Ao final de 2019 o mundo presenciou algo jamais visto por muitos, o início de uma pandemia. O novo coronavírus é uma doença infecciosa que pode ser transmitida por meio de gotículas de saliva, do aperto de mãos contaminadas, espirro, tosse e tem como sintomas: perdas de olfato e paladar, falta de ar, tosse, dor de garganta, coriza, febre, cansaço, entre outros. Mas, o que realmente preocupa são os assintomáticos que espalham esta enfermidade sem sequer saberem que estão doentes, colocando as pessoas do grupo de risco, como idosos e pessoas com pressão alta, em piores condições. Os jovens, menor grupo de afetados pela doença, acreditam que podem ignorar o isolamento social, que funciona como método preventivo e que é adotado por muitos países até hoje.
Em entrevista, Ana Silva, 18 anos, estudante de direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie, conta à Agência de Jornalismo Online Maurício Tragtenberg sobre sua vida na pandemia, que inclui encontros familiares e com amigos. A jovem diz que desde o começo era contra o isolamento e que nunca parou de frequentar lugares como farmácias, cartório, supermercado, academia, praia, restaurantes (quando abertos) e que se a faculdade estivesse aberta, também iria. Em seu relato, ainda narra que em sua família houve encontro familiar para a comemoração do Natal, que contou com a presença de 15 ou 20 pessoas e que os integrantes não utilizavam máscaras, medida utilizada para prevenção do covid-19, especialmente com a presença de idosos.
A necessidade de ver pessoas é um ponto que Ana ressalta em sua fala, ela se reúne com seus amigos frequentemente, em torno de 5 a 15 pessoas aos fins de semana, na maioria das vezes. A jovem diz que os encontros com pessoas de sua faixa etária estimulam as habilidades de convivência, indica que é reconfortante tê-los ao seu lado fisicamente e não somente através de uma tela de celular. Psicólogo formado há 16 anos pela Uniban, Sidney de Rosa Júnior, em entrevista à agência, explica essa necessidade de convivência: “Tem a questão dos interesses similares, assim como a identificação com um grupo. Um jovem de 18 ou 19 anos tem a maturidade e os interesses completamente diferentes de um adulto de 30 anos, a conversa é outra, a diversão é outra.”

Mesmo tendo contato com várias pessoas sem tomar as devidas medidas de prevenção contra a doença, a menina não a contraiu. Em razão deste exemplo e de muitas outras situações semelhantes que os jovens de hoje em dia possuem essa ilusão de indestrutibilidade, por terem pouca idade, acreditam que são indestrutíveis. Questionado sobre isso, Sidney elucida sobre essa “Síndrome de super-heróis”: “Quando somos crianças, não conseguimos associar a ideia por trás da morte. Quando entramos na adolescência, temos consciência do que ela é, porém é uma ideia muito distante. Isso, combinado com a liberação de hormônios (que não podem ser ignorados também) nos jovens gera a sensação de imortalidade”.
Em entrevista à BBC News, o médico Matheus Alves de Lima, em um plantão recente de casos de covid-19 em UTI de hospitais de campanha no Distrito Federal, afirma que houve uma mudança no perfil dos pacientes. "Tivemos a morte de um paciente de apenas 25 anos, o que é muito chocante", explica à BBC News Brasil. Alves ainda relata outros casos como o de um paciente de 28 anos que não resistiu à extubação (processo de retirada da ventilação mecânica), precisou ser entubado novamente e fazer hemodiálise.

Em entrevista coletiva no dia 1° de março de 2021, o Secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, afirma que "a pandemia retornou com uma velocidade e uma característica clínica diferentes daquela da primeira onda". E continua, "São pacientes mais jovens, que têm a sua condição clínica muito mais comprometida e, pior, são pacientes que acabam permanecendo um período mais prolongado nas UTIs. Na primeira onda, tínhamos (nas UTIs paulistas) percentual de mais de 80% de idosos e portadores de doenças crônicas. O que temos visto hoje são pacientes mais jovens, 60% deles de 30 a 50 anos, muitos dos quais sem qualquer doença prévia."
Muitas das pessoas contaminadas hoje utilizam desculpas como não estarem no grupo de risco, ou até mesmo por já terem contraído o vírus para se aglomerarem e não seguirem as normas de prevenção contra o covid. A maioria da população mundial já tomou alguma atitude considerada inconsequente, porém há um limite que está sendo seriamente ultrapassado, visto que são completamente diferentes a ida a um restaurante e a uma festa, por exemplo.
A conscientização dos jovens quanto aos riscos da doença e a adoção das medidas sanitárias recomendadas pelos médicos são fundamentais para o controle da pandemia no Brasil, porém não é o que ocorre, uma vez que o percentual de pessoas que morrem sem atingirem os 60 anos de idade saltou 35% em relação ao ano passado, segundo dados fornecidos pela UOL com base nos números do portal da transparência da Arpen (Associação dos Registradores de Pessoas Naturais).
(O nome da jovem entrevistada foi alterado para a preservação de sua identidade).
Diante de países como o Japão, Cingapura - cuja média de expectativa de vida é 83 anos -, Espanha - 82 anos - e Coreia do Sul - primeiro país a caminhar para uma expectativa de vida de 90 anos -, o Brasil não está muito distante em questão de longevidade, com sua expectativa geral em 75,8 anos esta supera a média mundial que é de 71 anos. De acordo com dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), em 2016, a média da expectativa de vida da população mundial era de 74 anos para mulheres e de 69 anos para homens.
