A CCJ, Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, decidiu nesta quarta-feira (10) manter a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido). Numa disputa folgada, 277 votaram a favor, 129 contra e houve 28 abstenções. No mesmo dia, o Conselho de Ética da Câmara abriu um processo, a pedido do PSOL, que pode levar à cassação do mandato do político. Ele foi detido em 24 de março pela Polícia Federal acusado de ser mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes.
Na CCJ
Mais cedo, antes da votação correr no plenário e definir a medida cautelar, a CCJ aprovou o relatório de Darci de Matos (PSD-SC), que mostrou-se a favor da prisão de Chiquinho Brazão. “Considerando presentes os requisitos constitucionais do flagrante e da inafiançabilidade, além de estar adequadamente fundamentada, meu voto é pela preservação da eficácia da decisão proferida pelo ministro Alexandre de Moraes, referendada, à unanimidade, pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal”, argumentou o relator. O placar foi de 39 a 25, com uma abstenção.
Na Câmara
Com um quórum total de 435 parlamentares no plenário, o número mínimo para afirmar a permanência ou não de Chiquinho era de 257 votos, 20 a menos da maioria.
Entre os partidos que reconhecem a prisão estão o PT, o PCdoB, o PV, o MDB, o PSD, o PSB, o PDT, o Avante e o Solidariedade.
Por outro lado, o presidente do União Brasil, partido ao qual o político esteve filiado até a detenção, posicionou-se contra a determinação do STF e a fala do relator do caso. Junto a ele, o PL (Partido Liberal), partido do ex-presidente Jair Bolsonaro e o maior da legenda, com 13 votos, o PRD (Partido Republicano Democrático) e o REPUBLICANOS, partido do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Chiquinho Brazão teve o direito de acompanhar virtualmente a votação.

Posicionamento contraditório do União Brasil
Após a prisão do seu parlamentar, a agremiação manifestou a expulsão de Brazão. “A decisão da Executiva Nacional aponta que Brazão incide em ao menos três condutas ilícitas previstas no artigo 95 do Estatuto: atividade política contrária ao Estado Democrático de Direito, ao Regime Democrático e aos interesses partidários; falta de exação no cumprimento dos deveres atinentes às funções públicas e partidárias e violência política contra a mulher. O União Brasil repudia de maneira enfática quaisquer crimes, em especial os que atentam contra a vida, o Estado Democrático de Direito e os que envolvem a violência contra a mulher. ”, afirma a legenda em nota oficial.
A decisão punitiva do presidente do partido, Antonio Rueda, e da posição a favor de Chiquinho do União Brasil revela um descompasso entre os parlamentares da Câmara baixa.
Pedido de Cassação
No mesmo dia em que o parlamentar foi preso, o Conselho de Ética recebeu um pedido de cassação do cargo do ex-deputado federal, protocolado pelo PSOL. A nota oficial da legenda afirma que “é necessário (a cassação) para evitar que ele use o cargo para atrapalhar investigações. Além disso, a sigla argumenta que a permanência do deputado no mandato atinge a imagem da Câmara.”.
A presidente do PSOL, Erika Hilton, comemorou a vitória da permanência prisional do suspeito de mandar matar, junto com seu irmão Domingos Brazão, ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, Marielle Franco, seis anos atrás.”Lutaremos até o fim”, afirmou a deputada em suas redes sociais.

Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro e ex-delegado da Divisão de Homicídios, também foi preso em flagrante, acusado de ter utilizado de seu cargo dentro da corporação para obstruir e atrasar as investigações do assassinato.

O Tribunal Regional do Paraná (TRE-PR) suspendeu o segundo dia de julgamento das ações contra o senador Sergio Moro (União Brasil) de autoria do PL e do PT, após o pedido de vista (mais tempo para análise do caso) da desembargadora Claudia Cristina Cristofani.
Na sessão da última quarta-feira (3), o julgamento da cassação do ex-juiz acabou em empate por 1 a 1, com um voto a favor do desembargador eleitoral José Rodrigo Sade e um contra do relator Luciano Carrasco Falavinha Souza.
