No Dia dos Povos Indígenas, ela debate sua história e as lutas de seus ancestrais
por
Luísa Ayres
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19/04/2024 - 12h
jaci
Jaci mostra sempre em suas redes sociais os eventos e festividades de seu povo / Reprodução: @jaci.martins_

Jaci Guarani é uma mulher, indígena, estudante bolsista e mãe de quase meia dúzia de filhos. Ela vem da etnia Guarani, e atua como militante das causas indígenas no estado de São Paulo. O nome de seu povo significa guerreiro, e talvez ela nunca tenha precisado ser tão guerreira quanto nos últimos anos. 

Segundo pesquisadores do Instituto Socioambiental (ISA), apenas no Mato Grosso do Sul, mais de 530 indígenas de sua etnia foram assassinados nos últimos 16 anos. Somado a isso, as invasões, a poluição ambiental, o estupro e a pedofilia a que são submetidos os indígenas, levam a pauta da demarcação de terras a ser uma das mais urgentes para os povos – não só pelo direito ao espaço, mas pelo direito à vida. 

Além disso, entre 2000 e 2020, houve um aumento de 167% nos números de feminicídio de mulheres indígenas, segundo o Instituto Igarapé.  

“A gente tá vendo que os não indígenas estão desmatando a Mata Atlântica, o pulmão aqui de São Paulo”, desabafa Jaci Guarani. Mesmo assim, nada parece ser forte o suficiente para abater a ancestralidade da neta de indígenas nômades, que saíram lá da fronteira do Uruguai. A caminhada foi longa, mas ainda não acabou. 

Akângatu

Jaci conta que seu avô ficou internado por 7 anos na Santa Casa. Nesse tempo, aprendeu a escrever e começou a anotar suas lembranças e ensinamentos em um diário, guardado por um Instituto que já não existe mais. Quer dizer, não existe mais no papel, mas resiste no coração de Jaci, que não só guarda histórias, mas as constrói. Afinal, neta da primeira mulher cacique do Brasil, ela garante que para seu povo “não existe só o homem”. “Se eu sou essa mulher que luta pela tekoa (aldeia), é porque essa mulher veio primeiro pra me inspirar”, garante ela. 

Apesar de todo o racismo, preconceito e machismo que enfrentou em sua vida, aprendeu na dor a força que tem a união. Foi contra a exclusão de tantas crianças indígenas que a avó de Jaci lutou pelo ensino regular dentro das aldeias, direito conquistado posteriormente em 2002. Apesar da educação euro centrada, a língua materna é de ensino obrigatório para as crianças de cada  tekoa. No seu caso, seu tronco linguístico é o Tupi, o que permite uma maior identificação entre os povos. 

“É preciso ter a língua materna e o ensinamento cultural voltado para a natureza, plantio e rituais ancestrais”, pontua Jaci, em um tom de preocupação, como o de quem não pode mais deixar que as lembranças e lutas de seu avô sejam novamente perdidos em papéis brancos, tão brancos quanto a pele daqueles que os silencia. A esses, talvez, tenha faltado o que para Jaci Gurani jamais faltou: “A gente aprende o respeito a todos os tipos de vida, o amor, o zelar, o estar cuidando”, conta, relembrando que aprender não e se limita a contas matemáticas e verbos de línguas estrangeiras. 

Além da educação, sua avó cacique também foi peça fundamental na conquista de postos de saúde para as aldeias, o que só aconteceu em 2005, apesar dos primeiros centros básicos de saúde no país terem sido criados por volta do ano de 1918. Não surpreende que as primeiras assistências, preocupações e direitos jamais sejam dados em primeiro lugar aos que já estavam aqui antes.  

aldeia
Casas na tekoa de Jaci, localizada próxima ao Pico do Jaraguá, em São Paulo / Reprodução: Jaci Guarani


Mãe Natureza

Jaci é mãe de 5 crianças. Ainda assim, para que pudesse tomar qualquer tipo de anticoncepcional, precisava da autorização de seu marido e de sua avó, que jamais concordou com essa ideia de pedir a ela permissão. “O corpo é dela, a decisão é dela. Não quero mais nenhuma mulher precisando de assinatura minha para não engravidar”, disse a cacique para todas as outras indígenas de sua tekoa naquela ocasião. 

