A instauração da ditadura militar no Chile por meio de um golpe de Estado em setembro de 1973 constituiu um capítulo sombrio na história. Com a destituição do governo de Salvador Allende, Augusto Pinochet assumiu o comando do país, inaugurando um período caracterizado pela repressão política e violações aos direitos humanos que perdurou até 1990.
Além de impactos sociais e humanitários, a ditadura de Pinochet moldou profundamente a economia chilena. O país adotou políticas neoliberais como reformas que visavam reduzir o papel do Estado na economia, privatização de empresas estatais e abertura do mercado para investidores estrangeiros. Essa transição para o neoliberalismo teve implicações devastadoras na estrutura socioeconômica do Chile que podem ser observadas na história recente. Essa razão econômica, política e social foi implementada pelos “Chicago Boys”, economistas que tiveram passagem pela Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, escola que distribuía e distribui a ideologia para governos mundo afora.
As consequências brutais da instituição desse modelo, que continuou após a redemocratização no país, sob o pretexto de uma suposta ciência, contribuíram fortemente para o surgimento de protestos intensos que tinham como objetivo a elaboração de uma nova constituição, em 2019. O debate e a tramitação de uma nova constituição seguem no país, enquanto a constituição de de Pinochet persiste.
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Os sistemas de educação, saúde e previdência, representam as violências dessa estrutura política e econômica sobre a população, que luta para seu fim e construção de uma nova constituição com direitos sociais universais.
Com a ascensão da extrema direita em Portugal imigrantes brasileiros têm percebido o aumento dos casos de xenofobia no país, estimulados por discursos nacionalistas de partidos de extrema-direita. Aluguéis caros e salários baixos também são dificuldades enfrentadas por quem busca se estabelecer em terras lusas.
Atualmente, o Chega! é o partido de extrema-direita que mais conquista espaço na política portuguesa. A sigla fundada em 2019 possui pautas conservadoras e nacionalistas que são difundidas, principalmente, por André Ventura, atual presidente da legenda. Através de discursos xenófobos e anti-imigratórios, o deputado da Assembleia da República adota a mesma estratégia populista que elegeu à presidência Donald Trump, nos EUA, e Jair Bolsonaro, no Brasil.
Em entrevista à Rádio Renascença, em maio de 2019, André Ventura disse que a Europa deve ser solidária, mas ao mesmo tempo manter o controle de suas fronteiras para que não se torne um espaço completamente aberto. “Para vir viver dos nossos impostos já temos cá muitos, não precisamos de mais”, opina.
As declarações do líder do Chega! influenciam parte da população portuguesa. Dados de um levantamento realizado pelo Instituto Intercampus, que foram divulgados pelo jornal Correio Braziliense, mostram impressionante crescimento do partido -– que já é a terceira força da Assembleia da República, com uma bancada de 12 deputados.
O estudo aponta que as intenções de votos no partido de ultradireita saltou de 7,2%, há um ano, para 13,5%, ou seja, quase dobrou. Esse aumento confirma que o discurso inflamado do deputado André Ventura, presidente do Chega, está ecoando entre os portugueses, o que pode refletir no aumento da xenofobia contra imigrantes.
Henrique de Barros (33), formado em cinema, decidiu sair do Brasil há um ano em busca de emprego. Ele conta que ao chegar em Portugal sofreu com violências verbais e generalizações depreciativas por ser brasieliro. "Já lidei com micro agressões como olhares feios e falas ríspidas; pessoas me chamando de pobre, oportunista e sem cultura. Além disso, pressupunham que eu era burro ou vivia em condições muito ruins no Brasil", conta.
Barros trabalha como editor de vídeo, um emprego que se adequa à sua área de formação. Entretanto, ressalta que seu caso é uma exceção entre os imigrantes e os próprios portugueses, já que o país luso oferece poucas oportunidades para pessoas especializadas. “Quanto mais formação se tem, menos vale a pena porque a compensação não sobe igual.”. Ou seja, mesmo com um diploma o salário das pessoas continua limitado, o que as impede de arcar com o alto custo de vida no país.
