A ascensão das plataformas digitais como palco central da nova política e o desafio da polarização
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
|
27/11/2025 - 12h

 

A imagem conceitual representa a polarização política. FONTE: Shutterstock / Imagem Conceitual

O cenário político contemporâneo foi drasticamente redefinido pela ascensão das redes sociais. O que antes era um mero canal de comunicação secundário transformou-se no principal palco de debate, engajamento e, por vezes, de acirrada polarização. Líderes e figuras públicas, de todas as ideologias, utilizam plataformas como X (antigo Twitter), Instagram, Facebook e TikTok não apenas para disseminar informações, mas para construir narrativas, interagir diretamente com eleitores e moldar a opinião pública.

A Onipresença Digital: Vantagens e Riscos

A presença massiva de políticos nas redes oferece uma série de vantagens:

  • Acesso Direto: Permite uma comunicação sem intermediários com o eleitorado, humanizando a figura pública e criando um senso de proximidade.

  • Mobilização: Ferramenta poderosa para organizar movimentos, manifestações e campanhas de forma rápida e eficiente.

  • Quebra de Monopólio: Diminui a dependência da mídia tradicional, permitindo que políticos e partidos estabeleçam suas próprias agendas.

No entanto, essa "democratização" da comunicação não está isenta de riscos e desafios:

  • Polarização e Bolhas: Os algoritmos das redes tendem a criar "bolhas" de informação, reforçando crenças existentes e expondo os usuários a conteúdo que confirma seus vieses, o que contribui para a polarização.

  • Desinformação (Fake News): A velocidade de propagação e a falta de filtros rigorosos tornam as redes um terreno fértil para a disseminação de notícias falsas, boatos e manipulação de informações, com sérias consequências para o debate público e a democracia.

  • Discurso de Ódio: A anonimidade e a falta de moderação eficaz em algumas plataformas facilitam a proliferação de discursos de ódio, ataques pessoais e campanhas difamatórias.

Foto de uma tela de celular com vários ícones de redes sociais misturados. Fonte: Depositphotos / Mídia Social e Política

Estratégias Digitais em Constante Evolução

A "nova política" é inerentemente digital. Políticos e suas equipes investem pesadamente em estratégias de marketing digital, análise de dados e criação de conteúdo. O uso de memes, vídeos curtos e transmissões ao vivo (lives) são táticas comuns para viralizar mensagens e engajar diferentes faixas etárias.

Observa-se também a profissionalização das equipes digitais, com especialistas em análise de sentimentos, SEO (Search Engine Optimization) e gestão de crises online. A capacidade de responder rapidamente a eventos e narrativas em tempo real tornou-se um diferencial competitivo crucial.

O Futuro da Política e das Redes

O fenômeno dos políticos nas redes sociais é irreversível. O desafio para as democracias é encontrar mecanismos para regular e fiscalizar o ambiente digital sem cercear a liberdade de expressão, garantindo que as plataformas sirvam como ferramentas de fortalecimento do debate público e não de sua deterioração. A busca por um equilíbrio entre a liberdade, a responsabilidade e a moderação de conteúdo continuará a ser um dos temas centrais dos próximos anos, moldando não apenas a política, mas a própria sociedade.

 

Unanimidade da 1ª Turma confirma preventiva e abre caminho para execução imediata da pena de 27 anos
por
Isabelle Maieru
Jalile Elias
Marcela Rocha
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26/11/2025 - 12h

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, manter a prisão preventiva do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro. A decisão, referendada na segunda-feira (24), confirmou o decreto do ministro Alexandre de Moraes que converteu a prisão domiciliar do ex-presidente em preventiva no último sábado (22).

A manutenção da prisão ocorre no momento em que o processo final de condenação do ex-presidente na Ação Penal (AP) 2668 se aproxima do trânsito em julgado, permitindo que o ministro relator determine o início imediato do cumprimento da pena. Bolsonaro está detido na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília.

 

Ministro Alexandre de Moraes discursando na bancada. Fonte: STF (Supremo Tribunal Federal)

 

Argumentos da Corte e Motivação da Prisão Preventiva

A decisão unânime dos ministros da 1ª Turma (Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin) considerou que a prisão preventiva é imprescindível para garantir a ordem pública, assegurar a aplicação da lei penal e coibir o reiterado desrespeito às medidas cautelares impostas.

Os fatores centrais que motivaram a conversão da prisão domiciliar para preventiva são:

  1. Violação da Tornozeleira Eletrônica: A Polícia Federal apontou que o equipamento de monitoramento eletrônico foi violado intencionalmente pelo ex-presidente. Moraes classificou o ato como uma violação "dolosa e consciente", após o próprio Bolsonaro admitir ter usado um ferro de solda na tornozeleira, alegando ter agido sob "surto" e efeito de medicamentos.

  2. Risco de Fuga e Obstrução: O ministro relator citou o risco concreto de fuga, intensificado pela violação do equipamento e pela convocação pública para uma "vigília" em frente à residência de Bolsonaro, feita por um familiar. A Corte avaliou que essa mobilização poderia criar tumulto e facilitar uma eventual evasão.

 

Os Argumentos da Defesa

A defesa do ex-presidente apresentou recursos e pedidos que foram, em grande parte, rejeitados ou considerados prejudicados pela decretação da prisão preventiva.

  • Prisão Domiciliar Humanitária: O principal pleito da defesa foi a prisão domiciliar humanitária, citando o quadro de saúde frágil de Bolsonaro, que inclui gastrite, esofagite e crises de soluços. No entanto, o ministro Moraes considerou este pedido prejudicado com a prisão preventiva, embora tenha determinado o atendimento médico em regime de plantão na PF.

