Congresso quer investigar as fraudes contra aposentados e pensionistas
por
Marcelo Barbosa
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28/05/2025 - 12h

Parlamentares da oposição ao Governo Lula fizeram um pedido formal, na terça-feira (13), para a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). O objetivo é examinar as irregularidades ocorridas nas folhas de pagamento associadas ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).

O pedido foi feito após a Polícia Federal descobrir um esquema criminoso de fraudes e desvios de dinheiro nas aposentadorias do INSS. De acordo com a PF, o esquema ocorreu da seguinte forma: associações ofereciam serviços aos aposentados e falsificavam assinaturas para autorizar descontos na folha de pagamento do benefício. 

O relatório emitido pela PF indica que servidores públicos do INSS recebiam propina para o fornecimento de dados de aposentados. No total, é estimado que tenha acontecido uma fraude de mais de 6 bilhões de reais.

O pedido de CPMI foi protocolado pela ex-ministra de Jair Bolsonaro e atual senadora, Damares Alves (Republicanos) e pela deputada federal Coronel Fernanda (PL), do Mato Grosso. Elas conseguiram assinaturas de 223 deputados e 36 senadores – o suficiente para a abertura. Quem decide se a CPMI vai ser aprovada é Davi Alcolumbre, presidente do Senado. Caso seja aprovada, a comissão será composta por 15 deputados e outros 15 senadores. O grupo que irá compor a CPMI terá um orçamento de 200 mil reais e 180 dias para realizar as investigações.

Quem é investigado?

O pedido cita diferentes nomes supostamente envolvidos. Entre os de maior destaque está o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto. Ele foi indicado pelo Ministro da Previdência, Carlos Lupi. Stefanutto foi demitido no dia 23 do mês passado. Além dele, houve o afastamento de outros cinco funcionários públicos. No entanto, a PF apontou que a figura central do esquema é o lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, que possui mais de 20 empresas associadas ao escândalo e que obteve movimentações milionárias nas contas particulares, que chegaram a 24,5 milhões de reais. 

Nomeada de “Operação Sem Desconto”, ela já está causando impactos internos no governo, que suspendeu os acordos de cooperação técnica, dando fim a organizações da sociedade civil que cobram mensalidades associativas descontadas de beneficiários do INSS.

A operação entrou em uma nova fase na quarta-feira (14). A Polícia Federal realizou, em Presidente Prudente, uma segunda fase da investigação. Dois empresários ficaram na mira, sendo eles um homem, que é assessor de uma associação, e a esposa dele. A PF alega que vai investigar a relação dessas pessoas com a Confederação Nacional de Agricultores Familiares Rurais.

O que será feito a partir de agora?

O INSS suspendeu todos os descontos e fez a promessa de que haveria uma devolução do dinheiro, sem detalhar como isso será feito. Desde então, o Governo passou a elaborar estratégias para conseguir fazer o reembolso para as vítimas. A primeira fonte de recursos serão os valores bloqueados das instituições investigadas.

 

Decisão unânime concede à ex-presidenta o valor máximo de reparação previsto em lei
por
Carolina Zaterka Ajzen e Luiza Zaccano
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26/05/2025 - 12h

Nesta quinta-feira (22), a ex-presidente Dilma Rousseff teve a anistia concedida pela Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Com a decisão, a comissão reconhece que Dilma foi perseguida sistematicamente pelo Estado brasileiro durante o regime autoritário (1964-1985), e oficializou um pedido de desculpas em nome do estado, assim como uma indenização de 100 mil reais. 

Criada em 2001, a Comissão de Anistia tem como principal função examinar e julgar pedidos de anistia política relacionados a perseguições ocorridas entre 1946 e 1988. A atuação da comissão se insere em um contexto amplo da justiça de transição, um conjunto de medidas adotadas para lidar com legados de violações de direitos humanos por regimes autoritários, incluindo reparação, memória, verdade e garantia de não repetição. A presidenta da Comissão, Ana Maria Oliveira pontua que “a anistia de 1988 é uma conquista democrática e um direito individual e coletivo em razão da violação dos direitos fundamentais promovida pelo estado autoritário por motivação política, não se trata de um gesto de clemência do estado”. 

Em sessão plenária realizada em Brasília, os 21 conselheiros do colegiado aprovaram, por unanimidade, o recurso apresentado por Dilma contra a decisão de 2022, que havia negado o reconhecimento. A presidenta da Comissão de Anistia, Ana Maria Lima de Oliveira, leu a portaria de reconhecimento e, em nome do Estado, pediu desculpas a Dilma “por todas as atrocidades” que lhe foram causadas durante o período ditatorial. Ana Maria agradeceu à anistiada por sua “incansável luta pela democracia brasileira e pelo povo brasileiro” – referindo-se ao apelido “coração valente” pelo qual Dilma ficou conhecida em sua trajetória de resistência. Esse pedido formal de perdão é parte importante do resultado, pois simboliza a reconciliação do Estado com uma cidadã que ele próprio torturou e perseguiu.

A indenização aprovada, de R$100 mil, corresponde ao teto previsto pelas diretrizes atuais da Comissão de Anistia. O relator do caso, conselheiro Rodrigo Lentz, justificou seu voto alegando que a indenização corresponde ao período de 1969 a 1988, totalizando 20 anos de perseguição reconhecidos oficialmente. O cálculo considerou o tempo em que Dilma ficou impedida de trabalhar e estudar devido à repressão. Nos bastidores, sabe-se que o pedido original apresentado por Dilma em 2002 pleiteava uma pensão mensal vitalícia de R$ 10,7 mil, valor equivalente ao salário que ela deixou de receber na Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul, FEE-RS, ao ser forçada a se demitir em 1970. Caso esse benefício retroativo fosse concedido integralmente, a União teria que desembolsar cerca de R$ 2,8 milhões em pagamentos acumulados.

Entretanto, alterações normativas implementadas nos últimos anos estabeleceram limites mais baixos. Atualmente, a reparação máxima para anistiados políticos é justamente de R$ 100 mil em cota única, ou, alternativamente, R$ 2 mil mensais. A comissão também determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) realize uma suspensão do período de afastamento de Dilma do serviço público para fins de aposentadoria, evitando dupla pensão com eventuais reparações já obtidas em outras instâncias.

O caso de Dilma Rousseff já havia tido desdobramentos no Poder Judiciário. Em 2023, a Justiça Federal em Brasília reconheceu que a ex-presidente Dilma Rousseff foi anistiada politicamente, em uma ação movida por ela, e determinou que a União pagasse R$ 400 mil por danos morais. No entanto, a pensão mensal retroativa foi negada, pois seria um benefício a ser tratado em instâncias administrativas.

Além disso, Dilma já havia sido reconhecida como anistiada em nível estadual, recebendo indenizações nos estados do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo, totalizando cerca de R$ 72 mil. A ex-presidente tem direcionado esses recursos para institutos e projetos sociais, não utilizando o dinheiro para fins pessoais.

A trajetória de Dilma, durante a ditadura, ilustra o perfil das perseguições políticas promovidas durante o regime militar.  Após o golpe civil-militar de 1964 e o aprofundamento do autoritarismo, Rousseff ingressou em organizações que se posicionaram contra o regime, como a Política Operária (POLOP), e, posteriormente, a VAR-Palmares. Em 1969, devido à repressão política, ela foi forçada a abandonar seus estudos de Economia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e entrar na clandestinidade, prática recorrente entre militantes perseguidos, especialmente após o Ato Institucional número 5, promulgado em 1968.

Em 1970, a ex-presidenta foi capturada pelos militares e submetida a torturas físicas e psicológicas aplicadas por agentes do Estado a serviço de órgãos como a Oban (Operação Bandeirante) e o DOPS. Os métodos empregados incluíam pau de arara, choques elétricos e outros que se enquadram como crimes contra a humanidade. Condenada a mais de seis anos de prisão pelo Superior Tribunal Militar (STM), teve seus direitos políticos suspensos por dez anos. A condenação ocorreu em um contexto de judicialização da repressão, em que o processo legal era sistematicamente ignorado em nome da doutrina de segurança nacional. Em 1972, a pena foi reduzida, mas isso não representou o fim da perseguição, já que ex-presos políticos continuavam a ser vigiados.  

A Lei da Anistia, promulgada em 1979 sob pressão de amplos setores da sociedade civil, foi celebrada como marco da transição democrática, pois possibilitou o retorno de exilados e o perdão a perseguidos políticos. No entanto, sua formulação ambígua incluiu também o perdão a agentes do Estado envolvidos em graves violações de direitos humanos, como tortura, desaparecimentos forçados e execuções sumárias. Essa chamada “anistia recíproca” foi fortemente criticada por entidades de direitos humanos por gerar uma assimetria perversa: enquanto as vítimas lutavam por reparação, seus torturadores recebiam o mesmo benefício jurídico, perpetuando um quadro de impunidade institucionalizada.

Dados da Comissão de Anistia e do Ministério da Justiça revelam que, até o final de 2023, pelo menos 4.514 membros das Forças Armadas haviam sido anistiados. Esses números reforçam a dimensão controversa da Lei de 1979 e demonstram como ela foi utilizada para blindar juridicamente os agentes da repressão, dificultando avanços na responsabilização penal e na construção de uma justiça de transição plena.

A Comissão de Anistia, criada pela Lei nº 10.559/2002 e vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos, foi uma tentativa de corrigir parte dessa assimetria histórica. Sua função é reconhecer e reparar perseguições políticas mediante comprovação documental e testemunhal, observando critérios técnicos e jurídicos. Contudo, mesmo esse espaço institucional tem sido alvo de disputas ideológicas ao longo dos diferentes governos, o que reflete o quanto a memória da ditadura segue sendo campo de disputa política no Brasil contemporâneo.

