A conferência sobre clima reforça a urgência de ações globais, enquanto o Brasil enfrenta a crescente ameaça de desastres ambientais e suas consequências socioeconômicas.
por
Mariana Castilho e Stefany Santos
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18/03/2025 - 12h

A COP (Conferência das Partes), o maior encontro mundial para a discussão sobre mudanças climáticas, terá sua 30ª edição sediada em Belém do Pará, no Brasil, em novembro de 2025. A Conferência da ONU sobre Clima volta a atenção dos líderes globais e da sociedade civil para um tema que afeta diariamente a população, mas sobre o qual ainda se discutem poucas medidas concretas para minimizar seus impactos e desacelerar a crise.

Em entrevista à AGEMT, Denison Ferreira, natural de São Luís, Maranhão, professor, pedagogo, geógrafo, especialista em sustentabilidade e políticas públicas, e ativista socioambiental, pontuou a importância da escolha do país e da cidade que sediarão o evento. "A realização da COP 30 em Belém tem um significado estratégico tanto para o Brasil, quanto para a agenda climática mundial, reforçando a centralidade da Amazônia no debate sobre mudanças climáticas e sua importância na absorção de carbono e na manutenção do equilíbrio ambiental do planeta”, diz Ferreira

Segundo dados da OIM (Organização Internacional para as Migrações), da ONU, o número de pessoas deslocadas por desastres ambientais no Brasil em 2023 foi de 745 mil, o maior desde 2008, sendo o índice mais alto da América Latina. Esses dados apontam a falta de políticas públicas eficazes para a proteção ao meio ambiente e, principalmente, à população civil, que segue sendo a maior afetada pelos eventos climáticos extremos.

“No Brasil, a política climática oscila entre avanços e retrocessos. O país conta com instrumentos legais importantes, como a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (Fundo Clima), mas a implementação dessas medidas enfrenta desafios significativos, incluindo a falta de fiscalização e a pressão de setores econômicos ligados ao desmatamento e à exploração de combustíveis fósseis. Recentemente, houve um esforço para retomar compromissos ambientais, com maior participação em fóruns internacionais e ações de combate ao desmatamento na Amazônia", afirma Ferreira. 

As mudanças climáticas são uma ameaça crescente e presente em todo o mundo. No Brasil, podemos observar o impacto das chuvas intensas, que afetam uma grande parte da população, como no caso do Rio Grande do Sul, onde cidades ficaram submersas pelas tempestades. Essas chuvas devastadoras forçaram muitas pessoas a abandonar seus lares, deixando suas histórias em busca de um novo lugar para viver. As pessoas que enfrentaram e ainda enfrentam fenômenos como tempestades, aumento do nível do mar, secas extremas e até incêndios florestais são chamadas de migrantes climáticos, um grupo diretamente afetado por esses eventos naturais.

Segundo Ferreira, os eventos climáticos extremos impactam desproporcionalmente as populações mais vulneráveis, que, em sua maioria, vivem em áreas de risco, como encostas, margens de rios e regiões costeiras baixas. A falta de infraestrutura adequada e a ausência de políticas públicas eficazes aumentam a exposição dessas comunidades a enchentes e deslizamentos, resultando na destruição de moradias, na perda de meios de subsistência e, em muitos casos, no aumento da mortalidade. "Esse cenário reflete o que chamamos de racismo ambiental, em que as populações negras e economicamente vulneráveis são as mais afetadas pelos desastres naturais", ressalta.

“Secas prolongadas comprometem a segurança alimentar e hídrica, como ocorre nas estiagens severas que atingem o bioma amazônico, afetando estados como Amazonas, Acre e Pará. A elevação do nível do mar também ameaça comunidades litorâneas e populações tradicionais, como pescadores e ribeirinhos, cujas terras são progressivamente inundadas. Esse fenômeno gera deslocamentos involuntários, agravando desafios socioeconômicos, como a dificuldade de acesso a novas moradias e empregos”, afirma o ativista.

Logo, a perspectiva de resultados positivos para o clima durante a COP30 sediada em território amazônico é grande. “As expectativas para a COP 30 são altas, especialmente quanto ao fortalecimento dos compromissos climáticos e à implementação de medidas concretas de adaptação e mitigação das mudanças climáticas. Espera-se que o evento resulte em acordos mais ambiciosos para a redução de emissões, com metas mais rigorosas para os países signatários do Acordo de Paris”. 





 

Fragmentos dessa vegetação sobrevivem na cidade e carregam a memória de uma paisagem que um dia foi predominante
por
Majoí Costa
Nicole Conchon
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21/11/2024 - 12h

No coração da maior metrópole da América Latina, árvores como ipês, muricis e araçás do campo resistem como testemunhas vivas de um passado em que São Paulo era dominada pelo Cerrado. Muito antes das avenidas e arranha-céus, as várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí formavam um mosaico natural de matas e campos, ocupadas por povos Tupiniquins.

Registros antigos da época da colonização retratam uma São Paulo bem diferente. Em 1585, o padre jesuíta Fernão Cardim descreveu a região como um “lugar de grandes campos… e campinas... que é formosura de ver”. Esse cenário, marcado pela vegetação arbustiva de galhos retorcidos típica do Cerrado, se estendia por boa parte do território paulista.

