Artista também é terceira mulher a vencer a categoria de Melhor Álbum de Rap no Grammy
por
Beatriz Alencar
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14/03/2025 - 12h

A cantora Doechii foi nomeada a Mulher do Ano de 2025 pela Billboard, com o anúncio feito nesta segunda-feira (10). Com o título, a artista norte-americana tornou-se a segunda rapper a ganhar a honraria no mundo da música, a primeira foi a Cardi B, premiada em 2020.

A revista da Billboard descreveu Doechii como uma das principais artistas da atualidade a “redefinir o que é ser uma precursora na indústria musical”. Ela será homenageada em um evento da Billboard no final deste mês.

Foto: Divulgação álbum “Alligator Nites Never Heal” | Reprodução: Redes sociais | Fotógrafo: John Jay

Foto: Divulgação álbum “Alligator Nites Never Heal” | Reprodução: Redes sociais | Fotógrafo: John Jay

A rapper, de apenas 26 anos, fortaleceu mais a carreira musical em 2024, com o lançamento do álbum “Alligator Bites Never Heal”, uma aposta de mistura entre os gêneros R & B e hip-hop. O mixtape foi indicado para três categorias do Grammy, entre eles o Melhor Álbum de Rap, marcando a primeira vez desse estilo de faixa feito por uma mulher a alcançar essa indicação.

Apesar disso, após a indicação de Melhor Álbum de Rap, Doechii foi convidada para fazer parte da faixa “Baloon” do álbum “Chromakopia”, do rapper Tyler, The Creator. A participação aumentou a visibilidade da artista que começou a fazer apresentações virais em festivais e em programas de rádio e televisão.

As composições de Doechii já viralizavam nas redes sociais desde 2020, com músicas como “What It Is” e "Yucky Blucky Fruitcake", mas as músicas não eram associadas com a imagem da artista. Foi somente após o espaço na mídia tradicional e o convite de Tyler que a rapper foi reconhecida.

Em fevereiro deste ano, Doechii se tornou a terceira mulher a vencer a categoria de Melhor Álbum de Rap no Grammy ao sair vitoriosa na edição de 2025, novamente, seguindo a história de Cardi B.

Foto: sessão de fotos para a revista The Cut - edição de fevereiro | Fotógrafo: Richie Shazam

Foto: sessão de fotos para a revista The Cut - edição de fevereiro | Fotógrafo: Richie Shazam

A apresentação da artista norte-americana na premiação, ocorrida no dia 2 de fevereiro, também foi classificada pela Billboard, como a melhor da noite. A versatilidade, modernidade e o fato de ser uma mulher preta na indústria da música, aparecem tanto nas faixas de Doechii quanto nas roupas e shows, fixando essas características como um dos pontos principais da identidade da artista.

A rapper tem planos de lançar o próximo álbum ainda em 2025, e definiu os últimos meses como um "florescer de um trabalho longo", em declaração a jornalistas na saída do Grammy.

Pesquisa do Datafolha evidencia a complexidade das percepções raciais no país
por
Letícia Alcântara
Sophia Razel
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03/12/2024 - 12h
Garotas negras em pé e sentadas em um corredor
Jovens reunidos em um espaço que reflete a diversidade  Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Na última terça-feira de novembro (25), uma pesquisa conduzida pelo Instituto DataFolha e divulgada na mesma semana revelou dados significativos sobre a percepção racial no Brasil. O levantamento mostrou que 6 em cada 10 pessoas que se autodeclaram pardas não se consideram negras, evidenciando uma desconexão entre a autodeclaração oficial e a forma como essas pessoas percebem sua identidade racial. Por outro lado, entre os brasileiros que se identificam como pretos, 96% se reconhecem como negros, enquanto 4% não compartilham dessa visão.

Em relação a preconceito e racismo, a mesma pesquisa revelou que 59% dos brasileiros consideram que a maioria da população é racista, 30% considera que apenas uma minoria, 5% que toda a população seria, 4% que ninguém seria, enquanto 2% não souberam responder. Entre os gêneros, 74% das mulheres  acreditam que todos ou a maioria dos brasileiros são racistas. Por sua vez, entre os homens, esse percentual cai para 45%.

 

Percepção e Vivências do Racismo no Brasil

Ainda sobre a percepção referente ao racismo no Brasil, para 45% da população o racismo aumentou ao longo dos anos, enquanto 35% acreditam que o cenário  permanece o mesmo. Apenas 20% dos entrevistados enxergam uma redução nos casos de discriminação.

Quando perguntados em relação ao contexto onde o racismo está mais presente, a maioria dos brasileiros, 56%, aponta que as atitudes das pessoas são a principal manifestação do problema. Outros 27% acreditam que ele está mais evidente nas estruturas institucionais, como empresas e governos, enquanto 13% consideram que o racismo está igualmente distribuído entre comportamentos individuais e sistemas institucionais. Por fim, 4% dos participantes não souberam opinar sobre a questão.

A pesquisa também abordou vivências individuais de discriminação. Entre os entrevistados que se identificam como pretos, 56% relataram já ter sofrido preconceito relacionado à cor da pele. Esse percentual é significativamente maior entre os pardos, dos quais 17% relataram ter enfrentado situações semelhantes. Já entre os brancos, o índice cai para 7%.

