Voluntários se reúnem quinzenalmente para apoiar pessoas em situação de vulnerabilidade na capital paulista
por
FABIANA CAMINHA
JOÃO VICTOR ESPOSO GUIMARÃES
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25/09/2025 - 12h

Domingo, 7h da manhã. Enquanto a cidade ainda desperta, a fila já contorna os fundos do Shopping da Lapa, zona oeste de São Paulo. Essa cena se repete a cada 15 dias. Antes mesmo da chegada dos voluntários do Ondas de Amor, quem deseja receber os kits já sabe onde se posicionar. Pessoas com mobilidade reduzida são prioridade. Todos aguardam organizados quando chega o primeiro carro carregado com os itens que serão distribuídos. 

 

Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa
Pessoas em situação de vulnerabilidade formam fila para receber kits entregues por voluntários na Lapa. ​​​​Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Criado em 2019, o grupo distribui, a cada ação, cerca de 180 kits de café da manhã, além de água e itens de higiene, como sabonetes, absorventes e papel higiênico. Ocasionalmente, também são oferecidos produtos adicionais, como escovas e pasta de dente, aparelhos de barbear e desodorantes.

Em dias frios, a entrega inclui cobertores e toucas de lã. Além de suprir necessidades básicas, a iniciativa oferece também mensagens de acolhimento inspiradas na doutrina espírita a quem quiser ouvir.

A ideia nasceu de uma dinâmica com adolescentes em um centro espírita da Vila Romana, bairro da zona oeste. Desafiados a elaborar um projeto de caridade, os jovens sugeriram o nome Ondas de Amor e propuseram oferecer não apenas alimentos básicos, mas itens que consideravam “gostosos”, como sanduíches, bolachas recheadas, doces e achocolatado. O projeto não foi adiante com os adolescentes, mas duas das educadoras, Marildes Esposo e Valéria Vareta, decidiram colocá-lo em prática.

No início, as limitações eram grandes. Somente cerca de 20 kits eram distribuídos, por falta de recursos e voluntários. Com o tempo, a ação ganhou força. Nem mesmo a pandemia interrompeu o trabalho. Com adaptações, máscaras, luvas e distanciamento, o Ondas manteve as distribuições em um período em que a vulnerabilidade de quem vive nas ruas se agravou.

 

Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos.
Voluntários incluem mensagens de fé junto com os kits distribuídos. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Hoje, aproximadamente 130 kits são entregues na Lapa e o restante é oferecido nos arredores da Avenida General Olímpio da Silveira, sob o Minhocão. Nessa segunda etapa, os voluntários percorrem as barracas, chamando as pessoas pelo nome e demonstrando os vínculos construídos ao longo dos últimos anos.

O senhor José, em situação de rua, é um exemplo dessa relação. Há anos recebe os kits do grupo sob o viaduto e, a pedido dele, o projeto passou a incluir livros, dispostos de forma acessível a qualquer interessado. Sempre que possível, são distribuídos sacos de rações para animais e quando há doações de roupas e calçados, esses itens também são entregues a quem precisar.

Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária.
Livros doados são organizados para distribuição durante a ação voluntária. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

Mas a atuação do grupo vai além da entrega de alimentos, livros e vestimentas. Em alguns casos, é possível fazer uma diferença ainda maior, como no de Ana, que vivia em uma barraca sob o Minhocão quando os voluntários perceberam que estava grávida.

Com sua permissão, Marildes, Eloisa Cestari e Márcia Aoki, outras colaboradoras do projeto, se mobilizaram para garantir o acompanhamento médico de Ana. Desde então, ela passou a viver na Associação Amparo Maternal, centro de acolhida para gestantes, mães e bebês apoiado pela Prefeitura de São Paulo.

O caso evidencia como a iniciativa pode transformar vidas, especialmente quando atua em parceria com outras instituições. Segundo Marildes, o projeto busca ir ainda mais longe. “Nosso sonho é criar uma rede de apoio que nos permita ampliar e qualificar o acolhimento dos que precisem desse tipo de ajuda”, afirma.

Uma operação com um impacto tão grande exige um esforço quase proporcional. A preparação para o domingo começa cerca de uma semana antes. Alguns voluntários cuidam das compras, outros montam os lanches e organizam as sacolas. Atualmente, cerca de 20 pessoas atuam diretamente na logística para que tudo esteja pronto no dia da ação, além daqueles que contribuem indiretamente com doações e apoio financeiro. 

Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários.
Alimentos e produtos de higiene compõem os kits distribuídos por voluntários. Foto: João Victor Esposo Guimarães/Agemt

“O trabalho voluntário é isso, é dar e fazer o que é possível, mesmo que sejam 10 minutos na ação ou 10 reais doados.”  afirma Marildes, que reforça a importância do esforço coletivo. É possível encontrar mais detalhes sobre o trabalho do grupo e outras formas de contribuir com o projeto no site https://ondasdeamor.com.br/social 

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Maior evento europeu do setor continua na rota por novidades eletricas e mais concorrência a cada ano
por
Vítor Nhoatto
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22/09/2025 - 12h

Ocorrido entre os dias 9 e 14 de setembro, o IAA Mobility recebeu mais de 500 mil visitantes, superando a sua última edição em 2023. Estiveram presentes as germânicas Audi, BMW, Mercedes, Opel, Porsche e Volkswagen, mas Fiat, Peugeot e nenhuma japonesa compareceu. Com isso, mais uma vez uma grande parte de Munique foi palco para as chinesas se consolidarem e expandirem.

Com o lema “It’s all About Mobility”, em tradução livre, “É Tudo Sobre Mobilidade”, o foco da mostra se manteve em soluções inteligentes e inovadoras. Startups como a Linktour com  seus micro carros elétricos, e marcas de bicicletas e motocicletas elétricas estavam por todos os lados do München Expo Center. E repetindo o formato aplicado desde 2021, com o chamado “Open Space”, uma área de experiências interativas gratuitas ao ar livre, os visitantes podiam experimentar tudo isso.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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 Além disso, a inovação tecnológica foi tema de muitos debates e coletivas de imprensa com representantes da indústria. Fornecedoras como a Bosch, Aisin e Revolt, além de empresas de carregadores como a Charge X e E-Mobilio e a gigante de baterias CATL foram só alguns dos mais de 750 expositores presentes. 

Setor premium atento

Falando em eletricidade, ela estava no centro das atenções de todas as marcas, apesar das vendas de carros elétricos (BEV) terem sido prejudicada na Europa no ano passado. O fim ou diminuição de subsídios governamentais e metas de descarbonização estagnadas na União Europeia foram os principais motivos segundo o Global EV Outlook 2025 da International Energy Agency (IEA). No entanto, as projeções para esse ano e os próximos são de crescimento.

De olho nisso a BMW lançou o novo iX3, modelo mais importante em anos ao inaugurar uma nova era para a alemã. A segunda geração do modelo estreia uma plataforma sob medida e exclusiva para elétricos de nova geração, chamada de Neue Klasse. O destaque fica com a nova bateria de 108.7kWh de capacidade integrada ao chassi, compatível com carregamento ultrarrápido de até 800V - ganha 372km em apenas dez minutos - e autonomia de 805km em uma carga segundo o ciclo WLTP. 

No quesito design a ruptura com o passado é ainda mais evidente, com uma nova linguagem visual, inspirado nos modelos da BMW dos anos 80. No interior foi inaugurado o Panoramic iDrive, com o painel de instrumentos correndo ao longo de todo o para-brisa, um novo volante de quatro raios e um multimídia com inteligência artificial de 17,5 polegadas. “A Neue Klasse é o nosso maior projeto futuro e marca um grande salto em termos de tecnologias, experiência de condução e design”, frisou o presidente do conselho de administração da marca, Oliver Zipse.

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Alemã aproveitou o evento para apresentar o futuro Sedan i3, que seguirá o capítulo iniciado pelo SUV iX3,  irmão de plataforma. Foto: BMW Group / Divulgação 

Do outro lado do pavilhão, a Mercedes-Benz fez um movimento parecido, lançando a segunda geração do GLC elétrico. O modelo foi o primeiro elétrico da marca, ainda em 2018 como EQC. Mas pelas vendas baixas havia sido descontinuado no ano passado, e agora retorna com o nome “GLC With EQ Technology”, para evidenciar as mudanças. Rival direto do iX3, segue a linguagem de design inaugurada no novo CLA no ano passado, aqui com uma grade iluminada e enormemente proeminente.

Construído sob a inédita plataforma elétrica MB.EA Medium, independente do GLC, a combustão portanto, possui carregamento de até 800V e uma bateria de 94kWh, traduzidos em 713 km de autonomia. No interior, o SUV inaugura o “Hyperscreen”, transformando o painel inteiro em uma tela de 39.1 polegadas. O interior pode ser todo vegano e certificado, e a comunicação Car-to-X - que coleta e envia dados para comunicar outros veículos - se destaca no quesito segurança. O preço inicial deve girar em €60 mil quando chegar às lojas ainda esse ano, tal qual o rival.

