Videogames se aproximam de artigos de luxo devido aos elevados custos
por
Lucca Cantarim dos Santos
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07/11/2025 - 12h

Por Lucca Cantarim

 

Quem acompanha o cenário dos videogames vem se surpreendendo com a alta nos preços dos jogos nestes últimos meses. Com valores que vão desde R$ 249,95, valor do jogo “Hundred Line – Last line of defense”, lançado em abril de 2025, até R$ 499,99, preço do jogo Mario Kart World, que chegou às lojas em junho do mesmo ano. Esses preços têm dificultado cada vez mais o acesso dos fãs aos jogos que desejam, uma vez que acaba sendo inviável para muitos precisar gastar tanto dinheiro sempre que querem jogar um jogo novo. A estudante de sistemas de computação Gabrielle Rodrigues afirma sempre se arrepender de pagar caro em um jogo no dia do lançamento e acabar ficando sem dinheiro para comprar uma roupa ou até mesmo uma passagem do Rio de Janeiro até São Paulo para visitar seus entes queridos. Já o estudante Gabriel Merino alega sentir cada vez mais que não consegue comprar jogos no lançamento, precisando esperar diversos meses até uma baixa no preço ou promoção para finalmente ter acesso ao produto.

Fazer um jogo é um processo extremamente caro, e para a desenvolvedora independente “Dumativa”, responsável por jogos brasileiros como “Enigma do Medo” e “Lenda do Herói”, esse é o principal motivo para o aumento no custo do produto final. Já para Juno Cecílio, CEO da “Gixer Entertainment”, outra desenvolvedora independente, criadora do projeto “Changer Seven”, que se encontra em desenvolvimento atualmente, existe um fator ainda mais sensível.

 

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"Changer Seven", jogo de Juno Cecílio                                                 Foto:Divulgação/Gixer

 

Juno defende que existe uma estratégia de mercado mais agressiva por parte das empresas, que almejam maximizar sua receita em cima de um público fiel e cada vez mais disposto a pagar por franquias conhecidas. O grande problema, é que não existe um teto que defina até onde uma corporação queira ganhar, o que acaba sucateando o setor. O desenvolvedor faz um comparativo com outros setores no Brasil, como o de faculdades, que são compradas, demitem o corpo docente e substituem-no por profissionais mais baratos e revendem para o próximo, que fará o mesmo. Esse caso pode se observar na faculdade Anhembi Morumbi, que sofreu demissões e perdas massivas na grade horária após ser comprada pelo grupo Ânima Educação em 2021, como afirma uma matéria publicada na UOL em 2023.

Mas ele também aponta para outro fator, que também é abordado pela Dumativa, a falta de regionalização do preço. Quando um jogo chega no Brasil apenas convertido pela taxa do dólar, sem considerar a realidade do poder de compra local, ele acaba se tornando um produto quase que de luxo, e é nessas situações que observamos preços como os R$ 500,00 de Mario Kart World. A maioria dos jogos independentes já consideram fatores regionais quando lançam seus produtos em outros países, mas as produções de empresas grandes, como Nintendo, Ubisoft e Activision não, o que agrava uma ideia de “ganância” por parte dessas empresas.

Oferecer preços acessíveis ao consumidor é importante por inúmeros fatores, e um deles é justamente oferecer a experiência de jogo para um público mais amplo. Para muitos fãs de videogames, é extremamente doloroso, apesar de não chegar a um estágio extremo, ser privado de jogar algum jogo que goste devido ao seu custo elevado.

Gabrielle, por exemplo, diz que se sentiria mal caso fosse impedida de comprar um lançamento que estivesse com vontade de jogar. Ela alega que tem vontade de jogar o “Persona 3 Reload” a cerca de um ano, mas até hoje não o fez devido ao alto custo do jogo. Ela conta que até pensou em piratear a mídia apenas para consumo, e pagar por ela quando tivesse a oportunidade – igual já fez com outras franquias – mas que os sistemas que as empresas andam colocando em seus produtos, dificultam muito a pirataria. Gabriel Merino passa por uma situação similar, ficaria chateado caso não conseguisse comprar um jogo devido ao preço, mas também não compraria um jogo à preços exorbitantes mesmo se tivesse as condições para isso.

Lançar os jogos à preços acessíveis é essencial para que essas pessoas consigam consumir a mídia que desejam sem precisar se arriscar na pirataria ou pagar valores elevados. Além disso, é essencial para a criação de um consumo saudável. Nas palavras de Juno, quando um jogo lança à um preço compatível com a realidade do brasileiro, ele vende mais e ajuda a fortalecer o mercado e a comunidade local, e a trazer mais espaço para as empresas no País. Um exemplo foi o “Hollow Knight: Silksong”, lançado pela Team Cherry em setembro desse ano. O preço de R$ 60,00 cobrado pela mídia fez com que ela vendesse muitas unidades em um único dia – culminando na queda dos servidores da plataforma de compras Steam.

As empresas e publicadoras são as primeiras que podem participar na criação de um preço mais acessível e justo para o bolso da população. Grandes empresas e distribuidoras (Nintendo, Ubisoft, Microsoft) podem ajudar aprimorando a regionalização de preços, levando em conta o poder de compra de cada país; aprimorar a educação e formação de talentos, o que em longo prazo reduz o custo de produção global; oferecer programas de incentivo e parcerias com estúdios locais, o que acaba por gerar mais empregos, e visibilidade.

Quanto às empresas independentes, não se pode transferir as mesmas responsabilidades, uma vez que estas não tem o mesmo poder financeiro que as “gigantes do setor”. No entanto, elas podem e devem estabelecer métodos de acessibilidade nos preços de seus jogos, e algumas já tomam as providências, apesar de este ser um dos maiores desafios para essas instituições.

A Dumativa têm feito uso dos sistemas de financiamento coletivo em seus lançamentos, isso ajuda as empresas a terem uma base financeira mais sólida antes mesmo do lançamento, além de estabelecer uma relação saudável com empresa e consumidor, a partir do sistema de recompensas e conteúdo adicional dependendo de quanto cada pessoa optou por investir no jogo, além do próprio produto completo após o lançamento.

Já Juno, da Gixer, amplia ainda mais sua visão, para ele, jogos independentes não precisam competir com os grandes lançamentos em preço, na realidade, esses lançamentos têm de entregar valor percebido, autenticidade e qualidade dentro de seu escopo. Além disso, ele acredita que uma das melhores formas de equilibrar as contas sem depender do preço cheio é a diversificação de fontes de receita, e podem fazer isso por meio do lançamento de edições digitais com bônus, participação em festivais e até mesmo outros tipos de produto, como colecionáveis, histórias em quadrinho e até trilhas sonoras.

Outra ajuda também pode vir das próprias lojas, plataformas como a Steam se destacam quando o assunto é tornar seus preços mais acessíveis. Além da abundância de promoções, principalmente em datas comemorativas, que podem levar um preço de R$ 200,00 a R$ 40,00, a plataforma criou um sistema de famílias, que permite que um grupo de pessoas compartilhem a mesma biblioteca, podendo jogar jogos que pertencem à conta de terceiros (desde que inseridos na mesma família, cujo limite de pessoas é seis).

 

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Logo da loja digital Steam                                                                           Foto: Divulgação/Steam

 

Para Gabrielle Rodrigues e Gabriel Merino, que participam da mesma família alegam o quão benéfico isso é para eles, ambos afirmam como conseguiram ter mais acesso à jogos que não conseguiriam ter de outra forma, além da possibilidade de repartir os custos com os membros do grupo. Gabrielle afirma que financeiramente a família Steam é algo divino.