Quase 500 anos depois, o que restou dessa paisagem na capital está restrito a pequenos redutos. Na zona oeste, dois locais guardam a memória desse Bioma. Na Universidade de São Paulo (USP), próximo a uma caixa d’água, espécies raras, como a língua-de-tucano, um arbusto espinhoso usado pelos colonizadores para fabricar alpargatas, seguem resistindo. Já no bairro do Jaguaré, outro fragmento do Cerrado sobrevive em uma reserva fechada ao público.

A destruição do Cerrado em São Paulo reflete um processo que se intensificou ao longo do século passado. No início do século 20, 18,2% do território paulista era coberto pelo Bioma; hoje, resta menos de 1%. Deste pequeno remanescente, menos de 20% está protegido por unidades de conservação ou reservas legais.

Desmatado e fragmentado, o bioma se tornou associado apenas à região Centro-Oeste, mesmo tendo atravessado boa parte do território paulista até o norte do Paraná. Os poucos fragmentos restantes não só revelam a fragilidade das espécies endêmicas, mas também comprometem o ciclo natural de abastecimento de água. A substituição da vegetação original afeta diretamente o Aquífero Guarani, por exemplo, uma das maiores reservas subterrâneas de água do mundo.

De acordo com Daniel Caballero, fundador do projeto Cerrado Infinito, o cerrado é uma floresta invertida: “O que você vê na superfície são campos com arbustos mas no subsolo tem verdadeiras árvores, que seriam as raízes, de 30 a 40 metros enterradas que são responsáveis por carregar os aquíferos. Sem cerrado, nós ficamos sem água”.

 

Daniel Caballero em viagem ao cerrado
Daniel Caballero em viagem ao cerrado / Foto: Reprodução/Instagram/@caballeroland.art

 

Daniel é artista plástico e resolveu fazer um projeto sobre as casas da cidade. Com isso, ele se deparava com as mais diversas vegetações durante seus passeios pela metrópole. Depois de um estudo, ele descobriu que São Paulo era um grande campo cerrado; isso fez com que ele começasse a colher vegetações remanescentes desse bioma e plantasse em sua casa. 

Com a intenção de fazer crescer ainda mais essa vegetação na cidade, ele começou a plantar essas mudas na Praça da Nascente, na Sumaré. “O nome Sumaré que denomina a avenida e o bairro vem do nome de uma uma orquídea do cerrado”, acrescenta Daniel. 

 

Daniel trabalhando na renovação da Praça da Nascente
Daniel trabalhando na renovação da Praça da Nascente / Foto: Arquivo Pessoal 

 

 Caballero encerra a entrevista com uma indagação a todos nós da cidade: “A área mais urbanizada da cidade foi construída em cima desses campos de cerrado, se não tivesse cerrado, não teria a cidade de São Paulo”. 

Medida visa combater emissões de gases do efeito estufa, com regras que obrigam empresas a compensar poluentes
por
Majoí Costa
Nicole Conchon
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21/11/2024 - 12h

 

Floresta Amazônica
Floresta Amazônica / Foto: Neil Palmer

 

 

A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (19), o Projeto de Lei 182/2024, que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). O objetivo da proposta é estabelecer um mercado regulado de carbono, com o intuito de controlar e reduzir as emissões de gases que agravam o efeito estufa, oferecendo incentivos para que as empresas adotem práticas mais sustentáveis.

O novo sistema funcionará com a criação de cotas de emissão de gases chamados créditos de carbono. Esses créditos são certificados emitidos a partir de ações que reduzem ou capturam gases de efeito estufa. Cada crédito equivale a uma tonelada de dióxido de carbono evitada ou retirada da atmosfera. Eles podem ser comercializados tanto por estatais quanto por empresas privadas.

As empresas que ultrapassarem seus limites de poluição terão que compensar com a compra de créditos. Em contrapartida, aquelas que conseguirem reduzir suas emissões, poderão vender esses créditos, o que gera uma fonte de receita para as práticas mais ecológicas.

A proposta foi idealizada para tornar o mercado mais eficiente e permitir a redução dos impactos ambientais provocados pelas indústrias. 

O projeto foi discutido e aprovado em uma sessão no plenário da Câmara, e agora segue para sanção presidencial. A proposta foi trabalhada em conjunto com o Senado, que já havia aprovado uma versão anterior. O texto estabelece um marco para a criação de um sistema transparente e confiável de monitoramento e controle das emissões no Brasil.

Além disso, o projeto inclui mecanismos de compensação de emissões para veículos automotores e prevê a criação de fundos para apoiar projetos sustentáveis. O mercado será regulamentado por um órgão especializado, garantindo a transparência e a eficácia das ações.

Preservar as nascentes é essencial para garantir a sustentabilidade e qualidade de vida na cidade.
por
Majoí Costa
Nicole Conchon
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21/11/2024 - 12h

São Paulo, a maior cidade do Brasil, esconde um tesouro natural: as nascentes de água. Essas fontes de água, muitas vezes, são invisíveis aos olhos de quem vive na correria do cotidiano paulistano. Porém, se olharmos mais de perto, podemos perceber que são elas que abastecem os rios que cruzam a cidade e que são parte fundamental de um ciclo ecológico essencial para o funcionamento de toda a metrópole. Conhecer essas fontes de água é o primeiro passo para sua preservação e, assim, para a manutenção de uma São Paulo mais verde, mais saudável e mais sustentável.

De acordo com a Secretaria do Verde e Meio Ambiente da cidade de São Paulo, há 10.403 nascentes só na capital. Essas fontes de água são vitais para o abastecimento hídrico da cidade e para o equilíbrio do ecossistema urbano. Mas o curioso é que a maioria da população desconhece sua importância ou, em alguns casos, tenta ocultá-las por acreditar que elas representam um problema. Esse comportamento leva algumas pessoas a cobrir ou "tapar" essas nascentes, o que compromete não só o abastecimento de água, mas também a biodiversidade local.