  • Contradições na Condenação: Nos recursos apresentados contra a condenação na AP 2668, a defesa alegou que a decisão foi baseada em provas frágeis e contradições no acórdão, e que o ex-presidente não teve participação direta nos atos que levaram à denúncia.

  • Inexistência de Risco: Advogados argumentaram que a prisão preventiva não se justificava, pois a situação já estava controlada pela prisão domiciliar, e Bolsonaro não representaria um risco iminente à sociedade.

Ex-presidente Jair Bolsonaro em evento público (imagem de arquivo). Fonte: Agência Brasil / EBC

 

A Condenação na Ação Penal 2668 e Execução da Pena

Jair Bolsonaro foi condenado pelo STF a 27 anos e 3 meses de prisão em regime inicial fechado, além de multa (124 dias-multa no valor de dois salários mínimos à época dos fatos), na Ação Penal (AP) 2668.

  • Crimes: O ex-presidente foi condenado, majoritariamente, por ser o líder da organização criminosa que articulou planos para impedir a posse do governo eleito em 2022, sendo réu pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

  • Trânsito em Julgado: O prazo para a defesa apresentar o último recurso contra a condenação encerrou-se nessa segunda-feira (24). Com isso, a Corte confirmou o trânsito em julgado para Bolsonaro.

  • Próximo Passo: O ministro Alexandre de Moraes está liberado para, a qualquer momento, determinar a expedição da guia de execução penal, documento que formaliza o início do cumprimento da pena em regime fechado. A sede da PF é apenas o local inicial da custódia, sendo o Complexo Penitenciário da Papuda, ou outra unidade compatível com sua condição de ex-presidente, o destino mais provável para o cumprimento da sentença.

Nova ferramenta deve integrar informações socioeconômicas relacionadas ao gênero
por
Marcela Rocha
Jalile Elias
Isabelle Maieru
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25/11/2025 - 12h
Foto: José Cruz/Agência Brasil
Ativistas participam da 5ª edição da CNPM. Foto: José Cruz/Agência Brasil

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A 5ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres (CNPM), ocorreu em Brasília entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro. Durante o evento foi anunciada a plataforma DataMulheres, criada pelo governo federal através do Ministério das Mulheres.

Desenvolvida entre uma parceria do Observatório Brasil da Igualdade de Gênero e a Dataprev (empresa vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos), a tecnologia deve integrar informações de gênero e auxiliar procedimentos de pesquisas, observatórios, projetos e demais iniciativas de gestores públicos e instituições nacionais.

O encontro contou com a presença de 4 mil participantes de coletivos, movimentos sociais, deputadas, ministras e outras autoridades, além do oferecimento de palestras, redes de diálogo e stands para a exposição de livros e artesanatos produzidos por mulheres de todo o Brasil.

Na plenária final do evento foram aprovados o relatório de propostas para o novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e 33 moções, com 98% dos votos favoráveis. O resultado quase unânime reflete a assertividade de diálogos previamente realizados nas instâncias municipais e estaduais.

Com o intuito de reconhecer a pluralidade das 100 milhões de mulheres que vivem no Brasil, o texto do relatório foi dividido em 15 temas, entre eles a questão do fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho, igualdade salarial, desigualdades econômicas e raciais, fortalecimento da participação política de mulheres, autonomia econômica e o enfrentamento à violência de gênero.

Durante o evento, a Ministra das Mulheres, Márcia Lopes, afirmou que “a luta não acaba nunca”, sendo necessário construir “não somente o Brasil, mas a América Latina, o Caribe, um mundo de paz”, para que as mulheres sejam livres e em que não haja nenhum tipo de violência contra elas.

Mudanças incluem teto para operadoras, repasse mais rápido e interoperabilidade
por
Antônio Bandeira e Fábio Pinheiro
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24/11/2025 - 12h

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou no dia 11 de novembro o decreto que moderniza as regras do vale-refeição e vale-alimentação dentro do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). As mudanças criam um teto para as taxas cobradas pelos operadores, reduzem prazos de repasse aos estabelecimentos e definem novas obrigações para empresas e bandeiras do setor.

Entenda as mudanças mais importantes:

Redução de taxa: O texto fixa limite de 3,6% para a taxa cobrada dos restaurantes e outros estabelecimentos. Atualmente, segundo o governo, esse percentual chega a 15% em alguns casos. As empresas terão 90 dias para se adequar à nova regra. O decreto também estabelece teto de 2% para a tarifa de intercâmbio e proíbe cobranças adicionais.

Interoperabilidade: Em até 360 dias, qualquer maquininha deverá aceitar cartões de todas as bandeiras. A medida, conforme o Ministério do Trabalho, amplia a concorrência e facilita o uso do benefício pelos trabalhadores e pelos estabelecimentos.

Prazo de repasse aos comerciantes: Os restaurantes e supermercados passarão a receber em até 15 dias após a transação. Antes das novas regras, o pagamento ocorria em cerca de 30 dias, podendo chegar a 60.

Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert
Legenda: Lula durante assinatura do novo regulamento do PAT - Foto/ Por: Ricardo Stuckert

As regras incluem ainda a abertura dos chamados “arranjos fechados”. Empresas que atendem mais de 500 mil trabalhadores terão 180 dias para migrar para sistemas abertos. A mudança deve reduzir a concentração de mercado e permitir que mais credenciadoras participem do sistema.