Sergio Moro e os suplentes Luis Felipe Cunha e Ricardo Augusto Guerra estão sendo acusados de abuso de poder econômico durante a pré campanha eleitoral de 2022.
Desdobramentos desde a denúncia
A Procuradoria Regional Eleitoral do Paraná entrou com duas ações de cassação do mandato senatorial de Moro, instauradas pela federação PT/PV/PCdoB e pelo Partido Liberal (PL), em dezembro do ano passado. Contudo, o processo só começou a ser julgado agora em abril, no TRE-PR, em Curitiba.
Na primeira sessão, o relator votou pela absolvição de Moro. Já durante o segundo dia de julgamento, José Rodrigo Sade defendeu a inelegibilidade do senador e votou a favor dos processos que buscavam cassar o mandato dele e de seus suplentes.
No entanto, Claudia Cristina Cristofani, terceira a votar, suspendeu o julgamento, alegando a necessidade de mais tempo para analisar o caso.
As acusações argumentam que Moro provocou uma desigualdade no processo eleitoral ao desistir de sua candidatura à Presidência da República após se filiar ao partido Podemos e, em seguida, concorrer ao cargo de senador.
A tese defendida é que Moro teria se beneficiado de recursos e destaques proporcionados pela sua pré-campanha à presidência, para então trocar por uma disputa com menos projeção nacional.
A professora de direito constitucional da PUC-SP, Gabriela Shizue Araujo, explicou para a AGEMT que esses movimentos teriam gerado uma vantagem indevida em favor de Moro e de seus dois suplentes. Com isso “eles teriam desfrutado de uma visibilidade pré-eleitoral realçada em relação aos demais concorrentes”, afirma Araujo.
Em um documento assinado pelos procuradores regionais eleitorais Marcelo Godoy e Eloisa Helena Machado, foi revelado que a campanha eleitoral pagou um investimento de 39,78% das despesas totais, totalizando dois milhões de reais pelo Partido Podemos e pelo União Brasil.
Apesar de ter sido registrado que o valor total foi de dois milhões de reais, a acusação sustenta que Sergio Moro gastou mais de seis milhões durante a campanha.
Segundo as diretrizes do Ministério Público, o limite legal para esse tipo de campanha é de R$ 4,4 milhões. Ao somar os gastos da campanha de Moro, constatou-se um valor de R$ 5,1 milhões.
Impasse entre os desembargadores
O ponto de divergência no TRE-PR, debatido até agora nas duas sessões do julgamento, é sobre até onde pode ser entendido abuso de poder econômico em relação ao tempo de cada campanha.
Para a cientista política da Universidade Federal de São Carlos, Maria do Socorro Braga, a argumentação neste julgamento vai “depender do olhar” de cada votante, visto que o caso se apresenta multifacetado. Exemplo disso é que, para o desembargador Carrasco, a acusação precisa fazer uma diferenciação das intenções durante o período de pré-campanha.
Isso porque as despesas realizadas por Moro em outros estados, durante a pré-campanha à presidência, foram consideradas como pré-campanha ao Senado pela Federação Brasil da Esperança (FÉ BRASIL - PT/PCdoB/PV) e pelo Partido Liberal (PL).
Já na visão do desembargador eleitoral Sade, não é possível ignorar a trajetória de pré-campanha presidencial que Moro fez antes de mudar sua candidatura. "A pré-campanha do investigado a presidente acabou o beneficiando quando, mudando a veras o seu barco, tentou aportar no Senado Federal. Para mim, assim, é completamente desinfluente saber da intenção inicial do investigado", colocou Sade durante a segunda sessão do julgamento.
Controvérsias e futuro do mandatário
"Normalmente o candidato devolve o valor [verba] ao partido político", explica Maria Braga, em situações nas quais há mudança de pleito durante sua pré eleição. No caso de Moro, somente pouco antes do prazo final é que o senador resolveu mudar de partido e disputar outro cargo.