Realizado em 113 municípios brasileiros, o estudo contou com a participação de aproximadamente 2.004 pessoas e buscou compreender as nuances entre autodeclaração racial e identidade, além de explorar como os brasileiros enxergam o racismo na sociedade. O objetivo do levantamento é fomentar debates mais aprofundados sobre a questão racial no país. 

Homenagens a figuras importantes buscam eternizar legados, mas memórias ainda enfrentam apagamento e negligência
por
Majoí Costa
Nicole Conchon
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22/11/2024 - 12h

 

As ruas, avenidas e praças que cruzamos diariamente não são apenas caminhos, mas também registros históricos. Seus nomes, frequentemente memorando políticos, militares, religiosos ou escritores, carregam a tentativa de manter viva a memória de pessoas importantes. O que poucas pessoas sabem é que as principais ruas da cidade carregam nomes de famílias negras que ajudaram a moldar a história de São Paulo e do Brasil como um todo. 

 

Avenida Rebouças, nome em homenagem à família negra de prestígio / Foto: Mariana Orsi
Avenida Rebouças, nome em homenagem à família negra de prestígio / Foto: Mariana Orsi

Historicamente, figuras negras de renome sofreram um processo de embranquecimento a fim de tentar esconder ao máximo sua conexão com a negritude. Quando essa estratégia não funciona, o apagamento entra. Por conta disso, essas homenagens nem sempre têm a visibilidade ou o reconhecimento merecidos. Portanto, relembrar essas histórias é um convite à memória, resistência e celebração das contribuições históricas de figuras negras que ajudaram a moldar o país.

Confira as principais ruas com nomes de pessoas negras na cidade e onde se localizam:

Rua Luiz Gama (Cambuci)

Luiz Gama foi um intelectual negro do século 19, jornalista e advogado autodidata. Ele conquistou sua própria liberdade e dedicou sua vida à defesa do fim da escravidão. Sua atuação foi essencial para libertar centenas de escravizados por vias legais.

Rua Cruz e Souza (Aclimação)

Inaugurada em 1936, essa rua homenageia o poeta Cruz e Souza, também chamado de Cisne Negro, por criar o movimento simbolista no Brasil do século XIX que que buscava expressar emoções e ideias abstratas por meio de imagens sugestivas e místicas. Filho de pessoas escravizadas, o autor deixou sua marca na literatura brasileira ao lançar obras que desafiaram as convenções de sua época.

Avenida Rebouças (Zona oeste)

O nome homenageia uma família negra de prestígio no século 19. O patriarca, Antônio Pereira Rebouças, foi conselheiro de Dom Pedro II. Seus filhos, André e Antônio Rebouças, se destacaram como engenheiros responsáveis por grandes obras de infraestrutura no país. Seus principais trabalhos foram o novo plano de abastecimento de água do Rio de Janeiro após a seca em 1870 e a estrada de ferro Curitiba-Paranaguá que liga a capital paranaense ao porto de Paranaguá.

Rua Teodoro Sampaio (Pinheiros)

Teodoro Sampaio foi engenheiro, geógrafo e historiador. Suas contribuições no mapeamento e na construção de obras públicas ajudaram a moldar o território brasileiro.

Avenida Mário de Andrade (Barra Funda)

Inaugurada em 1978, a avenida homenageia o poeta e escritor Mário de Andrade, figura central do modernismo brasileiro e defensor da diversidade cultural e racial do país.

Rua Machado de Assis (Vila Mariana)

Desde 1912, essa rua leva o nome de Machado de Assis, um dos maiores escritores brasileiros. Fundador da Academia Brasileira de Letras, ele foi pioneiro ao explorar temas raciais, sociais e psicológicos em suas obras.

 

Entretanto, esses nomes ainda são exceções em uma cidade onde a maioria das homenagens em ruas é destinada a pessoas brancas. Pressionar por mais representatividade nas nomenclaturas urbanas é uma maneira de manter viva a memória de heróis negros e negras, ampliando sua visibilidade e reconhecimento. 

Recentemente, debates sobre questões raciais no espaço público ganharam força, como a polêmica envolvendo as luminárias do bairro da Liberdade, reacendendo discussões sobre a valorização da história afro-brasileira.

Bairro da liberdade em 1998
Bairro da liberdade em 1998 / Foto: Greg Salibian 

A identidade do bairro foi moldada, com forte ênfase na cultura japonesa desde os anos 1970, enquanto sua história negra foi sendo aos poucos ofuscada. O bairro, que já abrigou uma significativa população negra e foi palco de importantes eventos históricos, como por exemplo execuções públicas de escravizados, viu sua memória alterada pela instalação dessas luminárias e apagamento de símbolos de herança afro-brasileira. O debate recente destaca a necessidade de valorizar e lembrar essa parte da história, ao invés de apagá-la ou tentar escondê-la com outras questões.​

Homenagens como essas dadas a pessoas negras em vias e ruas importantes da cidade ajudam a construir uma metrópole mais inclusiva e consciente de sua diversidade histórica.

