme cientistas, mas também consiga retê-los e fortalecer sua base científica para o desenvolvimento nacional e reconhecimento internacional.

A iniciativa engloba desde uma página de checagem até vídeos no Tik Tok
por
Esther Ursulino
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30/06/2022 - 12h

Por Esther Ursulino

O TSE está se inserindo no mundo da tecnologia e das redes sociais para combater as notícias falsas que desestabilizam a democracia brasileira. A iniciativa também busca reforçar a confiança na Justiça Eleitoral, nas eleições e na urna eletrônica, que vêm sendo alvos constantes de campanhas difamatórias. 

Em agosto de 2021 o Tribunal Superior Eleitoral instituiu o Programa Permanente de Combate à Desinformação, que tem como objetivo reduzir os efeitos negativos das notícias falsas relacionadas, especialmente, à Justiça Eleitoral e seus integrantes, às urnas eletrônicas e às diferentes fases do processo eleitoral. As ações do programa estão baseadas em três eixos: Informar, Capacitar e Responder. O primeiro eixo promove o consumo de informações oficiais, confiáveis e de qualidade; o segundo é destinado à alfabetização midiática dos brasileiros; e o terceiro busca identificar casos de desinformação e respondê-los, de forma preventiva ou repressiva, para que seus efeitos negativos sejam contidos. Atualmente, a iniciativa mobiliza mais de 70 instituições, entre partidos políticos e entidades públicas e privadas. 

Visando a efetividade do Programa Permanente de Combate à Desinformação, a Justiça Eleitoral viu a necessidade de se adaptar às plataformas digitais, que se tornaram o principal meio de informação no país. Segundo o estudo Digital News Report 2022 do Instituto Reuters, 64% dos brasileiros dizem receber notícias pelas redes sociais. As principais são Youtube (43%), seguido pelo WhatsApp (41%) e Facebook (40%). O relatório também mostra a tendência dos mais jovens em privilegiar informações em formato de áudio e vídeo, características de redes como Instagram, Tik Tok e Spotify. Tendo em vista este cenário, o TSE realizou parcerias com as plataformas citadas na pesquisa, além do Google, Kwai e Telegram. Vale ressaltar que o Tribunal é o primeiro órgão eleitoral no mundo a firmar parceria com este último aplicativo. 

Além de ser parceiro das plataformas, o TSE também se insere nelas. Em sua conta do instagram @tsejus é possível encontrar publicações relacionadas à educação midiática, às eleições e à importância do voto – tudo isso feito de forma leve, informativa e até mesmo bem humorada. E por falar em humor, o órgão não poderia ficar de fora do Tik Tok. No app desde 2020, o perfil TSEjus posta conteúdos institucionais e informativos em formato de vídeos curtos, muitas vezes utilizando memes e elementos da cultura pop para se comunicar melhor com a população mais jovem – principal público do aplicativo. Em maio deste ano, o perfil oficial do Tribunal publicou uma paródia de uma das cenas da novela Pantanal, edição exibida pela TV Globo, em que Juma Marruá entrega um bilhete a Jove, seu par romântico na trama. Quando o moço abre o bilhete encontra a frase: “Não deixe de votar. Todo voto importa.”. https://www.tiktok.com/@tsejus/video/7103528900742958342?is_from_webapp=1&sender_device=pc&web_id=7131855846342395397 Em outros vídeos, podemos encontrar referências aos Vingadores, Star Wars, Irmão do Jorel etc. 

No YouTube, há o canal da Justiça Eleitoral. Nele, dentre outros conteúdos, há o quadro “Então é Isso!”, com vinheta que lembra a identidade visual dos games. O programa apresenta, toda sexta-feira, uma decisão da Justiça Eleitoral de forma simples e acessível. A presença do Tribunal Superior Eleitoral no WhatsApp se dá através do chatbot – assistente virtual – criado em parceria com o próprio aplicativo de mensagens. O robô virtual, como também é conhecido, foi criado para esclarecer dúvidas relacionadas às Eleições Gerais de 2022 e fornecer informações confiáveis aos usuários. As alianças não se limitam às plataformas. O Tribunal também se uniu a nove agências de checagem: AFP, Agência Lupa, Aos Fatos, Boatos.org, Comprova, E-Farsas, Estadão Verifica, Fato ou Fake e UOL Confere. As notícias checadas pela coalizão são publicadas na página “Fato ou Boato”, disponível no Portal da Justiça Eleitoral. 

