“Frankenstein” de Guillermo Del Toro, traz uma perspectiva sensível sobre o clássico
por
Isabelli Albuquerque
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03/11/2025 - 12h

A nova adaptação cinematográfica do clássico da literatura gótica, “Frankenstein”, chegou aos cinemas brasileiros no dia 25 de outubro por um curto período de tempo. O filme, dirigido pelo ganhador do Oscar, Guillermo Del Toro, é uma produção da Netflix e será lançado mundialmente na plataforma dia 7 de novembro. A produção traz uma nova perspectiva sobre a história, contando com a sensibilidade de Del Toro, que é especialista em mostrar o lado humano de criaturas assustadoras.

 

Alerta de Spoiler!

 

A trama é dividida em três partes: um curto prólogo, o ponto de vista do Dr. Victor Frankenstein (Oscar Isaac) e, por fim, o ponto de vista do Monstro (Jacob Elordi). Já no prólogo, podemos ter uma ideia da relação de Victor com sua criação, por mais que essa primeira impressão se prova errada ao longo da história.

Primeiramente, o público é introduzido à uma embarcação presa no gelo, cuja tripulação tenta desesperadamente libertá-la. Em meio ao caos de homens trabalhando duro, o corpo inconsciente de Victor é avistado e imediatamente transportado para a cabine do capitão. Após seu resgate, a criatura ressurge em meio ao deserto congelado e ataca o navio durante um acesso de raiva, enquanto seu frágil e ferido criador se encolhe na cabine e implora ao capitão para ser sacrificado em prol de seus marinheiros. Essa introdução engana a audiência propositalmente, mostrando um Monstro desregulado e violento que faz de seu pobre criador sua vítima.

Após o caos ser controlado, Victor começa a narrar sua história de vida e explica o que o levou a criar o Monstro. De uma criança sensível a um adulto enlouquecido com ideais de grandeza, nós somos introduzidos à natureza narcisista do doutor aos poucos.

Sua maior motivação em seus estudos é a morte de sua mãe no parto e o fato de que seu pai - outro grande médico, outro mesquinho Victor - não conseguiu salvá-la de seu destino. O até então doce garoto, cresce com uma raiva reprimida que se torna seu combustível ao desenvolver ideias malucas e apresentá-las em frente a outros doutores em busca de financiamento.

 

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Oscar Isaac caracterizado como Victor. Foto: Divulgação/Netflix

Nessa sequência, somos introduzidos a outro personagem, Heinrich Harlender, um rico nobre e entusiasta da medicina que passa a apoiar Frankenstein em seu projeto. Herr Harlender patrocina o cientista e cede uma torre inóspita para seus experimentos.

Após cerca de 30 minutos do longa, um instrumental romântico toca ao fundo enquanto a câmera aos poucos se aproxima de Elizabeth Harlander (Mia Goth), a curiosa sobrinha de seu patrocinador, que cativa Victor com suas opiniões fortes e interesses “não-femininos” em ciência e política.

Durante o desenvolvimento da relação de ambos os personagens, já é possível perceber a presunção de Victor, que se apaixona por Elizabeth por mais que ela seja noiva de seu irmão mais novo, Will (Felix Kammerer). Os dois possuem uma natureza semelhante, obscura e melancólica, que faz com que se aproximem mais do que deveriam. Em seguida, ao confessar seu amor pela cunhada, o conde se zanga ao receber uma negativa.

O diálogo da cena é muito interessante e reflete sobre os papéis de gênero numa sociedade inglesa do século XIX. Elizabeth até possuía os mesmos sentimentos românticos que Victor expressou em sua confissão, porém fez a escolha segura de se casar com Will ao ver a propensão obsessiva do cunhado por seus projetos.

É na torre que Victor dá vida à sua obra-prima, o Monstro. O primeiro contato dos dois é lindo de se ver, uma criatura tão grande agindo como uma criança perante seu entusiasmado criador poderia ser cômico se não fosse uma obra de Del Toro.

O diretor é conhecido por abordar temáticas fantásticas com criaturas monstruosas, submergindo as regras e transformando essas bestas em seres lindos e humanizados. Afinal, “Frankenstein” é sobre isso. Um ser de aparência assustadora sendo tudo aquilo que seu belo e nobre criador nunca conseguiu:, um ser humano sensível.

O estilo de Del Toro continua ao longo de toda essa parte, mostrando as diferenças de comportamento entre Victor e o Monstro: o primeiro um homem bonito e inteligente que age com violência, e o segundo uma junção de partes humanas de aparência medonha que possuí mais alma que o doutor.

Um dos momentos mais significativos do filme é quando a criatura diz sua primeira palavra: Victor. Essa única palavra que contéêm tantos sentimentos por trás se torna a sina de Frankenstein. O que antes demonstrava ternura, virou a prova de sua falha como criador.

A partir deste momento que a loucura começa a sangrar pela bela fachada. Victor se mostra um homem violento e frustrado, descontando toda sua raiva em sua criação. Destaca-se a atuação de Oscar Isaac nos momentos de loucura de seu personagem, que interpreta um cientista paranóico com maestria. Em seus expressivos olhos é possível enxergar a mente perturbada do doutor, que fere a criatura sem motivos e causa nojo na audiência.