Torcedores do Valencia são condenados a oito meses de prisão por conta dos ataques racistas contra o jogador.
por
Julia Sena
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01/07/2024 - 12h

 

Atuando pelo Real Madrid e pela Seleção Brasileira, Vinicius Jr. é um exemplo de excelência dentro e fora de campo. O “Caso Vinicius Jr.” ganhou ainda mais destaque no mês de junho devido a condenação de três torcedores do Valencia por ataques racistas cometidos durante uma partida em maio de 2023 no estádio Mestalla. 

Vini Jr. está com um dos braços levantados e punho cerrado em gesto de resistência, a torcida encontra-se atrás em desfoque e um jogador do time adversário tembém em desfoque mais a frente.
Em reencontro com a torcida do Valencia, Vini Jr. comemora gol com gesto de resistência. Foto: Jose Jordan/AFP

 

No dia 21 daquele ano, acontecia a partida que foi o estopim para a mudança de posicionamento da Justiça Espanhola, quando o Valencia enfrentava o Real Madrid pela 35º rodada do Campeonato Espanhol. Durante uma confusão após falta marcada em cima do então camisa 20 do Real, torcedores do time adversário começaram a proferir diversos ataques racistas contra o brasileiro, incluindo gestos e gritos de “mono”  - que se traduz “macaco” em espanhol. Ainda que apontados imediatamente por Vini assim que percebidos, a partida seguiu. 

Após mais de um ano do ocorrido, três torcedores do Valencia foram condenados a oito meses de prisão, além de terem de arcar com multas e estarem impedidos de entrar em estádios de futebol por dois anos. É a primeira condenação desse tipo por parte da Justiça Espanhola. Em suas redes sociais, Vini comenta o caso, comemorando a decisão e salientando a importância de continuar denunciando atos racistas. 

Os ataques contra o jogador existem mesmo antes da sua saída do Flamengo, clube que o revelou, mas foi na Espanha que os insultos se intensificaram. 

O primeiro caso a ser noticiado ocorreu em 2021 em uma partida contra o Barcelona no estádio Camp Nou. Torcedores que não foram identificados também gritaram “macaco” em direção ao jogador. Depois desse ocorrido, a onda de ódio contra Vini nas partidas e fora delas foi crescendo cada vez mais, o arquivamento do caso serviu como uma forma de estímulo a essas práticas, já que os envolvidos acabaram isentos de punição.

 

Após diversos episódios criminosos, pode se constatar que não é de hoje que Vinícius vem se demonstrando um grande agente de mudança na luta anti racista mesmo fora das quatro linhas. Alguns dias depois do anúncio da prisão dos três torcedores, o  Projeto de lei “Vini Jr.” proposto pela deputada Luciana Genro (PSOL) foi aprovado por unanimidade pela Assembleia Legislativa do Rio Grande Do Sul, a fim de combater o racismo nos estádios. 

 

O projeto prevê que a partida seja interrompida até que os atos suspeitos sejam descontinuados. Caso isso não aconteça, os atletas devem se retirar do campo por dez minutos. Por fim, se a situação não for resolvida, a partida deverá ser encerrada. Já no caso dos ataques acontecerem antes do apito inicial, o jogo pode ser cancelado pelo árbitro a depender da gravidade do caso. 

Vinicius Jr. com um sorriso no rosto ergue a taça da Champions League 2024
Vini Jr. ergue a taça da Champions League 2024, da qual foi eleito pela UEFA o melhor em campo. Foto: Glyn Kirk/AFP

Em entrevista à AGEMT, o estudante Tiago Nascimento, 20, relata a importância de Vini para a comunidade negra. “Há muito tempo não se via um jogador ter tanto impacto fora de campo. Para mim é importante ter um representante do que eu e minha família vivemos diariamente e o Vinicius faz isso com excelência.”  

 

Tiago ainda destaca a importância desse tipo de representatividade dentro do futebol, já que o esporte possui um enorme alcance e está enraizado na cultura brasileira. “Todo mundo consome futebol no Brasil, mesmo que indiretamente, tudo o que acontece possui impacto, então é muito interessante esse fator político e social que podemos observar acontecendo”, declara o estudante.  

 

Vinicius Jr - em suas próprias palavras um algoz de racistas, foi duas vezes campeão da Champions League e é favorito à Bola de Ouro 2024. Como se não bastasse, luta por uma causa que vai além do futebol, vindo de um país que tem o esporte em questão amplamente difundido. Vini motiva e enche de esperança milhares de crianças que têm o sonho de ser jogador de futebol, mostrando que independente de onde vieram ou de sua cor, tudo é possível. 

 

Conhecido pela estética e cultura oriental, o bairro renomeado em 2023 para Liberdade África-Japão carrega história ainda desconhecida
por
Vinícus Evangelista
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08/05/2024 - 12h

Famoso por suas icônicas luminárias japonesas e por abrigar a maior comunidade asiática do Brasil, o bairro da Liberdade, em São Paulo, atrai cerca de 20 mil visitantes todos os fins de semana, conforme dados da APECC (Associação Paulista dos Empreendedores do Circuito das Compras). Muitos, cativados pela culinária, produtos e atmosfera oriental que permeia as ruas, desconhecem a origem negra do bairro e pouco têm acesso a essa história quando caminham sob a região próxima ao centro da cidade.