Se para poucas decisões precisava da aprovação da avó, não a teve em uma de suas mais importantes. Jaci saiu da aldeia para casar-se com um não indígena. E quase deixou que a aldeia também saísse dela. 

“Eu não gosto que você vá para a aldeia ou que fale em idioma indígena”, dizia seu ex marido. Assim foi também com o nome de uma das filhas do casal, Taquá. Para ele, nada agradava ter uma descendente batizada com as  águas e ervas sagradas da floresta, abençoadas pelas divindades. Por isso, Jaci lutou muito pelo nome dessa criança. Não o de papel e documentos. O de alma. 

Outra parte da aldeia Guarani no Jaraguá. Para eles, é fundamental que as crianças brinquem e não reproduzam os vícios da internet e dos jogos / Reprodução: Jaci Guarani. 

Jaci conta que na hora que nasce uma criança indígena, um espírito vem à terra. O nome desse espírito, no entanto, só é sussurrado nos ouvidos do cacique cerca de 5 anos depois, se a criança ainda estiver viva, já que não se sabe se ela ainda estará feliz na terra ou se subirá antes aos céus. Esse nome, em todo caso, será o seu novo dali por diante. 

Pelo nome de suas filhas e pelo seu próprio, Jaci largou mão de seu  casamento e voltou à sua aldeia. Sem as repressões da sogra, sem as ofensas vindas do ex marido, apenas com a doçura daquilo que seu nome sempre significou. “Mel”. 

Nascida na região do pico do Jaraguá, terra demarcada em 1988, Jaci vive em uma aldeia de cerca de 1,7 hectares. Que deveria ser bem maior. 

O parque e as construções ao redor de sua casa, ameaçam a cada dia mais o seu povo. Para ela,  isso decorre de toda uma história de desprezo, violência e invasão, já naturalizados em nossa sociedade. 

“Nunca se falaram dos povos indígenas, nunca passamos na televisão”, protesta, chamando atenção também para o silenciamento e apagamento dessa luta.  

Tempo

Apesar disso, Jaci decidiu mostrar sua verdadeira face para quem quisesse olhar. E a quem não, paciência. A mesma enorme paciência que ela teve para acreditar que conseguiria se formar na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, a PUC, uma universidade das mais elitistas do país. 

Aqui, começa sua história com o Pindorama, programa de bolsas de estudo fornecidas a estudantes indígenas - mediante prova e obtenção de nota como em qualquer outro processo seletivo. Isso, 11 anos antes das cotas para estudantes indígenas serem de fato sancionadas no país. 

Ainda assim, como para qualquer outro estudante bolsista, estar lá dentro não significa pertencer, ser aceito ou visto da mesma forma pelos outros alunos. Guarani guerreira, batalhou muito, mas essa não foi uma das lutas, dentre tantas outras, que pode vencer naquele momento. 

“Você não tem tempo para estar aqui”, ouviu da sua professora. Falar de tempo para Jaci, porém, é complicado. Para ela, isso é coisa de gente branca. Gente essa que manda e desmanda nas universidades – que acha que sabe do tempo de cada um.  

Como quem já não se preocupava mais com tempo nenhum a perder, afinal já tinha perdido muita coisa nessa vida só por ser quem realmente era, Jaci desceu as rampas da universidade em lágrimas depois de escrever sua carta de desligamento da graduação. Naquele dia, não perdeu só tempo. Perdeu chances, perdeu suas forças e sua esperança. 

“Eu passo muito preconceito aqui na PUC. Eu ando pintada e o racismo já começa dentro do ônibus”, desabafou. Afinal, a trajetória de sua aldeia até sua universidade, não era dolorosa só pela longa viagem. 

Jaci está falando do tempo da mulher indígena, ainda que esteja sendo contado nos relógios do sistema capitalista, que só marcam as horas de des(matar) e exterminar. Esse não é o tempo da colheita, nem o tempo da fertilidade, tampouco o  tempo dos rituais e pedidos atendidos. Porque se fosse, Jaci saberia muito bem. E esse tempo, teria de sobra. 

Ainda assim, voltou a estudar nesse mesmo lugar anos mais tarde. Como se o tempo a tivesse dado forças para tentar de novo. Recebeu uma ligação de um dos padres da mantenedora da universidade que leu sua carta com todos os motivos que a fizeram desistir de estudar. E pela primeira vez na história, tornou-se uma estudante indígena aceita de volta no Programa Pindorama. Isso porque, dentre tantas centenas de indígenas que desistem da universidade, nenhum pode, pelo regulamento, voltar a estudar com sua bolsa depois da desistência. 