O pedido de anistia de Rousseff foi protocolado em 2002, mas por razões éticas e para evitar conflitos de interesse, ela solicitou que o processo fosse suspenso enquanto estivesse em cargos públicos como ministra e presidenta da República. Em 2016, o seu pedido voltou à tramitação, mas em 2022, durante o governo Bolsonaro, o pedido foi negado. Dilma recorreu da decisão, insistindo na reparação e reconhecimento da perseguição e tortura política que sofreu. 

Com o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência, foi nomeada uma nova composição para a Comissão de Anistia, com o objetivo de restaurar sua função original de justiça. A medida visava neutralizar a politização promovida durante o governo de Jair Bolsonaro, período que a comissão passou a rejeitar sistematicamente pedidos de anistia. 

Com a decisão unânime, Dilma Rousseff passa a fazer parte oficialmente da lista de anistiados políticos do Brasil, que inclui milhares de pessoas perseguidas durante a ditadura e reconhecidas pelo Estado brasileiro desde a redemocratização.
 

Pena inclui prisão, cassação do mandato e indenização milionária
por
Carolina Zaterka e Luiza Zaccano
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20/05/2025 - 12h

Por unanimidade, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), composta pelos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Flávio Dino e Cármen Lúcia, condenou, no dia 14 de maio, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) a dez anos de prisão em regime fechado, além da perda do mandato parlamentar. A condenação se deu em razão da invasão aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em ação coordenada com o hacker Walter Delgatti Netto.

Zambelli e Delgatti foram condenados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica. De acordo com a acusação, os dois coordenaram ataques aos sistemas do CNJ com o objetivo de desacreditar o Poder Judiciário e incitar comportamentos antidemocráticos. A deputada teria orientado o hacker a invadir o sistema e inserir documentos falsos, como ordens de bloqueio de valores milionários e até um mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes. O ministro ressaltou a premeditação e a censurabilidade das condutas de Zambelli,  que “agiu de modo premeditado, organizado e consciente” para atingir as bases do Estado Democrático de Direito, atentando deliberadamente contra a Justiça brasileira. A PGR aponta que os ataques coordenados "possuem gravidade acentuada e tinham o propósito espúrio de desestabilizar as instituições republicanas".

Delgatti, que está cumprindo prisão preventiva, recebeu a pena de 8 anos e 3 meses em regime fechado. O hacker é considerado réu confesso e foi responsabilizado por efetivar as invasões e adulterações no sistema do CNJ conforme o plano atribuído a Zambelli. Ambos os acusados terão que pagar uma indenização de R$ 2 milhões por danos morais e coletivos.

 


O hacker Walter Delgatti Netto ao lado da deputada Carla Zambelli — Foto: Reprodução/Redes sociais


As investigações realizadas pela PGR indicam que Carla Zambelli teve papel central durante o ataque cibernético, sendo considerada o cérebro da invasão. Em seu depoimento, o hacker explica como acessou ilegalmente plataformas judiciais ao longo de 2022 e 2023, manipulando registros e despachos para criar documentos fraudulentos, como decisões e ordens judiciais falsas. Ele também afirmou para a Polícia Federal que foi procurado por Zambelli e que recebeu dinheiro da deputada, o que ela nega. 

Zambelli questionou as declarações do hacker, afirmando que ele apresentou seis versões diferentes à Polícia Federal. Em coletiva de imprensa, negou envolvimento e ironizou a acusação: “Não iria, de forma alguma, brincar de fazer invasão ao CNJ, de mandar prender o ministro Alexandre de Moraes com um documento assinado por ele próprio. Assim, é tão ridículo que, como disse a ministra Carmen Lúcia, seria burrice. Eu não colocaria meu mandato em risco por causa de uma brincadeira sem graça.” 

 


Carla Zambelli durante coletiva de imprensa  — Foto: Lula Marques /Agência Brasil


Em 2023, Delgatti já foi preso por outros crimes cibernéticos, incluindo invasão de contas no Telegram e falsificação de um comunicado de golpe de Estado em nome de militares. O STF considerou essa reincidência ao julgar o hacker, mas aplicou uma pena menor do que a de Zambelli, pois ela exerceu uma posição de liderança no esquema e violou de forma mais grave a confiança pública, em razão de ser agente política eleita.

Mesmo com duas condenações já proferidas, nenhum outro réu foi responsabilizado diretamente no âmbito deste caso. No entanto, durante as investigações, foi descoberto que Delgatti chegou a produzir documentos falsos envolvendo terceiros sem o conhecimento direto de Zambelli, como um alvará de soltura falso para um parente do hacker. A defesa de Carla usou esses fatos para argumentar que nem todas as ações de Delgatti foram solicitadas por ela.

Com a decisão feita pela Turma do STF, os advogados de Carla Zambelli ainda têm a possibilidade de recorrer dentro do Supremo Tribunal Federal. O próximo passo é a publicação do acórdão, um documento oficial que resume o julgamento e os argumentos dos ministros. Após a publicação, abre-se o prazo para a apresentação dos embargos de declaração, um tipo de recurso utilizado para questionar pontos obscuros ou contradições no acórdão. No entanto, esse recurso não permite discutir a decisão em si, apenas questões formais.

Uma vez que a condenação foi unânime, não será possível recorrer, entrar com embargos infringentes ou de divergência, recursos utilizados quando ainda há votos divergentes entre os ministros. Em suma, as opções recursais ficam bastante limitadas. Ainda que os recursos não sejam analisados de imediato, a execução da pena permanece suspensa até o trânsito em julgado.

Durante esse período, Carla Zambelli permanece em liberdade e pode continuar exercendo normalmente suas funções como deputada federal por São Paulo. Ela mantém todos os direitos e benefícios decorrentes do cargo, salvo se a Câmara dos Deputados decidir adotar alguma medida antes do trânsito em julgado da condenação.

A possibilidade de a Câmara agir politicamente antes da decisão definitiva ainda está em debate. A Constituição Federal, em seu artigo 55, inciso VI, estabelece que perderá o mandato o parlamentar condenado criminalmente com sentença transitada em julgado — ou seja, após o esgotamento de todos os recursos. A perda do mandato, nesses casos, deve ser declarada pela maioria absoluta dos membros da Câmara dos Deputados. Entretanto, o STF tem entendimento consolidado de que a perda dos direitos políticos e, consequentemente, do mandato parlamentar ocorre de forma automática após a condenação definitiva, sem necessidade de deliberação pelo Legislativo.

Após a conclusão dos recursos, é possível que o Supremo notifique a Câmara para efetivar a perda do mandato, sem margem para questionamentos. No entanto, caberá à Mesa Diretora da Câmara formalizar a cassação do mandato de Zambelli, o que pode gerar atritos entre os Poderes caso haja resistência por parte dos deputados em acatar a decisão judicial automaticamente.

Além disso, a parlamentar terá que enfrentar as implicações eleitorais de sua condenação. A Lei da Ficha Limpa estabelece que condenações criminais confirmadas por órgão colegiado torna o condenado inelegível por 8 anos após o cumprimento da pena. No caso da deputada, sua inelegibilidade já foi determinada pelo STF, mas seus efeitos se concretizam com o encerramento definitivo do processo e, por conseguinte, a perda do mandato. Com isso, ela ficará impedida de disputar eleições durante esse período, salvo se obtiver êxito em um recurso extraordinário que reverta a condenação.
 

Em novo plano diretor, a Prefeitura de São Paulo determinou a desativação do “Minhocão” a partir de 2029.
por
Julia Sena
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19/05/2025 - 12h

Por Julia Sena 

Popularmente conhecido como “Minhocão”, o Elevado Presidente João Goulart é uma via expressa elevada que liga a zona oeste de São Paulo até a zona central, a construção é centro de um debate antigo: o que fazer com uma obra que é símbolo de exclusão social, mas tenta se reerguer em um processo de revitalização? 

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Elevado Presidente João Goulart. Foto: Julia Sena/AGEMT 

O projeto do antes batizado Elevado Presidente Costa e Silva foi idealizado pelo arquiteto Luiz Carlos Sangirardi e construído no início da década de 1970 durante o mandato do então prefeito Paulo Maluf, nomeado pela Ditadura Militar. O objetivo da obra era facilitar a mobilidaded aqueles que tinham carros, além de um claro interesse político de Maluf ao deixar sua marca com uma obra grandiosa, independente dos impactos negativos que pudesse trazer para a região.  

A poluição, tanto sonora quanto atmosférica, e a degradação dos arredores desvalorizaram a região, o que possibilitou a uma parcela da população de baixa renda morar nos edifícios mais precárias, nos arredores do elevado e, muitas vezes, mais perto de seus trabalhos. 

O futuro do Minhocão e o lazer que mascara uma realidade precária 

Desde 2016, aos finais de semana, o Minhocão se transforma. Fechado para a passagem de carros, o espaço se vira um ambiente de lazer, funcionando como pista de corrida, ciclismo e skate; além de abrigar espaços para leitura, e a prática de jogos de tabuleiro. Devido às coloridas empenas gigantes dos prédios que margeiam a via, o elevado também se tornou uma galeria de arte a céu aberto. Pedro Teixeira é jornalista, e nos dias de folga prática corrida no local, “a solução de revitalizar o espaço para o lazer parece ser muito boa, mas com certeza serve como uma máscara que tira o destaque dos principais problemas aqui do centro”, pontuou.  

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Túnel sob o Elevado Presidente João Goulart, que conecta o centro com o bairro da Bela Vista. Foto: Julia Sena/AGEMT 

No Plano Diretor de São Paulo, aprovado em 2024, está prevista a desativação do Minhocão até 2029. As opções em debate são a sua demolição ou a transformação definitiva em um parque elevado. As alternativas levantam um questionamento para especialistas e moradores: quem vai, de fato, aproveitar esse novo espaço? 