 

Foto 1
Os dias mais movimentados do bairro são sábado e domingo, quando acontece a "Feira de Arte, Artesanato e Cultura da Praça da Liberdade", popularmente conhecida como "feirinha da Liberdade", criada em 1975, que percorre toda a rua Galvão Bueno. Foto: Vinícius Evangelista.
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Foto 2
A estética do bairro tal qual conhecemos hoje começou a se moldar em 1970, quando foram instaladas as primeiras famosas lanternas japonesas. Foto: Vinícius Evangelista

 

Foto 2
Em meio ao movimento da feira na atual Praça da Sé, antes Largo da Forca, está a "igreja de Santa Cruz das Almas dos Enforcados", fundada em 1891, no local onde antes se erguia uma cruz em memória das execuções de Joaquim José Cotindiba e Francisco José das Chagas, militares negros condenados a enforcamento por liderarem um motim que exigia, durante o governo Imperial, igualdade salarial entre soldados brasileiros e portugueses, além do pagamento atrasos remuneratórios. Joaquim foi morto, porém Francisco, conhecido como Chaguinhas. sobreviveu por três vezes à forca e foi morto a paulada. A cruz e a mesa com velas postas no local, foram sendo deslocadas conforme a região foi sendo habitada, até parar onde hoje está a igreja. Foto: Vinícius Evangelista.
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Foto 3
Antes de ser considerado centro, na então Vila de São Paulo, o bairro era denominado de "bairro da pólvora", uma simples periferia afastada o suficiente para ser construída ali, num dos largos, em 1754, a "Casa da Pólvora", um depósito de explosivos projetado para minimizar danos em caso de acidentes. Apesar da demolição do armazém, o local manteve o mesmo nome e foi transformado em um jardim oriental. Foto: Vinícius Evangelista.
Foto 4
Monumento instalado, em 2018, rememorando os então 110 anos da imigração japonesa ao bairro e saudando a neta mais velha do então imperador japonês, Akihito, "sua alteza imperial Princesa Mako", que em 2021 abriu mão de seu título real para se casar com um plebeu e ir morar em Nova York. Foto: Vinícius Evangelista.

 

Foto 4
No jardim, rodeado por bustos, estátuas e monumentos que contam a história da ocupação asiática no bairro, esta é a única placa que rememora o que era o largo antes da imigração. Foto: Vinícius Evangelista
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Antes chamado de "Largo do Pelourinho", o Largo de 7 Setembro foi renomeado em 1865, até quando havia um pelourinho no local, um poste de madeira para açoitamento público de escravizados, previstos no “Código Criminal do Império” de 1830, e na famigerada “Lei da Morte” de 1835. Os escravizados condenados a morte eram açoitados no pelourinho e iam caminhando até o Largo da Forca para a execussão. Foto: Vinícius Evangelista.
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Foi apenas em 2019 que uma pequena placa foi instalada na região memorando o fato. Foto: Vinícius Evangelista
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Apesar das poucas lembranças institucionais, os grafites e expressões populares tratam de lembrar a história de Chaguinhas e a resistência negra, em meio aos vislumbres da estética japonesa que compõe o bairro. Foto: Vinícius Evangelista.

 

Entenda como o Mundo Nerd deixou de ser um ambiente acolhedor e representativo para se transformar em um lugar recheado de preconceito e opressão
por
Matheus Monteiro da Luz
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29/06/2022 - 12h

Por Matheus Monteiro

Ser nerd nem sempre foi “cool”. Antigamente o bullying e a violência eram comuns na vida de alguém que pertencesse ao mundo geek. Na escola, fãs de videogames, RPG’s e quadrinhos sempre eram excluídos pelas pessoas mais “populares”, aquelas que julgavam o que era certo e errado, inclusive, quem ousasse não se encaixar aos padrões impostos, estaria sujeito a opressão.

De alguns anos para cá, porém, a cultura nerd deixou de ser algo alternativo, agora passa a ser valorizada e domina o mainstream. Ironicamente, no entanto, alguns indivíduos que se consideram nerds, em vez de usar essa sua nova posição de destaque na sociedade para integrar novos fãs e expandir as fronteiras de suas histórias preferidas, preferem promover o ódio e a opressão já vividos por eles.

E mesmo cercados de histórias de cunho obviamente progressistas – como as dos “XMen”, heróis que lutavam contra o preconceito de todas as formas –, o mundo nerd tem sido tomado por uma onda conservadora e purista que constantemente vira manchete por problematizar praticamente toda a tentativa de representatividade em filmes, séries e adaptações.

Evidentemente, não são todos que promovem esse discurso. Essas ofensas costumam vir daqueles que são conhecidos nas redes sociais como “nerds raiz”, “nerdolas” ou “nerd boomers”. Por vezes, eles mesmos ostentam essas alcunhas. Eles escondem o seu racismo e intolerância no sentimento de nostalgia, com aquele clássico discurso de que “antigamente era melhor”. Não podem ver sequer uma obra que contenha uma representação de alguma minoria que já a taxam como “lacradora”, ou esquerdista.