Segundo o Inep, as mulheres indígenas representam apenas 0,5% dos estudantes universitários. 

Mesmo assim, Jaci voltou. Como quem ressurge das cinzas, mas ainda sente as feridas arderem em fogo. Fogo vermelho como tinta de pau-brasil. 

Felizmente, a doçura que Jaci carrega no significado de seu nome não amargou. Quem sabe, dessa vez, Jaci consiga contar o tempo, ou melhor, contar ao tempo que ele é só uma abstração, porque tudo muda e a natureza muda junto. E que para isso, não existe tempo, existe união, amor e fé. Existe muita reza, muita força e muita festa. Existe um caderninho de memórias eterno de seu avô que o tempo jamais poderá apagar. E toda uma história que nem o tempo é capaz de mensurar. 

Se guarani significa guerreiro, Jaci é canto de guerra, disfarçado de amor, doçura e paz. 

Não falemos de tempo para Jaci. Falemos de Jaci em todo o tempo, para todo o mundo. 

Para que um dos povos mais antigos desse continente, com ainda cerca de 51.000 sobreviventes de todos os massacres e extermínios a que foram submetidos no Brasil, no Paraguai, na Bolívia e na Argentina, continuem fazendo da Terra um lugar melhor para se estar. Que tudo seja aldeia e que a aldeia a tudo resista! 

Nhanderu tenondeguiae

Jaikuaa nhanderekorã'i

Ãyreve jareko'i aguã

Ãyreveve hareko'i aguã

Ãyreve ãyreve. 

(Todas sabedorias que mantemos vem do nosso pai supremo e assim mantemos até hoje, e assim mantemos até hoje). 

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Jaci ressalta a importância das tradições e rituais de seu povo com orgulho / Reprodução: Jaci Guarani
Fala de Ailton Krenak foi destaque durante 13 aniversário da Pública
por
Kimberlly Ramos
Victória Rodrigues
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25/03/2024 - 12h

A Agência Pública completou 13 anos no último dia 13 de março. Em comemoração, organizou um evento na PUC SP, para debater “Condições Climáticas e o Antropoceno”, entre outros temas mais do que necessários. A celebração contou com a presença do ativista e escritor Ailton Krenak, o climatologista Carlos Nobre e a jornalista Daniela Chiaretti. Durante a conversa, Krenak trouxe uma importante reflexão, em que enfatiza o fato de as mudanças climáticas recentes afetarem principalmente os mais pobres. Confira no link

Referência nacional no jornalismo independente celebrou seu aniversário no Tucarena
por
Philipe Mor
Rafael Rizzo
Vitor Bonets
Arthur Rocha
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25/03/2024 - 12h

No último dia 13 de março, a Agência Pública comemorou seu 13 aniversário. O evento ocorreu no Tucarena e contou com a presença de personagens ilustres do cenário socioambiental e político. Giovana Girardi foi a responsável por mediar a mesa de debate, que tinha como convidados: Carlos Nobre, cientista ambiental; Daniela Chiaretti, jornalista de meio ambiente do jornal O Valor Econômico e Ailton Krenak, o mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras.

O tema central da palestra foi o colapso climático e o antropoceno. Além disso, foram esclarecidas pautas importantes como o racismo climático, a desumanização social e a extinção de várias espécies. A conversa também buscou associar o jornalismo como ferramenta democrática e relacionar os impactos climáticos nesse tipo de modelo político. Confira tudo o que aconteceu nesse dia no YouTube

 

Em comemoração aos 13 anos da Agência Pública, o Tucarena recebe Ailton Krenak, Carlos Nobre e Daniela Chiaretti para discutir o "Colapso climático e Antropoceno"
por
Bianca Abreu
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25/03/2024 - 12h

O ativista indígena Ailton Krenak, o climatologista Carlos Nobre e a jornalista especial de meio ambiente do jornal Valor Econômico, Daniela Chiaretti, explicam como a crise ambiental e a política se entrelaçam. Além disso, chamam a atenção para o quanto é importante que todos, enquanto cidadãos, reflitam sobre suas próprias decisões em relação a essa pauta, que, segundo eles, é tão urgente. Confira a cobertura pelo TikTok. Direção: @biancao.producoes/ @brasilandiana
Áudio e imagens: @tvpucsp / @brasilandiana