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Faróis possuem tecnologia Matrix, e sob o capô há um espaço de 128 litros para bagagens. Foto: Mercedes-Benz / Reprodução

Mas nem só de SUVs o mercado premium é formado, e a Polestar compareceu a Munique para o lançamento mundial do seu novo modelo de topo, o sedã 5. A marca do grupo Geely, divisão de performance da Volvo até 2017, aposta em sustentabilidade e alta performance, estreando a nova plataforma PPA do grupo. São 872 cavalos, tração integral, aceleração de 0 a 100 em 3,2 segundos e ausência de janela traseira, tal qual no crossover 4.

Um presente e futuro elétrico

Nas duas últimas edições do Salão de Munique, ambientalistas protestaram em frente ao evento em defesa de uma mudança sistêmica da indústria, o que se repetiu. As ONGs Extinction Rebellion e Attac levaram placas pedindo por mais investimento em transporte público e justiça social, jogando atenção para uma mentalidade individualista e o preço dos elétricos. 

Em relação a essa questão, um estudo da empresa de consultoria, Gartner, mostra que até 2027 os BEVs serão mais baratos de produzir que os carros a combustão (ICEVs), e o Grupo Volkswagen promete preços competitivos para sua nova geração de elétricos. 

Foram revelados no evento quatro modelos para o segmento B baseados na plataforma MEB Entry do conglomerado. O principal deles foi o ID.Polo da Volkswagen, com previsão de início de vendas em maio na casa dos € 25 mil. Como o seu nome sugere, é a versão elétrica do hatch Polo, e contará com baterias de 38 e 56 kWh, com uma autonomia de 350 e 450 km respectivamente. Uma versão GTI do modelo será também comercializada, com 223 cavalos.

Continuando o apelo esportivo que a versão encurtada da plataforma em que os modelos do segmento C, ID.3 e ID.4, são construídos, a espanhola Cupra mostrou a versão de produção do Raval. Com dimensões e motorizações basicamente iguais às do ID.Polo, promete continuar a expansão da nova marca do grupo, antigamente uma divisão de performance da Seat.

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Cupra Raval, ID.Polo e ID.Polo GTI  (direita) serão lançados em março do ano que vem, enquanto os SUVs Epiq e ID.Cross (esquerda) chegarão no segundo semestre. Foto: Volkswagen AG / Divulgação

Como era de se esperar pela relação do Polo com o T-Cross, sua versão SUV, o conceito ID.Cross foi mostrado. Com o mesmo tamanho do modelo que substituirá em 2026, integra o segmento disputado dos B-SUV elétricos, formado por nomes como Peugeot e-2008, Renault 4 e Volvo EX30. Focando em espaço e ergonomia, marca a volta de botões físicos no volante e do ar condicionado, além de um maior uso de materiais reciclados. 

Por fim, a Skoda apresentou a sua versão do SUV, denominada Epiq. Tal qual os irmãos de plataforma, será construído em Pamplona, na Espanha, e contará com a capacidade de carregar dispositivos externos como eletrodomésticos (V2L). A velocidade de carregamento é de até 125 kW, indo de 10% a 80% em 20 minutos, e o modelo estreará uma nova identidade visual para a tcheca no ano que vem.

Ascensão chinesa continua 

Aprofundando essa questão dos preços, são as marcas chinesas que se destacam globalmente, como destaca a IEA. Com grandes reservas dos minérios utilizados nas baterias, as fábricas para construí-las e anos de investimento estatal na tecnologia, seguiram com sua expansão em solo alemão. 

A BYD, maior marca chinesa em números, marcou presença com o recém lançado Dolphin Surf - a versão europeia do Dolphin Mini. Avaliado com cinco estrelas pelo Euro NCAP, é um dos BEVs mais baratos hoje à venda na Europa, custando cerca de € 20 mil. No campo dos híbridos plug-in (PHEV) a Station Wagon do segmento D, Sealion 06, foi lançada, focada em conforto e tecnologia com até 1.092 km de autonomia combinada.

Outra marca com novidades foi a Leapmotor, que já vende o hatch subcompacto T03 e o D-SUV C10 no continente, de lançamento marcado para o Brasil ainda em 2025. Pertencendo 20% à Stellantis, que controla a sua operação internacional, apresentou o inédito hatch B05, rival de Volkswagen ID.3 e BYD Dolphin. Sob a mesma plataforma do C-SUV B10, terá cerca de 400 km de autonomia e início de vendas para o ano que vem por cerca de € 30 mil.

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"O B05 (direita) reflete nosso compromisso com a inovação, acessibilidade e a capacitação da próxima geração de motoristas em toda a Europa e além", declarou o CEO global da marca, Zhu Jiangming. Foto: Leapmotor / Divulgação

Munique foi para além de um lugar de novos modelos, mais uma vez o palco de marcas inteiras debutando em solo europeu. A marca AITO, do grupo Seres, que usa a tecnologia da Huawei, se lançou no mercado internacional com os SUVs 9, 7 e 5. Mirando as marcas premium alemãs nos segmentos E e D, podem ser tanto BEVs ou elétricos com extensor de autonomia (REEV), repetindo a abordagem da Leapmotor com o C10.

O grupo Changan Auto iniciou as operações da sua marca Deepal com os SUVs de apelo jovem e esportivo S05 e S07, ambos com opções de serem elétricos ou PHEVs. No campo de luxo, a marca Avatr da gigante chinesa mostrou seu primeiro concept car, o Xpectra, além dos modelos 06, 07 e 12, já comercializados em alguns países europeus e com planos de chegarem a 50 mercados em breve.

A premium Hongqi esteve presente e revelou o C-SUV elétrico EHS5, além de anunciar planos de expansão com 15 modelos e 200 pontos de venda pela Europa nos próximos anos. E aumentando a sua aposta no evento, a Xpeng teve um stand dentro do pavilhão e apresentou a nova geração do P7, sedã que começou a ser comercializado na Europa no IAA Mobility 2023.

Além disso, a recém chegada ao Brasil, GAC, estreou no velho continente levando cinco modelos para a mostra. Seguindo com o “European Plan Market” anunciado no ano passado, lançou como modelos de topo o novo GS7, um SUV grande híbrido plug-in, e a MPV híbrida (HEV) E9. Mas os destaques da marca foram o hatch AION UT, rival de BYD Dolphin, e o D-SUV rival de Tesla Model Y, o AION V.

O primeiro possui bateria de 60 kW/h com 430 km de autonomia e previsão de início da comercialização em 2026 na casa dos € 30 mil. Já para o segundo, comercializado no Brasil por R$214.990, o preço de € 35.990 foi anunciado, muito competitivo para o segmento. Com 510km de autonomia e cinco estrelas no teste do Euro NCAP - com mais ADAS que o brasileiro - será o primeiro a chegar às lojas, já em setembro em mercados como Portugal, Finlândia e Polônia. O plano é que a marca venda em todos os países europeus até 2028.

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Estava ainda em Munique o carro elétrico voador GOVI AirCab (ao fundo) buscando mostrar os avanços da indústria chinesa, segundo a empresa. Foto: GAC Group / Divulgação

Eletrificação em todos os níveis 

Para além das novatas, ícones do mercado aproveitaram os holofotes da feira para se renovarem completamente. Esse foi o caso da única francesa presente, a Renault, que lançou a sexta geração do hatch Clio, o segundo carro mais vendido no continente em 2024.

Construído sob a mesma plataforma que o seu predecessor, mantém o motor 1.2 TCe e uma opção movida a GPL, mas as semelhanças acabam por aqui. No powertrain, estreia um novo sistema full-hybrid (HEV) formado por um motor 1.8 e dois elétricos, resultando em 160 cavalos e modo de condução elétrico na cidade. Conforme a estratégia da marca, o Clio não terá versão elétrica, papel delegado ao hatch de estilo retrô, o 5.

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Hatch cresceu 6 centímetros em comprimento, evocando uma silhueta mais esportiva e afilada. Foto: Renault Group / Divulgação

No quesito design, o carro rompe por inteiro com a geração anterior, o oposto do que havia acontecido com a quinta geração em relação à quarta. A frente ostenta uma nova assinatura em DRL, que forma o símbolo da Renault, e a traseira possui lanternas duplas, nunca vistas em um Clio. O interior é todo novo também em relação ao antecessor, mas com o mesmo layout e sistema operacional do Google do irmão elétrico 5.

A Volkswagen foi outra que debutou no IAA uma nova geração de um best-seller, o T-Roc. Em sua segunda encarnação, também não terá versões elétricas, sendo o último novo carro a combustão desenvolvido pela marca. Haverão pela primeira vez no SUV opções micro-híbridas (MHEV), já conhecidas dos irmãos de plataforma como o Golf e A3, além de um novo sistema HEV, com 134 e 168 cavalos. Não haverá, pelo menos por ora, versões PHEV, sendo o único modelo sob a MEB Evo sem essa possibilidade, no entanto.