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Renata Falzoni em entrevista coletiva na Escola da Cidade, no centro de São Paulo. Foto: Julia Sena/AGEMT 

Para a arquiteta, jornalista e vereadora do PSB Renata Falzoni os futuros planos da prefeitura envolvendo o Elevado João Goulart são perigosos e se encaixam dentro de uma política de higienização. “Qualquer melhoria na região do Minhocão vai gentrificar, por que quando o Elevado foi construído na década de 1970, as pessoas venderam os seus apartamentos a preço de banana para uma população que não teria dinheiro para comprar um apartamento novo em um minhocão renovado.”, explicou.  

Antes de bater o martelo sobre o destino do Minhocão, é preciso pressionar a prefeitura para a criação de um plano que garanta a permanência da população que conviveu com todas as suas desvantagens da obra nos seus anos de existência. “As pessoas que estão lá tem que conseguir ficar e, claro, temos que ter políticas de habitação social e acolhimento a quem está em situação de rua.”, lembrou a vereadora.  

Segundo dados divulgados pela Folha de São Paulo em 2005, os gastos para demolição do Elevado João Goulart seriam estimados em R$ 80 milhões - o que corrigido para a inflação atual equivaleria a aproximadamente R$230 milhões.

 

Discursos nacionalistas, conservadorismo extremo e ataques às instituições democráticas voltaram a ganhar força em diversos países
por
Lueny Gomes Batista
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13/05/2025 - 12h
Bolsonaro em manifestação de sua anistia Foto: / Reprodução: AFP
Bolsonaro em manifestação de sua anistia Foto: / Reprodução: AFP

Movimentos de direita radical têm ampliado sua presença em diferentes partes do mundo. Na Europa, Estados Unidos e Brasil, partidos e líderes políticos com pautas conservadoras, nacionalistas e críticas às instituições democráticas vêm crescendo em influência e eleitorado. Na Europa, por exemplo, partidos como a National Rally, de Marine Le Pen, na França, e o Fidesz de Viktor Órban, na Hungria, têm conquistado cada vez mais apoio. Segundo levantamento da consultoria europeia Europe Elects, partidos de direita populista estão entre os mais votados em países como Itália, Polônia, Suécia e Alemanha. Os discursos mais frequentes incluem críticas à imigração, defesa de valores tradicionais e oposição à União Europeia.

Nos Estados Unidos, o ex-presidente Donald Trump segue como principal figura da ala conservadora. Trump mantém apoio expressivo dentro do Partido Republicano desde a invasão ao Capitólio por apoiadores do ex-presidente evidenciando a polarização política no país. No Brasil, a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, representou o fortalecimento de uma direita mais radical. Seu governo foi marcado por embates com o judiciário, declarações polêmicas e forte presença nas redes sociais. Em 2022, Bolsonaro perdeu a reeleição, mas seu grupo político continua ativo, com destaque em bancadas no Congresso Nacional e grande engajamento digital.

Segundo o historiador Eliel Filho, professor e graduado em História, em entrevista à AGEMT, um dos fatores que explicam esse crescimento é a dificuldade de comunicação entre gerações. “A geração dos trinta anos — a última a vivenciar diretamente os reflexos das lutas anteriores — não conseguiu repassar de forma efetiva os aprendizados políticos às novas gerações”, afirma Eliel.

Para ele, isso contribuiu para o enfraquecimento da educação política e do engajamento social, onde a fragmentação da esquerda tem dificultado a resposta a esses movimentos. “Enquanto a direita tem conseguido se fortalecer por meio da coesão entre partidos de pensamento alinhado, a esquerda ainda encontra dificuldades nesse sentido. A unificação em torno de ideias comuns é urgente”, ressalta Eliel.

De acordo com o historiador, o uso estratégico do humor nas redes sociais (memetização) também tem sido uma ferramenta eficaz da extrema direita para ampliar sua presença entre os jovens. “A linguagem das redes foi dominada com mais eficiência por esses grupos, que usam memes e vídeos curtos para atrair e fidelizar públicos”, explica. Levantamentos de institutos como o Pew Research Center e a Fundação Bertelsmann mostram que, em diferentes países, cresce a desconfiança nas instituições políticas e nos meios de comunicação tradicionais. Em paralelo, indicadores econômicos apontam como aumento da desigualdade e do desemprego em períodos de crise, como durante e após a pandemia de Covid-19,  intensificam a polarização política, criam um ambiente mais propício à disseminação de discursos radicais.

 

As eleições para conselheiros tutelares ocorrem em todo país no dia 01
por
Laura Mello
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29/09/2023 - 12h

Capa Reprodução:  Renato Alves/Agência Brasília

Neste domingo, 01, das 08 às 17 horas, acontecerá a eleição para o Conselho Tutelar em todo território nacional. Os eleitos ocuparão o cargo até 2028, e possuem, como principal atribuição, garantir os direitos fundamentais das crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade ou de violação de direitos. Todo cidadão com mais de 16 anos e com o título de eleitor regularizado pode participar da votação.

De acordo com censo realizado pela prefeitura, São Paulo possui 3.759 crianças em situação de vulnerabilidade nas ruas, que utilizam as vias públicas para dormir ou para prática de atividades irregulares, como o trabalho infantil. Elas estão, também, inseridas em redes socioassistenciais, e serão atendidas pelos próximos conselheiros eleitos no pleito deste domingo. 

 

Para saber onde votar, consulte o Conselho Municipal de Direitos das Crianças e Adolescentes (CMDCA) do seu município. 

 

Na cidade de São Paulo, serão eleitos cinco conselheiros para cada um dos 52 Conselhos Tutelares do município, elegendo 260 cidadãos no total. No site da prefeitura, é possível descobrir o local de votação pelo número do título de eleitor, além de todos os candidatos separados por subprefeitura. O município também disponibilizará passe livre em todos os ônibus, a fim de facilitar a mobilidade até os locais de votação.

 

Organizações sociais como o Nossas, envolvidas em pautas pelos direitos humanos e mobilização de campanhas, se uniram para criar um portal de candidaturas comprometidas com o Estatuto das Crianças e Adolescentes (ECA). O portal A Eleição do Ano apresenta candidaturas cadastradas em subprefeituras de todo o país, conectando o eleitor ao candidato da sua região. 

 

 

As candidaturas do portal foram selecionadas de acordo com pontos fundamentais para a proteção integral da infância.  Entre os pontos, estão a participação popular do candidato na construção de políticas públicas, respeito aos direitos da população LBGTQIA+ e escuta especializada para crianças em situação de vulnerabilidade.

por
Annanda Deusdará
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02/10/2023 - 12h

O Terminal Rodoviário Palmeiras-Barra Funda, é o maior terminal intermodal do sistema, contando com Metrô, Trens de subúrbio e de longa distância, ônibus urbanos e terminal interestadual. Com capacidade de 40 mil usuários todos os dias, ele recebe pessoas de vários cantos do estado, com milhares de narrativas de vida se cruzando todos os dias. Entre elas, estão as histórias das estudantes, Nina, Raissa e Ana Júlia. 

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Terminal Barra Funda – Foto: Metrô de São Paulo 

Início de um sonho 

Com uma distância de 138 km da capital do estado de São Paulo e com uma população de 404 mil e 142 habitantes, esses são os dados encontrados no site da prefeitura de Piracicaba, cidade natal de Nina (19) e o palco de sua história.  

Ela conta que desde os seus 13 anos, sabia que queria fazer Jornalismo, “e consequentemente, eu sabia que não ia ser em Piracicaba, eu não ia ficar lá”, isso acontece porque segundo ela, não tem a faculdade que queria em Piracicaba e mesmo que tivesse, as oportunidades que ela teria seriam muito reduzidas, comparadas por exemplo, a vir para São Paulo. 

Apesar de sempre ter certeza, que era pelo Jornalismo que seu coração batia mais forte, a adolescência, entre ensino médio e o cursinho, trouxe para si dúvidas sobre sua escolha profissional.  A incerteza sobre o mercado de trabalho e as oportunidades, levou com que ela pensasse em cursar Arquitetura e Urbanismo ou Direito. No ano passado, a ideia de fazer Engenharia Agronômica apareceu, na sua cidade têm uma boa faculdade nessa área, a ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), uma das unidades da Universidade de São Paulo (USP), se ela decidisse por essa opção, não seria necessário sair do seu lar e poderia permanecer com sua família, tendo uma opção, segundo sua perspectiva, mais segura. Entretanto esse não era seu desejo. 

Após terminar o ensino médio, ela decidiu fazer um ano de cursinho em sua cidade, tendo escolhido o sistema poliedro que é bem famoso também na capital do estado. Ela conta como era sua rotina de preparação para o vestibular, pela manhã ela estudava, as vezes ficando na instituição também pela parte da tarde, fazia simulado aos finais de semana e reforçava o seu preparo com aulas de redação além do cursinho, após as aulas ela retornava para a casa, ficava com sua família e depois estudava mais um pouco. 

Sua meta, era passar em uma faculdade pública, sendo elas, Jornalismo na Unesp Bauru e Marketing na USP aqui de São Paulo. Ela acabou não passando em nenhuma das duas e decidiu vir para a PUC São Paulo. “Porque eu acabei, no ano passado nas férias, vindo conhecer a PUC, a estrutura e tudo mais. Eles são muito bem-conceituados no ranking, então como uma opção de faculdade particular, eu acabei prestando a PUC e passando”.  