 

Ativistas, cientistas e jornalistas se encontram na comemoração de 13 anos da Agência Pública
por
Artur Maciel Rodrigues
Giovanna Takamatsu
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25/03/2024 - 12h

Antropoceno e os colapsos ambientais foram os temas centrais da última palestra do dia 13 de março, em comemoração aos 13 anos da Agência Pública. Com participação do ativista e escritor, Ailton Krenak, do professor e Climatologista, Carlos Nobre, e da repórter ambiental e internacional, Daniela Chiaretti, a roda de conversa ocorreu no teatro Tucarena, em São Paulo, onde a discussão sobre a crise climática e o que nos espera no futuro tomou conta da arena.    

A pergunta “estaríamos vivendo uma era antropocena” (ou a “era dos humanos”) iniciou a discussão. Isso porque em uma reunião recente da Comissão Internacional de Estratigrafia (ICM), foi definido que não. Por essa decisão, é possível perceber que a ICM ignora a marca que os seres humanos fizeram na geologia da terra pelos próximos anos. O professor Carlos Nobre explica: “[A] união internacional de Geologia quer ver se essas épocas geológicas não têm nenhuma que acontece na escala de séculos só em milhares de anos”, diz Nobre.

O professor explica que, diferente da Comissão, ele concorda com a nova nomeação da era: “Se a gente continuar com as emissões, nós vamos chegar em 2100 com 4 graus de aumento. Em 100 anos, nós vamos ter o mesmo aquecimento que levou 12.000 anos para sair da época Glacial e chegar na Interglacial”. No fim de sua fala, o climatologista exemplifica o impacto disso, explicando que, quando a temperatura subir, resultará em uma grande extinção: “Nós estamos tão próximos dessa extinção que fica difícil imaginar porque que não pode se chamar antropoceno”.

Após o professor falar, foi a vez de Ailton Krenak. O ativista inicia exemplificando o pensamento binário da ciência, e apresenta a ideia de uma fita métrica que guia os cientistas: "A metade do planeta já morreu, mas a ciência pode dizer ‘não, ainda não morreu, porque naquele ponto ali [na fita métrica]. Ele menciona que as ações do homem influenciaram tanto o planeta que a era antropocena foi antecipada: “Nunca na história do planeta nenhum organismo espertalhão, como os humanos, acelerou tanto as mudanças no mundo”.

O eruditismo dos povos tradicionais, em respostas a tendências específicas da ciência, toma cada vez mais rumo nas conversas. Krenak argumenta que a perspectiva científica da coisa está atrasada. Ele questiona “E se o nome da coisa não fosse “era geológica”? Se fosse por exemplo uma “era de sensibilidade cósmica”, essa coisa que você não acha que vive só dentro de uma esfera”. Ele conclui: “Para mim, as cosmovisões têm muito mais alcance que uma apreciação geológica”. 

A jornalista Daniela Chiaretti diz que a grande mídia tem papel importante na exploração e distribuição dessa informação sobre as crises ambientais.  Afirma também que no início das conversas sobre o aquecimento global, havia dificuldade para explicar alguns conceitos: “As convenções que iam ser feitas de clima de biodiversidade. Eu me lembro dos editores falando ‘o que é biodiversidade?’ Daí eu falava ‘é diversidade biológica", ressalta Chiaretti.

Parte da ciência moderna é compreender os pensamentos de comunidades tradicionais. A jornalista do Valor conta sobre sua experiência: “Eu adorei depois tentar traduzir um pouco o pensamento dos povos tradicionais indígenas Isso é Um Desafio". 

Por fim, Ailton Krenak falou sobre sua experiência com o mundo contemporâneo e com as hipocrisias de estar falando desse tema em uma “estrutura ferro, cimento, fazendo os abrigos subterrâneos como se a gente já tivesse no apocalipse nuclear adiantado”. Descalço, o ativista e escritor perguntou qual a verdadeira utilidade e conhecimento acadêmico nessa luta a favor da vida na terra e da vida: “Deveriam fechar, por exemplo, uma faculdade de arquitetura que só reproduz essas coisas de ferro, cimento e vidro. Tá passando um atestado de que ela é incompetente e burra. Porque ela está construindo cemitérios futuristas para todos nós”, afirma Krenak.

