Banda se apresenta em fevereiro de 2026; taxas extras geram críticas e frustrações entre os fãs
por
Maria Clara Palmeira
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27/06/2025 - 12h

A espera acabou! Na segunda-feira (23), foi anunciado que, após 17 anos, a banda americana My Chemical Romance retornará ao Brasil em 2026 pela segunda vez. O único show da banda em solo brasileiro será no dia 5 de fevereiro, no Allianz Parque, em São Paulo, como parte de sua turnê pela América Latina. 

A apresentação contará com a abertura da banda sueca The Hives e irá reunir brasileiros que acompanham a trajetória do grupo desde os anos 2000.

Anúncio da turnê na América do Sul. Reprodução: Instragram/@mychemicalromance
Anúncio da turnê na América do Sul. Reprodução: Instragram/@mychemicalromance


Formada em Nova Jersey nos Estados Unidos, em 2001, o My Chemical Romance tornou-se uma das bandas mais representativas do rock alternativo e símbolo do movimento emo. A formação atual é composta por Gerard Way nos vocais, Ray Toro e Frank Iero na guitarra, e Mikey Way no baixo.

O grupo lançou seu álbum de estreia, “I Brought You My Bullets, You Brought Me Your Love”, em 2002, mas o sucesso internacional veio em 2004, com “Three Cheers for Sweet Revenge”. No entanto, foi em 2006 com o disco “The Black Parade” que a banda atingiu o auge. O single “Welcome to the Black Parade” se tornou um hino da geração emo, alcançando o primeiro lugar nas paradas britânicas e consolidando o grupo no cenário global.

Após diversos sucessos, a banda entrou em hiato e anunciou sua separação em março de 2013. O retorno foi anunciado em outubro de 2019, com um show em Los Angeles. Em 2022, após dois anos de adiamentos devido à pandemia, a banda embarcou em uma extensa turnê, passando pelos EUA, Europa, Oceania e Ásia.

Desde a quarta-feira (25), início da pré-venda, fãs relataram insatisfação com o preço dos ingressos, que variam entre R$ 197,50 e R$ 895,00, além das cobranças de taxas adicionais. A revolta se intensificou com a cobrança da taxa de processamento, considerada uma novidade pela bilheteria oficial, a Eventim. A empresa alegou que essa tarifa garante a segurança dos dados dos consumidores, mas a justificativa não convenceu o público. 


Mesmo com a revolta, a expectativa de alta demanda se confirmou: a venda geral, aberta nesta quinta-feira (27) ao meio-dia, resultou em ingressos esgotados em 10 minutos.

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Nova exposição na Pinacoteca Contemporânea revela o papel político da pop arte brasileira no período de ditadura.
por
Maria Luiza Pinheiro Reining
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25/06/2025 - 12h

Por trás da explosão de cores, imagens familiares e estética publicitária da pop art brasileira, havia ruído, ambiguidade e protesto. Essa é a premissa da exposição Pop Brasil: Vanguarda e Nova Figuração, 1960-70, em cartaz na nova sede da Pinacoteca Contemporânea, em São Paulo. Mais do que uma exibição de obras pop, a mostra constrói um retrato crítico de uma década marcada por ditadura, censura e modernização desigual, e de como a arte respondeu a esse cenário.

A exposição celebra os sessenta anos das mostras Opinião 65 e Propostas 65, marcos da virada estética e política na produção brasileira. O percurso curatorial, assinado por Pollyana Quintella e Yuri Quevedo, reúne obras que reagiram diretamente ao avanço da indústria cultural, à opressão do regime militar e à transformação dos modos de vida. Em vez de apenas absorver os códigos da cultura de massa, os artistas incorporaram sua linguagem para tensionar o que ela ocultava: a violência da ditadura, o apagamento de subjetividades e a precarização das relações sociais.

Contra a censura
Tônia Carreiro, Eva Wilma, Odete Lara, Norma Benghel e Cacilda Becker protestam contra censura, em 1968

A ideia de que “a pop arte é o braço avançado do desenvolvimento industrial das grandes economias” é ressignificada no Brasil, onde a modernização industrial coexistia com a informalidade, a desigualdade e a repressão. Em vez do otimismo norte-americano, a arte pop brasileira surge como crítica: reapropria slogans, transforma marginais em heróis, imprime silhuetas de bandeiras como gesto de manifestação coletiva. A visualidade sedutora do consumo encontra a resistência política camuflada nas superfícies gráficas.

A exposição percorre núcleos como Poder e Resistência, Desejo e Trivialidade, Criminosos e Cultura Marginal, entre outros. Em comum, todos os conjuntos partem de imagens produzidas ou apropriadas do cotidiano: televisão, jornal, embalagem; para apontar fissuras entre aparência e estrutura. Hélio Oiticica, Rubens Gerchman, Wanda Pimentel, Antonio Manuel e muitos outros traduzem a tensão entre censura e invenção por meio de performances, happenings e obras gráficas que confundem arte e ação direta.

Helio Oiticica
Hélio Oiticica, 1968

Se nos Estados Unidos a pop art celebrava o consumo, no Brasil ela revelou o que havia por trás dele. A mostra explicita como a arte brasileira dos anos 1960 e 70 operou sob risco, incorporando elementos populares para criticar os próprios instrumentos de controle e espetáculo.

Mais do que rever o passado, Pop Brasil propõe um exercício de leitura do presente. Diante da repetição de discursos autoritários, da estetização da política e da crise na democracia, o gesto pop reaparece como estratégia de sobrevivência, uma forma de dizer muito com imagens que, à primeira vista, parecem dizer pouco.