De acordo com o arquiteto e fundador da ONG Rios e Ruas, José Bueno: “A população foi ensinada a não gostar dos rios e a tratá-los como um problema urbano, mas na verdade os rios são a solução para uma cidade que enfrenta aquecimento global e mudanças climáticas extremas”. 

José andava de bike pelo Butantã quando percebeu que havia água e planta crescendo em uma linha específica da rua Iquiririm que tinha uma parte coberta por mato. Curioso, ele foi seguindo aquele rastro de vegetação e encontrou uma nascente. 

Essa nascente não tinha nome, então ele a nomeou de rio/riacho Iquiririm. Ela encontra com o rio Pirajussara Mirim, que, por sua vez, encontra com Pirajussara e deságua no rio Pinheiros. 

José Bueno junto com Luiz Campos Jr na nascente do Iquiririm
José Bueno junto com Luiz Campos Jr na nascente do Iquiririm / Foto: Arquivo Pessoal

Depois disso ele fundou, junto com seu amigo Luiz de Campos Jr., a ONG Rios e Ruas e publicou um livro sobre a presença dessas nascentes na cidade e como cuidar delas torna a cidade melhor. A intenção do projeto é mudar o nível de consciência não só da população da capital, mas do país inteiro para que as mudanças causem um impacto visível na sociedade. 

“Os rios estão pela cidade inteira, a maioria foi canalizada, desprezada, esquecida e apagada da memória. A má notícia é que eles estão longe da percepção, mas a boa notícia é que eles estão todos vivos, eles foram enterrados vivos”, acrescenta José. 

A importância dessas nascentes vai além de seu papel no abastecimento de água. Elas são fontes de vida para diversas espécies de fauna e flora e desempenham um papel crucial na manutenção da qualidade do ar e do clima na cidade. No entanto, sua preservação está diretamente ligada à conscientização da população sobre sua relevância. A falta de informação sobre o ciclo da água e sobre como o ecossistema urbano se relaciona com esses recursos naturais contribui para a negligência em relação a esses corpos de água.

José Bueno não é o único que luta pelos rios e nascentes na cidade de São Paulo. Adriano Sampaio largou sua vida na administração para fazer um curso de permacultura e nunca mais voltou atrás. Filho de nordestinos e neto de pescadores, Adriano se denomina como “da roça”. Anos depois de sua chegada em São Paulo, Adriano fundou o coletivo Existe Água em SP. “Eu sempre gostei da natureza, de pescar, mas não tinha espaço pra fazer isso em São Paulo até que eu percebi que existe sim natureza aqui, só é preciso encontrá-la”, afirma Sampaio.  

À direita, Adriano Sampaio em dos seus mutirões
À direita, Adriano Sampaio em dos seus mutirões / Reprodução: Facebook

 

E de tanto buscar, Adriano encontrou a Praça das Nascentes, local em que havia diversos charcos d’agua. Essa praça fica localizada em Sumaré, zona oeste de São Paulo. As águas da praça vêm de nascentes do córrego Água Preta. Esse córrego vai descendo, passa pelo Sesc Pompéia, até chegar no rio Tietê. 

Adriano e sua ONG, junto com o coletivo Ocupe e Abrace, juntaram todas essas nascentes e charcos d’agua e transformaram em um grande lago. 

Lago na Praça das Nascentes/ Foto: Divulgação
Lago na Praça das Nascentes / Foto: Divulgação

Adriano relata que sua vida se transformou quando começou essa luta em defesa dos rios e ainda diz: “Eu vejo os rios como artérias porque o planeta é um sistema vivo”. 

A gestão de áreas verdes e de rios precisa ser reforçada com políticas públicas que envolvam a comunidade, para que as pessoas compreendam a importância de manter essas fontes de água em seu estado natural.

Está em trâmite na Câmara Municipal de São Paulo um projeto de lei que visa criar Áreas de Preservação Permanente (APP) perto de cursos d'água naturais. O PL 4/2022,  apresentado pelo vereador Toninho Vespoli (PSOL), tem como justificativa a função de preservar os recursos naturais e garantir a segurança e o bem-estar da população.

Especialistas alertam a ultrapassagem do limite estabelecido pelo Acordo de Paris e destacam a rapidez assustadora
por
Leticia Alcântara
Sophia Razel
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19/11/2024 - 12h

É praticamente certo que 2024 irá bater recordes de temperatura e será o ano mais quente já registrado. Pela primeira vez, o planeta deve terminar o ano com a média de temperatura de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Os dados são do relatório do Observatório Europeu Copernicus, divulgados no início de novembro, antes do início da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29). 

O relatório ainda mostrou que não só na Europa, mas também em regiões como o leste da Antártida, Texas, México, Canadá, nordeste da África, Irã, China, Japão e na Austrália as temperaturas também ficaram acima da média. Parte da América do Sul também enfrentou secas e incêndios florestais, como foi o caso do Brasil.

Bombeiros tentando controlar o fogo
Mudanças climáticas favorecem as queimadas Foto: Marcelo Camargo//Agência Brasil

Durante o primeiro dia da COP29, que acontece entre os dias 11 e 22 de novembro na cidade de Baku, no Azerbaijão, o relatório “Atualização do Estado do Clima 2024”  foi divulgado.