O Instituto Moreira Salles dá espaço para exposição que mostra como os povos originários contam suas histórias através do audiovisual.
por
Laura Teixeira e Vitor Simas
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04/04/2023 - 12h

O Xingu é um dos territórios indígenas mais fotografados e filmados no mundo. Sobretudo por olhares quase sempre de uma branquitude que desconhece o protagonismo e a identidade dos povos originários. “Mas hoje nós somos protagonistas da nossa própria história, não conhecíamos o audiovisual, agora conhecemos. Somos donos da nossa imagem e levamos as lutas dos povos do Xingu para museus, festivais, cinemas, redes sociais e exposições”, defende Takumã Kuikur.

Com curadoria de Guilherme Freitas e Takumã Kuikuro, a exposição “XINGU: Contatos” fica aberta ao público até o dia 09.04 no centro de São Paulo e conta como os povos da região do XINGU utilizam equipamentos de audiovisual para registrar sua e forma de ver o mundo para além da visão do homem branco.

Imagem da amostra / Laura Teixeira
Imagem da amostra / Laura Teixeira

A amostra está localizada nos 7° e 8° andar do IMS e lá é possível entender um pouco como câmeras, tripés e lentes chegaram até os indígenas. A maneira como isso é apresentado é bastante plural, sendo possível ter acesso aos textos dos curadores, fotos e vídeos tiradas das populações, até as próprias gravações feitas por elas.

 Ao entrar nas salas ocorre uma desconstrução do imaginário popular do que seriam essas comunidades, já que a história dos povos originários sempre foi narrada pelo viés do homem branco. Os documentos expostos subvertem essa narrativa mostrando desde os rituais até o impacto da exploração do meio ambiente. Há uma humanização daqueles que sempre foram desconsiderados pessoas constituídas de direitos. 

O último andar do prédio é uma área comum que também expõe algumas atrações mais interativas como, por exemplo, quadros com palavras no dialeto de alguns povos e imagens com a tradução para o português. A exposição é gratuita e pode ser visitada de terça a domingo das 10h às 20h, podendo ser acessada até meia hora antes do encerramento. O IMS fica localizado na Avenida Paulista 2424 ao lado da estação Paulista (linha amarela) e Consolação (linha verde). 

Para mais informações acesse: https://ims.com.br/exposicao/xingu-contatos_ims-paulista/

 

 

Poema em homenagem ao Projeto Pindorama da PUC-SP
por
Ricardo Dias de Oliveira Filho
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15/12/2022 - 12h

Rio São Francisco,

Rio Pinheiros,

A aldeia de Caynã Pankararu é favela,

Real Parque, próximo ao Estádio do Morumbi.

 

Morumbi, termo tupi-guarani,

"Morro verde", mas de aspecto concretal.

A aldeia Pankararu é de Pernambuco,

Mas também é Real.

 

Os corpos que habitam essa comunidade,

De luta contínua, de geração a geração,

São mais do que cultura,

Também são tradição.

 

Leroy Merlin,

Shopping Cidade Jardim,

O que antes eram terras indígenas,

Hoje são antros do capitalismo sem fim.

 

Caynã vive, mas a burguesia lhe tirou,

O que antes era lar,

Hoje é Pão de Açúcar,

Não os morros, e sim o supermercado,

Mas ele não se abalou,

Não se sentiu derrotado.

 

A resistência indígena jovem,

Que ele defende desde que se conhece por gente,

Não fortalece apenas Pankararu,

Mas todos os primos, de norte a sul.

 

Apesar da distância, a aldeia continua viva,

Mais de duzentas famílias são periféricas,

Com invasões e truculência policial,

Retornar à aldeia nordestina é cultural,

É espiritual.

 

O ID Jovem traz conforto,

Voltar à aldeia raiz por vinte reais traz o barro sagrado,

A pintura corporal traz o encontro,

Ensinar o sagrado é elevado.

 

Que as escolas Pankararu,

De professores indígenas e não-indígenas,

Ensinem sempre ao seu povo,

Que resistência é essencial,

Ainda mais para a aldeia Pankararu, que é Pernambuco, é Real.