 

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A incerteza quanto ao fim das salas de cinema e início da diminuição em massa de consumidores
por
Chiara Renata Abreu
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18/06/2025 - 12h

A recente chegada dos streamings pode acabar com os cinemas. Internacionalmente, as plataformas têm se mostrado cada vez mais aptas a abalar seus concorrentes. 

Depois da pandemia, os donos dos cinemas sentiram a diminuição de movimento, que preocupa não só a indústria, mas a sociedade em si. Filmes e curtas fazem parte da formação da cultura de civilizações, e a incerteza de sua existência atormenta. Os streamings ganharam força no período de quarentena, ocupando o espaço que as salas obtinham. O conforto de estar em sua própria casa, poder parar o filme a qualquer momento e a variedade no catálogo são alguns dos principais motivos do aumento da modalidade segundo pesquisas da Cinepop, site especializado em cinema. 

De acordo com pesquisas da revista O Globo, a área do cinema conseguiu em 2023 superar as dificuldades e recuperar alguns de seus fregueses, mas os números seguem abaixo do que estavam antes da pandemia. Segundo o analista de mercado Marcelo J. L. Lima em entrevista para a revista, a crise é mundial, com ressalvas em países como França, Índia, Coreia do Sul e China, que tem menor influência de Hollywood. Ainda, a reportagem aponta que parte da fraqueza hoje encontrada na indústria se fez depois de 1980, a partir do início da migração dos cinemas de rua para os de shopping. Em 2008 apenas 27% deles eram fora dos centros de comércio. 

Em entrevista para O Globo, Marcos Barros, presidente da Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas Operadoras de Multiplex (Abraplex), apontou que os cinemas estão em apenas 8% dos municípios brasileiros, apenas 451 de um total de 5.565 cidades. A volta dos cinemas de rua poderia diminuir o desequilíbrio das salas, gerando uma maior popularização do cinema. Segundo Raíssa Araújo Ferreira, estudante de cinema na Belas Artes, “os cinemas estão se perdendo. Antigamente existiam vários cinemas de rua, de mais fácil acesso. Hoje está acontecendo uma elitização das salas. Elas estão, por exemplo, muito longe das periferias e concentradas nos shoppings, então existe todo o gasto com a locomoção. O cinema se torna um lugar de privilégio”. 

“O cinema é a sétima arte. Ela é um conjunto de todas as outras artes, e o cinema é vivo. Ele é sempre atual. Ele é sempre de todas as épocas. Então nada que é vivo vai desaparecer sem deixar vestígios. O cinema tem muito o que falar. É como se as salas estivessem adormecidas. Elas não estão mortas, mas sim apagadas”, comenta a aluna. 

A jovem complementa com ideias para a volta do triunfo das salas de cinema. “Acho que precisamos reinventar as salas. Apostar em programações mais diversas, ingressos mais acessíveis, novas salas mais perto da periferia e espalhar o cinema pelas cidades do Brasil. Criar o desejo de ir ao cinema, como um acontecimento, e trazer experiências mais imersivas, como convidar atores para, antes da sala de cinema, falarem sobre o filme. Trazer também eventos para apoiar o cinema de rua, investindo nas produções independentes e criando lugares públicos. Assim, as salas vão se reposicionar e oferecer algo que o sofá de casa ou a cama não oferece”. 

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A história do grupo que ultrapassou as barreiras sonoras pode ser vista no centro de SP até o fim de agosto
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Por Guilbert Inácio
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26/06/2025 - 12h

A exposição “O Quinto Elemento”, em homenagem aos 35 anos do notório grupo de rap Racionais MC’s, está em cartaz desde o dia 06 de dezembro de 2024, no Museu das Favelas, no Pátio do Colégio, região central da cidade de São Paulo. A mostra era para ter sido encerrada em 31 de maio de 2025, mas, devido ao sucesso, vai agora até 31 de agosto.

A imagem mostra um painel os quatros membros dos Racionais MC's
Em 2024, o museu ganhou o prêmio de Projeto Especial da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA) pela exposição. Foto: Guilbert Inácio. 

Museu das Favelas

O Museu das Favelas está localizado no Centro histórico de São Paulo, mas esse nem sempre foi o seu endereço. Inaugurado no dia 25 de novembro de 2022, no Palácio dos Campos Elíseos, o Museu das Favelas ficou 23 meses no local até trocar de lugar com a Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, no dia 26 de agosto de 2024.  

Fechado por três meses, o museu reabriu no dia 06 de dezembro de 2024, já com a nova exposição dos Racionais MC’s. Em entrevista à AGEMT, Eduardo Matos, um dos educadores do museu, explicou que a proposta da exposição chegou neles por meio de Eliane Dias, curadora da exposição, CEO da Boogie Naipe, produtora dos Racionais e esposa do Mano Brown. Eduardo complementou que o museu trocou de lugar para ter mais espaço para a mostra, já que no Campos Elísios não teria espaço suficiente para implantar a ideia. 

Tarso Oliveira, jornalista e historiador com pós-graduação em Africanidades e Cultura Afro-Brasileira, comentou que a gratuidade do museu é um convite para periferia conhecer a sua própria história e que, quando falamos de Racionais MC's, falamos de uma história dentro da história da cultura hip-hop, que salvou várias gerações fadadas a serem esquecidas e massacradas pelo racismo estrutural no Brasil. “Nós temos oportunidades de escrever a nossa narrativa pelas nossas mãos e voltada para o nosso povo. Isso é a quebra fundamental do epistemicídio que a filósofa Sueli Carneiro cita como uma das primeiras violências que a periferia sofre.”, afirma o historiador. 

O Quinto Elemento

Basta subir as escadas para o segundo andar do museu, para iniciar a imersão ao mundo dos Racionais. Na entrada, à sua direita, é possível ouvir áudios do metrô, com o anúncio das estações. Uma delas, a estação São Bento da linha 1-Azul, foi o berço do hip-hop em São Paulo, na década de 1980. À esquerda está um som com músicas dos Racionais, uma trilha que você irá ouvir em todos os espaços da exposição.

