Em sua quarta edição, ação reforça a importância da informação e do apoio às famílias
por
João Pedro Lindolfo
Lucca Andreoli
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04/06/2025 - 12h

 

Fotografia: Wellington Freitas  Reprodução/Instagram: @35elementos
Fotografia: Wellington Freitas 
Reprodução/Instagram: @35elementos

A caminhada de conscientização sobre a síndrome Cri Du Chat - ou Síndrome do Choro do Gato, uma alteração genética rara que afeta o desenvolvimento físico e intelectual - aconteceu no sábado (17), no Parque Villa Lobos, em São Paulo.

A doença, presente em uma a cada 50 mil pessoas, ocorre quando uma parte do cromossomo cinco é perdida, o que causa características como a face arredondada, olhos separados, mandíbula pequena, orelhas baixas e um choro agudo parecido com um miado de gato, de onde vem o apelido.

O diagnóstico é realizado através da genética clínica, com testes que avaliam os cromossomos, e o teste de FISH ou CGH-array, que detectam a deleção do cromossomo cinco.

A síndrome impacta diretamente a rotina das famílias, exigindo acompanhamento contínuo com diferentes especialistas. Por isso, a disseminação de informações confiáveis e o estímulo ao diagnóstico precoce são fundamentais para promover mais qualidade de vida às crianças e a quem cuida delas.

A importância do diagnóstico precoce vai além do aspecto clínico: ele abre caminhos para que as famílias se organizem emocionalmente e encontrem apoio em redes especializadas, fortalecendo a jornada de cuidado e inclusão. O conhecimento da síndrome, associado à troca de experiências entre famílias, é um passo decisivo para transformar desafios em conquistas diárias.

Em 2022 foi lançado o primeiro livro a respeito da síndrome no Brasil, intitulado de "Síndrome de Cri du Chat: mais amor, realidade e esperança” (EFeditores e Literare Books International, 264 págs., R$ 72), além de ser o ano da primeira edição da caminhada dedicada a pessoas que convivem com a síndrome.

A publicação veio a partir da vivência de famílias e do engajamento de profissionais que acompanham de perto os desafios do diagnóstico e do tratamento. O livro se tornou referência para quem busca compreender não só os aspectos clínicos da condição, mas também as realidades sociais, emocionais e educacionais enfrentadas por quem convive com ela.

Com entrevistas de profissionais médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e psicólogos, a obra de Sandra Doria Xavier, Fernando da Silva Xavier e Monica Levy Andersen traz também uma perspectiva que auxilia familiares e profissionais que trabalham com portadores da síndrome.

Capa do livro: Síndrome Cri Du Chat: mais amor, realidade e esperança  Instagram: @criduchatbrasil
Capa do livro: Síndrome Cri Du Chat: mais amor, realidade e esperança 
Instagram: @criduchatbrasil

A publicação do livro e a realização da caminhada refletem o compromisso com a visibilidade da condição. Ao longo dos últimos anos, a entidade tem promovido ações que unem acolhimento, informação e mobilização social, contribuindo para a construção de uma rede de apoio mais sólida e atuante.

Em meio a esse esforço coletivo, o aspecto emocional e comunitário da Caminhada se destaca. “Encontrar outras famílias na Caminhada Cri Du Chat é encontrar a sua tribo”, define Juliane Gehm, mãe do Martin. “É um momento onde todos podem ser livres para ser quem são!”

Agora em sua quarta edição, a “Caminhada Cri Du Chat 2025” apresentou uma programação com atividades inclusivas, como áreas sensoriais (massinha, slime, bolha de sabão), desenhos e pinturas, pinturas faciais e tatuagens de adesivo, além de recreação com palhaços e personagens infantis.

Através do ato de conscientização, familiares, profissionais e portadores trouxeram luz ao tema. 

Segundo a neuropsicóloga Bianca Balbueno, a estimulação precoce é a chave: “Nos primeiros anos de vida, o cérebro da criança está num pico de neuroplasticidade, ou seja, a capacidade de aprendizagem é mais potente neste período, sendo assim, a estimulação precoce aproveita essa fase para promover o desenvolvimento de áreas centrais, como motor, cognitivo e social.” 

“Intervenção precoce promove o desenvolvimento redirecionando e fortalecendo trilhas de aprendizagem que podem estar em risco, especialmente em casos de alterações do neurodesenvolvimento”, ela acrescenta. 

Essa também foi a percepção de Lilian Lima, engenheira de software e mãe do Heitor Monteiro Lima, de 7 anos. O diagnóstico veio aos 19 dias de vida e aos 30 dias ele já iniciou a fisioterapia. “Com 2 anos e 9 meses ele andou. Hoje ele corre, chuta bola, arremessa para a cesta, ensaia quicar e treina saques de vôlei”, conta Lilian. Ela lembra que, no início, havia muitos medos — do desconhecido, do futuro e de como seria criar um filho com um prognóstico tão incerto. Mas reforça que o acesso a terapias e os estímulos desde cedo fizeram toda a diferença. “A fisioterapia foi essencial nos primeiros anos de vida, e os estímulos fizeram toda a diferença.”

Ainda sobre o plano de tratamento, Bianca afirma que deve ser individualizado “pois cada criança terá uma necessidade diferente, mesmo tendo o mesmo diagnóstico. Leva-se em consideração não apenas características da síndrome, mas áreas gerais de desenvolvimento, comportamentos desafiadores, excessos e déficits comportamentais, bem como a rede de apoio da família e o suporte fornecido pela escola”.