De acordo com análise feita pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), organização da ONU, “as ambições do Acordo de Paris estão em grave perigo” uma vez que a temperatura global foi extremamente alta entre janeiro e setembro de 2024. Isso corrobora as projeções do Observatório Europeu, e destaca que 2024 deve ser o ano mais quente da história, superando 2023 que, até então, possuía o posto. 

Acordo de Paris e mobilização mundial 

O Acordo de Paris, tratado internacional que foi assinado em dezembro de 2015 e passou a valer em novembro de 2016, foi adotado por 195 países e tem como objetivo reforçar a ação global contra as mudanças climáticas. Dentre os propósitos, destacam-se reduzir os gases de efeito estufa, como, por exemplo, o dióxido de carbono - que se origina do uso intenso de combustíveis fósseis -, e manter  o aumento da temperatura global abaixo de 2 °C até o final do século. Isso inclui uma série de esforços para limitar esse aumento a 1,5°C. Diante dos dados apresentados, a meta deve ser quebrada.

A vitória do republicano Donald Trump nas eleições dos EUA coloca em xeque as negociações globais futuras e participação estadunidense do acordo.  Em 2017, durante seu primeiro mandato, Trump retirou o país do acordo; tal atitude causou preocupação mundial, já que se trata do segundo país com maiores níveis de emissão de gases de efeito estufa do mundo, perdendo apenas para a China. No início de 2021 seu então sucessor, Joe Biden, voltou a aderir ao acordo. Com o seu retorno à Casa Branca existe forte especulação de uma nova saída.

Quais são as consequências 

Danos climáticos já passaram a ser observados nos últimos anos. O aumento da temperatura dos oceanos, a elevação do nível do mar, incêndios florestais e o derretimento de geleiras são alguns deles. 

Há pelo menos uma década, cientistas já alertam para os perigos iminentes das constantes mudanças climáticas resultadas pelas ações humanas, que estão causando constante destruição e perdas irreparáveis. Desde as ondas de calor intensas à chuvas torrenciais, os efeitos já estão sendo sentidos e, se não controladas as mudanças, a tendência é piorar. 

A OMM ainda alerta para a necessidade urgente de medidas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e garantir preparo para lidar com as consequências, especialmente em relação a pessoas em situações de vulnerabilidade.

 

O desmatamento do bioma é equivalente a um Ibirapuera a cada três dias. Mas a esperança mora no CEU e nas leis.
por
João Curi
Laís Bonfim Carnelosso
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02/10/2023 - 12h

Dizem que a natureza é distante. Quase imperceptível por entre a selva de pedras chamada São Paulo. Quem procura vai a um parque, a uma avenida mais larga, ao jardinzinho de qualquer dona cuidadora de plantas, mas tem que se contentar com a timidez das pequenas amostras. E tem quem se admire tanto com o ipê colorindo a calçada em plena segunda-feira que decide arrancar uma flor ou duas para levar para casa.

“Não, não pode tirar a flor”, mas as crianças já aprenderam e gostam de ensinar. “A gente tem que regar, tem que cuidar dessa flor. Se a gente arrancar, esse lugar não vai ficar bonito”.

 

Passos de formiga

Era uma terça-feira. Na saída da estação, havia um shopping daqueles de passar o dia lá dentro e ainda faltar o que ver, o que já entregou que por ali não era. Depois de algumas informações, colhidas ali mesmo na rua repleta de comércio, chegava o ônibus que passaria próximo ao CEU. E que passagem.

Árvores verdes vistas de baixo
Árvores na entrada do CEU Campo Limpo, em São Paulo. (Foto: Lais Carnelosso)

Chegando perto, a natureza foi se revelando. Árvores amontoadas numa vegetação densa, verde, viva. “Tem certeza que aqui ainda é São Paulo?”, e não falava somente pelos ônibus interestaduais que circulavam um atrás do outro. Ali parecia um recuo de todo o congestionamento urbano, uma cidadela da natureza diante da megalópole.

Havia um portão como qualquer outro, mas este guardava um tesouro a céu aberto. A entrada pavimentada mais parecia enfeite, demarcando o limite da urbanização no refúgio ambiental. As narinas estranhavam a pureza da recepção. Era um ar que convidava uma respiração profunda, que refrescava os pulmões. Entrar naquele espaço fez nascer a inveja de quem o fazia todos os dias. “O CEU é aberto até nos fins de semana, de feriado, para a comunidade retornar aqui quando quiser”, relata a assessora educacional Simone Aguilera.

Foi no CEU Campo Limpo, em 2021, que se ergueu a minifloresta pioneira do projeto de educação ambiental da ONG formigas-de-embaúba, um programa em parceria com a Prefeitura de São Paulo e com apoio de financiadores de captação privada. A partir da formação de professores e funcionários, instala-se o programa pedagógico para estudantes, que abrange desde o ensino primário até o fundamental.

Nesta etapa, o aprendizado é ao ar livre, acompanhando os processos de reflorestamento com espécies nativas – seguindo o método Miyawaki - e a importância dessa ação no presente e a longo prazo. Para além do clássico experimento do feijão no algodão, essas crianças vivenciam a experiência intrínseca da mão na terra e dos pés descalços na grama natural. “A minifloresta é pensada para ser uma sala de aula livre”, explica Gabriela Arakaki, educadora ambiental e cofundadora da organização.