A atuação de Goth também é excepcional, em especial na cena mencionada anteriormente e no momento em que encontra a criatura pela primeira vez. Sua personagem é uma mulher inteligente e sensível, sendo retratada como uma figura materna em contraste com a paternidade tóxica de Victor. 

O primeiro contato que ela tem com o Monstro é doce, gentil e emocionante. Imediatamente ela evoca um sentimento de ternura misturado com raiva pelas ações de Victor. Mais um ponto importante é a química entre Goth e Elordi, que atuam com uma leveza e naturalidade juntos, se encaixando perfeitamente com o objetivo da cena: montar um cenário para o futuro romance.

 

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O primeiro encontro da criatura com Elizabeth. Foto: Divulgação/Netflix

 

No auge de sua loucura e raiva, evocada pelas opiniões de Elizabeth sobre seus métodos, Victor ateia fogo na torre de Harlender após a visita de seu irmão e da noiva. O gesto impulsivo é rapidamente arrependido, mas já é tarde para salvar sua criação.

Quem duvidou da capacidade de atuação de Elordi como o Monstro, foi positivamente surpreendido com sua retratação, sendo um dos pontos altos do filme. Desde os maneirismos da criatura ao nascer, remetente aos movimentos de um filhote que está conhecendo o mundo, à raiva melancólica que cresce por seu criador ao longo da película.

Seu capítulo, mesmo sendo mais curto que o de seu criador, mostra como é crescer num mundo onde tudo é novo sendo diferente dos demais. O telespectador é transportado para a mente do personagem imediatamente após Victor atear fogo à torre e vê a pobre criatura desesperada para se libertar do fim iminente. Assim, presa às correntes, ela se assemelha a um animal trancafiado em uma cela, lutando ao máximo para se libertar de seu captor.

A fuga é bem sucedida e o Monstro se depara com o mundo fora da torre escura pela primeira vez. A sensação da terra abaixo de seus pés, a luz do sol, tudo é novo para ele, que compartilha uma cena adorável com um cervo na floresta ao alimentar o animal.

Entretanto, sua inocência é repentinamente abalada quando encara a morte pela primeira vez e é atacado por outros seres humanos. Ele foge de seus caçadores e se esconde no celeiro de uma casa de camponeses, onde rapidamente desenvolve uma afeição por seus anfitriões, os ajudando secretamente. Esses camponeses são os mesmos que o atacaram anteriormente, mas a criatura, em sua inocente gentileza, cuida dos moradores sem esperar nada em troca. 

Mais para a frente, uma amizade entre ele e o ancião da casa nasce, e essa sequência é essencial para a formação do caráter da criatura. O velho possui um grande interesse por literatura, e ensina a besta a ler e escrever, além de ensinamentos importantes sobre filosofia e religião, que abrem a mente do Monstro e o ajudam a amadurecer.

Após uma tragédia acontecer na pequena casa, a criatura enfrenta sua própria mortalidade ao fugir mais uma vez. A percepção de que é imortal a devasta, ao ponto de ir atrás de Victor suplicar pela criação de uma companhia para sua alma solitária. O confronto acontece na noite do casamento de Elizabeth e Will e, ao ter o pedido negado pelo conde - que têm o ego ferido ao enfrentar sua obra falha - o Monstro destrói a cerimônia e leva sua paixão, Elizabeth, consigo.

 

A arte por trás das câmeras

 

A cenografia do longa é excepcional e foi assinada por Dan Lausteen, que já colaborou com Del Toro em outras obras. As cores são utilizadas de forma muito inteligente e esteticamente satisfatórias, tons vibrantes (como o vestido vermelho da mãe de Victor) em meio a cenários pálidos e quase que monocromáticos, criam um contraste belíssimo que valorizam e ajudam a contar a história sem a necessidade de diálogos.

A cena da criação do Monstro é multissensorial, desde a beleza dos cenários ao design de som, que juntos provocam uma explosão de sentimentos na audiência, que observa maravilhada pai dar vida ao filho em meio a uma tempestade torrencial.

Del Toro afirmou em uma entrevista no Festival de Veneza - onde o filme teve seu lançamento - que era muito importante para ele a utilização de cenários reais e efeitos práticos. "Sempre esperei que o filme fosse feito nas condições certas, criativamente, em termos de atingir o escopo necessário, para torná-lo diferente, para fazê-lo em uma escala que permitisse reconstruir o mundo inteiro", contou. Essa exigência do diretor foi essencial para o ar surrealista do longa, que conta com explosões e cenários ricos em detalhes. O laboratório do Dr. Frankenstein, por exemplo, remete ao Palácio de Esmeraldas de Oz, com seus tons de verde brilhante e arquitetura.

 

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Os cenários do filme foram todos construídos, exigência do diretor. Foto: Divulgação/Netflix

 

O diálogo final, entre Elordi e Isaac, é poderoso e tocante. Enfim, ambos deixam a raiva um pelo outro de lado e aceitam seus respectivos papéis: Frankenstein como pai e o Monstro como filho. A última fala da criatura no filme é “Victor”, o nome de quem ao mesmo tempo o trouxe ao mundo e se tornou seu mundo.