Participantes exploram atividades sensoriais durante a Caminhada. Fotografia: Wellington Freitas Reprodução/Instagram: @35elementos
Participantes exploram atividades sensoriais durante a Caminhada.
Fotografia: Wellington Freitas
Reprodução/Instagram: @35elementos
Caminhada tem presença de personagens infantis e momentos de interação Imagem: Wellington Freitas  Reprodução/Instagram: @35elementos
Caminhada tem presença de personagens infantis e momentos de interação
Imagem: Wellington Freitas 
Reprodução/Instagram: @35elementos
Espaço de desenho e pintura incentiva a criatividade  Fotografia: Wellington Freitas  Instagram: @35elementos
Espaço de desenho e pintura incentiva a criatividade 
Fotografia: Wellington Freitas 
Instagram: @35elementos
Cabo de guerra e outras dinâmicas de grupo promovem inclusão  Fotografia: Wellington Freitas  Instagram: @35elementos
Cabo de guerra e outras dinâmicas de grupo promovem inclusão 
Fotografia: Wellington Freitas 
Instagram: @35elementos

 

Após dois anos da concessão pública, Pérola Byington tem conflitos na administração da Organização Social Seconci
por
Daniella Ramos
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15/05/2025 - 12h

O Centro de Referência em Saúde da Mulher, do estado de São Paulo, trocou a humanização no atendimento pelo cumprimento de metas a serem batidas. Isso é o que garantem os funcionários que acompanharam a mudança vivida pelo hospital nos últimos três anos.

Em setembro de 2022, o Hospital Pérola Byington mudou de nome e local. Foi da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, na região central, para a Avenida Rio Branco, nos Campos Elíseos, região conhecida como Cracolândia. E passou a se chamar “Hospital da Mulher”.

Após concessão do Estado para a Seconci, o local passou a ser uma Parceria Público-Privada (PPP). A enfermeira Denise Souza, funcionária pública que continua no hospital após a privatização, relata que no Pérola havia um comprometimento com um atendimento mais humanizado aos paciente, mas a atual organização social se preocupa mais com as metas que devem ser batidas pelos funcionários.

“Na primeira vez, achei tudo muito bonito e limpo, apesar das pessoas em situação de rua ao redor do hospital”, afirma Áurea Suda, tia de uma paciente em início de tratamento. Ela reclama da falta de assentos na recepção para aguardar atendimento.

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Fachada do Hospital da Mulher na Avenida Rio Branco. Foto: Daniella Ramos


Hoje, o hospital ainda atende pelo SUS. Após a PPP, funcionários públicos e privados passaram a trabalhar juntos. O número de leitos de UTI quadruplicou e essa melhoria veio junto ao aumento de cirurgias para bater metas, segundo relato de Denise. No Pérola Byington, havia apenas 5 leitos, o que quase causou a morte da paciente Edma Dias, internada para remoção de um nódulo. Ela relata ter ido mais de 3 vezes para o centro cirúrgico: "voltava, pois não conseguia realizar a cirurgia devido à falta de leito de UTI".

Denise ainda diz sentir falta de trabalhar em um hospital de referência como o Pérola Byington. Ela lamenta que o atual Hospital da Mulher ainda não tenha conquistado o destaque devido. “A notoriedade não é feita apenas com equipamentos, temos que contar com uma boa gestão da Organização”, reitera a enfermeira. 

Entramos em contato com a assessoria da Secretaria da Saúde, mas não tivemos retorno até a publicação da matéria.

 

 

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Entenda os danos causados por fake news sobre a alimentação
por
Laura Petroucic
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08/05/2025 - 12h

Com o acesso ilimitado à internet, atualmente é fácil encontrar informações sobre nutrição. Basta um clique para que as pessoas se informem sobre dietas e calorias pelo Instagram, TikTok ou X (antigoTwitter). Mas é preciso tomar muito cuidado com a fonte desses dados. Clickbaits como “arroz dá câncer”, “o açúcar das frutas faz mal” e “emagreça cinco quilos tomando essa sopa” parecem absurdos, porém muitas pessoas acabam tomando essas frases como verdadeiras. A nutricionista Fernanda Zanon, em entrevista à AGEMT, explica: “Informações nutricionais falsas podem levar a deficiências nutricionais, problemas hormonais e queda de imunidade”. E acrescenta: "os danos de misturar desinformação com alimentação não são apenas físicos, mas também psicológicos. A relação com a comida fica deturpada e confusa, podendo até gerar distúrbios alimentares em pessoas que buscavam melhorar sua alimentação", explica Zanon.

Um dos grandes responsáveis pela onda de desinformação nutricional são influenciadores com milhões de seguidores que, mesmo sem nenhuma formação na área, fazem postagens indicando dietas e produtos sem eficácia comprovada. Vitaminas e chás milagrosos são vendidos sem nenhum tipo de fiscalização por parte das big techs — e quem sofre o prejuízo são os consumidores.

E por que as pessoas compartilham esse tipo de desinformação na internet? Fernanda afirma que "algumas dessas pessoas acreditam porque tiveram alguma experiência pessoal que funcionou para elas — e acabam generalizando, como se aquilo fosse uma verdade universal. O que funciona para um pode ser prejudicial para outro. Outras, infelizmente, estão mais interessadas em ganhar visibilidade e engajamento, mesmo sabendo que o que divulgam não tem respaldo científico”, diz. 

Fernanda também comenta sobre o motivo de a população preferir buscar soluções online: “ainda existe uma barreira de acesso, seja por questões financeiras, falta de informação ou até pela ideia de que só se deve procurar um nutricionista quando se quer emagrecer. Isso faz com que muita gente recorra à internet em busca de respostas rápidas e fáceis — o famoso milagre!”. Em um país cuja acessibilidade à saúde ainda é segregada, a conscientização sobre o impacto negativo da desinformação é essencial para criar um ambiente mais seguro e saudável para todos, como aponta Fernanda. 

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Políticas públicas devem assegurar o direto à saúde de quem sofrem com essa condição, ainda pouco estudada
por
Khadijah Calil
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28/04/2025 - 12h

A regulamentação da Lei 32/2025, sancionada em 27 de março em Portugal, representa o reconhecimento dos direitos das pessoas com endometriose. A nova legislação estabelece que quem tiver o diagnóstico da doença têm direito a até três dias de faltas mensais justificadas no trabalho ou na escola, sem prejuízo da remuneração e de outros direitos trabalhistas ou estudantis. Segundo o Diário da República, a norma entra em vigor a partir de abril deste ano e requer a apresentação de um laudo médico mensal para ter sua ausência abonada.  

O contexto social em que essa regulamentação surge é o de enfrentamento a preconceitos relacionados à menstruação e à saúde reprodutiva das pessoas com útero. De acordo com o portal SciElo em um estudo sobre os efeitos da masculinidade tóxica, o machismo estrutural, entendido como um fenômeno social que se manifesta por meio de normas, práticas e instituições, gera estigmas de fragilidade ou incapacidade sobre quem enfrenta esses sintomas. Servindo de exemplo para outros países, a nova medida portuguesa rompe com a lógica de que essas pessoas devem se adaptar ao ambiente de trabalho sem levar em consideração suas condições de saúde.  