Claudir Segura, doutor na área de Processos Cognitivos em Ambientes Digitais, e professor dos cursos de multimeios e comunicação da PUC-SP, diz que os propagadores de fake news conseguem entender as maneiras pelas quais as pessoas compreendem algo, e por isso sabem como utilizar as plataformas digitais para influenciá-las de maneira errada. “A informação é uma arma, e infelizmente pode ser utilizada para o lado negativo.”, diz. Entretanto, Segura ressalta que a tecnologia pode ser uma aliada no combate à desinformação, e cita a música “Nos Bailes da Vida”, de Milton Nascimento, para explicar a importância da inserção de um órgão governamental nas novas mídias: “‘Todo artista tem que ir onde o povo está’. O artista é o TSE e onde o povo está ele tem que estar junto. (...) O importante é não deixar faltar informação.”.

 

Tik Tok do TSE

O que é a slow fashion e como ela oferece uma nova perspectiva para a implementação de uma moda sustentável e consciente
por
Catharina Faria de Morais
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29/06/2022 - 12h

Por Catharina Morais

Ilustração de roupas sustentáveis - Foto: Getty Images
Ilustração de roupas sustentáveis - Foto: Getty Images

 

Giancarlo Pancioli, funcionário da Empresa Farfetch, uma das plataformas líderes mundiais no mercado online de moda de luxo, diz que a tendência é um subproduto da moda, mas que reflete no tempo e suas influências.  Para Gian, o que é usado vai muito além do que  simples vestimentas, já que dentro desse ato contém reflexos de efervescências sociais que criam a sensação de pertencimento e que ao se disseminar, torna-se a cultura do consumo; logo sendo a moda também um mecanismo de semelhança e atrativo social. É possível notar isto na prática, em como por via de regra, pessoas que frequentam determinados ambientes vestem-se de forma parecida, ainda que existam algumas exceções, tal observação é extremamente comum. Mais um exemplo disto, são as empresas, que atualmente em casos cada vez mais frequentes possuem dress code, a ser seguido por seus funcionários, desta forma padronizando seus contratados. 

Na era da contemporaneidade, vemos surgir um novo consumidor: com valores mais enfraquecidos e desesperados para submeter-se às demandas do mercado. Colocando uma lupa maior na situação, é possível enxergar no Brasil, país que enfrenta uma intensa desigualdade de concentração de renda, um fenômeno cultural globalizado.

A política e a industrialização moldaram então as normas da sociedade, se utilizando de uma lógica de isolamento e individualização do ser em relação ao seu meio. O período de crescimento demográfico mundial da modernidade causou uma eclosão de ideologias de poder e progresso que deram uma ilusão maior de autonomia de consumo. Como consequência desse desenfreamento, problemas ambientais como a intensificação de produção de lixo, intoxicação de rios e lençóis freáticos e desmatamento, se proliferaram. A exploração exacerbada da natureza para suprir as demandas populacionais, também a fez passar por um processo de transformação: a de mercantilização, sendo então vista somente como uma ferramenta de exploração humana.

Contudo, não foi só a nossa relação com o meio ambiente que mudou. A cadeia produtiva industrial humana e ética, se enfraqueceu no meio da era da ‘racionalização’ pós-moderna. Na proliferação dessa nova cultura globalizada, é possível traçar mudanças entre períodos: o do século XX até o término da Guerra Fria, que como um dos seus principais destaques, teve lutas de reivindicações de um proletariado explorado pela intensificação da cultura industrial, atrelada a uma constante tentativa de derrubar o sistema capitalista vigente; e a do após a Guerra Fria, onde a vitória capitalista, junto com a proliferação dos aparelhos eletrônicos nos anos 2000, provocaram uma era de fluidez e inconstância nos valores e reformas em diversas lutas sociais. 