 

Movimento nas lojas aumentam conforme as épocas temáticas do ano vão chegando
por
Nathalia de Moura
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24/10/2025 - 12h

Por Nathalia de Moura

 

Entre o vai e vem e o sobe e desce das pessoas, a 25 de Março é o centro das vendas, principalmente em épocas como Carnaval, Natal e Halloween. Cores, brilhos, formas, luzes, ocupam as fachadas das lojas fazendo cada cliente lembrar que as bruxas chegam em 31 de outubro, o Papai Noel dará o ar da graça em 25 de dezembro e o Carnaval em breve tomará conta das ruas do País. 

A correria para atender o cliente que precisa de uma abóbora laranja e gigante, a atenção para cortar o tecido para a roupa do velhinho do Polo Norte ou até mesmo separar as lantejoulas para a confecção da fantasia faz parte do dia a dia das vendedoras do centro de São Paulo. Marlene tem 53 anos e veio atrás dos sonhos na capital paulista aos 16. Hoje fala com muito carinho no orgulho em fazer parte desses momentos. Com um sorriso, mas a voz embargada e os olhos marejados, relembra a dificuldade de se iniciar nesse mundo dos produtos de aviamentos e sazonais. Sempre sonhou em ter o que possui hoje, e mesmo com tantos patrões desacreditando de seu potencial, conseguiu ir atrás daquilo que a motivava: a arte do artesanato.

Os produtos chegam na loja e dali, são transformados em grandes realizações. Ela conta que nada é mais gratificante do que poder ajudar alguém que nem sabia o que estava procurando e encontra ali no seu estabelecimento. Na correria dos dias, as horas passam, a agitação aumenta, o fluxo cresce. Cada cliente fica um tempo observando aquele ambiente repleto de oportunidades. Oportunidade de fazer algo diferente do ano anterior, a chance de colocar uma cor diferente na decoração, de enfeitar a casa com pisca-pisca ou até fazer a festa temática do dia das bruxas que não aconteceu antes.

Na salinha apertada, rodeada de papelada importante e também do quadro estampando a foto da sua família, Marlene contava que proporcionar produtos de qualidade aos clientes a transforma. Pode ser que o Papai Noel não seja vendido hoje, que a abóbora gigante ainda passe despercebida ou o letreiro de “Feliz Natal” não seja usado, mas ela segue acreditando que cada fio, botão ou glitter pode ser utilizado em outros momentos justamente para não ser desperdiçado.

Ao andar pelas lojas, percebemos os olhares atentos nas promoções, o barulho dos comentários ao ver uma peça exposta ou as perguntas em relação aos preços. Para lá ou para cá, a multidão toma conta dos ambientes. Mesmo antes dos dias de comemoração, as pessoas fazem questão de irem em busca do que procuram o quanto antes. Mas sempre tem os que preferem comprar aos 45 minutos do segundo tempo. Na pressa para conseguir atender todos os clientes, Elen, funcionária que enfrenta todas as épocas corridas de venda do ano, fala que em alguns momentos, não consegue dar a atenção que as pessoas merecem. Seu olhar acompanhava a chegada e a saída dos clientes na loja. A atenção é máxima em um lugar que a exige a todo tempo.

No meio das linhas, botões e tecidos, a cearense de sotaque presente e forte expressa que nem imagina as diversas possibilidades que podem sair dali na sacola de cada pessoa. Uma linha pode se tornar mais de uma peça no Carnaval do Sambódromo do Anhembi ou nos bloquinhos pela cidade. E quando ela pensa nisso, os olhos até brilham em saber que, de alguma forma, fez parte daquilo.

A oferta e a demanda não param, assim como a agitação que só o ambiente da mais conhecida rua de comércio paulistana é capaz de proporcionar. Pelas ruas da 25 de março andam jovens, idosos, mulheres e homens carregando pequenas sacolas ou grandes volumes de mercadorias. De um lado o consumidor, do outro o vendedor. Ambos sabem que precisam um do outro, principalmente nessas épocas agitadas do comércio. Para Marlene, inspirar pessoas com seu empreendimento é motivo de orgulho. Em meio aos elogios que sua loja recebe, ela sempre sai com o sentimento de missão cumprida ao ver seus clientes com as sacolas recheadas de produtos que farão a diferença em épocas que se tornam especiais nas particularidades de cada um.

Lugares que focavam em atividades de lazer e contemplação da natureza estão sendo transformados em shoppings a céu aberto
por
Victória da Silva
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31/10/2025 - 12h

Por Victória da Silva

 

Na Zona Sul da capital paulista, o Parque Ibirapuera é bastante frequentado por pessoas que não se restringem a residentes da cidade. Miriam Santos, sorridente e carismática, frequenta regularmente o local em períodos de descanso e, acompanhada por Andre Bressa, sente as mudanças causadas pela iniciativa privada que invade o espaço público e o torna um tanto quanto diferente do habitual. Miriam trabalhou durante 48 anos na mesma empresa e agora, aposentada, encontra no parque um refúgio no meio da selva de pedra, diz que o lugar já não é mais para todos os tipos de pessoas. Atualmente, com a grande quantidade de carrinhos de sorvetes sofisticados e o aumento do preço de lanches, ela mostra a mochila que Andre carrega com bolsas térmicas cheias de garrafas de água e alimentos para quando necessário. Bressa, que é pintor e trabalha em feiras livres, demonstra certa curiosidade sobre a quantidade de propagandas e publicidades que estão sendo distribuídas por todo o parque após a concessão. Ele atenta para um anúncio da tinta Suvinil, algo nunca visto antes em anos de visita ao local.

O Parque Ibirapuera não foi privatizado, já que sua propriedade continua sendo do município, mas foi concedido à iniciativa privada em 2020 para a concessionária Urbia, que vai comandá-lo durante os próximos 30 anos. Não só o Ibirapuera, mas os parques Villa-Lobos e Cândido Portinari também estão sob concessão, lidando com as mudanças. Há também projetos de concessão para outras regiões, principalmente na Zona Leste, no Parque Ecológico do Tietê, Parque Vila Jacuí e Parque Maria Cristina Hellmeister de Abreu.

No Parque da Água Branca, localizado em Perdizes, Andre relembra o episódio em que a concessionária, Reserva Novos Parques Urbanos S.A, instalou um showroom de carros da Peugeot que foi desmontado após ser considerado ilegal e gerar vários protestos. O pintor destaca como os espaços estão sendo utilizados para promover eventos de nichos mais elitizados e o quão evidente isso se tornou após o controle da e empresas. Além disso, ele observa que as lojas e restaurantes distribuídos, além dos eventos, shows e festivais realizados são majoritariamente frequentados por pessoas brancas, repercutindo uma desigualdade racial dentro dos parques que anteriormente não eram exclusivos de determinada raça ou classe.

Outros visitantes como Beatriz e sua mãe Alessandra, que costumam andar de bicicleta pela pista do local, se depararam com o alto preço de produtos simples, como a água. A garota relata que o preço da garrafa é o que mais a incomoda e sua mãe complementa contando que todos os produtos ficaram caros, incluindo os alugueis das bicicletas em que 1 hora com o veículo custa 18 reais.