No Brasil tem mais de 28 milhões de pessoas nessa faixa etária, número que representa 13% da população do país. E esse percentual tende a dobrar nas próximas décadas, segundo a Projeção da População, divulgada em 2018 pelo IBGE.
A relação entre a porcentagem de idosos e de jovens é chamada de “índice de envelhecimento”, que aumentou de 43,19%, em 2018, para 173,47%, em 2060. Esse processo pode ser observado graficamente pelas mudanças no formato da pirâmide etária ao longo dos anos, que segue a tendência mundial de estreitamento da base (menos crianças e jovens) e alargamento do corpo (adultos) e topo (idosos).
A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada pelo IBGE em 2013, mostrou que a cada quatro pessoas com 60 anos ou mais, pelo menos uma relatava participar de atividades sociais organizadas. Entre as mulheres, o percentual era maior, chegando a quase 30%. Mas a participação dos homens também foi significativa, ficando bem pouco abaixo dos 20%. Este estudo nos permite ter um olhar sensível sobre a qualidade de vida desta população e mostra como a tendência dos idosos, com o avanço das cidades , é se isolar socialmente.
De acordo com a psicóloga Graça Câmara, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, esse movimento acontece por causa das limitações que vão sendo impostas, pelo próprio corpo e pela sociedade. “Os jovens perdem a paciência com os mais velhos e, muitas vezes, as famílias os colocam no lugar de ‘os improdutivos da casa’”, disse para a revista Leve. Contudo este também é um dos motivos que traz profunda angústia aos que estão envelhecendo, se tornar dependente de alguém ou “incapaz” de realizar certas funções que antes lhe vinham naturalmente.
Nessa constante busca por compreensão, sem perder o respeito e validação da sociedade, nossos futuros antepassados já nos avisam quanto nossa futura realidade: se aqui, enquanto somos jovens, não mudarmos certas posturas e visões “viciadas” de nossa sociedade, iremos nos deparar com nosso inerente destino e ainda sem apoio. Simone de Beauvoir disse em sua obra “A Velhice”, nos anos 70, que “Não reconhecemos a velhice em nós, nem sequer paramos para observá-la, somente a vemos nos outros, mesmo que estes possuam a mesma idade que nós”.
Entrevista com Sandra Regina Gomes
Sandra é a atual coordenadora de políticas para o idoso, dentro da secretaria de direitos humanos da prefeitura da cidade de São Paulo. Nascida em Santos a especialista tem um longo currículo na área, foi responsável pela implementação de políticas públicas para o idoso na cidade de São Paulo e já ocupou os cargos de assessora técnica da Secretaria de Relações Institucionais do Governo do Estado de São Paulo, coordenadora da Rede de Proteção Social para Idosos na Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social da Prefeitura de São Paulo e docente na Universidade da Terceira Idade. A fonoaudióloga e gerontóloga, que também se especializou em políticas públicas, ajudou diretamente a implantar o Centro de Referência da Cidadania do Idoso, as unidades Boracea e Casa de Simeão do Abrigo para Idoso em Situação de Rua, o Serviço de Apoio-Socioalimentar para Idoso e os Núcleos de Convivência para Idosos.
Envelhecimento é um fenômeno global?
Sim, o mundo todo envelhece. Só que os países que se preparam para isso, no caso da Europa, do Canadá que por mais de cem anos se preparam para o processo de envelhecimento; o Brasil não. No Brasil, como diz uma professora querida, Maria Cecília Minai da Fiocruz, estamos trocando o pneu com o carro andando e isso é muito sério porque até onde éramos um país de jovens e hoje estamos com um país envelhecido e um envelhecimento muito rápido. Então é um um fenômeno global sem dúvida nenhuma, o mundo está envelhecendo rapidamente e nós precisamos ter ações e políticas públicas para isso.
O que é Envelhecimento ativo? Como abordar o tema ao longo da vida e não apenas na fase do envelhecimento?
Primeiro envelhecimento ativo é um processo de otimização de oportunidades para a saúde e aprendizagem ao longo da vida, que está relacionado a educação, a participação e segurança para garantir uma melhor qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. Isso tudo aqui é uma determinação da OMS baseada no pressuposto de que o mundo precisa olhar o envelhecimento sob a ótica, promovendo resiliência ao longo do curso de vida. O que quer dizer isso? Em tese você tem processo de envelhecimento e que bom porque a maior conquista do século XX é a longevidade, uau estamos envelhecendo, hoje no Brasil a expectativa de vida é de 75 anos, e já já vamos chegar ao Japão é de 81 anos. Para o século XXI a longevidade é um desafio, nós temos que saber como envelhecer. Então em 2002 a OMS lança esse programa de envelhecimento ativo, que o Brasil é signatário. Isto tem a ver como abordar o tema ao longo da vida, temos que pensar o envelhecimento ao longo da vida porque é uma fase como a infância, a adolescência e fase adulta depois criamos independência e depois temos o processo de velhice. Ainda bem que chegamos ao processo de envelhecimento se não você morre antes dos 60 anos e no Brasil você é considerado idoso com essa idade, em país desenvolvidos é 65 anos ou mais. Então é importante que se faça um trabalho desde de a infância, de orientação alimentar, de estilos de vidas, de aproximação de gerações e tudo isso está no Estatuto do Idoso. Não é possível falar sobre envelhecimento no Brasil sem citar o Estatuto do idoso.
Qual é o papel do Estado frente ao envelhecimento ativo? Existe o direito ao envelhecimento? O que determina um processo de envelhecimento seja de qualidade e englobe o conceito de envelhecimento ativo?