A imagem apresenta três placas, em sequência, com os dizeres "X", "Racionais MC's" e "Vida Loka".
Placas semelhantes às placas com nomes de rua trazem as letras do grupo. Foto: Guilbert Inácio.

No primeiro espaço, podemos ver o figurino do Lorde Joker, além de uma breve explicação da presença recorrente na obra do grupo da figura do palhaço em apresentações e músicas como “Jesus Chorou”, em que Mano Brown canta: “Não entende o que eu sou. Não entende o que eu faço. Não entende a dor e as lágrimas do palhaço.”

A imagem mostra uma fantasia laranja de um palhaço. Ao lado, há uma televisão.
O figurino é usado em shows pelo dançarino de break Jorge Paixão. Foto: Guilbert Inácio. 

Ao adentrar o segundo espaço, você mergulha na ancestralidade do grupo. Primeiro vemos imagens e um pouco da história das mães dos quatro membros, Dona Benedita, mãe e avó de Ice Blue; Dona Ana, mãe do Mano Brown; Dona Maria José, mãe de KL Jay e Dona Natalícia, mãe de Edi Rock. Todas elas são muito importantes para o grupo e ganharam, inclusive, referências em músicas como “Negro Drama” em que Brown canta: “Aí Dona Ana, sem palavra. A senhora é uma rainha, rainha”. 

É nessa área que descobrimos o significado do nome da exposição. Há um painel no local com um exame de DNA dos quatro integrantes que revela o ponto de encontro entre eles ou o quinto elemento – a África.

A imagem mostra um painel com o exame de DNA dos quatro membros dos Racionais MC's
Na “Selva de Pedra”, antes de todos se conhecerem, todos já estavam conectados por meio da ancestralidade. Foto: Guilbert Inácio.

O título se torna ainda mais significativo quando lembramos que a cultura hip-hop é composta por quatro elementos: rap, beat, break dance e grafite. O quinto elemento seria o conhecimento e a filosofia transmitida pelos Racionais, grupo já imortalizado na cultura brasileira, sobretudo na cultura periférica. 

Na terceira área, podemos conhecer um pouco de Pedro Paulo Soares Pereira, o Mano Brown; Paulo Eduardo Salvador, mais conhecido como Ice Blue; Edivaldo Pereira Alves, o Edi Rock e, por fim, Kleber Geraldo Lelis Simões, o KL Jay. Entre os inúmeros objetos, temos o quimono de karatê de Blue e o trombone de seu pai, a CDC do KL Jay, rascunhos de letras de Brown e Edi Rock.

A imagem mostra um bicicleta BMX azul
Primeira BMX de Edi Rock. Foto: Guilbert Inácio. 

O próximo espaço é o “Becos do som e do Tempo”, que está dividido em vários pequenos slots que mostram a trajetória musical do grupo. Podemos ver rascunhos de letras, registros de shows e a história de algumas músicas, além de alguns prêmios conquistados durante a carreira do grupo. 

Algumas produções expostas são “Holocausto Urbano” (1990); “Escolha seu Caminho” (1992); “Raio X do Brasil” (1993); “Sobrevivendo no Inferno” (1997); “Nada Como um Dia Após o outro Dia” (2002).

A imagem mostra um painel com os dizeres "Minha palavra vale um tiro, eu tenho muita munição" e uma foto dos quatro membros dos Racionais MC's. Ao lado, há fotos individuais dos membros.
O grupo confirmou um novo álbum para este ano, mas ainda não divulgou o título da obra nem a data de lançamento. Foto: Guilbert Inácio.

Nos próximos espaços, tem uma área sobre o impacto cultural, um cinema que exibe shows e o local “Trutas que se Foram” em homenagem a várias personalidades da cultura hip-hop que já morreram. A exposição se encerra no camarim, onde estão disponíveis alguns papéis e canetas para quem quiser deixar um registro particular na exposição.

A imagem mostra uma pequena placa com a foto da Dina Di e os dizeres: "Dina Di. Cria da área 019, como as quebradas conhecem a região de Campinas, no interior de São Paulo, Viviane Lopes Matias, a Dina Di, foi uma das mulheres mais importantes do rap no Brasil. Dina era a voz do grupo Visão de Rua. Dona de uma voz forte, assim como sua personalidade, a rapper nasceu em 19 de fevereiro de 1976 e morreu em 19 de março de 2010. Foi uma das primeiras mulheres a conquistar espaço no rap nacional. Dina nos deixou por causa de uma infecção hospitalar, que a atingiu 17 dias após o parto de sua segunda filha, Aline."
Nomes como Sabotage, Chorão, WGI, entre outros são homenageados na exposição. Foto: Guilbert Inácio. 

Segundo Eduardo, a exposição está movimentando bastante o museu, com uma média de 500 a 800 pessoas por dia. Ele conta que o ápice da visitação foi um dia em que 1500 pessoas apareceram no local. O educador complementa que, quando a exibição chegou perto da sua primeira data de encerramento, em maio, as filas para visitar o espaço aumentaram consideravelmente. O que ajudou a administração a decidir pela prorrogação.  

Eduardo também destaca que muitas pessoas vão ao museu achando que ele é elitizado, mas a partir do momento em que eles veem que o Museu das Favelas é acolhedor, com funcionários dispostos a tirar suas dúvidas e com temas que narram o cotidiano da população brasileira, tudo muda. 

 “Dá para sentir que o pessoal se sente acolhido, e tendo um movimento desse com um grupo que é das favelas, das quebradas, que o pessoal se identifica, é muito melhor. Chama atenção e o pessoal consegue ver que o museu também é lugar da periferia”, conclui. 