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Concedido à iniciativa privada em outubro de 2020, Ibirapuera enfrenta alta no preço de produtos e instalação de unidades comerciais. Foto: Victória da Silva

Em maio deste ano, o Ministério Público de São Paulo abriu um inquérito para investigar a Prefeitura e a concessionária Urbia por uso e segregação de espaços públicos para fins particulares. Na época, o promotor Silvio Marques manifestou sua indignação contando que a empresa estava transformando o Ibirapuera em um “verdadeiro shopping center”. Também segundo o inquérito do MP, a Urbia promove um "loteamento" com a instalação de lojas, construção de grandes edifícios, comércio de bens e serviços e o uso remunerado de diversos espaços, com redução do espaço livre para uso gratuito da população. A investigação revela a crescente tensão entre o discurso de modernização via parcerias público-privadas.

Os radialistas, Viviane e Everton, que semanalmente vão ao parque para praticar exercícios e corrida, relembram a instalação da Casa Centauro que foi retirada após as muitas denúncias. Diferentemente, o casal não vê problemas nas mudanças que a concessionária promove e afirma que não sentiu tantas diferenças. No entanto, o mau planejamento dos serviços é um fator levantado pelos dois. Ele afirma que os espaços livres estão sempre lotados, dividindo-se entre pessoas que vão para passear e outras que praticam algum esporte. Apesar de admirada com a quantidade de novos serviços e possibilidades dentro do parque, a mulher faz uma dura crítica à falta de segurança, já que, para ela, a concessionária deveria investir em questões como essa.

Para além dos fatores levantados, taxas para corredores e para assessorias esportivas também são alvos de revolta. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) autorizou, em julho deste ano, a aplicação de tarifas pensando no uso do espaço do parque para atividades esportivas. Mais do que discutir contratos e taxas, está em jogo o compromisso de preservar os espaços públicos como lugares de encontro, lazer e diversidade, e não como territórios delimitados pelo poder de consumo. A garantia que espaços públicos não se convertam em mercados restritos permanece aos órgãos municipais e a população que frequenta os ambientes precisa lidar com a frequente disputa que acontece desde 2024.

Gratuidade do transporte público no Brasil é possível, e joga luz nos gastos das famílias com a locomoção e exclusão social
por
Vítor Nhoatto
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24/10/2025 - 12h

Por Vítor Nhoatto

 

É de manhã, por volta das sete, e o começo do dia para milhões de brasileiros em um ponto lotado. As dezenas de pessoas tentando se colocar fora do sol escaldante da cidade, com rostos franzidos e olhos apertados toda vez que um ônibus passa, torcendo para que seja o seu. E decepcionadamente dispostos, pagam por algo que deveria ser universal, e poderia, mas é na verdade um peso desproporcional e impede o acesso a outros direitos.

Mas nos últimos meses uma luz no fim do túnel, ou melhor, um letreiro iluminado no ônibus com o destino desejado voltou a ser discutido. A chamada Tarifa Zero do transporte público no País está em análise pelo Governo Federal, e o presidente Lula solicitou estudos para a viabilidade do projeto, que envolve questões políticas e relativa falta de esperança pelo povo.

O público no meio da avenida é desse jeito, já apático diante do barulho do motor diesel e dos corpos todos em contato na condução do dia a dia. Para Josefa Sueli, só Sueli pede ela, e cerca de 10 milhões de pessoas só na capital paulista segundo a SPTrans, é exatamente nesse cenário que o ir e vir acontece. Trabalhadora doméstica há mais de 30 anos e pernambucana arretada, conta que pelo menos quatro vezes por semana desembolsa R$5,80 no ônibus da EMTU azul e vermelho até a estação em Osasco ou a Lapa aqui na capital, e mais R$5,20 no trem ou R$5,00 no ônibus agora da SPTrans. Fato é que como milhões de outros brasileiros, o gasto só na ida passa dos dez reais, e o tempo nessa brincadeira urbana não é menor que duas horas. 

Pessoas com mochila nas costas que atrapalham a passagem, condução que não chega no intervalo que era para chegar. Olhos nervosos mirando o relógio na tela do celular que seguram com uma mão, enquanto a outra suada se segura nas próprias pessoas ao redor… não há espaço para encontrar as barras de suporte. E lá se foram as duas horas. Sueli chega então na casa do dia perto das nove da manhã, e com R$11 a menos na conta. Entre vassouradas e esfregadas, continua comentando sobre episódios que só o transporte coletivo pode proporcionar. Mas depois de uma janela que não pôde abrir, uma encarada de lá e um empurrão de cá, a constatação que mesmo assim ainda gasta um absurdo só para chegar até os lugares, em vida e dinheiro.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), o gasto com transporte das famílias só não é maior que habitação e alimentação, sugando até 20% do salário por mês. No caso da Sueli, que perde a mesma quantia na volta, lá se foram pelo menos R$350 no mês, só indo e vindo do trabalho quatro dias na semana.

Recentemente tendo passado por uma suspeita de câncer de intestino, ela conta feliz que não tem a doença, e todo final de semana sai para comemorar a vida. Às vezes com o filho, que mora na zona leste de São Paulo, há mais de duas horas de distância, outras com a irmã e com as amigas em algum bar, se ela não conseguiu um ingresso para um show de algum cantor sertanejo que tanto gosta.  E tudo isso ela faz de ônibus e metrô na maioria das vezes, salva as pouquíssimas vezes que sobra algo para o Uber, mas enfim, também meio de locomoção. Fazendo então seus “passeios” obrigatórios no transporte ultrapassarem o gasto de 400 reais. 

Não precisava nem ser totalmente de graça aos olhos dela, que já viveram muitas histórias, e suas mãos calejadas que agarram as barras no ônibus e metrô tanto quanto o esfregão. Ela suspira enquanto levanta o seu óculos e indaga que algumas patroas ajudam com a condução, mas é um dinheiro que podia gastar com tantas outras coisas. 

Comprar um saco de arroz e feijão a mais, uma guloseima para a companheira de quatro patas, Bela, uma ida na Villa Country ou no Centro de Tradições Nordestinas (CTN). Uma quantia que faria a economia girar. Segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV), nas cidades com gratuidade universal, o número de empregos aumentou 3,2% e o de empresas 7,5%, sem falar da redução em 4,2% das emissões de poluentes pela diminuição de carros. 

Mas ela ainda se lembra da parte da sua família que vive em Pernambuco e dos conhecidos de lá. Cada real a mais faz a diferença para quem não tem o que ela tem. Um litro de leite, uma ida no posto que não pode fazer por causa da passagem, destaca.

Uma realidade para milhões de brasileiros que têm os seus direitos básicos negados também pelo transporte, um outro direito que consta na Constituição de 1988. O artigo 5º prevê direito à livre locomoção, e o artigo 6º o direito ao transporte, mas que são segregados e traduzidos como ferramenta de desigualdade social na prática.

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Transporte público é o meio de acessar os outros direitos além de simples meio de locomoção  - Foto: Vítor Nhoatto

De olhos na cidade

De volta ao ônibus, agora à tarde, mesmo que de pé ou sentado, é engraçado ver a vida passando pela janela. Os olhos dos CLTs, dos estudantes, dos trabalhadores informais como a Sueli olham para a cidade lotada de trânsito… quando não estão cochilando de cansaço com a cabeça encostada tremendo no vidro. Sobre essa questão, o mestre em economia pela universidade de São Paulo (USP), e mais que isso, militante da área, Antônio Carlos de Moraes destaca como isso é enorme e importante. Não se trata apenas de algo eleitoreiro e de apelo popular, destaca ele, mas algo que realmente muda a vida das pessoas. 