A embaúba (Cecropia sp.) é uma planta rica em propriedades medicinais. É uma árvore pioneira nos biomas brasileiros, sendo uma das primeiras espécies a ressurgir na sucessão natural. É o símbolo dos primeiros passos de restauração após o desmatamento. Suas folhas combatem a pressão alta, a taquicardia, dentre outros benefícios à saúde humana. O caule e os ramos são ocos, o que permite a presença de formigas (do gênero Azteca) no seu interior, vivendo em uma simbiose que a protege de animais herbívoros ao mesmo tempo que oferece alimento às suas moradoras.

“Nós somos essas formiguinhas, as crianças são essas formiguinhas e estamos em simbiose com essas árvores, com a floresta e com a Mata Atlântica”, aponta Rafael Ribeiro, cofundador da ONG formigas-de-embaúba.

 

Antagonistas

            Mais do que se preocupar com o reflorestamento, é necessário evitar que o mal corte a raiz. Não se pode construir o futuro quando se destrói o presente todos os dias. A comoção pela poda de uma árvore na rua de um bairro cinzento é apenas uma figurante na trama do show de horrores que retratam o desmatamento. Os números são preocupantes e revelam antagonistas.

            Segundo levantamento do MapBiomas, em 2020, restava somente 25,8% da cobertura florestal da Mata Atlântica em condições de preservação dentro da área de aplicação da lei (11.428/2006), em contrariedade à ocupação de 69% por uso antrópico – em destaque, as pastagens e a agricultura. No âmbito estadual, o Piauí compreende 89% da cobertura nativa em meio à transição com a Caatinga, enquanto os estados de Goiás (14%), Alagoas (16%), Sergipe, Mato Grosso do Sul e São Paulo (os três apresentam 26%) carecem dessa conservação.

            Em 2022, de acordo com o boletim do Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD) da Mata Atlântica, o estado de São Paulo apresentou uma área total desmatada três vezes maior que o Parque Ibirapuera. O que assusta é que Sandovalina, o município de maior índice, não possui mais do que 4000 habitantes, segundo o Censo (2022) divulgado pelo IBGE nesta quarta-feira (28).

Infográfico sobre o desmatamento da Mata Atlântica em SP, em 2022
Infográfico sobre o desmatamento da Mata Atlântica em SP, em 2022. (Créditos: Lais Carnelosso)

Legislação ambiental

Dentre as principais estratégias para restaurar o bioma, a regeneração natural consiste em abandonar propositalmente uma área para viabilizar o crescimento da vegetação sem a interferência humana. A técnica é a forma mais econômica no contexto de restauração da Mata Atlântica, mas se prova insuficiente, visto que um terço dessas áreas regeneradas voltam a sofrer desmatamento em até oito anos.

Em tons mais otimistas, existem outras alternativas mais cabíveis à urgência e que correspondem a um dever público em todas as esferas – dos municípios ao Governo Federal. Desde os primórdios da legislação ambiental no Brasil, em 1934, com a decretação do Código das Águas e do primeiro Código Florestal, é notável o comprometimento – no papel – do Estado com essa agenda.

Nesse âmbito, a agenda é apenas o primeiro passo, seguida da elaboração, implementação e, por fim, controlar e monitorar. A dura verdade é que não basta um ou dois passos para vencer a corrida contra o clima. É necessário que o ciclo perdure o quanto a humanidade quiser durar.

 “A gente tem um arcabouço de Direito Ambiental que está elaborado, mas continua sendo um desafio da sociedade a implementação do que está garantido nessas legislações fontes de políticas públicas”, revela o professor Rafael Freiria, coordenador do Laboratório de Políticas Públicas Ambientais (LAPPA/FT) da Unicamp. “A cidade de São Paulo tem políticas extremamente refinadas em termos de elaboração, mas isso não garante bons resultados”.

Perfil do professor Rafael Freiria (UNICAMP)
Prof. Dr. Rafael Freiria (Reprodução/Unicamp)

Em maio deste ano, a Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado de São Paulo (Semil) divulgou detalhes sobre o Plano Estadual de Energia 2050 (PEE), que propõe um incentivo para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa (GEE) a partir de projetos de transição energética que acumulam, ao todo, R$16,8 bilhões em investimentos privados. De acordo com dados recentes dos Balanços Energético Nacional e do Estado de São Paulo, a matriz energética renovável alcança 58,5%, o que supera as marcas do Brasil (47,7%) e do mundo (14,1%).

O Estado consome energia elétrica em larga escala, esbanjando os maiores potenciais de energia solar fotovoltaica e de produção de biogás – este corresponde ao dobro da demanda estadual. Em uma primeira fase, o foco recai sobre cinco eixos estruturantes: meio ambiente, social, infraestrutura, regulação e mercado. Desses, desenvolvem-se até doze áreas de atuação, dentre elas a eficiência energética; a disponibilidade hídrica e múltiplos usos; redes inteligentes; a eletromobilidade; e as mudanças climáticas. Para completar, todos esses processos ainda se concentram nos vetores de descarbonização, descentralização, diversificação e digitalização.

“Esse plano deposita fortemente a esperança, um prognóstico, num maior empoderamento e participação da iniciativa privada e da sociedade civil”, analisa o professor. “Ele reconhece a dificuldade do poder público dar conta dessas agendas todas. A expectativa da comissão que elaborou o PAC 2050 [Plano de Ação Climática do Estado de São Paulo], por sua vez, é de se ter até 70% de redução das emissões em relação aos níveis de hoje, o que seria um ganho importante”.