Impacto Cultural

Os Racionais surgiram em 1988 e, durante todo o trajeto da exposição, podemos ver o quão importante eles são até hoje para a cultura brasileira, seja por meio de suas músicas que denunciaram e denunciam o racismo, a violência do Estado e a miséria na periferia – marcada pela pobreza e pela criminalidade –, seja ocupando outros espaços como as provas nacionais e vestibulares.

A imagem mostra duas provas do Exame do Ensino Médio de 2023 com os trechos "Até no lixão nasce Flor" e É só questão de tempo, o fim do sofrimento".".
Trechos de Vida Loka, parte I e II nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio de 2023 (ENEM). Foto: Guilbert Inácio. 

Em 2021, foi ao ar a primeira temporada do podcast Mano a Mano, conduzido por Brown e a jornalista Semayat Oliveira, que chegou a sua terceira temporada em 2025.

Inclusive, o podcast, que já teve inúmeros convidados da cultura e da política vai virar  um livro, homônimo. A publicação sairá pela Companhia das Letras, que já publicou o livro “Sobrevivendo no Inferno”, em 2017. 

Segundo Tarso, o grupo representa a maior bandeira que a cultura negra e periférica já levantou nesse país, visto por muitos como super-heróis do gueto contra um sistema racista e neoliberal; além de produtores de uma música capaz de mudar a atitude e a perspectiva das pessoas, trazendo autoestima, além de muito conhecimento. 

“Um dos principais motivos do grupo se manter presente no cenário cultural é não se acomodar com a "força da camisa", como cita o Blue.  E sempre buscar ir além artisticamente, fazendo com que seus fãs tendam a ir para o mesmo caminho e continuem admirando sua arte e missão.”, finaliza Tarso. 

 

Serviço

O Museu das Favelas é gratuito e está aberto de terça a domingo, das 10h às 17h, com permanência permitida até às 18h. A retirada dos ingressos pode ser online ou na recepção do museu. Além da exposição “O Quinto Elemento”, também é possível visitar as exibições “Sobre Vivências” e “Favela é Giro”, nos mesmos horários.

Temáticas são abordadas desde os anos 60 no Japão e continuam exploradas até hoje
por
LUCCA CANTARIM DOS SANTOS
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16/06/2025 - 12h

“O sonífero”, projeto criado por Lucca Cantarim, estudante de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) , tem por objetivo combater a visão reacionária a respeito de temas de gênero no entretenimento.

Trazendo a história da presença de personagens de diversas sexualidades e gêneros nos mangás e animes dentro da mídia japonesa, o autor trás uma reflexão leve, descontraída, porém importante a respeito de uma representatividade tão importante.

Os sete artigos que compõem o projeto estão disponíveis para serem lidos no site “Medium”, no perfil autoral de Lucca. Os textos contém entrevistas com pesquisadores, fãs e até mesmo leitores de dentro da comunidade LGBT que se identificam e se abrem sobre a importância da representatividade para eles.

Disponível em: https://medium.com/@luccacantarim/list/o-sonifero-d19af775653e

 

Especialista explica de onde surgiu a sexualização mulher japonesa e a relação com os animes e a cultura conservadora do país
por
Gabriella Lopes
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24/06/2021 - 12h

Por Gabriella Lopes

 

Yumeko Jabami em seu primeiro dia na Academia Privada Hyakkaou, uma escola da alta elite localizada em algum lugar não especificado no Japão, surpreende os colegas quando desafia Mary Saotome, um monstro das apostas. Ninguém conhecia Yumeko e muito menos esperavam que fosse ganhar de Mary. Logo de cara entendemos a personalidade da personagem principal. Ela é viciada em apostar, mas para sua sorte, nasceu com o dom de decifrar as pessoas a sua volta e perceber trapaças, o que a leva ganhar na maioria das vezes. 

A história do anime Kakegurui é bastante interessante. A escola é um tipo de cassino para jovens ricos. A hierarquia começa no grêmio estudantil, formado pelos melhores jogadores até os endividados, tratados como serviçais. As relações de poder e amizade são determinadas pelo nível de habilidade. Assim que o sinal bate e a aula acaba, começam as apostas que dependendo do resultado pode mudar completamente a vida de alguém.

Em todos os jogos que Yumeko participa, ela arrisca perder enormes quantidades de dinheiro e em alguns casos até sua a vida, só para sentir a adrenalina do momento e acima de tudo, o prazer. As cenas não são explícitas, mas podemos entender bem o que a personagem sente. Características como suor, gemidos, bochechas coradas e as mãos em cima das partes íntimas são comuns quando se está em uma cena tensa de aposta.

Para quem lê a sinopse parece uma história comum para o estilo de anime shounen mangá.

O shounen mangá é um estilo de anime e mangá japonês voltado para os adolescentes. O seu foco é o público masculino, mas também atrai o feminino. Para atrair os meninos, uma das artimanhas desse estilo usadas pelos produtores  é a sexualização das personagens femininas, o que, com o tempo, se tornou uma característica comum do estilo.

Kakegurui não é exceção. A maioria dos personagens principais são mulheres e todas são sexualizadas, além de mostrarem traços fortes erotizados de homossexualidade e bissexualidade. Elas são viciadas em apostar e sentem prazer sexual, a ponto de se masturbarem ao longo das partidas devido ao tamanho do prazer que sentem ao jogarem. 

Personagens estereotipadas com as de Kakegurui são reflexos diretos do fetcihe do homem japonês. Não existe qualquer conexão lógica em sentir tamanho prazer sexual com apostar. E são histórias como essas que caracterizam o fetiche japonês. Esses tipos de fantasias sexuais são traços singular da cultura do país, especialmente dentro do grupo masculino. 