Raphael Augusto Alves, estudante universitário e geek, contesta se esse universo sequer já teve uma premissa inclusiva. Para ele, “a comunidade nerd foi realmente criada nesse contexto, mas dizer que ela nasceu em um ambiente de inclusão, é exagerar. Isso porque, aquele jovem que jogava Dungeons & Dragons no porão de casa e não se sentia bemvindo no resto das atividades, partia naturalmente para a exclusão. É aquela coisa, quando você não entende como mudar a opressão, você tende a se tornar o opressor. O conservadorismo nasce do medo de mudança. Porque pensam que qualquer mudança que afete uma memória antiga pode ser um grande problema. Então de fato há um purismo. É um conservadorismo nascido de um preconceito que também gera preconceito. É um ciclo.”

© @lukaswerneck  Halle Bailey como Ariel em desenho de Lucas Werneck

 

Um dos casos mais emblemáticos causado por esse fenômeno foi quando houve o anúncio de uma Ariel negra para a adaptação com atores reais do filme animado “A Pequena Sereia”, uma das mais famosas princesas da Disney. Os fãs da animação foram à loucura. A exceção foram aqueles que ficaram indignados pelo fato que trocariam a etnia de uma das princesas mais queridas do estúdio. 

Em julho de 2019 divulgaram quem seria a Ariel. Muitas fontes apontavam a atriz Zendaya para pegar o papel principal, só que quem levou essa foi a atriz Halle Bailey conhecida por seu trabalho na série Grown-ish e por cantar em um duo com sua irmã Chloe Bailey. 

Mesmo com debates sobre racismo espalhados pelo mundo todo, Bailey não ficou imune aos ataques feitos pela internet quando por três dias a hashtag “not my Ariel” (não é minha Ariel) ficou nos trend topics do Twitter mundial. Por outro lado, muitos apoiaram a iniciativa, uma vez que personagens racializados das produções dos estúdios Disney geralmente ficam em forma de animais ou de seres inanimados, como a Tiana da animação “A Princesa e o Sapo” e Kuzco de “A Nova Onda do Imperador”. 

A dubladora de Ariel na animação de 1989, Jodi Benson, declarou apoio a cantora em sua entrevista para o ComicBook. com. “Não importa nossa aparência por fora, não importa nossa raça, nossa nação, a cor de nossa pele, nosso dialeto, se eu sou alto ou magro, se estou acima do peso ou abaixo do peso, ou meu cabelo e a cor que for, realmente precisamos contar a história”. 

Outra situação em que o discurso de ódio dominou as entrelinhas dos “nerds conservadores” nas redes sociais ocorreu logo após o lançamento do primeiro trailer da série “Senhor dos Anéis”, que está sendo produzida pela Amazon.

Fotografia do elfo de 'Senhor dos Anéis' - Divulgação/ Amazon Prime Vídeo

Por incrível que pareça, o retorno do rico universo de J. R. R. Tolkien não foi motivo para a celebração de alguns de seus fãs, que preferiram concentrarse em um detalhe com menos de 10 segundos de tela: um dos elfos representados na trama terá pele negra. O assunto rapidamente foi aos trending topics do Twitter e, novamente, gerou calorosas discussões sobre a possibilidade de algo tão indiferente. Vale ressaltar que elfos, brancos ou negros, são personagens fictícios que sequer existem.

Episódios como dos elfos interpretados por negros em Senhor dos anéis e da Ariel de Halle Bailey não são casos isolados. Qualquer pessoa que tenha contato com a bolha geek nas redes sociais já presenciou ou irá presenciar uma discussão onde a luta antiracista é menosprezada.

Infelizmente para o “nerd raiz” a cultura está mudando, queira ele ou não, e, infelizmente, a  representatividade negra está deixando de ocupar apenas espaços secundários, inclusive, com inúmeros exemplos disso.

Em um quadrinho do Capitão América, “Truth: Red, White and Black”, há uma marcante história de um Capitão América Negro durante um periodo de grande tensão racial nos Estados Unidos. Essa trama é aproveitada na aclamada série em Live Action da Marvel, “Falcão e o Soldado Invernal”, onde todo o grande público pôde conhecer Isaiah Bradley, esse mesmo Capitão América negro das histórias em quadrinhos, e sua jornada para superar a intolerância do Governo e Sociedade Americana.

Nesse "duelo" não nos resta dúvidas de que de um lado está o mau-caratismo e do outro a grandeza e a luta.
por
Henrique Alexandre
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28/06/2022 - 12h

Não que seja novidade para os brasileiros a conduta baixa de Nelson Piquet, mas agora ficou ainda mais visível, principalmente ao mundo do automobilismo, que o ex-piloto e tri-campeão mundial de fórmula 1 se encontra no panteão de seres humanos de caráter desprezível. Eu sei que são palavras fortes, mas se tratando de atitudes racistas como foi a de Piquet, a passividade não tem mais espaço. 

 

O ex-piloto e apoiador devoto de Jair Bolsonaro conseguiu, com sua asneira, algo inimaginável: mobilizar a sociedade elitista e não menos preconceituosa da Fórmula 1 contra o racismo. É fato e notório que a categoria não abre espaço para lutas progressistas. Um exemplo disso foi quando Lewis Hamilton, alvo de racismo de Piquet, se posicionava pelo fim do preconceito racial e membros do esporte tentavam boicotar as ações do heptacampeão. Portanto, o fato de a fórmula 1 e equipes se posicionarem contra Nelson Piquet já evidencia que a atitude do ex-piloto passou totalmente do limite. 