Em março desse ano, veio a resposta da lista de espera da Unesp Bauru, ela tinha conseguido a tão sonhada vaga. Ela transferiu sua matrícula para lá, entretanto, uma semana depois acabou voltando para a PUC-SP. O pensamento que veio a sua cabeça, foi “cara, eu saí de uma cidade pequena, e fui para uma menor ainda”, e isso foi fundamental para sua escolha, devido as oportunidades que a cidade de São Paulo oferece, por ser uma metrópole. “Com mais de 20 milhões de pessoas, com muitas oportunidades no jornalismo, que é uma área difícil, e aqui em São Paulo tem muito mais oportunidade do que na cidade de Bauru e também porque a PUC São Paulo me proporcionou conhecer alguns profissionais da área bem-conceituados”. 

Ela disse que foi uma decisão muito difícil e que precisou de muita coragem, pra tentar e também para sair da sua cidade, o apoio de seus pais e da sua psicóloga foram essenciais, “por causa deles, eu vi que tentar coisas novas, sair de Piracicaba e ir para uma cidade diferente, que tem muitas coisas que eu gosto, como São Paulo, especialmente em relação a área cultural era algo que eu precisava”. 

A vida no interior

Com uma distância de 70 km da capital do estado de São Paulo e com uma população de 48 mil e 852 habitantes, esses são os dados encontrados no site da prefeitura de Mairinque, cidade natal de Ana Julia (21) e o palco de sua história.  

Diferentemente de Nina, para Ana o cursinho não deu tão certo assim.  Em 2020, ela terminou o ensino médio na cidade em que mora, ou seja, no meio da pandemia “eu não sabia exatamente o que eu queria fazer. Ainda tinha o jornalismo em mente, mas estava confusa”. Devido as incertezas, ela decidiu tirar um ano para pensar, começou a trabalhar com uma coisa que ela gostava muito, “que era dar aula de inglês e resolvi tirar esse ano pra mim só dando aula, e não estudando pro vestibular” ela usa o verbo no passado e com tristeza porque infelizmente teve que sair do emprego devido a rotina puxada. 

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Ana Júlia voltando para casa - Foto: Ana Julia Bertolaccini 

Em 2022, ela entrou no cursinho com o sonho de cursar Jornalismo em uma faculdade pública, para que pudesse trilhar esse caminho, tinha que viajar todo dia de Mairinque para a cidade vizinha, Sorocaba que fica a 36,7 km de distância. “Foi um ano muito difícil para mim e eu não me adaptei ao modo de estudo. Para muita gente funciona, mas pra mim não funcionava”. Ela conta que passou a deixar os conteúdos acumularem e a sentir grande pressão do vestibular, para lidar com tudo isso, ela focava em dar suas aulas “eu também trabalhava, porque era a única coisa que eu gostava da minha rotina”. 

Em Mairinque também não existe faculdade de Jornalismo, o mais perto fica na cidade vizinha, Sorocaba, ela acabou optando por São Paulo devido as oportunidades de mercado de trabalho, sua mãe também foi uma peça essencial nessa decisão. Ela acabou não passando nas faculdades públicas, mas passou em duas particulares, “Foi uma frustração no começo, mas depois eu percebi que eu gostei muito de onde eu estou, que é na PUC”. A escolha da universidade se deu pela história da instituição, pela posição política e pela liberdade que os estudantes têm, ela acrescenta com felicidade que não poderia ter feito escolha melhor. 

A rotina de vestibulanda

Com uma distância de 12 km da capital do estado de São Paulo e com uma população de 161 mil e 127 habitantes, esses são os dados encontrados no site da prefeitura de São Caetano do Sul, cidade natal de Raissa (18) e o palco de sua história.  

Por estudar em colégio particular, Raíssa não fez cursinho e entrou na faculdade logo após terminar o ensino médio.  Seu colégio tinha um preparo forte, principalmente para o Enem, “eu fazia tipo, muito simulado, simulado pra caramba, eu escrevia tipo uma redação por semana”. 

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Raíssa - Foto: Raíssa Santos

Relação familiar 

Nina é muito próxima de sua família, antes de se mudar para São Paulo ela vivia com seus pais e sua irmã mais nova, além deles, ela conta que convive muito com a avó e com a tia lá em Piracicaba. Para ela, o apoio familiar é uma faca de dois gumes, ao mesmo tempo que dá força para ela seguir seu sonho, torna o processo muito dolorido, “mudar de cidade para mim foi e, tem sido bem difícil, especialmente pela questão da saudade e da solidão, porque eu sinto muita falta dos meus pais, da minha irmã, do meu cachorro, da minha avó, que a gente é bem unido.” Sua família não foi importante só para dar apoio emocional, ela conta que já tinha uma base familiar aqui, pois parte da família da mãe é daqui, inclusive é com o seu tio, que ela mora atualmente. 

“Eu acho que a coisa mais importante na preparação pra eu estudar em São Paulo foi o incentivo da minha mãe. Que foi comigo até a PUC, fez eu perder esse medo da cidade grande. Medo de não saber me locomover, pegar transporte. Então ela fez todo o caminho comigo. A gente foi conhecer a PUC nas férias, andamos por tudo lá e isso já me deixou mais confortável assim, e aí quando eu comecei, eu já estava um pouco mais confiante.” 

Ana conta que seus pais sempre a apoiaram muito, e isso foi essencial. “Eu achava que eu tinha que ficar por aqui mesmo [Mairinque] e fazer faculdade em Sorocaba, que era mais perto. E a minha mãe falava sempre, não vai. Você tem que conhecer jornalismo em São Paulo, é o melhor lugar que você pode fazer, bastante oportunidade, lugar diferente, pessoas diferentes. Você precisa disso pra crescer e eu acatei isso, e não poderia ter feito melhor.” 

Os pais de Raíssa moram no ABC paulista, seu pai mora em Santo Amaro e ela e a mãe em São Caetano, sua mãe foi a maior apoiadora da sua escolha de fazer Jornalismo. Percorrendo o litoral brasileiro, suas origens familiares vão do nordeste ao sudeste, tendo familiares em Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro. Sendo paulistas e paulistanos de coração, grande parte da sua família mora em São Paulo, concentrados na zona sul e na zona leste. Entre eles o seu avô, que era o motivo dela vir para a cidade uma vez por semana, mais o costume de andar pela selva de pedra só veio após iniciar a Universidade e fazer amigos por aqui. 

Dificuldades  

A decisão de Nina, não foi fácil, ir para uma cidade muito longe e muito diferente da sua, ver a família com que cresceu apenas aos fins de semana, isso mexe muito com seu emocional, “Eu sinto muita saudade, especialmente da bagunça de estar em casa com a minha família, de poder ver meus avós, a minha tia. De estar no conforto de onde eu cresci, perto dos meus pais que me ajudam muito”.   

Para sair da tranquilidade de Piracicaba e passar a viver na cidade que nunca dorme, ela também precisou se preparar emocionalmente, fazendo acompanhamento psicológico no ano passado inteiro, e esse primeiro semestre de 2023. E isso a ajudou a pensar em prós e contras e a ver se estava preparada para os desafios que enfrentaria, “às vezes, não é fácil. Dá vontade em mim de desistir, voltar para minha cidade, jogar tudo para o ar, para poder ficar mais perto de quem eu amo”.  Do lado financeiro, exigiu bastante planejamento em conjunto com seus pais, sobre onde ela iria morar, com quem e quanto precisaria para se manter, mas a universitária garante que tem dado certo. 

Ana Julia conta que se não demorasse no trajeto entre sua casa e a Universidade, poderia ter se mantido no trabalho como professora de inglês, até conseguir um estágio na área de Jornalismo, “eu gostaria de manter porque é uma coisa que eu gostava muito e não queria abrir mão, foi bastante difícil”. Apesar da rotina puxada, ela comenta que está conseguindo manter a vida social com os seus amigos nos finais de semana.  

Durante o ensino médio, Raíssa demorava 50 minutos para chegar em casa, uma hora a menos que o tempo que gasta hoje. Sua rotina atual é mais puxada devido ao trabalho, ela chega em casa 13h30 e tem uma hora para comer e se arrumar para ir trabalhar às 14h30, o emprego é perto de sua casa então o trajeto não é um problema, ela chega em casa as 21h, só tendo tempo de jantar antes de ir dormir as 22h, para acordar as 5h no dia seguinte para ir para a Universidade. 

Experiência 

 A nova cidade de nina, conhecida como “selva de pedra”, devido aos arranha-céus espalhados por todo o território paulistano, é também “muito solitária, muito cada um por si, querendo ou não”, o que a faz se se sentir sozinha ou improdutiva, normalmente um pouco dos dois, o sentimento vem por achar que poderia estar aproveitando melhor a oportunidade de estar morando em São Paulo. Para lidar com a solidão que sua rotina lhe impôs, ela se inscreveu no vôlei de sua faculdade, que acontece duas vezes por semana, ajudando ao mesmo tempo em sua saúde física e mental, ela une a isso as aulas de inglês e a companhia das amigas que fez na cidade. 

Após quase um semestre e meio vivendo por aqui, ela já se considera pelo menos um pouquinho paulistana, mas disse que nunca vai deixar de ter sentimentos afetivos com a cidade que a concebeu, “Acho que isso foi uma coisa que acabou nascendo e se desenvolvendo dentro de mim, sempre que eu estou aqui, sinto muita saudade de Piracicaba e quando eu chego lá, sinto saudade daqui”. 

