Parecia só mais uma manifestação costumeira na prainha da PUC-SP. Muita gente falando no palanque improvisado, pouco público, menos gente ainda ouvindo. Distribuição de panfletos e adesivos. Pessoas se movimentando, passando para o prédio velho, novo, para o bosque, ou indo embora. Alguns alunos e professores param por alguns minutos para bisbilhotar alguma fala interessante. A diferença é que a caixa de som, desta vez, era boa. Também vale ressaltar que tudo se tratava de um comício de um candidato à Reitoria da faculdade.
Esse aparente tom de banalidade não parece condizer com a importância do evento. Ao contrário da maioria das universidades privadas no país, a PUC-SP elege, de quatro em quatro anos, reitor e vice-reitor através de uma consulta que leva em conta todos os funcionários, professores e alunos dos campi Perdizes, Sorocaba, Consolação, Ipiranga e Santana.
Essa prática eletiva foi instaurada por Dom Paulo Evaristo Arns, no início da década de 1980. O Brasil estava submerso há quase 20 anos pela ditadura militar, que impedia as eleições diretas a cargos executivos no país.
O pleito propõe duas fases. Na primeira, a votação é feita de forma paritária, ou seja, é proporcional. Os candidatos com mais votos ganham. Na segunda fase, os vitoriosos formam uma lista tríplice, encaminhada para o Cardeal Metropolitano de São Paulo, mantenedor da universidade. Ele irá escolher, entre os três vencedores, reitor e vice-reitor para os próximos quatro anos.
Apesar da praxe ser de o candidato que figurar em primeiro lugar ser empossado, houve vezes em que isso não aconteceu. Em 2012, o Cardeal-Arcebispo Dom Odilo Scherer decidiu empossar a Profa. Dra. Anna Maria Marques Cintra, que foi a terceira mais votada na consulta à comunidade da época. Essa quebra súbita de uma longa tradição democrática levou estudantes e professores a encabeçarem uma greve geral para que o Prof. Dr. Dirceu de Mello, que foi o mais votado do pleito, tomasse o lugar como reitor.
A movimentação interna que levou à decisão inesperada da administração teve como ponto de partida algo imperceptível. Na década de 2000, a Universidade perdeu autonomia e deu mais autoriadade para a Fundação São Paulo (FUNDASP), comandada pelo Arcebisco Metropolitano de São Paulo e pelos Bispos Auxiliares da Arquidiocese da cidade.
A instituição existe desde 1946, mas para conter a crise financeira e o rombo de 80 milhões no déficit bancário da Universidade, acabou formando em 2007 o Conselho de Administração da PUC-SP (CONSAD). Essa entidade se tornou voz final em assuntos ecônomicos-financeiros, trabalhistas e patrimoniais que envolvem todas as faculdades. Os temas, antes, eram geridos pela própria PUC-SP.
Para obter tais resultados, os mantenedores da universidade cortaram salários, extinguiram ou diminuíram cursos, demitiram funcionários e professores, e iniciaram um processo marcado pelos cortes dos custos dos campi que se arrasta até hoje.
Neste ano, as duas chapas que concorrem ao cargo de reitor foram formadas com a promessa de lutar e mediar soluções contra essas medidas. A chapa Renova-PUC, encabeçada pelo professor e diretor da Faculdade de Direito, Dr. Vidal Serrano Jr, e a candidata a vice-reitora, Dra. Carla Reis Longhi, tem como palavra de ordem a renovação e a inovação nos cargos de reitor e vice-reitora. Ela também se autointitula “oposição da reitoria atual”, que é identificada com a gestão da FUNDASP.
A segunda chapa, O Nosso Tempo é Agora, do candidato Prof. Dr. Márcio Alves da Fonseca e sua vice Dr. Patrícia Penha, promete um processo de mudança e maior aproximação das demandas dos funcionários, estudantes e professores. A campanha reivindica, ainda, ser contra as políticas neoliberais implementadas na PUC-SP desde a adoção de sua mantenedora, apesar do candidato a reitor ser o atual Pró-reitor de Pós-Graduação da universidade.
Recentes crises na universidade, como a de segurança, geraram insatisfação na comunidade e um clima propício para chapas se apropriarem do discurso anti-FUNDASP.
Já em 2024, ocorreu um furto, dentro do campus Monte Alegre, de aparelhos eletrônicos com o valor estimado em 30 mil reais. Reagindo a esse fato, a página do Instagram “Spotted PUC” mobilizou uma campanha pedindo catracas nas instalações da universidade. De forma inesperada, a FUNDASP declarou interesse em instalá-las em seus campi.
Estudantes se manifestaram contra e a favor da decisão, e, por consequência, movimentos reivindicaram direitos e reclamaram sobre várias carências da infraestrutura do campus Monte Alegre. A crise com a Fundação São Paulo, que não se manifestou quanto às demandas dos estudantes, foi reavivada.
A função dos reitores e vice-reitores, que ainda passa despercebida pela comunidade puquiana, é de formular o Plano de Desenvolvimento Institucional da PUC-SP, que formaliza os objetivos da evolução universitária. Além disso, cabe a eles aprovarem o Calendário Geral e o Orçamento Anual da Universidade. A reitoria constitui, também, um dos votos do Conselho de Administração (CONSAD), enquanto outros dois pertencem aos secretários executivos representantes da FUNDASP.
É nesse clima de buscar a atenção dos eleitores - que não são obrigados a votar - insatisfeitos com a situação da universidade que se iniciou a campanha eleitoral, que vai do dia 29 de abril a 19 de maio. O período de votação, que é digital e deve ser realizada com o e-mail cadastrado pela PUC-SP, está aberta entre os dias 20 e 24 de maio.