Tudo isso é importante que a gente entenda que não se consegue um envelhecimento saudável se você não garantir esses quatro pilares: saúde, educação, proteção e participação. Esses princípios são fundamentais porque se você tem saúde, tem a garantir de que tem as doenças todas controladas. Hoje você não morre mais de hipertensão, a não ser que você não tenha o controle dessa doença. Hipertensão, colesterol e demais doenças têm medicações e tratamentos próprios. Acompanhamento médico, atividade física, alimentação saudável, dependência química e uso de drogas, inclusive as lícitas como bebida e cigarro, tem relação com a qualidade de vida além da participação social.
Estamos em plena pandemia, onde o isolamento é palavra de ordem, principalmente para a população idosa, que tem maior risco em relação ao COVID-19. Em que pé estamos? Temos que manter esse cérebro ativo, fazer com que as pessoas superem essas dificuldades da inclusão social e digital. Uma coisa está ligada a outra, por isso, atuo como coordenadora de políticas para a pessoa idosa dentro da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania pensando nessas relações. Existe um ganho para o idoso quando enxergamos que ele não está ligada apenas a saúde, ou a assistência, ou a previdência, ou a justiça e na verdade ele engloba todos esses aspectos representados no Estatuto do Idoso que declara que o idoso precisa de proteção, precisa ter condições de denunciar casos de violência, precisa do acolhimento, precisa da saúde e por aí vai.
As diferenças que observamos em outras áreas, como na economia onde as mulheres ganham menos que os homens, também se repetem no processo de envelhecimento? Fatores culturais, gênero, ambiente social e a presença de sistemas de saúde, tanto rede particular quanto rede pública, são determinantes?
Sim, esses determinantes sociais são muito importantes ao meu ver. Você pode resgatar esses determinantes na publicação do Kalache, A revolução da Longevidade. Ele destaca duas questões, dentre todos os determinantes, existem dois pontos transversais: um é o gênero, o outro é a cultural.
Nós não podemos desconsiderar o histórico cultural das pessoas mais velhas e por isso nós defendemos a territorialização dessa população, ou seja que fiquem onde nasceram, onde criaram os filhos portanto onde teve seu ambiente de participação social. "Ah vou tirar ele da casa dele e vou colocá-lo na minha casa", temos que ter muito cuidado em relação a isso. Em casos extremos, talvez seja necessário, mas é melhor que a população idosa consiga permanecer onde transitou durante a vida toda, onde existe maior afinidade, aproximação e familiaridade. Chamamos isso de princípio da territorialização.
A questão do gênero também merece destaque. Evidentemente que o processo de envelhecimento é um processo mais feminino, a gente fala dentro da gerontologia da feminização da velhice e existem muitos estudos falando disso. É muito importante que a gente entenda que existe uma característica muito marcante em relação ao envelhecimento da mulher, entretanto o sofrimento maior do processo de envelhecimento fica realmente para o homem. O homem tem muita dificuldade pra envelhecer, a mulher tem mais cuidados de saúde ao longo da vida.
Quais são os principais desafios enfrentados por quem está no processo de envelhecimento? Como lidar com o desenvolvimento de doenças e com o maior risco de desenvolver deficiências?
À medida que envelhecemos corremos riscos, né? Aumento de quedas em idosos é o que mais mata, aumenta porque nós temos a fragilidade óssea e doenças como osteoporose e também por questões visuais, há uma baixa da acuidade visão e acuidade auditiva. Nós temos a percepção e os reflexos, então há uma característica própria do processo de envelhecimento e isso é inevitável. À medida que você tem um trabalho de prevenção, uma rotina mais disciplinada no jeito de atividade física, alimentação saudável, grupo de amigos. Um dos recursos importantes é manter uma rede de amigos, mesmo que em pese alguns com o passar dos alguns venham a falecer, você abrir a possibilidade de novos contatos. è importante que você tem a amplitude da sua rede de suporte, para que você tenha a família e no caso da ausência da família que você tenha amigos, na ausência que você constitua uma outra rede de suporte. Isso é fundamental porque faz com que você esteja inserido e a gente chama na gerontologia, um sentimento de pertencimento, isso é muito importante.
Apartar socialmente é um grande erro das políticas e na abordagem quando se fala de velho, "Ah vou colocar um prédio só de idosos" Eu não gosto disso. "Ah vou colocar um bairro só de idosos" Eu acho que a gente precisa de todas as diversidades, todas as diferentes gerações, toda movimentação como é a característica de uma cidade. Não precisa isolar, você precisa cuidar e garantir uma cidade acessível você consegue nesse documento, A Revolução da Longevidade, Kalache fala muito sobre acessibilidade, sobre possibilidade de ter uma cidade mais amigável a pessoa idosa. Os risco de doenças sim, tem um gráfico de capacidade funcional quanto mais risco você corre quando inclusive como jovem
Como devemos prover as condições ideias e as condições necessárias para oferecer cuidado de qualidade para população em envelhecimento?
A primeira providência é a participação social da pessoa idosa, participação nos conselhos e nos foros a exemplo de São Paulo - que tem 23 foros do idoso na capital. Nós temos o grande Conselho Municipal do Idoso, onde se concentram representantes das cinco macro regiões da cidade. É nesse local, nessa arena democrática, que se discutem as demandas e as necessidades das pessoas idosas na metrópole paulistana. São Paulo é uma cidade enorme, um idoso que mora em São Miguel Paulista é completamente diferente do idoso que mora no centro da cidade.