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Nina após um dia de aula na PUC-SP  - Foto: Nina Januzzi 

Assim como O filme protagonizado por Ingrid Guimarães em 2010 (De pernas pro ar), a rotina de Nina mudou drasticamente, o fato de ela morar em São Paulo permite que ela pegue apenas um ônibus, o que foi uma grande mudança já que ela fazia tudo de carro em Piracicaba. Ela também conta sobre como é voltar para sua cidade, normalmente o trajeto é feito de sexta-feira à tarde, ela sai da casa do tio e vai até a Rodoviária Tietê, o meio de transporte varia entre Uber e metrô, “é um caos, porque eu tenho que levar mil coisas e é superdifícil porque eu pego o metrô da Sé, que é lotado”.  Na Rodoviária, ela pega um ônibus da sua cidade que passa a 13h30, são 2 horas e meia de viagem e ela geralmente vai sem almoçar porque não dá tempo, chegando na sua cidade sua mãe a busca no ponto e a deixa em casa.  

Ter que ficar dividida entre São Paulo e Piracicaba, é muito difícil ainda e ela acha que sempre vai ser, “Cansa também sabe? Ir e voltar sempre, mas não consigo ficar longe dos meus pais.” Ela diz que pretende fazer esse caminho muitas vezes ainda. Apesar disso, ela conta que tem levado a vida na terra da garoa de forma mais madura e mais leve, mas que no início, isso lhe causou muito problema com ansiedade. Também cresceu bastante no quesito autonomia, “eu faço muitas coisas sozinha, eu vou aonde eu preciso ir, dou meu rolê e faço meu do meu jeito para fazer as coisas.” Para ela, o motivo da sua ansiedade e saudade serem tão fortes no começo, é não ocupar sua mente com coisas que lhe fizessem bem, como o vôlei e o inglês que ela faz atualmente.  

Ana Júlia também sempre quis ter a experiência de fazer faculdade fora, que para ela é algo bem diferente do que estava acostumada, tudo muito perto, sempre as mesmas pessoas, “eu precisava disso, mas eu estava com medo, com muito medo”. O medo que ela tinha é referente a faculdade, de não se adaptar ao ambiente, de perceber que não era o curso que ela queria. Porém, para a sua felicidade, as preocupações não se concretizaram “eu fui bem acolhida. Acho que as pessoas se ajudam muito lá, fiz amizades e estou gostando muito do curso, então foi só coisa boa”. Diferente de Nina, Ana não tem família na cidade e a única amizade que ela tinha, era virtual, a qual só encontrou duas vezes, então ela considera que veio estudar na cidade sozinha, o que aumentou seu nervosismo e seus medos. 

O que a atrapalha muito é o fato de precisar pegar dois ônibus para fazer o trajeto entre a faculdade e a sua casa. Apesar de morar no interior, sua cidade não fica muito longe da capital, de carro é cerca de uma hora, mas com o tempo de espera do ônibus e com o trânsito leva cerca de 1 hora e meia, mais 15 min de carro de São Roque a Mairinque. “muitas vezes o trajeto cansa mais do que a própria faculdade, do que as aulas em si”, mas ela afirma que está valendo a pena.  

Seu primeiro sonho em relação aos estudos, era passar em uma faculdade em São Paulo. Agora que ele se realizou, seu desejo é morar por aqui assim que começar a estagiar, porque ela não tem como voltar para casa, pois seu último ônibus passa as 20h30. O seu trajeto até a faculdade, começa com sua mãe a levando de carro até São Roque, onde ela pega um fretado que a deixa a cinco quadras da Universidade; para voltar ela precisa pegar dois ônibus, um até a estação Barra Funda e outro de viagem até São Roque onde sua mãe a leva para casa. “Eu tenho essas limitações de horário de ônibus, ele só passa de 2 em 2 horas e só tem uma única opção. 

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Trajeto até a PUC– Foto: Ana Julia Bertolaccini

Desde o cursinho sua rotina já era puxada, vivendo esse pêndulo de ir e voltar. Apesar do caminho ser mais curto, 40 minutos até Sorocaba, seus dias eram exaustivos devido ao ritmo do curso pré- vestibular. Ana fala que antes do cursinho, ela não precisava pegar ônibus, as vezes nem carro, ela dá exemplo do local onde trabalhava, “é tipo 5 minutos a pé de onde eu moro. O interior tem essa facilidade, então não é que a gente fique sem fazer nada, mas a questão do transporte é uma facilidade.” 

Para chegar na Universidade as 7h30, ela acorda as 4h45, vai de carro até São Roque, o que demora uns 15 min, as 5h30 ela pega um ônibus fretado que a deixa perto da PUC (5 quadras). Para voltar para casa, o caminho muda um pouco, “eu tenho a opção de pegar o ônibus de 12h30, mas se eu faço isso não dá tempo de eu almoçar, então eu prefiro ficar pra almoçar na bandejão”. Depois de almoçar, ela precisa esperar por mais de uma hora na Universidade para pegar um ônibus até o Terminal, comprar a passagem do Cometa (ônibus de viagem) para sair as 14h30, chegando em casa as 16h, se ela não tiver nenhum atraso. “se eu morasse mais perto, eu conseguiria levar de forma mais leve”. 

A terra da garoa não era território completamente desconhecido, porém era pouco frequentado. “A gente acaba se acostumando muito no interior, então sempre que vai sair, sai para Sorocaba, que já é considerado cidade grande em relação à minha cidade.”, agora além de ir durante semana, ela também vem aos fins de semana, como quando teve o show do Bruno Mars no início do mês, após o festival ela precisou dormir na casa de uma amiga, porque só teria ônibus para voltar no dia seguinte. O que a move a se manter na faculdade, é a felicidade de ter se adaptado ao curso, ao ambiente e feito amizades. Ela afirma que se não se sentisse bem, teria desistido logo no início, porque a distância torna sua rotina bem exaustiva.   

Jornalismo sempre foi uma das opções de Raíssa, mas a certeza só veio em setembro do ano passado, durante a feira de profissões da USP. Até o momento sua inscrição na Fuvest era para Publicidade e Propaganda, porém ela conversou com um menino que estava no primeiro semestre do curso que ela desejava e o jeito que ele falou sobre sua vivência a desanimou, “nossa, aquele menino estava morto”. Depois dessa desilusão, ela decidiu ir ao stand de Jornalismo, e teve uma experiência completamente diferente, a menina que estava responsável por apresentar o curso, contou sobre o que a Universidade proporcionava de forma tão empolgada que a convenceu. “Eu falei, nossa, que bacana, é isso que eu quero para minha vida, aí lá mesmo eu mudei a minha inscrição da Fuvest”. 

Apesar de querer muito fazer jornalismo, ela não estava muito empenhada em procurar faculdades particulares, porque o seu foco era ir bem no Enem e na Fuvest para passar em uma faculdade pública.  Porém no final do ano, o seu coordenador passou para ela, com base no seu resultado do simulado, onde ele achava que ela passaria, “ele olhou na minha cara com muita seriedade, um sorriso no rosto e disse: é, com as suas notas você não passa numa faculdade pública, mas numa particular você pode passar.” Depois dessa conversa, ela decidiu procurar quais faculdades tinham melhor colocação pelo MEC, ficando entre PUC, ESPM e Cásper, só que o vestibular de ESPM e o da PUC eram no mesmo dia, ela acabou optando pela PUC e passando no vestibular. 

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Ônibus em São Caetano do Sul – Foto: Raíssa Santos 

A decisão de ir para São Paulo estudar já era certa, na cidade em que mora só tem uma faculdade, a USCS, que por ser uma faculdade pequena, não oferece muitas oportunidades no ramo profissional. Se tem uma palavra que define seu trajeto, ela é “cansativo”, ela leva 1 hora e meia para ir e o mesmo tempo para voltar, ao todo são 3 horas de transporte público por dia. São Caetano possui só duas avenidas principais, a do Estado e a Goiás, e a estação fica no centro, o que facilita seu percurso, isso porque mora perto das duas avenidas, seu trajeto inclui 10 minutos de carro até a estação pela manhã, trem até o Terminal Barra Funda e mais 20 minutos de ônibus até a Universidade, na parte da tarde, ela troca o carro por um ônibus circular. Apesar do cansaço, ela diz que é uma coisa que você acaba se acostumando, “não tem o que você fazer, sabe? Eu não tenho carro, então, ou eu venho de trem ou eu fico em casa.”   

A experiência de andar por São Paulo é diferente, porque é uma cidade muito grande e tem muito trânsito, “você sempre tem que pegar um ônibus, um trem, um metrô, alguma coisa.” Já em São Caetano apesar de ser uma cidade montanhosa, então tem muita subida e descida, é muito pequena, “é um ovo de cidade, pessoal fala que São Caetano é de você tropicar e chegar aonde você quer”, ela tem 2 avenidas principais e tudo que for feito, precisa passar por elas, porém a universitária garante que apesar de pequena, não falta nada, “A gente fala que São Caetano, é uma cidade pequena, com energia de cidade grande”.  

A estudante já esperava que a rotina da Universidade seria desgastante, mas ela acha que vale a pena, “porque assim eu sei que eu estou fazendo uma faculdade boa. Ruim seria para mim ter que sair de São Caetano, pegar transporte público pra uma faculdade, que não tem estrutura, isso é um privilégio que eu sei que tenho, porque eu estudo em uma Universidade particular.” 

A vida universitária das 3 mulheres apresentadas não é fácil e traz visibilidade a questão, de que passar no vestibular nem sempre é o mais difícil, a permanência seja pela questão financeira, logística ou emocional é o fator determinante a continuidade na faculdade. A escolha é diária e as renúncias são constantes, dentro desse contexto o que as motiva a continuar é a potência de seus sonhos de serem jornalistas e o apoio incondicional de seus familiares.

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP

Vinte anos após a criação da primeira política em prol da igualdade racial no Brasil, Anielle Franco lidera o mais novo Ministério, responsável por combater a injustiça étnica
por
Annanda Deusdará
Geovana Bosak
Manuela Mourão
|
29/09/2023 - 12h

O Ministério é um órgão de administração pública federal direta, que tem como função elaborar políticas e diretrizes para combater a discriminação étnica. Isso inclui negros, indígenas, quilombolas e outras etnias que sofrem preconceito no país.  