Infográfico: linha do tempo das legislações ambientais brasileiras referentes à Mata Atlântica
Infográfico: linha do tempo das legislações ambientais brasileiras referentes à Mata Atlântica. (Créditos: João Curi)

Vigiar e punir

Neste cânone de preservar e destruir, existe um ciclo de controle que se sustenta na dimensão proativa, relacionada às ações lícitas, e uma agenda reativa, que contrai uma série de penalidades. Mas nem todas as ações são tratadas de maneira uniforme. Afinal, não é o caso de um médico que, para todas as doenças, teria o mesmo remédio.

“Uma solução possível, dentre as várias dentro das políticas públicas, é ‘aproveitar as medidas compensatórias do licenciamento ambiental, que é uma ferramenta de controle de atividades de significativo impacto, em que há declaradamente uma perda de qualidade em prol de outros interesses’”, discorre Freiria, com referências na dissertação Análise da restauração florestal da Mata Atlântica via compensações ambientais no contexto do licenciamento no estado de São Paulo (Unicamp, 2020). “Você pode usar o licenciamento para trazer uma compensação, em termos de recuperação de Mata Atlântica, maior do que aquela área afetada”.

Ou seja, o bom uso do licenciamento ambiental viabiliza uma agenda proativa que configura, por sua vez, melhor direcionamento compensatório a partir da aplicação de benefícios. É o caso dos atores-chave que, por demasiada empatia com a fragilidade do bioma, tornam-se beneficiários de políticas de fomento, como linhas de crédito, isenções tributárias, capacitação, orientação técnica.

Recentemente, o Estado de São Paulo desenvolveu alguns programas regionais de agenda proativa, como o Programa Agro Legal (2020) e o ReflorestaSP (2021). Essas iniciativas se espelham na missão de reduzir os GEE e reforçar os mecanismos de regularização ambiental com fomentos de recursos públicos e privados. Aliado aos objetivos de ONGs como Copaíba e SOS Mata Atlântica, o Estado encontra um caminho aberto e bem-acompanhado para o cumprimento de suas metas ambientais.

Aos antagonistas, entretanto, que ousarem desafiar as normas já decretadas, espera-se uma resposta à altura da Polícia e das demais autoridades competentes. Na construção de um verdadeiro ato de fiscalização e controle, seria ideal promover a coibição do desmatamento ilegal e monitorar as APPs, em colaboração com a continuidade do ciclo de controle.

 “O Estado tem que estar sempre calibrando isso”, demarca o professor. “Para quem quer contribuir, políticas de fomento, proatividade. Para quem está querendo atrapalhar essas agendas, políticas de reação, de comando e controle”.

Alunos da PUC-SP pertencentes ao coletivo 'Eco Luta' colaram cartazes no pátio de entrada da universidade
por
Vinícus Evangelista
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23/09/2023 - 12h

Nesta sexta-feira (15), alunos do curso de Ciências Socioambientais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), se reuniram para colar cartazes em forma de manifestação a respeito de temas diversos que envolve o ambientalismo. Os ativistas fazem parte do coletivo 'Eco Luta', que em 2023 celebra a '3ª semana do curso de Ciências Socioambientais'. "O evento tem por objetivo promover o debate acadêmico a respeito dos temas atuais do curso de Ciências Socioambientais, com destaque para as questões climáticas, movimentos sociais, povos indígenas e Amazônia.", explica o site do evento.

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Movimento reuniu mais de dez pessoas na entrada da universidade // Foto: Vinícius Evangelista

 

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Cartazes fazem oposição ao Marco Temporal e chama a atenção para as crises climáticas existentes no país // Foto: Vinícius Evangelista

 

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Jovens são estudantes de "Ciências Socioambientais" e fazem parte do coletivo "Eco Luta" // Foto: Vinícius Evangelista
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A Semana de socioambientais é um evento anual que reúne estudantes, professores e especialistas para discutir temas atuais e relevantes relacionados à área. // Foto: Vinícius Evangelista
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A 3ª semana de Ciências Socioambientais ocorreu nos dias 11 e 15 de Setembro no auditório 117-A da PUC-SP // Foto: Vinícius Evangelista
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Dentre as principais pautas de debate do coletivo estão os direitos dos Povos Indígenas, o desmatamento e as ações governamentais a respeito do tema // Foto: Vinícius Evangelista

 

País recorreu ao uso de água insalubre após decreto de emergência nacional
por
Lucas de Paula Allabi
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31/08/2023 - 12h

Desde maio deste ano, o Uruguai registrou níveis de água entre 1,7 e 6% na represa Paso Severino, principal reservatório que abastece a região sul do país. Com a iminente crise hídrica, o presidente de centro-direita, Luis Lacalle Pou, autorizou a mistura da água do rio da Prata, com maior concentração de substâncias impróprias, ao resto do reservatório para complementar o estoque.

O acúmulo de sal e cloreto no rio é três vezes maior que o recomendado pela OSE (Obras Sanitarias del Estado), empresa estatal responsável pela manutenção dos sistemas hídricos. Várias famílias, sem dinheiro para comprar água engarrafada, ficaram impossibilitadas de consumir o líquido no país que foi o primeiro a reconhecer o direito à água como universal.

O estado uruguaio, em meio a insatisfação popular, afirmou que a crise hídrica foi agravada pela seca dos últimos três anos, causada pelo fenômeno oceânico La Ninã. O vice-ministro do meio ambiente, Gerardo Amarilla, em entrevista a rede local Canal 12, disse esperar as chuvas futuras para resolver o problema. Nós atuamos pensando que era uma questão temporal e que as chuvas iriam chegar”, comentou o ministro.

