Em meio à quarentena e à recessão provocadas pela rápida proliferação do coronavírus, o mercado floricultor do país já deixou de faturar R$ 297,7 milhões apenas entre os dias 14 e 28 de março, quando as medidas de isolamento social começaram a ser implantadas. Segundo o Ibraflor (Instituto Brasileiro de Floricultura), o setor movimenta R$ 8,67 bilhões em toda a cadeia e gera mais de 1 milhão de empregos, sendo 210 mil diretos e 800 mil indiretos.
Após um bem-sucedido Dia Internacional da Mulher (8 de março), as previsões para o Dia das Mães (10 de maio) eram muito boas: “A situação mudou de uma hora para outra e o setor da floricultura foi atingido de maneira drástica”, comentou Kees Schoenmaker, presidente do Ibraflor, para o jornal Holambrense.
De acordo com o instituto, os prejuízos previstos para o mês de abril devem somar mais de R$ 669,8 milhões e a perda estimada para o Dia das Mães é de R$ 396,9 milhões.
Lucimeire Barbosa, uma das donas da Floricultura Marajoara, no cemitério de Congonhas, conta que as vendas caíram cerca de 90% desde o início da quarentena. “Como o tempo dos enterros diminuiu, nem coroa de flores a gente tá vendendo direito”, diz Lucimeire. Ela acrescenta que não conhece nenhuma outra floricultura que tenha mantido as atividades neste período.
Em relação ao Dia das Mães, Lucimeire não tem expectativas de venda. “O Dia das Mães costuma ser muito bom, tanto pra quem vem ao cemitério presentear, como pra quem compra e vai pra casa. Se a quarentena continuar, do jeito que tá acho que a gente não vende nada. Ninguém vai querer sair”, afirma.
Em uma live feita no perfil do Canal Terraviva no Instagram, o diretor de marketing do Ibraflor, Renato Opitz, comentou sobre a maior apreensão do setor em relação ao Dia das Mães. "O volume da produção no Dia das Mães é muito grande, então ele dependia de toda uma cadeia logística de distribuição funcionando perfeitamente para poder escoar. A nossa principal preocupação agora é que essa cadeia funcione, ou seja, não adianta o próprio consumidor, próximo do Dia das Mães, querer o produto e não ter", disse.
Em 2019, o Dia das Mães deu um lucro de quase R$ 10 bilhões ao comércio, sendo a segunda data comemorativa mais lucrativa para o setor. Diante disso, neste ano, comparando os resultados da Páscoa com os do ano passado, muitos comerciantes chegaram a propor a mudança do Dia das Mães para o segundo domingo do mês de julho. O governador de São Paulo, João Doria, sugeriu que a data fosse celebrada em agosto.
A respeito de um possível adiamento, Opitz afirmou: "Da nossa parte, do setor de flores ornamentais, a gente é totalmente contra essa mudança por vários motivos, sendo o principal o fato de as flores já estarem plantadas para essa data, então os produtores não teriam onde escoar essa produção e depois, em julho, não teria flor, ou seja, agora vai sobrar e depois vai faltar".
O Ibraflor, junto a cooperativas de Holambra (SP), conhecida como a “cidade das flores”, formou um comitê de crise para monitorar os impactos causados pelo novo coronavírus e analisar o mercado para minimizar os prejuízos em meio às medidas do isolamento social, que fizeram com que festas e eventos fossem cancelados.
Além da criação do comitê, o instituto e as cooperativas lançaram no dia 17 de março uma campanha nas redes sociais intitulada “O poder das flores e das plantas – A flor é o alimento para a alma”, que tem por objetivo incentivar o consumo ao associar flores e plantas com o bem-estar e a geração de emoções, e não só como um artefato para embelezar um cômodo.
No portal Nação Agro, uma iniciativa do Canal Rural, o produtor rural e representante da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo na Ceagesp, Valdemar Koga, deu uma entrevista exclusiva e comentou: "O mercado realmente está com 60 a 70% de perdas, se não mais".
Sobre a situação dos produtores, Koga disse: "A produção será menor, então é possível que futuramente falte mercadoria. Aqueles que não têm condições de continuar com a produção vão parar, já que não têm reserva no caixa. Os médios e os grandes até têm uma reserva, mas não por muito tempo. E outra, se os pequenos produtores pegarem uma linha de crédito, um empréstimo pessoal, os juros seriam muito grandes".
Segundo o Canal Rural, no dia 9 de abril o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou um plano de ajuda econômica a produtores rurais afetados pelo coronavírus e pela seca. A ajuda inclui prorrogações de pagamentos de dívidas e novas linhas de crédito.