A disparada nos preços dos aluguéis ampliou as dificuldades dos imigrantes. Nos últimos anos, vários empresários compraram casas em cidades portuguesas para as transformarem em hospedagens e Airbnbs, o que tem feito os valores da especulação imobiliária dispararem. Segundo dados do EuroStat, os preços das casas aumentaram 46,9% nos países da União Europeia de 2010 até o 4° trimestre de 2022. A inflação acumulada ficou em 29,6% no mesmo período.
Em um cenário de alta procura, os locatários portugueses não escondem sua xenofobia ao alugarem quartos ou apartamentos para imigrantes. “Já vi muitos depoimentos em grupos dizendo que não alugam boas casas para brasileiros ou, quando percebem que são imigrantes, dizem que as residências não estão mais disponíveis.”, relata Henrique de Barros.
Lis Barreto, que viveu dois anos e meio em Portugal, confirma a denúncia de Henrique. A pesquisadora de 32 anos, que foi ao país com o intuito de fazer uma extensão universitária, encontrou algumas dificuldades. Ela conta que devido aos altos preços de locação precisou compartilhar um apartamento com mais duas pessoas, a fim de dividir custos. Ela ainda destaca que o lugar onde morou era alugado informalmente, pois o proprietário era uma das poucas pessoas que alugava para brasileiros.
Além de problemas relacionados à moradia, Lis Barreto relata episódios de xenofobia e machismo que sofreu no país. Apesar de não ter enfrentado agressões explícitas, as notava em algumas atitudes, como na diferença da abordagem reservada às mulheres brasileiras e às portuguesas durante uma paquera. “O machismo do português se manifesta de um jeito diferente do que o machismo do brasileiro. Fica na sutileza às vezes, mas você consegue perceber a diferença se comparar o tratamento que eles vão dar para outras mulheres. Não vão chegar da mesma forma.”.
A pesquisadora também se recorda de sofrer generalizações, a exemplo das vezes em que se surpreenderam quando ela disse que estava fazendo doutorado no país; ou quando pressupunham que estava em Portugal com o intuito de encontrar um marido para ganhar cidadania.
Henrique de Barros percebe a omissão do governo português diante dos casos de xenofobia, e diz que é raro ver algo sendo feito para evitar essas situações. "Sempre caminha para algo genérico no sentido de 'Vamos todos se respeitar', mas tem poucas ações públicas que eu vejo para integração positiva das culturas.", desabafa.
Além dos casos implícitos e presentes no cotidiano de diversos imigrantes, a ausência de ações concretas resulta em casos extremos. O engenheiro civil Saulo Jucá (51) foi agredido com socos e chutes dentro de uma cafeteria na cidade de Braga, Portugal, no dia 10 de junho deste ano. A data é considerada feriado nacional em que se comemora o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Embriagado, o agressor perguntou a nacionalidade do engenheiro, que foi agredido quando confirmou ser brasileiro. Nenhuma autoridade ou instituição oficial portuguesa comentou o assunto.
O atual governo brasileiro já manifestou preocupação com o tema. Anielle Franco, ministra da Promoção da Igualdade Racial, anunciou que o Poder Executivo pretende reforçar a rede de enfrentamento ao racismo e à xenofobia cometidos contra brasileiros que vivem em Portugal em abril deste ano. Essa rede terá o apoio do consulado brasileiro naquele país.
Um mês antes, Portugal havia anunciado a criação do Observatório do Racismo e Xenofobia. O projeto une o governo e universidades e tem o objetivo de fornecer conhecimento sobre o tema para auxiliar ações governamentais e entidades no combate à crescente intolerância.
Henrique Barros considera o período atual péssimo para brasileiros se mudarem para Portugal, mas entende que é importante conversar com outros imigrantes antes da decisão final. "Meu conselho é entender bem suas prioridades e falar com pessoas que amaram e odiaram a experiência para entender os porquês”, finaliza.