Os idosos têm características diferentes, o que a gente chama de singularidade da velhice na área da Gerontologia. É importante respeitar as características de cada um e de cada região, na cidade de São Paulo são 96 bairros e distritos, cada um com seu perfil. Nós temos um documento onde fizemos o diagnóstico da questão para a cidade, elaboramos indicadores sociodemográficos para população idosa residente na cidade em São Paulo, porque o primeiro passo para fazer essas políticas públicas foi conhecer quem são esses idosos, onde eles vivem, quais são suas características e qual o perfil daquela população. Esse documento foi publicado em 2020, mas nós já o usamos desde setembro de 2017 quando iniciamos nosso trabalho durante a minha gestão na Secretaria.
Então a primeira coisa é isso, a segunda é fortalecer essa participação social que é fundamental. Para que isso aconteça, você tem que levar ao conhecimento das pessoas idosas os dados sobre as regiões para eles avaliarem. Nós seguimos esse documento do Alexandre Kalache, que é um guia global de uma cidade amiga do idoso. Perguntamos para a população idosa sobre como está o transporte, a questão da moradia, a acessibilidade, a participação social, a questão dos locais de atendimento ao idoso se estão acessíveis e iluminados, além de uma série de perguntas que você encontra ao visitar esse documento. Então você dá insumos às discussões e em cada bairro, em cada local isso faz com que exista uma participação, uma voz do idoso. Essa participação social clama por uma escuta. Então é como nós falamos, é de baixo pra cima e de cima pra baixo; isso é fundamental.
Como podemos criar um novo paradigma de envelhecimento?
A primeira coisa é falar de onde estamos falando, de que envelhecimento estamos falando. Nós estamos falando de um processo natural da vida, a velhice é natural, à medida que você vive mais adquire mais anos na sua vida, isso é super importante, e a partir dos 60 anos você é considerado idoso. Nós estamos sofrendo no Brasil, principalmente na pandemia, a questão do idadismo - que é o preconceito em relação a idade.
"Ah é coisa de velho", "Isso é porque são velhos", "Porque os velhos precisam ficar apartados"... Existe um preconceito.
Então, primeiramente, é preparar a sociedade para a maior proximidade com a questão do envelhecimento, então temos a questão da intergeracionalidade. A intergeracionalidade é um paradigma fundamental. As políticas públicas, privadas, filantrópicas, particulares devem integrar as ações e não fazê-las de forma apartada. É o mesmo idoso que transita entre a assistência social, entre a saúde e todas as outras áreas. Precisamos ter a integração e a integralidade, uma visão holística, integral, intergeneracional. A transversalidade é fundamental, todas as agendas de discussões precisam ter a temática sobre envelhecimento. Todas. Todas porque temos idosos imigrantes, LGBTs, em situação de rua, com deficiências, quilombolas, ribeirinhos, indígenas, portanto temos que parar de segregar. Todas essas temáticas devem vir à tona na discussão e tudo isso para preparar a questão de uma sociedade mais amigável e amorosa na questão do envelhecimento.
Referências
A Revolução Da Longevidade | Alexandre Kalache. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=_5N8V1lPIGg&t=47s> Acessado em 24/11
KALACHE, Alexandre. Envelhecimento populacional no Brasil: uma realidade nova. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro , v. 3, n. 3, p. 217-220, Sept. 1987
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de
julho de 1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002.
Beauvoir S. (1990). A velhice. Tradução de MHF Monteiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira
A pandemia afeta o Brasil todo, dos ricos aos pobres, porém a quarentena para a classe baixa existiu durante um mês, logo após isso houve a crise, onde os comércios locais e pessoas empregadas em residências e empresas se viram necessitadas a sair de casa. Ficar em casa é um privilégio, em São Paulo, é um local de extrema desigualdade social e econômica, desde março a cidade vive em um colapso na saúde. A classe baixa tem diversos conflitos entre si e com a classe alta.
Segundo o site UOL, no dia 24 de maio, foi compartilhado que os 20 bairros com mais mortes por covid-19 são áreas periféricas. No site do G1, em 4 de agosto, foi publicado que o levantamento da prefeitura mostra a localização dos locais com mais vítimas fatais pelo novo coronavírus, o bairro de Sapopemba, na Zona Leste de São Paulo, é o primeiro com 437 óbitos pela doença, já o segundo é o da Brasilândia, na Zona Norte, com 368.
Em entrevista, Ana Paula Vianna, que perdeu seu avô, Carlos Ribeiro Vianna, de 83 anos, por conta do corona, conta como foi o procedimento até a morte. A família vive na COHAB-1 Zona Leste, onde é conhecido também como conjunto habitacional Padre José de Anchieta. Ela relata que não sabe dizer se houve mesmo uma quarentena por lá, pois muitos vizinhos acreditavam e confiaram em ser apenas uma “gripezinha”, porém houve a paralisação do comércio local, mantendo apenas estabelecimentos com serviços essenciais, segundo decretado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Em relação a morte de seu avô ela contou detalhadamente como foi o trajeto até o óbito de Carlos. Na primeira ida ao hospital, não foi feito o teste para covid, apenas alegaram que o mesmo estava com dengue, porém no dia seguinte levaram o senhor para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Itaquera, no local ele foi atendido e constatado como portador do vírus, mas enviaram ele novamente para sua casa, chegando na residência, a família ligou para o SAMU, que levou o idoso até o hospital de campanha do Morumbi, onde era muito complicado o contato com o próprio, mesmo que fosse para saber se havia melhora. Durante oito dias eles buscaram informações, ligando para os médicos responsáveis e assistentes sociais, porém sem nenhum retorno, quando conseguiam ver ele, aparentemente o idoso estava com frio. A neta afirma que o avô estava melhorando, porém de repente, houve uma ligação da médica responsável pelo plantão dizendo que o senhor precisava ser entubado, a família se desesperou, e no dia seguinte, houve a ligação dizendo que ele não possuía estabilidade para ser transferido de hospital por conta da intubação. Horas depois, ligaram dizendo que ele estava sendo transferido. Quando a família chegou ao Hospital do Mandaqui, localizado na Zona Norte de São Paulo, não havia registro da entrada de Carlos, após duas horas, a família conseguiu entrar na ala de emergência, porém ele não foi encontrado, até que um médico informou que o avô não havia resistido. A inconformação da família é se o mesmo morreu por negligência médica ou por vontade divina, pois afirmaram que o mesmo não aguentava ser transferido e mesmo assim houve a transferência.
