Indicador registrou crescimento da economia brasileira de 0,3% no segundo trimestre de 2025
por
Marcelo Barbosa
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20/08/2025 - 12h


O Banco Central (BC) divulgou nesta segunda-feira (18) os dados do IBC-BR (Índice de Atividade Econômica do Banco Central do Brasil) referentes ao mês de junho. Os números mostraram uma queda de 0,1% em relação a maio, mas o resultado do segundo trimestre de 2025 se manteve positivo, com um crescimento de 0,3%. O IBC-BR é um dos indicadores oficiais da economia brasileira. Ele faz uma estimativa de crescimento levando em conta três setores: agropecuária, indústria e serviços. O índice foi criado para trazer números frequentes sobre a atividade econômica do Brasil e tem influência sobre as decisões financeiras do país, servindo de auxílio para políticas monetárias, como a taxa de juros (Selic).

Por exemplo, quando a taxa de juros está em patamares elevados, isso reduz a atividade econômica, o que se reflete nos números do indicador. Por isso, atualmente, ele é lido pelo mercado como a "prévia do PIB".

 
 

Fachada do Banco Central do Brasil em Brasília — Foto: Marcello Casal/Agência Brasil
IBC-BR: agropecuária, indústria e serviços tem leve alta no segundo trimestre de 2025 (Marcello Casal Jr./ Agência Brasil)

 

 

Retração da economia

Após quatro meses seguidos de bons resultados, maio registrou a primeira retração do ano, de 0,7% em relação a abril. Em junho, a queda foi de 0,1%. De acordo com o professor de economia Renan Silva, do IBMEC Brasília, "a alta deu-se devido à Selic, que chegou ao patamar de 15%”. Ele explicou que "o que corrobora para essa questão da taxa de juros restritiva é o fato de que os indicadores de inflação vêm arrefecendo. No último relatório Focus, do Banco Central, o IPCA já registra uma inflação, em 2025, de 4,95%, ante os 5,30%, que as projeções vinham indicando”.

 

Os dados oficiais do Banco Central confirmam que a agropecuária foi o principal fator para a retração no trimestre, com uma diminuição de 3,1% no período. Por outro lado, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) aponta que o destaque de junho foi o aumento de 0,3% no volume do setor de serviços. A produção industrial teve um recuo de 0,1% no mês, e as vendas no varejo também frustraram as expectativas, recuando 0,1% em comparação a maio. Sob a óptica do professor, o tarifaço de Donald Trump pode trazer efeitos adversos e "provocar uma redução intensa no segundo semestre”.

 

Nos últimos 12 meses, os números ficaram em 3,9%, o que representa uma desaceleração em face ao mesmo período, que marcou uma alta de 4,04%.

 

Para o futuro, Silva acredita que a retração na atividade econômica pode influenciar o COPOM (Comitê de Política Monetária) - órgão responsável por estabelecer as diretrizes da política monetária - a iniciar um novo ciclo na queda dos juros. "Esse ciclo restritivo já teve efeito, o que gerou como resultado a redução na atividade econômica”, conclui. A retração de 0,6% no terceiro trimestre de 2023 havia sido a última queda do indicador antes dos recuos registrados neste ano.

Alimentação e bebidas têm deflação em relação ao mês anterior, enquanto habitação sofreu alta devido ao aumento da conta de luz
por
Marcelo Barbosa P.
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13/08/2025 - 12h

O IBGE divulgou nesta terça-feira (12) o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial da inflação do país. Os dados apontam que houve um aumento de 0,26% no mês de julho, uma leve alta em comparação com a taxa de 0,24% registrada em junho. No ano, o IPCA já acumula desaceleração de 3,26% e, nos últimos 12 meses, de 5,23%.

De acordo com o gestor de investimentos e especialista financeiro da WFlow, Guilherme Viveiros, a inflação surpreendeu positivamente. "O índice deste mês veio com o valor de 0,26%, enquanto o mercado via uma elevação de 0,36%". O mês de agosto também deve apresentar queda, com índices negativos o que, segundo Viveiros, "fez com que o mercado começasse a sondar uma possível queda dos juros ainda em 2025".

Entre os setores da economia que apresentaram deflação, ou seja, queda de preços, estão o grupo Alimentação e bebidas (-0,27%), Vestuário (-0,54%) e Comunicação (-0,09%). Em contrapartida, entre os maiores destaques da alta estão os grupos Habitação (0,91%) e Despesas Pessoais (0,76%). A alta do grupo Habitação foi impulsionada pela energia elétrica residencial, com variação de 3,04% - o maior impacto individual no índice do mês. Esse número se deve ao fato de que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) confirmou a bandeira tarifária de agosto, que será a Vermelha patamar 2, a mais cara do sistema. Como consequência disso, haverá um acréscimo de R$ 7,87 para cada 100 kWh consumidos na conta de luz.

O grupo Transportes também teve aceleração, passando de 0,27% em junho para 0,35% em julho, impulsionado pela alta de 19,92% nas passagens aéreas. Por outro lado, os combustíveis tiveram uma queda de 0,64% no mês, com recuos no preço do etanol (-1,68%), do óleo diesel (-0,59%), da gasolina (-0,51%) e do gás veicular (-0,14%).