A moda se insere no mundo e se associa com a liquidez do momento. Ela têm a capacidade dicótoma de individualizar mas também agrupar. A primeira forma surge no momento da escolhas do que usar, agindo de forma para realizar suas vontades e gostos; e a segunda na inserção da sua aparência para num meio social, então, como sua escolha pode ser influenciada por uma imposição do mercado, de forma com que você se vista num mesmo "estilo" com outros. Mas a inconsciência das mãos do mercado nas escolhas individuais é onde mora o perigo. 

A frase de Zygmunt Bauman que Mara Sant’ana usa em seu livro, Vida para consumo: Transformação das pessoas em mercadoria, de “Quanto mais escolhas parecem ter os ricos, tanto mais a vida sem escolha parece insuportável para todos”, demonstra como o consumismo se tornou uma forma de integração dentro da sociedade estratificada pós moderna. 

As tendências se alterando a cada mês dentro de redes sociais, impulsionadas por grandes marcas e figuras públicas, provocou uma nova forma entre a relação do mercado e consumidor e essa necessidade, com base no desejo, foi o resultado dessa transição. A busca incessante pela felicidade e pertencimento são projetadas em produtos que, assim que pararem de ser a tendência, se tornam descartáveis. Pancioli também contempla que:

O fast fashion se inseriu dentro desse contexto e conquistou um grande público que cresce a cada dia. Esses são os mesmos indivíduos inseridos na mentalidade pós moderna. As empresas de fast fashion proporcionam um mar de opções de tendências para o cliente caminhar livremente, com uma liberdade de escolha e com um menor compromisso de escolha. As tendências e novidades nos sites dessas empresas são atrativas pelos preços baixos e a vasta quantidade. As tendências criam um fenômeno de imitação, criando uma multidão homogênea ocidental. Com sua popularização, o setor se tornou uma grande fonte de tendências, sem distinções de classes, passou a ser consumido por predominantemente a classe média. Essa mistura pode ser explicada pelo boom do consumo das lojas rápidas, e o desejo pelos produtos que todos querem consumir. Com preço acessível e o consumo impulsionado pelo desejo e não necessidade, facilita o desapego e a superprodução de peças.

 Observa-se, então, uma indústria marcada pela efemeridade, onde o sistema apresenta materiais com um ciclo de vida curto. Seguir tendências acarretam num ciclo de vida programado, que impõe o descarte precoce dos produtos, que podem estar ou não em bom estado, por que deixam de “estar na moda”. A exploração laboral e a insustentabilidade presentes nas fábricas produtoras, são impactos diretos da modernidade nos tempos atuais. Passando então por muitas etapas que envolvem o gasto e desgaste de pessoas que trabalham na linha de produção até o meio ambiente, há uma deterioração dos valores de muitas empresas. Paula Bortz, formada em moda na faculdade Santa Marcelina, contempla sobre esse tipo de desenvolvimento.    

Um movimento contrário a essa forma é o slow fashion, que se baseia na sustentabilidade ética das mais diversas áreas, desacelerando esses impactos negativos. Ganhando notoriedade a partir de 2008, como uma alternativa para a crise que se instalou, ela se tornou uma forma de conscientização que junta princípios éticos conscientes. Os questionamentos sobre a origem e a produção dessas mercadorias, junto com a desaceleração, é o objetivo dessa forma de enxergar a moda.

Esse processo de transição, porém não é instantâneo, uma vez que a sociedade de maneira geral, por viver sob  um sistema capitalista frenético, o qual induz ao consumo desenfreado e nada consciente, muitas vezes apresenta resistência ao novo, além disso o consumo, não só relacionada a moda mas a tudo,  está fortemente ligado às propagadas e a mídia que pouco se importa com demandas sociais e sustentáveis, atentando-se apenas ao lucro, objetivando produzir e vender cada vez mais, para tal feito apropriando-se então dos padrões de  comportamento humano, para induzir e padronizar, os anseios de consumo, tendo como porta voz as mídias ( sociais, digitais, televisivas etc.) que moldam seus espectadores para ansiar não só pelos objetos apresentados mas pela sensação imagética que a indústria vende através dos mesmos.