A advogada brasileira e especialista trabalhista Ingrid Raunaimer, explica algumas das medidas descritas na nova lei estrangeira: respeitar os afastamentos devidamente justificados por motivos de saúde, incluindo aqueles relacionados ao ciclo menstrual, sem retaliações ou descontos indevidos; garantir o sigilo e respeito à intimidade, evitando constrangimentos; criar políticas internas de acolhimento e orientação para promover um ambiente livre de preconceitos; e adotar uma abordagem inclusiva, considerando medidas como flexibilidade de horários, possibilidade de trabalho remoto ou reposição de aulas/atividades, sempre que possível. 

“Essa regulamentação é, portanto, não apenas um instrumento jurídico, mas também um marco simbólico e político, pois reconhece que dores menstruais incapacitantes não devem ser normalizadas e nem ignoradas em nenhum lugar do mundo”, explica Ingrid. 

Cenário Brasileiro  

O ginecologista Thiago Pareja, membro da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Estado de São Paulo, explica que a endometriose afeta cerca de 10% das pessoas que menstruam e estão em idade reprodutiva no Brasil, o que representa aproximadamente 8 milhões de pacientes. A doença, caracterizada pela presença de tecido endometrial fora do útero, pode causar dor intensa, infertilidade e outros sintomas debilitantes, comprometendo significativamente a qualidade de vida de quem recebe o diagnóstico. 

Kizzy Novicov Silva, ex-agente de turismo e paciente com endometriose, compartilha sua experiência com o SUS e o INSS. Após três processos de afastamento, Kizzy recorreu à ajuda de um advogado para provar sua incapacidade de trabalhar devido à doença. “É desumano ter que provar sua dor para quem nunca a sentiu”, afirmou a paciente, que passou por sete cirurgias sem conseguir alívio para a dor crônica da endometriose. 

Ela também conta que sua rotina e sua saúde era um quebra-cabeça de tratamentos, frustrações e burocracias. As consequências foram além do físico: perdeu empregos por faltas constantes, se afastou da faculdade e viu momentos de lazer serem interrompidos por crises abruptas.  

Ingrid Raunaimer acredita que o Brasil precisa integrar mais os direitos trabalhistas com a política pública de saúde para que casos como os de Kizzy não sejam normalizados. A criação de campanhas de conscientização e a capacitação de profissionais de saúde são necessárias para garantir que os direitos previstos em lei cheguem de fato a quem precisa. 

No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1.069/2023, que propõe incluir a endometriose como manifestação incapacitante no rol de doenças que dispensam o período de carência para a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. Contudo, a concessão desses benefícios ainda dependerá da comprovação médica da incapacidade laboral, conforme os critérios estabelecidos pela Previdência Social. 

Visto que uma das maiores problemáticas desse quadro ginecológico é o diagnostico tardio, as políticas públicas ainda são insuficientes e imaturas.  Segundo a CNN, a média no Brasil é de 8 a 10 anos até a descoberta da doença, o que não só intensifica os sintomas, mas também a progressão da doença. 

Além de ser uma questão de saúde, a endometriose também é uma questão de direitos humanos. A Constituição prevê o direito à saúde, à dignidade da pessoa humana e à igualdade de gênero a todas as pessoas, sem distinção, conforme os artigos 1º, inciso III e 5º, no inciso I, respectivamente. O Brasil precisa assegurar que quem sofre com a endometriose não enfrente preconceitos ou penalizações por sua condição médica, implementando políticas públicas que permitam o acesso adequado à saúde e o cumprimento de seus direitos trabalhistas. 

 

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A profissão de professor é uma das mais afetadas por transtornos mentais. Entenda o que tem impactado a vida dessas pessoas
por
Guilbert Inácio
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19/05/2025 - 12h

Segundo pesquisa Atuação Docente em Múltiplas Escolas no Brasil, divulgada em 2024 pela Fundação Carlos Chagas (FCC), aproximadamente 460 mil professores e professoras da educação básica trabalham em mais de uma escola no país. Os dados acendem um alerta para o cuidado da saúde mental dessas pessoas.

Ao fundo há um quadro com ilustrações de gráficos. No centro da imagem, há uma mulher de óculos segurando papeis com a mão esquerda e com a mão direita no queixo, demonstrando cansaço. Ela está com ambos os cotovelos encostados em uma mesa, que tem um xícara e um notebook em cima.
Falta de tempo é algo recorrente no magistério / Fonte: Freepik

De acordo com o estudo, que usou dados do Censo Escolar 2023, docentes que atuam em jornadas extensas têm maiores chances de se ausentarem do trabalho por causa da saúde, em especial por questões psicológicas e relativas à voz, além de não conseguirem administrar o tempo, gerando estresse e menor participação em atividades coletivas, o que vai impactar diretamente na educação dos e das estudantes. 

Segundo a Pesquisa Saúde Mental dos Educadores, realizada pela Nova Escola, em 2022, 21,5% de educadores e educadoras consideravam sua saúde mental ruim ou muito ruim. As consequências mais citadas foram sentimentos intensos e frequentes de ansiedade (60,1%), baixo rendimento e cansaço excessivo (48,1%) e problemas com sono (41,1%). Para lidar com a pressão, 40,4% relataram que fazer atividade física ou ao ar livre pode ajudar e 36,8% destacam o contato com amigos e familiares que ofereçam apoio emocional. 

Exercícios físicos e contatos sociais requerem uma certa disponibilidade, porém o cenário atual não contribui. Os dados obtidos pela FCC mostram que a creche é o segmento com menor proporção de profissionais em mais de uma escola: 12,7%. Mas o número aumenta nas próximas fases, até chegar em 36,4% no Ensino Médio. 

A hipótese é que nos anos iniciais de ensino, as professoras – em sua maioria – são polivalentes e passam todo o turno com uma turma. Nos anos finais, os e as docentes são especialistas, lecionando, de acordo com sua formação, um ou dois componentes curriculares, portanto não passam todo o turno com uma mesma turma. Para cumprir a carga horária necessária, esse grupo assume várias classes, o que aumenta as chances de uma atuação em mais de uma escola. 