 Já o grupo Alimentação e bebidas, que tem o maior peso no IPCA, registrou baixa pelo segundo mês consecutivo. A queda em julho foi impulsionada pela alimentação no domicílio, que caiu 0,69% com destaque para redução nos preços da batata-inglesa (-20,27%), da cebola (-13,26%) e do arroz (-2,89%).

 

Reprodução: Tânia Rego/Agência Brasil | Pessoas andando em um mercado
Reprodução: Tânia Rêgo| Pessoas escolhem frutas em um mercado


Rafael Prado, economista e analista de macroeconomia da Go Associados, chama a atenção para o fato de que o valor da inflação deste mês ainda é elevado em relação à meta de 4,5% ao ano. Segundo ele, o resultado deste mês é prova de que a política monetária pode atuar de maneira enfática nos dados. "Quando nós olhamos para os números desagregados do IPCA, vemos que existem grupos, como Habitação que foi impactado pela energia elétrica, que influenciaram para o aumento de julho". Para ele, isso ressalta a importância de "continuar com uma política monetária restritiva, para que a inflação continue caindo e volte ao intervalo de tolerância."

Já o professor de economia João Gabriel Araújo, do Ibmec Brasília, destaca o efeito Trump na economia brasileira. Segundo ele, a guerra tarifária vai ser um dos fatores determinantes para a queda dos preços no Brasil. "Com o anúncio das medidas para o Brasil, especialmente a tarifa de 50% sobre as importações, os produtores nacionais aumentaram os estoques para o mercado interno, reflexo da diminuição das exportações para os Estados Unidos antes da implementação da tarifa e do consequente aumento da oferta de bens no mercado doméstico".

O cálculo do IPCA foi realizado a partir da comparação dos preços coletados entre 1 e 30 de julho de 2025 com os preços vigentes entre 30 de maio e 30 de junho de 2025. O IPCA abrange famílias com rendimento monetário de 1 a 40 salários-mínimos. Já o INPC, que considera famílias com rendimento de 1 a 5 salários-mínimos, teve alta de 0,21% em julho, com acumulado de 3,30% no ano.

A falta de renda fixa, escolaridade e educação financeira empurra jovens para ciclos longos de endividamento.
por
Maria Luiza Pinheiro Reining
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24/06/2025 - 12h

Entre boletos parcelados, cartões de crédito e ofertas de empréstimos rápidos, jovens brasileiros têm se tornado protagonistas de um fenômeno crescente: o superendividamento. Sem renda fixa, sem vínculo formal com instituições financeiras e com pouca ou nenhuma educação financeira, parte expressiva dessa população vê no crédito imediato uma resposta à sobrevivência, ainda que, a longo prazo, isso signifique um acúmulo impagável de dívidas.

A especialista em consumo e pesquisa de mercado, Eduarda Barreto, 27, chama atenção para a complexidade do problema. Para ela, não se trata apenas de comportamento individual, mas de um contexto social e estrutural. “Em 2022, uma pesquisa do Banco Central mostrou que 22% dos jovens entre 15 e 29 anos estavam fora da escola e do mercado de trabalho. Isso representa cerca de 11 milhões de jovens sem renda fixa ou escolaridade mínima para acessar melhores oportunidades”, afirma.

Eduarda Barreto em palestra na FEA-USP
Eduarda Barreto em palestra na FEA-USP 

Esse grupo, segundo Eduarda, é o mais vulnerável a modalidades de crédito como empréstimos emergenciais ou cartões pré-aprovados. Com pouco conhecimento sobre juros e condições, esses jovens recorrem ao que está disponível mesmo que isso signifique aceitar taxas elevadas e prazos inflexíveis. Ela explica que não se trata de crédito para investir, mas para sobreviver. Muitas vezes, o empréstimo serve para pagar contas básicas como luz, gás e alimentação.

Eduarda destaca que esse ciclo é agravado pela ausência de políticas públicas consistentes de educação financeira desde os primeiros anos escolares. Jovens que não estão inseridos no mercado de trabalho ou na escola muitas vezes não têm qualquer orientação sobre orçamento, crédito ou endividamento. O resultado é um cenário em que decisões são tomadas no impulso da necessidade, sem planejamento ou capacidade de negociação com bancos.

A falta de vínculo estável com instituições financeiras também pesa. Quem não tem um histórico com o banco dificilmente acessa linhas de crédito com melhores condições. Barreto observa que, mesmo com juros altos, muitos jovens aceitam a única oferta disponível, pois não têm tempo nem suporte para tomar uma decisão mais estratégica. Eles precisam do dinheiro de forma imediata.

Embora programas de renegociação de dívidas e feirões "limpa nome" tenham ganhado força nos últimos anos, Eduarda pondera que eles não atacam o problema na raiz. O superendividamento juvenil é reflexo direto de um sistema que oferece crédito sem oferecer estabilidade, informação ou perspectivas.

Chris Martin terá apresentação aberta ao público em Belém para promover a COP 30
por
Victória Miranda
Ana Julia Mira
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10/06/2025 - 12h

No dia primeiro de novembro, o cantor do grupo musical Coldplay, estará se apresentando no Mangueirão (Estádio Olímpico do Pará). O estado também será palco da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30) e o festival, que contará com outros grandes nomes da música, faz parte da promoção da campanha #ProtejaAAmazônia.