O cargo atualmente é ocupado pela Ministra Anielle Franco, que, além de escritora e jornalista, é uma ativista pelos direitos dos negros, tendo criado projetos para empoderar mulheres negras, perífericas e LGBT+.  

Desde de que foi estudar nos Estados Unidos ( aos 16 anos), ela era militante da causa, algo que se intensificou pela sua vivência, e, posteriormente, pelo assasinato da irmã.  A ex-vereadora Marielle Franco teve o carro alvejado por tiros quando voltava de um evento político em 2018.  Hoje, o caso segue em aberto.  A falta de justiça e a tentativa de silenciamento da irmã levaram a atual Ministra a entrar de forma mais ativa na política.  

 

Quem é Anielle Franco? 

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Ministra Anielle Franco na cerimônia de posse - Foto: Palácio do Planalto

Anielle Francisco da Silva nasceu em 1984, e foi criada no Complexo da Maré, zona norte do Rio de Janeiro. Ela é formada em Jornalismo pela Universidade Central da Carolina do Norte, mestre em relações étnicos raciais pelo CEFET/RJ e doutoranda em linguística aplicada (UFRJ). Atualmente é Ministra da Igualdade Racial do governo Lula, diretora do Instituto Marielle Franco e colunista da Ecoa UOL. Aos 39 anos, também é mãe de duas meninas. 

Com oito anos de idade, começou a jogar vôlei, e, devido ao seu desempenho, conquistou uma bolsa de estudos nos Estados Unidos aos 16 anos. Durante sua trajetória acadêmica na North Carolina Central University e na Florida A&M University, instituições historicamente negras, Anielle foi influenciada a se entender como mulher negra e pensar de forma antirracista.  

Foi nesses locais que conheceu as principais obras de autores como Angela Davis, Martin Luther King e Malcolm X. Em sua estadia nos Estados Unidos, também trabalhou em um centro de imigração, presenciando como funciona o sistema penal estadunidense.  

A ministraa ingressou na política após a morte de sua irmã, Marielle, que era uma ativista contra a violência policial e a corrupção antes de ser assassinada. Anielle também luta para manter viva a memória da irmã e para que a justiça seja feita. 

Dentro do Instituto Marielle Franco, a Ministra desenvolveu diversos projetos com o intuito de empoderar mulheres negras, periféricas e LGBTQIA+. Como diretora do Instituto, liderou iniciativas como a Plataforma Antirracista nas Eleições em 2020, para impulsionar candidaturas negras no âmbito municipal. Também coordenou uma pesquisa para analisar a violência política de raça e gênero no Brasil. 

Em 2023, Anielle esteve presente na lista de mulheres do ano publicada pela revista Time. Formada por 12 mulheres de diversas partes do mundo, o ranking  homenageia aquelas que "desempenharam um papel importante em suas comunidades e em diferentes campos, abrangendo desde ativismo e governo até esportes e artes," de acordo com a publicação.

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Ministra Anielle Franco na Revista Time - Foto/Reprodução: Twitter

Além disso, Franco também escreveu a orelha do livro “Angela Davis - Uma Biografia”, Posteriormente, lançou sua própria obra  intitulada  "Cartas Para Marielle" durante a Festa Literária Internacional de Paraty. Este livro é uma compilação de desabafos, entrevistas para reportagens e recordações. 

Em 2021, em colaboração com Ana Carolina Lourenço, Anielle organizou o livro "A Radical Imaginação Política das Mulheres Negras", uma coletânea de escritos políticos de mulheres negras notáveis, incluindo Lélia Gonzalez, Leci Brandão e Erica Malunguinho. 

Retornando às suas raízes como jornalista, a Ministra criou um programa de entrevistas no YouTube chamado "Papo Franco". O programa apresenta uma variedade de tópicos, conversas descontraídas e convidados especiais toda semana. 

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Ministra no Congresso de Jornalismo Investigativo - Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Qual sua relação com Marielle Franco? 

Anielle Franco é irmã mais nova de Marielle Franco.  As duas sempre foram muito próximas, mesmo quando ela  morava nos Estados Unidos. Inclusive, os gastos com passagens e visto para que ela pudesse ir estudar no exterior foram pagos não só pelos pais, mas também pela ex-vereadora.  

Com o assasinato, a atual Ministra criou junto da  sua família o Instituto Marielle Franco, escreveu livros sobre seu processo de luta e sua relação com a irmã em vida. Hoje, ela  segue lutando para descobrir o motivo do assasinato da irmã e quem foram os mandantes. Em entrevista ao Ecoa.uol, pouco antes de começar a escrever uma coluna para o jornal, contou que, em 2016, quando sua irmã disse que iria se candidatar ao cargo de vereadora estadual, escreveram juntas seu discurso. 

 

O que é o Ministério da Igualdade Racial? 

O Ministério da Igualdade Racial, ou MIR, é um órgão de administração pública federal direta, que tem como principal objetivo a elaboração de políticas e diretrizes em prol da igualdade racial e étnica no Brasil.  

Faz parte da responsabilidade do MIR a criação de políticas afirmativas e de combate ao racismo. Ações voltadas ao fim da desigualdade racial com povos indígenas, comunidades quilombolas e tradicionais também são dever deste Ministério. 

Fundado em 2023, após 20 anos da primeira política de promoção da igualdade racial no país, o Ministério da Igualdade Racial se mostrou de extrema relevância para a população brasileira. Mais de 56% da população total é constituída por pessoas negras, e aproximadamente 900 mil são indígenas. Existem  por volta de 27 comunidades tradicionais, que carecem de  representatividade. 

 

Ações realizadas pelo Ministério da Igualdade Racial 

Em  2023, o Ministério inaugurou o Pacote pela Igualdade Racial, que trouxe  6 medidas para combater a desigualdade. São elas: 

 

  • Titulação de territórios quilombola 

Nessa ação, está prevista a titulação oficial de cinco propriedades localizadas em três distintos territórios: Lagoa dos Campinhos e Serra da Guia, ambos em Sergipe e Brejo dos Crioulos, situado em Minas Gerais, e, no nordeste do Brasil. Esses três territórios têm travado uma luta por mais de uma década em busca de demarcação. 

 

  • Aquilomba Brasil 

Trata-se de um projeto formado por medidas voltadas à promoção dos direitos das comunidades quilombolas. 

 

  • Grupo de trabalho Interministerial para o Novo Programa Nacional de Ações Afirmativas 

Tem como objetivo desenvolver um programa abrangente focado na avaliação e acompanhamento de dados, visando assegurar que a população de baixa renda e afrodescendente tenha acesso ao ensino superior. 

 

  • Plano Juventude Negra Viva  

É um programa destinado a diminuir os índices de homicídios e as fragilidades sociais que afetam a juventude negra. Além disso, visa promover oportunidades e ampliar o compartilhamento do conhecimento proveniente das comunidades periféricas. 

 

  • Grupo de trabalho de enfrentamento do racismo religioso 

Grupo de trabalho com objetivo de formular ações para combater o racismo religioso contra  comunidades de matriz africana. 

 

  • Grupo de trabalho interministerial do Cais do Valongo 

Comitê encarregado de apresentar iniciativas de políticas públicas em âmbito federal, visando garantir a preservação da herança africana no Sítio Arqueológico do Cais do Valongo no Rio de Janeiro. Este cais histórico serviu como o principal ponto de desembarque de africanos escravizados no Brasil e nas Américas em 1811. Atualmente é um monumento preservado, acessível ao público para visitação. 

Além do Pacote pela Igualdade Racial, o MIR já se mostrou atuante diversos outros projetos, como a realização de um programa para uma melhor preparação de jovens negros para concursos na advocacia e um novo informativo de monitoramento para a análise do Censo Quilombola.  

A ministra Anielle se mostrou extremamente engajada em seu cargo, e participou de uma viagem à África do Sul, com o atual presidente Lula, em que acompanhou uma sessão do BRICS, e se reuniu com lideranças políticas sul-africanas para debater uma agenda conjunta de promoção à igualdade racial. 

 

Futuro e Expectativas  

No início de agosto, Anielle Franco reafirmou o compromisso do governo federal em regularizar pelo menos 300 territórios quilombolas até o final de seu mandato, em dezembro de 2026. 

Durante os Diálogos Amazônicos, um evento preparatório para a Cúpula da Amazônia que reúne líderes dos países da região, a ministra da Igualdade Racial, em entrevista ao CanalGov, destacou: “[A questão do] acesso ao território é, desde sempre, no nosso país, algo muito grave. É uma luta. Precisamos retomar isto para pensar uma titulação a nível nacional. Se formos comparar, na última gestão [federal, entre 2019 e 2022], apenas um território quilombola foi titulado, por ordem judicial. Nestes seis meses [de 2023], já titulamos cinco territórios quilombolas. E nosso objetivo é chegarmos a 300 até o final do nosso mandato”.  

Franco enfatizou a importância de enfrentar o racismo ambiental, especialmente em regiões como o Marajó, que tem um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do país. Ela estabeleceu um acordo de cooperação técnica assinado durante os Diálogos Amazônicos para abordar essa questão. 

80% da Amazônia Legal é habitada por pessoas negras. Aproximadamente 1 milhão de pessoas quilombolas vivem no país, e um terço delas está localizado na região. Para abordar esses desafios, seu ministério planeja criar um comitê e uma secretaria dedicados a acompanhar e apoiar essa população. 

 

Desafios e Controvérsias  

Um dos principais desafios do ministério é a regularização de territórios quilombolas. Isso se deve à complexidade do processo burocrático, que envolve várias instâncias governamentais e procedimentos legais. Esse trajeto se torna ainda mais atrasado com recursos financeiros limitados em conjunto com a  falta de financiamento para conduzir estudos técnicos e oferecer assistência legal às comunidades quilombolas.   