O filme é finalizado com um frame da criatura de costas observando o nascer do sol após a morte de seu criador. Além de visualmente fantástica, é uma perfeita representação do arco do personagem no longa, que passa de uma criatura que foi presa por quem a deu vida, para alguém livre para ver o mundo como quiser, com a alvorada trazendo um mundo de recomeços.

Entretanto, certos aspectos causam alguns incômodos. A obra chama a atenção por seus visuais impressionantes, mas faltou criatividade nos jogos de câmera, que não fazem juz à beleza do cenário. Em sua maioria, são quadros fechados focando apenas no objeto central da cena, sem explorar os arredores.

Outro ponto que desagrada, foi a obviedade de ser um filme para a TV. Produções da Netflix possuem estéticas parecidas, e precisam ser filmadas de certa forma para a imagem imprimir bem em uma televisão. Infelizmente, essa formatação é bem notável no longa, que, mesmo sendo uma obra incrível de experienciar no cinema, se encaixa melhor numa tela de 40 polegadas. “Frankenstein” é uma adaptação única e sensível sobre um clássico já conhecido no imaginário popular, uma perspectiva interessante que com certeza vale a pena ser presenciada numa tela de cinema. E, quem sabe, até mudar a visão do público sobre a verdadeira natureza humana.

Filme quebra paradigmas sobre originalidade e ancestralidade no cinema
por
Isabelle Rodrigues
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07/05/2025 - 12h

“Pecadores”, a nova aposta do diretor, roteirista e co-produtor Ryan Coogler - a mente por trás dos sucessos “Creed” e “Pantera Negra” - estreou em abril de 2025. O longa acompanha uma história de liberdade e conflitos raciais com muito Blues e dança, sem perder o terror e o suspense de sua atmosfera surrealista.

Os gêmeos Stack e Smoke utilizam cores distintas durante o longa, como forma de demonstrar suas posições ao longo da narrativa. Foto / Reprodução IMDB
Os gêmeos Stack e Smoke utilizam cores distintas durante o longa, como forma de demonstrar suas posições ao longo da narrativa. Foto / Reprodução IMDB

O filme, situado em 1932, acompanha em seu elenco principal os gêmeos Fumaça e Fuligem, ambos interpretados por Michael B. Jordan. Tudo se centraliza no clube de Blues criado pelos gêmeos, o terreno que foi comprado de um senhor envolvido na Ku Klux Klan, com dinheiro roubado em Chicago com a ajuda do gangster norte americano, Al Capone, além do vinho e a cerveja importados que serviram como atrativo para a comunidade cansada da região. Mas claro, nada disso importa para os gêmeos, até o fim da noite todos os envolvidos no clube serão pecadores. Como dito pelo pastor e pai do personagem Sammie, “Se você continuar a dançar com o diabo, um dia ele vai te seguir até em casa".

Durante o desenrolar do longa, surgem outros personagens relacionados ao passado da dupla e o conflito central, como Sammie (Miles Caton), primo e filho do pastor local, Mary (Hailee Steinfeld), irmã de criação e Annie (Wunmi Mosaku), curandeira local. Todos têm seu lugar naquela sociedade, que situa de forma aguçada seu papel historicamente bem pensado. 

Destaque especial para Sammie, que demonstra a dualidade entre a religião e o conformismo, na qual, para ele, a música representa liberdade e salvação, o que fica ainda mais evidente após a chegada do personagem Remmick (Jack O'Connell). O roteiro utiliza diversos contextos históricos, que o torna um prato culturalmente cheio.

Por exemplo, o passado de Remmick demonstra ter relação com a opressão irlandesa, durante colonização dos ingleses no século XII, além das implicações a um proselitismo forçado, por conta das citações do personagem sobre ter sido obrigado a aprender hinos e cânticos religiosos no passado pelo homem que roubou as terras de sua família.

A ideia do vampiro, em uma narrativa banhada de elementos religiosos é uma escolha pensada e calculada aos mínimos detalhes, seja no batismo feito em Sammie ou na visão tida por Fumaça no ato final. O movimento do afro-surrealismo tem muita influência nessa decisão, em que os elementos do sobrenatural servem como analogia direta ao período de apagamento histórico e cultural que aconteceu com a população negra, o que torna ainda mais simbólica a representação do Blues na trama.

Outro elemento que vale a pena destacar é a posição da trilha sonora na narrativa.  O mérito vem da parceria entre Ludwig Göransson e Coogler que entraram em sintonia em todos os seus projetos. Mesmo não sendo um musical, a trilha sonora e seus números musicais fazem parte do âmago da história, principalmente nas músicas tocadas durante a sequência do clube, como “Lie to You” e “Rocky Road to Dublin”, performadas pelos atores.