Os shows gratuitos têm sido ferramentas poderosas do governo brasileiro para promover turismo e projetos nacionais. Mesmo sendo totalmente abertos ao público, essas apresentações movimentam a economia brasileira em diversos aspectos. Entenda mais sobre o assunto e confira as falas da doutora em Comunicação e Cultura e professora titular do programa de pós-graduação em Economia Criativa, Lucia Santa-Cruz, em entrevista em vídeo para a AGEMT. 

 

 

Esse é o maior índice desde 2006
por
Marcelo Barbosa Prado Filho
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12/05/2025 - 12h

Na última quarta-feira (7), o Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica de juros para 14,75% por ano, um aumento de 0,5%.

 

De acordo com um comunicado lançado pelo Comitê, os fatores que colaboraram para a decisão foram o tarifaço de Donald Trump e a política econômica do presidente Lula: “Cenário de elevada incerteza, aliado ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados por serem observados, demanda cautela adicional na atuação da política monetária e flexibilidade para incorporar os dados que impactem a dinâmica de inflação”, declarou o informe. 


A Selic tem um papel fundamental na economia. Ela é o parâmetro para definir todas as outras taxas no país e serve como referencial para os bancos precificarem seus créditos. Essa é a sexta elevação consecutiva da taxa e coloca a Selic em maior patamar desde julho de 2006. 

 

De acordo com a economista Cristina Helena, a taxa de juros tem um impacto considerável na economia: “Quando a taxa de juros aumenta, uma das coisas que acontecem é tornar mais atrativo o investimento externo para dentro do país. Essa entrada de capital ajuda na queda do dólar, porque tem maior oferta de moeda estrangeira”. Por outro lado, a economista pontua que a elevação da taxa pode acarretar em menor consumo familiar: “Alguns podem aumentar os recursos e consumo, mas vão ter famílias que vão ficar mais pobres.”.  

Reprodução: Getty Images
Reprodução:Getty Images

Com isso, o Brasil passou a compor a lista dos países com os maiores juros reais do mundo, ficando em terceiro lugar no âmbito internacional. Em primeiro lugar está a Turquia, com 10,47%, e em segundo a Rússia, que tem  9,17%.

 

No entanto, junto com a elevação, houve uma queda do dólar diante do real.  A elevação da taxa não foi o único fator que influenciou, visto que a perspectiva de um acordo comercial entre EUA e o Reino Unido aumentou. 

 

Para a próxima reunião, há expectativas, mas não parece ser diferente do cenário atual. Em nota, a Copom afirmou: “Para a próxima reunião, o cenário de elevada incerteza, aliado ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional na atuação da política monetária e flexibilidade para incorporar os dados que impactem a dinâmica de inflação”.


 

por
Laura Pancini
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04/05/2020 - 12h

por Laura Pancini

Imagem do filme “Histórias Cruzadas”, que conta vida de domésticas negras nos anos 60. (Foto: Carta Capital)
Imagem do filme “Histórias Cruzadas”, que conta vida de domésticas negras nos anos 60. (Foto: Carta Capital)

 

Cento e vinte quilômetros. Era essa a distância que uma empregada doméstica de 63 anos tinha que percorrer até o seu trabalho semanalmente. Apesar da idade e de ter diabetes e hipertensão, sua condição financeira a obrigava a continuar trabalhando na casa de uma família no Alto Leblon. Isso até o dia 17 de março. A mulher, que não teve seu nome divulgado, teve a primeira morte por coronavírus no Rio de Janeiro. Os primeiros sintomas surgiram no dia anterior e a trabalhadora foi levada ao hospital, mas não resistiu à falta de ar. Seu contato com o vírus se deu por meio de sua patroa, que havia acabado de voltar da Itália.

Esse caso de transmissão local (quando alguém contaminado no exterior passa o vírus adiante) mostrou um risco gigantesco para quem é empregado doméstico no Brasil. Segundo o IBGE, trabalhadores domésticos representam 6,3 milhões de empregados no país. Desse número, 2,5 milhões são diaristas e só 1,5 milhão trabalham com carteira assinada. A estimativa é que de 15% a 20% sejam maiores de 60 anos: ou seja, um quinto da categoria está inserido no grupo de risco da Covid-19.

O Ministério da Economia anunciou acesso ao seguro-desemprego para quem teve redução de jornada e salário ou contrato suspenso, mas essa medida se limita a trabalhadores com carteira assinada. Apesar de o titular da pasta, Paulo Guedes, ter afirmado, em entrevista para o jornal O Globo, que “ninguém será deixado para trás”, sua medida protege apenas 28,4% dos 6,3 milhões de domésticos no Brasil — os outros 71,6% não são formalizados e dependem do próprio empregador para saber o futuro da sua renda.

Essa é a realidade da diarista Fernanda Moraes, 33, que está com a renda estagnada por conta da crise do coronavírus. Ela trabalha em duas casas e foi liberada por ambas. Uma de suas patroas a auxiliou com um total de R$ 300 nas primeiras três semanas da quarentena, mas logo depois interrompeu o contato e os pagamentos. A outra empregadora, uma senhora de 80 anos, não disse nada depois de dispensá-la.

Com o aluguel e as contas atrasadas, Fernanda está à espera do auxílio emergencial do governo, que oferece R$ 600 para pessoas que se encontram em situações como a dela, mas o tempo é crítico em momentos como esse. “Por aqui onde eu moro, em Itapecerica da Serra, não está tendo nenhum tipo de doação”, ela conta. “Tento ir ao mercado uma vez por semana, mas os itens da cesta básica estão cada dia mais caros.”