Diante de crises econômicas, como a que o Brasil está enfrentando em decorrência da pandemia do novo coronavírus, a tendência é que a desigualdade social fique ainda mais evidente. O principal ponto afetado pela disparidade econômica acaba sendo a área da saúde, principalmente a vida das pessoas que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS).
Em situações emergenciais, o papel do Estado é garantir que tanto os ricos quanto os pobres consigam se prevenir da forma mais justa possível. Entretanto, acaba se tornando impossível exigir adesão à quarentena de pessoas que vivem em condições precárias de saneamento básico, não têm possibilidade de fazer home office e moram em habitações apertadas e com aglomeração.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), prorrogou, no dia 17 de abril, a quarentena no estado. “Aqui nós não brigamos com a ciência, nós respeitamos a ciência”, disse Doria em pronunciamento. O estado já está em isolamento social desde 22 de março.
A diretora-executiva da Oxfam Brasil, Katia Drager Maia, reforça que nem todos os brasileiros podem seguir as orientações de isolamento feitas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “Milhões de pessoas não têm a opção do chamado home office, tanto no que se refere ao tipo de trabalho quanto às condições logísticas residenciais. O necessário e importante isolamento social é totalmente diferente para quem tem condições de moradia adequadas e para quem não tem”, afirma.

A desigualdade social acaba se tornando algo comum aos olhos dos brasileiros e até mesmo sendo banalizada. É nos momentos de crises sanitárias, como esta pandemia mundial, que os menos favorecidos sofrem mais, e o principal motivo disso é a falta de direitos básicos de higiene e saúde.
Segundo o DataSUS, sistema de informação do Sistema Único de Saúde, houve uma queda de 2,5% no número de leitos disponíveis no estado de São Paulo nos últimos quatro anos. Em 2015, a média era de 109,5 mil leitos. Já em 2019 esse número caiu para 106,8 mil. Esses dados se referem aos leitos básicos e às Unidades de Terapia Intensiva (UTI), nos hospitais públicos e privados do estado.
Com o crescimento acelerado dos casos de coronavírus, os hospitais acabam não suportando a demanda de atendimentos e, consequentemente, o sistema de saúde fica sobrecarregado. Dados da Rede Nossa São Paulo (RNSP) mostram que atualmente, em São Paulo, a proporção é de 2,5 leitos para cada mil habitantes, o que é pouco, ainda mais no enfrentamento de uma pandemia.
Uma das soluções encontradas foi a construção dos hospitais de campanha. São dois na capital paulista, que têm por finalidade atender os pacientes infectados com baixa ou média complexidade. Um deles foi montado no Estádio do Pacaembu, disponibilizando 200 leitos. O outro foi erguido no Anhembi, com 887 leitos, dos quais 64 de Unidade de Terapia Intensiva.
Os números divulgados pela Prefeitura de São Paulo mostram que, até o dia 17 de abril, o bairro com mais mortes na capital paulista era a Brasilândia. O portal de notícias G1 divulgou que o bairro tinha então 89 casos confirmados de Covid-19 e 54 mortes. Já no Morumbi, bairro considerado de classe média alta, eram 297 casos confirmados e sete mortes.
Em meio a uma pandemia, cuja prevenção depende exclusivamente do isolamento social, os trabalhadores informais sentem ainda mais de perto os efeitos da crise econômica. Nesses momentos, os empregos mais vulneráveis e que pagam menos acabam demitindo seus funcionários, o que contribui para o agravamento da desigualdade social. Trabalhadores com carteira assinada também sofrem nessa crise, porém têm uma segurança econômica maior.
Diante da pressão da sociedade civil, economistas e parlamentares, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou o projeto de lei que visa ajudar os mais vulneráveis nesse momento de crise. A concessão de uma renda básica emergencial de R$ 600 durante a pandemia é uma das ações do governo com intuito de ajudar os mais afetados.
“É fundamental que o governo priorize o atendimento econômico e social à população que está em situação de vulnerabilidade ou que pode vir a ficar, como consequência da crise provocada pelo coronavírus. A renda básica emergencial é um programa fundamental que precisa ser implementado com maior eficiência e por um período bem maior do que os três meses iniciais previstos”, afirma Katia Drager Maia.