Seu exterior é uma evolução da primeira geração, mantendo linhas semelhantes e o seu apelo descolado, descrito pela marca. As dimensões aumentaram, 12 centímetros em comprimento, chegando a 4.37 metros, o colocando alinhado a rivais como o Toyota CH-R e Mazda CX-30. Por dentro a abordagem continua, com telas maiores e mais itens de conectividade e segurança assistida, mas com uma disposição de elementos clássica, vista nos últimos Golf e Tiguan.

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Modelo construído em Portugal foi o quinto carro mais vendido na Europa no ano passado. Foto: Volkswagen Group / Divulgação

Concorrência de todos os lados

Além das chinesas em franca expansão nos últimos anos no continente, outras concorrentes vêm se destacando na corrida pelos elétricos principalmente. A coreana Kia compareceu ao evento e mostrou ao público os novos integrantes da família EV, o EV4 e o EV5. 

O primeiro é um hatch do segmento C, acompanhado de uma variante sedã. Já o último se trata de um modelo lançado em 2023 - inclusive a venda no Brasil desde o ano passado - mas que chega só agora à União Europeia como a versão elétrica do Sportage. Sua conterrânea e marca irmã também esteve em Munique com o Concept 3, prevendo o futuro Hyundai Ioniq 3, equivalente do EV4.

Mas nem só da Ásia as novidades chegam, com a primeira marca turca de automóveis elétricos, a Togg, debutando em solo alemão a sua ofensiva no continente europeu. Fundada em 2018 e com a primeira fábrica inaugurada em 2022, apresentou o C-SUV T10X e o sedã T10F ao público. A pré-venda dos modelos começará em 29 de setembro na Alemanha, e no ano que vem a empresa pretende iniciar seus trabalhos na França e Itália, com meta de ter até 2030 um milhão de veículos em toda a Europa.

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Preços ainda não foram divulgados, mas devem ficar em torno de € 40 mil tomando como base as cifras no mercado turco. Foto: Togg / Divulgação

Construídos sob uma plataforma elétrica, ambos receberam nota máxima no Euro NCAP recentemente, com mais de 9% de proteção para adultos e 80% nos ADAS. A respeito do desempenho, a bateria possui 88.5 kWh de capacidade, e autonomias de até 500 e 600 km para o SUV e o sedã respectivamente. 

“Nossos modelos proporcionam uma experiência de mobilidade voltada para o usuário e voltada para o futuro”, comentou Gürcan Karakaş, CEO da marca durante o evento. A marca anunciou ainda que trabalha no terceiro de cinco modelos que irá lançar até o fim da década, o B-SUV T8X. Karakaş finalizou destacando que prepara para introduzir baterias de pirofosfato de lítio (LFP), e que a indústria deve estar preparada para as mudanças e maior concorrência.

Deslocamento diário afeta qualidade de vida e desempenho profissional
por
João Luiz Freitas
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18/09/2025 - 12h

Muitas vezes se imagina que o desgaste mental de um trabalhador nasce apenas de pressões internas do ambiente corporativo. No entanto, ele pode começar muito antes, ainda no trajeto até o local de trabalho. Congestionamentos, longa espera entre um transporte público e outro, atrasos constantes e até mesmo a convivência com o estresse de outros passageiros são alguns dos fatores que tornam o percurso diário um desafio silencioso.

A psicóloga Sandra Oliveira de Freitas explica: “Podemos pensar na sensação de desumanização como se as pessoas fossem apenas mais um número dentro do sistema, o que afeta sua autoestima e a percepção de valor pessoal. É como se muitos acreditassem que, por serem trabalhadores, precisam aceitar situações desgastantes no transporte público”.

Esse sentimento, reforçado pela lógica de trabalhar para sobreviver, não apenas fragiliza a forma como os trabalhadores se enxergam na sociedade, como também influencia diretamente sua rotina. O esgotamento acumulado nos deslocamentos diários pode comprometer tanto a saúde mental quanto o desempenho no trabalho, tornando o desgaste uma extensão não tão evidente da jornada.

Freitas alerta ainda para os reflexos dentro dos ambientes de ofício: “A produtividade e as relações interpessoais no ambiente de trabalho podem ser impactadas diretamente. Quando o funcionário já chega cansado ou irritado, sua energia para se concentrar em tarefas simples diminui. Isso compromete também a criatividade, a motivação e a capacidade de colaborar com colegas”.

Esse cenário mostra que o problema vai além do transporte em si: ele expõe como a estrutura urbana e a forma de organização social interferem na vida de quem depende diariamente do transporte público.

A fisioterapeuta intensivista Laís Aparecida Silva, 27 anos, leva pelo menos duas horas para chegar ao hospital em que trabalha. Metade do percurso é feita no ônibus e a outra metade no metrô.  “É cansativo e imprevisível. Muitas vezes o transporte vem lotado, tem atrasos e preciso sair de casa bem mais cedo para não correr o risco de me atrasar. Às vezes até sinto que já começo o dia esgotada só pelo trajeto”, conta.

Trânsito congestionado na cidade de São Paulo
Trânsito congestionado nas de São Paulo — Foto: Chris Faga (Getty)

 

De acordo com uma pesquisa realizada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica), usuários de transporte público gastaram em média  duas horas e 47 minutos por dia nos deslocamentos pela cidade em 2024.

O impacto vai além do tempo perdido nas conduções. Aparecida explica que o percurso interfere diretamente no desempenho de suas atividades profissionais: “Eu chego no trabalho já meio desgastada. Em alguns dias, parece que gasto a minha energia no transporte e não nas minhas atividades. Isso afeta meu rendimento, principalmente no começo do plantão”, afirma.

Mas o reflexo do trajeto diário não para no ambiente de trabalho. A fisioterapeuta relata que sua vida pessoal também acaba sendo atingida. “Chego em casa muitas vezes sem ânimo para sair, conversar ou brincar com meus familiares. O tempo que passo no trânsito poderia ser aproveitado com a minha família ou até para descansar melhor, realizar uma atividade física”, desabafa.

Para ela, melhorias estruturais no transporte público poderiam transformar a rotina de milhares de trabalhadores. “Gostaria que tivesse mais pontualidade, veículos em melhores condições e menos lotação. Isso já faria muita diferença. Também ajudaria se tivesse mais opções de linhas, para reduzir o tempo de deslocamento”, diz.

Como psicóloga, Sandra Oliveira de Freitas reforça que esse desgaste não pode ser ignorado e aponta algumas práticas que podem ajudar a reduzir o estresse no trajeto. “Ouvir músicas relaxantes, podcast, ler um livro ou até mesmo praticar exercícios de respiração. A respiração diafragmática ajuda. Pode parecer coisa simples, mas que ajuda, ajuda bastante”, afirma.

Segundo ela, é importante também prestar atenção ao corpo durante a viagem, evitando tensões acumuladas: “Às vezes você deixa o seu corpo tão tenso que não percebe. Perceber o quanto a sua mandíbula está travada, o quanto as suas costas estão pesadas e tentar dar uma relaxada”.

Plataforma do metrô lotada em São Paulo
Plataforma do metrô lotada em São Paulo - Foto: Marcelo Mora/G1

 

Além dos cuidados no trajeto, Freitas recomenda criar pequenos rituais antes e depois da jornada: tomar um café tranquilo, conversar com pessoas queridas, priorizar o sono e uma boa alimentação. Ela reforça, acima de tudo,  a importância da saúde mental.

“Eu sempre falo e indico: fazer terapia. Porque ajuda, e ajuda muito. O transporte público está deixando o trabalhador muito estressado, sim. Então, acredito que a terapia vai ajudar não só a lidar com esse transporte caótico, como [vai ser útil] para a sua vida no geral.”

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Último final de semana do evento ficou marcado por performances que misturaram passado, presente e futuro
por
Jessica Castro
Vítor Nhoatto
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16/09/2025 - 12h

A segunda edição do festival The Town se despediu de São Paulo com um resultado positivo e bastante barulho. Durante os dias 12, 13 e 14 de setembro, pisaram nos palcos do Autódromo de Interlagos nomes como Backstreet Boys, Mariah Carey, Ivete Sangalo e Katy Perry.

Realizado a cada dois anos em alternância ao irmão consolidado Rock In Rio, é organizado também pela Rock World, da família do empresário Gabriel Medina. Sua primeira realização foi em 2023, em uma aposta de tornar a cidade da música paulista, e preencher o intervalo de um ano do concorrente Lollapalooza.