O modelo atual do transporte se baseia no ganho por passageiro, então quanto mais cheia for a linha, quanto mais empurrões e reclamações a Sueli tiver para contar na ida e vinda do trabalho, dentista, mercado, médico, bar, mais rentável ela se torna. Nisso tudo o número de carros aumenta para quem pode, tal qual o de acidentes, congestionamento e poluição, além das pessoas que deixam de acessar lugares pelo preço cada vez mais alto das tarifas. 

Com um sistema público nacional de transporte coletivo a história seria muito diferente, como enfatiza Antonio, lembrando de suas vivências e não de números que só interessam a economistas. Ele destaca que todos arcam com os prejuízos da troca do ônibus pelo carro, mas são os mais pobres que pagam o preço na pele, com cada vez menos para gastos básicos como alimentação, e abrindo mão de ir e vir compulsoriamente pelo orçamento que não fecha. 

Falando em sistema, tramita na Câmara o Marco Legal do Transporte Público, que visa estabelecer diretrizes nacionais sobre a contratação de empresas, regras, fiscalização e fontes de financiamento. Isso pode aumentar ainda mais a quantidade de cidades que adotam a Tarifa Zero de algum jeito, hoje o Brasil é o país com o maior número do mundo, com 170 municípios. E mais que isso, ele pressiona e possibilita a reparação histórica que seria um Sistema Único de Saúde (SUS) do transporte público. Poder ir e vir seria garantido, mais pessoas iriam à escola, ao médico, ao museu, ao mercado… e prefeririam o coletivo ao individual. 

Porém, quem iria então pagar a conta? Essa é a principal pergunta de Roseli Rodrigues, passageira de ônibus não por opção. Com um semblante preocupado, atrasada para o trabalho na Avenida Doutor Arnaldo enquanto espera no ponto da Rua Guaicurus, reclama do preço da gratuidade lembrando que de domingo, quando é de graça, o ônibus nunca chega.  Passando a mão pelo rosto em sinal de aflição e cinco reais no bolso ardendo para sair dali quando o número certo aparecer no letreiro no horizonte, destaca que é contra a gratuidade se a qualidade piorar. 

Mas em seguida, lembra que seria ótimo poder ir ao mercado com 200 reais a mais, valor que gasta em média por mês, já que prefere não ter 6% descontado do seu salário com Vale-Transporte (VT). Nos domingos, Roseli destaca ainda, que sempre que pode opta pelo carro de aplicativo devido a demora do ônibus e a lotação do metrô. 

Em exclusividade à CNN Brasil, segundo o presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Vander Costa, o custo anual da gratuidade universal de ônibus, trem e metrô custaria R$90 bilhões. Quantia, no entanto, que como destaca Antonio, pode se tornar realidade sem colocar as contas públicas em risco. Ele destaca que a solução não é tirar de outras áreas essenciais nem criar impostos novos para o povo, mas sim, por exemplo, tributar super ricos. Uma decisão política que precisa ser bancada além de calculada para dar certo. 

No caso das empresas, ele lembra como elas se beneficiam diretamente das obras de infraestrutura voltadas ao transporte, apontando para os prédios em construção ao redor com destaque para o outdoor que grita “more perto da futura linha-6 laranja do metrô”. É mais que justo que elas contribuam para o transporte, portanto, sem falar da diminuição do trânsito e melhora no rendimento dos funcionários, defende.  Além disso, o ônibus que não chega aos domingos para levar Roseli, ou a lotação de todo dia que pega na Guaicurus, e que faz jus a esse apelido, deixaria de ser o modelo de negócios praticado. Com a criação de regras e diretrizes tal qual o Marco Legal propõe, e a Frente Parlamentar - Tarifa Zero, as empresas em acordo iriam receber verba independente da quantidade de passageiros pagantes. Assim, não sendo benéficas economicamente a superlotação e qualidade ruim.

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Os públicos no ônibus são diversos, mas a necessidade de se locomover é universal - Foto: Vítor Nhoatto

E agora já está quase escuro lá no céu, e o fluxo de volta para casa começou. A fila no ponto de Roseli está dando a volta no quarteirão, tão longa quanto essa discussão. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a pasta quer apresentar os estudos de viabilidade ainda em 2025, mas os embates políticos e ideológicos são tão intensos quanto os pisões e esbarradas no corredor cansado do transporte coletivo. 

Avisos dizem, “cuidado degrau” no ônibus, e “atenção com o vão” nos trilhos, mas o verdadeiro foco deve ser nas ações políticas das próximas estações dessa história. Inegável programa de redistribuição de renda, esses 90 bilhões são um investimento e devolução de direitos a milhões de brasileiros, desde que passem a ser vistos assim. Mas enfim, até lá a vida não para, e agora tenho que ir que esse é o meu ônibus. 

Felipe trabalha como motorista de aplicativo e não paga INSS, mas diz que passará a contribuir no futuro
por
Mayara Pereira
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31/10/2025 - 12h

Por Mayara Pereira

 

Felipe Silva é um motorista de aplicativo há 4 anos. Ele conta que após perder o emprego de repositor em um pequeno mercado perto de onde morava, teve que buscar alternativas para sustentar ele e a família, já que é o provedor da casa. Tentou procurar emprego em outros setores, mas sem sucesso. Com suas tentativas frustradas, resolveu virar motorista de aplicativo. Quando começou não tinha um carro que era aceito para fazer as viagens, então com o dinheiro que conseguiu depois de ser demitido, deu de entrada, junto com o seu carro e comprou um melhor para conseguir rodar. Hoje a única fonte de renda de Felipe são as corridas. Ele passa cerca de 10 horas por dia trabalhando, durante 6 dias da semana e as vezes até 7. Mesmo sem os direitos trabalhistas básicos ele diz que gosta de ser “livre” e não ter patrão. Felipe não paga INSS, mas diz que passará a pagar futuramente e segundo ele, possuí uma poupança para custear gastos futuros dele e de sua família.

Os números da economia informal no Brasil são indicadores complicados no mercado de trabalho. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que no primeiro trimestre de 2025 perto de 32 milhões de brasileiros estão trabalhando informalmente. Quase um terço de trabalhadores operam sem carteira assinada, nem CNPJ, muito menos acesso a direitos básicos. No Norte e Nordeste essa taxa supera os 50%, levantando desigualdades históricas e estruturais no país. Motoristas de aplicativo e motoboys surgem como os maiores exemplos de uma informalidade, influenciada por discursos morais e “flexibilidade”, mas na prática percebemos a precarização desses trabalhadores.  

As plataformas digitais mudaram a maneira de trabalhar e gerar renda. O IBGE calculou que, em 2022, cerca de 2 milhões de brasileiros usavam apps para trabalhar e representam 77% autônomos. A maioria atua em serviços de entrega ou transporte, com jornadas extensas, muitas vezes ultrapassando 10 horas de trabalho por dia. Motoboys e entregadores, por exemplo, trabalham em média mais de 45 horas semanais, conforme o instituto, quase cinco horas a mais que trabalhadores de funções similares fora das plataformas. O Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) mostra que mais de 55% destes trabalhadores estão completamente na informalidade, sem nenhum tipo de contribuição para a previdência ou segurança social. 