(Carlos Vianna é o circulado. Por: Ana, sua neta)
O atual presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, é um dos cúmplices para explicar o momento em que o país vive. Com as frases mais emblemáticas quando questionado sobre o coronavírus “É só uma gripezinha. ” e “Vou fazer o que? Não sou coveiro. ”. O governo do mesmo não tem um Ministro da Saúde em definitivo faz 3 meses. Muitos de seus seguidores apenas reproduzem suas falas e não ligam para as normas básicas que a OMS decretou. A priorização da volta da economia levou a diversos problemas, como o aumento em massa pelo vírus e o fatídico frango contaminado vendido para China, que vetou a compra de alimentos do país, Filipinas também mencionou que não comprara por enquanto.
Em entrevista, uma enfermeira do Hospital do Mandaqui, que pediu para que não fosse dito seu nome, explicou como funciona tudo por parte da linha de frente que ajuda ao máximo a população.
A mulher disse não haver falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) (roupas e acessórios para evitar o máximo a contaminação), mas não há leitos suficientes para todos os infectados, assim tendo que transferir o paciente para outros hospitais. Ela diz que os funcionários do hospital têm a preocupação de não se infectar e não levar o vírus para suas respectivas residências. Ela relatou que quando os pacientes descobrem que estão infectados eles entram em estado de medo e angústia, alterando batimentos cardíacos e impossibilitando diversos procedimentos, muitos oram em voz alta pedindo a cura para seu respectivo Deus, muitas vezes eles se exaltam. É normal, segundo ela, a população procurar ajuda médica quando já está em estágio avançado.
A quarentena é um privilégio da classe média e alta, a população da classe baixa não tem alternativa, apenas trabalha para que consigam colocar comida em suas respectivas casas. O descaso do Estado com eles é revoltante, mas sempre foi assim, o povo pelo povo, a burguesia nunca se importou, porque das mais de 100.000 mortes, a maioria vem das periferias. Segundo a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo, publicou em, 6 de maio, que houve um aumento de 45% nas mortes dos 20 distritos mais pobres da cidade. Já dos 20 bairros mais ricos, foi um aumento de 36%. Essa diferença ocorre pelo fato da classe baixa não ter condições de manter uma higiene básica, causada pela desigualdade social.
Lucas Marques Cardoso, 23, diz que seu pai, mesmo com todo o caos, teve que trabalhar durante a pandemia, mas ele não contraiu a doença, felizmente, alega o jovem. Em, Itapecerica, que é onde o mesmo mora, não houve quarentena para a população, mas para o comércio local existiu a parada. Lucas teve suspeita de corona, porém recorreu ao hospital particular, quando chegou lá e confirmou que havia o vírus, ele relata a diferença que é do sistema público para o privado de saúde.
Segundo a Imperial College, de Londres, cravou que a pandemia do novo coronavírus é elitista, pois lavar as mãos com água e sabão, algo considerado básico para se precaver, não é algo que todos possuem, assim aumentado a taxa de contaminação em 32%. Através da Organização das Nações Unidas (ONU), 4,5 bilhões de pessoas não têm acesso à saneamento básico seguro, dado de 2017.
A mesma pesquisa relata que os países com maior concentração de riqueza apresentam 4,7 vezes mais leitos hospitalares, 13 vezes mais médicos e 9,6 vezes mais enfermeiros em relação aos mais pobres.
Através do site G1, foi publicado uma matéria que visibiliza a desigualdade social, na qual o Ministério da Saúde disponibilizou o Código de Endereçamento Postal (CEP), de 3.959 pessoas, mostra que 66% das vítimas, da grande São Paulo, recebiam salários médios abaixo de R$ 3 mil, 21% com a média de R$ 6.500 e nas regiões da classe alta, a média de R$ 19 mil era de apenas 1%. Segundo o G1, também, no dia 17 de setembro, a média de mortes no Brasil nos sete últimos dias era de 779 óbitos por dia, que somados dão 5.453 no país.
(Reprodução: Uol.com)
Em entrevista com Lucas Bacelar, 18, morador do bairro da Brasilândia, localizado na Zona Norte de São Paulo contou sobre como vive durante a pandemia. O jovem conta que conheceu pessoas que se infectaram pelo vírus, sendo algumas pessoas de sua família e ele conhecia um senhor que tinha um bar, contaminou-se e faleceu, o caso viralizou tanto que foi parar na Record. O mesmo especifica como foi a quarentena por lá, na qual ele cita a preocupação inicial com o vírus, fazendo o possível para evitar movimentação na rua, higienizar, como possível, suas respectivas casas e as pessoas. Porém, cerca de um mês após o decreto do isolamento, o medo da contaminação ficou para trás e tudo voltou ao normal.