Além disso, o decreto proíbe práticas consideradas abusivas, como deságios, descontos indiretos, bonificações e vantagens financeiras não relacionadas à alimentação.

De acordo com o governo, mais de 22 milhões de trabalhadores e cerca de 330 mil empresas cadastradas no PAT serão afetados. O valor do benefício não muda e segue exclusivo para compra de alimentos.

Para o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, o decreto corrige distorções que vinham sendo cobradas por restaurantes, mercados e padarias. Ele afirmou que o governo discutiu o tema por dois anos com empresas e representantes do setor, mas não houve consenso para um acordo.

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados, João Galassi, disse que a medida aumenta a concorrência e deve melhorar o valor final disponível para o trabalhador. Segundo Galassi, a redução da intermediação permitirá que mais pequenos estabelecimentos aceitem os vales.

O decreto cria ainda um comitê gestor para acompanhar a implementação das novas regras, fiscalizar práticas abusivas e definir parâmetros técnicos para o funcionamento do sistema.

Congresso irá analisar nesta quinta-feira (27), os 63 vetos feitos pelo presidente Lula
por
CRISTIAN FRANCISCO BUONO COSTA
Antônio Bandeira de Melo Carvalho Valle
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24/11/2025 - 12h

A votação dos vetos ao novo marco do licenciamento ambiental virou um dos temas centrais da agenda do Congresso para novembro. Deputados e senadores se reúnem no dia 27 para decidir se mantêm ou derrubam os 63 trechos barrados pelo presidente Lula na lei sancionada em agosto. O resultado importa porque define até onde o país flexibiliza ou reforça o controle sobre atividades que causam impacto ambiental.

O licenciamento sempre foi o principal instrumento de fiscalização ambiental no Brasil. Ele estabelece quais estudos cada empreendimento precisa apresentar; quais riscos devem ser controlados e quais condicionantes precisam ser cumpridas. O processo costuma ser longo e heterogêneo entre estados, e por isso o Congresso discute há anos uma lei geral que dê mais previsibilidade.

A proposta aprovada em maio deste ano avançou justamente nessa direção: criou regras nacionais, previu modalidades mais simples — como a licença única (LAU) e a licença por adesão e compromisso (LAC) — e dispensou determinadas atividades do processo formal de licenciamento.

Os vetos do governo miraram pontos considerados sensíveis. O Planalto argumenta que alguns trechos ampliavam exageradamente as dispensas, reduziam a fiscalização e fragilizavam compromissos ambientais assumidos pelo país. A justificativa foi a mesma em outras áreas: garantir proteção ambiental sem abandonar a segurança jurídica para o setor produtivo. Entre os vetos estão dispositivos que tratavam da dispensa de licenciamento para obras de manutenção em estradas, linhas de transmissão e linhas férreas, e regras mais amplas para empreendimentos agropecuários.

Parlamentares contrários aos vetos dizem que as restrições prejudicam obras estruturantes e atrasam investimentos. Para eles, trechos barrados pelo Executivo traziam justamente o alívio burocrático que falta para modernizar o setor. O debate ganhou ainda mais força porque a lei entra em vigor em fevereiro de 2026 e o Congresso quer definir o texto final antes disso. Também pesa o cenário político: o tema aparece na agenda de eventos internacionais de clima, e o governo tenta apresentar avanços em governança ambiental.

A votação deve mostrar qual será o equilíbrio escolhido pelo Legislativo para os próximos anos. Manter os vetos significa reforçar o papel fiscalizador do licenciamento, enquanto derrubá-los abre espaço para uma lei mais permissiva, com processos mais rápidos e menos pontos de controle. Para estados, municípios, empreendedores e órgãos ambientais, o resultado define como novos projetos, como o de hidrelétricas, estradas, etc, serão avaliados a partir de 2026.

Em ano de eleições municipais, a Justiça Eleitoral repagina suas normas e aposta em novas regulamentações para enfrentar o cenário informacional
por
Marina Jonas
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22/03/2024 - 12h

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) inaugurou o Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia (CIEDDE) na terça-feira (12). Comandado pelo presidente da Corte, ministro Alexandre de Moraes, tem como objetivo promover uma educação voltada à cidadania, aos valores da democracia e aos direitos digitais e, principalmente, combater o discurso de ódio, o discurso antidemocrático e a desinformação no que se diz respeito às eleições de 2024. 

Para concretizar sua meta, o CIEDDE irá atuar de forma coordenada com órgãos públicos e entidades privadas, mais especificamente com plataformas de redes sociais e serviços de mensageria privada. A cooperação está prevista para acontecer durante o período eleitoral, exclusivamente, e visa assegurar o cumprimento das regras estabelecidas pelo TSE acerca dos anúncios realizados por candidatos e partidos políticos durante a disputa.  

A Resolução nº 23.610/2019 do TSE sobre publicidade eleitoral, a qual já existe desde 2019, foi recentemente alterada pelo órgão, o que se concretizou por meio da inclusão de normas voltadas à regulamentação do uso de inteligência artificial (IA) no processo eleitoral brasileiro. Para realizar essa mudança, foram ouvidas diversas sugestões de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), partidos políticos e entidades da sociedade civil em audiências públicas no mês de janeiro. Entre as principais normas, destacam-se a que institui a necessidade de identificação quando houver o uso de IA para alterar conteúdos multimídia, ou seja, uma regra de rotulagem e a que veda completamente o uso de deep fakes, seja em vídeo, em áudio ou mesmo uma combinação dos dois. 