No caso de Moro, somente pouco antes do prazo final é que o senador resolveu mudar de partido e disputar outro cargo.
Para Sade, quando se lançou candidato ao senado, Moro e seus suplentes já contavam com a projeção nacional da sua imagem em campanha para a presidência, principalmente em outros estados, o que teria impacto direto no Paraná.
Vale destacar que caso o mandato do senador seja cassado, ele não perde o cargo de imediato, visto que a decisão final caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para a cientista política Braga, o julgamento possivelmente ainda será levado a outras instâncias após o resultado final.
Em paralelo, a professora Araujo comentou que caso a cassação se concretize, será declarada a inelegibilidade de Moro e dos suplentes por oito anos, contando a partir de 2022.
O julgamento segue e será retomado na segunda-feira (08), quando outros cinco desembargadores devem votar.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) formaram maioria para impedir a possibilidade de um “Poder Moderador” comandado pelas Forças Armadas (FA) na última terça-feira (2). Seis dos 11 magistrados, em plenário virtual, refutaram a interpretação do setor militar sobre o Art.142 da Constituição que instituiria uma “abertura” ao papel interventor da Marinha, do Exército e da Aeronáutica sob o Legislativo, o Judiciário ou o Executivo.
Essa visão é defendida por bolsonaristas que viam, sem provas, uma fraude na última eleição que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva ao Poder Executivo. De acordo com eles, cabia às FAs dar suporte a um projeto de golpe que derrubasse a presidência eleita e devolvesse Bolsonaro, que perdeu o pleito, ao poder.
O próprio ex-presidente, enquanto estava no cargo, defendeu em inúmeros discursos o “Poder Moderador”. Nas suas falas, como quando disse em outubro de 2021 que o exército estava totalmente subordinado às suas decisões, cabia a ele a função de dissolver qualquer oposição no Legislativo e Judiciário que prejudicasse os seus objetivos.
O ministro Luiz Fux, relator do caso, declarou em seu voto que "nenhuma Constituição republicana, a começar pela de 1891, instituiu o Poder Moderador. Seguindo essa mesma linha e inspirada no modelo tripartite, a Constituição de 1988 adotou o princípio da separação de poderes, que impõe a cada um deles comedimento, autolimitação e defesa contra o arbítrio.” Ele reforçou que o dispositivo não permite "qualquer interpretação que admita o emprego das Forças Armadas para a defesa de um Poder contra o outro" e que elas são instrumentos de Estado, e não de governo.
O julgamento no STF é resultado da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.457, que o PDT apresentou em 2020, questionando a aplicação do dispositivo. O partido questionou, no documento, a interpretação do inciso por juristas de viés “reacionário” que garantiria essa função aos militares.
Confira o Artigo 142 na sua integridade:
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Não é por acaso que a votação da inconstitucionalidade do Poder Moderador está acontecendo nos 60 anos de aniversário do golpe militar de 1964, que colocou o país em uma ditadura que durou 21 anos.
Desde o início da República, no século XIX, as FAs têm intervindo na política em momentos de crise ou de rompimento com as instituições. Foi o caso do movimento tenentista que resultou na Revolução de 1930 e colocou Getúlio Vargas no poder. Em 1945, ele foi derrubado também por uma movimentação que envolveu setores da caserna.

"O poder é apenas civil, constituído por três ramos [Executivo, Legislativo e Judiciário] ungidos pela soberania popular, direta ou indiretamente", escreveu Flávio Dino no seu voto como ministro do STF, lembrando o golpe como "um período abominável da nossa História Constitucional".
Gilmar Mendes, ministro do STF, por sua vez, disse que o Supremo está “reafirmando o que deveria ser óbvio. A hermenêutica da baioneta não cabe na Constituição. A sociedade brasileira nada tem a ganhar com a politização dos quarteis e tampouco a Constituição de 1988 o admite”, escreveu em sua decisão.