Simonia Fukue, professora da USP, pesquisadora da cultura japonesa e especialista em animes explica que no Japão o homem não necessariamente precisa do sexo para se satisfazer. O fetiche é, explica ela, em alguns casos, o suficiente. Isso é algo tão característico que existe um mercado inteiro para suprir as demandas desses consumidores.

 

Kakegurui vai longe nesta questão. Midari Ikishima é uma das integrantes  do grêmio estudantil e é masoquista. Seu jogo preferido é a roleta russa e quando quer sentir prazer, atira na própria cabeça com a  expectativa de levar o tiro enquanto se masturba. Todos os jogos que ela propõe envolvem risco de vida a fim de buscar o prazer sexual. Na vida dos homens japoneses existem situações extremas como essa também.

Para a pesquisadora que descende de japoneses e já morou mais de um ano lá, o problema é sistemático. Diferente do ocidente que está avançado no processo, no Japão, o movimento feminista e a pauta sobre a igualdade de gênero é pouco discutida. Além disso, espera-se da mulher um determinado comportamento e vestimenta.  

Simonia, conta, por exemplo, que quando foi pesquisar a estética kawaii (é um adjetivo japonês usado para chamar algo de lindo e fofo, também é uma estética que envolve estilo de roupa, personalidade e conteúdos animados considerado fofo e delicado) no Japão em 2015, sentiu-se julgada pelas suas roupas serem justas (nos padrões japonês) e pela alça de seu sutiã aparecer, algo que no Brasil é popular.

Na visão da professora, o gênero shounen mangá não é contestado pela sociedade japonesa, porque as mulheres ainda não aprofundaram a discussão sobre os direitos da mulher. Pelo contrário, a maior parte pensa que esse é o normal. 

Ao ser perguntada sobre porque uma sociedade tão conservadora também sexualiza personagens de animes, ela responde que ainda não existe uma resposta concreta. Entretanto, voltando um pouco na história do país, é possível observar alguns pontos que dão pistas de onde esse comportamento veio.

Começa na era Meiji, que iniciou em 1868, quando o Japão pressionado pela expansão do capitalismo abriu sua economia para o mundo ocidental. Segundo Simonia, quando as mulheres japonesas entraram em contato com as mulheres ocidentais, principalmente as europeias, elas tomaram como beleza o biotipo das estrangeiras. Uma das consequências disso foi a sexualização de si mesma. Por exemplo, para tentar aumentar os seios, buscaram métodos como usar roupas decotadas.  

Todavia, esse novo desejo entrou em conflito com as tradições e tendências foram criadas. Simonia explica que na década de 90 com o desenvolvimento da Internet, os japoneses passaram a ter mais contato com a cultura ocidental. Dessa forma, as mulheres perceberam diferenças no modo como o homem ocidental tratavam as mulheres e como os homens japoneses as tratavam.

O carinho japonês, conta a professora, é, de certa forma, agressivo e quando viram o carinho ocidental (como o de um homem de filmes hollywoodianos), passaram a repreender os japoneses pela forma brusca como demonstravam amor. 

Em busca de um parceiro ocidental, as japonesas começaram a mudar sua postura. Passaram a buscar uma profissão e a independência financeira, pois concluíram que seria assim que conquistariam os gringos. 

Por outro lado, o homem japonês passou a se sentir abandonado. No Japão, não é aceitável que mulheres ganhem mais do que homens, pois é dever dele sustentar a família. Além disso, começaram a se incomodar com a voz feminina. Para eles era inaceitável que a mulher não seguisse os padrões de comportamento e estéticos pré-determinados. 

Foi daí que se fortaleceu o fetiche do homem. O sexo ficou um pouco de lado, para dar espaço a carência, levando a situações extremas como o mercado de pernas para abraçar, entre outros produtos.

Ao mesmo tempo, as mulheres descobriram uma nova forma de se expressarem. Para burlar as regras sociais, passaram a se mostrar de forma diferente conforme o ambiente. Simonia fala, que “esse outro lado japonês [da mulher] é: ‘enquanto estou vivendo na sociedade eu sou recatada, mas quando estou com meus amigos, estou fora do nicho disciplinado japonês, que pensam como eu e que são como eu, vou ser sexualizada, quero ser sexualizada’, não são todas, mas é a maioria.”

Em contrapartida, as chances delas conseguirem casar com um ocidental eram poucas. Inclusive, porque a cultura japonesa não aceita facilmente relacionamentos com pessoas de outra nacionalidade. Todavia, uma mulher independente e usando roupas decotadas não atrairia o homem japonês e outra tendência nasceu. 

Foi assim que nasceu a moda kawaii. Simonia não sabe afirmar se foi o kawaii que copiou a cultura japonesa ou se foi o contrário. Mas as mulheres passaram a usar roupas e maquiagens para transparecer fofura e fragilidade. 

Isso, segundo a pesquisadora, é outra contradição dentro da sociedade. Ao mesmo tempo que as mulheres querem se sexualizar, elas querem mostrar fragilidade e vulnerabilidade. Ainda não existe uma conclusão certa para isso, mas Simonia diz que na visão dela, os japoneses são 8 ou 80. Talvez isso explique, mesmo que superficialmente, porque as japonesas vivem essa ambiguidade. 

No Brasil, apesar de não haver uma pesquisa específica para isso, pode-se observar um grupo considerável de consumidores de animes e mangás que se incomodam com o assunto. Mesmo assim, continua sendo consumido tanto quanto no Japão. 