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Mercedes, a equipe de Hamilton, se pronuncia sobre o racismo cometido por Nelson Piquet

Mais do que ofender Lewis Hamilton, o Uber presidencial, como Nelson Piquet é chamado na internet, também atacou negros e negras do mundo todo que tentam se inserir no esporte mais elitista do planeta. Hamilton, que segue sendo o único piloto negro da história da categoria, além de esportista, é um sinal de esperança para a negritude. E para azar de Piquet, o heptacampeão brilha cada vez mais, apesar da sua fala enojada. Hamilton é o que há de melhor na categoria, mesmo com o ódio que sofre por conta da cor da sua pele.

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A fórmula 1, que historicamente não se posiciona, repudiou racismo sofrido por ​​​​Lewis Hamilton
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Ao comentar a manobra que Hamilton fez em cima de seu genro, Max Verstappen, no GP da Grã-Betanha de 2021, dá pra notar o nojo que Piquet sente pelo "neguinho". Mais do que isso, evidencia que sua rixa com o heptacampeão ultrapassa a seara do esporte. Dá para interpretar que o ex-piloto, na verdade, não gosta do fato do piloto mais relevante da história da categoria tenha a pele escura. Dito isso, só dá para ter um sentimento em relação a Nelson Piquet: o de pena. 

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Mesmo sendo inglês, Hamilton parece ser mais brasileiro do Nelson Piquet

Agora resta saber quais serão os próximos passos sobre esse caso incontestável de racismo. Será que a fórmula 1 vai proibir que Nelson Piquet circule pelo padock? Acho difícil, mas é o que deveria ser feito. Hamilton vai processar o ex-piloto? Ao que tudo indica, sim. Mas mais do que isso, é preciso mudar a mentalidade desse esporte elitista. Vai demandar tempo, sabemos, mas urge a necessidade de priorizar para essa mudança, pois dar voz a párias como Nelson Piquet não é mais aceitável.

Still we rise.

O perfil tem como meta abordar os diferentes assuntos do livro por meio de threads
por
Andre Nunes, Daniel Dias, Leonardo Nunez e Rafael Monteiro
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24/11/2021 - 12h

“As prisões estão sendo espaços de real ressocialização como se propõe? Como surge essa ideia da privação de liberdade como uma pena para quebra de convenções e contratos sociais (...) Quem define o que é crime e quem é criminoso?"

Essas foram algumas questões que Juliana Borges expôs em seu livro “Encarceramento em massa”, que aborda questões sobre o sistema de justiça criminal punitiva, reinserção de presos na sociedade, Lei de Drogas, o espaço da mulher nos presídios, entre outros assuntos. Pensando nisso, criamos um perfil no Twitter, onde exploraremos os assuntos apresentados nas páginas do livro por meio de threads [fios], que vem sendo um grande sucesso na rede social.

Acreditamos que expondo através de redes sociais, esse assunto que é tão importante e necessário de ser debatido, pode chegar a mais pessoas, além de possibilitar aqueles que não conhecem o trabalho da Juliana, darem uma olhada em alguns assuntos abordados no livro, e assim decidir compra-lo ou não. Clique aqui para ver a thread completa.

 

Acostumados a ver a maioria branca em telejornais, os telespectadores, ao se depararem com um âncora ou repórter preto, não tem o hábito de refletir quais dificuldades eles enfrentam.
por
Vitória Nunes de Jesus
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16/11/2021 - 12h

         A humanidade conhece o racismo há séculos. Ele se manifesta desde as maiores atrocidades, como a escravidão, até as formas mais imperceptíveis para as pessoas brancas, como um olhar diferente, que é conhecido como racismo estrutural. Um exemplo desse tipo de discriminação pode aparecer até em relação ao modo de se vestir de cada um. Um branco pode sair tranquilamente na rua de camiseta, bermuda e chinelo, mas, caso um negro use esta mesma vestimenta, corre o risco de ser parado pela polícia ou receber olhares de desconfiança, como relata o jornalista Marcus Vinícius Anjos, atualmente repórter da Rede Globo: “no mercado, a gente se dá ao luxo de usar roupas mais simples. Se uma pessoa branca vai vestida assim no mercado, ela é tratada de uma forma, mas as pessoas negra, de outra”. 

 

     Outro meio em que o racismo é notável, é no jornalismo, principalmente dentro da televisão. 

Pesquisas apontam que apenas 10% dos profissionais do Jornalismos televisivo são negros. Marcus diz que trabalhou com poucos jornalistas negros: “Em uma emissora eu era o único negro na redação. Embora a diversidade esteja crescendo e sendo aceita em diversas empresas, não se compara com a grande quantidade de colegas brancos. A impressão que eu tenho é que nós temos avançado, mas de forma muito tímida. De qualquer maneira, é muito bom ver que essa questão esteja mais presente nas pautas dos veículos de comunicação”. 