Mais uma vez em setembro, grandes nomes do cenário nacional e internacional atraíram 420 mil pessoas durante cinco dias divididos em dois finais de semana. O número é menor que o da estreia, com 500 mil espectadores, mas ainda de acordo com a organizadora do evento, o impacto na cidade aumentou. Foram movimentados R$2,2 bilhões, aumento de 21% segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Após um primeiro final de semana marcado por uma apresentação imponente do rapper Travis Scott no sábado (6), único dia com ingressos esgotados, e um domingo (7) energético com o rock do Green Day, foi a vez do pop invadir a zona sul da capital. 

Os portões seguiram abrindo ao meio dia, tal qual o serviço de transporte expresso do festival. Além disso, as opções variadas de alimentação, com opções vegetarianas e veganas, banheiros bem sinalizados e muitas ativações dos patrocinadores foram pontos positivos. No entanto, a distância entre o palco secundário (The One) e o principal (Skyline), além da inclinação do terreno no último, continuaram provocando críticas.

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Segundo estudo da FGV, 177 mil litros de chope e 106 mil hambúrgueres foram consumidos nos 5 dias de evento - Foto: Live Marketing News / Reprodução

Sexta-feira (12)

Jason Derulo animou o público na noite de sexta com um espetáculo cheio de energia e coreografias impactantes. Em meio a hits como “Talk Dirty”, “Wiggle” e “Want to Want Me”, o cantor mesclou pop e R&B destacando sua potência vocal, além de entregar muito carisma e sensualidade durante a apresentação.

A noite, aquecida por Derulo, ganhou clima nostálgico com os Backstreet Boys, que transformaram o palco em uma viagem ao auge dos anos 90. Ao som de clássicos como “I Want It That Way” e “As Long As You Love Me”, a plateia virou um grande coral emocionado, enquanto as coreografias reforçavam a identidade da boyband. Três décadas depois, o grupo mostrou que ainda sabe comandar multidões com carisma e sintonia.

Com novo visual, Luísa Sonza enfrentou o frio paulista com um figurino ousado e um show cheio de atitude no Palco The One. Além dos próprios sucessos que a consagraram no pop, a cantora surpreendeu ao incluir releituras de clássicos da música brasileira, indo de “Louras Geladas”, do RPM, a uma homenagem emocionante a Rita Lee com “Amor e Sexo”. A mistura de hits atuais, performances coreografadas e referências à MPB agitou a platéia.

E completando a presença de potências nacionais, Pedro Sampaio fez uma apresentação histórica para o público e para si, alegando que gastou milhões para tudo acontecer. A banda Jota Quest acalentou corações nostálgicos, e nomes em ascensão no cenário do funk e rap como Duquesa e Keyblack agitaram a platéia. 

Sábado (13)

No sábado (13), o festival reuniu diferentes gerações da música, com encontros que alternaram festa, emoção e mais nostalgia. Ivete Sangalo levou a energia de um carnaval baiano para o The Town. Colorida, divertida e sempre próxima da multidão, fez do show uma festa ao ar livre, com direito a roda de samba e participação surpresa de ritmistas que incendiaram ainda mais a apresentação. O repertório, que atravessa gerações, transformou a noite em um daqueles encontros em que ninguém consegue ficar parado.

Mais íntimo e afetivo, Lionel Richie trouxe outro clima para a noite fria da cidade da música. Quando sentou ao piano para entoar “Hello”, parecia que o festival inteiro tinha parado para ouvi-lo. A emoção foi tanta que, dois dias depois, o cantor usou as redes sociais para agradecer pelo carinho recebido em São Paulo, declarando que ainda sentia o amor do público brasileiro.

A diva Mariah Carey apostou no glamour e em seu repertório de baladas imortais. A performance, embora marcada por certa distância, encontrou momentos de brilho quando dedicou uma música ao público brasileiro, gesto que foi recebido com emoção. Hits como “Hero” e “We Belong Together” reafirmaram o status da cantora como uma das maiores vozes do pop mundial.

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Vestindo as cores do Brasil, Mariah manteve seu estilo pleno, o que não foi positivo dessa vez - Foto: Ellen Artie

O festival também abriu espaço para outras vozes marcantes. Jessie J emocionou em um show acústico intimista, feito apesar de estar em tratamento contra um câncer de mama — e que acabou sendo o único da cantora na América do Sul após o cancelamento das demais datas na América do Norte e Europa. 

Glória Groove incendiou o público com sua potência performática e visual, enquanto Criolo trouxe poesia afiada e versos de impacto, lembrando a força política do rap. MC Livinho levou o funk a outro patamar e anunciou seu novo projeto de carreira em R&B. Péricles encerrou sua participação em clima caloroso de roda de samba, onde cada espectador parecia parte de um grande encontro entre amigos.

Domingo (14)

Com Joelma, o The Town se transformou em um baile popular de cores, brilhos e danças frenéticas. A cantora revisitou sucessos da época da banda Calypso e apresentou a força de sua carreira solo, mas também abriu espaço para artistas nortistas como Dona Onete, Gaby Amarantos e Zaynara. 

O gesto deu visibilidade a uma cena muitas vezes esquecida nos grandes festivais e reforçou sua identidade como representante da cultura amazônica. Com plateia recheada, a artista mostrou que a demanda é alta.

No início da noite, em um horário um pouco melhor que sua última apresentação no Rock In Rio, Ludmilla mobilizou milhares de pessoas no palco secundário. Atravessando hits de sua carreira como “Favela Chegou”, “É Hoje” e sucessos do Numanice, entregou presença de palco e coreografias sensuais. A carioca também surpreendeu a todos com a aparição da cantora estadunidense Victória Monet para a parceria “Cam Girl”.

Sem atrasos, às 20:30, foi a vez então de Camila Cabello levar ao palco o último show da C,XOXO tour. A performance da cubana foi marcada pelo seu carisma e declarações em português como “eu te amo Brasil” e “tenho uma relação muito especial com o Brasil [...] me sinto meio brasileira”. Hits do início de sua carreira solo animaram, como “Bad Kind Of Butterflies” e “Never Be The Same”, além de quase todas as faixas do seu último álbum de 2024, que dá nome à turnê, como “HE KNOWS” e “I LUV IT”. 

A performance potente e animada, que mesclou reggaeton e eletrônica, ainda contou com o funk “Tubarão Te Amo” e uma versão acapella de “Ai Se Eu Te Pego” de Michel Teló. Seguindo, logo após “Señorita”, parceria com o seu ex-namorado, Shawn Mendes, ela cantou “Bam Bam”, brincando com a plateia que aquela canção era para se livrar das pessoas negativas. Vestindo uma camiseta do Brasil e com uma bandeira, encerrou o show de uma hora e meia com “Havana”.

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Com coreografia, grande estrutura metálica e vocais potentes, Camila entregou um show de diva pop - Foto: Taba Querino / Estadão

Para encerrar o festival, Katy Perry trouxe espetáculo em grande escala, mas não deixou faltar momentos de intimidade. A apresentação iniciada pontualmente às 23h15 teve direito a pirotecnias, muitos efeitos especiais e um discurso emocionante da cantora sobre a importância de trazer sua turnê para a América do Sul. 

Em meio a cenários lúdicos, trocas de figurino e um repertório recheado de hits, Katy Perry chamou o fã André Bitencourt ao palco para cantarem juntos “The One That Got Away”, o que levou o público ao delírio. O show integrou a turnê The Lifetimes World Tour, e deixou a impressão de que a artista fez questão de entregar em São Paulo um dos capítulos mais completos dessa jornada.

No último dia, outros públicos foram contemplados também, com o colombiano J Balvin, dono de hits como “Mi Gente”, e uma atmosfera poderosa com IZA de cleópatra ocupando o palco principal no início da tarde. Dennis DJ agitou com funk no palco The One e, completando a proposta do festival de dar espaço a todos os ritmos e artistas, Belo e a Orquestra Sinfônica Heliópolis marcaram presença no palco Quebrada. 

A cidade da música em solo paulista entregou o que prometia, grandes estruturas e um line up potente, mas ainda segue construindo sua identidade e se aperfeiçoando. A terceira edição já foi inclusive confirmada para 2027 pelo prefeito Ricardo Nunes e a vice-presidente da Rock World, Roberta Medina em coletiva na segunda-feira (15).

Cooperativa é a grande responsável por reerguer a população da Vila Nossa Senhora Aparecida após tragédia climática, reafirmando a máxima do “povo pelo povo”
por
Cecília Schwengber Leite
Laura Petroucic
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10/09/2025 - 12h

Em junho de 2025, um ano após a enchente que assolou o Rio Grande do Sul em 2024, o bairro Sarandi – um dos mais afetados de Porto Alegre – se viu novamente sob ameaça de cheias. Um intenso volume de chuvas causou alagamentos, transbordamento de dois bueiros e elevou o nível de água no dique do bairro, preocupando os moradores traumatizados com a catástrofe do ano passado. 