A conclusão do caso está prevista para acabar até o dia 8 de abril. Além de Fux, Dino e Gilmar Mendes, os ministros Luís Roberto Barroso, André Mendonça e Edson Fachin votaram contra o Poder Moderador. Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e Cristiano Zanin ainda não depositaram seus votos.
O governo de João Goulart foi deposto pelos militares no dia 1º de abril de 1964 por meio de um golpe, sob justificativa de uma suposta “ameaça comunista”. A ditadura durou 21 anos, se intensificando por meio de atos institucionais (AI). Dentre eles, o AI-5 foi o mais rigoroso, estabelecendo a censura, a tortura e a perseguição de inimigos políticos do Estado.
Cantores, intelectuais, professores, estudantes, jornalistas e muitos outros profissionais foram fortemente censurados pelo regime, com a utilização do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna). O principal objetivo era reprimir e censurar os opositores da ditadura. Rita Lee foi uma das cantoras mais censuradas durante o período. Caetano Veloso e Gilberto Gil foram exilados, vivendo quase dois anos fora.
A morte do jornalista Vladimir Herzog foi uma virada de chave para o fim da ditadura. Comovidos, os cidadãos se juntaram na Catedral da Sé em uma manifestação dia 31 de outubro de 1975, de forma pacífica contra o regime e em memória de Herzog. O jornalista se tornou símbolo de resistência contra a ditadura.

O silêncio do Governo
Em setembro de 2023, o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, anunciou a criação de um Museu da Memória e dos Direitos Humanos, durante viagem ao Chile, para lembrar não só o golpe, mas homenagear os mortos, presos e perseguidos na ditadura. De acordo com dados do Governo Federal, 364 pessoas ainda não foram encontradas.
Quando anunciou o projeto, Dino afirmou que o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania faria a organização e realização do projeto, enquanto a pasta da Justiça entraria com o capital. Porém, de acordo com o G1, o projeto não avançou e tampouco sairá do papel, por decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de não gerar atritos com os militares.
Já em 2024, em entrevista ao jornalista Kennedy Alencar na RedeTV!, Lula disse que não quer remoer o golpe de 1964 e que sua maior preocupação é com os atos de 08 de janeiro de 2023, quando golpistas invadiram e depredaram a Praça dos Três Poderes, em Brasília.
Além disso, o governo ainda não cumpriu com uma de suas promessas de campanha de voltar com as atividades da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), desativada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). A CEMDP é responsável por identificar e localizar pessoas desaparecidas durante o período ditatorial.
O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania planejava um ato em memória das vítimas para a última segunda-feira (01), porém a Presidência da República ordenou que o evento fosse cancelado. O governo decidiu ainda que não realizaria nenhum ato alusivo aos 60 anos do golpe.
Dos 38 ministros de Lula, apenas sete se manifestaram pessoalmente em memória do evento histórico e político mais relevante da República brasileira no século XX: Camilo Santana (Educação), Cida Gonçalves (Mulheres), Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), Sonia Guajajara (Povos Indígenas) e Silvio Almeida (Direitos Humanos).
Entre os integrantes do Executivo, a fala mais incisiva foi a de Silvio Almeida. O ministrou afirmou em sua postagem em uma rede social que “foi preciso odiar a escravidão e seus institutos para que ela tivesse fim; os nazistas e seus símbolos para derrotá-los; o fascismo e todos que o celebram. É imprescindível repudiar visceralmente e com todas as forças aqueles que humilham e destroem a vida de trabalhadores e de minorias”.
Por que ditadura nunca mais?
— Silvio Almeida (@silviolual) March 31, 2024
Porque queremos um país social e economicamente desenvolvido, e não um “Brasil interrompido”
Porque queremos um país soberano, que não se curve a interesses opostos aos do povo brasileiro
Porque queremos um país institucional e culturalmente…
Caminhada do Silêncio
A Caminhada do Silêncio pelas Vítimas de Violência do Estado, é outro evento importante que ocorre anualmente em São Paulo, homenageando vítimas da Ditadura
Sua quarta edição partiu da antiga sede do DOI-CODI, prédio onde eram realizadas torturas, assassinatos e desaparecimentos de presos políticos, no último domingo (31). Os manifestantes caminharam com o lema "Para que não se esqueça, para que não continue acontecendo" e fizeram duras críticas a Lula e ao governo por conta da suspensão de cerimônias institucionais em memória e rejeição à ditadura.