De acordo com o exemplo da nota técnica da FCC, um docente em uma jornada de 40h semanais, com um terço do tempo para as atividades extraclasse, leciona, no máximo, por 26 horas e 40 minutos por semana. Se considerar redes de ensino com aulas de 50 minutos e que o componente curricular só tenha duas aulas por semana, esse profissional pode chegar a lecionar 32 aulas por semana para 16 turmas diferentes.  

Se usarmos uma média de 30 alunos por turma, docentes, na situação do exemplo, dão aulas para 480 estudantes, o que significa uma alta demanda para quem vai ter que explicar a mesma coisa várias vezes, tirar dúvidas, corrigir lições e trabalhos, além de se deslocar entre as turmas e escolas. 

A partir da pesquisa, a FCC traçou o perfil de profissionais nessa situação - docentes do sexo masculino que lecionam disciplinas com menor carga curricular, como biologia, física, filosofia, entre outras. A hipótese levantada pela FCC sobre isso, é que há concentração de docentes masculinos na etapa em que isso mais ocorre, enquanto as mulheres estão mais distribuídas nas etapas de ensino - Censo Escolar 2022: 90% de docentes das creches e da educação infantil são mulheres. Além de que os dados demonstrem menor disponibilidade de tempo por parte das mulheres para acumular mais escolas, em comparação com os homens, tendo em vista que, segundo o IBGE 2024, mulheres dedicam quase o dobro das horas do que os homens, em média, para afazeres domésticos e cuidados familiares.

A ilustração apresenta um fundo cinza com os dizeres a frente: 29,8% de professores atuam em mais de uma escola (143.940 de 482.984) 16,8% de professoras atuam em mais de uma escola (364.364 de 1.871.210)
Recorte por gênero / Fonte: Fundação Carlos Chagas (FCC) / Arte: Guilbert Inácio

Em entrevista à AGEMT, o Dr. Marcelo Afonso Ribeiro, professor do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Serviço de Orientação Profissional (SOPI) e do Laboratório de Estudos do Trabalho e Orientação Profissional (LABOR) da USP, destacou que a saúde mental requer condições dignas de vida, respeito, reconhecimento e autonomia. “A falta de condições de trabalho com sobrecarga de tarefas, uma organização do trabalho centrada na produtividade e uma falta de reconhecimento social e econômico do professor tendem a levar ao adoecimento, não como condição individual, mas como resposta a este conjunto de condições insatisfatórias de trabalho.”, comenta o professor. 

Adoecimento profissional

Segundo Marcelo, os principais dilemas contemporâneos da profissão estão em três campos:

  • Questões pessoais e profissionais: Há falta de limite entre vida pessoal e profissional, insatisfação versus realização e falta de sentido no que faz. 

  • Questões estruturais e organizacionais: Falta de condições dignas de trabalho, ampliação e sobrecarga do trabalho, defasagem entre trabalho prescrito e trabalho real, assédio moral, demanda ao lidar com tecnologia e mundo digital, além de autorresponsabilização por problemas estruturais. 

  • Questões sociais: Falta de reconhecimento, declínio no discurso de autoridade, falta de autonomia, conflito entre o discurso de formador e doutrinador, pressão das famílias dos e das discentes e dos ambientes públicos.

Dados obtidos pela TV Globo, por meio da Lei de Acesso à Informação, revelam que no primeiro semestre de 2023, 20.173 docentes da rede estadual de São Paulo foram afastados do trabalho por questões relacionadas à saúde mental, como depressão, ansiedade e crise do pânico. Os dados demostram um aumento de 15% em comparação ao mesmo período de 2022 e que, em média, 112 profissionais são afastados por dia. Este ano, o G1 obteve, por meio da mesma lei, dados da Secretaria de Estado da Educação (Seduc-SP) que revelam que Campinas (SP) teve 3.421 docentes afastados por transtornos mentais de 2022 para cá. 

Cruzando os dados acima com a pesquisa da FCC, 12,9% da rede municipal de Campinas e 23,5% de docentes da rede estadual de São Paulo trabalham em múltiplas escolas. Segundo o Dr. Odair Furtado, professor de psicologia e coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trabalho e Ação Social (NTAS) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), profissionais da educação básica recebem salários incompatíveis com a sua função social e por isso optam por uma dupla ou tripla jornada desumana para conseguirem sobreviver e isso é catastrófico. 

A questão salarial foi pauta do antigo Plano Nacional de Educação (PNE), 2014-2024, que tinha como meta equiparar, até 2024, a remuneração média de docentes com as demais profissões que requerem Ensino Superior. Contudo, o piso salarial atual (2025) para professores do ensino básico da rede pública é de R$ 4.867,77 para exercício de 40h mínimas; representando 68,6% de R$ 7.094,17; salário médio de uma pessoa com graduação, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Devido à crise econômica, principalmente depois da pandemia, não só educadores, mas todas as profissões passaram por uma precarização. Dentre os fatores, Odair Furtado, aponta a crescente utilização da Inteligência Artificial (IA) nas atividades profissionais que aumentaram a produtividade, mas também a pressão em cima do trabalhador, que acumula estresse e, consequentemente, pode gerar ansiedade e depressão. “Trabalhadores sabem que se buscarem atendimento, são afastados do trabalho e isso leva, inexoravelmente, à demissão. Então, essas pessoas suportam até surtarem”, comenta o professor. 

O Brasil passa por uma epidemia de doenças relacionadas à saúde mental no ambiente profissional. De acordo com o Ministério da Previdência Social, em 2024, cerca de 470 mil trabalhadores foram afastados do emprego por causa de transtornos mentais. Os dados representam, em comparação com 2023, um aumento de 68% de licenças concedidas, além de ser o maior desde 2014. As duas doenças mais diagnosticadas foram ansiedade e depressão.