Localizado na periferia da zona norte da capital gaúcha, o bairro Sarandi é um dos mais populosos e abriga algumas comunidades, chamadas pelos moradores de Vilas. Desde março deste ano, famílias em situação de desemprego ou baixa renda viviam um impasse com a prefeitura devido a necessidade de sua remoção das casas em que viviam para a reforma do dique rompido durante a enchente. Houve negociação, e as obras de reforço estão em andamento. 

Em julho de 2025, moradoras da Vila Nossa Senhora Aparecida, localizada em Sarandi, relataram a situação da comunidade e destacaram o papel significativo das cooperativas lideradas por Nelsa Nespolo para a restabilização dos seus habitantes. “Aqui foi o povo pelo povo”, afirma Leonilda Quadros, aposentada que teve a sua casa inundada durante a enchente. 

Nelsa Nespolo é diretora-presidente das cooperativas Univens e Justa Trama, referência em Economia Solidária (modelo econômico baseado na cooperação, autogestão e distribuição equitativa de lucros). Ambas as entidades, assim como o banco comunitário Justa Troca, dividem o mesmo endereço na Vila Nossa Senhora Aparecida e, durante e pós enchente, tiveram e vêm tendo papel fundamental e central na recuperação das famílias da comunidade. 

A Rede de Algodão Agroecológico Solidário Justa Trama é um projeto que envolve cinco estados brasileiros e 700 cooperados e cooperadas, entre agricultores, tecelões, artesãs e costureiras. Atualmente, é a maior cadeia produtiva brasileira de economia solidária no setor de confecção. No RS, uma parte importante deste projeto acontece na cooperativa de costureiras Univens. Nelsa destaca o papel da cooperativa no empoderamento e geração de renda para mulheres, muitas vezes já de meia idade e sem estudo. 

O banco comunitário Justa Troca faz parte da Associação de Moradores da Vila e tem como moeda social o Justo. Suas administradoras de cursos, Adriana Nunes, e financeiro, Andreia Padilha, contam que a iniciativa vem sendo fundamental para dar apoio às famílias e organizar a economia da comunidade. A iniciativa se mantém por meio de parcerias com institutos e principalmente com a UNISOL (Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários), uma Organização da Sociedade Civil, sem fins lucrativos e de abrangência nacional. 

Por meio do Justo, que é aceito em quase todo o comércio da Vila (e possui fundo garantidor), o banco fornece microcréditos para moradores iniciarem um empreendimento, ou se reerguerem após algum ocorrido – como a própria enchente, ou uma situação de desemprego. Além disso, o Justa Troca promove doações de cestas básicas compostas por alimentos da agricultura familiar e MST, iniciativas de trocas de produtos, cursos variados de formação de microempreendedores e feiras de gastronomia e artesanato, que geram renda para os vendedores formados nos cursos. 

Adriana e Andreia contam que o espaço físico onde se encontram as cooperativas está localizado na única rua da comunidade que não foi completamente inundada durante a enchente. Assim, o local concentrou as iniciativas para assistir de todas as formas possíveis a sua população, tornando-se ponto de distribuição de produtos, doações e de muito trabalho voluntário e mobilização de recursos. As 1165 famílias da comunidade cadastradas receberam marmitas, água, roupas, cestas básicas, produtos de limpeza e higiene, e posteriormente alguns móveis e até mesmo brinquedos para as crianças. 

Dados do Banco Justa Troca mostram número de famílias beneficiadas com doações.
Dados do Banco Justa Troca mostram número de famílias beneficiadas com doações. 

Em meados de agosto de 2024, o banco passou a promover cursos profissionalizantes para que os moradores da Vila retomassem suas atividades de geração de renda. Abriram grupos nas áreas de costura, gastronomia, beleza, construção civil e cuidadores de idosos. A parceria com a Instituição Gerações foi fundamental para a doação de equipamento para os participantes. Assistida pela cooperativa e aluna do curso de tricô, Leonilda Quadros destaca o trabalho intensivo e humano que salvou a comunidade durante e no pós enchente: sem essa ajuda, não sei o que teria sido de nós. 

Fachada da Cooperativa Univens em um dia de entrega de doações. Reprodução: acervo da cooperativa.
Fachada da Cooperativa Univens em um dia de entrega de doações. Reprodução: acervo da cooperativa.

Leonilda conta que, em sua rua, assim como na maioria das ruas da comunidade, o nível da água subiu a ponto de só ser possível passar de barco. A água não vinha somente do transbordamento do dique, vinha também de baixo para cima, saindo do esgoto. “Nós erguemos os móveis antes de sair, pensando que no dia seguinte voltaríamos e a água estaria batendo na canela… mas não sobrou nada”, relata a moradora, que viu a água atingir o telhado de sua casa. 

Vila Nossa Senhora Aparecida durante a enchente. Reprodução: acervo da cooperativa.
Vila Nossa Senhora Aparecida durante a enchente. Reprodução: acervo da cooperativa.

Demorou semanas até que Leonilda pudesse ao menos abrir a porta e, enquanto isso, precisou se deslocar para diversas casas de parentes. “Era desesperador… quando pensávamos que a água ia baixar, subia de novo”, relembra. Quando foi possível acessar sua casa, o cenário era pós-apocalíptico: um cheiro podre, de gente ou bicho morto, misturado com esgoto. Os móveis e utensílios estavam todos espalhados, os canos estourados. Tinham até mesmo cobras, lagartos e peixes pelos arredores. “Parecia um filme de terror”, afirma. 

Após semanas, Leonilda conseguiu voltar para casa, que ainda hoje está em reconstrução, assim como as de muitos moradores. “Quando abri a porta e vi que não tinha sobrado nada, o primeiro pensamento foi de dar meia volta, largar tudo e ir embora. Só pensava: acabou, não vou ficar aqui”. Atualmente, a Vila se vê cheia de “ruas-fantasma”, pois muita gente não voltou depois de perderem tudo. “Ninguém se preparou para a enchente, porque nunca tinha acontecido algo assim. A maioria das pessoas saiu de casa só com a roupa do corpo, e deixou tudo para trás”, comenta. 

Meses depois, ruas da Vila Nossa Senhora Aparecida ainda acumulavam entulho aguardando recolhimento. Reprodução: acervo da cooperativa.
Meses depois, ruas da Vila Nossa Senhora Aparecida ainda acumulavam entulho aguardando recolhimento. Reprodução: acervo da cooperativa. 

Entre os que seguiram morando na comunidade, a maioria carrega traumas, o que faz com entrem em pânico com as ameaças de novas cheias. Quando há chuvas prolongadas por mais de dois dias, já se iniciam movimentações desesperadas, preventivas. “Eu não consigo dormir a noite quando começa a cair muita água, já corro para a janela ver como está a rua”, relata Leonilda. 

O descaso da prefeitura com o bairro Sarandi em relação a Orla (que atrai turismo e investimento empresarial), rapidamente reconstruída após a enchente, é notório. Levou meses para que o poder público da capital gaúcha mobilizasse o recolhimento dos entulhos, realizasse as reformas necessárias e as limpezas pesadas. Para isso, foi preciso um levante popular no bairro, do qual moradores da Vila Nossa Senhora Aparecida participaram, exigindo dignidade. O curioso é que, apesar disso, o então prefeito Sebastião Melo (MDB) foi reeleito em 2024 com forte base eleitoral em Sarandi, segundo dados do TSE. 

Moradores protestam pela limpeza da Vila Nossa Senhora Aparecida. Reprodução: acervo da cooperativa.
Moradores protestam pela limpeza da Vila Nossa Senhora Aparecida. Reprodução: acervo da cooperativa. 

Apesar da tragédia sem precedentes, muitos danos à população poderiam – e deveriam – ter sido evitados com um programa de investimento em prevenção de enchentes, que foi gradualmente negligenciado pela prefeitura da capital durante o primeiro mandato de Sebastião Melo. Segundo dados do Portal da Transparência de Porto Alegre, em 2023 o dinheiro em caixa do departamento responsável era de R$ 428,9 milhões. Entretanto, não houve recursos destinados à melhoria no sistema contra cheias. Mesmo em um contexto de crise climática, a queda no investimento da prefeitura na prevenção de enchentes foi gritante: em 2021, a verba era de R$ 1,7 milhão. Já em 2022, caiu para apenas R$ 141 mil até que, em 2023, o orçamento foi nulo. 