 Quantas vezes é possível notar em filmes, séries e afins um padrão de marcas de roupa; a moda em especial exerce uma pressão significativa na vida das pessoas, os trajes tornam-se mais que apenas objetivos simples de vestimenta,  passando por uma personificação, sendo o ser humano julgado por aquilo que veste, o amplo uso dos aplicativos digitais, especialmente na era do instagram e do Tik Tok agravam este cenário já que as ditas “blogueiras de moda”, ditam regras daquilo que será almejado, exercendo um controle sobre a moda, especialmente sob um público mais jovem. O slow fashion então, passa por grandes desafios, no enfrentamento de um mercado selvagem e já consolidado, por isso deve ser pauta mais presente no dia a dia da população, que muitas vezes nem sequer o conhecem, servindo não só como uma alternativa, mas como uma prioridade consciente para com o  produtor,  o consumidor e meio ambiente.

Como a tecnologia e a engenharia trabalham em conjunto para dar esperança e uma nova perspectiva àqueles que de alguma forma passaram por uma amputação de membros.
por
Leticia Alcântara Andrade de Freitas
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27/06/2022 - 12h

Por Letícia Alcântara

Ilustração de confecção de prótese de perna  - Foto: Getty Images
Ilustração de confecção de prótese membro inferior - Foto: Getty Images

 

No dia 16 de agosto de 2021, Bárbara Caroline, moradora de São José dos Campos, município do interior do estado de  São Paulo, sofre um acidente de moto que mudaria sua vida. Pilotando na via Cambuí, de máscara e capacete fechado, Bárbara perdeu a consciência, devido a uma hipóxia, condição médica caracterizada  pela falta de oxigênio no corpo; a mesma narra que sentiu que iria desmaiar, porém não teve tempo de parar a moto.

Após ser socorrida, já no hospital realizou todos os exames necessários, Um dos vários ortopedistas que a  atenderam explicou que, de seu joelho para baixo, encontrava-se tudo destroçado incluindo todos seus ligamentos e o próprio joelho, restando apenas 20% de tecido da sua perna direita. Após a queda, a moto bateu no meio fio, seu corpo escorregou pela grama, e sua perna colidiu com uma placa de sinalização de trânsito. Caso não houvesse a placa, teria tido apenas arranhões leves. No mesmo dia de seu acidente, ela então passa por uma amputação. 

Bárbara conta que atualmente está no processo de fisioterapia para poder então utilizar uma prótese, a mesma pontua que todo seu tratamento é realizado através do SUS, dizendo ainda que enxerga na prótese que utilizará, a esperança da volta de  sua independência, sendo possibilitada novamente de realizar  o simples gesto de poder abraçar seu filho, de 6 anos, em pé, podendo caminhar e segura-lo pela mão na rua. A protetização trará novamente a segurança de andar livremente,  chegando mais perto daquilo que fazia antes, como correr, pular dançar… Atividades que eram presentes, antes do ocorrido, em sua rotina.

Por definição, próteses ortopédicas são aparelhos que desempenham funções motoras semelhantes às do membro amputado. Seu uso traz inúmeros benefícios, para aqueles que nasceram sem, ou que de alguma maneira perderam um de seus membros, a tecnologia das próteses não só representa funcionalidade para estas pessoas, bem como devolve e eleva a autoestima, entregando esperança e uma nova perspectiva aos usuários.  

As próteses ortopédicas, não são uma invenção nova do século XIX e XXI, desde a antiguidade os egípcios desenvolveram e faziam uso do mecanismo de membros artificiais para suprir a necessidade dos amputados. A diferença dos dias atuais, encontra-se no uso da tecnologia a favor destas demandas. Ao contrário do passado, em que esses membros eram desenvolvidos diante de condições rudimentares, hoje, a tecnologia se une  a medicina e a engenharia para estabelecer melhores condições, as quais são mais funcionais e com uma gama mais vasta de utilidades.