Marcus Vinícius Anjos
Marcus Vinícius Anjos 

       Além do número de negros presentes nessa área ser baixo, estes jornalistas passam por dificuldades. A jornalista Basília Rodrigues tem 13 anos de profissão e atualmente é analista na CNN Brasil. Ela conta que no início da carreira, antes mesmo de fazer televisão, sentiu-se alvo de racismo ao ser convidada para cuidar da filha da pessoa que a chefiava. "Eu não aceitei, afinal de contas meu trabalho era ser jornalista e não babá”. Ao ser questionada sobre qual foi o ato de racismo mais marcante que já sofreu, ela faz uma importante colocação: “Todos são marcantes. Nem todos podem ser ditos”. 

 

       Basília conta como é fazer parte desse pequeno grupo de jornalistas e menciona sentimentos que já teve ao longo de sua trajetória: “A definição de repórteres e pautas em uma redação passa por diversos critérios. Às vezes, raciais. É preciso ter muito jogo de cintura. Sentir-me preterida, como deixar de acompanhar algum evento social por decisão da empresa, é um exemplo de racismo, mas eu não saberia, nem gostaria, de apontar muitos detalhes. Observo que todos esses relatos são do início da minha carreira. Não tem relação com o atual lugar onde trabalho”. 

Basilia Rodrigues
Basília Rodrigues 

          É possível conhecer os dois lados da moeda existentes nas vidas de jornalistas negros. Marcus conta que felizmente nunca sofreu racismo no exercício da profissão e se sente privilegiado por isso: “Ao mesmo tempo, não me vejo na condição de naturalizar esse privilégio e poder dizer que é normal, porque não é. Tenho a consciência de que a maioria dos negros não o possuem”. 

 

 

           A ativista e intelectual Lélia Gonzalez fala sobre a apropriação de ser negro: “a gente nasce preta, mulata, parda, marrom, roxinha dentre outras, mas tornar-se negra é uma conquista”. Basilia explica o que Gonzalez quer dizer: “A conscientização de que carregamos responsabilidades coletivas tanto quanto as nossas trajetórias pessoais, vem com o tempo. O "tornar-se negro" ultrapassa a definição do tom da pele. Compreender-se como parte de uma história que antecede as nossas próprias vidas, que vem das condições e posições criadas para o negro na sociedade, depende de um processo de reflexão e de vivências. Para alguns, isso pode ser rápido, em especial quando o negro nasce em uma família com consciência racial; em outros casos, é mais complexo, depende de experiências (ruins ou positivas) que amadureçam a percepção sobre a diferença social entre ser negro ou branco”.  

 

         Marcus cita uma experiência pessoal que é um bom exemplo da situação acima: “Desde pequeno, cortei o cabelo bem baixinho, meu pai que ditava o tamanho do corte quando me levava no cabeleireiro. Quando vim da Bahia para São Paulo, eu passei a controlar o tamanho do meu cabelo. Apesar de não ter mudado o corte, passei a cortá-lo mais alto. Se uma pessoa branca pode usar um cabelo do tamanho do meu, porque eu que sou negro não posso? As vezes meu pai me pergunta “você não está com o cabelo muito grande?” e eu respondo “não, está do tamanho que eu quero”. O fato dele estar maior não é uma questão de desleixo, eu que quero ele assim. É uma questão que a gente se poda as vezes. Se o seu cabelo não é liso, é crespo, você se sente obrigado a cortar ele baixinho. Felizmente comigo nunca aconteceu de uma empresa me mandar cortar o cabelo. Sinal de que aos poucos, as coisas estão melhorando”. 

 

        Através dos telejornais, é possível notar a grande importância que se dá a notícias vindas do continente europeu e dos Estados Unidos. Já o continente africano tornou-se uma “não notícia” e quando faz parte dos telejornais, é retratado como um lugar pobre, violento e com alto índice de fome. Durante o período de vacinação contra a COVID-19 no mundo, a África foi esquecida. Em uma coletiva de imprensa, o diretor do Centro Africano de Controle e Prevenção de Doenças (África CDC), John Nkengasong alerta que apenas 3,5% da população foi completamente imunizada, segundo dados publicados em 14/09/2021. Enquanto, no mesmo período, 58% da população estadunidense estava completamente vacinada, segundo a publicação digital Our World In Data. 

 

Pessoa pede vacina em manifestação em Pretória, África do Sul, 25 de junho de 2021. Foto: Siphiwe Sibeko/Reuters
Pessoa pede vacina em manifestação em Pretória, África do Sul, 25 de junho de 2021. Foto: Siphiwe Sibeko/Reuters 
 

         Marcus fala sobre a falta de informação em relação à África e cita um exemplo retirado de um livro jornalístico: “É triste. Tem um exemplo num livro que diz “se um avião cai na Europa ou nos EUA com 20 pessoas, indiscutivelmente isso vai ser pauta no mundo inteiro. Mas se um avião com 300 pessoas cai na África, isso as vezes vira uma nota em algum jornal, dependendo do veículo, se torna apenas uma nota pelada, que não tem nem imagens”. 300 pessoas valem menos do que 20 dependendo de onde elas vivem? Pra mim, isso é questionável demais. No dia a dia, a gente precisa ter esse olhar e cuidado, porque as vezes somos condicionados a isso. Quando eu era mais novo, tinha meu próprio jornal, em que eu era o editor chefe, apresentador e repórter. Já perdi as contas de ver uma notícia e pensar que ninguém se interessaria por ela. A gente precisa do exercício de se perguntar: “porque um avião caiu na África, as pessoas vão se interessar por aquela notícia?” 