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Diante do desinteresse do Estado, a ONG Equilíbrio Universal é capaz de amparar a comunidade do Cocaia, no extremo sul de São Paulo
por
Yasmin Solon
Laura Paro
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24/10/2023 - 12h

 

 

 

 

Por Yasmin Solon (texto) e Laura Paro (audiovisual)

 

Sinir à esquerda e Maristela à direita em frente ao espaço destinado às atividades da ONG Equilíbrio Universal no Parque Residencial Cocaia, no Grajaú/Foto: Laura Paro
Maristela à esquerda e Sinir à direita/Foto: Laura Paro

Sinir saiu do norte de Minas Gerais em busca de uma vida melhor com oportunidades. Deixou seus pais e seus 13 irmãos aos 16 anos e depois de morar na região metropolitana de SP, foi às periferias da grande capital. Ela conta que quando chegou ao bairro conhecido hoje como Cocaia, tudo estava desabitado, que a população não tinha nada; na época, não haviam lixeiros e nem água. Era apenas matagal. Sinir tem sete filhos e é formada por duas faculdades, Assistência Social e Enfermagem, e pós graduanda em Educação e Saúde. Fundou a Organização Não Governamental Equilíbrio Universal em 1994 na tentativa de melhorar a comunidade, que já tinha um número de moradores relevante e que sofria, desde o surgimento do bairro, uma negligência governamental. Hoje, aos 67 anos de idade, ela é Presidente da Equilíbrio Universal. 

Ao redor da Represa Billings, em uma área de mananciais no extremo da região Sul de São Paulo, durante o burburinho e a ansiedade da rotina paulistana, surgia um distrito que hoje é considerado o maior da cidade, o Grajaú. Em 1981 a Imobiliária Federal de São Paulo vendeu os primeiros lotes irregulares na área que hoje é conhecida como Parque Residencial Cocaia. Em ruas de terra batidas, sem água ou esgoto encanados, luz, transporte, educação ou saúde básica, ou ao menos uma coleta de lixo aos moradores locais, já moravam Sinir Bento de Nazaret e Maristela Ribeiro da Silva que até hoje atuam na ONG Equilíbrio Universal, um símbolo que concretizou a democratização dos direitos do cidadão na região.

A instituição independente, apartidária e sem fins lucrativos surgiu a partir das necessidades da comunidade. Nas manhãs em que as mães e os pais precisavam ir ao trabalho, porém não podiam deixar seus filhos nas creches da região porque elas não existiam, foi na instituição que eles encontraram o abrigo necessário. Em meio às ruas sem asfaltos e lixos não coletados, as crianças encontravam na instituição um local de lazer e interação social. Enquanto não existia nenhum ensino na região, a Equilíbrio Universal oferecia cursos profissionalizantes aos moradores. É nesse sentido que Maristela comenta que eles representam a política do local, pois onde o governo não chega, são eles que governam. A comunidade depende das ações da instituição. 

Maristela tem 61 anos e também atua diretamente na Equilíbrio Universal. Mãe de quatro filhos adotivos, ela conta como é essencial acolher todos, independente de qualquer coisa: não existe distinção na comunidade de Cocaia pois todos merecem ser acolhidos, e é isso que o governo não enxerga. A entidade se compromete em dar a mesma chance e o mesmo tratamento, para que todos tenham as mesmas oportunidades. Quase dez anos antes da criação da Equilíbrio Universal, em 1983, foi feita a primeira reunião com autoridades da Prefeitura para reivindicar água, luz, transportes, coleta de lixo e incentivo ao comércio. Porém, ao que pareceu, não existia uma falta de diálogo e sim de interesse em transformar aquela área estruturada para as famílias morarem. Isso se tornou ainda mais evidente quando Sinir afirmou que a área do Grajaú é, até hoje, considerada um ‘cinturão verde’, e por isso o governo diz não poder dar uma infraestrutura digna aos moradores. 

Parque Residencial Cocaia, área de mananciais e à beira da represa Billings/Foto: Laura Paro
Parque Residencial Cocaia, área de mananciais e à beira da represa Billings/Foto: Laura Paro

Enquanto escorriam os esgotos das casas no mesmo chão em que as crianças brincavam descalças, Sinir, Maristela e outros integrantes procuravam solucionar os problemas e as demandas que a região sofria. A água não era tratada  e o esgoto sequer encanado, e elas contam que para atender todos da comunidade, a água era roubada, e o esgoto à céu aberto. Hoje, a água é tratada e distribuída, mas o esgoto é centralizado para uma caixa da Sabesp, como uma fossa, e despejado na represa. Durante essa problemática sanitária, diversas crianças e pessoas se infectaram e faleceram devido à Hepatite. Atualmente, a caixa mencionada, de fato, acumula os dejetos domésticos e deságua na Billings à beira das casas. Isso reflete no número assombroso em que cerca de 1,5 milhão de pessoas vivem sem saneamento básico na capital, a maioria das casas sem saneamento estão na Zona Sul. Há poucos quilômetros, é possível imaginar como é fácil para as famílias assistidas pelo governo apenas darem descarga e não terem contato com esse esgoto diretamente, mas devido à negligência, os moradores do Cocaia são acostumados à paisagem poluente e o odor fétido. Sinir conta que, ali, não é possível ver o esgoto saindo das casas porque é encanado, mas não é tratado. Então às vezes ao visitar alguém, a casa e a rua estão limpinhas, mas o cheiro ruim de esgoto está presente porque está tudo centralizado e não tratado.

A desculpa de que o local é de preservação ambiental e assim não pode ser atendido pelas demandas, só funciona nas periferias. A 10 quilômetros de distância mas em mundos paralelos completamente diferentes, no bairro Jardim dos Estados, um bairro classe média-alta, a Associação do bairro precisou lutar há uns anos atrás para que o Jardim Alfomares, grande área verde local, não fosse desmatado para construção de condomínios residenciais. Por outro lado, o Grajaú já é habitado por muita gente - mais de 1 milhão - e tem suas necessidades não atendidas por ser uma área de mananciais. Se a área já foi desmatada, habitada, vendida por lotes irregulares, não há motivos para negligenciar direitos básicos aos moradores locais. Não faz sentido dizer que é feita uma proteção ambiental se o esgoto é desaguado em um dos maiores e mais importantes reservatórios de água da Região Metropolitana de São Paulo.

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Esgoto a céu aberto no bairro do Cocaia./Foto: Laura Paro

Maristela e Sinir contaram como foi conquistar a água tratada na região. Apesar das inúmeras tentativas e diversas vezes ignoradas, a ONG se organizou em conjunto com a comunidade e a Associação do bairro para ir até Brasília reivindicar pelo direito básico assegurado pela Constituição. Elas contam que juntaram 50 pessoas em um ônibus para ir a Brasília, com panelas e cartazes, e foram ouvidas com deboche vindo dos políticos. Nesse dia, Maristela conta que começou a chover, e foi quando ouviram ‘Está aí a água que vocês queriam’, seguidas de risadas. 

No surgimento do bairro, como os loteadores apenas tratavam de vender os terrenos irregulares da região e desapareciam logo em seguida, os moradores locais ficavam responsáveis por correr atrás de melhorias e necessidades básicas do bairro. O asfalto chegou ao Parque Residencial Cocaia em 1998, após muita luta dos moradores e atuação direta da instituição, que iam à prefeitura, e ouviam que a rua já havia sido asfaltada. Possivelmente, resultado de obras fantasmas que tiveram desvio de verba.
Quando o poder público argumentou “não existir número significativo de crianças” para construir creches e escolas, a instituição se organizou juntamente à comunidade para estender um varal na porta da Secretaria da Educação com as certidões de nascimento daquelas que moravam no Cocaia. Depois dessa atitude, a Equilíbrio Universal e a Associação em Defesa da Moradia do Parque Recanto Cocaia, fundada por Ilda Vieira Vilela, irmã de Maristela que hoje é homenageada pela Escola Estadual Ilda Vieira Vilela, ou seja, os próprios moradores, ocuparam um espaço abandonado e se revezaram por dois anos para dar aulas e cuidarem das crianças, já que 1600 delas não estudavam. Hoje, esse local é a Escola Estadual Aniz Badra.

Em relação à coleta de lixo, não foi diferente. Em meio aos ratos e o cheiro azedo que persistia nas ruas do bairro, era impossível lidar e seguir a rotina de forma normal. Mais uma vez, a entidade tomou uma atitude para serem atendidos após diversas respostas negativas. Um dia, o grupo se organizou e juntou diversos sacos de lixos para despejar na mesa do então subprefeito, logo o pedido foi atendido e os lixos domésticos começaram a ser recolhidos.  

 

Apostila que conta a história da Equilíbrio Universal mencionando os acontecimentos/Foto: Acervo pessoal
Apostila que conta a história da Equilíbrio Universal mencionando os acontecimentos/Foto: Acervo pessoal

Atualmente, a ONG Equilíbrio Universal ainda atua com os cursos profissionalizantes para áreas de beleza, costura, reforma, entre outras. Distribui cestas básicas na região e busca o empoderamento femino às moradoras. Maristela comenta que elas acreditam que o ser humano deve ser curado fisicamente, emocionalmente, mentalmente, socialmente, espiritualmente e ser inserido na sociedade como alguém capaz. Porém, infelizmente a comunidade não tem nenhum incentivo governamental, seus recursos são frutos de doações e são independentes em todos os sentidos. As pessoas da instituição tem muita força de vontade, muita garra e muita coragem, o que lhes falta é a verba. Maristela finaliza dizendo que o povo é visto apenas como curral eleitoral, números estratégicos, e depois são esquecidos. A comunidade coloca os políticos no governo e depois é abandonada, desrespeitada e debochada. A Equilíbrio Universal e outras entidades que asseguram os direitos políticos e sociais prometidos pela Constituição brasileira. Graças às iniciativas como à de Sinir existem políticas resistentes à negligência governamental.