Pecadores se torna uma das maiores apostas para o oscar de 2025, segundo a critica especializada Foto / Reprodução IMDB
Pecadores se torna uma das maiores apostas para o Oscar de 2025, segundo a critica especializada Foto / Reprodução IMDB

A recepção da crítica e público foi representativa, fazendo história além da tela, estando com 84% de aclamação no Metacritic. Além de ter conquistado uma das maiores bilheterias do ano, totalizando 230 milhões arrecadados por todo o mundo. 

O diretor Ryan Coogler conseguiu deixar um legado na indústria cinematográfica, com o contrato histórico feito para a produção do filme, no qual em vinte e cinco anos, todos os direitos relacionados a sua obra serão retornados para o diretor. 

Veja abaixo o trailer da produção: 

Título original: Sinners
Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler
Trilha sonora original: Ludwig Göransson
Produção: Ryan Coogler, Zinzi Coogler, Kevin Feige

Elenco principal: Michael B. Jordan, Miles Caton, Hailee Steinfeld, Wunmi Mosaku e Jack O’Connell.

Como Antônio Fonseca de Deus enxerga a utilização do tempo na atual sociedade brasileira
por
Júlio Antônio Poças Pinto
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29/04/2025 - 12h

O Professor de Sociologia, Antônio Fonseca de Deus, conversou com à AGEMT sobre como as pessoasm “consomem” o tempo no seu dia-a-dia acelerado. Antônio começa a entrevista lembrando que o tempo é uma criação humana e com o advento da Revolução Industrial esse tempo passou a ter conotação econômica e financeira. Observa também que o “relógio” neste período e ainda hoje, virou cronometro e toda nossa rotina de vida, passou a ter minutos contados, com começo, meio e fim. Trazendo para nossa atual realidade, aponta para uma triste constatação: como gerir o nosso tempo entre trabalho, família e lazer?

Se antes (no período áureo da Revolução Industrial) o gerenciamento do tempo tinha como base única e exclusivamente o “trabalho nas fábricas”, hoje, este gerenciamento é muito mais complexo: gerenciar a vida num todo, buscando equilíbrio entre trabalho, lazer e descanso. Consequentemente, esta “falta” de gerenciamento culmina em questões de saúde, levando ao esgotamento físico e em grande parte psicológico.

Ele chama à atenção para outra triste constatação: as novas gerações (Z e Alpha), apesar da genialidade das novas tecnologias, utilizam muito de seu tempo de forma improdutiva, criando um “descontrole” do tempo. Lembrou do ocorrido com uma amiga no seu horário de almoço na empresa, confessando ter utilizado todo tempo destinado à alimentação, vendo postagens nas redes TikToK e Instagram, esquecendo seu prato com comida no micro-ondas. 

Ao ser questionado sobre as formas de “utilizar” o tempo pode vir a gerar um conflito social, ele respondeu: "dificultando acesso à cultura, ao lazer, ao descanso, com certeza pode gerar conflitos sim; já vemos alguns setores econômicos pelo mundo que enxergam que um dia a mais de descanso na semana, possa melhorar a qualidade de vida das e consequentemente um melhor rendimento de seus colaboradores", afirma Antônio.

Ele também acrescenta que não enxerga um conflito social sem ter relação com qualidade de vida, e dentro dos conflitos de classe ele faz uma relação da “Mais-Valia – Karl Marx), cujo o tempo é dinheiro para quem o controla. Com relação às propostas do Estado para melhorar a maneira de como as pessoas gastam o tempo, ele diz que, se for pensar em leis trabalhistas uma restruturação do tempo de trabalho (remuneração e carga horária) seria providencial, afinal o mundo muda a todo momento e é imperativo que o mercado de trabalho acompanhe tais mudanças; desde que as pessoas consigam conciliar qualidade de vida, como ter mais tempo para a família, lazer e descanso. O IDH dos países desenvolvidos (e em desenvolvimento) aponta para isto.

No campo, o foco parece ser a bola. Nos bastidores, o jogo é outro
por
Amanda Campos
Lorena Basilia
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28/04/2025 - 12h

Uma sucessão de episódios controversos tomou conta do noticiário esportivo brasileiro, da chamada “Lei Memphis Depay” às críticas generalizadas contra a arbitragem, o cenário do futebol nacional virou alvo de polêmicas. Mas, nos bastidores das discussões que inflamam torcedores e dirigentes nas redes sociais, um movimento silencioso desenha o verdadeiro placar na Confederação Brasileira de Futebol: a reeleição unânime de Ednaldo Rodrigues à presidência da CBF, como um capítulo de um sistema em que a transparência cede espaço a alianças políticas. Em entrevista para a AGEMT, o especialista em análise de futebol, Tiago Herani explica o cenário do futebol brasileiro atual.

Na prática, não existe uma lei oficial com esse nome. O que houve foi uma mudança no regulamento de competições nacionais, aprovada no início de abril pela CBF, que proíbe comemorações consideradas “provocativas” contra os adversários. A nova regra prevê que um jogador que imite uma pose de deboche, faça gestos de provocação ou se refira ao adversário de forma pejorativa pode ser advertido com cartão amarelo – ou até expulso se reincidir.

O episódio, que nomeou a nova regra, surgiu na final do Campeonato Paulista. Durante a partida entre Corinthians e Palmeiras, o  atacante holandês do time alvinegro subiu em cima da bola, afim de provocar e confundir o adversário.  A ação causou revolta entre os jogadores e torcedores palmeirenses.