Lucas relata seu privilégio de sua mãe e seu irmão poderem trabalhar em home-office, porém ele mora com seu avô, que faz fretes e é autônomo, mesmo com o auxílio, teve de ir em busca de alguma renda. O próprio relata que o seu tio, que trabalhava de Uber e como segurança particular, teve de sair para a rua em busca de algum sustento. Ele pôde ver que os casos de pessoas que tiveram o privilégio de se manter em casa foram minoria, a grande maioria da população local teve que sair após os 15 dias de quarentena. Após isso, as festas e bailes clandestinos começaram novamente, logo, o isolamento proposto pelo governo foi quebrado muito rápido.
O jovem relata que no início, se assustava com a proporção de mortos, mas depois de algumas pesquisas feitas pelo próprio, ele disse que viu o quão grande era o bairro, que engloba boa parte da Zona Norte e da parte Noroeste, tornando o número de mortos pequeno para o real tamanho. Porém, ele ressalta que não se deve relaxar, e sim continuar tomando os cuidados devidos, sendo eles higiênicos e o mesmo cita a imunidade, para que haja uma boa resistência contra o vírus. Sobre a pesquisa de Lucas, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que a Brasilândia tem 5.803,542 km2, com cerca de 11.853 pessoas em seu território. Um bairro com grandes números comparado a outros próximos.
Uma enfermeira de um postinho de saúde da região da Freguesia do Ó, ela afirma que o Estado deu as condições mínimas de trabalho e os funcionários lidam com as normas descritas pela OMS. A mulher diz que é desesperador ver a reação das pessoas ao saberem que estão com o vírus, com a evolução e se poderão sair vivas.
Em entrevista com Antônio Gati, o idoso de 86 anos contraiu o vírus, ele alega que achou que morreria, pois ele já possui uma idade avançada e já tem casos de pressão alta e problemas pulmonares. O próprio tem convênio, porém com todos os fatores ele se torna um grupo de risco bem alto e grave, porém ele saiu bem e sem nenhuma sequela. Sua esposa, Rosa Moreli, também teve, ela possui 82 anos, tem diabetes e é obesa, no entanto, ela sobreviveu ao vírus, porém despertou um câncer em seu fígado e pâncreas.
O presidente, Jair Messias Bolsonaro, que tanto recomenda a cloroquina sem recomendações médicas pode gerar efeitos colaterais em seus pacientes com o uso do remédio, como arritmia cardíaca, problemas renais e comprometimento na saúde dos olhos. Magnus Gisslén, professor e médico chefe da clínica de infecção do Hospital Universitário Sahlgrenska, relatou ao jornal Gothenburg Post que o medicamento tem efeitos colaterais sérios, principalmente no coração.
De acordo com o monitoramento da Universidade Johns Hopkins (Estados Unidos), já são mais de 116.600.908 milhões de casos no mundo, com 2.589.638 morte até o momento. Mesmo com uma taxa de mortalidade baixa, que mata uma pessoa a cada 30, é uma doença letal que não se sabe seus efeitos a longo prazo.
A ONU publicou em 2019 o Índice Multidimensional de Pobreza, com 101 países analisados, há 1,3 bilhão de pessoas consideradas “multidimensionalmente pobres”. Cerca de 500 milhões vivem em pobreza extrema, sem comida, água e higiene básica. Aproximadamente, 600 milhões de pessoas menores de 18 anos vivem com a desigualdade e 428 milhões tem menos de 10 anos.
O relatório observa que a África Subsaariana e o sul da Ásia têm a maior proporção de pessoas pobres, cerca de 84,5%. O nível de desigualdade é descrito como imenso na África Subsaariana, onde varia de 6,3% na África do Sul a 91,9% no Sudão do Sul. O nível de disparidade no sul da Ásia é oscilando de 0,8% nas Maldivas, para 55,9% no Afeganistão.
Após todos os fatos, deve-se tomar cuidado atualmente e posteriormente a fase do coronavírus, na qual deve aumentar o índice, por exemplo quando o dono da Amazon aumentou sua fortuna enquanto milhares de pessoas perdem seus pequenos negócios e ficam desempregados. O covid-19 é um vírus que veio para atingir o pobre e fortificar a elite. As pessoas só não sabiam que teriam que lutar contra dois vírus, o coronavírus e o capitalismo. E para o brasileiro, combater o genocida Jair Messias Bolsonaro é mais um obstáculo.
O número de refugiados no Brasil vem crescendo a cada ano. Só no ano de 2018, segundo a Agência da ONU Para Refugiados (ACNUR) foram relatadas 80 mil solicitações de reconhecimento de condição de refugiado no Brasil. Os grupos de maior número entre as solicitações são os venezuelanos (61.681), que saíram do país devido à crise humanitária, e os haitianos (7.030), cujo fluxo de migração se intensificou após o terremoto que atingiu o país em 2010.
A lei brasileira considera refugiado todo indivíduo que está fora de seu país de origem devido a guerras, terremotos, miséria e questões relacionadas a conflitos de raça, religião, perseguição política, entre outros motivos que violam seus direitos humanos. Isso pode acontecer, por exemplo, quando a vida, liberdade ou integridade física da pessoa corria sério risco no seu país.
Para que o imigrante seja reconhecido como refugiado, é necessário enviar uma solicitação para o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE). O processo de reconhecimento, que antes era mais burocrático e mais demorado, atualmente é feito no site do Ministério da Justiça, a partir do preenchimento do formulário que pode ser feito ainda no país de origem. Todas as etapas podem ser acompanhadas pela internet, mas para o processo começar a tramitar, o solicitante deverá comparecer pessoalmente a uma unidade da polícia federal.
Dentre a população refugiada reconhecida no Brasil, segundo o censo da ACNUR de 2018, a maioria se concentra nas faixas etárias de 30 a 59 anos (41,80%), seguido de pessoas com idade entre 18 a 29 anos (38,58%). Do total, 34% são mulheres e 66% são homens, ressaltando os sírios, os congoleses como nacionalidades em maior quantidade (respectivamente 55% e 21%).