 

Para contribuir a instituição, doe qualquer valor possível ao Equilíbrio Universal: 
CHAVE PIX - CNPJ: 01.741.913/0001-21 
Banco do Brasil
Agência: 6996-5 C/corrente: 15.518-7

E-mail: ong.equilibrio.universal.1997@gmail.com

 

 

 

 

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A Rádio Cidadã, no Butantã, transmite diariamente um pedaço de São Paulo
por
Artur dos Santos
Kawan Novais
|
14/11/2023 - 12h

Por Artur dos Santos (texto) e Kawan Novais (audiovisual

 

A antena de 30 metros com uma fundação de toneladas de cimento da Rádio Cidadã não há motivo para (e nem intenção de) cair. O que já foi uma antena leve de 20 metros com um dos pés amarrados em uma parede - arrancada com facilidade por uma chuva que Deus mandava enquanto os radialistas se abrigavam em um bar próximo - hoje seguraria até um avião.

 

Antena da Rádio Cidadã
Antena que distribui o sinal da Rádio Cidadã. Foto: Artur Santos.

 

O sinal varia, é circular, depende da topografia, no Butantã tem muito morro, e pode alcançar o estádio do Morumbi, mas não na avenida a menos de 2 quilômetros. 500 mil ouvintes são contemplados pela amplitude das ondas todo dia, bairros com mais densidade demográfica têm rádios com maior alcance de pessoas, consequentemente. A sintonia é FM 87.5, dial das rádios comunitárias (RC) legalizado pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) na cidade de São Paulo. “Entrando na Sola” e “Na Onda do Forró”, dois dos programas mais badalados da rádio, atingem ouvintes dos arredores de sua localidade, assim como suecos e tailandeses, via digital, mesmo que sem entender o idioma.

 

Cachorros guardando a entrada do estúdio.
Descida para o estúdio da Rádio Cidadã. Foto: Artur Santos.

 

Cachorros guardando a entrada do estúdio.
Ródio e Baguan na entrada do estúdio. Foto: Artur Santos.
Estúdio
Metade áudio, metade vídeo. Foto: Artur Santos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Assim como a antena sobe, por rampas ou escadas, a entrada para o estúdio desce, guardada por dois cachorros, um magro com focinho molhado e um velho, que ameaçam fugir do QG de Julio César, responsável pela Rádio Cidadã. “Não repare a bagunça” - diz qualquer dono de estúdio em qualquer lugar. As habilidades de Julio e seus anos de experiência como programador cortam os custos e a dor de cabeça de se manter uma rádio comunitária em pé. Os segredos nas tomadas e o raciocínio lógico de quem trabalha com a área de programação automatizam o funcionamento, e a rádio está no ar mesmo se ninguém estiver em casa.

“Bem tranquilo, apesar de parecer bagunçado. Tem uma parte aqui que você programa tudo que vai acontecer, toda a parte obrigatória, como prefixo, publicidades, tem que passar tem que falar a hora certa de hora… regras que você precisa seguir. Ele programa todas as playlists com parâmetros. Eu coloco a música que o menos tocou, então ele vai pegando sempre essa e separa por estilo também. Samba toca no meio-dia uma, de manhã um reggae, MPB… madrugada putaria toca.”

O estúdio da Cidadã mescla áudio e vídeo, tendência não muito escapável atualmente. Os programas transmitidos via FM 87.5 são, simultaneamente, veiculados no canal do YouTube e no site da rádio, possibilitando mais adesão do público aos programas no ar. Julio não sabe explicar o sucesso de um de seus programas, o Na Onda do Forró, apresentado por “Neguinho da Bahia”, que conversa com o público, faz piadas e realiza seus anúncios. As “tiradas” divertidas de Neguinho ser o motivo do encanto que faz a transmissão ao vivo atingirem 400 ouvintes, algo fora do comum na vida diária da rádio. Mesmo assim, foi impossível explicar como resulta em tanta audiência. Rádios comunitárias como a Rádio Cidadã estão sob as mesmas burocracias de rádios comerciais, com alguns adendos. Os radialistas de uma RC não podem anunciar os preços, a forma de pagamento de anunciantes, ou ao menos anunciar marcas que não tenham representação dentro do bairro. Mas, Neguinho da Bahia tem anunciantes de sobra.

Julio Cesar, responsável pela rádio Cidadã.
Julio trabalhou na Rádio Tupi e na Atual. Foto: Artur Santos

A lei n° 4133, de 2012, impedia as rádios comunitárias de se adequarem a qualquer tipo de financiamento público ou privado visando custear seus serviços ou melhorar as atividades a serem prestadas. Como apoio cultural, era permitido patrocínio, mas restrito apenas aos estabelecimentos situados na mesma área que o rádio estaria estabelecido. Neste ano, 2023, ao fim de agosto, a Câmara Municipal de São Paulo sediou o terceiro Congresso das Rádios Comunitárias de São Paulo, reunindo radialistas da cidade paulista e de outros estados, como do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Bahia. Autoridades federais que também participaram dos debates, expuseram os auxílios existentes para os radialistas e apresentaram as “novidades” que visam suprir as necessidades dos comunicadores.

O principal tema da reunião foi a criação de políticas públicas e a regulação de leis vigentes direcionada às rádios comunitárias. Para se tornar um radialista desta modalidade, o processo se inicia por meio do requerimento para a abertura de uma rádio comunitária através do Plano Nacional de Outorgas (PNO), que é a identificação e seleção de municípios que ainda não têm esta modalidade comunicadora, mas que manifestaram o interesse de tê-la. Após uma série de etapas, o processo resulta no funcionamento legal do veículo de transmissão por 10 anos, podendo ser renovado por outro processo no fim da década.

Julio apresentou seu documento, uma espécie de RG (Registro Geral), mas que não o identifica enquanto um cidadão, e sim enquanto um radialista comunitário legal perante a lei. Mas, no início da vida da Cidadã, quando ainda era caracterizada como uma rádio clandestina, o atual responsável por ela chegou a entrevistar dois ministros, a qual ele não tem mais acesso atualmente. Criada em 1994, era assim que tinha que ser. Clandestina ou regularizada, as Rádios Comunitárias servem uma função social nos bairros em que atuam.

Em 1970, as da Zona Leste eram caixas de som hasteadas em um pau nas esquinas, disseminando informação que se recusava a chegar nas periferias pelos meios tradicionais. A criatividade é a saída. As favelas oferecem um público muito mais engajado, mais do que qualquer outro. Até a transmissão da queima de fogos realizada aos finais de anos, apenas por áudio acontecia, e mesmo que sem a imagem, atraía público a rádio. Pessoas de outras regiões, inclusive mais nobres, paravam para observar em um local que já ocupava o triplo de pessoas de sua capacidade. Mesmo com todo o engajamento, não é suficiente para tornar a Cidadã autofinanciável. De acordo com a lei já citada, as rádios comunitárias, assim como as educativas, conseguem financiamento por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Trata-se de empréstimo realizado por este órgão com a finalidade de modernização, aquisição de equipamentos e instalação de sistemas radiantes.

A feira contou com várias atrações culturais e gastronômicas, propondo uma viagem para alem da Índia
por
Vitor Nhoatto
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22/09/2023 - 12h

Na Avenida Paulista neste sábado (16), em um imponente prédio com o letreiro Club Homs, uma aglomeração sugeria algo especial.  Ao entrar e subir as escadas, um forte odor de especiarias atiçava o olfato dos visitantes, e um mundo de cores e sons animavam a todos. Ali acontecia um festival indiano totalmente vegano. A feira anual de entrada gratuita trouxe um pedaço do país asiatico ao centro de São Paulo. Por meio da sua culinária intensa; música tradicional "kirtana"; rituais religiosos e muitas bancas de diversos produtos artesanais.

Tendo seu início às 11h e término às 22h , o evento possibilitou uma imersão na cultura indiana, tão rica e diferente aos olhos ocidentais. No entanto, vários idiomas se misturavam no ar, e à medida que se avançava pelo grande salão do tradicional clube paulista, bandeiras e símbolos de vários países, levavam os presentes a uma viagem pelo mundo.