Os efeitos econômicos da pandemia do coronavírus ainda vão ser vistos ao longo dos próximos anos. Maia prevê um aumento significativo nos índices de desigualdade no país nos próximos relatórios da Oxfam Brasil. “O Brasil já apresentava cerca de 40 milhões de pessoas no trabalho informal e esse número deverá aumentar. Os indicadores de renda também devem apresentar uma redução na renda da população, particularmente da base da pirâmide. Já existem análises que indicam que o país pode ter mais de 2 milhões de novos desempregados.”
Um caso muito comentado nas redes sociais foi o post da blogueira fitness Gabriela Pugliesi, cujo teste de Covid-19 apontou resultado positivo no início de março. Em uma postagem na rede social Instagram, ela escreveu: “Bastaram meia dúzia de dias para que o universo estabelecesse a igualdade social, que se dizia ser impossível novamente. O medo invadiu todos. Que isto sirva para nos darmos conta da vulnerabilidade do ser humano. Não se esqueçam, bastou meia dúzia de dias”, escreveu Pugliesi. O assunto teve uma repercussão negativa e a influenciadora apagou o post.
A visão equivocada de que um vírus possa trazer à tona uma igualdade biológica humana é muito discutida nos dias de hoje, em meio ao enfrentamento da pandemia. Viver num país em desenvolvimento como o Brasil é uma experiência diária que permite enxergar como o mundo ainda sofre com a desigualdade total e não apenas no âmbito da saúde.
Imagem da capa: Casas de Paraisópolis e prédio no Morumbi, em São Paulo. (Reprodução: BBC Brasil)
Segunda-feira, 16 de março de 2020. Após uma alta de 4,55%, o valor do dólar supera os R$ 5 pela primeira vez na história. Desde então, a moeda americana passa por altos e baixos em relação ao real, mas quase sempre se mantendo acima dos R$ 5. No dia 24 de abril, após o anúncio do ex-ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) de que estava deixando o governo, o dólar bateu um novo recorde e fechou a R$ 5,65. A alta acumulada ano chegou aos 35%, com a moeda fechando o mês de abril em R$ 5,43, sem previsão de queda para maio.
Embora influenciada pela instabilidade política, a disparada da moeda americana tem como razão principal a crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19. De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Produto Interno Bruto (PIB) do planeta deve ter uma contração de 3% neste ano, a maior desde a Grande Depressão da década de 1930. Para o Brasil, o FMI espera uma queda de 5,3%, um recuo sem precedentes. A recessão será acompanhada de um aumento de quase três pontos percentuais na taxa de desemprego.
Neste cenário negativo e repleto de incertezas, a alta do dólar tem a ver com o regime de câmbio flutuante que o país adota desde 1999. Por esse sistema, o valor das moedas é determinado pela oferta e pela demanda do mercado. Neste momento, um movimento de fuga de capitais, no qual muitos investidores liquidaram suas aplicações em busca de opções que consideram mais seguras, está fazendo o preço do dólar subir, como explica o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central.

Ou seja, muitas pessoas acabam por trocar investimentos menos seguros em solo brasileiro (retirando dinheiro da economia local) por outros no exterior que apresentam menor risco de perda. "É muita gente vendendo em reais e comprando dólares para poder aplicar lá fora, levando a uma alta significativa", afirma Schwartsman.
A retirada de dinheiro do mercado brasileiro também tem afetado a Bolsa de Valores, que tem sofrido constantes quedas nos últimos tempos. O Ibovespa, principal indicador da Bolsa brasileira, costuma se comportar de maneira inversamente proporcional à cotação do dólar: enquanto um sobe, a tendência do outro é descer.
Enquanto isso, mesmo sendo um dos principais afetados pela Covid-19, os Estados Unidos vivem um movimento contrário. Enquanto o Brasil vê o capital sendo tirado de sua economia, os norte-americanos veem dinheiro sendo injetado, com muitas pessoas, de todo o mundo, comprando títulos de seu governo e sua moeda local.
Um dos principais receios quando o dólar sobe são os impactos na inflação, uma vez que os valores de produtos importados e exportados costumam ser ligados à moeda americana. De acordo com Schwartsman, no entanto, esta não é uma preocupação muito importante no contexto atual. Isso porque, segundo ele, não parece estar havendo um grande repasse no preço destes produtos, o que deve, em alguma medida, ajudar na recuperação do atual cenário de crise.
Segundo o ex-diretor do Banco Central, com a atual cotação do dólar, o Brasil consegue exportar mais facilmente tudo o que é produzido localmente, mas tem dificuldade em importar, o que caracteriza um câmbio desalinhado. Considerando que tudo que é produzido na Brasil acaba ficando mais barato, a exportação deve ser facilitada, o que, para muitos economistas, pode levar à diminuição da concorrência de outros exportadores em relação aos produtos brasileiros.