	Em imagens da NASA capturadas por satélite, é possível ver o leito reservatório Paso Severino completamente seco e envolto por fazendas, que prejudicam a retenção de água no local.
Em imagens da NASA capturadas por satélite, é possível ver o leito reservatório Paso Severino completamente seco e envolto por fazendas, que prejudicam a retenção de água no local.

A população, que se mobilizou em manifestações desde o final de maio, reclama, também, que os últimos governos fizeram mau uso dos recursos hídricos, dando a sua maior destinação à indústria e à agropecuária. A organização ambiental Redes-Amigos de La Tierra expôs que 80% da água do país é destinada a fábricas de celulose e cultivos de arroz e soja.

As acusações de descaso com o abastecimento se agravaram ainda mais com a tentativa da Google de instalar uma data base no país. De acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente, o centro usaria 7,6 milhões de litros de água por dia para resfriar seus servidores, o equivalente ao uso doméstico diário de 55 mil pessoas.

A frase “não é seca, é roubo”, em protesto contra a empresa, foi vista em vários cartazes em Montevidéu. O Ministério do Meio Ambiente rebateu dizendo que os dados estavam desatualizados e que a instalação do Google será menor.

A BNamericas, consultora e analista de mercados para empresas que querem firmar negócios em países latino-americanos e que presta serviços ao Google, declarou que a empresa está buscando soluções: Esperamos que as cifras preliminares, como o consumo de água projetado, sofram alterações. No Google a sustentabilidade está no centro de tudo o que fazemos, e a forma em que desenhamos e administramos nossos centros de dados não é uma exceção".

Manifestantes seguram cartazes contra a política da seca em Montevidéu
Manifestantes em Montevidéu reinvindicam o direito à água. Foto: Redes-Amigos de la Tierra

 

Célia Xakriabá, líder da Frente Indígena, irá coordenar os trabalhos da Comissão para Amazônia e Povos Originários.
por
Vitor Simas
|
18/03/2023 - 12h
A deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) durante sessão na Câmara; Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados.
A deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) durante sessão na Câmara; Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados.
 

A deputada federal, Célia Xakriabá, se tornou na quarta-feira (15) a primeira liderança indígena a presidir uma comissão no Congresso Nacional. Ela irá assumir o papel de presidenta da Comissão Amazônia e Povos Originários Câmara dos Deputados (CPOVOS).  Um marco histórico para a política brasileira.

A comissão foi criada a partir do desmembramento da Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional. O colegiado terá como papel discutir e votar propostas relativas ao desenvolvimento da região amazônica e a defesa dos mais de 300 povos indígenas que vivem no Brasil.

 Já na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara, algumas organizações ambientalistas manifestaram preocupação com a escolha, para a presidência, deputado José Priante (MDB-PA) que defende o garimpo em Terras Indígenas.

“No momento em que a crise climática exige do Congresso Nacional a promoção de avanços na proteção socioambiental, causa preocupação que a presidência da comissão não esteja com um parlamentar com histórico de atuação no tema”, afirmou Maurício Guetta, do Instituto Socioambiental (ISA), ao Metrópoles. “Esperamos que sua gestão seja marcada pela prevalência dos consensos e pela contenção dos graves retrocessos em tramitação”.

Em seu primeiro mandato, Célia ressaltou que  pretende fazer do colegiado um espaço de debates que esteja além das fronteiras da Amazônia. "Pautaremos a importância de todos os biomas brasileiros, de povos originários, de povos e comunidades tradicionais. Nós não precisamos ser da Amazônia para defender a Amazônia. Não precisamos ser do cerrado para defender o cerrado. E, neste momento, esta comissão tem um caráter muito importante porque ela vai dar contorno a outras comissões – de Meio Ambiente, de Direitos Humanos", citou, ao mencionar o percurso legislativo de propostas que afetam diferentes áreas.

Célia informou que a luta contra o Projeto de Lei (PL) 490, que pretende barrar as demarcações de TIs; a implementação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de TIs (PNGAT); o combate ao racismo; e a defesa dos direitos das mulheres indígenas serão prioridades da frente parlamentar.

Em conversa com o Brasil de Fato, a deputada ressaltou seu compromisso na promoção de diferentes interlocuções no âmbito das tarefas do colegiado. "Entender a presença indígena aqui é também entender que precisamos criar diálogos. Esta casa se tornou uma casa árida, onde se tem pouco diálogo. Quero dizer ainda que nós, povos originários, que não somos nem 1% da população brasileira, protegemos mais de 80% da biodiversidade. Isso significa que nem sempre quem é maioria está fazendo melhoria. Estamos aqui convocando os parlamentares a fazerem parte dessa melhoria."

 

Terras indígenas combatem a crise climática.

 

A proteção das Terras Indígenas demonstra ser essencial para frear o desmatamento  fomentado pelas grandes corporações, madeireiros e garimpeiros. Hoje, as TIs  e Unidades de Conservação cobrem mais de 42% da Amazônia Brasileira.  Enquanto 20% da floresta amazônica foi desmatada nos últimos 40 anos, as Terras Indígenas na Amazônia Legal perderam apenas 2% de suas florestas originais – Instituto Socioambiental (ISA).