Com a introdução de tantos recursos tecnológicos potentes inovadores, mudanças na comunicação são inevitáveis, podendo ser essas tanto positivas quanto negativas, tudo depende da forma com que os internautas utilizam dessas ferramentas.

O fato é que a manipulação de conteúdos de áudio e vídeo por uso de inteligência artificial está cada vez mais acessível e, portanto, comum nas mídias digitais. Os softwares que produzem as então chamadas deep fakes conseguem fazer com que os conteúdos gerados tenham aspecto extremamente realista, tanto que ainda não é tecnologicamente possível detectá-los, como se esperava. Esses conteúdos, por sua vez, têm alto poder de enganação sobre o eleitor, que passa a acreditar naquilo que vê e ouve. 

Nina Santos, pesquisadora na área de comunicação e informação digital, explica que ainda não há um parâmetro internacional bem definido do que outros países estão fazendo para lidar com a problemática da IA no cenário eleitoral e que, portanto, o que a Justiça Eleitoral brasileira propõe às disputas municipais deste ano através da nova resolução de propaganda que foi aprovada é muito positivo. 

Ao mesmo tempo, Santos também ressalta que não é apenas nesse contexto em que deve-se preocupar em criar normas. “Assim como as eleições, a vida política cotidiana também é muito importante. Então, da mesma forma em que acontece no Judiciário em relação ao período eleitoral, precisamos ter um processo no Legislativo, na Câmara e no Senado, em que as deputadas e deputados mobilizem as suas bases, façam discussões amplas e construam uma política para lidar com a inteligência artificial em todos os momentos da nossa vida, não só na disputa política”, explica a pesquisadora. 

 

​  Ministro Alexandre de Moraes discursando na inauguração do CIEDDE no TSE. Foto: Luiz Roberto  ​
Ministro Alexandre de Moraes discursando na inauguração do CIEDDE no TSE. Foto: Luiz Roberto

 

Inauguração

Realizada no próprio edifício-sede do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, a cerimônia de inauguração se iniciou com o discurso do ministro Alexandre de Moraes, no qual explicou que cada Tribunal Regional Eleitoral já tem o seu órgão que cuida da desinformação, mas que será dada mais uma competência a ele, a qual será o canal de ligação com o Centro. “Teremos uma rede de 27 TREs em comunicação online 24 horas por dia com o CIEDDE, para garantir a liberdade do eleitor na hora de votar e para garantir com que o mal uso da IA, as fake news e as deep fakes, possa ser combatido nas eleições”, completa.  

Em sua fala, Mores também traça as metas e as expectativas do TSE para com o sistema integrado de combate à desinformação e defesa da democracia inaugurado. “Todos os parceiros irão atuar neste conjunto de troca de informações, de ideias e de estudos, para que a Justiça Eleitoral possa novamente garantir eleições tranquilas, transparentes, que garantam que o voto que o eleitor deposite na urna eletrônica é o voto apurado; mas mais do que isso, que o eleitor irá apertar o número de sua preferência tendo todas as informações verdadeiras, ele não sofrerá um abuso de desinformação. E, se isso ocorrer, aqueles que o fizerem serão responsabilizados, inclusive com a cassação do registro ou a cassação do mandato”, afirma o ministro. 

 

Convidados

Para participar do Centro, foram convidados a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Para firmar essa parceria, as instituições também assinaram Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) durante a inauguração. 

Ministro Alexandre de Moraes discursando na inauguração do CIEDDE no TSE. Foto: Luiz Roberto
Inauguração do CIEDDE no TSE. Foto: Luiz Roberto

 


 

Sancionada em 2006, o dispositivo é responsável por proteger vítimas da violência doméstica e acrescentou medidas nos últimos anos
por
Amanda Furniel
Giuliana Zanin
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20/03/2024 - 12h

A Lei Maria da Penha, uma medida de prevenção e punição em caso de violência doméstica, foi sancionada em 7 de agosto de 2006. Dezessete anos depois, em 2023, o Brasil ainda é o quinto país com mais casos de violência contra mulher, com 3.181 denúncias contra parceiros e parentes. 

A Lei determina que todo caso de violência dentro de casa e por familiares é crime, sendo julgados nos Juizados Especializados de Violência Doméstica Contra a Mulher. Nos últimos cinco anos, houve pelo menos oito coberturas incluídas no projeto, dentre elas, o afastamento imediato da vítima do ambiente de violência sem a prescrição doboletim de ocorrência (B.O.) e a proteção de mulheres transgêneras.

 

Mas, afinal, quem é Maria da Penha?

Maria da Penha Maia Fernandes foi vítima de duas tentativas de feminicídio em 1983. Na primeira, enquanto dormia, seu então marido atirou contra a suas costas, o que a deixou paraplégica. Quatro meses após uma recuperação intensiva da tragédia intencionada que quase tirou a sua vida, o ex-parceiro tentou eletrocutá-la durante o banho, enquanto a mantinha em cárcere privado. Depois de muita luta, a família e os amigos de Maria conseguiram tirá-la de casa e das mãos do agressor.  

 

O caso de Maria da Penha levou ao todo 19 anos e seis meses de disputas judiciais. O agressor chegou a ser sentenciado à prisão duas vezes, com penas de 10 e 15 anos, mas nenhuma das sentenças foi cumprida por falhas na justiça. Na primeira, em 1991, os advogados do réu anularam o julgamento e, na segunda, em 1996, o réu foi condenado a dez anos e seis meses, mas recorreu e acabou passando apenas cerca de dois anos preso. 