Para Tiago Herani, a medida tomada é um ataque direto à individualidade do jogador e à essência artística do futebol brasileiro. “É uma cortina de fumaça muito bem executada. Quem lê sobre isso vai se indignar, mas ignora os verdadeiros problemas do futebol brasileiro”, afirma. Ele vê na proposta um retrocesso: “Vai contra o que o futebol brasileiro representa: arte, liberdade, improviso". O país do futebol não tem esse nome à toa, os jogadores têm uma habilidade única de misturar técnica improviso e criatividade em campo. A fluidez e “ginga” é o símbolo mais forte da identidade nacional em campo. Além de um esporte, o futebol é arte.

Em paralelo à polêmica das provocações, a arbitragem brasileira vive um período conturbado, desde falhas em campo até decisões de gestão contestadas compõem um quadro preocupante. Herani conta que a CBF não demonstra nenhum interesse real em investimentos para mudar esse cenário: “Com investimento em tecnologia e preparação, a arbitragem poderia evoluir. Mas parece que isso não é prioridade”.

A cortina de fumaça

A atual gestão da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), liderada por Ednaldo Rodrigues, representa uma ruptura importante com os mandatos anteriores — especialmente no que diz respeito à transparência e à percepção pública. Após anos marcados por escândalos e desconfiança, muitos viam em Ednaldo uma tentativa de estabilização. Ainda assim, a calmaria relativa parece ter durado pouco. “A gestão do Ednaldo foi a menos polêmica em muito tempo - até agora”, avalia Tiago Herani. Ele destaca que, internamente, o presidente conta com forte apoio, o que torna improvável qualquer mudança drástica no comando, como a entrada de Ronaldo Nazário, frequentemente citado como uma figura de renovação. “É muito difícil que isso aconteça, mesmo ele sendo a melhor opção, tanto por ser empresário quanto pelas boas relações que mantém com FIFA e Conmebol”, comenta.

Ednaldo Rodrigues
Presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ednaldo Rodrigues.
Foto: R
eprodução/Rafael Ribeiro.

 O artigo da Revista Piauí, assinada por Alan de Abreu, foi um divisor de águas na forma como o público passou a enxergar a atual gestão da CBF. Por meio de áudios e bastidores, até então desconhecidos, expôs com clareza as engrenagens de um sistema que opera sem concorrência para o cargo. Em um dos trechos, um presidente de clube — mantido no anonimato — admite que “não há o que fazer” para mudar a situação, o que ilustra a sensação generalizada de impotência dentro da estrutura do futebol brasileiro.

A pensata, segundo Tiago, escancara como a permanência de Ednaldo Rodrigues no comando da CBF foi garantida mais pela conveniência dos bastidores do que por mérito ou vontade de renovação. “Os presidentes poderiam, ao menos, ter votado nulo, feito um gesto simbólico. Mas não. Todos aplaudiram a candidatura do Ednaldo”, critica. Herani também acredita que a repercussão gerada pela reportagem é fruto de um novo momento da cobertura esportiva, impulsionado pela internet. “A Piauí teve coragem de fazer o que muitas grandes emissoras não fazem. Essa foi a primeira gestão com seus problemas tão detalhadamente expostos, e isso só aconteceu porque a internet deu espaço para esse debate crescer”.

A repercussão gerada pela reportagem é fruto de um novo momento da cobertura esportiva, impulsionado pela internet. “A Piauí teve coragem de fazer o que muitas grandes emissoras não fazem. Essa foi a primeira gestão com seus problemas tão detalhadamente expostos, e isso só aconteceu porque a internet deu espaço para esse debate crescer”, afirma.

O contraste com a grande mídia ficou evidente recentemente, quando seis jornalistas da ESPN foram afastados em abril após críticas à gestão de Ednaldo Rodrigues no programa Linha de Passe. Baseados na própria reportagem da Piauí, os comentaristas questionaram a atuação da CBF, o que teria provocado uma reação direta da entidade e um desconforto interno na emissora. A ESPN tratou o episódio como um "erro de processo" e suspendeu os profissionais por um dia, sem demissões formais. A emissora não se manifestou publicamente sobre o caso, e os jornalistas afastados retornaram às suas funções normalmente após o período de suspensão. Para Tiago, casos como esse reforçam a importância das mídias independentes e das redes sociais como espaços onde o debate pode, de fato, acontecer.

 

Com um resgate das próprias raízes, a artista prova que é impossível se esconder, mesmo coberta de referências musicais no novo álbum
por
Pedro da Silva Menezes
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14/03/2025 - 12h

Depois de muito apelo dos Little Monsters (fandom da cantora) e de Michael Polansky, seu noivo, Lady Gaga lançou na sexta-feira (7) seu sétimo álbum de estúdio, “Mayhem”. Com um nome que significa “caos”, o disco é uma mistura de gêneros com a originalidade da ‘Mother Monster’.