Outro ponto importante é que por meio dos chamados rios voadores, em que árvores amazônicas possuem participação fundamental, elas reciclam a umidade que recebem do Atlântico e "disparam" para a atmosfera grande carga de umidade, que viaja milhares de quilômetros até cair em forma de chuva em diversas regiões do país, abastecendo importantes bacias hidrelétricas. "A do Paraná principalmente, que tem um monte de hidrelétricas, uma depois da outra. Se não tiver essa quantidade de água transportada pelos rios voadores, não vai encher reservatórios e não vai produzir energia", analisa Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

. . .

A frente indígena tem importância estratégica no governo Lula, que nos primeiros dias de seu governo, sinalizou com a demarcação de 13 novas terras indígenas. O Congresso também tem a maior representação de indígenas na atual legislatura, tornando-se um espaço de relevante discussão para o desenvolvimento de uma política comprometida na defesa dos povos da floresta e desenvolvimento econômico sustentável.

O assessor político da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Paulino Montejo, diz enxergar a chegada de Xakriabá à presidência da comissão como a descoberta de mais um espaço para demonstrar que as lideranças do segmento podem exercer protagonismo naquilo que diz respeito à sua própria agenda. 

A criação da CPOVOS - Comissão Amazônia e Povos Originários Câmara dos Deputados e a escolha de Célia Xakriabá para presidir o colegiado conta com o apoio também de servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que atuam no movimento organizado em prol de políticas públicas consistentes para o órgão. 

"Não serei somente uma pessoa indígena a presidir a comissão: serão 900 mil cocares que assumem a comissão comigo", disse a parlamentar, em um discurso que agitou dezenas de apoiadores que compareceram à sessão para prestigiá-la. Célia Xakriabá (CPOVOS).

 

 

Referências:

Instituto Socioambiental - socioambiental.org

Brasil De Fato - brasildefato.com.br

Made For Minds  - dw.com

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Aumento dos casos de varíola estimulou ataque a animais silvestres.
por
Vitor Simas
|
09/08/2022 - 12h

O aumento de casos da “varíola dos macacos” tem provocado uma onda de perseguição aos animais silvestres. As pessoas, por medo, começaram a agredir os animais, em especial os macacos, por acharem que estes são os transmissores da nova doença. Agência Brasil.

Muitos estão sendo apedrejados e envenenados. Informações duvidosas e preconceituosas emitidas por mídias imprudentes para com a vida dos animais não humanos estão estimulando essa perseguição. 11 macacos da espécie dos Saguis (Callithrix jacchus) e Prego (Cebus apella), em risco de extinção, foram encontrados intoxicados, agredidos e mortos no interior de São Paulo, em São José do Rio Preto.

Sobreviventes foram levados para tratamento no zoológico Municipal. Apesar do nome, a transmissão da “varíola dos macacos” não está associada aos primatas não-humanos. Em comunicado divulgado pela Sociedade Brasileira de Primatologia (SBP) todas as transmissões identificadas, que já ultrapassam 2 mil casos no Brasil, foram passadas de humanos para humanos. Essa forma de contágio é o fator relevante para o estabelecimento de medidas de controle.

Mas por que a “varíola dos macacos’’ tem esse nome?

A nova varíola foi erroneamente nomeada em pesquisas feitas por cientistas na década de 50, em que o vírus da atual varíola foi registrado em primatas-não-humanos em laboratório dinamarques e então nomeado de (Monkeypox).

A Organização Mundial da Saúde (OMS) está colaborando com especialistas para adotar um novo nome para a varíola dos macacos. A iniciativa ocorreu depois que mais de 30 cientistas escreveram na semana passada sobre a “necessidade urgente de um (nome para a doença e para o vírus) que não seja discriminatório nem estigmatizante”.

Vale ressaltar que os macacos, os primatas não humanos são vítimas da zoonose assim como os humanos e portanto não devem sofrer nenhum tipo de retaliação, a população de macacos atua como sentinelas da doença, costuma adoecer antes que os humanos alertando sobre a presença da doença no local.

Transbordamento de novas infecções.

Antes mesmo da emergência do coronavírus no final de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem alertado sobre os riscos do surgimento de doenças relacionadas com a interação entre animais humanos e não humanos com potencial de se espalhar pelo mundo e afetar grandes populações em todos os países.

Segundo o Instituto Oswaldo Cruz, o desmatamento e a caça de animais silvestres são fatores determinantes para a propagação de novas e antigas zoonoses, pois aumentam o risco de exposição entre animais adoecidos e saudáveis. O estudo aponta, ainda, que todo o território brasileiro está suscetível a emergências ocasionadas por zoonoses, a expansão das atividades extrativistas em diversos biomas do país favorece um fenômeno conhecido como “spillover” em tradução literal, é quando os agentes causadores de doença que circulavam restritamente em um grupo animal “saltam” e passam a infectar outras espécies, incluindo humanos.

Relembrando, o receio de contágio por transmissão desta e de outras doenças, como a febre amarela, pela proximidade com os macacos nao justifica a violência para com esses e outros animais silvestres. Os primatas fazem parte da nossa biodiversidade, têm importante papel na manutenção das florestas e auxiliam nos serviços ecossistêmicos — serviços reguladores que a natureza nos presta, como na polinização, dispersão de sementes nativas, controle de pragas, etc. Com isso, os primatas contribuem com a manutenção da saúde ambiental e humana e portanto não são os vilões do novo contagio da doença.

Relatório na integra: https://drive.google.com/file/d/1DmVaIFrvfRJt8ccDBeHrB7UXpNzq6Hc0/view