O ato organizado pelo Movimento Vozes do Silêncio, representado pelo Instituto Vladimir Herzog, o Núcleo de Preservação da Memória Política e a Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), com apoio da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, contou ainda com a participação de importantes figuras da política nacional contemporânea como o deputado estadual Eduardo Suplicy (PT) e a deputada federal e ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (PSOL).

Durante seu discurso, Erundina disse: “Vamos continuar cobrando, exigindo e levando às novas gerações a realidade sobre aquele tempo para que eles também nos ajudem a continuar essa luta”. A deputada completa afirmando que não podemos admitir que a ditadura seja esquecida.
A vida antes da política
Marielle Francisco da Silva, conhecida socialmente por Marielle Franco, filha de Marinete Francisco e Antônio da Silva Neto, nasceu em 27 de julho de 1979. Cresceu no Complexo de favelas da Maré, no Rio de Janeiro. Começou a trabalhar com seus pais aos 11 anos, determinada a juntar dinheiro e custear seus estudos.
Aos 19 anos, deu à luz a sua filha Luyara Franco. No mesmo ano, em 1998, ingressou seus estudos para o vestibular em um cursinho comunitário oferecido aos jovens da Maré. Quatro anos depois, foi aprovada com bolsa integral, pelo Programa Universidade para Todos (PROUNI), em Ciências Sociais, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).
Anos depois, em 2014, obteve seu mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF), onde apresentou a tese “UPP: A Redução da Favela a Três Letras”.
Franco conheceu Mônica Benício, a primeira mulher por quem se apaixonou, por meio de amigas em comum, em 2004. Começaram a namorar um ano após se conhecerem. Entre idas e vindas, a união só foi formalizada em 2015. Mônica e Marielle moravam juntas na Barra da Tijuca e tinham planos para festejar o casamento em setembro de 2019.

Marielle tinha o apoio da família para entrar na política.Foto: Instagram @mariellefranco
Vereadora Marielle Franco
Marielle sentiu a necessidade de erguer a voz da militância pelo povo, quando ainda tinha 20 anos, ao perder injustamente uma amiga durante um confronto entre traficantes e policiais. O estímulo para lutar pelos direitos das mulheres e debater esse assunto dentro das comunidades perdurava, sobretudo, por uma motivação: criar a filha em um lugar seguro.
Sua carreira no ambiente político teve início quando integrou a equipe de Marcelo Freixo (PSOL), eleito deputado estadual do Rio de Janeiro, em 2006. Marielle trabalhou como assessora parlamentar por 10 anos. Nessa época, atuou junto ao deputado na “CPI das Milícias”.
Em 2016, na sua primeira disputa eleitoral, a cientista política elegeu-se vereadora, sendo a quinta mais votada do município com mais de 46 mil votos.
Durante o seu mandato, deu voz às pautas pelas quais se propunha. Foi presidente da Comissão de Defesa da Mulher, com planos de elevar a representatividade das mulheres pretas e periféricas; coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, prestando assistência jurídica e psicológica aos familiares de vítimas de homicídios e policiais vitimados; criou o Projeto de Lei das Casas de Parto, que propõe lugares voltados a partos normais, com médicos e enfermeiros obstétricos, além do acompanhamento integral da gestante com nutricionistas e assistência social; também criou o projeto de lei que regulariza o trabalho dos mototáxis.
Marielle não se calava, trabalhou pela denúncia dos abusos policiais nas operações das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora). Pouco antes do dia em que teve a sua vida tirada brutalmente, fez parte da Comissão responsável por monitorar a intervenção federal na Favela de Acari.