A ilustração demonstra um gráfico com os dados da Previdência Social sobre afastamentos do trabalho por causa de doenças mentais. O gráfico inicia em 2014 com 221.721 casos. Os dados caem em 2015 e sobem até 2018, quando voltam a cair até 2020. Após isso, os dados sobem muito rápido, chegando em 472.328, em 2024.
Dados do Ministério da Previdência Social / Arte: Guilbert Inácio 

Caminhos futuros 

No dia 26 de maio de 2025, riscos psicossociais serão incluídos na NR-1, norma que apresenta as diretrizes de saúde no ambiente do trabalho. Após a inclusão, o Ministério do Trabalho passa a fiscalizar os riscos psicossociais no processo de gestão de Segurança e Saúde no Trabalho (SST), o que pode acarretar penalizações às empresas, caso sejam identificadas questões como: 

  • Metas excessivas 

  • Jornadas extensas 

  • Ausência de suporte 

  • Assédio moral 

  • Conflitos interpessoais 

  • Falta de autonomia no trabalho 

  • Condições precárias de trabalho 

Quanto à valorização da carreira docente, em junho do ano passado, o novo PNE, 2024-2034, foi encaminhado ao Congresso Nacional. A pasta prevê 18 objetivos a serem cumpridos nos próximos dez anos. O Plano será prioridade da Bancada da Educação em 2025. 

Confira outras propostas defendidas pela Bancada ao longo do ano que dizem respeito à profissão:

Ilustração em formato de pergaminho na cor cinza. Há os dizeres: SNE - Sistema Nacional de Educação;  PEC 169/19- permite ao professor acumular cargos públicos,  PL 3628/2024 - visa garantir que as diretrizes já estabelecidas pela Lei nº 14.817 sejam implementadas em todo o país;  PL 2387/23 - inclui os professores de Educação Infantil como profissionais do magistério;  PL 3824/23 - estabelece a Política Nacional de Indução à Docência na Educação Básica
Projetos em tramitação / Arte: Guilbert Inácio ​​​​​​

Em janeiro de 2025, o Governo Federal lançou o programa Mais Professores, com o objetivo de incentivar estudantes a seguirem a carreira docente. Dentre as medidas está o Pé-de-Meia Licenciaturas que concedera uma bolsa mensal de R$1.050 por mês para quem tirar mais de 650 pontos no ENEM e ingressar na licenciatura via Sisu, Prouni ou Fies Social. 

A medida é um ponto importante para aumentar a atratividade da carreira, pois, em 2022, uma pesquisa do Instituto Semesp projetou que, em 2040, o Brasil enfrentará um “apagão” na educação básica - a projeção é de que faltarão 235 mil docentes nas escolas do país. 

Segundo Marcelo Afonso, para mudar o cenário de precarização da carreira docente, as políticas públicas precisam se centrar em: “valorizar mais o professor e a professora, oferecer melhores condições de trabalho, remunerar melhor, oferecer qualificação contínua e, acima de tudo, construir um ambiente de respeito para formação de seres humanos.”.

O isolamento social se mostrou prejudicial para a saúde mental das pessoas, os números de casos de depressão e ansiedade deverá aumentar durante esse período. As redes sociais trás várias campanhas durante esse mês para ressaltar o combate ao suicídio.
por
Beatriz Comoli Marques
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11/09/2020 - 12h

10 de setembro é marcado pelo dia mundial da prevenção ao suicídio. O mês traz várias campanhas de conscientização relacionadas a valorização da vida. Esse ano o setembro amarelo, como é conhecido, ganhou um caráter mais importante, visto que a população está enfrentando um isolamento social, o que a deixa mais suscetível a crises de ansiedades ou depressão. Diante desse cenário, a campanha ganhou mais força e relevância. 

O setembro amarelo é uma iniciativa do centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria. A cor amarela foi escolhida, após um jovem americano de 17 anos, tirar a própria vida em seu carro, um Mustang amarelo. Segundo a organização mundial da saúde (OMS) 800 mil pessoas por ano cometem suicídio.  

“No Brasil, cerca de 12 mil suicídios acontecem por ano, um número muito alto. A maioria dessa taxa está relacionada a transtornos mentais, depressão, bipolaridade, ansiedade. Durante a pandemia esses transtornos ficaram mais evidentes, já que estamos isolados, e acabaram surgindo vários problemas como perda de dinheiro, e de familiares. Nesse contexto, o suicídio se tornou muito mais prevalente”, relata Jessica Barbosa Lima, psiquiatra.  

A especialista ainda ressalta como é importante falar sobre esse assunto, ainda mais agora durante a pandemia do coronavírus. Apesar de ser um assunto de grande importância, ainda se tem um certo tabu. A psiquiatra afirma que “existe um preconceito muito grande quando se fala de suicídio e transtornos mentais, as pessoas têm medo de falar sobre e dar ideia para a pessoa. Falar de suicídio é falar sobre vida”. 

 

Triste mulher sentada no chão sozinho na sala vazia, desespero e conceito  solitário com espaço de cópia | Foto Premium

Crédito: freepik 

Ao ser questionada sobre como identificar alguém com sintomas de depressão, a psicóloga Juliana Ribeiro explica que "o diagnóstico deve ser realizado por um médico psiquiatra. A depressão pode ser causada pela genética, alterações bioquímicas e eventos vitais/estressantes, e é necessário que a pessoa tenha mais de um sintoma, e que esses sintomas estejam presentes por um determinado tempo.” 

É importante prestarmos atenção a alguns sinais de alerta como: 

- Sentimento de tristeza e vazio constantes; 

- Sentimento de inutilidade ou desamparo; 

- Dificuldades para ficar quieto, em concentração ou para tomar decisões; 

- Falta de energia e fadiga excessivos; 

- Alterações de apetite, mudanças no peso; 

- Perda do interesse pela vida, interesse sexual, prazer, hobbies ou outras atividades; 

- Pensamentos suicidas ou tentativa de suicídio; 

- Dificuldades para dormir ou sono em excesso. 

A doutora explica que o primeiro passo para ajudar alguém com depressão “é confirmar o diagnóstico com um profissional e começar a psicoterapia com um psicólogo. Um familiar ou amigo pode auxiliar dando suporte e acolhendo essa pessoa. Estar disponível, compreender e apoiar é sempre o melhor que alguém pode fazer.” 

Em meio à pandemia e ao isolamento social, vários especialistas estão disponibilizando atendimento online, até mesmo por aplicativos de mensagem. O centro de valorização da vida (CVV) oferece serviço de acolhimento 24 horas por dia, basta ligar para o número 188 caso esteja se sentindo sozinho e precisando de ajuda.  