 

Origem da Lei 

Após um ultimato da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), em 1998, o Estado Brasileiro foi denunciado e responsabilizado por “negligência, omissão e tolerância” em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. 

O caso de Maria de Penha passou a ser tratado como uma violência contra a mulher por razão de gênero, mas, em 2002, foi formado um Consórcio de ONGs Feministas para reivindicar a elaboração de uma lei especializada no combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Depois de debates e reivindicações dentro dos tribunais, o Projeto de Lei n. 4.559/2004, da Câmara dos Deputados, chegou ao Senado Federal (Projeto de Lei de Câmara n. 37/2006) e foi aprovado por unanimidade em ambas as Casas. A Lei Maria da Penha (Lei N. 11.340) foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.  

Como uma das recomendações do CIDH foi uma reparação simbólica e material à Maria da Penha, o Estado do Ceará pagou uma indenização a ela e o Governo Federal nomeou a lei em reconhecimento e homenagem à sua luta contra a violação dos direitos humanos das mulheres.  

Em 2015, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que a Lei Maria da Penha diminuiu em 10% a taxa de feminicídio cometidos pelos agressores dentro da residência das vítimas. 

A legislação trouxe avanços e amparos para as mulheres brasileiras. Além de tipificar a violência doméstica, ela oferece medida protetiva com o afastamento do agressor da vítima e seus familiares, proíbe aplicação de penas pecuniárias, (ou seja, não pode ser paga por multas ou doações de cestas básicas), oferece auxílio para a mulher caso ela seja financeiramente dependente do agressor e amplia a pena do agressor de um a três anos de cadeia caso a mulher vítima seja deficiente.  

 

Mudanças e inclusões 

Desde 2019, outras medidas foram acrescentadas à Lei Maria da Penha, entre elas:  

  • Lei nº 13.827/19, que permitiu a adoção de medidas protetivas de urgência e o afastamento do agressor do lar pelo delegado;   

  • Lei nº 13.836/19, tornando obrigatório informar quando a mulher vítima de agressão doméstica ou familiar é pessoa com deficiência;  

  • Lei nº 13.871/19 determina como responsabilidade do agressor o ressarcimento dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados; 

  • Lei nº 13.894/19, que atribuiu ao Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a ação de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável. A norma também estabeleceu a prioridade de tramitação dos procedimentos judiciais em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar;

  • Lei nº 13.984/20, estabelecendo obrigatoriedade referente ao agressor, que deve frequentar centros de educação e reabilitação e fazer acompanhamento psicossocial;

  • Lei nº 14.132/21 inclui um artigo no Código Penal (CP) para tipificar os crimes de perseguição (stalking);

  • Lei n° 14.164/21, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para incluir conteúdo sobre a prevenção à violência contra a mulher nos currículos da educação básica, além de instituir a Semana Escolar de Combate à Violência Contra a Mulher, a ser celebrada todos os anos no mês de março;

  • No primeiro semestre de 2022, a Sexta Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a Lei Maria da Penha seria aplicada também em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgêneras. 

 

Os números não param de crescer

Em 2023, o Brasil registrou 1.463 casos de feminicídio, crime em que o assassinato de uma mulher ocorre pelo simples fato de ser mulher, ou seja, uma mulher a cada seis horas era assassinada. No mesmo ano, a cada 24 horas, oito mulheres foram vítimas de violência doméstica, segundo o boletim "Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver".

​De acordo com a ONU, sete a cada 10 mulheres no mundo já foram ou serão vítimas de violência de gênero em algum momento da vida. No mundo, de acordo com a OMS e a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, a estimativa é de que 35% dos feminicídios são cometidos por seus parceiros, ao passo que 5% dos homicídios de homens são praticados por suas parceiras.

 

Presidente reúne ministros para avaliar resultados da educação, economia e saúde e demonstra-se insatisfeito com os dados analisados de 2023, apesar dos resultados positivos
por
Giuliana Zanin
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20/03/2024 - 12h

O salão do Palácio do Planalto esteve movimentado na última segunda-feira (18). O presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, uniu a bancada do seu governo e a imprensa para a primeira reunião ministerial do segundo ano de mandato do petista. 

A apresentação foi realizada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, que fez o balanço geral dos eixos sociais, divididos em: cuidando das pessoas, cuidando da cidade, do urbano e do rural, economia e investimentos e  democracia. 
 

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A reunião aconteceu no Palácio do Planalto e estava aberta à imprensa. Foto:Ricardo Stuckert.

O presidente, na sua primeira fala, afirmou que “essa recuperação é apenas o início, mas isso não basta. Nós vamos fazer com que as pessoas consigam alcançar um degrau da classe social desse país”.

Lula comentou sobre as mudanças feitas ao longo do último ano no corpo ministerial. Dos 38 ministros presentes, quatro cadeiras foram alteradas desde a reforma ministerial: 

Gonçalves Dias, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que pediu para ser afastado após boatos de envolvimento com a invasão de um dos prédios da Praça dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro de 2023. Daniela Cordeiro, ex-ministra do Turismo, que constituiu a cota do partido União Brasil, pediu desfiliação da sigla alguns meses depois, e Ana Moser, ex-ministra do Esporte, que foi exonerada após ser desaprovada em discussões sobre investimentos com esportes eletrônicos. Por último, Flávio Dino, que liderava o ministério da Justiça e Segurança Pública, foi promovido à cadeira do Supremo Tribunal Federal (STF), por escolha de Lula, e quem o sucedeu foi Ricardo Lewandowski, ex-político dos outros governos do petista.