 

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“Mais um tiro no pé do governo”, afirma chargista que teve publicação investigada após associar o Presidente Bolsonaro à suástica nazista.
por
Carlos Kelm
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08/04/2021 - 12h

“Algumas pessoas começaram a me mandar solidariedade no zap”, Renato Aroeira conta que ficou incrédulo ao descobrir sobre o caso pela internet. Após se inteirar, o chargista revela que sentiu pânico: “eu não tenho nem advogado”.

 Mais tarde, foi surpreendido novamente, desta vez por pessoas oferecendo ajuda: “Dez advogados apareceram, todos de escritório grande, se colocando à disposição, e eu descobri que existe uma rede de solidariedade funcionando no Brasil há um tempo”

O caso passou a ter ainda mais repercussão após outros cartunistas se juntarem para fazer suas próprias versões da charge original; a nova proposta recebeu o nome de Charge Continuada. “Na evolução disso, a Charge Continuada gerou centenas e centenas de desenhos”

Em pouco tempo, diversos jornais, intelectuais e escritores já haviam declarado apoio a Aroeira. “Aos poucos fui descobrindo que foi um grande tiro no pé e que a capacidade da sociedade de reagir a alguns absurdos é muito rápida”, comenta.

Recentemente, o inquérito aberto pelo ministro da Justiça André Mendonça foi arquivado pelo MPF, em defesa da liberdade de expressão do chargista. Após esse desfecho, Aroeira reafirma seu posicionamento: “O presidente da República pede para a sua massa apoiadora invadir um hospital, a gente só vê isso no fascismo”

O chargista ainda compreende as consequências positivas do ocorrido: “Isso trouxe, na verdade, a discussão sobre a Lei de Segurança Nacional, que é um absurdo e não deveria existir”. Atualmente, o STF discute uma possível mudança na referida lei.

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O compositor marcou geração com suas letras despojadas que empoderaram o rock brasileiro
por
Daniel Seiti, Luise Goulart e Rafael Felix
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09/04/2021 - 12h

               O ex-vocalista do Charlie Brown Jr., Chorão, completaria 51 anos de idade nesta sexta (9). O músico liderou a banda a um sucesso nacional astronômico desde o final da década de 90 até a sua morte, em 2013. 

            Alexandre Magno Abrão nasceu em 9 de abril de 1970, na cidade de São Paulo, onde residiu durante sua infância até se mudar para Santos, no litoral paulista. O curioso apelido que o acompanhou até o final de sua vida surgiu aos 14 anos de idade, criado pelos amigos que se referiam aos choros do jovem quando errava manobras em seu skate. Ali nascia o “Chorão”.

Começou sua carreira aos 20 anos, quando se juntou ao What’s Up. Nesse período, conheceu o baixista Champignon. Após o fim do grupo, a dupla buscou novos membros para a formação de uma nova banda. O conjunto foi completado por Renato Pelado (bateria), Marcão e Thiago Castanho (guitarras).

O nome Charlie Brown Jr. foi originado a partir do desenho “Charlie Brown”, que Chorão encontrou em uma barraca de água de coco. O “Jr.” significava que a banda seria a mais nova geração do rock brasileiro. O estilo musical era bem diverso, misturando elementos do hardcore e do reggae, junto com as influências estéticas advindas do skate.

Foto Charlie Brown Jr.
Charlie Brown Jr.  Foto: divulgação

A banda passou por diversas formações em sua extensa carreira, mas isso não impediu que o projeto se tornasse de grande sucesso no Brasil. Ao total, lançaram 11 álbuns de estúdio, além de três discos gravados ao vivo, recebendo títulos e premiações pelos trabalhos.

“O Chorão era um cara que entedia muito de som, sua genialidade musical era atemporal.  Ele ouvia muitas músicas e tinha um ouvido muito refinado. A gente gravava a voz dele e ele já orientava as próximas coordenadas para as demais vozes. Isso era de praxe, gravávamos, ouvíamos juntos e ele, de certa forma, já pré-mixava ali mesmo”, conta André Freitas, um dos produtores do álbum “La Família 013”, em entrevista à AGEMT.

Freitas relembra como o vocalista era muito exigente e autocrítico durante as tomadas de gravação do disco. “Ele gravava um trecho, ouvia no fone, ouvia na técnica e seguia. E eu, privilegiado por estar ali, aprendi muito”.

Em 6 de março de 2013, aos 42 anos de idade, Chorão é encontrado morto em sua casa, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Após a realização do exame toxicológico do corpo, constata-se que o artista sofreu uma overdose de cocaína.

Seu falecimento acontece em meio as gravações do disco que ainda não havia sido terminado. Freitas explica que “as vozes do álbum já haviam sido gravadas previamente, inclusive, junto de algumas faixas que estavam finalizadas e prontas para serem lançadas”.

O disco “La Família 013”, divulgado em outubro de 2013, foi o último trabalho do conjunto e recebeu uma indicação ao Grammy Latino na categoria de “Melhor Álbum de Rock Brasileiro".

“As músicas “Fina Arte”, “Um dia a gente se encontra” e “Meu novo Mundo”, que seriam os singles do disco, foram gravadas antes”.

“Depois do falecimento dele, entramos em uma rotina: trabalhávamos todas as tardes no estúdio pegando todas as músicas no computador e cobrindo com as guitarras”, conclui Freitas.

La Família 013
Capa do álbum "La Família 013" (2013).  Foto: divulgação

Apesar do fim da banda santista, ainda em 2013, após a morte do vocalista, seu legado segue preservado pelos ouvidos de uma legião de fãs, como o Naderson Henrique, administrador de uma das maiores páginas de fãs do Chorão no Facebook, “O Chorão me ensinou”.

"Ele [Chorão] não pode ser lembrado apenas quando chegar esta data [falecimento], ele é muito mais do que isso. Eu queria ajudar de alguma maneira, então criei a fanpage e 'tamo aí na atividade' até hoje”, explica Henrique para a AGEMT.