Marielle defendeu o direito e a representatividade das mulheres pretas.Foto: Instagram @mariellefranco
Sementes de Marielle: uma luta de todos
Na noite do dia 14 de março de 2018, a vereadora retornava de um debate promovido pelo PSOL, na Casa das Pretas, quando foi surpreendida por um carro que parou ao lado do seu e abriu fogo contra seu veículo, atingindo a cabeça de Marielle Franco e o tórax de Anderson Gomes, seu motorista. Os dois morreram na hora e a assessora da parlamentar, Fernanda Chaves, que também estava no carro, sofreu leves ferimentos com os estilhaços.
O silenciamento de uma mulher preta, LGBT e favelada atuante fortaleceu o grito de milhares nas ruas. Após a morte de Franco e seu motorista, a pergunta que emergiu durante esses anos foi: quem mandou matar Marielle? Manifestações eclodiram por todo o Brasil e pelo mundo atrás dessa resposta. No Rio de Janeiro, no centro da Cinelândia, a população foi às ruas após acompanhar o cortejo da política na Câmara. Em São Paulo, manifestantes fecharam a Av. Paulista em frente ao MASP. Em Portugal e Nova York, também houve atos para expressar o luto e a revolta contra o sistema de violência no país.
Artistas também expuseram sua indignação com tamanha violência.Caetano Veloso publicou em suas redes sociais um vídeo cantando “Estou triste”, com a legenda “#lutopormarielle” e “#mariellepresente”. Também foi homenageada em músicas, como no rap “Favela Vive 3”, em que o cantor Choice canta “Gritei Marielle presente, essa bala também me fere”.
A memória e o legado de Marielle Franco resistiram e resistem. No estado do Rio de Janeiro, foi instituído, no calendário oficial, o dia 14 de março como “Dia Marielle Franco – Dia de luta contra o genocídio da Mulher Preta”. A figura da militante ganhou respeito pela Medalha Tiradentes e o Diploma Bertha Lutz, como reconhecimento em sua batalha pelas causas públicas e contribuição na defesa do direito das mulheres. Ela também foi homenageada em escolas de samba, a Vai-Vai, de São Paulo, apresentou um mosaico com a foto de Marielle na ala “eu tenho um sonho”.
Para prosseguir o mandato, foi criado pela família da vereadora o Instituto Marielle Franco. Dirigido por sua irmã Anielle, o órgão tem mantido viva sua memória e desenvolvido políticas para as mulheres e a população periférica.

Criada na Maré, revolucionou o lugar de uma mulher periférica na política. Foto: Instituto Marielle Franco
Quem mandou matar Marielle?
Um ano após o assassinato da Franco e Gomes, as respostas começaram a surgir. O ex-militar Élcio Vieira de Queiroz e o militar reformado Ronnie Lessa, identificados como os executores do crime, foram presos. No entanto, quem ordenou o crime? Os nomes só vieram a público cinco anos mais tarde.
Depois de falsas testemunhas e tentativas de atrapalhar as investigações, no último dia vinte e quatro de março, Ronnie Lessa, acusado por atirar contra o carro da vereadora, aceitou um acordo em delação premiada e entregou Domingos Brazão, ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e o deputado federal Chiquinho Brazão, vereador na época, como os mandantes do assassinato. Ambos foram presos junto ao delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil (PC), acusado de engavetar as investigações na Delegacia de Homicídios quando era chefe do distrito. Barbosa assumiu o cargo na PC em 8 de março de 2019.
Os três estão presos preventivamente e o caso corre sob o procedimento de indiciamento que, passado pelo Supremo Tribunal Federal, será encaminhado para o Ministério Público. O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, declarou no dia da publicação das investigações sobre os mandantes do crime contra Marielle, que o caso está concluído. Até onde? Descobrir quem matou será suficiente para que outras mulheres não sejam vítimas da violência miliciana?
A demora do caso demonstra a fragilidade da justiça brasileira dentro da corrupção praticada pelos agentes públicos e questiona qual o papel dos políticos no Brasil.