O primeiro single, “Disease”, criou no público uma impressão de como seria a era. Com versos como “Eu posso sentir o cheiro da sua doença, posso te curar” e uma sonoridade pop pesada que lembra trabalhos anteriores, como “The Fame Monster”, a esperança era de que o som a ser seguido fosse o do dark pop, estilo que a cantora domina, caracterizado por elementos densos na produção e na composição. 

A segunda música de trabalho, “Abracadabra”, e as fotos de divulgação reforçaram a expectativa de que uma Gaga que não ouvíamos desde 2012 estaria de volta.

Apesar de as duas músicas serem pops completos, com refrãos marcantes, pontes poderosas e videoclipes completamente esquisitos, no melhor estilo Gaga, elas são apenas uma das muitas experimentações que o público encontrará no álbum.

Processo de edição manual com cacos de vidro e sobreposição de fotos no ensaio fotográfico do álbum.
Processo de edição manual com cacos de vidro e sobreposição de fotos no ensaio fotográfico do álbum. Fonte: Reprodução/MTLA Studio.

A faixa “Garden of Eden” evoca uma atmosfera dos anos 2000, com sintetizadores semelhantes aos de “Do Somethin’”, de Britney Spears. A repetição silábica no refrão se tornou uma marca da cantora, e ela usa esse recurso com maestria desde “Poker Face”, repetindo a estratégia aqui e em “Abracadabra”. 

Trechos como “Abracadabra, amor, ooh-na-na / Abracadabra, morta, ooh-ga-ga / Abracadabra, abra, ooh-na-na” e “I'll t-t-take you to the Garden of Eden” mostram como a combinação entre letra e interpretação resulta em uma teatralidade musical característica da nova-iorquina.

Ao contar sobre as inspirações para as canções, Lady disse à revista Elle: “Alternativo dos anos 90, electro-grunge, melodias de Prince e Bowie, guitarra e atitude, linhas de baixo funky, dance eletrônico francês e sintetizadores analógicos”. Isso pode ser ouvido com clareza em “Killah”, que conta com um sample de “Fame”, de David Bowie. A parceria com Gesaffelstein é extremamente divertida e brinca com os instrumentos e a voz da cantora.

Tudo isso foi levado à máxima potência na apresentação que fez no sábado (8) no programa SNL. Entre gritos, trocas de looks e coreografia no chão, a música ganhou vida.

O rock também aparece em “Perfect Celebrity”, na qual fala sobre um tema recorrente em sua carreira: a fama. Contudo, diferente de “Killah”, nessa faixa tudo é mais sombrio. Em “Engasgue com a fama e torça para ficar chapado / Sente na primeira fila, veja a princesa morrer”, ela menciona a não lançada “Princess Die”, uma música muito querida pelos fãs da era “Born This Way”. A Mother Monster confirmou a referência em entrevista para a Billboard.

A primeira música escrita para o álbum foi “Vanish Into You”, candidata ao próximo single. A faixa aparece com destaque nos materiais de divulgação e aborda o amor de uma perspectiva menos esperançosa  que “Die with a Smile”. Nessa e em várias outras canções, o vocal da artista surpreende pela potência e versatilidade. No podcast Las Culturistas, ela revelou que chegava a gravar mais de 50 takes cantando de diferentes formas até encontrar a versão perfeita.

Foto do encarte do álbum com Lady Gaga deitada no chão.
Foto do encarte do álbum. Fonte: Divulgação/Frank Lebon

“Zombieboy” já viralizou no TikTok com uma dança. A música, que havia sido apresentada no clipe de “Disease”, cativa pelo som oitentista, mas com o toque inconfundível da cantora. Afinal, quem mais poderia falar sobre flerte usando uma metáfora com zumbis?

“LoveDrug” e “Don’t Call Tonight” são mais tímidas em relação às outras faixas do disco, sem traços marcantes. Elas lembram o estilo explorado em “Summerboy” e “Disco Heaven”, do “The Fame”, seu primeiro álbum. 

Gaga revelou, na coletiva de imprensa realizada com fãs e o Spotify, que revisitou muitas demos antigas durante o desenvolvimento do projeto. Talvez por isso o álbum soe como um resgate às suas raízes nova-iorquinas, explorando sons do alternativo do começo do século — uma cena da qual a artista fazia parte. “How Bad Do You Want Me” segue a mesma linha, mas com um pouco menos de identidade, chegando até a ser comparada com músicas de Taylor Swift nas redes sociais.

No filme “Gaga Chromatica Ball”, sobre sua última turnê, a compositora divulgou uma prévia de “Shadow of a Man”. O que parecia ser um pop convencional revelou-se, na verdade, uma viagem ao universo de Michael Jackson. Em uma homenagem, ela se entrega à performance ao cantar frases como: “(Eu não quero desaparecer na escuridão esta noite) mostre-me a luz / (Eu não quero ser aquela que se sacrifica) para ganhar vida / (Estou chegando lá, estou chegando lá) me veja, eu juro que vou / Dançar na sombra de um homem” no estilo do Rei do Pop. 

Tudo isso, envolto em uma mensagem sobre mulheres na indústria que estão à sombra de uma figura masculina tomando seu lugar de respeito, torna a música apoteótica.