Além disso, como a importação é dificultada devido ao câmbio, o mercado interno tem que adquirir produtos nacionais. Com isso, quando o ritmo de compras no país voltar ao normal, uma preferência maior deve ser dada aos produtos locais, de acordo com Schwartsman.
Com a velocidade com que o dólar está subindo, o grande medo é de que a moeda americana atinja níveis estratosféricos – ainda maiores do que já atingiu – e nem mesmo os economistas chegam a um consenso sobre o que será do futuro. Alguns acreditam que a moeda possa atingir R$ 6 e outros creem que ficará abaixo de R$ 5. Alexandre Schwartsman é um dos que acreditam na baixa: "Minha impressão – é difícil fazer previsões neste momento – é que me parece um pouco esticado o valor do dólar, na casa do R$ 5,20, R$ 5,30. É mais provável que ele caia do que suba". Segundo a edição de 4 de maio do Relatório Focus do Banco Central – que considera as estimativas de mais de 100 instituições do mercado financeiro – , o ponto médio das previsões para o dólar no fim do ano está em R$ 5.
Schwartsman avalia que os movimentos do mercado têm sido muito mais ditados pelo pânico do que por um raciocínio mais elaborado. Ou seja, com o retorno à situação normal, o patamar buscado pelo dólar deve ser inferior ao de hoje, inclusive abaixo de R$ 5. "Eu não ficaria espantado", diz.
Por ora, não há nada no âmbito econômico que o governo brasileiro possa fazer para reverter o atual quadro de instabilidade, no entendimento de Schwartsman, uma vez que as principais forças do que está acontecendo não vêm de dentro, mas sim de um movimento mundial causado pela pandemia.
"As ações estão muito mais do lado de medidas de saúde pública, que podem mostrar um impacto menor da epidemia no Brasil", diz.
Na visão do economista, o que deve ser feito, mas nem tanto para tentar uma valorização do real e consequente baixa do dólar, mas sim porque é "o absolutamente correto", é mostrar que o país tem estratégias para lidar com o vírus, algo que o governo não tem mostrado, inclusive o presidente Jair Bolsonaro.
Para Schwartsman, o quanto antes o Brasil tiver condições de abandonar a quarentena e o isolamento social, melhor vai ser para a economia local.
Em meio à discussão de medidas que possam atenuar os impactos do novo coronavírus, o secretário de Fazenda e Planejamento de São Paulo, Henrique Meirelles, fez uma proposta que dividiu os economistas. Em entrevista à BBC News Brasil, Meirelles sugeriu que o Banco Central (BC) “imprima dinheiro” para combater as consequências econômicas da pandemia.
Presidente do BC durante os dois mandatos de Lula (2003-2010) e ministro da Fazenda no governo Temer (2016-2019), Meirelles defendeu sua proposta com veemência, argumentando que a retração da economia será tão brutal que não haverá risco de inflação. Entretanto, a opinião está longe de ter unanimidade. Para alguns economistas entrevistados, a proposta pode ser uma solução viável; para outros, está fora de cogitação diante do risco de inflação e por existirem alternativas mais indicadas para o contexto brasileiro.
Dinheiro que dá em árvore
A ideia de “imprimir dinheiro” frequentemente é interpretada de forma errônea, uma vez que não é baseada apenas no aumento da quantidade de papel-moeda, e sim em um conjunto de fatores que promovem uma expansão na base monetária. Entre eles está a compra e a valorização de títulos pelo BC, que gera dinheiro para o mercado e o redireciona para investimentos e empréstimos.
Com a economia estimulada, a taxa básica de juros (no Brasil, a taxa Selic) diminui e a demanda é aquecida novamente. Porém, outros fatores podem influenciar os resultados da medida, entre eles a inflação.
“Para dar certo precisaria ser bem pensado”
Para o professor da GVLaw Rafael Bianchini, existe a possibilidade de adotar a ideia da emissão de moeda, mas “não pode ser uma medida perene, tem que ser muito pontual para essa crise que estamos vivendo”.
De acordo com o economista, o que está subjacente ao conceito de imprimir dinheiro é o Banco Central financiar o Tesouro, mas hoje isso é vedado pela Constituição Federal (artigo 164, parágrafo primeiro). “Ou seja, demandaria uma emenda constitucional ou no mínimo um outro entendimento da Constituição."