De fato hoje em dia a tecnologia é um elemento determinante para essas invenções, nos primeiros relatos relacionados ao assunto como mencionado, ainda que nem tão tecnológicos, estas descobertas sem sombra de dúvidas já faziam uma diferença imensurável na vida dos seres humanos. Nesta época as próteses geralmente eram feitas utilizando madeira, e o couro sendo utilizado para fornecer a sustentação necessária. Durante a primeira e a segunda guerra mundial, ocorrem avanços significativos neste campo, devido ao elevado número de soldados que sofreram amputações, logo uma maior demanda proporciona maiores avanços e descobertas. 

No ano de 1969, o médico cirurgião holandês Pieter Verduyn desenvolveu a primeira prótese transtibial articular sem travas, isto significa que, diferente das antigas, esta permitia algum grau de movimento e flexão para o usuário. A tecnologia não só promoveu uma melhora significativa nos materiais e funcionalidades das próteses, para além disso o passar dos anos e a modernização, da engenharia em conjunto com a medicina, baratearam os custos, de modo que as mesmas tornaram-se acessíveis a um maior número de pessoas.

Hoje em dia, existem diferentes tecnologias para a confecção e funcionamento das próteses. O Engenheiro de automação e controle Leandro Jussek, conta um pouco mais da prótese mioelétrica que desenvolveu. A mesma funciona através de estímulos elétricos, captados pelo músculo do antebraço, por sensores acoplados no coto do paciente. Leandro explica ainda que, a cada contração de um músculo se produz uma tensão elétrica, que pode ser medida através da pele. Estes sinais são captados e amplificados, enviados a um microprocessador, acionando então os servomotores contidos na prótese. No caso de pacientes amputados dos membros superiores, as próteses mioelétricas trazem maior independência e funcionalismo.

O engenheiro comenta que pessoas com deficiência física apresentam grandes problemas de integração na sociedade, em função da dificuldade de executarem tarefas consideradas simples do dia a dia. Com o avanço da tecnologia, hoje é possível desenvolver próteses eletrônicas, leves, resistentes e de baixo custo, para pessoas com deficiência física, melhorando sua qualidade de vida.

Infelizmente as próteses mioelétricas disponíveis no mercado, apresentam valor de compra relativamente alto, e muitas vezes envolvem custos adicionais, tais como, importação, custos de troca de peças e manutenção. No Brasil, não existe fabricante nacional que ofereça esse dispositivo para o mercado interno. Diferente destas, a prótese de Leandro é um produto de baixo custo, e com pouco investimento. Ele ainda lamenta que no País não haja incentivos do governo para o desenvolvimento das próteses, para membros superiores e pesquisas. Sendo suas alternativas procurar empresas privadas que manifestem interesse em investir nos projetos.

Ainda em relação às dificuldades de acesso às próteses através do governo,  Plínio Francisco, amputado do joelho para baixo narra as dificuldades que teve para ter acesso a sua prótese, que demorou cerca de dois anos até chegar a ele, e que muitas vezes ela não dura muito, devido ao material utilizado na confecção. Que as próteses mudam a vida das pessoas, devolvendo, autonomia e dignidade, não existem dúvidas, então quais são os impasses que circundam a falta de investimento e interesse por parte do Estado nesta área. Atualmente vivemos tempos obscuros, onde saúde, inclusão e educação, parecem não ser pautas prioritárias,  a tecnologia tem o poder de reescrever histórias, executando aquilo, que antes parecia impossível, de modo que deveria mais do que nunca ser uma primazia social, em especial por parte dos líderes e governantes.

  

  

Embora tenha o poder de salvar vidas, no tratamento de doenças como o câncer, ela reforça a diferença entre classes no Brasil
por
Guilherme Silvério Tirelli
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23/06/2022 - 12h

Por Guilherme Tirelli

Era praticamente impensável, alguns anos atrás, crer que a tecnologia se desenvolveria tanto em um espaço de tempo tão curto. Muitos fracassos aconteceram até que o Raio-X, enfim fosse descoberto por Wilhelm Roentgen no fim do século 19. Várias décadas se passaram até que Felix Bloch e Edward Purcell conseguissem desenvolver a primeira máquina de ressonância magnética, a partir do estudo dos íons, em meados da década de 1960. Todos esses avanços mudaram a história da medicina, e consequentemente, fizeram total diferença na vida na vida das pessoas.