Fernanda ainda tenta ajudar sua mãe e seus três filhos que moram com o pai, mas, sem um trabalho fixo, ela não está conseguindo acudir a família. “Como sou diarista, não sou registrada. A crise me fez perceber o quanto isso faz falta”, ela comenta. Agora, ela tenta se manter com alguns “bicos” feitos pelo marido e a ajuda de amigos. Acima de tudo, tenta se manter positiva: “Mesmo com dificuldades, estamos dando um jeito”.

O Ministério Público do Trabalho (MPT), em uma nota técnica, orientou a dispensa dos domésticos e diaristas, com a continuidade do pagamento dos salários, e sugeriu que a negociação fosse feita entre o trabalhador e o patrão. Tal dinâmica soa simples no papel, mas acaba sendo injusta para o empregado. Em sua nota, o MPT comenta: “As trabalhadoras domésticas estão entre as pessoas mais expostas aos riscos de contaminação da Covid-19; pois dependem de transportes públicos para ir ao trabalho, estão em contato direto com pessoas (crianças, idosos, pessoas doentes ou portadoras de deficiências) e não têm a opção de não trabalhar ou de trabalhar de casa, principalmente no caso das diaristas”.

Apesar da recomendação do Ministério, mulheres como Eliane Mota, 41 anos, não sentem que têm outra opção. Ela trabalha desde 2012 na casa da mesma família e, além desse emprego, tem orgulho de ser conhecida como uma faz-tudo. “Cozinho, faço doces e salgados e também faço cabelo e unha. O que aparecer, eu sei fazer.” Atualmente, Eliane é a única doméstica indo trabalhar todos os dias em um prédio de 48 apartamentos na zona sul de São Paulo.

Por conta da crise do coronavírus, Eliane se tornou a única fonte de renda em sua casa. “Meu filho e meu marido trabalhavam em restaurantes e perderam seus empregos. Eles estão em análise para o auxílio emergencial e eu, como sou registrada, não vou consegui-lo”, comenta. “Meu salário é de R$ 1.300 e meu aluguel é R$ 1.200. Tive que pagar metade do aluguel e usar o restante para comprar comida. Conseguimos nos manter, mas não é mais a mesma coisa.”

Para pegar seus ônibus diários, Eliane usa luvas e máscara. Para ela, é preocupante a falta de limpeza dos ônibus e o descuido das pessoas que pegam o transporte público. Como sua filha tem bronquite, ela toma todos os cuidados necessários para não se contaminar. “Eu tiro os sapatos antes de entrar na casa em que trabalho, descarto as luvas, troco de roupa e lavo as mãos e os braços.”

No começo da quarentena, sua patroa ofereceu 15 dias de folga, mas logo depois pediu para Eliane voltar. “Ela disse: ’E se eu te der mais folga e você ficar doente depois? Como é que eu faço?’. Acabei voltando, mas logo depois fiquei gripada e me ausentei de novo. Não tive sintomas de coronavírus, mas não tinha condições de sair de casa.”

No final, se automedicou com alguns remédios e voltou para o trabalho alguns dias depois. “Minha patroa não queria ficar sozinha e já tinha avisado que, se eu não fosse trabalhar, ela ia achar outra pessoa para entrar no meu lugar. Aí tive que ir, né? Como iríamos pagar o aluguel?”, conta Eliane, que se encontrou em uma encruzilhada. “Ou fico desempregada, ou trabalho. Como estou sem opção, fui trabalhar.”

Histórias como as de Eliane Mota e Fernanda Moraes são apenas um recorte de um problema muito maior no Brasil. O auxílio do governo exclui uma parcela gigantesca de famílias com histórias complexas demais para preencherem os requisitos. Quem sofre no final são os milhares de domésticos, em sua maioria mulheres negras, idosas e periféricas, que arriscam a vida todos os dias para manter a renda.

por
Maria Fernanda Favoretto
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04/05/2020 - 12h

Por Maria Fernanda Favoretto

Elas são maioria entre os trabalhadores informais e desempregados, as mais prejudicadas pelas disparidades salariais e vivem sobrecarregadas pelos cuidados domésticos. Historicamente, esta é a realidade enfrentada pelas mulheres. Com a pandemia da Covid-19, no entanto, a vulnerabilidade feminina ficou ainda maior.

Em nota divulgada no dia 24 de março, a ONU Mulheres confirmou esse quadro desfavorável. “A maioria das mulheres trabalha na economia informal, onde o seguro de saúde provavelmente não existe ou é inadequado e a renda não é segura. Como elas não são contempladas por ajuda financeira, acabam não tendo suporte”, disse no comunicado a sul-africana Phumzile Mlambo-Ngcuka, diretora-executiva do órgão.

Mlambo-Ngcuka disse também que a maioria dos profissionais de saúde são mulheres, o que as coloca em maior risco. “Muitas delas também são mães e cuidadoras de familiares. Elas continuam carregando a carga de cuidados, que já é desproporcionalmente alta em tempos normais”, comentou.

