É de conhecimento popular que em tempos de eleição tudo se promete, e a consulta da PUC-SP não é diferente. Para angariar votos de possíveis eleitores, as duas chapas que concorrem aos cargos de reitor e vice-reitora prometem tudo, ou quase tudo.
Dentre as promessas, por exemplo, estão as de modificar os planos de carreira dos professores, comprar equipamentos para os laboratórios, mudar o sistema de horas de trabalho dos funcionários e renovar os campi da universidade.
Os professores Vidal Serrano, cabeça da chapa Renova PUC, e Márcio Fonseca, cabeça da chapa Nosso Tempo é Agora, proferem diariamente discursos e lançam panfletos e propagandas garantindo vários aperfeiçoamentos do sistema universitário.
Alunos, funcionários e professores se deixam levar pelas palavras de líderes que representam um sentimento de transformação da PUC-SP. O problema é que grande parte das propostas de campanha das duas chapas depende de aprovação de outras instâncias administrativas da instituição.
O sistema de comando na universidade é simples. A Fundação São Paulo (FUNDASP), comandada pelo Arcebispo de São Paulo e seus bispos auxiliares, é a autoridade máxima e mantenedora da PUC-SP. Abaixo dela estão o Conselho Universitário (CONSUN), que é um órgão consultivo por onde passam em votação todas as questões acadêmicas da universidade, e o Conselho Administrativo (CONSAD), uma entidade similar que decide todas as questões econômicas, patrimoniais e financeiras da PUC-SP.
O reitor e o vice-reitor submetem suas propostas para essas duas organizações e devem acatar suas decisões sempre. O papel desses cargos é o de levar as pautas, discussões, deliberações ou votações para essas instâncias superiores.
E o que isso implica de fato? Vamos pegar um exemplo prático. A chapa Renova PUC afirma, em seu programa de campanha, que irá “aumentar a disponibilidade de praças esportivas para os alunos”. Ora, isso implica um gasto financeiro e uma mudança do espaço físico da PUC-SP. Dessa maneira, a proposta de criação dessas praças será invariavelmente levada para debate no CONSUN e, se aprovada, para o CONSAD.
Lá, dois secretários-executivos nomeados pela FUNDASP e o reitor votam para aprovação ou rejeição do projeto em maioria simples, ou seja, 2 votos são necessários para uma vitória. Nesse caso, se os representantes da Fundação não quiserem novos espaços esportivos, o reitor nada poderá fazer. Ele será um voto vencido.
Mesmo se os secretários forem a favor, as questões patrimoniais devem sempre ser levadas para um parecer dos administradores da FUNDASP, como fica explícito no estatuto da PUC-SP. Ou seja, o papel do reitor é levantar suas decisões políticas feitas em sua campanha para serem consideradas por esses corpos.
Propostas similares da campanha Nosso Tempo é Agora irão encontrar a mesma burocracia por serem mudanças que revolvem em questões patrimoniais ou em aumento de gastos. São elas: “Propor a criação de espaços dedicados a grupos de pesquisa”; “Aumento gradual e constante do orçamento destinado à pesquisa.”; “Garantir uma iluminação adequada em todos os espaços dos campi (...) para aumentar a visibilidade e reduzir os pontos cegos que podem representar riscos à segurança” e “Atualização (tecnologia 5G) e ampliação dos pontos de acesso à Internet sem fio nos campi da PUC-SP (...)”.
Outros temas muito abordados pelos planos de campanha também não são de competência exclusiva do reitor. No caso das bolsas, o artigo 28 do estatuto esclarece que qualquer política da área na PUC-SP deve ser submetida à Fundação São Paulo. Também, toda geração de despesas pelas pró-reitorias, como explicitado na seção II do mesmo documento, deve ser aprovada pela FUNDASP. E, por fim, os planos de ingresso, salários e promoção dos docentes devem ser dirigida pelos Planos Acadêmicos de Curso redigidos pela mantenedora.
Propostas, como da chapa Renova PUC, de “revisão de salários e contratos" dos professores, de “definição de reajuste das mensalidades” e de propor “o aumento do número de bolsas concedidas durante a graduação por razões de vulnerabilidade financeira” também dependem de outros órgãos para sua aprovação.
A chapa Nosso Tempo é Agora, apesar de instruir em seu programa de gestão algumas questões administrativas e a relação entre corpos da gestão, anda na mesma linhas, como a proposta de “desenvolver projetos de extensão e ampliar programas de bolsas em colaboração com empresas e ONGs”, a de “criação de política de permanência para estudantes bolsistas” e a de “investir em tecnologias mais avançadas e adequadas às demandas atuais e futuras”.
A minha sugestão, portanto, ao leitor é: preste muita atenção em promessas de campanha que acarretam aumento de gastos, mudanças de orçamentos ou modificação da infraestrutura. O que a Reitoria pode fazer, nesses casos, é levar essas discussões para o CONSUN e o CONSAD, que irão decidir seus rumos. A outra função desse cargo é o de gerência acadêmica. Isso implica a gestão de currículos, cursos, métodos de ensino, graduações, mestrados e doutorados.