Felix Bloch e Edward Purcell
Felix Bloch e Edward Purcell. Fonte: Getty Images

Uma delas é Marco Aurélio Peres. O auditor fiscal do trabalho dedicava-se de segunda a segunda até que uma notícia o fez perder o chão. Quando fazia exames de rotina solicitados pelo cardiologista, um deles mostrou elevação repentina do PSA (Antígeno Prostático Específico), um marcador de câncer de próstata. Após ser encaminhado ao urologista e realizar outros vários exames, incluindo biópsia, veio o laudo definitivo do câncer. Na época, ele tinha 53 anos e nunca havia tido uma doença mais grave, ou precisado passar por qualquer tipo de intervenção cirúrgica.

Muito assustado, Marco leu bastante sobre a doença e a respeito da prostatectomia radical, tendo em mente relatos de pessoas próximas à ele que, após a cirurgia, perderam definitivamente a ereção e/ou passaram a sofrer com elevados graus de incontinência urinária. Homens com idade semelhante à dele que precisavam usar fralda geriátrica diariamente. Para piorar o cenário, dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), indicavam que anualmente cerca de 14 mil óbitos eram registrados.

Esse número fez com que o servidor público federal repensasse o sentido da vida. Todos os seus objetivos e sonhos, agora seriam pautados pela esperança de sobreviver. O câncer de próstata é o segundo tipo mais comum da doença em homens, sendo que em 2020, 65 mil casos foram detectados. Na tecnologia, entretanto, reside a esperança de alguns, já que nos últimos anos, uma série de inovações tecnológicas surgiram tanto para tornar mais eficiente o tratamento, quanto para diagnosticar o tumor o mais rápido possível. Atualmente existem diferentes formas de retirar o órgão, que variam desde modalidades abertas até a cirurgia robótica. Pela prostatectomia aberta, é feito um corte na parede abdominal, abaixo do umbigo para ter acesso ao órgão que será removido. Porém, o risco de incontinência e disfunção erétil é elevado.

Já a prostatectomia videolaparoscópica é realizada através de trocateres que são colocados em toda parede abdominal. Nesse procedimento, o cirurgião opera olhando para o vídeo que traz imagens da cavidade. As mãos manipulam os instrumentos de fora do organismo. A técnica apresenta bem mais vantagens do que a cirurgia aberta, mas os movimentos são efetuados em um ambiente bidimensional, de maneira que, para sua perfeita execução, é necessária maior destreza do médico. Além disso, o assistente deve dirigir a câmera em sincronia com os movimentos do cirurgião, caso contrário o procedimento pode se tornar ainda mais desafiador.

Por fim, na modalidade robótica, as vantagens da videolaparoscopia (menos dor e sangramento) são ampliadas pela precisão do robô. Ele permite visualização tridimensional e com proporções aumentadas, além de otimizar a dissecção dos feixes nervosos e na junção da bexiga com a uretra. Como consequência disso, o tempo de recuperação da continência urinária e da função erétil é menor. Já o controle dos instrumentos é realizado através do console no qual o cirurgião fica sentado, seja no painel ao alcance do comando digital ou nos pés que controlam a câmera.

Cirurgia robótica de retirada da próstata
Médico manipulando console do robô. Fonte: Getty Images

O sistema dispõe de inúmeras vantagens para facilitar sua execução. A câmera fica presa e o centro remoto dos trocateres também são fixos e portanto causam menos dano a parede abdominal. Ademais, não há tremores, uma vez que tudo é controlado pelo cirurgião em seu console. As mãos robóticas realizam movimentos de giro de até 560 graus, o que seria impossível para um ser humano. Na maior parte do tempo operatório, o médico se encontra de 3 a 4 centímetros do que se está operando, com uma visão aumentada em 10 vezes, com acomodação visual 3D. Portanto, a profundidade da imagem permite que uma maior eficiência da intervenção, sem que o sangue prejudique a visibilidade.