No Brasil, segundo informações da ONU Mulheres, 85% dos profissionais da enfermagem, 45,6% dos médicos e 85% dos cuidadores de idosos pertencem ao sexo feminino. Ou seja, não são elas apenas as mais afetadas social e economicamente, mas as mais vulneráveis ao contágio do coronavírus.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou no mês de fevereiro dados sobre a taxa de desemprego do quarto trimestre de 2019. O número, que faz parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad), mostra que a atual taxa de desocupação gira em torno de 11,9%. O mesmo índice sobre as mulheres brasileiras foi calculado em 13,1%, superior à taxa masculina, de 9,2%. Entre a população desempregada, mulheres também somam a maioria: 53,8%.

Em matéria publicada no dia 27 de março no portal Valor Investe, o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, projetou que os primeiros e mais afetados pela falta de emprego serão os trabalhadores informais, ou seja, aqueles que não têm suas atividades regulamentadas pelo Estado, e que representam 40,7% da força de trabalho ocupada no país, ainda conforme a Pnad referente ao quarto trimestre de 2019.

Segundo a "Síntese de Indicadores Sociais 2019 - Uma Análise das Condições de Vida da População Brasileira", divulgada em março pelo IBGE, a proporção de mulheres em ocupações informais no Brasil é de 41,6%, tendo principalmente maior atuação no trabalho auxiliar familiar e no trabalho doméstico sem carteira assinada.

Em âmbito domiciliar, dados publicados pela Agência IBGE Notícias em setembro do ano passado mostram que a taxa de realização de afazeres domésticos em domicílio é de 92,2% para as mulheres e 78,2% para os homens. Ou seja, as mulheres dedicam, em média, 21,3 horas por semana a esse conjunto de atividades, enquanto os homens, apenas 10,9 horas. Ou seja, frente à pandemia do coronavírus e à alta esperada no desemprego, as poucas privilegiadas que não serão demitidas e poderão trabalhar em home office terão que alinhar o serviço a uma rotina de cuidados com a casa e a família.

Para muitas mulheres, infelizmente, o vírus e os problemas econômicos não são os únicos desafios. Como consequência do processo, a taxa de violência doméstica também aumentou. No Brasil, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos informou que a quarentena gerou uma alta de quase 9% no número de ligações para o Ligue 180, canal que recebe denúncias de violência contra a mulher. Enquanto a média diária entre os dias 1° e 16 de março foi de 3.045 ligações e 829 denúncias, entre os dias 17 e 25 de março foram 3.303 ligações e 978 denúncias. Só na cidade de São Paulo, os registros de violência contra a mulher aumentaram 30% no mesmo mês.

No dia 9 de abril, o governo começou a distribuir um auxílio emergencial de R$ 600 a trabalhadores informais, microempreendedores individuais, autônomos e desempregados, formados em sua maioria pelas mulheres. Mulheres que são chefes de família também podem solicitar o auxílio. 

Debora Adão Alves da Silva, 30, moradora do bairro da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, é uma das que estão recebendo o benefício . Mãe solteira e desempregada desde agosto de 2019, conta que sua principal fonte de renda para cuidar da filha de apenas um ano é a pensão mensal de R$ 300.

“Esta pandemia, não só para mim, mas para todos de baixa renda, vem causando um grande transtorno. No meu caso, não tem como eu trabalhar para sustentar minha filha, pois ela tem bronquite e está no grupo de risco. Tem dias que não tenho sequer R$ 1 para comprar pão”, conta Debora.

A moça ainda comenta: “Minha filha estava em fase de adaptação na creche, justamente para que eu pudesse voltar a procurar uma nova oportunidade de emprego”.

Com o valor disponibilizado pelo governo em mãos, Debora fala sobre a aplicação da verba: “Pretendo usar esse dinheiro enchendo os armários e comprando as coisas da bebê. As contas ficarão para depois”.

por
Artur Ferreira
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29/04/2020 - 12h

Por Artur Ferreira

 

Todos os dias, novos casos de Covid-19 são registrados no Brasil. Além disso, o número de mortes cresce diariamente. Segundo o Ministério da Saúde, até o dia 14 de abril, o coronavírus causou mais de 1.500 mortes e contaminou mais de 25 mil brasileiros.

Além dos dados alarmantes, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Brasília (UnB) afirmam que o Brasil possui um número de pessoas infectadas 15 vezes maior que o registrado oficialmente.

A estimativa dos especialistas do portal Covid-19 Brasil, que reúne cientistas das duas instituições, é que o Brasil já havia passado dos 313 mil infectados até 11 de abril. O estudo também foi divulgado no dia 14 deste mês e afirma que a baixa quantidade de testes feitos gera um alto índice de subnotificações de casos.

No Brasil, além dos decretos de quarentena que permanecem vigentes em diversos estados,  a criação de  hospitais de campanha para o combate ao vírus também tem estimulado a contratação de  profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros e farmacêuticos.

Enquanto médicos e enfermeiros dividem o ambiente hospitalar com as pessoas com suspeita ou confirmação do vírus, os profissionais das drogarias estão expostos ao contato constante com dezenas de pessoas diariamente.

Pois, da mesma forma que hospitais e postos de saúde, farmácias e drogarias não podem parar sua operação. Os farmacêuticos, além do estresse gerado pela pandemia, muitas vezes têm trabalhado mais do que o habitual,  devido ao cuidado maior com a higienização das farmácias e a assistência para clientes sobre remédios e substâncias em geral.