Já é possível vislumbrar a diversidade indígena sendo representada
por
Vitor Simas
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25/11/2022 - 12h

Por Vitor Simas Ribeiro Costa

 

O Brasil é ainda o País com maior número de povos indígenas em isolamento voluntário na América do Sul, segundo o MPF (Ministério Público Federal).A diversidade de etnias e línguas é uma característica das populações indígenas no Brasil, diversos em sua sabedoria e modo de vida. O Censo de 2010 registrou 305 etnias e 274 línguas indígenas. A Funai reconhece a existência de 114 registros de indígenas isolados na Amazônia brasileira. São povos que vivem sem contato frequente ou sem contato nenhum com outros indígenas e com não indígenas.

O censo dos povos indígenas, a fim de atender a diversidade do modo de vida presente nas mais de 305 etnias presentes no Brasil, conta com peculiaridades. O Recenseamento Indígena vai mostrar o número de pessoas indígenas que vivem no País atualmente e as condições das comunidades, com perguntas sobre etnia, línguas faladas, questões de registro civil, arranjo familiar, religiosidade, deficiência, educação, trabalho, situação do domicílio e dos cômodos, assim como de água, saneamento, destino do lixo e acesso à Internet, entre outros.

Em aldeias nas florestas, distante dos centros urbanos, não há ruas com casas em sequência nas aldeias, há recenseador que opte por fazer a coleta de dados por núcleos familiares. Alguns grupos étnicos habitam malocas ou casas sem paredes, por isso, no questionário é aceito que o domicílio não tenha paredes. Outra adaptaçãé a pergunta sobre religião ou culto, presente no questionário da população em geral. Em território indígena, a pergunta é Qual sua crença, ritual indígena ou religião?, para trazer uma caracterização mais ampla da religiosidade dos povos originários.

Essas peculiaridades foram conferidas por quem foi a campo logo no início da coleta de dados dos indígenas para o Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), na Aldeia Lagoinha, em Mato Grosso do Sul. Na aldeia, vivem indígenas da etnia Terena.

Essa edição vai contar com um importante avanço no mapeamento das aldeias, o que amplia a cobertura da pesquisa. Nossa cartografia censitária avançou muito de 2010 para agora. Tivemos acesso a um geoserviço de imagem que nos permitiu detalhar a localização de aldeias e comunidades indígenas de forma muito mais precisa que em 2010. Isso nos garante uma ótima cobertura censitária e que não vamos deixar nenhuma aldeia ou comunidade de fora do Censo, explicou Marta Antunes, coordenadora de Censo de povos e comunidades tradicionais do IBGE.

Nesse contato inicial, é aplicado um questionário sobre a infraestrutura das comunidades indígenas. Essa é a primeira vez que esse tipo de informação será levantada. São perguntas sobre abastecimento de água, de energia e presença de escolas e unidades de saúde. Outras questões são sobre a língua em que as aulas são lecionadas nas escolas, número de professores, hábitos e práticas como a caça, a criação de animais e o artesanato.

O trabalho prévio de mapeamento do IBGE identificou 632 terras indígenas, 5.494 agrupamentos indígenas e 977 outras localidades indígenas, em 827 municípios brasileiros. Caso os recenseadores identifiquem comunidades não mapeadas previamente, elas serão incluídas na pesquisa do Censo. De acordo com o IBGE, os povos em isolamento voluntário não entram no Censo 2022.

Esse mapeamento é de extrema importância para o fortalecimento da visibilidade da existência dos mais diversos grupos étnicos indígenas presentes no Brasil. As equipes do IBGE que vão atuar nos territórios indígenas passaram por um dia a mais de treinamento específico e foram preparadas para a abordagem e possíveis adaptações de metodologia nos questionários. E vão obedecer aos protocolos de saúde, tais como terem tomado as vacinas contra a gripe, a febre amarela e a Covid-19. Devem ainda apresentar teste negativo para Covid-19, declaração de que não teve contato com nenhuma pessoa com sintomas gripais 10 dias antes da entrada em área indígena e usar máscara.

“O Estado é que demarca a terra, é ele que protege os povos indígenas. Ele tem essa obrigação, não é um favor que ele nos faz, é obrigação constitucional de assim proceder. A demarcação é fundamental para que o Estado, a nação, os povos indígenas tenham um limite que ele saiba que sua terra. E os brancos tenham um limite até onde ele pode chegar sem causar mal a esses povos”.  Alerta Sydney Possuelo ex-presidente da Funai em especial Terra Yanomami feito pelo Instituto Socioambiental.