Apesar do aumento da participação feminina no cenário político, ainda há um longo caminho a percorrer para alcançar uma representação equitativa. O Brasil enfrenta desafios significativos em termos de igualdade racial e de gênero na política, e a trajetória de Anielle Franco destaca esses desafios e a necessidade contínua de lutar por uma representatividade mais justa e inclusiva. 

Deputada Estadual se orgulha em fazer parte da família do ex-presidente e se firma como representante da extrema-direita na Alesp
por
Beatriz Barboza
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20/09/2023 - 12h
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Valéria Bolsonaro participa do quadro Poder Por Elas/Foto: Agemt

Nascida em Santos, litoral paulista, Valéria Muller Ramos Bolsonaro saiu de sua cidade natal aos 3 anos de idade. Desde então, morou em São Paulo, Porto Alegre e atualmente reside em Campinas. Muller formou-se em Biologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e atuou na Rede Municipal por 32 anos como professora da Educação Infantil e do EJA (Educação de Jovens e Adultos). 

“Essa é a pergunta que eu mais respondo. Eu sou uma parente agregada, sou esposa de um primo distante do ex-presidente”, afirmou Valéria Bolsonaro, do Partido Liberal (PL), Deputada Estadual por São Paulo, reeleita em 2022 com mais de 113 mil votos. “Além do sobrenome, eu sou muito bolsonarista”, completou em entrevista para o Estadão.

TRAJETÓRIA POLÍTICA

Sua carreira política se iniciou em 2016, quando se filiou ao Partido Social Cristão (PSC), do qual o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro fazia parte na época. “Me ligaram e me convidaram para ser filiada ao partido. Eu me filiei e fiz campanha para vereadora”, contou em entrevista ao programa de rádio Pânico, da Jovem Pan, em junho de 2022.

A parlamentar explicou que o convite foi motivado pelo sobrenome em comum com Jair, que já estava em seu 7° mandato na Câmara dos Deputados. Valéria afirma que sua campanha de estréia foi pequena e totalizou cerca de 700 votos, o que não foi suficiente para elegê-la. 

Em 2018, com o anúncio da candidatura oficial de Bolsonaro à presidência pelo Partido Social Liberal (PSL), Valéria lançou-se candidata à deputada estadual pelo mesmo partido. Ainda em entrevista ao Pânico, Muller explicou que a ideia era ganhar notoriedade na sua cidade e promover a campanha para Bolsonaro. 

Findada a apuração, no domingo de eleição do dia 28 de outubro de 2018, Valéria Bolsonaro foi eleita à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo com mais de 54 mil votos. Valéria definiu sua eleição como um “acidente de percurso” e relembrou sua reação ao resultado: “foi o maior susto!”. 

A deputada contou, em entrevista a Paulo Leoni, da Band Campinas, que sua campanha eleitoral se baseou na “nova forma de fazer política”, pelas redes sociais. Valéria publicava, em seu canal do Youtube, vídeos em que explicitava seus posicionamentos atrelados aos defendidos por Jair Bolsonaro no mesmo período. O repúdio à ideologia de gênero e o apoio ao armamento foram temas escolhidos.

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Parlamentar em aula de tiro filmada e compartilhada em seu canal. (Foto: Reprodução/ YOUTUBE Valéria Bolsonaro)

“Eu aconselho, isso aqui é uma maravilha, faz muito bem para nossa segurança”, afirmou Valéria durante uma aula de tiro, filmada e compartilhada em seu canal. 

A PARLAMENTAR EM ATIVIDADE

A atuação de Valéria Bolsonaro contempla áreas como educação, saúde, assistência social e políticas públicas para mulheres. A deputada também é líder da Frente Parlamentar de Apoio de Combate ao Câncer. No Programa Café no Parlamento, com Sílvia Garcia, da Alesp, Valéria destacou que a frente promove campanhas preventivas e de suporte médico, informacional e emocional aos diagnosticados. 

A Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Doenças Raras também é coordenada pela deputada. Em entrevista ao Movimento Muda Pedreira, a parlamentar afirmou que seu foco de atuação é a capacitação das áreas da Saúde, Educação e Assistência Social para o suporte efetivo às pessoas com deficiências e suas famílias. Ela é autora do Projeto de Lei 670/2020 que altera a Lei 17.158/2019 e institui a Política Estadual de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), aprovado em abril de 2021. 

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Deputada Valéria Bolsonaro na tribuna da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. (Foto: Reprodução / Site Alesp)

Valéria Bolsonaro foi eleita presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres em abril de 2023. “Pela primeira vez, um governador do Estado teve a sensibilidade de fazer uma secretaria estadual de políticas públicas para as mulheres”, disse a dirigente recém-eleita. A comissão deve se dedicar, especialmente, à proteção dos direitos femininos e ao combate à violência de gênero. 

Quanto às demandas da pasta Educação, a parlamentar defende a “escola sem ideologia”. A conservadora justifica seu posicionamento criticando a atuação da esquerda nas universidades e a define como “formadora de militantes”. 

“A Unicamp é uma desgraça, principalmente, na área de Humanas. Eu não pude permitir que a minha filha fizesse faculdade em Campinas”, afirmou em entrevista ao Pânico. A Deputada Estadual faz parte da autoria do Projeto de Lei n° 245/2019 que proíbe a “ideologia de gênero” nas instituições de ensino do Estado.  

BOLSONARO NO NOME, NA CABEÇA E NO CORAÇÃO  

Em entrevista a Sérgio Ewerton, da Rede Alesp, em 29 de junho de 2020, Valéria Bolsonaro explicitou seu apoio à flexibilização do isolamento social. “É necessário porque o número de empresas pedindo falência já é absurdo e estamos em torno de 100 mil desempregados. Se não voltarmos a fazer com que a economia volte a girar, corremos um grave risco de termos um problema muito mais sério do que o vírus a longo prazo”, defendeu a parlamentar. 

No dia seguinte à publicação da entrevista no canal da Assembleia Legislativa de São Paulo, o consórcio de veículos de imprensa junto às secretarias estaduais de Saúde informou que o número de óbitos pelo Coronavírus era superior a 59.600 e o estado de São Paulo se destacava pelo maior índice de mortes em todo o país.

“Se a população não se levantar e começar exigir de volta a nossa democracia, nós vamos acabar ficando todos trancados em casa, sem emprego e passando fome”, declarou a Deputada Estadual no vídeo “Artigo Institucional”, disponível em seu canal no Youtube. 

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Parlamentar bolsonarista, prima distante do ex-presidente Jair Bolsonaro. (Foto: Claudio Gatti)

Valéria Bolsonaro também publicou, no dia 30 de julho de 2020, em seu canal um vídeo em defesa do uso da Cloroquina no tratamento do Covid-19. A deputada parabenizou os prefeitos Marcus Soliva, de Guaratinguetá, Partido Social Cristão (PSC) e Everton Sodário, na época então prefeito de Mirandópolis pelo Partido Social Liberal (PSL) pela promoção de decretos que determinavam que a rede de Saúde de suas cidades teriam acesso à Cloroquina, o que contrariava as orientações do Governo do Estado de São Paulo.

“Esse medicamento tem trazido resultados excelentes para as pessoas acometidas pela Covid-19”, declarou a Deputada em vídeo. Na contramão, a Fundação Oswaldo Cruz de Manaus conduziu um estudo para avaliar a utilização da Cloroquina no tratamento da doença. "O intuito era justamente checar se as dosagens eram seguras. O trabalho de Manaus foi realmente demonstrar que essa dose era tóxica, perigosa e não deveria ser usada", afirmou Natália Pasternak, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, ao jornal Brasil de Fato, em abril de 2020.

Após a aprovação da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet pelo Senado, a Deputada Estadual expressou sua indignação em um vídeo publicado em seu canal do Youtube. “Como é que pode um artigo desse? O que é fake news? Quem é que vai definir o que é fake news ou não? Quem é que vai punir? Punir como?”. Valéria afirmou que a lei aprovada promovia a perseguição ideológica por parte do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. A bolsonarista insistiu: “agora querem calar a nossa boca”.

“EMPODERAMENTO? EU NÃO SEI O QUE É ESSA MELECA!”

Em julho de 2020, a mobilização online “Mulheres Derrubam Bolsonaro” se popularizou entre as figuras femininas da esquerda e suas apoiadoras. O movimento reuniu mulheres que reconheciam o governo de extrema-direita como símbolo do machismo. Valéria Bolsonaro, em seu canal, expressou sua opinião e se dirigiu às políticas esquerdistas: “como esse governo pode ser considerado machista? O primeiro governo que tem o maior número de mulheres, tanto dentro da Alesp, quanto do Governo Federal. Continuem gritando, já que gritar é a única coisa que vocês sabem fazer”. 

Durante a entrevista na Jovem Pan, Valéria negou a agressividade dos homens na política brasileira: “Quando um homem é agressivo, você é agressiva igual e responde na mesma moeda”. A deputada acrescentou que a defesa dos direitos das mulheres e a proteção às parlamentares depende do espectro político. “É um teatro dentro da Alesp”, afirmou se referindo à ideia de falsa luta conjunta. “Empoderamento? Eu não sei o que é essa “meleca” até hoje”. 

Durante uma reunião da Comissão dos Direitos das Mulheres, no dia 8 de setembro deste ano, a parlamentar bolsonarista usou a expressão racista “denegrir” (como sinônimo equivocado de “difamar”) para denunciar a deputada negra Mônica Seixas (PSOL). Segundo Valéria, a esquerdista cometeu crimes de “injúria e difamação” ao atribuir o termo “token” à secretária negra de Políticas para Mulher, Sonaira Fernandes.