A ausência de um vínculo formal mostra um dilema presente no mercado de trabalho atual, a autonomia e liberdade prometida se juntam com a instabilidade e falta de direitos. Muitos motoristas e entregadores, dizem gostar desse sistema, já que podem definir horários e ganhos. Apesar disso, essa independência, traz consigo muitos perigos que não são assumidos pelas empresas. Custos com gasolina, consertos do veículo, comida e equipamentos de segurança, são todos por conta do trabalhador. Caso fiquem doentes ou se acidentem, não têm direito a auxílio-doença, FGTS ou seguro-desemprego. A contribuição para o INSS, quando rola, acontece de forma voluntária e as vezes, o que dificulta o acesso a aposentadorias e benefícios. A maioria dessas pessoas simplesmente não contribuem, seja por não saber como, por ter dificuldade em pagar, ou por causa da renda irregular.  

Essa situação mostra que, por um lado, a economia informal é considerada como um motor que mantém o País indo para frente. Por exemplo, na pandemia, os entregadores e motoristas de aplicativo foram muito importantes para garantir os serviços básicos, como a entrega de comida e remédios, quando quase tudo parou, e, por outro, mesmo sendo vistos como essenciais, esses trabalhadores continuam marginalizados pelo Estado e pela sociedade. Existe uma mistura de admiração e estigma: eles são vistos como guerreiros que "não param", mas também como profissionais que fazem "bicos", sem estabilidade ou um futuro garantido. O efeito da informalidade na economia é incerto. Ela absorve milhões de pessoas que, de certa forma, estariam sem emprego, aliviando os números de desocupação e assegurando uma pequena circulação de dinheiro. 

Em áreas remotas e cidades pequenas, o trabalho sem registro é o pilar do comércio e dos serviços locais. No entanto, essa situação traz um preço elevado, diminuindo a receita fiscal e fragilizando a Previdência Social. Esses trabalhadores sofrem mais com as crises, imprevistos e enfermidades, sobrecarregando os sistemas públicos de saúde e ajudas sociais. Além disso, a produtividade é reduzida, visto que a instabilidade financeira dificulta planos. Em 2024, o IBGE apontou que mais de 25% dos trabalhadores do setor privado não possuíam carteira assinada. O Dieese revelou também que os salários de motoboys e entregadores de aplicativos são, em média, 40% abaixo dos de quem trabalha formalmente em funções parecidas. Esses números evidenciam que, mesmo com a tendência nova economia e da "liberdade de empreender", a verdade é que acontece um maior esgotamento desses trabalhadores.  

A ausência de uma regulamentação correta para os trabalhadores de aplicativo é um dos maiores problemas. Em 2024, o governo começou algumas propostas para fazer uma lei, para dar direitos mínimos, como a previdência social e seguro contra acidentes. O projeto pensava em colocar as plataformas para colaborar pagando uma parte do INSS, pelo tempo de trabalho que o sujeito presta serviços a essas empresas. Mas o projeto encontra dificuldades pois as empresas terão menos lucro e vendem a ideia da perda de liberdade. Fora a lei, alguns especialistas falam em criar políticas públicas para ajudar na previdência e dar cursos de capacitação de forma gratuita.  

Simplificar o processo de contribuição ao INSS, ajustar a renda variável e irregular dos trabalhadores autônomos, seria um passo importante para esse problema. Oferecer linhas de crédito acessíveis, juntamente com seguros específicos para motoboys e motoristas, poderia diminuir custos operacionais e reduzir o risco de dívidas. Também é importante investir em infraestrutura urbana, locais de apoio e políticas de saúde ocupacional. Tais medidas poderiam ajudar na redução de acidentes e no melhoramento das condições de trabalho, sobretudo nas grandes metrópoles. 

O entregador de aplicativo, o motorista do Uber, e o vendedor ambulante, são parte significativa da economia brasileira. Eles impulsionam e estimulam o consumo, e sustentam inúmeras famílias. Reconhecer estes profissionais significa admitir que o Brasil de verdade é construído, em grande parte, por gente que vive na informalidade. 

Dessa forma, a economia vai muito além de simples dados estatísticos, é o pilar da subsistência de milhões de brasileiros. Ela expõe as diferenças de uma país em ascensão, que não garante condições decentes para todos. Sem políticas estruturais que envolvam esses trabalhadores sobre os direitos sociais, o País continuará preso em um ciclo de desigualdade e precarização. Formalizar, é bem mais que só um contrato, é garantir que o trabalho, em qualquer área, seja sinônimo de dignidade. 

Isolamento social prejudica muitas áreas da economia, mas mercado erótico caminha na contramão
por
Paula Paolini Remondini
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30/06/2020 - 12h

A busca por alternativas de lazer no meio da pandemia cresce cada vez mais. As pessoas que estão passando por esse momento sozinhas acabam procurando o prazer. Mas isso não se restringe apenas aos solteiros. Muitos casais em confinamento têm recorrido a artifícios externos para apimentar a relação. 

O mercado erótico vem apresentando forte crescimento desde que o isolamento social começou. Conhecer-se melhor ou se aproximar ainda mais do parceiro são alguns dos impulsos que têm permitido às empresas do setor colher bons resultados neste momento de crise. 

Na primeira quinzena de maio, a ex-BBB Marcela Mc Gowan, especialista em saúde feminina, ginecologista e obstetra, postou em seu instagram (@marcelamcgowan) uma apresentação de produtos clássicos e novos de um dos sex shops mais famosos do Brasil, a Exclusiva Sexshop (@exclusivasex_oficial), que obteve mais de dois milhões de visualizações. Além da promoção das mercadorias, muitas lojas utilizam as redes sociais para tirar dúvidas, curiosidades e até divertir os clientes com postagens organizadas e interessantes.  

A Agemt conversou com Andrei Marsiglia, proprietário do sex shop Doce Sensualidade (@doce_sensualidade) e também terapeuta sexual, sobre como funciona sua loja e como ela está lidando com esse fenômeno na quarentena. 

“Aqui percorremos um caminho que começa desde a parte da autoestima, onde há os sabonetes íntimos, desodorantes, perfumes, coletores menstruais e cremes hidrantes e até parte de suplementação alimentar, chegando na parte de pompoarismo, muito importante para a saúde da mulher.” 

Andrei também possui em sua loja uma sala especial para conversar com os clientes sobre suas inseguranças, dúvidas e curiosidades relacionadas ao sexo. Mesmo durante o isolamento social, seus atendimentos continuam pela internet, onde consegue ajudar seu público, majoritariamente feminino.

“Conversando, vou descobrindo o que o cliente precisa. Depois da primeira parte, vem a segunda fase, que é a lubrificação e vários tipos de excitantes, para finalmente chegarmos nos brinquedos, onde trabalha-se a desconstrução desse tabu que envolve o sexo”, completa Andrei, acrescentando que, além dos brinquedos e outros produtos, a loja conta com lingeries e fantasias. 

“Estou vendendo mais pelo WhatsApp e Instagram, onde os pedidos aumentaram bastante. Pelo e-commerce houve uma movimentada, mas ainda é menor quando comparado às redes sociais. Apesar desse aumento das vendas pela internet, meu forte continua em loja física”, afirma Andrei.  

O empresário conta que muitas vezes ele mesmo vai entregar os pedidos para os clientes, que preferem um atendimento mais rápido, e sempre fica atento aos cuidados de higiene, utilizando máscara, álcool em gel e o devido distanciamento. Há ainda a opção de retirar o produto na loja, onde o pedido é feito previamente pela internet e fica pronto para o cliente buscar. 