O presidente falou sobre os acontecimentos que envolveram a tentativa de golpe em Brasília em 8 de janeiro do ano passado e os últimos resultados das investigações que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro e próximos a ele.

“Nós precisamos resolver uma questão mais séria que é a consolidação do processo democrático. A democracia precisa ser uma coisa fundamental na nossa vida. É preciso ter respeito com as instituições e com a nossa Constituição, que foi a mais participativa na história desse país.”, afirma. 

Outra questão abordada foram as metas do Governo até 2026: a relação harmônica entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário; e a demonstração prática de que democracia não é só para quem está na política e o povo com melhores condições de estudo e alimentação. Lula é convicto: “eu tenho certeza que nós cumpriremos com a nossa meta até o fim do mandato”.

As principais mudanças no último ano foram:

  • retomada de programas sociais (Bolsa Família, Minha casa Minha vida, Farmácia Popular, Bolsa Atleta, bolsa de pesquisa e pós-graduação);

  • aumento pelo segundo ano consecutivo do salário-mínimo, que foi aprovado para R$1.412 e;

  • Volta do Ministério da Cultura e iniciativas públicas e privadas para a movimentação do setor.

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O Governo Lula aumentou o investimento em verba para os setores do primeiro setor. Imagem: Reprodução/Câmara dos Deputados.

 

BALANÇO DO PRIMEIRO ANO EM EIXOS 

Os dados apresentados por Rui Costa declararam a menor taxa de desemprego desde 2014, além do retorno da política de valorização do salário mínimo - o maior desde o plano real - e a retomada do Bolsa-Família (BF), com a aprovação de transferência de renda para familiares.

Na área da saúde, o número de médicos em UBSs cresceu 85%, de 13.726 para 25.421. Houve também a volta do Farmácia Popular, com preços acessíveis e gratuidade de remédios, além da ampliação de repasses de recursos aos estados e municípios em 20%. 

Na educação, o reajuste no valor da merenda escolar para municípios e estados saltou para quase 5.300 milhões de reais, equivalente a 48%.

O incentivo à cultura pela Lei Rounet evoluiu para 255% propostas numéricas financiadas pelas empresas públicas e privadas. Também houve aumento da Bolsa Atleta em 22% e da Bolsa Pós-Graduação e Pesquisa (CNPQ e CAPES) em 41%.

Sobre o cuidado da cidade, do campo e do ambiente, o ministro apresentou dados de redução de pelo menos 41% do desmatamento na Amazônia. No entanto, o Governo enfrenta dificuldade na fiscalização dos biomas mais afetados, como o Cerrado, com o desmatamento e o garimpo. Exibiu também o novo Plano Safra, com aumento de 11%, equivalente a 344 bilhões de reais investidos em exportação do agronegócio e agricultura familiar.

Os investimentos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) deram o que falar entre os ministros com a retomada do orçamento público e os incentivos das empresas comentado por Rui Costata. O ministro Rui Costa afirma que a relação do setor privado nos aportes à infraestrutura, ciência e tecnologia e ao agronegócio firmará “o maior investimento da série histórica brasileira”.

Outra promessa feita pelo Governo é o aumento de 80% no padrão de qualidade nas rodovias federais. Em 2023, houve um aumento de 52%.

Sobre a democracia brasileira, dados apresentaram a diminuição de 52% da violência contra jornalistas. “O respeito à imprensa é o pilar da democracia”, afirmou o presidente da República.

O ministro-chefe da Casa Civil também frisou a importância do posicionamento do governo brasileiro em assuntos internacionais. Segundo ele, retomar as relações sociais com o exterior "aumenta a qualidade da sociedade no geral”.

Rui Costa finalizou a reunião garantindo que o corpo ministerial trabalhará para que, em janeiro do ano que vem, os investimentos e as mudanças que, segundo ele, o presidente coordena para o crescimento do Brasil sejam apresentados em gráficos completos.

Projeto aprovado pelo Senado proíbe a utilização ou a posse de entorpecentes em qualquer quantidade
por
Giuliana Zanin
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15/03/2024 - 12h

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) concordou com a penalização do uso ou do porte de qualquer substância que tenha potencial de dependência química, em votação simbólica, na última quarta-feira (13). Apoiado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o relatório de Efraim Filho (União Brasil-PB) irá ao plenário da Casa, órgão máximo de decisões, e, caso seja aprovado, passará pela Câmara dos Deputados. Essa é uma reação ao Supremo Tribunal Federal (STF), que está discutindo a descriminalização da maconha para uso pessoal e a distinção dos termos “traficante” e “usuário” para diferenciação das penalizações.

O texto do Projeto de Emenda Constitucional insere na Constituição um trecho da Lei de Drogas de 2006 e estabelece que usuários não serão presos por utilizar ou transportar drogas, mas estarão cometendo um crime sujeito a penas alternativas julgadas pelo Judiciário. Foram contra a aprovação Humberto Costa (PT-PE), Fabiano Contarato (PT-ES), Jaques Wagner (PT-BA) e Marcelo Castro (MDB-PI).

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A sessão na CCJ finalizou com 34 a favor à criminalização e 3 contra.Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

A decisão da proposta impacta na relação política entre o Legislativo e o Judiciário. A AGEMT reportou a última sessão realizada no STF sobre o tema, na semana passada. Apesar da paralisação temporária a pedido do ministro Dias Toffoli, a votação acabou 5 a favor da descriminalização da maconha com regras determinadas e 3 contra. 