 

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Um retrato de como esse vírus pode ter sofrido mutação será fundamental para pesquisas futuras
por
Ana Beatriz de Souza, Guilherme do Nascimento Tedesco Sanches, Giuliano Guimarães Formoso, Henrique Soto Lopes, Liana Ruiz
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02/07/2020 - 12h

 

Pesquisadoras da Universidade Federal de Santa Catarina divulgaram, na tarde desta quinta-feira, os resultados de uma pesquisa que identificou partículas do coronavírus, Sars-CoV-2, em duas amostras do esgoto de Florianópolis. Em entrevista coletiva, acompanhada de São Paulo pela Agemt, as professoras  Gislaine Fongaro (Laboratório de Virologia Aplicada – LVA/UFSC), Patrícia Hermes Stoco (Laboratório de Protozoologia/UFSC), e Maria Elisa Magri (Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental), autoras da pesquisa  "SARS-CoV-2 in human sewage in Santa Catarina, Brazil, November 2019" relataram a presença do vírus no material avaliado.

Por meio da análise do esgoto retroativo, isto é, congelado, o estudo concluiu que partículas do vírus já circulavam no país em 27 de novembro de 2019, dois meses antes do primeiro caso clínico ser apresentado no Brasil.

A hipótese para a chegada do vírus, segundo as pesquisadoras, é de que anteriormente já existiam casos no mundo que ainda não haviam sido identificados. “O vírus circulava antes mesmo de termos ciência de sua rotina em pacientes”, explicou Gislaine Fongaro.

Daiane Mayer/Estagiária de Fotografia da Agecom/UFSC
Foto: Daiane Mayer/Estagiária de Fotografia da Agecom/UFSC

Esse é o primeiro estudo realizado nas Américas em relação à pesquisa do esgoto retrospectivo. Estudos feitos anteriormente em Wuhan (China) e em Murcia (Espanha) comprovaram que o vírus já era encontrado no esgoto antes de haver casos confirmados de pessoas infectadas.

Segundo a pesquisadora Maria Elisa Magri, a prática de coleta de esgoto e análise é algo comum e corriqueiro nos estudos, “a gente faz muitas pesquisas com esgoto sanitário, na universidade inteira. Inclusive no nosso próprio departamento e no de engenharia química”. Ela ainda complementa que isso pode impactar na descoberta de uma presença de outras doenças antes mesmo do primeiro caso oficial nessas redes de esgoto.

Os resultados possibilitam a tentativa de sequenciar o genoma completo das partículas. As amostras chegam ao laboratório e, como o vírus está diluído em uma matriz ambiental que contém água e sedimentos, são concentradas para que as partículas virais sejam identificadas mais facilmente. Estas seguem para a extração do material genético e posteriormente faz-se o estudo para encontrar o genoma do vírus. “Com o sequenciamento, há a tendência de se fazer comparações com resultados anteriores para tentar encontrar a origem do vírus”, completa Gislaine.


Questionadas sobre a possibilidade de essas partículas virais contaminarem pessoas que possuem maior contato com esgoto a céu aberto e sem tratamento, Gislaine explicou que o vírus é envelopado e, portanto, mais sensível e suscetível à degradabilidade, por ser revestido por uma camada de gordura. Contudo, a pesquisadora ressalta que os teste realizados não conseguem indicar o grau de infecção do vírus, mas que “em termos gerais os vírus envelopados não têm longas durabilidades em esgoto sanitário”. 

Daiane Mayer/Estagiária de Fotografia da Agecom/UFSC
Foto: Daiane Mayer/Estagiária de Fotografia da Agecom/UFSC

Gislaine ressalta que a pesquisa é importante para entender possíveis alterações no vírus. “É importante conseguir esse estudo filogenético, que é um retrato de como esse vírus pode ter sofrido mutação. O quanto eles se assemelham e se diferem. E isso vai abrir portas para outros estudos também.

Aureo Moraes, chefe de gabinete da Reitoria da UFSC, elogiou o trabalho das pesquisadoras: “Parabéns, em nome do Reitor Ubaldo Balthazar, e de toda a Universidade, ao trabalho de tantos e tão dedicados profissionais, docentes, pesquisadores e pesquisadoras. Uma resposta inequívoca do quanto as Instituições Públicas têm se dedicado nas ações de combate à pandemia. A UFSC não está parada!!”

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Casos ficaram mais graves e especialistas apontam dificuldades para consultas presenciais e crise econômica como fatores a serem observados
por
Rafaela Reis Serra
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26/06/2020 - 12h

São Paulo  Os casos de doenças mentais pioraram neste período de isolamento segundo uma pesquisa feita pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Pessoas que antes da pandemia não apresentavam quadros psiquiátricos ou que já haviam recebido alta, foram em busca de ajuda médica especializada.

“Os pacientes ficaram mais graves, principalmente os que estavam começando a fazer tratamento. Pessoas que não tinham sintomas passaram a apresentá-los, porém não é a maioria.”, conta a psiquiatra Alice Baltar, 40.

Há o problema da contenção de gastos: as pessoas não estão indo às consultas e quando procuram ajuda, elas estão no extremo. “O aumento de novos casos não foi significativo, a ida aos médicos em geral diminuiu”, relata.

Psiquiatra Alice Baltar
A psiquiatra Alice Baltar faz consultas de sua casa


“Às pessoas com a vida social mais restrita, só o isolamento não é o problema. Já as mais ativas estão sofrendo de insônia. A maioria dos casos mais alarmantes são das pessoas que apresentam Transtorno do Pânico ou depressão e com outros problemas concomitantes.” A psiquiatra chega a atender um mesmo paciente mais de uma vez ao dia.

Baltar se sente sobrecarregada. Ela tem uma responsabilidade maior por conta dos casos e, além disso, agregou-se os serviços domésticos.

A psiquiatra também atende voluntariamente profissionais da saúde que estão atendendo a Covid-19. Alguns deles não apresentavam sintomas antes da pandemia e agora passaram a manifestar.