Residente em Natal (RN), o administrador da página detalha o motivo de tanto carinho pelo Charlie Brown Jr.

“Não importa o meu estado emocional, sempre vou ouvir Charlie Brown Jr., o Chorão sempre tem um conselho pra te dar e a banda tem uma música pra cada momento da sua vida.” Apesar de cada um ter uma relação diferente com as obras do Chorão, não há dúvida que o músico foi uma figura inspiradora para muitas pessoas. Henrique afirma que sua maior admiração pelo vocalista é devido a sua humildade.

“Ele sabia como conversar com a gente através de suas letras, nos aconselhando a não desistir dos nossos sonhos, mesmo que ainda esteja longe, pois como ele mesmo dizia: temos que ter força, atitude, coragem, respeito...”

Chorão
Foto: Jerri Rossato Lima

Em junho de 2020, o Charlie Brown Jr. se reunia para a realização de um tributo ao aniversário do Chorão, que teria completado 50 anos de idade. O grupo havia planejado uma turnê celebrativa em homenagem ao falecido vocalista para ser iniciada no mês de abril, mas, em função da pandemia de coronavírus, os shows foram adiados.

Contudo, os integrantes convidaram Egypcio, ex-vocalista da banda Tihuana, para assumir os microfones, realizando um show, transmitido através de uma live, para anunciar a adição. 

“Para mim, é uma grande honra. Estarei representando um brother, com quem viajei muito pelas estradas, nos shows e festivais. Será bacana, vou dedicar todo o meu trabalho e atenção a essa tour celebrativa e espero todos vocês nos shows assim que essa pandemia passar”, diz Egypcio à AGEMT.

O conjunto santista é um conhecido de longa data do convidado. Mesmo antes de sua participação em um show do Charlie Brown Jr., em 2014, Egypcio relata diversos encontros fora dos palcos ao longo dos anos.

“Fizemos muitos shows juntos. Pertencíamos [o Tihuana e o CBJr] à mesma gravadora, a Virgin Records, que ficava no Brooklyn (Nova Iorque, EUA), e a gente se encontrava frequentemente. Todos os nossos encontros por aí eram muito bacanas, sempre com muita festa e muita risada”, conta o vocalista.

Egypcio também reconhece a importância do grupo de seus anfitriões para o cenário musical nacional e a relevância de seu front man no meio. “Um letrista que falava a língua da rua, da garotada, do skate. Tudo isso marcou uma geração”.

 

Assista a entrevista com Chorão, durante o programa Ensaio de TV Cultura, em 2009, quando o vocalista nos 29:17 minutos comenta a briga com Marcelo Camelo, do Los Hermanos, e se autointitula “Pedregulho do rock”.

 

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Renato Aroeira conta sobre a sua trajetória como cartunista.
por
Renan Silva de Mello
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08/04/2021 - 12h

Renato Aroeira, nascido em 18 de maio de 1954, é um chargista renomado. O mineiro de 65 anos contou um pouco sobre a sua carreira. Ao ser perguntado sobre sua entrada no ramo das charges, ele diz que sua trajetória começa no "nepotismo" antes de ingressar na carreira de cartunista, "meu pai era jornalista do jornal de Minas, e a coluna de esportes era dele", e foi aí que começou a carreira de Aroeira ilustrando a coluna de futebol.

E essa influência do futebol em sua vida, faz com que ele use muitos temas futebolísticos em suas charges.

juiz ladrão

Os desenhos dele chamaram a atenção do editor do jornal, que o chamou para fazer ilustrações políticas.  Essa transição de esportes para política trouxe Aroeira ao que é hoje. Renato fez sucesso com suas charges políticas, e em 2020 ganhou ainda mais destaque. O Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos reconhece o melhor da produção jornalística em defesa da democracia, cidadania e direitos humanos e sociais. No ano passado, a comissão  organizadora criou uma categoria exclusiva daquela edição para reconhecer a importância da chamada "Charge Continuada", uma série com mais de 400 desenhos que replicam uma charge inicial de Aroeira, na qual ele apresenta o Presidente Jair Bolsonaro pintando uma suástica no símbolo da saúde, o nome da categoria foi "Prêmio Destaque Vladimir Herzog Continuado". O prêmio é dado à série de charges, porém o detentor do físico dele é Aroeira, por ser o idealizador.

bolsonaro pintando suastica

Essa charge não recebeu só a premiação, mas também um processo a Renato Aroeira, a pedido do Ministro da Justiça André Mendonça. A Procuradoria Geral da República arquivou o processo que se baseava na Lei de Segurança Nacional, do tempo da ditadura civil-militar no país. Essa tentativa de censurar a arte não freou a criatividade de Aroeira, que deu continuidade a suas ilustrações, com o tom humorístico e realista de sempre.

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O cartunista conta sobre sua trajetória e os desafios da profissão para os alunos de jornalismo do terceiro semestre.
por
Gabriella Maya
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08/04/2021 - 12h

Com pai jornalista e mãe pedagoga, Aroeira começa no mundo do cartoon ajudando os dois com alguns trabalhos de ilustração. Sua trajetória se inicia no jornal local de Minas Gerais, na coluna de esportes do pai, e a mudança do jornalismo esportivo para o político ocorre quando o mesmo é enxergado pelo editor geral do jornal que o chama para fazer alguns desenhos para a coluna política. Aroeira conta que isso foi durante o governo Geisel, e é interessante que mesmo durante a ditadura, ainda havia chargistas falando sobre política. 