O produto mais procurado, segundo o terapeuta, são os vibradores. Uma pesquisa da CBN confirma esse fato, mostrando que houve um aumento de 50% nas vendas de vibradores no país. “Também há uma grande procura pelo satisfyer, um novo produto que está fazendo sucesso entre as mulheres. Ele promete um orgasmo em cinco minutos e ando vendendo bastante dele.” 

“No isolamento, devido a tantos acontecimentos, as pessoas tendem a pensar em muitas coisas, incluindo o prazer. Quem está sozinho procura cada vez mais essa alternativa dos produtos eróticos”, finaliza Andrei. 

A pesquisa da CBN também mostra que a maioria dos consumidores de vibradores é composta por mulheres de 25 a 35 anos que estão em um relacionamento. Roberta Nascimento conta que foi motivada por querer inovar na hora das relações com seu parceiro e sempre gostou de consumir em sex shops, mesmo quando era solteira. “O uso na quarentena aumentou e comprei alguns produtos como plugs, gel e estimulantes de libido, que acho bem interessantes." Roberta conta que também prefere que a entrega seja discreta, até mesmo escondendo o nome da loja no pacote, embora more apenas com seu companheiro. 

Já Catherine Sekine não se importa com um modo reservado de receber sua compra. “Como moro em prédio e tem uma boa rotatividade de porteiros, não me importo muito como vem a encomenda. Se for discreto melhor, mas se possuir o logo da loja ou alguma indicação do que é o produto não tenho problema com isso.”

Catherine expressa que os preços atrativos e diversas promoções dos sites que já consumia antes incentivaram ainda mais suas compras de produtos eróticos durante o isolamento social. “O gel, o kit algema e o vibrador que comprei na loja Aline Lingerie (@alinelingerie) chegaram bem rápido e todo o processo foi bem simples. Eu e meu companheiro indicamos totalmente os produtos e tudo foi bem satisfatório.”  

Os solteiros estão curtindo as compras sensuais da mesma forma. Beatriz Lisanti viu que ficaria um longo período em casa e com mais tempo livre, por isso, já que consumia artigos desse setor antes da pandemia, pensou em experimentar novas opções. “Queria uma coisa maior e mais sofisticada do que já tenho, então decidi investir em algo mais caro”, relata. Além disso, Beatriz  procurou se informar sobre os assuntos antes de fazer uma compra, como o pompoarismo, ficando curiosa para tentar. 

De acordo com Lisanti, o sex shop Pentynova (@novapanty) apresenta um site recheado de informações detalhadas de cada produto e que ainda contém vídeos de vários produtos sendo demonstrados em objetos de vidro com água, expondo a intensidade um por um. Além disso, deixa disponível a opinião dos compradores, facilitando para quem quer entender mais do assunto. 

“Como já comprei mais de uma vez nesse lugar, sou muito fã dos produtos e recomendo para quem quiser algo confortável e de qualidade. Inclusive, gosto muito do posicionamento da marca, sendo que vai além de um site de produtos eróticos e abraça todo tipo de público. A página deles tem até alguns contos eróticos para entreter a galera que acessa”, expressa Beatriz.
 

Com feiras e eventos suspensos pelas medidas de isolamento, profissionais usam redes sociais para divulgar e vender seu trabalho
por
Luísa Eller
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29/06/2020 - 12h
artesaos pandemia
Marketing digital se tornou aliada de pequenos empreendedores (Foto:pixabay)

Com o cancelamento de feiras e eventos, decorrente do isolamento social, muitos artesãos estão preocupados em como divulgar e vender seus trabalhos, já que esses locais contribuem para a promoção do artesanato. As vendas de itens não essenciais caíram em vários setores. Um estudo da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) mostra que, no período entre 15 de março e 18 de abril, as perdas mais expressivas se concentraram nos segmentos varejistas especializados na venda de itens não essenciais ( R$ 78,27 bilhões). Com essa retração no comércio, os pequenos artesãos, que em sua maioria são independentes, estão tendo que buscar maneiras de se reinventar. As redes sociais se tornaram uma peça importante para divulgação e venda de seus trabalhos. Os artistas apostam na publicidade online, o chamado marketing digital, e no e-commerce.

Ana Paula Mauricio comercializa bijuterias e acessórios online e já sentiu uma diferença nas vendas. “A demanda diminuiu, em média, 60%. As pessoas estão com medo de gastar com coisas supérfluas, devido à instabilidade do mercado”, afirma. A microempreendedora está apostando ainda mais nas mídias sociais para manter as vendas. Segundo uma pesquisa feita pela Cision, empresa de relações públicas dos Estados Unidos, 84% das pessoas esperam que uma marca produza conteúdo que entretenha e promova experiências. Isso fez com que a empresária investisse na divulgação de peças. “Precisei trabalhar com mais fotos e abusar dos artifícios visuais que agradassem os olhos”, conta.

Além disso, Ana Paula ainda teve que ampliar algumas medidas de descontos, parcelamento e até prorrogar pagamentos para que os clientes continuassem comprando. “Essas medidas, muito provavelmente, serão mantidas após esse período, até o mercado se aquecer novamente”, conclui a empreendedora.

Outro caso é o de Ana Nunes, que trabalha exclusivamente com artesanato. Ela conta que não teve muita queda nas vendas, mas encontrou dificuldades para comprar materiais para produção, com as lojas fechadas na cidade. A artesã busca sempre estar atenta às mudanças que ocorrem no comércio. “No momento estou me reinventando, fazendo cursos, focando no meu cliente-alvo e em estratégias para alcançar meu objetivo”, afirma, acrescentando que uma oportunidade surgida na crise foi a de confeccionar máscaras de proteção, o que proporcionou uma importante ajuda financeira.  

Ana também está focada na publicidade digital e vendas online, um segmento que vem crescendo muito no mercado e dando resultados. “O comércio online é o futuro, hoje não se precisa de uma loja física, a loja online atinge a minha cidade, meu estado, meu país e o mundo”, diz. Segundo dados do IBGE, cerca de 80% dos brasileiros têm acesso à internet e uma pesquisa feita pela agência de marketing Ironpaper concluiu que 93% das decisões de compra são influenciadas pelas mídias sociais. Ou seja, para pequenos empreendedores, estar conectado tem rendido lucros.

No mês de abril, a designer e proprietária da Yankatu, loja de design artesanal, Maria Fernanda Paes de Barros, criou o projeto social online “Artesãos do Brasil”, para dar suporte aos artesãos das áreas mais remotas do país. Para isso,  lançou uma campanha na plataforma de crowdfouning Catarse, onde há pacotes de valores diversos e de diferentes artesãos. O comprador escolhe seu pacote e envia um e-mail dizendo qual artesão gostaria de ajudar. O artista irá produzir sua peça e, assim que a quarentena acabar, colocará no correio para envio. “A Yankatu funcionou apenas como uma facilitadora, uma ponte para que as pessoas pudessem acessar os artesãos”, conta a designer. Segundo ela,  durante esse período, os profissionais tiveram seus trabalhos divulgados em diversos portais.

Barros também aponta que a campanha teve grande visibilidade e resultado por estar em uma plataforma online. “As redes sociais com certeza ajudam muito, principalmente numa crise como a que estamos vivendo, na qual precisamos nos resguardar e o contato social é praticamente zero.” Ela acrescenta que “com certeza a abrangência da campanha foi muito maior graças ao uso do Instagram”.