Enquanto no Senado, o relator do PEC retoma a sua opinião. “É preciso coibir o que for possível, que exploda o consumo através da liberação. Também é nocivo a questão da segurança pública. A gente sabe que a aquisição da droga é feita no tráfico e o tráfico financia o crime organizado, que é responsável pela escalada da violência, hoje, na sociedade. Por esse motivo, o parecer é contrário à descriminalização das drogas e esperamos ter essa ampla maioria para sua aprovação”.

 Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) argumenta sua posição contrária: "Nós temos uma população carcerária no Brasil que saltou de 58,4% para 68,2% de pessoas pretas e pardas. Nós temos fontes que um branco no Brasil, para ser definido como traficante, tem que ter 80% a mais de substância do que um negro. É o Estado criminalizando a pobreza e a cor da pele”. O parlamentar se refere aos números dos estudos da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), que analisa ocorrências envolvendo posse de drogas em São Paulo.

 A diferenciação dos termos “traficante” e “usuário” para determinar a personalização das penas - uma das pautas no STF -, tem movimentado o debate social e racial. A discussão começou na Casa Alta Judiciária, depois da falta de acordo legal para determinar a classificação quantitativa da maconha para uso e tráfico, além de reforçar o histórico racista presente nesse tema, na tentativa de cumprir com a seguridade social.

A “guerra às drogas”, termo cunhado nos EUA durante a governança de Richard Nixon, que declarou “o uso abusivo de drogas é o inimigo número um dos Estados Unidos”, se popularizou pelo mundo. No Brasil, essa condição estabeleceu que a militarização e o alto índice de violência funcionariam como estratégias para alcançar um dos maiores desafios do Estado: “a Segurança Pública no combate ao crime organizado”, fala do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva durante entrevista coletiva sobre ações na área de Segurança Pública no Rio de Janeiro e em São Paulo, no Palácio do Planalto, em 1º de novembro de 2023. 

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Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023. Infográfico: Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Números do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram a atuação dos policiais diante de apreensões de acusados do tráfico ou posse de drogas. O perfil da pessoa privada de liberdade é negro, entre os 18 e 34 anos e do sexo masculino. Além disso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou, em outubro do ano passado, que negros são mais alvos de prisões por tráfico de drogas em casos flagrantes feitos a partir de rondas policiais, alegando “indivíduo com atividade suspeita”. 

O ministro de Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, comentou o assunto na Organização das Nações Unidas (ONU), em fevereiro do ano passado: “Temos que tratar isso como uma questão de saúde pública, como uma questão que não se resolve por meio do encarceramento, com prisão e com punição”. Ele acrescentou que enxerga a descriminalização das drogas como uma forma de diminuir a pressão do sistema carcerário brasileiro, que enfrenta superlotação a cada ano. Em 22 anos, o número de presos aumentou 257%, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.

 

Mesmo com reações contrárias a decisão, deputado confia em um mandato múltiplo
por
Nathalia de Moura
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15/03/2024 - 12h

A Câmara dos Deputados elegeu 19 presidentes para as 30 comissões permanentes, em sessão realizada em Brasília, na última quarta-feira (6). Um dos resultados que mais chamou a atenção foi a escolha do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) como presidente da Comissão de Educação. Ele recebeu 22 votos favoráveis de um total de 37, com 15 votos em branco, e irá presidir uma das Comissões mais importantes da Câmara por um ano, substituindo o deputado Moses Rodrigues (União-CE).

As Comissões

As Comissões Permanentes da Câmara são constituídas por deputados para discutir e avaliar projetos de lei referentes a cada tema, além de fiscalizar e acompanhar as ações administrativas. O objetivo das Comissões Permanentes é garantir o rápido trâmite das propostas de lei e assegurar que elas sejam compatíveis com a Constituição Federal e com as legislações locais, trazendo também qualidade ao processo legislativo.

 

Antes das propostas irem para o Plenário, cada comissão envia um parecer sobre elas, mas, em alguns casos, ela é avaliada e quem constitui a comissão decide se será aprovada ou rejeitada, sem necessidade de encaminhar ao Plenário da Casa. 

Os líderes dos partidos políticos indicam os membros que possuem representação nas Casas Legislativas, mantendo um equilíbrio em cada comissão. Estar na presidência das comissões é importante, pois o presidente irá pautar as propostas que serão avaliadas. 

Mesa com 5 homens e 1 mulher. Todos com vestimentas sociais.
22/06/2017- Brasília-DF, Brasil - Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a Previdência em audiência pública. Foto: Marcelo Camargo/EBC

 

Comissão da Educação

A Comissão de Educação (CE) é uma das mais importantes da Casa. O objetivo é atribuir pautas sobre assuntos importantes relacionados à educação num contexto geral, falar sobre a política e o sistema educacional, os aspectos funcionais, legais e estruturais, além de tratar sobre o direito à educação e os recursos, tanto financeiro quanto humano, no setor.

Em 2023, a CE aprovou projetos que garantem equipamentos para a educação digital nas escolas públicas e a instalação de laboratórios de informática, matemática e ciência nas instituições de ensino. Além disso, foi aprovada a proposta de lei que estimula professores da educação básica a se especializarem ou tornarem-se mestres e doutores. Segundo o projeto, as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) devem ofertar pelo menos 20% das vagas em cursos de pós-graduação para esse grupo. 

Nikolas, que foi eleito em 2022 com o maior número de votos do país, é ligado a pautas conservadoras e já esteve envolvido em acusações de transfobia, apoio a discursos golpistas e muitos outros episódios polêmicos. Agora, tem o dever de atuar em uma área em que não tem familiaridade desde que assumiu seu mandato. 