Exalando maturidade musical de um artista que cresceu no rap e não se limitou ao seu ritmo de origem, “AmarElo” do Emicida, se tornou mais do que um álbum musical, que não só reúne as principais facetas da cultura preta brasileira, mas abriu uma porta para ocupar lugares históricos e criar autoestima em qualquer um que tenha sido marginalizado. “AmarElo”, virou “AmarElo - É Tudo pra Ontem”, filme que descreve o processo criativo do álbum musical e apresenta os motivos da estreia deste no Theatro Municipal de São Paulo, com plateia majoritariamente preta e periférica. Ele é produzido por uma equipe de artistas, incluindo Leandro Roque de Oliveira, o Emicida, e direção estreante de Fred Ouro Preto.
Dividido em três atos (plantar, regar e colher), o documentário intercala a inspiração/criação das músicas, com as obras prontas, apresentadas no Theatro Municipal. A obra conta ainda como o artista paulistano desenvolveu as ideias que arquitetam o seu terceiro álbum de estúdio pelos percalços e desafios de toda sua concepção. Misturando ritmos musicais negros, com a história do povo preto brasileiro e crítica às mazelas sociais, em AmarElo, Emicida constrói uma narrativa baseada em amor, união, coragem e esperança, trazendo a dor e a alegria da vivência, para um campo sensível e intímo do ouvinte, se desvencilhando um pouco da acidez e firmeza que dominam outras obras suas.
A trama do filme é construída em diferentes tipos de imagens. Enquanto os fatos históricos são apresentados com animações e ilustrações, o íntimo do artista é trazido por imagens de arquivo. Entre o backstage e o show no Municipal, assistimos todo processo de nascimento de um álbum e de um documentário que marcaria seu nome em premiações internacionais como o Grammy e o Emmy.
A trilha sonora é composta inteiramente pelos onze títulos que compõem a junção musical e guiam a narrativa, abrindo e fechando os arcos. Esse é o principal diferencial do audiovisual: ele tem história! Não apenas a de Emicida, mas a dos criadores e a de todos que um dia viriam a se identificar com alguma daquelas canções.
POR DENTRO DE “AMARELO”
Repleto de referências que vão muito além do espectro musical, o documentário aborda alguns dos principais pilares da cultura brasileira que contribuíram para a formação da sociedade que temos hoje. Muito além disso, AmarElo traz significâncias e significados para resgatar na memória do Brasil toda a pluralidade preta para a sua formação, que foi sucateada e apagada no processo de branqueamento da história.
Em um movimento precursor de amostragem do passado, a narrativa explora em cada arco personalidades como Lélia Gonzalez, Aleijadinho, Wilson Neves e muito mais, referenciando também movimentos como a Semana de Arte Moderna de 1922 como ferramenta de marco representativo e divisor de ideias, que até então estavam consolidadas entre o aceito e o invisível.
Explora também a ocupação de um espaço físico como marco, marco de uma luta viva e presente na vida de milhões de brasileiros. Estar no Municipal e ressignificá-lo como um ambiente condizente com o florescer de um grupo que foi reprimido por séculos leva a público discussões além da luta racial no Brasil, pois mostra como o racismo e ideais de embranquecimento trabalharam para o apagamento daqueles que foram, são e sempre vão ser a alma de todo um país.
AmarElo se faz necessário não somente por ser uma obra que ganhou relevância nos streamings, mas por sintetizar de forma visual a história preta intrínseca na construção de um país, facilitando a compreensão de um movimento individual que, após as dimensões conquistadas, ganha um caráter coletivo.
O esporte mais famoso do mundo é para muitos uma paixão que ultrapassa as barreiras do campo. Além disso, pode ser o ingrediente secreto para fortalecer a relação entre pais e filhas.
Numa sociedade onde algumas pessoas ainda torcem o nariz para a ideia de que meninas também podem ser fanáticas por futebol, esse esporte se torna uma ponte entre gerações, que não passa só de avós para pais e filhos, mas também de avós para pais, mães e filhas.