Mas, mesmo nesses casos, a questão não é tão simples. Toda mudança nos planos e gerências dessas áreas deve ser votada pelo CONSUN. Esse corpo deliberativo, formado pelo reitor, pró-reitores, diretores das faculdades, um professor de cada curso, funcionários, um representante estudantil, o coordenador da Pastoral Universitária e um representante da FUNDASP, irá aprovar ou rejeitar projetos educacionais.
Nesse sentido, uma mudança como a “reestruturação e recomposição da equipe técnico- administrativa da SAE-EC e da Pós-Graduação lato sensu”, prometida pela chapa Nosso Tempo é Agora, deve ser votada por um corpo de interesses e origens variadas, com diversos objetivos que podem ser conflitantes.
Ainda por cima, os líderes da FUNDASP têm o direito de exonerar o reitor e os pró-reitores a qualquer momento, recompondo o CONSUN de forma mais amigável aos seus interesses. Apesar desta situação nunca ter acontecido, esta possibilidade está prevista no estatuto.
Dessa forma, por que a relutância em falar sobre os conselhos e as questões administrativas envolvendo a PUC? No programa de gestão da Renova PUC, em 16 páginas, a FUNDASP é mencionada 7 vezes, o CONSUN apenas 1 vez e o CONSAD nem sequer é citado. No programa da Nosso Tempo é Agora, em 77 páginas, a FUNDASP é mencionada 23 vezes, enquanto o CONSUN e o CONSAD são referenciados 5 vezes cada.
Ambas as chapas parecem se beneficiar do desconhecimento da comunidade universitária ao passarem a percepção de unilateralmente resolver as demandas dos funcionários, professores e alunos da PUC-SP. Nesse caso, os candidatos a reitor tomam forma como grandes personagens que poderão solucionar tudo à sua maneira.
Para o leitor melhor entender a situação administrativa da nossa universidade, destaquei alguns pontos importantes do estatuto que sugiro a leitura:
SOBRE O CONSUN
Art. 20. O CONSUN é constituído:
I – pelo Reitor, seu Presidente;
II – pelo Vice-Reitor, sem direito a voto;
III – pelo Pró-Reitor de Graduação, pelo Pró-Reitor de Pós-Graduação, pelo PróReitor de Educação Continuada, pelo Pró-Reitor de Planejamento e Avaliação Acadêmicos, e pelo Pró-Reitor de Cultura e Relações Comunitárias;
IV – pelos Diretores de Faculdade;
V – por 01 (um) Representante docente de cada Faculdade integrante da carreira do magistério, indicado por seus pares;
VI – por funcionários administrativos da PUC-SP, indicados por seus pares em número equivalente aos representantes docentes das Faculdades, sendo pelo menos um de cada campus;
VII – por representantes discentes, sendo um de cada Faculdade, indicados por seus pares;
VIII – por 01 (um) representante da Fundação São Paulo, indicado pelo Presidente do Conselho Superior;
IX – por 01 (um) representante da sociedade civil organizada, indicado pelo Presidente do Conselho Superior da Fundação São Paulo;
X – pelo Coordenador da Pastoral Universitária.
Cabe ao CONSUN apenas questões acadêmicas, como:
I - aprovar a política educacional, de desenvolvimento e permanente qualificação do Ensino, da Pesquisa e da Extensão da PUC-SP
II - aprovar o Plano de Desenvolvimento Institucional
III - apreciar os Planos Acadêmicos da PUC-SP
V – aprovar as normas e orientações gerais de programas e projetos de ensino, pesquisa e extensão, bem como as normas gerais da Graduação, Pós-Graduação e Educação Continuada da
VI – homologar os Projetos Pedagógicos dos cursos encaminhados pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão;
SOBRE O CONSAD
O CONSAD é constituído:
I – pelo Reitor, como presidente;
II – por 01 (um) Pró-Reitor da área acadêmica, escolhido entre os Pró-Reitores de Graduação, Pós-Graduação, Educação Continuada ou Planejamento e Avaliação Acadêmicos;
III – pelo Pró-Reitor de Cultura e Relações Comunitárias;
IV – pelos Secretários Executivos da Fundação São Paulo.
Parágrafo único - São membros com direito a voto o Reitor e os Secretários Executivos da Fundação São Paulo.
Compete ao CONSAD:
I – decidir sobre as questões econômico-financeiras da PUC-SP;
II – fixar os valores dos encargos educacionais e das taxas escolares;
III – decidir sobre a viabilidade financeira dos cursos, também no tocante à fixação, ampliação e diminuição de vagas;
VI – indicar a política salarial da PUC-SP, remetendo à deliberação da Mantenedora;
XI – emitir parecer prévio quanto ao orçamento e ao Plano de Trabalho da PUC-SP, bem como de seu balanço anual;
XII – emitir parecer sobre questões patrimoniais;
§4º As deliberações previstas nos incisos XI e XII deverão ser submetidas à aprovação da Fundação São Paulo.