Com todos esses dados em mão, Marco e sua esposa foram ao urologista que o acompanhava há tempos. Ele realizava apenas os procedimentos aberto e videolaparoscópico, mas se prontificou a realizá-los, mencionando que o resultado destas técnicas poderia ser muito próximo ao da cirurgia robótica. No entanto, ao ser indagado pelo casal sobre qual procedimento escolheria, caso fosse acometido por câncer de próstata, o médico não titubeou e, de forma contundente, afirmou que se submeteria à modalidade robótica. Por ser um tratamento relativamente novo e caro, no Estado de São Paulo o procedimento estava disponível apenas na capital. A pedido do paciente, o doutor indicou outros três profissionais, dentre eles o cirurgião Carlo Passerotti, o primeiro a trazer a técnica robótica ao País e um dos clínicos que mais realiza esse tipo de cirurgia no Brasil. O funcionário público então acabou decidindo fazer a intervenção com aquele que possuía mais experiência no ramo.

A cirurgia, realizada no dia 1º de abril de 2019, durou aproximadamente 3 horas e 30 minutos e foi um sucesso. A doença não havia atingido tecidos ao redor e, ao retirar a próstata, nenhum nervo foi danificado durante o processo. A recuperação de Marco não poderia ter sido melhor. Passados mais de dois anos da prostatectomia, o servidor público tem uma vida absolutamente normal.

Entretanto, a realidade do auditor fiscal não é a mesma da grande maioria da população brasileira. Somente o procedimento robótico custa, em média, 20 mil reais. Com a taxa de internação inclusa, esse valor cresce exponencialmente. Embora alguns planos de saúde se comprometam a cobrir parte desse montante, a verdade é que apenas 24,5% dos brasileiros tem acesso a convênios, segundo levantamento do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS). Portanto, é utopia acreditar que todos teriam acesso a um procedimento como esse, como relata Marco.

 

 

A pandemia

Num piscar de olhos voltamos um século no tempo. De repente, estamos de volta ao ano de 1918. À época, sofríamos com a destruição que desmantelou o planeta. A Primeira Guerra Mundial foi cruel, mas não foi a única responsável pelo caos. A Gripe Espanhola assolou a Europa e, posteriormente, o mundo inteiro, deixando mais de 50 milhões de mortos. Já naquele período, nem todos tinham acesso a assistência e a saúde como um todo, era muito precária.

Mais de 100 anos se passaram e aquele cenário pandêmico tornou-se novamente realidade. A Covid-19 se alastrou pelo mundo como um foguete saindo de órbita. O reflexo da pandemia vai muito além das mais de 6 milhões de mortes, até o momento. No Brasil, a enorme quantidade de infectados fez com que outras doenças fossem deixadas de lado. Os corredores dos hospitais nunca estiveram tão cheios. A realidade, porém, é ainda mais crítica, já que o SUS não tem condições de comportar tantas pessoas e o serviço público de saúde jamais foi capaz de lidar com tamanha demanda.

Não é possível tratar das pessoas da forma como se deveria. Nem mesmo com o advento da tecnologia isso seria possível. Notoriamente, ela foi uma das aliadas dos cientistas na busca por minimizar os efeitos da doença. De fato, ela que forneceu os meios necessários para o desenvolvimento das vacinas. No entanto, em um cenário mundial no qual 1% dos mais ricos detém quase 40% de toda economia global, a desigualdade social é o que prevalece. Dentro desse contexto, nada deve ser tão doloroso quanto perder um familiar por negligência, nos corredores dos hospital. O vírus não tinha cor, não possuía gênero, não tinha  religião e não carregava preconceitos. Todos estavam sujeitos a transmissão.

Entretanto, as semelhanças param por aí. As elites, sempre tiveram acesso aos melhores profissionais, mais chances de serem atendidas e, por fim, não ficaram reféns da falta de oxigênio. De volta ao exemplo do câncer é irônico pensar que a tecnologia é capaz de desenvolver métodos e tratamentos super avançados que a maior parcela da população nunca se beneficiará. No fim da história, as tecnologias, sim, ajudaram a salvar milhões de vidas, mas também realçaram a gigantesca distância entre classes. Talvez, por conta disso, a medicina é um dos maiores indicadores da desigualdade social no Brasil e no mundo.