Segundo dados de 2018 do Conselho Federal de Farmácia, os farmacêuticos representam 221 mil dos brasileiros. O número de farmácias e drogarias supera 87 mil no setor privado e 11 mil na administração pública.

Carina França de Carvalho faz parte dessa parcela da população, e trabalha em uma rede de drogarias na Zona Sul de São Paulo. A farmacêutica afirma que, mesmo  não tendo havido aumento  da carga horária, a cobrança se intensificou muito.

De acordo com Carina, uma de suas principais tarefas hoje é orientar os clientes em relação a medicamentos. Ela conta que, além do balcão, chega a atender pessoas por WhatsApp.

Além dos clientes, os atendentes da drogaria também precisam seguir uma série de orientações, principalmente  quando se trata de medidas de higiene, explica a profissional.

Segundo Carina, o farmacêutico também tem que “ensinar a eles [a equipe] como lidar com esse paciente que vem do hospital, até mesmo casos confirmados [de coronavírus]”. Ela também cita a importância do apoio psicológico em um momento desses de crise.

“É importante ressaltar que a gente não tenha nenhum preconceito, mesmo com o paciente com caso confirmado”, explica Carina, pois a farmácia deve estar preparada para receber essas pessoas.

Ela completa dizendo que, em casos como esse, o profissional da linha de frente se torna mais alerta com a própria higienização. Mas isso nunca deve se tornar uma forma de preconceito ou um motivo para evitar atender pessoas contaminadas com a Covid-19. “É uma questão de ética”, define.

As orientações vão além das medicações. Os farmacêuticos também podem ser consultados sobre os sintomas causados pelo vírus   na maioria das vezes, para não confundi-los com os de outras doenças –,  a necessidade de ir ou não  ao hospital, entre outros detalhes que podem evitar o contágio desnecessário ou uma automedicação.

A automedicação é um grande risco. Carina deixa bem claro que uma das principais funções de sua profissão é evitar que o paciente se medique por conta própria, o que pode ser fatal.  .

 

Fora do ambiente de trabalho

 

Carina diz que o marido  também trabalha no ramo farmacêutico. O filho do casal também  atua na área, mas  já não mora  com os pais desde que se casou.

Porém, a farmacêutica relata que é a responsável pela sua mãe, que já tem 70 anos, e que realiza todos os cuidados necessários para o mínimo de interação com ela.

Conta que faz as compras  e  deixa no portão da casa da mãe, com o alerta de que   higienize com  com álcool  tudo que recebe. E  liga constantemente para saber se a mãe está bem e se necessita de algum apoio.

“Eu não quero só proteger a minha mãe da Covid, mas impedir que ela entre em uma depressão por se sentir sozinha”, explica Carina. A rotina de orientação e cuidado também é feita com seus sogros, que moram próximo de sua casa, e seu filho.

Desde o início da pandemia,  Carina e o marido seguem uma disciplina rigorosa: assim que chegam em casa, lavam todas as roupas usadas durante o dia e higienizam, um a um, os objetos que manusearam, como chaves e celulares. .

Depois desse processo, os dois sempre tomam um banho para que, aí sim, possam descansar com segurança. A casa também tem sido limpa com mais frequência.

 

O que o sindicato tem feito pelos farmacêuticos?

 

A   presidente do Sindicato dos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sinfar), Renata Gonçalves, explica que a atuação dos farmacêuticos vai além do varejo. Eles também podem estar presentes na indústria, hospitais e pesquisa científica.

A presidente conta que a distribuição variada dos profissionais da categoria acaba por dificultar a atuação do sindicato, já que o trabalhador  que deverá ser auxiliado pode enfrentar os problemas  mais diversos.

E, no momento de crise causada pela Covid-19, Gonçalves explica que a rotina do sindicato foi mudada da noite para o dia. A presidente entende que em crises anteriores na área da saúde, como a do H1N1, o peso para a categoria nunca foi tão grande como agora.

Devido à intensidade que a pandemia adquiriu no Brasil, a equipe do Sinfar tem redobrado sua atenção para as demandas, dúvidas e pedidos de orientações jurídicas dos profissionais da farmácia. “Nenhum profissional está ficando sem atendimento”, garante Gonçalves.

A dirigente explica que, atualmente, todas as ações do Sinfar estão sendo realizadas de forma remota, evitando o contato físico e a exposição de pessoas.

E, mesmo sendo parte da linha de frente, farmacêuticos também não estão imunes a demissões. De acordo com a presidente, as ações do sindicato estão muito voltadas para “que não haja demissões em massa e prejuízo na condição de trabalho do profissional”.

A sindicalista também conta que, em relação aos empregadores, qualquer forma de negociação para redução de salários, devido à crise, necessita de um acordo prévio com o sindicato, para a proteção das condições de trabalho do farmacêutico.

“A gente entende que a negociação direta entre patrão e empregado pode ser muito prejudicial ao trabalhador. Acaba pesando muito mais a pressão do patrão”, diz a presidente.

Entre as diversas ações em favor do profissional, Gonçalves cita a demanda do sindicato sobre a liberação do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) da categoria em caso de calamidade.

Porém, a presidente diz que a Caixa Econômica Federal ainda tem negado esse pedido, já que só liberaria o FGTS em caso de um “desastre natural”, como rompimentos de barragens e enchentes. O Sinfar está aguardando que a Caixa analise a demanda argumentando que uma pandemia como essa nunca poderia estar prevista na lei, e que o benefício precisa ser liberado ao trabalhador.