 

        No artigo “Sete Visões da Crise do Jornalismo Profissional- Tempestade Perfeita”, a jornalista Luciana Barreto cita uma experiência que vivenciou: “recebi um convite para participar de uma celebração com angolanos no Brasil. O representante do consulado veio explicar a alegria de ver um pouco de seu país em algum noticiário, reconhecendo o Brasil como um país extremamente racista. Por último, me fez um pedido que exemplifica quanto estamos distantes de chegar a um jornalismo plural. Com cuidado e um tanto embaraçado me perguntou se nós poderíamos atualizar nossos arquivos porque o país dele não era mais aquele, as ruas estão diferentes, e disse ainda: “Não temos fuscas por lá desde os anos 1980”. Basília diz que esse tipo de tratamento que matérias vindas da África recebem, é preconceituoso: “narrativa dominante de que o negro é sempre marginalizado, periférico, excluído, pobre, necessitado. Infelizmente esse entendimento distorce as diferenças, amplia as desigualdades e reforça o olhar exótico (e equivocado) sobre o negro”. 

 

       Diante desses apontamentos, é possível dizer que apesar de jornalistas negros estarem ocupando um pouco mais de espaço no telejornalismo, ainda são poucos os que fazem parte dele. É preciso melhorar, segundo Marcus: “Eu torço para que a gente melhore e para que possamos ver uma redação colorida”. Além de inclusão, é necessário ter igualdade entre negros e brancos, em todos os aspectos. 

 

Amailton Azevedo, explica a nova era da indústria musical: os serviços de streaming, que dão uma nova chance aos artistas autônomos
por
Juliana Mello
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27/10/2021 - 12h

Para Amailton Azevedo, professor de História da PUC-SP, cantor e compositor independente, sua história com a música começou desde quando era criança, porém só se envolveu com a cena musical na faculdade: “Formei bandas e participei de festivais universitários. Em 2011, fiz um pocket show no festival ‘South by South West’ em Austin, nos EUA. Em 2021 irei lançar o single ‘Ruas Tortas’ como produção independente. Para 2022 está previsto o lançamento do disco ‘Asas Negras’ em parceria com Salomão Salomão.”

Atualmente, com o crescimento dos serviços de streaming, a realidade dos músicos independentes — aqueles sem contrato com gravadoras — mudou radicalmente. Eles mostram que é possível construir uma carreira de sucesso usando apenas as redes sociais e as plataformas como Youtube, Spotify e Apple Music. Para Amailton, a música não é sobre o estrelato, conta com seu álbum 'Mundo Atlântico’ de 2007, disponível no Spotify, onde possui 20 ouvintes mensais. Sobre isso, ele diz: "Hoje é uma questão absolutamente resolvida, pois compreendi que fazer música é diferente do que fazer sucesso. Já almejei o sucesso, hoje almejo continuar no circuito dialogando com meus amigos e amigas envolvidos com a música."

O Spotify escolheu a Top Brasil, sua maior playlist de hits, para celebrar, com música nacional, o “Dia da Consciência Negra”. Durante uma semana, a seleção contou com músicas feitas exclusivamente por artistas negros. Os grandes espaços da música estão cada vez mais sendo reocupados por esses músicos, recebendo, assim, seu reconhecimento. Isso é visível pelos line ups de grandes festivais, que têm tido uma crescente lista de nomes negros nos últimos anos, e a tendência é continuar aumentando, conforme o sucesso é alcançado e reconhecido. 

 O abismo ainda é evidente, em 2019, no Rock In Rio, dos 92 artistas que performaram, apenas 34 eram negros. No Lollapalooza, de 69, apenas 13. Contudo, tais artistas têm recebido grande destaque, fazendo jus a suas importâncias no cenário mundial. No RIR de 2019, quatro artistas se apresentaram no Palco Mundo, o maior do festival, dentre eles: Drake e Black Eyed Peas. Já no Palco Sunset, foram cinco brasileiros: IZA, Alcione, Elza Soares, Karol Conká e Mano Brown.

Amailton vê a música como um estilo de vida, não como uma carreira. Afirma que suas maiores inspirações para suas composições, são os estilos negros americanos, a Black Music, sendo eles o funk, rap e jazz. Caracterizada por esses estilos, a música brasileira nasceu a partir das danças e musicalidade dos indígenas, dos africanos, franceses e portugueses. Mas com o avanço da indústria cultural nacional, novos estilos e tendências foram ganhando espaço, e consequentemente, essa indústria elege quem recebe a fama ou não.

Com a popularização das redes sociais, os criadores de conteúdo musical criaram tendências e mercados alternativos engajando o próprio público. Com isso, a indústria musical adaptou-se a esse modelo, adotando as redes alternativas de produção e difusão, como os streamings, citados anteriormente, assim, Azevedo conclui: “A relação entre indústria e artista é muito complexa. Não se pode dizer que a Indústria tem o monopólio da criação. A indústria pode esvaziar um produto, mas a capacidade criativa do artista sempre provoca a surpresa e o inusitado, renovando a própria indústria que massifica o produto artístico.”