Um domingo à tarde, com expectativa, um pai e filha pai se ajeitam no sofá para ver seu time do coração jogando. Esse já é um cenário comum em muitas famílias ao redor do mundo todo. Hoje elas não apenas assistem ao jogo, mas sabem toda a escalação antes do time entrar em campo, e reclamam quando o árbitro apita uma falta errada.
É sobre compartilhar risadas, vibrações, lágrimas, e sentimentos de frustrações e alegria.
O futebol, longe de ser apenas um esporte, torna-se um terreno fértil para diálogos que vão além de gols e cartões. É o caso da Lívia, que passou 1 ano afastada do pai, e fez do futebol a principal ferramenta de reconciliação: "Ficamos sem nos falar por quase um ano e meio, mesmo morando na mesma casa, por diferenças em opinião política. Isso nos fez muito mal, mas quando o Palmeiras entrou na era de ouro, com o Abel Ferreira, vi ali uma chance de me reaproximar e tornar nossa relação mais leve."
As histórias dos jogadores, as reviravoltas inesperadas, as rivalidades intensas - tudo isso cria um caldo cultural que pais e filhas podem saborear juntos. Um esporte que é uma linguagem universal, onde quem acompanha tem algo em comum para falar, debater e se conectar.
Há exatamente 50 anos, um episódio peculiar marcou a história do futebol e refletiu a intensa influência da Guerra Fria no esporte. Em 21 de novembro de 1973, Chile e União Soviética protagonizaram um "não-jogo", uma partida que terminou antes mesmo de começar, com um gol relâmpago que assegurou a vaga chilena na Copa do Mundo de 1974, na Alemanha.
Para entendermos o que aconteceu naquele ano, precisamos conhecer o cenário político que cercou esse encontro crucial na modalidade. Em setembro de 1973, o Chile havia passado por um golpe militar, resultando no estabelecimento de um regime militar liderado por Augusto Pinochet. O Estádio Nacional de Santiago, palco da partida, tornou-se um centro de detenção e tortura de prisioneiros políticos, despertando a revolta internacional.
A União Soviética, como nona colocada nas eliminatórias europeias, enfrentou o terceiro colocado da América do Sul, o Chile, em uma repescagem. No jogo de ida em Moscou, a partida terminou empatada sem gols, surpreendendo aqueles que esperavam uma vitória fácil da equipe soviética.
A polêmica surgiu quando chegou a vez do jogo de volta em Santiago. A União Soviética se recusou a jogar no Estádio Nacional, denunciando-o como local de violações dos direitos humanos sob o regime de Pinochet. A Federação Soviética de Futebol solicitou à FIFA que a partida fosse realizada em um país vizinho, mas a recusa da entidade levou ao boicote soviético.
Em 21 de novembro de 1973, os jogadores chilenos entraram em campo sozinhos e, após uma relaxada troca de passes, Francisco "Chamaco" Valdés marcou um gol em um campo vazio. A União Soviética se recusou a participar, dando ao Chile uma vaga automática na Copa do Mundo.
Na União Soviética, a notícia de ficar de fora da Copa pela primeira vez desde 1958 gerou irritação na população, mas o ambiente repressivo impediu protestos públicos. A seleção chilena, por sua vez, celebrou a classificação até tarde, apenas ao enfrentar o Santos em um amistoso logo em seguida, perdendo por 5 a 0.
Na Copa do Mundo sediada na Alemanha, o Chile enfrentou desafios, sendo derrotado pela Alemanha Ocidental na estreia, empatando com a Alemanha Oriental e a Austrália. Os jogos do Chile foram boicotados pela TV russa, mas a Seleção, apesar das supostas diferenças políticas entre alguns jogadores, como críticas de Carlos Caszely ao regime militar, mostrou união em campo.
O "não-jogo" entre Chile e União Soviética em 1973 permanece como um capítulo peculiar na história das Copas do Mundo, destacando como a política e os eventos globais podem se entrelaçar até nos momentos mais inusitados do esporte. Esse episódio, marcado pelo boicote soviético, ecoa como um reflexo da intensidade das relações geopolíticas da época, que transcenderam fronteiras e influenciaram até mesmo o mundo do futebol.