 Renata Gonçalves conclui que, mesmo antes da crise, mais direitos eram pleiteados pelos farmacêuticos todos os anos, como é o caso do vale-refeição e da classificação de insalubridade para a atividade. E, agora, essa luta só se intensifica devido à importância desse profissional nesse momento de crise da saúde pública.

por
Maria Fernanda Hohlenwerger
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29/04/2020 - 12h

Algo que não era falado e vivenciado antes, hoje faz parte do cotidiano de todo mundo: a quarentena. Devido à disseminação de uma nova doença na sociedade, a Covid-19, a recomendação é que ninguém saia de casa. Com isso, um sentimento pouco percebido se intensificou durante esse período, que é o medo. Ele consiste em um estado afetivo que surge em resposta à consciência diante de uma situação de eventual perigo; é algo que faz parte da nossa defesa e está intrinsecamente ligado ao nosso subconsciente, que nos alerta sobre situações de risco.

Como uma forma de conter a disseminação do vírus, o governo implementou o sistema de isolamento horizontal, que consiste em uma medida mais abrangente de distanciamento social, que pode envolver desde o fechamento de escolas, museus, shoppings, estádios, até o 'lockdown', no qual o governo proíbe completamente o fluxo de pessoas e estabelece multas, ou até prisões, para aqueles que o descumprirem. 

A partir desse novo cenário, as empresas se viram inseridas em uma situação na qual tiveram que tomar medidas que antes não eram cogitadas e hoje já fazem parte da realidade dos empregados. O sistema home office é uma delas. Como uma forma de manter o ambiente de trabalho e seus funcionários saudáveis, todos começam a trabalhar em casa, seja em um esquema 'full-time' ou em um regime de escala, em que se vai ao local de trabalho uma vez por semana, e nos outros dias se trabalha remotamente, por exemplo. 

Além disso, criou-se uma Medida Provisória (MP) que permite a diminuição da jornada de trabalho e do salário em até 70% pelo prazo máximo de 90 dias. O contrato de trabalho também pode ser suspenso completamente de forma temporária. 

Todas essas decisões e medidas foram criadas para diminuir o impacto da crise econômica, porém, ao mesmo tempo, contribuíram para um cenário de medo. Esse sentimento cresce constantemente, está presente no dia a dia dos trabalhadores, e acaba por gerar angústia, a incerteza de não ter um lugar garantido na empresa, não ter mais a renda fixa do mês garantida e o conforto da rotina. 

https://bit.ly/2y2iVp9
Foto: Pixabay. Link: https://bit.ly/2y2iVp9

De acordo com o psicanalista Christian Dunker, em uma entrevista concedida à BBC News Brasil, a pandemia gerou três perfis de comportamento: o tolo, que tende a negar a situação dramática como maneira de enfrentar o medo; o perfil desesperado, que se angustia ainda mais com a situação; e o confuso, que transita entre esses dois polos, sem saber direito como deve agir e pensar. Todos esses perfis derivam do medo, da incerteza e da falta de controle da situação. 

Todos se veem expostos a algo novo, desconhecido, e que pode nos afetar de diferentes maneiras. Uma estagiária, que não quis se identificar, falou com a Agemt sobre o medo de ter seu contrato suspenso. "O estagiário vive sempre na incerteza. Parece que nós somos superdescartáveis e que a qualquer momento não vão mais precisar da gente. Temos que mostrar nosso valor, mostrar que eu consigo, que dou conta do que me pedem."

O estagiário sofre com essa sensação diariamente ao ter que provar seu conhecimento e aprendizado para não perder sua posição na empresa. Porém, no contexto atual, qualquer trabalhador está sujeito a esse medo. É o que mostra uma pesquisa da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ebape), feita pelos pesquisadores Marco Tulio Zanini e Eduardo Andrade.

A pesquisa entrevistou 620 executivos de diversos cargos, como o de CEO (diretor-presidente), diretores-executivos e gerentes. O levantamento mostrou que esses profissionais não se sentem imunes ao desemprego, mesmo ocupando posições de alto escalão. Isso ocorre devido aos impactos econômicos da Covid-19, que tendem a elevar fortemente as demissões. Para 47% dos entrevistados, o desemprego já é motivo de preocupação, embora não acreditem que isso vá acontecer. Já 14,7% acham que é muito provável ou quase certo que serão desligados.

De acordo com a consultora de carreiras Angélica Kuntz, é necessário saber lidar com esse medo. Segundo ela, uma das formas para fazer isso é pensar em perspectivas fora da situação atual. "Eu sempre incentivo que os clientes que eu atendo tenham planos A, B e C. Então, esse é o momento de realmente olhar para dentro, fazer uma lista de coisas ou de produtos que você tem para oferecer ao mercado, e começar a pensar em outras possibilidades que podem interdepender deste trabalho em si. Se a gente tiver a certeza de que estamos fazendo o melhor que a gente pode naquele momento, certamente isso vai trazer um conforto emocional e nos preparar para um momento que talvez seja esse desemprego."

Angélica diz que o trabalhador deve usar o medo a seu favor, pensando se de fato está contente em seu emprego, se tem interesse em permanecer na equipe neste momento de incertezas e, possivelmente, se dispor para uma demissão. É uma situação em que na maioria das vezes é necessário sair da zona de conforto e se permitir novas vivências. 