 

Após queda abrupta da receita, associação prevê corte de 25% no número de trabalhadores
por
Adriane Garotti
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29/06/2020 - 12h

Os adiamentos e cancelamentos de eventos neste ano atingiram em cheio o setor cultural – principalmente as produtoras de shows e festivais. Um exemplo disso foi a postergação da Olimpíada de Tóquio, que estava marcada para acontecer em 2020, mas devido à Covid-19 foi transferida para julho de 2021. Os trabalhadores do setor de eventos também sofrem com a crise econômica gerada por essa paralisação sem previsão de retorno.

Pessoas que trabalham em grandes eventos, como nos setores de limpeza, segurança, carregadores de grades e equipamentos, estão em situação de vulnerabilidade neste período de crise. Sem contar os trabalhadores informais, que muitas vezes tiram sua renda da venda de comidas, bebidas e camisetas na porta dos grandes shows e festivais.

A Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), junto com a Go Live Brasil – um movimento que uniu líderes do setor de eventos com o intuito de apoiar as empresas nesse momento da pandemia –, mostra em suas pesquisas que o setor já gerou 25 milhões de empregos, sendo 5 milhões indiretos e freelancers, que dependem inteiramente da geração de renda pela realização de shows, festivais e congressos. A informalidade sofre com a incerteza da retomada das atividades e, também, com a falta de visibilidade perante as políticas públicas emergenciais para aqueles que não têm os benefícios da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Doreni Caramori Jr, presidente da Abrape, afirma que houve uma significativa redução, que beira 100%, na receita do setor desde o início da paralisação, incluindo a queda na venda de eventos futuros, o que prejudica a gestão de novos negócios. “Isso envolve fluxo de caixa, questões de relacionamento com fornecedores, clientes e, principalmente, as questões de gestão do time da equipe. A tendência é que isso continue impactando bastante até o momento da retomada nesses itens”, diz o empresário. 

Não é apenas para os trabalhadores informais do setor que a crise está tomando grandes dimensões. Segundo o site Celebrity Access, que fornece informações sobre resultados de bilheteria, disponibilidade de artistas e arquivos de notícias, no início de maio, a Live Nation – uma das maiores promotoras de eventos do mundo – anunciou que iria emitir US$ 800 milhões em notas garantidas, apoiadas pelos seus ativos. A arrecadação será para financiar “fins corporativos” e não permitir a estagnação do giro econômico da empresa durante o período da crise.

No Brasil, o setor de eventos tem participação de 12,93% no PIB e um impacto de R$ 936 bilhões na economia, segundo dados da Go Live Brasil. A realização de grandes eventos colabora com a movimentação de outros setores, como turismo, alimentação e empresas terceirizadas.

Pedro Augusto Guimarães, presidente da Apresenta Rio, afirmou em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo que uma única edição do Rock In Rio é capaz de movimentar 30 mil empregos diretos. Normalmente, quando se trata de grandes festivais de música, a movimentação econômica nas cidades-sede fica muito mais intensa, pois o fluxo de pessoas que se deslocam entre estados e até mesmo países é muito grande. Esse fator demanda reservas de hospedagem, compra de passagens e incentiva o turismo local.

 (Reprodução: Go Live Brasil)
 (Reprodução: Go Live Brasil)

 

Inicialmente, quando a discussão era somente sobre a remarcação dos grandes eventos para o segundo semestre deste ano, ainda havia uma esperança de que o setor fosse retornar logo à ativa. Entretanto, quando os grandes festivais de música foram adiados, como o Coachella, na Califórnia, e o Lollapalooza, no Brasil, empresas de entretenimento ao vivo como a T4F foram afetadas em diversos aspectos econômicos e logísticos, como remarcação de datas com artistas e locais para realização dos eventos.

Caramori, da Abrape, afirma estar preocupado com os efeitos da crise no Brasil. “O número de colaboradores diretos do nosso setor chega próximo a 2 milhões. A nossa pesquisa apontou que o percentual passa dos 25% de demissões previstas para a crise, em função disso é uma matemática bastante linear. Você projeta essa demissão prevista nesta mostra – que é 25% – sobre toda a população de trabalhadores no nosso setor e estima que o risco é de 580 mil demissões nessa cadeia produtiva que emprega quase 2 milhões de brasileiros.”

No início de abril, o governo federal publicou uma medida provisória (MP) na qual dispensa os setores de turismo e cultura de reembolsarem seus clientes no período imediato. Também estendeu o prazo para que esse ressarcimento seja feito em até um ano após o fim da pandemia – neste caso, o ajuste será feito de acordo com a inflação do momento. Ainda segundo a MP, as empresas também dispõem de três opções: remarcar os serviços, disponibilizar crédito para o uso ou redução na compra de outros produtos da empresa ou firmar algum outro acordo com o consumidor. 

Marina Emily, 21, tinha ingressos comprados para o show da cantora norte-americana Taylor Swift, que iria trazer sua turnê “Lover Fest” para o Brasil em julho. A apresentação no Allianz Parque foi adiada para o próximo ano, porém as novas datas não foram divulgadas. “Como não foi cancelado, só adiado, isso me tranquilizou. Fiquei bem triste, porém já imaginava que fosse acontecer.” A estudante de Rádio e TV brinca que, mesmo diante da incerteza das novas datas, ela irá arrumar um jeito de encaixar o show na sua agenda. 

O presidente da Abrape indica que os pontos mais incertos do retorno dos eventos são as variáveis ambientais – curva de contágio e mortalidade –, a disponibilidade do produto, que depende inteiramente da oferta do setor, e, por fim, o comportamento do consumidor, se ele vai querer ir a eventos com características tão específicas pós-pandemia. 

Caramori ainda enfatiza que as previsões de retorno são muito incertas. “Acho que é possível termos eventos em 2021 sim, acho até que para alguns perfis de eventos é muito provável, mas lógico que qualquer antecipação nesse momento soa uma previsão amplamente subjetiva.”

 

Imagem da capa: Montagem do Lollapalooza 2017 no autódromo de Interlagos. (Reprodução: internet / VEJA)

Negociações com centrão e aceno a propostas de teor desenvolvimentista podem levar à perda do último pilar eleitoral de Bolsonaro
por
Fabrício Indrigo
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29/06/2020 - 12h
Paulo Guedes

                                                                 Ministro Paulo Guedes em reunião ministerial (Foto: Adriano Macho/Reuters)

A última saída de um ministro do governo Bolsonaro foi a de Abraham Weintraub, que era responsável pela pasta da Educação. Sua saída é mais uma das várias que aconteceram. A primeira foi a de Gustavo  Bebianno, que morreu em março deste ano. Ex-ministro da Secretaria-Geral, ele deixou o cargo em 18 de fevereiro do ano passado. De lá para cá, nove mudanças ocorreram, inclusive a demissão de um dos principais nomes desse governo: Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública).

Somente neste ano, Bolsonaro já passou por três crises ministeriais. Enquanto o Brasil enfrenta a pior crise sanitária e econômica de sua história, o governo insiste em criar ainda mais rixas contra seus adversários políticos. A famigerada “governabilidade” está tão complicada que Bolsonaro, que em campanha afirmava jamais negociar com o sistema, agora se vê sem alternativas e, numa verdadeira ginástica mental, fala que isso nunca foi dito. Essa aproximação com o centrão, que detém diversos nomes ligados aos piores casos de corrupção que esse país já viu e se mostra tão contrário à agenda reformista do Ministério da Economia, promete  balançar o casamento, como o próprio presidente gosta de classificar, entre ele e o último pilar da época de campanha, o ministro Paulo Guedes.