A lenta “The Beast”, na reta final do álbum, serve como um respiro antes da balada que vem a seguir: “Blade of Grass”. A faixa é uma carta de amor da artista ao noivo, Michael Polansky, e faz referência ao anel de compromisso do casal. 

Ao ser perguntada sobre como gostaria de ser pedida em casamento, Lady Gaga disse a Polansky que ele poderia simplesmente pegar um pedaço de grama e enrolá-lo em torno de seu dedo — e assim ele fez. No entanto, além desse gesto simbólico, a estrela também recebeu um anel de diamante avaliado em mais de 6 milhões de reais.

O noivo participou ativamente da construção do álbum e tem sido citado por Gaga em várias decisões. Ele está creditado em sete das letras do disco e, em “Blade of Grass”, ajudou a escrever o verso: “Eu vou te dar algo/ É, não é um anel de diamante/ O ar que eu respiro”. Além de ser um dos maiores incentivadores da popstar nesse lançamento, Michael vem ganhando popularidade entre os fãs, que o agradecem por apoiar a cantora. 

O encerramento acontece com “Die With a Smile”, definida pela V Magazine como um “clássico instantâneo”. O hit se tornou um dos maiores sucessos da década. Inicialmente, parecia não se encaixar muito nesta fase, por ser bastante diferente dos outros singles. No entanto, dentro da tracklist, é provado o contrário, sendo um desfecho digno para um trabalho coeso da diva. 

Mesmo depois de muitas décadas, o machismo continua presente em todos os âmbitos da vida humana
por
Bruna Galati e Letícia Galatro
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22/06/2021 - 12h

Por Bruna Galati e Letícia Galatro

A sociedade brasileira foi criada sob um viés machista, que acredita na superioridade masculina. Um dos primeiros traços da desigualdade aparece na educação, quando apenas na reforma educacional pombalina (1759) ocorreu a primeira tentativa de introduzir o ensino para as mulheres. Devido a esse tipo de pensamento preconceituoso, pessoas do gênero feminino vêm sofrendo há décadas.

 

As discriminações ocorrem de diversas formas, desde serem rebaixadas e diminuídas para servir e depender dos homens até serem agredidas fisicamente e virarem vítimas de feminicídio. O machismo enraizado se estende a todas as áreas da vida. Seja nas relações interpessoais, no acesso aos direitos fundamentais dos cidadãos ou nas ofertas de cultura e trabalho. 

 

Durante muitos anos a figura feminina foi proibida de trabalhar e estudar, sendo responsável pelo cuidado da casa e criação dos filhos. Embora a Lei de 15 de outubro de 1827, conhecida como Lei Geral, tratou de diversos assuntos, como a remuneração dos mestres, o currículo mínimo, a admissão de professores e as escolas para meninas. No entanto, as mulheres seguiram sendo discriminadas. Nem todas matérias eram ensinadas para elas, sobretudo as consideradas mais racionais, como geometria, e no lugar deveriam aprender as "artes do lar". 

 

Apenas durante a Primeira Guerra Mundial, por necessidade, as mulheres entraram no mercado de trabalho para exercerem o cargo de enfermeiras. O pós conflito, obrigou muitas delas a buscarem um emprego formal, como condutoras de bondes, garçonetes em cafés, funcionários de correio, etc, já que quem sustentava a casa havia morrido em combate. As condições de tratamento nesses ambientes eram péssimas e mesmo trabalhando muito, os salários eram escassos. Até hoje, em pleno 2021, mulheres ainda encontram dificuldades para alcançar posições de destaque e ganhos mensais iguais aos homens. 

 

Por mais que muitos avanços venham ocorrendo, algumas profissões como a de policial, ainda reforçam ações retrógradas. Patrícia Sales conta que quando entrou na polícia a 26 anos atrás, mulheres ficavam restritas às áreas administrativas. Isso só mudou em 1999. Mesmo assim, algumas situações machistas continuam acontecendo. 

 

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Pior do que a falta de conhecimento, é ser tratada como idiota e se sentir impotente. Situação que Morgana Weber, estudante e profissional da área de TI, vivenciou diversas vezes no ambiente de trabalho.  Ela escolheu trocar de roupa para não ser assediada, sem contestar que isso não tinha a ver com o que usava. Weber se sentiu frustrada quando seu chefe desenhou caminhões para explicar que a função deles era levar objetos de um lugar para o outro, sendo que ela havia perguntado algo sobre softwares.

 

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A falta de imposição de Weber pode ter acontecido por diversos motivos, mas o que ocorre com muitas mulheres é que elas não acreditam na força das suas vozes. Existem mulheres que tiveram oportunidade de crescer profissionalmente, mas a dificuldade de se expressar, de usar uma voz fraca e soar insegura na hora de resolver questões, foram grandes desafios em suas trajetórias. 

 

Um dos maiores ataques a voz da mulher aconteceu no nascimento da Inglaterra moderna, onde o termo "gossip", atualmente traduzido como "fofocar", que antes indicava amizade entre as mulheres, virou o posto e resultou na destruição da sociabilidade feminina.