Na visão da consultora, o desempenho pode ser afetado, porém é necessário manter a calma e estar alinhado com o propósito daquilo que se está fazendo. A crise econômica gera medo, afinal é uma situação da qual não se tem controle, mas é importante ver até que ponto esse ponto é administrável ou não, e procurar ajuda se for preciso. Em tempos de instabilidade, há muito apoio profissional para aprender a lidar com o momento da melhor maneira possível, e evitar, além do colapso econômico, um colapso emocional. 

por
Gabriela Neves
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29/04/2020 - 12h

O auxiliar administrativo Guilherme Moura conta que foi desligado da empresa onde trabalhava no dia 26 de março, dois dias depois da quarentena obrigatória ser decretada no estado de São Paulo. Ele mora na cidade de Barueri (SP), tem dois filhos e sua mulher é representante de vendas. A mulher continua trabalhando de casa, mas o número de clientes diminuiu, afetando seus ganhos. “Já vou atrás de outro emprego, mas por enquanto vou ter que me virar com o dinheiro da rescisão”, afirma Guilherme.

Infelizmente, ele não é o único brasileiro demitido por causa da crise gerada pelo COVID-19. O Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Ibre) calcula que a taxa de desemprego, que antes da pandemia era de 11,6%, chegará a  16,1% no segundo trimestre deste ano.  Caso a previsão se confirme, o número  de desempregados saltará de  12,3 milhões  para 17 milhões. Ou seja,  5 milhões de pessoas vão perder seus postos de trabalho.

Quem também está entre essas pessoas é Yasmin Colombo, que estagiava em um  cartório da cidade de Campinas (SP). Antes de a quarentena começar, havia recebido a notícia de que seria efetivada. Mas, no dia 24 de março, soube que seria desligada. Ela tem a esperança de voltar a trabalhar no local depois que a quarentena acabar.

Yasmin mora com sua mãe, Adriana Colombo,  supervisora de atendimento. Adriana poderia estar trabalhando de casa, mas não tem  computador. “Ela está sofrendo uma pressão terrível da empresa, que não fornece para ela ferramentas para  trabalhar”, diz Yasmin.

A faculdade de Yasmin é paga pelo pai, que é empresário. A garota teme os impactos da crise sobre seus estudos, pois as atividades da empresa do pai diminuíram e, diante disso, ela talvez  tenha que trancar o curso.

Assim como Guilherme, Yasmin  afirma que já vai começar a mandar currículos para outros lugares. A coach e mentora de carreiras especialista em recolocação Angélica Kuntz avalia que, para quem perdeu o emprego, o melhor a fazer é atualizar o currículo e adaptá-lo aos novos objetivos de trabalho.

Angélica indica o Linkedin como uma boa ferramenta para se reinserir no mercado de trabalho. Segundo ela, a plataforma é o mecanismo de busca mais utilizado por profissionais de recursos humanos. Seguir as dicas de especialistas em recolocação também pode ser interessante para ter um perfil mais competitivo na busca por emprego.

Angélica reconhece, no entanto, que o momento não é o melhor para abordar RH’s. “Há vagas dispostas no mercado, porém grande parte delas é para fazer banco de currículo, que só será usado quando a empresa voltar a contratar”, afirma .

De acordo com a especialista,  esse momento de quarentena é ideal para fazer cursos online e, com isso, melhorar suas competências. É importante pensar  que cursos se encaixam nas atribuições exigidas em possíveis vagas a que o desempregado pretenda se candidatar no futuro. Várias plataformas  oferecem cursos gratuitos ou de baixo custo.

Para quem está empregado e teme ser demitido, Angélica afirma que uma boa ideia é conversar com o RH e procurar saber se existem, de fato, perspectiva de desligamento. Neste caso, o profissional pode tentar um acordo com a empresa que evite a demissão.

A MP 936 permite que os empregadores reduzam a carga horária e os salários dos funcionários. Também pode haver suspensão temporária do contrato de trabalho. Nos dois casos, o governo vai compensar parte da perda de remuneração do trabalhador. O valor da compensação tomará como base o valor mensal do seguro-desemprego a que o trabalhador teria direito. E vai depender de como foram feitas as alterações no contrato.

Mesmo com essas medidas, o número de desempregados vai crescer e a situação deve demorar para melhorar. Na recessão de 2015 e 2016, por exemplo,  a taxa de desemprego subiu de 7% para 13%, mas só caiu 2,5 pontos percentuais nos últimos três anos.

Para ajudar quem busca emprego

Além das dicas já dadas, a mentora de carreiras especialista em recolocação Angélica faz mais alguns lembretes:

  • No Linkedin não diga que está  busca de recolocação. As empresas  procuram um profissional de determinada área e não alguém em busca de recolocação;
  • Sempre deixe seus contatos (e-mail e telefone) em fácil acesso;
  • Ative suas notificações, acesse e responda seus e-mails;
  • Nunca pague por nenhuma entrevista. Empresas sérias não cobram por recrutamento;
  • Mantenha-se ativo no Linkedin e tenha uma rede de pessoas que podem indicá-lo;
  • Tenha uma estratégia, faça uma lista de empresas que você tem como alvo. Não empresas dos sonhos, mas lugares que podem absorver seu perfil.

Angélica também deixou modelos de currículo, que podem ser baixados aqui.