Apesar de os líderes de partidos como DEM, MDB, Podemos, entre outros, elogiarem as tentativas de reforma por parte de Guedes, na prática têm atitudes extremamente opostas. Partidos de centro sempre foram os que mais gastaram o dinheiro do contribuinte, seja com Fundão, com auxílios, ou qualquer outra farra com o dinheiro público que a legislação permita. Um exemplo clássico foi a resistência dos políticos em votar a reforma da Previdência, que só foi possível após a liberação das emendas parlamentares.

A velha política, classificada por Bolsonaro e seus aliados como principal inimigo da nação, de uma hora para outra virou a principal aliada para sua continuidade no poder. Nomes como Roberto Jefferson e Valdemar Costa Neto, que foram indiciados em escândalos de corrupção do Mensalão ainda no governo Lula, são os líderes dessa parte do Legislativo em Brasília. O presidente sabe que a única forma de manter o apoio é a liberação de dinheiro, e isso desagrada muito Guedes.

Mais recentemente foi apresentado pelo general Braga Neto o programa desenvolvimentista Pró-Brasil, sem o aval ou sequer a participação de Paulo Guedes em seu desenvolvimento. Essa atitude caiu como uma luva para os partidos de centro. Isso porque o plano exclui o teto de gasto e seria mais uma forma de conseguir capital público. Cada vez mais Guedes perde força dentro do governo e isso pode atrapalhar muito os planos de Bolsonaro.

O professor de economia da PUC-SP Claudemir Galvani explica que a eventual saída do ministro da Economia desgastaria ainda mais o atual governo, uma vez que Guedes é um dos quadros respeitados deste limitado ministério. Além dele, somente o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, é considerado competente e com currículo para o cargo. Desta forma, Bolsonaro ficaria só com os amigos na sua equipe e somente teria apoio dos 25% de brasileiros classificados por ele como jihadistas.

Além do desgaste com o eleitorado, Bolsonaro perderia popularidade dentro do mercado financeiro. André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton, conta que a saída do ministro colocaria um ponto final na agenda liberal do governo, o que faria os preços dos ativos caírem fortemente, e pioraria ainda mais o ambiente de negócios brasileiro. Ele ainda fala que a curto prazo a economia não seria tão impactada, contudo, em longo prazo a situação seria desafiadora, com uma queda da bolsa bastante importante.

As próximas semanas em território tupiniquim serão intensas. O número de casos de Covid-19 não parece diminuir, o número de desempregados e empresas encerrando atividades só cresce. Enquanto isso, em Brasília, o governo parece mais preocupado com a reeleição em 2022 e o presidente parece não se importar com o povo que o elegeu.

Para Mariana Jansen, professora da PUC-SP, e Rafael Bianchini, da FGV, cenário exige outras prioridades do governo
por
Beatriz Leite
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29/06/2020 - 12h

Diante da pandemia do novo coronavírus, com empregos sendo perdidos, emergências na saúde e necessidade de investimentos em proteção social, o governo federal continua defendendo que o ajuste fiscal é sua principal pauta. O Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre de 2020, período em que o país ainda não tinha sido totalmente afetado pela crise sanitária – já que o isolamento social começou a ser adotado a partir da segunda quinzena de março –, apresentou queda de 1,5% em relação ao trimestre anterior.

Em maio, foi aprovada a chamada “PEC do Orçamento de Guerra”, que dá ao governo mais flexibilidade para gastar recursos no combate à pandemia do novo coronavírus, enquanto o decreto do estado de calamidade pública durar. Mas, de acordo com Rafael Bianchini, doutor em direito comercial e professor da FGV Law, quando acabar a calamidade pública do ponto de vista sanitário, haverá ainda a calamidade pública do ponto de vista econômico: “Eu acho que a calamidade econômica de pessoas sem emprego vai marcar muito mais a economia brasileira do que as mortes da Covid-19”.

            O debate sobre o ajuste fiscal brasileiro é antigo e tem dois principais aspectos: um estrutural e outro conjuntural. O primeiro ocorre devido ao modelo de desenvolvimento industrial adotado pelo país entre as décadas de 1930 e 1970, quando a dívida pública aumentou muito. Já o conjuntural passou a ocorrer a partir de 1980, quando o ritmo de crescimento do país desacelerou. A partir de 1994, com o Plano Real, tornou-se uma das principais pautas do governo.

            Esse plano nunca deixou de ser discutido, mas teve um marco no governo de Michel Temer, quando foi aprovada a Emenda Constitucional 95, que propõe congelar por 20 anos o aumento dos gastos públicos.

O ajuste fiscal é a principal bandeira dos economistas neoliberais, como os que formam a atual equipe do Ministério da Economia, para “consertar” as contas públicas brasileiras. Mariana Jansen, doutora em economia, professora e coordenadora do curso de especialização em economia urbana e gestão pública da PUC-SP, acredita que, se permanecer essa visão restrita em relação à questão fiscal na atual conjuntura, a crise gerada pela pandemia pode acabar se aprofundando.

            Segundo os economistas neoliberais, que defendem o livre mercado, sem interferências do Estado, quando há excesso de gastos por parte do governo e ocorre um déficit fiscal, o Estado tende a aumentar a arrecadação através de impostos para financiar seus gastos. Isso gera um maior custo ao setor produtivo, ampliando o chamado “custo Brasil”. Outro argumento é que o aumento do gasto faz a dívida pública crescer, elevando os indicadores de percepção de risco dos investidores internacionais com relação à economia brasileira, entre eles o risco-país.  

            Porém, Jansen replica dizendo que há outras formas de aumentar a arrecadação pública, que não passam pelo aumento da tributação. Quanto ao risco- país, a relação dívida pública/ PIB não é o único indicador. Ele é um dentre vários outros. Além disso, a professora deixa claro que “grande parte dos recursos [estrangeiros] que entraram na nossa economia não entraram no setor produtivo. Eles entraram no mercado financeiro”.

            Já Bianchini considera que é importante haver um ajuste fiscal estrutural para a adoção de políticas anticíclicas, ou seja, em momentos que seja necessário gastar mais, o Estado possa fazer isso. Outro problema ainda é o alto gasto com pessoal feito pelos estados e a Previdência. O Brasil não é um país rico e nem um país tão velho como aqueles que têm previdência semelhante à nossa, tornando as despesas muito regressivas. O economista lembra também que um Estado cronicamente deficitário se endivida mais por conta dos juros que continuam aumentando. Porém, pondera que, no momento atual, o ajuste fiscal não deve ser o foco: “Mesmo eu, que sou favorável a um ajuste estrutural, considero essa questão secundária na atual conjuntura. Para fazer um ajuste estrutural a gente precisa viver”.

            No início de junho, após muita resistência, o governo aprovou estender por mais tempo o auxílio emergencial, inicialmente de três parcelas de R$ 600. Mas ainda não está definido até quando, qual o valor e se o grupo contemplado pelo benefício será ampliado.

Devido ao enorme crescimento da taxa de desocupação, que no trimestre encerrado em abril chegou a 12,6% da população (sem contar aqueles que tiveram contratos suspensos e redução salarial), uma renda que contemple pelo menos o básico para sobreviver é muito necessária.

Segundo a professora da PUC-SP, a lógica da equipe econômica, que se espalha para diversos setores da população, é que é necessário reabrir o país porque as pessoas precisam de emprego e não de caridade.

O professor da FGV ainda aponta que um ponto crucial para a prorrogação do auxílio é a sobrevivência do próprio governo: “É uma questão que, se os governantes não fizerem isso, eu não tenho dúvida, eles vão cair”.