Em janeiro de 2020, o Brasil tornou-se o país com maior número de refugiados venezuelanos reconhecidos na América Latina, cerca de 17 mil pessoas se beneficiaram da aplicação facilitada no processo de reconhecimento, segundo a Agência da ONU para Refugiados. As autoridades brasileiras estimam que cerca de 264 mil venezuelanos vivem atualmente no país. Uma média de 500 venezuelanos continua a atravessar a fronteira com o Brasil todos os dias, principalmente para o estado de Roraima.
Apesar de em grande quantidade, apenas 215 municípios têm algum tipo de serviço especializado de atenção a essa população. As maiores dificuldades encontradas por pessoas refugiadas são a adaptação com o mercado de trabalho, com o aprendizado do idioma, o preconceito e a xenofobia, educação (muitos possuem diplomas em seus países de origem que não são aceitos aqui no Brasil), moradia e saúde.
Covid-19 e o amparo aos refugiados
Diante de um quadro de crise em escala global, como o que acontece este ano com a pandemia da Covid-19, essa população de migrantes e refugiados, que já se encontram em extrema vulnerabilidade, conta com o apoio de poucas instituições voltadas especialmente para suas necessidades. Este é o caso da Missão Paz, uma instituição filantrópica de apoio e acolhimento a imigrantes e refugiados, com uma das sedes na cidade de São Paulo, como conta o padre Paolo Parise.
Nascido e criado na Itália, Parise atua desde 2010 na Missão Paz, atualmente como um dos diretores, e explica que esta instituição está ligada a uma congregação da Igreja Católica chamada Scalabrinianos, que atua com imigrantes e refugiados em 34 países do mundo. “Na região do Glicério - município do estado de São Paulo-, a obra se iniciou nos anos 30 e atualmente está presente em Manaus, Rio de Janeiro, Cuiabá, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Foz do Iguaçu, Corumbá e outros lugares.”
Sua estrutura atual conta com a Casa do Migrante, um abrigo com capacidade de 110 indivíduos que são acolhidos com alimentação, material de higiene pessoal, roupas, aulas de português, acompanhamento de assistentes sociais e apoio psicológico; e o Centro Pastoral e de Mediação dos Migrantes (CPMM) que oferece atendimento e serviços voltados aos imigrantes, quanto aos seguintes temas: documentação e jurídico; trabalho, capacitação e cidadania; saúde; serviço social; família e comunidade. “Além disso, temos a área de pesquisa em parceria com a revista Travessia, que é o Centro de Estudos Migratórios (CEM), uma biblioteca especializada em migração e a WebRadio Migrantes”, completa Pe. Paolo.

De acordo com o diretor, o maior desafio enfrentado pela instituição, durante a pandemia, foi com a saúde dos refugiados, principalmente pela impossibilidade de viver a quarentena isoladamente, já que muitos vivem em ocupações ou em lugares com muitas pessoas concentradas. Ele ainda denunciou que, dentre tantas vítimas da Covid-19 em São Paulo, um dos grupos mais afetados foi o de imigrantes bolivianos, “muitos foram contaminados e muitos morreram”.
Diante de instabilidades políticas e econômicas, atualmente, sírios e venezuelanos são as principais nacionalidades afetadas que solicitam entrada no país. O que ratifica o Pe. Parise, “Falando pela Missão Paz, se você utiliza o termo ‘refugiados’, o maior grupo neste momento é de venezuelanos, sejam os que foram acolhidos pela missão paz, sejam os que estão entrando no Brasil. E depois encontramos outros grupos como da República Democrática do Congo. Mas se falamos de imigrantes, temos Colombianos, Bolivianos, Paraguaios, Peruanos, Angolanos e de outros países que estão recorrendo ao Brasil.”
Mesmo com mudanças críticas, no cenário jurídico e político brasileiro, para que esta população seja recebida no país e tenha seus direitos respeitados, ainda não se pode falar em auxílio do governo ou medidas diretas de apoio a refugiados e imigrantes.
Paolo relembra a criação de leis que têm beneficiado a população no Brasil. Uma delas é a lei municipal Nº 16.478 de 2016, onde o Prefeito do Município de São Paulo, Fernando Haddad, instituiu a Política Municipal para a População Imigrante que garantia a esses o acesso a direitos sociais e aos serviços públicos, o respeito à diversidade e à interculturalidade, impedia a violação de direitos e fomentava a participação social; e a outra é a lei federal Nº13.445 de 2017, ou a nova Lei de Migração, que substitui o Estatuto do Estrangeiro e define os direitos e deveres do migrante e do visitante, regula a sua entrada e estada no País e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante.
A Missão Paz se mantém através de projetos e dinheiro injetado pela congregação da Igreja Católica. “Neste momento, a Missão Paz não recebe apoio financeiro nem do município, nem do estado e nem do Governo Federal”, relata Parise. Durante a pandemia receberam ajuda da sociedade civil, “[A Instituição] Conseguiu muitas doações de pessoas físicas, de instituições, de campanhas, fosse em dinheiro, em cestas básicas ou kits de higiene pessoal”, e com 200 cestas básicas, por mês, da Prefeitura de São Paulo. Também receberam ajuda com testes de COVID em nível municipal.
A instituição filantrópica ainda conta com a ajuda de vários parceiros, como explica seu diretor “na área de incidências políticas, por exemplo, nós atuamos com a ONG Conectas Direitos Humanos, temos na área de refugiados um projeto com a ACNUR, estamos preparando outro com a OIM (Organização Internacional para as Migrações) e temos algumas ações com a Cruz Vermelha”.