E um dos maiores temores diante da adoção da medida é a inflação. Porém, segundo Bianchini, com o isolamento social, a demanda está caindo muito mais do que a produção. O professor menciona os dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) do mês de março, que mostram uma inflação muito elevada nos preços de alimentos (mais de 1%), mas no restante dos itens uma variação considerada baixa para o mês (de 0,7%). Além disso, o mercado já prevê uma deflação nos próximos dois meses. “Então esse risco de inflação, nesse tipo de contexto de uma crise tão forte como a da Covid, é muito pequeno”, diz o economista.
Para Bianchini, caso se decidisse adotar a proposta de Meirelles, seria necessário criar uma emenda constitucional bem desenhada, “porque voltando a normalidade não faria sentido o Banco Central continuar financiando o Tesouro Nacional, até para não ser uma violação a nossa Constituição”.
Professor da PUC prefere a venda de reservas
Já para o professor de economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Claudemir Galvani, a emissão de dinheiro não seria a melhor ideia, e sim o endividamento, “porque a dívida você tem um prazo maior para pagar e a inflação é um negócio muito mais difícil de controlar”.
Galvani diz que na crise de 2008 – quando as Bolsas de Valores despencaram, fazendo com que os governos de vários países anunciassem planos de socorro à economia – a dívida interna no Brasil estava próxima a 45% do PIB e a emissão de moeda foi adotada como uma saída.
“Pode ser uma boa possibilidade apenas quando a dívida está muito alta ou quando o mercado não está mais aceitando comprar títulos do governo”, avalia o professor da PUC-SP. “Nós temos US$ 340 bilhões de reservas, o que é muito grande, então daria para vender quase um terço disso e continuar com uma brutal segurança", acrescenta.
“Não serve para um país como o Brasil”
Para Zeina Latif, doutora em economia e ex-economista-chefe da XP Investimentos, a medida defendida por Meirelles não é a melhor prescrição de política econômica para o Brasil, pois reeditaria, segundo ela, um erro cometido pelo país até meados da década de 1980, quando o BC injetava liquidez de maneira direta ou indireta e o resultado era uma hiperinflação, debelada apenas com o Plano Real, em 1994.
A proposta seria viável, de acordo com a economista, se adotada em países que têm marcos institucionais mais sólidos e que não possuem problemas de inflação. “A nossa inflação agora está baixa, mas vamos lembrar que até outro dia a gente estava falando de uma inflação que ameaçava sair do controle no governo Dilma. Então não temos ainda um BC com regimes de metas tão solido assim”, afirma.
Segundo Zeina, a emissão de moedas colocaria em risco o cumprimento das metas de inflação, viabilizado normalmente pela fixação adequada da taxa básica de juros. “Nesse desenho você não teria como deixar a taxa de juros positiva. Iriamos ter fuga de capitais do país, porque ninguém iria comprar dívida pública com juro zero”, explica a economista.
“Na hora da crise, o Estado precisa intervir e logo”
Para Marcos Henrique do Espirito Santo, professor de economia do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), “a emissão monetária é necessária, porque ela não necessariamente causa inflação”. Segundo ele, “é importante lembrar que na caixa de ferramenta dos economistas nada é estático”.
Espírito Santo cita o caso do governo dos Estados Unidos, que vai gastar aproximadamente US$ 2 trilhões. Ou seja, o país irá investir em sua economia mais do que o próprio PIB do Brasil. “Todo mundo vai expandir dívida e todo mundo vai ter que expandir a quantidade de moeda, e isso é da lógica de funcionamento do capitalismo”, afirma o professor da FMU.
O bairro da Liberdade, em São Paulo, é atualmente o maior reduto da comunidade asiática na América Latina, com restaurantes, lojas e festivais que representam a cultura oriental. O local se tornou um ponto turístico da cidade e conta com diversos estabelecimentos comerciais que estão sofrendo devido à Covid-19, que levou ao fechamento de lojas e ao isolamento social.
De restaurantes a lojas de cosméticos, tudo na Liberdade é conhecido pelo toque oriental, apesar de não ter sido sempre assim. Os primeiros japoneses chegaram em 1912, atraídos pelos aluguéis mais baratos. Pouco tempo depois, já existiam os estabelecimentos familiares que tornaram o bairro o que ele é hoje. Muitas famílias orientais não moram mais no local, porém mantêm seus comércios e fontes de renda.
O fechamento de lojas e serviços não essenciais foi decretado pelo governador de São Paulo, João Doria, e começou a valer a partir de 24 de março. Porém, antes disso, muitos comerciantes já haviam fechado seus estabelecimentos por medo da doença respiratória.