Prato preto redondo sob uma mesa com espetos veganos de calabresa, frango e camarão junto a um pouco de farofa com uma pimenta vermelha em cima, maionese vegana e um pouco de folhas de faces crespas picadas
Churrasco sem crueldade é a proposta do restaurante Nega Fulô, idealizado por mulheres negras - Foto: Vitor Nhoatto

Servindo como deliciosos aperitivos para abrir o apetite, em meio a uma mesa de doces árabes e uma de mini pizzas, estava o quiosque do Nega Fulô. O restaurante, localizado na zona leste da capital paulista, levou até o evento um churrasco sem crueldade animal, com opções de espetinhos de calabresa, frango, camarão, kafta e cogumelos. Com a maioria dos sabores tendo como base proteína de soja, fécula de mandioca e condimentos diversos, os preços variavam entre R$14 e R$17 cada, com direito a três acompanhamentos: uma deliciosa veganese, uma farofa com ou sem pimenta e um pouco de salada de repolho com acelga.

Para beber, uma ótima opção era a Kombucha da barraca Amigos da vida, empresa do interior de São Paulo que desde 2014 produz artesanalmente as bebidas, as quais são orgânicas, veganas e sem aditivos artificiais. Custando R$14 a garrafa de 300ml, a bebida levemente gaseificada e com propriedades medicinais, é obtida a partir da fermentação dos seus ingredientes. Os sabores disponíveis eram: uva, hibisco e gengibre, e romã.

Varias pessoas de roupas coloridas sentadas no chão de um palco com cortinas vermelhas ao fundo, tocando instrumentos musicais orientais e cantando música tradicional indiana Kirtana
Apresentação de música tradicional indiana "kirtana"durante o ritual de bençãos no festival - Foto: Vitor Nhoatto

A maioria das opções de comida enfrentavam filas. Depois do pedido feito, o tempo de espera era de até 50 minutos, mas muitas outras atrações encantavam o público e faziam o tempo voar. Na feira estavam presentes camisetas indianas e hijabs; cosméticos naturais brasileiros; semijoias peruanas; e perfumes e livros árabes, todos esses artesanais, veganos e com uma história diferente para contar.

Além dos vários produtos à venda, atrações gratuitas ocorreram, aulas de yoga, rodas de meditação, sessões de pintura facial e um enorme ritual hindu de bênçãos com o guru indiano Paramahamsa Vishwananda. A trilha sonora ficou com as apresentações ao vivo de "kirtana", uma música tradicional do país asiatico.

Prato de papel alumínio com arroz temperado amarelo, samosas de legumes e uma salada de alface crespa e tomates em cubo, sob uma mesa bege de madeira junto a um garfo de plástico transparente, copo de papel com sopa de lentilhas, e um copo de plástico transparente com o suco Nimbu Pani indiano de aparência verde
Carro-chefe do festival, refeição indiana completa, e o suco Nimbu Pani, típicos da Índia - Foto: Vitor Nhoatto

A estrela do festival foi a refeição indiana completa, oferecida pelo restaurante Estação Vegana, com unidade fixa na Liberdade. O prato de R$40 era composto pelo Jeera Rice (arroz com açafrão e cominho), Dahl de lentilhas com especiarias, samosas de legumes, um salgado típico indiano e uma porção de salada para equilibrar a picância. Para beber, havia o Nimbu Pani, suco de limão, hortelã e cominho; e o Chai, bebida quente de leite vegetal com especiarias, ambos por R$12. No quesito sobremesa, o quiosque de temática anime, Xoxurros, oferecia churros ou açaí entre R$14 e R$20, dependendo do tamanho e adicionais. Havia também em outras bancas, brownies artesanais por R$10, ou brigadeiros por R$5.

Em um mar de pessoas tão diferentes, e ecobags com “somos parte do futuro” escrito, a valorização da diversidade e a mistura cultural prevaleciam, além do respeito pelas etnias e animais. O festival indiano organizado pela Vegnice acontece anualmente, mas outras feiras ocorrem ao longo do ano, demonstrando a versatilidade e sabor da comida vegana.

Para ter um gostinho do que rolou, confira o vídeo  no Instagram da AGEMT.

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O restaurante com culinária tailandesa autêntica possui unidades na Liberdade e em Pinheiros
por
Camila Stockler
Fernanda Querne
João Curi
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08/09/2023 - 12h

                                Legenda: O carro-chefe Pad Thai / Por: Camila Stockler

Subindo a rua Galvão Bueno e virando à esquerda na rua Barão de Iguape, no bairro da Liberdade, em São Paulo, já é possível notar algumas bandeiras tailandesas. E apesar delas, a porta é simples e durante a semana é preciso tocar a campainha. Ao entrar, tudo acontece ao mesmo tempo: o cheiro agridoce invade as narinas, as atendentes tailandesas perguntam “quantas pessoas?”, e em todo o salão há  decorações budistas, souvenires tailandeses e até retratos da monarquia desse país do Sudeste Asiático. Depois de um primeiro choque, é possível notar que este lugar além de um restaurante é um local de divulgação da cultura tailandesa. E é assim que se entra  no restaurante Thai E-San, da chef tailandesa Tookta Chomnuk.

Assim, a recomendação da AGEMT para quem nunca experimentou comida tailandesa, é o pad thai. Esse prato é o carro chefe de qualquer restaurante tailandês que se preze, e é o prato mais famoso da Tailândia. Sendo uma combinação agridoce de macarrão de arroz, legumes, tofu, ovo e a carne da sua escolha (frango, bovino, camarão ou tofu), tem o preço variando de 45 a 52 reais dependendo da carne. 

Além disso, tradicionalmente a culinária tailandesa é caracterizada pela presença do camarão, pimenta e arroz, mas o restaurante demonstra que a culinária tailandesa é muito mais que isso. E além de poder escolher o tipo da carne, é possível tornar a maioria dos pratos vegetarianos ou inclusive, veganos. Para quem não lida bem com a pimenta: fique tranquilo que a maioria dos pratos é possível regular o nível dela. 

                   Legenda: O Khaw Ung sticky rice na vasilha de bambu/ Por: Camila Stockler

Com currys e sopas distintas é possível experimentar desde um prato executivo como o Pad Kra Paw, que custa entre R$35,00 e R$40,00, para quem gosta de pimenta. Ou até o Khao Pad Sapparod, entre R$62,00 e R$72,00, que é apresentado em um abacaxi. Há o   Khaw Ung (sticky rice - R$12). Esse acompanhamento vem em uma vasilha de bambu feito no vapor, e por ser feito com arroz do tipo moti, é bem grudento (e muito saboroso) e é ótimo com currys

                             Legenda: O Pad Kra Paw e o Thai Tea com leite / Por: Camila Stockler 

Mas não é só de pratos que sobrevive a culinária tailandesa. Outro carro-chefe é o thai tea (R$13), um chá gelado de coloração laranja e especiarias que faz qualquer um se apaixonar, trazendo até um gosto de infância. Aliás, há duas opções: com leite e sem, ambas igualmente boas e ótimas para o calor. Além disso, a sobremesa mais tradicional é a Khaoeni Mamuang (R$23), um arroz moti adocicado e com extrato natural de folha de pandan, coberto com leite de coco e manga.

E neste ano, o Thai e San abriu outra casa em Pinheiros na Rua Cunha Gago, 399. Ambos os endereços fazem entregas pelo Ifood, Rappi e Vou de Nekô. Além disso, recentemente, o Thai tea entrou para o cardápio do delivery. Para saber mais, confira o vídeo no instagram da AGEMT. 

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Apesar da mudança abrupta do clima de São Paulo, não abalou os cidadãos de visitarem o bairro.
por
Octávio Alves
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11/09/2023 - 12h

No ultimo sábado, dia 26, apesar de todas as condições do clima para deixar a população em casa, com a grande queda de temperatura, não foi o suficiente para atrapalhar o final de semana dos cidadãos da grande São Paulo, um dos locais que não foram afetados foi na Liberdade. Atualmente este bairro é um dos pontos mais marcantes da capital São Paulo que não tiveram o movimento diminuído. Liberdade é um bairro de cultura oriental que não importa o dia da semana ou seu tempo, está sempre movimentada pelos diversos motivos; passeio, culinário, conhecimento cultural e procura de produtos.

 

Movimento na ponte
Movimento na "Ponte da Amizade", frequentemente utilizada pelos camelôs. Liberdade- SP.
(Foto- Octávio Silva)
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Pessoas andando perto de uma banca e um restaurante
Duas pessoas andado juntas entre o mercadinho e a banca de revista. (Foto- Octávio Silva)
Descendo a rua
Descendo uma das ruas comerciais do bairro, Liberdade. (Foto- Octávio Silva)
Homem compras
Homem fazendo compras na Liberdade.( Foto- Octávio Alves)
Pessoas andando em uma rua
Movimento na "saída" da "Ponte da Amizade". (Foto- Octávio Augusto)
Casal andando
Casal passeando na principal área comercial da Liberdade. (Foto- Octávio Silva)
Grande movimento, apesar do frio
Grande movimentação apesar do frio que fazia. (Foto- Octávio Silva)
Cosplays
Cosplayers do jogo chinês, Genshin Impact , posando para a foto. (Foto- Octávio Silva)