Desde o começo do ano, já atenderam por volta de 7 mil imigrantes e refugiados, e, hoje em dia, tem por volta de 40 pessoas na Casa, o que representa ⅓ da capacidade total. Além disso, entregam de 50 a 60 cestas básicas a refugiados, diariamente, e ao redor de 60 a 70 que vão, por dia, procurar os serviços do CPMM. “Outras ações incluíram a disponibilização de atendimentos online, de aulas de português a atendimentos jurídicos, psicológicos ou serviços sociais, além de ajudar a completar aluguel, água ou luz daqueles que precisam da ajuda da instituiçã”, fala Padre Paolo.
Todo esse esforço e dedicação da instituição foi feito, sempre, visando seguir as normas de segurança e as indicações da OMS (Organização Mundial da Saúde). Foram fornecidos a seus funcionários e a população migrante e de refugiados álcool para higienizar as mãos, máscaras e demais equipamentos e serviços de proteção e higiene.
No dia 27 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto - revogado no dia seguinte - autorizando estudos para a realização de parcerias com o setor privado nos atendimentos primários da saúde pública. A proposta de incluir a saúde no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) foi vista como um primeiro passo para uma possível privatização do Sistema Único de Saúde (SUS).
Saúde é direito de todos e dever do Estado garantido desde a Constituição brasileira de 1988. Foi para assegurar este direito que foi criado o SUS, que resultou em diminuição de taxas de mortalidade infantil e aumento da expectativa de vida dos brasileiros. Qualquer pessoa que está no território brasileiro pode ser atendido, em uma política que primeiro presta o serviço, depois pede os documentos.
Maior sistema público de saúde do mundo, o SUS representa uma vitória da sociedade brasileira por promover a justiça social. Segundo pesquisa divulgada no ano passado pelo IBGE, mais de 70% da população brasileira depende do SUS.
O sistema é um dos temas de pesquisa da economia da saúde, que trata das relações de produção, distribuição e consumo dos bens de saúde. O complexo produtivo da saúde pode ser dividido em tópicos: fontes pagadoras públicas (SUS) ou privadas (operadoras, seguros saúdes); produtores de bens (indústrias de equipamentos, medicamentos); prestadores de serviços (hospitais e clínicas) e consumidor/paciente/cidadão.
O dinheiro que chega ao SUS vem do fundo público. Existe uma quantidade de impostos que o governo recolhe da população sendo direcionados para as rubricas orçamentárias - educação, segurança, saúde, previdência etc. Este orçamento é votado pelo Parlamento todos os anos. A rubrica orçamental da saúde é a segunda maior - junto com a educação, ficando atrás somente da previdência. O Legislativo tem o poder de escolher a rubrica orçamentária que neste ano é de 9%, porém o Executivo pode segurar este dinheiro, limitando o montante que realmente chega nos hospitais.
Desde 2016, com a Emenda Constitucional (EC) 95, o dinheiro voltado para a saúde vem diminuindo cada vez mais. O PPI foi criado em 2016 pelo governo Temer, com o objetivo de avaliar e recomendar ao presidente da República projetos que poderiam render parcerias e quais poderiam sofrer desestatização. Papel semelhante havia sido desempenhado pelo Conselho Nacional de Desestatização do governo Fernando Henrique Cardoso.
Logo, este PPI não é algo novo. No estado de São Paulo, durante o governo de Mario Covas (1995-2001), iniciou-se um tipo de controle privado denominado “Organização Social de Saúde”. São instituições sem fins lucrativos, com vasta experiências nos serviços de saúde que gerenciam os equipamentos públicos. Por exemplo, a Unifesp gerencia um hospital de propriedade do governo de São Paulo. Os equipamentos e o dinheiro investido são de responsabilidade do estado de São Paulo e o governo paga um montante para a universidade gerenciar.
A professora de economia da PUC-SP Cristina Amorim pontua: “Saúde é um bem público, e o SUS é um patrimônio da sociedade brasileira. Há privatizações e privatizações. Eu diria que existe uma contradição em termos falar na privatização do SUS. Não deve e não pode. É um direito inviolável [constitucional]”.
A possível “privatização” do SUS passa pela disputa de orçamento, assim como outros serviços públicos. Mas para Cristina, que trabalha na área da economia da saúde há mais de vinte anos, “a saúde privada está muito menos interessada nos serviços do SUS do que pode parecer à primeira vista".
Ela cita como exemplo a atenção básica. "Vender para quem não tem recurso? Vender para quem não tem renda?", questiona a professora. "Sempre há uma tensão entre até onde é o espaço da saúde suplementar e até onde é o da pública", diz Cristina, acrescentando que existe uma disputa por espaço e hegemonia, mas não quanto "as manchetes anunciam".
Ao ser questionada sobre a declaração de Bolsonaro e a rápida revogação do decreto, a professora diz: “Nem deu para ver do que se trava exatamente. Eu li tudo que saiu e tudo o que pude entender é que o Estado usaria do BNDES, sendo ofertado para empresas privadas, e teriam o direito de ofertar algum tipo de serviço para atenção básica. Poderia ser a reforma do posto de saúde, porém foi muito rápido, mal deu tempo de analisar a situação”.
Porém, algo que pôde ser analisado foi a pressão da mídia e da população sobre a atitude do presidente. “A pressão foi evidente, inclusive da assessoria jurídica da Presidência da República, que deve ter falado: ‘Isto é inconstitucional’”, diz Cristina, lembrando o longo histórico de lutas da sociedade brasileira pela saúde pública.