É o caso de Aríana Spataro, proprietária da loja de incensos e artigos esotéricos Ita Brazil, que funciona há 21 anos na galeria SoGo Plaza. Aríana e a sócia, Elaine, têm apenas uma funcionária, de 51 anos. A lojista afirma que prefere dar emprego a pessoas dessa faixa etária, que costumam ter dificuldade para encontrar trabalho.
As três estão em isolamento social desde o dia 19 de março, tendo saído somente para ir ao supermercado e à farmácia. A mãe de Elaine é idosa e, portanto, do grupo de risco, o que causa preocupação às sócias, que estão se ajudando nas tarefas cotidianas.
Aríana conta que a situação financeira está muito difícil, já que a loja é a única fonte de renda delas. “Na real, não sabemos até quando nós iremos aguentar, porque está muito difícil, principalmente para nós que vivemos desse comércio”, diz.
Devido às características de seus produtos e do público consumidor, a Ita Brazil não consegue realizar vendas online. Com foco principal em incensos, a loja também vende mandalas, estátuas, incensários e cristais, artigos que a maioria das pessoas prefere adquirir presencialmente, seja por conta dos aromas ou até mesmo pela carga espiritual que vinculam às peças. A lojista relata que já tentou vender pela internet, mas que realmente não funciona. “Por isso que é dessa forma que a gente trabalha, com a porta aberta.”
Além da dificuldade em vender os artigos online, a maioria das mercadorias é importada da Indonésia, chegando na loja por meio de distribuidoras, que também estão enfrentando problemas por conta do coronavírus. Assim, a loja não está vendendo e nem recebendo os produtos, deixando a proprietária aflita sobre quando a situação vai se normalizar.
Apesar da situação complicada e do aperto financeiro, Aríana diz ter fé e esperança de que tudo isso vai passar.
Em contrapartida, a Omohna Store, uma loja de acessórios voltados ao pop coreano, conhecido como Kpop, está se preparando para migrar para as vendas online. A proprietária, Natália Pak, de 33 anos, disse que ela e seus dois funcionários ainda estão catalogando os produtos para disponibilizá-los no site.

Ela também relata que teve bastante procura pelos produtos após o começo das medidas de isolamento social, principalmente pelas máscaras de proteção coreanas, que já eram vendidas pela loja há alguns anos.
A Omohna Store funciona há cinco anos, e atualmente, assim como outros estabelecimentos, está remanejando gastos para economizar por conta da crise.
“Não está sendo diferente para nós, estamos economizando ao máximo nas compras de mantimentos e juntamos tudo o que tínhamos para pagar as contas, que não param. O máximo que conseguimos fazer é negociar os aluguéis, como o da loja e o da residência. Assim não precisamos reduzir os salários dos funcionários e nem deixar de pagar as contas da loja”, diz Natália.
Assim como Aríane e Elaine, da Ita Brazil, Natália tem enfrentado dificuldades em relação aos fornecedores. Todas as mercadorias da Omohna Store são importadas da Coreia e atualmente, por conta da pandemia, nada está saindo do país. Natália afirma que os fornecedores coreanos também estão passando por uma crise.
Já o mercado de produtos nacionais e importados Empório Azuki está atendendo por WhatsApp. Inaugurada em 2012, a loja tem 30 funcionários e começou recentemente a realizar vendas online, disponibilizando o catálogo nas redes sociais e via WhatsApp. Apesar de ter se adaptado rapidamente ao comércio virtual, a loja relata que a queda nas vendas físicas foi assustadora, impossibilitando, por isso, um reajuste de preços apesar da disparada do dólar. O estabelecimento ressalta que, como a Liberdade é um lugar turístico, muitos clientes são de fora do bairro. Por último, diz que está mantendo um bom relacionamento com os fornecedores e que considera a parceria fundamental.
Lojas:
Ita Brazil - Incensos indianos e artigos esotéricos. Rua Galvão Bueno, 40, 44, Liberdade, São Paulo/SP. Contato: (11) 95380-3501.
Ohmona Store - Loja de K-Pop e produtos coreanos originais. Rua Galvão Bueno, 200, lojas 23 a 28. São Paulo/SP. Instagram e Facebook: @ohmonastore.
Empório Azuki - Mercado de produtos nacionais e importados. Rua Galvão Bueno, 16, Liberdade - São Paulo/SP. Instagram e Facebook: @emporioazuki