Opiniões divergentes

Houve muitas manifestações referentes à indicação de Nikolas para a presidência da Comissão. 

A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) alegou ser inconcebível ele ocupar esse cargo. “Ele é réu no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em função de um vídeo que ele gravou de uma estudante de 14 anos que estava utilizando o banheiro.[...] Ele atentou aos direitos de uma criança, inclusive, ferindo o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]”. 

Fernanda Melchionna, deputada pelo PSOL-RS, fortaleceu os argumentos de sua colega contra a decisão, relembrando que Nikolas foi condenado em primeira e segunda instância por transfobia e finaliza: “é grave que a Comissão da Educação, que trata de tantos temas importantes, esteja presidida pelas trevas”.

Pessoas reunidas em uma sala, com a cara séria. Todas usam roupas sociais
Deputados em sessão da Comissão da Educação da Câmara - Foto: Leandro Rodrigues/ASCOM-Sâmia Bomfim

O deputado Marco Feliciano (PL-SP) defendeu seu colega de partido, afirmando que Nikolas não é inimigo da educação como disseram, mas “inimigo da esquerda, do mimimi e daqueles que querem a legalização das drogas”.

Também apoiando o atual presidente da Comissão, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) enfatiza que o PT (Partido dos Trabalhadores) teve a oportunidade de indicar um membro para o colegiado da Educação, porém, optou por representar a Comissão da Saúde. “Eu tenho certeza de que o deputado Nikolas, o nosso indicado do partido, vai ter diálogo com todos, vai respeitar o governo, vai respeitar o Partido dos Trabalhadores, e a pauta será consensual, até porque senão a comissão não andaria.”, concluiu. 

Diversos sindicatos que atuam pelos interesses de docentes de vários estados brasileiros como Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro repudiaram a eleição do deputado mineiro. O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) publicou uma nota de repúdio, afirmando que a educação, sendo um tema prioritário para o Brasil, não pode ter no comando um deputado que defende pautas extremistas e misóginas. “Compete ao presidente de uma Comissão dessa magnitude pautar e debater as grandes e inadiáveis questões de nosso, já há muito debilitado e preterido, sistema educativo, do fundamental ao superior. O eleito, neste caso, além de desconhecer nossos desafios educacionais, faz deboche e agride o bom senso de quem tem compromisso com a educação”, diz a publicação.

A Frente Parlamentar Mista da Educação (FPME), que é composta por deputados federais e senadores e atua defendendo a qualificação do ensino público aos cidadãos brasileiros, promovendo debates de políticas públicas nacionais e legislações em conjunto com órgãos públicos e representantes da sociedade, também demonstrou preocupação com a eleição de Nikolas Ferreira para o cargo.

De acordo com o comunicado divulgado, “o parlamentar não tem atuação na área ou profundidade para conduzir os trabalhos em um tema que é central para o desenvolvimento do País.” A FPME acrescenta que o ano de 2024 será importante na educação, pois matérias como o Novo Ensino Médio serão debatidas e o presidente da Comissão deve ser comprometido com a urgência e a seriedade dos temas. A Frente Parlamentar finaliza a mensagem ressaltando seu compromisso com a educação de qualidade para todos: “o momento exige um diálogo construtivo e ações afetivas que estejam alinhadas com as necessidades reais do País.” 

Os planos do novo presidente 

Logo após ser empossado na presidência da CE, Nikolas Ferreira anunciou algumas pautas que pretende priorizar em seu mandato. O deputado falará sobre o homeschooling, termo em inglês para ensino domiciliar, e o Plano Nacional da Educação. Ele também citou que irá fiscalizar a educação no governo atual, tratará da violência nas escolas e que serão realizadas audiências públicas, contando com a presença da sociedade. “Nós vamos fazer uma comissão bastante plural no debate de ideias e pensamentos, acredito que seja muito importante”, finaliza.

 

Crise na pauta educacional 

O cientista político e professor no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) Rafael Cortez entende que, no momento, o tema “educação” talvez seja o que mais separa governo e oposição. “O debate sobre questões educacionais ganhou um certo cunho moralista e se conecta com outros pontos que intervieram para a direita criticar a esquerda, a partir das emergências do bolsonarismo”. Para ele, a educação como política pública não diz respeito somente ao aperfeiçoamento do ensino público brasileiro ou a caminhos para subir nos rankings de avaliação, mas ganhou espaço nos debates públicos referentes a essas questões “por ser uma caixa de ressonâncias dessas diferenças de abordagem no campo moral, que ficaram mais fortes ao longo do governo Bolsonaro.” 

O professor comenta que a tendência é ter conflitos mais abrangentes entre governo e oposição na Comissão, já que o deputado Nikolas Ferreira, um dos grandes representantes do bolsonarismo, irá presidi-la. É plausível considerar também que o Partido Liberal (PL) tenha indicado o mineiro justamente por ele ter o histórico em enfrentar as pautas da oposição. “Me parece ser uma forma de aumentar a visibilidade pública dos acontecimentos da Comissão. [...] Pode estar presente a estratégia do partido em colocá-lo na presidência da Comissão e eventualmente prepará-lo para voos eleitorais em 2026”, destaca. 

Com as opiniões contrárias à eleição do deputado, Rafael acredita que Nikolas deverá se adaptar a essa pressão, dependendo também de quem irá compor o colegiado, para entender até onde os conflitos podem ser mais tumultuados. “Olhando o ponto de vista dos movimentos sociais, das organizações de interesse, a tendência é um cenário bastante conflituoso ao longo de 2024”, finaliza o cientista político.