O professor da PUC-SP, Claudir Segura, explica como o metaverso pode ser utilizado para diferentes áreas em evento promovido pela TOTVS
por
Maria Luiza Oliveira
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18/06/2022 - 12h

 

Nos dias 14 e 15 de junho aconteceu em São Paulo, no Expo Center Norte, o Universo Totvs 2022 e contou com a participação do professor da PUC-SP, Claudir Segura para falar sobre o metaverso. O objetivo do evento foi trazer maiores informações para profissionais de TI, Administrativo/Financeiro, Startups, Operações, RH, Marketing e Vendas sobre tecnologias no mercado.

A participação do professor ocorreu no segundo dia e o tema da palestra foi no espaço “Beer for Devs: No Metaverso da Loucura”. Com apresentação André Noel e ao lado de Marcel Saraiva, Executivo de Contas da NVIDIA Entreprise e de Caio Jahara, Co-Founder e Growth Converge Metaverse, Claudir falou sobre as possibilidades de aplicação do metaverso em diferentes cenários, seja ele no mercado ou na academia.

Da esquerda para a direita: Caio Jahara, Marcel Saraiva, Claudir Segura e André Noel
Da esquerda para a direita: Caio Jahara, Marcel Saraiva, Claudir Segura e André Noel

“Esse tipo de evento é importante para criar a sinergia entre universidade e empresa para assuntos da vanguarda. E é muito importante ter um professor da universidade conversando e articulando com o mercado para avaliar e entender a consequência da tecnologia.” - relata Daniel Gatti, Diretor Adjunto da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP.

Daniel Gatti, Diretor Adjunto da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP
Daniel Gatti, Diretor Adjunto da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP

 

O Metaverso tem o propósito de quebrar as barreiras do espaço virtual e do físico, onde pessoas irão interagir através de avatares tanto via Realidade Virtual, Aumentada ou ainda estendida e que funciona como reflexo do mundo no qual a sociedade está inserida. Como dito no encontro pelos palestrantes, o metaverso já é uma realidade vista nos vídeos games, lançamento de produtos, e que o desenvolvimento deste "além" universo abre espaços e oportunidades nos mais diversos campos, como moda, design, educação, programação, entretenimento, comunicação, entre outros.

 

Aplicação do metaverso nos dias atuais

O Second Life é um ambiente 3D criado em 2003 por Philip Rosedele e se constituía em uma vida virtual, e que levava os jogadores a desenvolver atividades lucrativas. O jogo tem a sua própria moeda, o Lidall Dollar (L$) e tem a possibilidade de ser convertido em dólar.

Os palestrantes explicam que um dos motivos para a Second Life não ter dado certo é devido a falta de tecnologia e profissionais capacitados da época. Contudo, esse cenário é diferente para os dias atuais, uma vez que ambos os fatores já estão disponíveis no mercado e cada vez mais a tecnologia está sendo atualizada para proporcionar uma melhor experiência no metaverso para seus usuários.

Palestra “Beer for Devs: No Metaverso da Loucura” no evento Universo Totvs 2022
Palestra “Beer for Devs: No Metaverso da Loucura” no evento Universo Totvs 2022

“Temos tecnologia disponível, profissionais e desenvolvedores altamente capacitados para acompanhar o metaverso” - diz Segura. Apesar disso, o professor faz uma ressalva da falta de valorização no âmbito nacional desses profissionais e da demora para implementar novas tecnologias no país, como o recurso 5G, que será fundamental para o funcionamento e ampliação desse conjunto de tecnologias. 

Para aqueles que acreditam que o metaverso é uma realidade muito distante, e dificilmente fará parte dela, o professor afirma que hoje podemos considerar o metaverso como o início da Internet “Ninguém conseguia definir exatamente o que era, e como funcionava, mas quando percebemos, já estávamos lá dentro e fazíamos parte dela”. Não se trata do futuro. Falamos do presente. Bem vindo ao mundo dos universos incontáveis…