Psicóloga há vinte anos, a Dra. Maria Marta Silva, 51, auxilia seus pacientes para que possam encarar os limites que a pandemia lhes causou. A maioria deles estão em processo terapêutico há mais de doze meses e seus desempenhos têm sido satisfatórios. “Acredito que eles estão acostumados a olhar para si e ressignificar pensamentos e crenças desviantes.”

Para ela, por um lado não está sendo fácil, porque gosta da liberdade e do contato social. Em contrapartida, a psicóloga afirma estar muito bem e não deveria queixar-se: “p
ode parecer estranho, até porque temos o hábito de reclamar e pensar somente em coisas negativas e nunca no positivo. Seria injusta com o universo.”

Somente uma nova paciente precisou de ajuda psiquiátrica e outro voltou a ser medicado. “Todos somos humanos e carentes de sociedade. Está tudo bem!”, declara.

Segundo Silva, sua agenda sempre esteve cheia para a proposta de seu trabalho. Apenas quatro pacientes desistiram neste período e outros vieram a somar. Alguns optaram aguardar por uma possível desistência.


Embora não esteja atuando na linha de frente dos diversos trabalhos essenciais, ela auxilia os pacientes transmitindo leveza, técnicas de relaxamento e mostrando um pouco da realidade. Por tratar cinquenta pessoas por semana – desde médicos de grandes hospitais a motoristas de ônibus - ela precisa encontrar-se bem, para o ciclo continuar a funcionar, como também mantém um trabalho filantrópico todos os domingos de cunho religioso com os jovens.

Psicóloga Dra. Maria Marta Silva
A Dra. Maria Marta Silva na International Conference on Adolescent Medicine & Chile Psychology (Omics) - Acervo Pessoal


Para a estudante de psicologia do 7º semestre da PUC, Natália Gonçalves, 20, o momento atual a deixa apreensiva, pois não há perspectiva do futuro. “Eu tenho um pouco de esperança de que a psicologia clínica seja mais valorizada depois da pandemia, porque é um momento em que as pessoas estão percebendo que saúde mental é muito importante em todos os aspectos da vida.”

Ela espera que seus futuros colegas de profissão tenham percebido o quão urgente é o debate da elitização da psicoterapia. “Durante essa pandemia, surgiram muitas iniciativas de atendimento online gratuito, que deveriam existir há tempos, e se fez presente o debate sobre essa necessidade na área em que pretendo atuar: psicologia social.”

A respeito de dicas para este momento em que a população se encontra, Baltar aplica as recomendações da OMS para guerras e epidemias e incentiva as pessoas a fazerem uma rotina, atividades físicas, ter alimentação saudável e um sistema de Buddy – amigo para conversar. De acordo com Silva, as pessoas devem respeitar seus próprios limites, pensar nos próprios sonhos e fazer planejamentos realistas para esta fase.
“Acredito que algumas pessoas precisem estar mais próximas de si. Por isso temos a quarentena, um período para desacelerar.

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Em meio à pandemia Covid-19, pessoas se mobilizam para ajudar portadores de depressão através da tecnologia
por
Lincoln Oliveira de Castro
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25/06/2020 - 12h

No momento em que todos os holofotes estão virados para o coronavírus, outra doença, altamente letal é deixada de lado. Pelos números da Organização Mundial da Saúde, 300 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de um mal silencioso que pode levar à morte: a depressão.

             Normalmente, quando alguém fala que está em depressão, muitos acabam não levando a sério e tratam apenas como um momento de tristeza. Aí que as pessoas se enganam. Segundo a psicóloga Mariana Caciaccaro, Presidente da Associação de ex-alunos e famílias de terapia da PUC-SP, o humor deprimido é diferente de depressão, que é multifatorial.

            Silenciosa e traiçoeira, a doença possui três desencadeadores. O biológico, que é passado dos pais para os filhos, o sociológico, que vai desde a mudança brusca das condições financeiras até o bullying e o psicológico, que envolve traumas, ansiedade crônica, estresse crônico e outros distúrbios. No Brasil, já é considerada o “mal do século”, alcançando mais de 5,8% da população, taxa considerada acima da global(4,4%).

Visto que neste transtorno as pessoas se sentem solitárias e podem até cometer suicídio, é necessária uma atenção especial. É o que dizem os terapeutas. Para Valéria Meirelles, terapeuta formada em psicologia na PUC-SP: “É necessário ter muito cuidado, entender a história deles. O depressivo é atendido de duas a três vezes por semana, sempre acompanhado de um psiquiatra. O meu trabalho como terapeuta é mostrar à pessoa que ela ainda pode ser útil.”.

Além do trabalho terapêutico, existem plataformas online que também dão suporte às pessoas com estes problemas e atendem 24 horas por dia. É o caso do Centro de Valorização da Vida e o entre laços.

Com a chegada do novo coronavírus, a depressão passa por uma nova etapa. Não há mais aquele abraço, aquele beijo. Enquanto ficar em casa protege da pandemia, alerta para o aumento dos casos de depressão e, consequentemente, de suicídio. Neste intuito, a tecnologia vem se mostrando essencial na adoção de novas medidas.

Recentemente, André Fernandes, um pastor e influenciador digital, lançou um aplicativo para dar suporte online contra a depressão em tempos de COVID-19. O aplicativo que tem como objetivo atuar no combate à depressão, ansiedade e suicídio (segundo maior causador de mortes entre jovens entre 15 e 29 anos em todo mundo), dá suporte 24 horas por dia, sete dias por semana. Em entrevista ao portal UOL, o pastor disse o seguinte: “Em um momento em que todos se voltaram para o número de mortes causadas pela pandemia do COVID-19, não podemos esquecer que, comprovadamente, o suicídio causa mais mortes no mundo do que as guerras e epidemias. Além disso, precisamos pensar no consequente abalo emocional que situações como a que estamos vivendo nesses tempos [AQ1] podem gerar para a sociedade como um todo.”.

Seguindo a mesma linha do pastor e influenciador digital, outros também vêm demonstrando solidariedade e ajudando pessoas. No caso de Tomás Levy, estudante e atleta de remo do Sport Club Corinthians Paulista, a ideia foi criar um canal no instagram para contar um pouco de como lida com o preconceito por ser portador da síndrome de tourrete, doença que carrega desde os quatro anos: “Sempre tive muita vontade de gravar os vídeos, mas sempre tive muita vergonha. É muito vergonhoso sentir este preconceito, porém temos uma chave para desconstruí-lo e a minha foi essa, contando a minha história e ajudando as pessoas.”.