Os povos indígenas têm uma relação muito profunda com a natureza, por isso é tão importante a demarcação de suas terras, por justiça ambiental, social e para a perpetuação de suas tradições e cultura ao longo das gerações.

Alvaro de Azevedo Gonzaga, docente no curso de direito, expõe preconceito sofrido por colega, em evento sobre indígenas no contexto universitário.
por
Guilherme Timpanaro Gastaldi
Guilherme Nazareth
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18/10/2022 - 12h

 

"'E aí, curumim, como é que cê tá?' 'A sua tribo é qual? Os canibais?' 'Eu posso conversar com você, ou você vai me morder?'" Esses foram alguns dos comentários que o professor Alvaro Azevedo Gonzaga escutou vindo de um colega do curso de direito da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) na sala de professores. O docente compartilhou tais acontecimentos no evento promovido pelo programa Pindorama na quinta-feira, 22 de setembro.

O programa Pindorama da PUC-SP, responsável pela promoção de bolsas de estudos para indígenas na universidade, realizou o evento da Retoma Indígena dos dias 19 ao 24 de setembro. As reuniões acontecem desde 2008 de forma anual com organização mútua da coordenação com os alunos da plataforma, apoiadas por siglas como por exemplo o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) e o Núcleo de Gênero, Raça e Etnia, do Curso de Serviço Social.

Em contato via WhatsApp, Amanda Santos Pankararu, assistente social por meio do Pindorama e hoje doutoranda em outra instituição, explicou sobre a expressão definida para o seminário e seu objetivo: "nós fazemos esse evento enquanto programa Pindorama no intuito de dar visibilidade para a presença indígena na universidade. A gente chama de retomada pensando que todo o território é indígena. Então, é um processo de retomar o que é nosso."

A pauta para os encontros foi uma crítica ao bicentenário, comemorando neste ano, da autonomia conquistada pelo Brasil em relação a Portugal, na era colonial - "Independência para quem? Luta e Resistência dos Povos Indígenas". Vanuza Kaimbé nos deu suas impressões gerais sobre a semana comemorativa: "foi de uma riqueza milenar, pois nós somos sabedores da ciência, educação, proteção à vida humana e da mãe terra."

 

22/09 - Bate papo: Como é ser estudante indígena na PUC-SP 

Amanda Santos, mediadora do evento, deu o ponto de largada da conversa pedindo licença a seus ancestrais, àqueles que vieram antes. Em sua introdução abordou o fato de haver poucas pessoas presentes na plateia e questionou, "a gente vai falar de nós para nós e é sempre importante demarcar que esse esvaziamento também é simbólico. Por que não temos aqui pessoas interessadas para discutir, para nos ouvir nesse lugar de saber?"

À respeito do esvaziamento, o outro mediador da mesa, Wesley Pankararu, formado em serviços sociais através do programa Pindorama, também se pronunciou. "A PUC-SP precisa ser cada vez mais 'aldeada' e acho que é muito simbólico que a gente tenha esse esvaziamento. Isso também se reflete nas nossas lutas lá fora. Mostra que as questões indígenas ainda não são pautadas da forma que deveriam, mas a gente ocupar esse espaço aqui também é uma forma de continuar com a nossa resistência, que dura mais de 520 anos."

Nascida na aldeia de Massacará, no sertão da Bahia, Vanuza Kaimbé compartilhou junto à bancada experiências de sua trajetória. "Quando eu entrei no curso de serviço social, já com 45 anos, era uma sala jovens e de pessoas que estavam na segunda, na terceira graduação. Quando eu comecei a fazer os trabalhos acadêmicos, eu senti uma resistência, que as pessoas não queriam fazer o trabalho comigo achando que eu não era capaz." 

Também convidada da mesa, Jaciara Guarani Mbyá abordou em seu discurso a necessidade de irmandade e diálogo entre indígenas e não-indígenas. "Temos que ter respeito a todos, porém quando eu vejo pessoas nos denominando como selvagens, eu fico pensando: que civilização pensa dessa forma? Cadê o humanismo, o amor, o respeito?" E concluiu, "a gente vem nesse mundo para aprender, e enquanto a gente não aprender a conviver bem, a respeitar o próximo e suas diferenças, não vamos evoluir."