 

No século XVI, a posição social das mulheres começou a se deteriorar e veio no lugar a guerra contra mulheres, especialmente das classes baixas, que costumavam ser acusadas de bruxaria e agressões contra esposas tidas como "rabugentas" e dominadoras. Nesse mesmo período, o significado bom de "gossip" começou a mudar, cada vez mais designando a mulher envolvida em conversas fúteis. 

 

Na Idade Média tardia, uma esposa ainda poderia confrontar seu marido, mas no fim do século XVI, ela poderia ser punida por apenas levantar a voz ou fazer críticas em relação a ele. A punição era usar a rédea ou freios das rabugentas, uma engenhosa sádica de metal e couro que rasgaria a língua da mulher se ela tentasse falar. 

 

Tratava-se de uma estrutura de ferro que circulava a cabeça, um bridão (utilizado em cavalos) de cinco centímetros de comprimento e dois centímetros e meio de largura projetado para dentro da boca e voltado para baixo sobre a língua, sendo impossível de falar. Muitas vezes, o instrumento era chamado de "gossip bridle", mostrando a mudança no sentido da palavra.

 

Esse foi apenas um exemplo resumido de alguns acontecimentos que impediam a mulher de ter sua própria voz, suas amizades e não depender de ninguém. É claro que nos dias atuais, a "gossip bridle" foi aposentada, mas as formas psicológicas de calar as mulheres ainda existem. 

 

Se a mulher cresce em uma família que a trata como um ser frágil, que precisa ser superprotegido do mundo perigoso, ela terá uma voz infantilizada ou existem criações que não reconhecem a liderança feminina e a mulher é adjetivada durante a vida como teimosa, briguenta, bocuda, mandona, etc, neste caso a voz perde sua potência e brilho. 

 

O Instituto Converse citou um exemplo desse acontecimento, uma mulher, com 38 anos, chegou com queixas de que seus funcionários não aceitaram suas ordens. Ela ocupava a chefia de um departamento na secretaria e a sua voz era "presa na garganta", quase sem projeção no ambiente. Ela não permitia a sua imposição, mesmo com a sua formação acadêmica, sendo a melhor entre todos os funcionários, o que por si só já facilitava uma postura de se impor. A pesquisa mostrou que no seu histórico familiar havia uma figura de um pai autoritário que não deixava as meninas da casa falarem. Através de exercícios vocais, em pouco tempo a insegurança foi colocada de lado e ela perdeu o medo de se posicionar com uma voz firme, argumentar suas necessidades, desejos, ideias e paixões.  

 

Trabalhando a autoconfiança, as mulheres conseguem se posicionar na sua vida profissional e é claro pessoal, mas o que acontece quando dentro do mercado de trabalho existe uma desigualdade de oportunidades e reconhecimento constante? Exercendo a mesma função de um homem, a mulher ainda ganha cerca de 70% do salário do homem. 

 

 

Infelizmente, cenários como esse no qual a profissão é predominada pela presença masculina e os tratamentos são feitos de formas diferenciadas são mais comuns do que deveriam. Um exemplo claro disso é o ramo da aviação civil. Segundo dados da Anac, dos mais de 70 mil profissionais de aviação com licenças ativas em 2018, contando comissários, pilotos e mecânicos, apenas 13% eram mulheres. Ao analisar apenas as mulheres presentes no setor de manutenção, o número cai para 3%.

 

Gregory Fabbri, piloto formado em 2020, conta que essa diferença discrepante pode ser notada desde a faculdade, onde a sala era majoritariamente formada por homens, assim como o grupo de docentes. O ambiente intimidador era reforçado por comentários machistas, que os próprios professores encaravam como piadas. 

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Nessa mesma área, podemos analisar o machismo por um outro lado. Iara Calegari, comissária a mais de 10 anos, conta que a sua profissão ainda é vista como o lugar ideal apenas para mulheres, que são maioria no setor. Essa ideia parte do pressuposto de que a figura feminina é a que deve servir e cuidar. Tal cargo surgiu da enfermagem, uma vez que devido a falta de tecnologia, os aviões vibravam muito e causavam náuseas nos passageiros. Porém, além de cuidar daqueles que estivessem passando mal, as profissionais ainda tinham e seguem tendo que se preocupar com os padrões estéticos impostos por cada companhia aérea. 

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A verdade é que mesmo com as evoluções promissoras das últimas décadas, mulheres continuam sendo discriminadas das mais diversas formas em todos os espaços. Isso acontece porque como as sociedades vêm sendo criadas sob um viés machista a milênios, alguns pensamentos e ações estão tão naturalizados e enraizados na educação que fica difícil perceber a problemática em volta da questão.

Uma solução prática para resolver a começar a resolver o problema e alcançar a equidade é dar oportunidades para as mulheres alcançarem espaços de poder, seja em cargos públicos, nos mais diversos trabalhos ou sendo uma voz ativa de grande relevância para seu meio. Essas instituições são um reflexo da organização social na qual se encontram inseridas, mas ao contrário também é verdadeiro. É possível que com essas ações mais pontuais e efetivas alcancem e alterem toda a filosofia de vida de uma sociedade. 

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