Renato conta que existem 3 coisas envolvidas numa charge: o que você quis dizer, o que você disse realmente, e o que as pessoas entenderam daquilo. Na hora de usar o humor para fazer uma charge é preciso ter muito cuidado pra não tocar em pontos sexistas, homofóbicos e etc. Renato diz tomar bastante cuidado com isso, e lembra de um desenho que fez para mãe retratando algumas profissões e de ter ouvido da mesma que todos os trabalhos importantes estavam retratados sendo feitos por pessoas brancas e homens, e os trabalhos considerados menos importantes, por mulheres e pessoas negras. Foi aí que ele começou a olhar profundamente para essas questões. 

Quando perguntado se incorpora o ‘politicamente correto’, Renato diz que sim, que sempre toma cuidado com o tipo de abordagem, e que não faz nenhuma charge criticando mulheres, índios, gays, nordestinos e outros que ainda são oprimidos pela sociedade.  

O cartunista relembra quando entrou em uma polêmica após fazer uma charge relacionando o atual presidente Bolsonaro ao nazifascismo, e diz ter lidado com a tentativa de censura do governo com sensação de incredulidade. Quando o ex-ministro da justiça, André Luiz Mendonça tuitou pedindo inquérito para apurar a charge que associava Bolsonaro, muitos advogados apoiaram Aroeira, assim como a população, que reagiu rapidamente. A procuradoria recusou o processo e o caso se encerrou. Esse episódio trouxe à cena a Lei de Segurança Nacional. 

Aroeira destaca que o atual governo ataca constantemente a imprensa, e o artista diz ter medo do que o governo possa fazer, mas diz que percebe estar seguro com o poder de luta a favor da democracia que existe atualmente. Para Aroeira, é preciso sempre ir com tudo na luta contra a censura e o fascismo, pois o outro lado não vai se cansar. Durante a entrevista, o artista relembra o Prêmio Especial Continuado Vladimir Herzog, dado em 2020 para a chamada "Charge Continuada", uma série de mais de quatrocentas charges de outros artistas que replicaram o primeiro desenho feito por Aroeira e atacado pelo governo ao relacionar Bolsonaro com a suástica: “Sou o depositário, fiz junto com parceiros da Revista Pirralha.” 

A intenção de publicar uma charge é uma mistura de sentimentos para o artista, “Há o querer de ser olhado pelo público, e também sentir o papel social de fazer críticas.  Quero que as pessoas se divirtam, que gostem, mas que também entendam o que eu estou querendo passar. O que eu não espero, é que a charge resolva algum problema ou provoque uma revolução. As charges são uma pecinha num componente cultural. [...] As pessoas precisam compreender o mundo para poder tomar uma decisão e entender o que está acontecendo. Este é o papel da mídia, e eu sou parte dela". 

Sobre o processo criativo, Renato conta que faz cerca de 15 a 20 desenhos por semana e relembra o começo da carreira, “Antes o processo era ler o jornal toda manhã, escolher um fato e fazer a charge sobre. Porém há alguns anos eu já sei mais ou menos o que quero dizer e já tenho uma noção do que eu estou enxergando. Eu escolho o aspecto da realidade daquele momento, e retrato ele.” E conta que realiza suas obras a mão e pelo computador, sempre amando a tinta nanquim e aquarela. 

Durante sua entrevista, o artista relata a importância das redes sociais atualmente, “Quando comecei eram por carta, e as cartas chegavam apenas uma semana depois do caso, depois foi por e-mail e depois eram nos jornais, mas quando a charge saía já era sobre um fato de 4 dias atrás. Agora com as redes sociais tudo fica mais fácil, eu vejo o fato, faço a charge e a arte já é publicada, as pessoas rapidamente comentam pois é sobre o que está acontecendo agora. E isso é extremamente importante, ajuda muito o nosso trabalho.” 

Os cartunistas são um grupo muito animado e unido, conta ele, que já trabalhou com Ziraldo, Miguel Paiva. Saxofonista, já formou banda com os cartunistas Chico e Paulo Caruso. Renato diz adorar trabalhar coletivamente. Sobre sua relação com a música, ele responde “A minha arte engajada é o cartoon, adoro a música, mas sou mais um intérprete dela, não um compositor. A minha força em tentar transformar é pelo desenho, a música é mais o que gosto, e gosto de passar pros outros.” 

Se há alguma charge que o mesmo se arrependeu de fazer? Aroeira diz com sinceridade, “Ah com certeza, volta e meia eu encontro charges com equívocos, mas vejo isso como um aprendizado.” E sobre a famosa cultura do cancelamento, Renato responde “Eu acredito muito no diálogo e na conversa, sou muito contrário à cultura do cancelamento, pois mais cedo ao mais tarde isso se volta contra você. [...] Acredito na mídia totalmente livre, pois qualquer restrição dela atinge a mim, e a qualquer pessoa que precisa dizer alguma coisa.” Sobre as questões sociais, o artista acrescenta, “Tento falar do que eu entendo, até para os meus vizinhos. [...] Mas eu acredito na ideia do lugar de fala se tornando o lugar de ação, este processo é emocionante.” 

Quando questionado sobre não fazer mais charges sobre futebol, Aroeira confessa em meio a risos que depois da derrota de 7x1 contra a Alemanha em 2014 seu amor pelo esporte morreu um pouco. “Também escolhi torcer pro Botafogo, que agora está na segunda divisão”, lamenta Aroeira. 

Os desafios da profissão são muitos. Uma aluna pergunta o que o faz continuar. Renato conta que acaba se tornando responsável pelo trabalho, “Depois que a gente começa a gente se sente responsável em continuar. [...] Os jornalistas sempre foram ferrados, precisamos sempre correr atrás e todo esse trabalho é necessário.”  

Renato Aroeira é um dos mais importantes cartunistas brasileiros, e depois dessa entrevista vemos sua humildade e abertura para conversa. O artista é um apaixonado pela pintura, e com toda certeza faz jus a esta paixão intensamente.

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