Após a fala dos membros da mesa, o microfone ficou aberto ao tímido e modesto grupo de pessoas que ali acompanhavam a conversa. Diante da oportunidade e da presença da estudante Cristiane Fairbanks, da Associação dos alunos de pós-graduação da PUC-SP (APG), o Professor Alvaro de Azevedo Gonzaga aproveitou para propor uma ideia que possa resultar em mudanças efetivas no comportamento do corpo docente da universidade. "Nós podemos propor que na semana de recepção aos professores, exista uma formação anti-discriminatória com relação aos estudantes indígenas, pois os professores ainda partem de um racismo recreativo."

Ao mostrar o dia a dia em aplicativos como TikTok e Instagram, os influenciadores respondem perguntas dos internautas, quebram estereótipos e fazem reidivincações por seus direitos
por
Davi Garcia
José Pedro dos Santos
Pedro Lima
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06/10/2022 - 12h

 

Tukuma Pataxo Reprodução / Digital Favela 

“Quero que as pessoas conheçam essa história, pois é muito mais do que a romantização da luta indígena. Muitas pessoas dizem: ‘Vocês são heróis’, mas não quero ser heroína de nada, quero ter o direito de ser eu mesma e ter a certeza do meu espaço” protesta Alice Pataxó (21), em uma live feita no Instagram. Indígena da Aldeia Craveiro, na Cidade do Prado, na Bahia, Alice é influenciadora digital e manifesta em suas redes sociais a defesa de seus direitos como mulher nas aldeias e luta pelo reconhecimento de seu povo, cobrando direitos e respeito. Além disso, Alice explica sobre pinturas, acessórios e rituais de suas origens. 

Em 2021, a influenciadora participou da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em Glasgow, na Escócia, e ressaltou a importância de “...defender esses territórios, defender a vida”. Alice foi indicada pela ativista paquistanês Malala como “mulheres que levam suas vozes e experiências para o mundo”.  

Por fim, a Pataxó destaca, no COP26, sobre os problemas no Brasil sobre terras indígenas, mas reafirma que não irá desistir: “Essa é a primeira vez que saio do meu território, em um momento em que o Brasil vive uma forte decisão sobre as terras indígenas. Mas eu entendo a necessidade de me unir à juventude do mundo para falar sobre isso, para lutar pelo meio ambiente e criar soluções juntos. Estou orgulhosa de poder voltar para minha casa e dizer para meu povo: não estamos mais sozinhos”. 

 

REUTERS / Christophe Petit Tesson MALALA 

Alice Pataxó / Arquivo Pessoal 

Tukumã Pataxó (22) é outro exemplo de um grande influenciador indígena, sendo ativo em suas redes sociais, contando com mais de 250 mil seguidores no total. Tukumã trabalha como comunicador, é palestrante e host do podcast Papo de Parente, disponível no Globoplay. Além disso, é representante do movimento em prol dos direitos indígenas, produzindo conteúdos voltados a conscientização sobre a urgência em relação a preservação do meio ambiente, desconstrução de estereótipos e distorções históricas. 

Em entrevista para a Fundação Tide, Tukumã descreve os principais desafios que encontra para se comunicar com quem pouco se sensibiliza em relação as pautas indígenas: “Cada plataforma tem uma maneira para você lidar com o público. O Papo de Parente foi algo muito novo para mim, tanto que, quando chegou o convite para participar, falei que não sabia gravar podcasts. Mas topei, pois, era algo que queria aprender. Temos de transmitir a emoção do que explicamos para as pessoas escutarem e tentarem imaginar o que tentamos falar para elas.” 

 Tukumã conta que, em um dia de gravação, ocorreu um confronto na frente da sede da Funai, “No dia da gravação, ocorreu o segundo confronto entre os indígenas e a polícia, quando não deixaram entrar na sede da Funai. Quando parei para almoçar e vi aquilo, sabendo que eu estava no estúdio, em Goiás, e não poderia estar lá.” Ele afirma que ficou ansioso e pensou sobre o que os parentes deles estavam passando enquanto ele estava gravando, após um tempo, o indígena diz que conseguiu falar com o pessoal presente na manifestação e o confronto já tinha se acalmado.