Para a psicóloga Valeria Meirelles, qualquer medida preventiva contra a depressão é valida: “Todas as medidas preventivas contra a depressão são importantes. Todo canal que dá voz a uma angústia é importante.”.

No entanto ela ressalta para os perigos das redes sociais:

“As redes sociais, por darem voz a essa angústia são muito boas, mas, ao mesmo tempo são muito ruins. Tem que ser muito criterioso com o que você lê e bloquear as pessoas que não te agradam.”.

            Ainda que existam pessoas se movimentando em prol de outras que necessitam, “fazendo o bem sem ver a quem”, falta muito para que a discussão sobre a depressão e o suicídio chegue ao nível ideal. É a opinião da psicóloga Mariana Cacciacaro: “Na faculdade de psicologia tem sido feito muito com relação a isso. Em Setembro, a PUC fez algumas discussões na semana do Setembro Amarelo, no entanto, neste período de pandemia, vemos que este assunto está chegando muito mais nos profissionais da área do que nos pacientes.”.

            Ela ressalta que para que a discussão chegue ao ideal, é indispensável um aumento da consciência pública: “Assim como a discussão do uso da camisinha, a depressão precisa ter um aumento de consciência pública. Isso precisa ser levado para pessoas de menor renda em maior número, e de uma maneira que todos entendam como funciona.”.

            A depressão não é brincadeira, quando uma pessoa fala que está com a doença, por mais que depois de dito não seja diagnosticado, ela merece toda a atenção e ajuda. Quando atinge o ponto extremo, leva as pessoas a se suicidarem. Por ano, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde(OPAS) e a Organização Mundial de Saúde(OMS), mais de 800 mil pessoas tiram as suas vidas, ou seja, essa discussão precisa de mais debates, mais consciência pública e, principalmente, ser levada a sério.  


 

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Em meio à pandemia do coronavírus, estudantes relatam crises diárias e ansiedade; psicólogos destacam um grande desafio
por
Raphael Dafferner Teixeira
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23/06/2020 - 12h

Desde a declaração da quarentena por parte do governador de São Paulo, João Dória (PSDB), no dia 22 de março, as aulas presenciais foram paralisadas. Assim, em aulas EAD, os estudantes têm enfrentado diferentes dificuldades.

Foto João Fernando Cruz Fernandes

O estudante João Fernando Cruz Fernandes, 18, relatou que, o mês de abril, foi o pior de todos: “Nessa época, eu tive ao menos uma crise por dia”. O morador do bairro Parque Continental, zona oeste de São Paulo, acha que o vestibular que fará no final do ano tem sido um dos maiores responsáveis, além de não poder ver seus amigos, não sair de casa e ir à academia, atividades que faz com frequência. 

Fernandes considerou que este seu temor de não passar no vestibular, além da própria pressão que já está envolvida no processo, tem uma grande relação com seu relacionamento familiar: “Meu pai me bota muita pressão”.

Aliviado, se considera melhor psicologicamente em comparação com abril e maio. Sua última grande crise foi quando comemorava seu aniversário, dois dias antes da data na verdade, no dia 24 de maio, quando seus pais, irmãs e sua namorada fizeram uma “mini festa surpresa” para ele. Porém, Fernandes confessou que não conseguia sentir felicidade: “Eu não conseguia parar de chorar”.

Contudo, os já matriculados na universidade têm dificuldades completamente diferentes. Para Fernanda Malagrino Galvão, 18, estudante de psicologia na PUC-SP, os estudos não são um peso. Muito pelo contrário, têm ajudado muito: “Estou adorando estudar. Amo fazer os trabalhos”, afirmou entusiasmada. Porém reconhece seu privilégio de já estar em uma faculdade: “Se eu fosse prestar vestibular no fim do ano, eu não aguentaria”.

A estudante ainda considera que estudar psicologia em um momento em que a saúde mental é uma questão, tem a ajudado a levar melhor esse problema: “O que a gente está aprendendo tem tudo a ver com o que está acontecendo agora”.

Foto Fernanda Malagrino Galvão

Galvão está desde o dia 2 de abril na casa de sua família em São Sebastião, litoral Norte de São Paulo. A estudante da PUC se considera bem psicologicamente “minha saúde mental continua a mesma de antes da pandemia”, disse. A jovem está dividindo a casa com mais nove pessoas, atualmente, algo que a ajudou muito: “Estar com muitas pessoas ajuda muito, na verdade. Quando eu estava em São Paulo, eu sentia que a casa estava sempre vazia, eu me sentia mais sozinha”, e ainda completou: “Interagir com mais pessoas diminui um pouco esta angústia”.

Durante o mês de março, quando ainda estava em seu apartamento no Alto de Pinheiros, zona oeste de São Paulo, Galvão dizia se sentir muito angustiada. “Caminhava para um ‘cenário ruim’”, confessou.

Quando estava em São Paulo, a universitária disse que as notícias a afligiam “eu chorei lendo algumas”, desabafou.

Para a psicóloga que já trabalha há oito anos na Escola Vera Cruz, Maria Teresa Oliveira Lima, 57, os adolescentes, mais do que nunca, enfrentam um desafio enorme: “Já são mais de 80 dias! E 80 dias sem ver os amigos, ir à escola, sentir o vento no rosto, para os adolescentes, é muito tempo!”, disse. Porém, Oliveira ressalta a diferença entre cada um, dizendo que alguns respondem melhor que outros: “É um problema global, mas cada comunidade, cada pessoa é afetada pela pandemia de uma forma”.

Além disso, Oliveira ressaltou que os jovens são afetados de maneira diferente que os adultos, o que acaba tendo um impacto psicológico muito grande: “Justamente no momento em que estão ‘ganhando a cidade’ perdem o direito a Ela”.

Apesar das dificuldades, a psicóloga formada pela PUC-SP avalia que não teve um número maior de conversas com os alunos agora do que presencialmente, mas “com certeza elas incluíram temas novos”, e reiterou ainda a importância de os jovens terem alguém para desabafar com durante um momento como esse.

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