“É muito comum pessoas brancas colocarem pessoas negras em postos de chefia, mas não permitir que elas trabalhem. Ter representação não significa ter representatividade”, explicou Seixas à GloboNews. A representação será julgada pelo Conselho de Ética da Alesp.

Há 13 anos, a ONU declarava a água como um direito humano universal, no Brasil, 15,8% da população não tem livre acesso a esse recurso
por
Maria Elisa Tauil
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18/09/2023 - 12h

O acesso à água potável e saneamento básico é um direito essencial, fundamental e universal, vital à vida humana com dignidade e reconhecido pela ONU como “condição para o gozo pleno da vida e dos demais direitos humanos” (Resolução 64/A/RES/64/292, de 28.07.2010). Mesmo assim, Mary Maia agricultora e moradora da Chapada do Apodi, divisa do Ceará e Rio Grande do Norte, vive com duas cisternas  de água, reservatório que faz a captação e armazenamento da água da chuva, instaladas em seu quintal.

Assim como Mary, os moradores da região enfrentam o semiárido brasileiro com as mesmas condições. Eles fazem parte dos 15,8% da população, aproximadamente 33 milhões de indivíduos, que não têm livre acesso à água potável no Brasil, conforme informações recentes do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento).

Apesar de enfrentarem a precariedade hídrica, os habitantes do município de Tabuleiro do Norte, localizado na Chapada do Apodi, acordam todos os dias sob a segunda maior reserva de água subterrânea do estado, a Bacia Potiguar. Enquanto o agronegócio usufrui do direito universal para plantar algodão e soja, com a falta de acesso ao aquífero e nenhuma assistência do governo para mudar a situação, a única opção de Mary é utilizar duas cisternas para uso próprio e irrigação da sua pequena plantação.

“Nesse quintal não tem água diariamente”, expõe a agricultora ao relatar as dificuldades de morar no local. “Não tem esse ditado, água é vida? E água é vida mesmo, o que a gente pode fazer sem água? Pra gente aguar um pé de planta falta, porque eu só tenho duas cisternas com água. Se aqui tivesse um poço eu tinha tudo isso aqui (quintal) cheio de fruta.”

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Acerola do quintal produtivo de Mary Maia. Foto: Maria Elisa Tauil

Assim como tantos outros pequenos agricultores, a vida de Mary é o seu quintal produtivo. Com a renda da família estando diretamente ligada à agricultura, ela diz que se vê refém da disponibilidade hídrica. “Quando tem água a gente consegue mais coisa, quando não tem as bichinhas (plantação) murcham e morrem,” expõe.

Também moradora da Chapada, a cozinheira Joana Bezerra reforça a denúncia da falta de água. “A nossa luta é a água, que não tem. A maioria não tem condições de furar poços e quem tem condições de fazer isso pela gente não faz, não resolvem o problema. As empresas têm água à vontade, por que nós não tem?”

Na casa onde Joana mora com o esposo, o acesso a água só é possível através de um poço de água no quintal. Consciente do seu privilégio por ter um fácil acesso ao recurso, a agricultora sabe que nem todos têm as mesmas condições. “O que poderia mudar é se tivesse água o bastante, o suficiente para todos, não é só para mim porque eu tenho um pocinho aqui no meu quintal, mas é pouca coisa. A gente quer é coisa pra comunidade, vizinhos, irmãos. É isso. É água.”

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Poço de água não tratada no quintal de Joana Bezerra. Foto: Maria Elisa Tauil

Conhecida como a alma do agronegócio do Ceará e um dos principais focos da fruticultura do Brasil, a Chapada do Apodi é vista, segundo o mapeamento feito pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), como um paraíso natural devido ao seu solo fértil e grande disponibilidade de água, fator que não passou despercebido pela política agrária brasileira.

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Chapada do Apodi. Foto: Maria Elisa Tauil

Em 1987, com a intenção de incentivar o agronegócio de frutas para exportação, através do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), o Estado brasileiro construiu um perímetro irrigado na região. Na teoria, isso poderia representar uma grande mudança para os moradores da Chapada, mas na prática a função dessa água nunca foi cumprir os direitos humanos.

Aline Maia, técnica da Cáritas de Limoeiro do Norte, explica as complicações que os agricultores enfrentam. “Essa é uma região que envolve muitas complexidades, estamos num território que a gente tem água e as comunidades não acessam essa água. Historicamente elas resistem aqui buscando alternativas e estratégias.”

“A grande dificuldade é a própria falta de apoio do Estado. Você não tem água. Nós estamos debaixo da segunda maior reserva hídrica subterrânea, que é o aquífero Jandaíra-Açu, a segunda maior reserva de água subterrânea no Estado do Ceará, e as famílias daqui não têm acesso a essa água. O acesso é por meio de carro pipa. A agroecologia precisa de água, como é que você vai viver no semiárido, produzir como camponeses e camponesas se você não tem água”, crítica.

“A falta de água tem sido um dos principais desafios, injustiça hídrica como a gente costuma dizer.”

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Agricultora moradora da Chapada do Apodi segurando uma batata doce. Foto: Maria Elisa Tauil

ACESSO A ÁGUA NO BRASIL

A precariedade hídrica enfrentada pelos moradores da Chapado do Apodi, é um caso entre tantos outros da realidade brasileira que mostram a fragilidade no cumprimento da resolução da Organização das Nações Unidas (ONU), assinada em 28 de julho de 2010. Apesar de apresentar uma grande disponibilidade hídrica, a distribuição no Brasil é desigual.

Segundo o estudo “Avanços do Novo Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil - 2023 (SNIS 2021)” realizado pelo Instituto Trata Brasil, divulgado em 2023, em colaboração com a GO Associados, a maior parte da população que não tem acesso a água potável está concentrada nas regiões Norte e Nordeste do país, assim como nas periferias das grandes cidades. Os dados comparam a disponibilidade hídrica das cidades do país, onde 99,07% dos brasileiros das 20 melhores cidades têm acesso a redes de água potável, enquanto somente 82,52% da população das 20 piores têm esse serviço.

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Fonte: Brasil de Fato

Além disso, durante o levantamento de dados, foi constatado que mais de 1.100 dos 5.568 municípios do país averiguados, não apresentaram a documentação imposta pela legislação que comprova a capacidade econômico-financeira das empresas de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário de cumprir as exigências legislativas.

Ao divulgar os resultados da pesquisa, a presidente do Instituto Trata Brasil, Luana Siewert Pretto, devido à disparidade de investimento em saneamento básico, apontou a existência de dois “Brasis”. “Se a gente for avaliar a região Sudeste, há uma média de investimento bastante grande, e mais de 90% da população já tem acesso a água”, declara. 

“Falta priorização dos governantes em relação ao tema do saneamento básico. Às vezes a gente ainda vê a política de que obra embaixo da terra não é interessante”, afirma Luana Pretto. 

Outro fator agravante na distribuição de água no país é a precariedade na gestão hídrica. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a irrigação corresponde ao consumo de 72%, à medida que as populações urbanas e rurais representam 10%, conforme um balanço sobre o consumo brasileiro feito em 2021. 

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Fonte: Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO)

Ainda conforme a FAO, o agronegócio é o setor que mais precisa de medidas de redução do consumo, uma vez que aproximadamente 60% de toda água usada na irrigação é desperdiçada. Pesquisas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária no Mato Grosso (Incra), apontam que um único pivô, sistema muito utilizado por grandes empresas na agricultura irrigada, chega a desperdiçar um milhão de litros por hectare (10 mil metros quadrados) em somente um dia. 

Durante a 21ª Semana Mundial da Água, Achim Steiner, chefe do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas, informou que, sem gerar nenhum impacto, somente 10% da atividade de irrigação mundial é necessária para garantir o abastecimento de toda população. “Sistemas agrícolas que respeitam os ecossistemas não apenas provêm comida, fibra e produtos animais, eles também geram serviços como mitigação de enchentes, recarga de aquíferos, controle de erosão e são habitats para plantas, aves, peixes e outras espécies”, disse. 

UM DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL E UNIVERSAL  

Há treze anos atrás, a ONU instituiu que o livre acesso à água potável e o saneamento básico é um dos direitos humanos fundamentais, o Comitê das Nações Unidas para os Direitos Econômicos afirma que: “O direito humano à água prevê que todos tenham água suficiente, segura, aceitável, fisicamente acessível e a preços razoáveis para usos pessoais e domésticos.” 

Mesmo o Estado brasileiro não assegurando a acessibilidade hídrica universal da população, existem medidas que procuram diminuir drasticamente o número de pessoas sem saneamento básico no país. O novo Marco Legal do Saneamento, versão atualizada da Lei nº11.445/2007, tem o propósito de atender 99% dos brasileiros com água potável e 90% com coleta e tratamento de esgotos até o final de 2023.  

Para João Amorim, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), é necessária uma política pública para melhorar a distribuição hídrica no Brasil. “Tem que haver uma política pública permanente, perene, de acesso descentralizado de acesso à água (distribuição por meio de sistemas de abastecimento), saneamento, tratamento. Uma política pública ampla com recursos financeiros garantidos no Orçamento Geral da União que deve ser acompanhada de uma mudança de prática dos gestores locais e da participação social, cobrando, acompanhando, orientando, exigindo água pra todas as famílias urbanas e rurais, de todos os biomas e territórios,” alega.  

“Água é vida, alimento, soberania, segurança alimentar, autonomia, liberdade. 

Água pra plantar, cuidar, colher, cozinhar, beneficiar alimentos e consumir. 

Água pra criar animais, produzir ração, sementes, comida farta, sadia e diversificada.”  

 

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.