Com o avanço da pandemia da Covid-19, as compras online aumentaram. O mercado de delivery se tornou uma necessidade com a chegada da pandemia em 2020, estimulando o consumo e influenciando hábitos da população. Segundo o levantamento feito pela Statista – empresa especializada em dados de mercado e consumidores –, estima-se um movimento de US$ 6,3 trilhões no delivery em todo mundo até dezembro.
Dados do setor mostram um salto de 155%, entre março e abril do ano passado, em relação aos usuários de plataformas como Rappi, iFood e Uber Eats, quando o estimado para o período era de 30%. O crescimento de pedidos também acompanhou o crescimento de usuários, atingindo expressivos 975% de aumento.
O levantamento mostra o Brasil como destaque no segmento de delivery na América Latina em 2020. O País foi responsável por quase metade dos números do delivery, com 48,77%, seguido por México e Argentina, com 27,07% e 11,85%.
Reconstrução do Food Service e a mudança no consumo
Com os novos canais de vendas, o conceito de Food Service foi reconstruído e modernizado. A transformação no modo de comprar veio ao encontro com a profissionalização do marketing digital na gastronomia, vista principalmente na construção de plataformas e estratégias de vendas no delivery.
“Comecei a trabalhar com delivery já na pandemia. E praticamente todos os clientes mandaram entregar ao invés de retirar na loja”, diz a empresária Natalia Kobbach, dona da Nati Gentil Brigadeiros – café especializado em bolos e brigadeiros, localizado na cidade de Mirandópolis.
A transformação digital também acelerou tendências criadas entre 2018 e 2019, como take away, quando você retira na loja, e o grab and go, no qual o consumidor vai ao restaurante, escolhe uma refeição que já está pronta, compra e vai embora.
Muitos profissionais tiveram de se reinventar e transformar o isolamento social em oportunidade para seus negócios. Foi assim que a confeiteira Patrícia Rezende, que trabalha com delivery na região da Saúde e do Grande ABC/SP, viu na pandemia uma oportunidade.
“As festas que estavam marcadas foram canceladas e eu comecei a oferecer bolos caseiros, voltei ao meu ponto inicial. Reduzi as grandes festas por pequenos kits. No meio de tanta turbulência, minha cartela de clientes aumentou.”
A aposta por bolos simples, pequenos e mais baratos, assim como doces caseiros e kits especiais, é uma das mudanças adotadas por confeiteiros para manterem seus negócios.
Por outro lado, Kobbach explica que, com o passar do tempo, as pessoas ficaram cada vez mais cansadas de não poder comemorar e começaram a procurar bolos de aniversário, sempre no menor tamanho, para pouquíssimas pessoas.
Ela enfatiza que não desistir do negócio é fundamental, apesar das dificuldades. Não é só saber fazer e nem vender o seu produto, é administrar as contas, o estoque, os funcionários, seu tempo, sua vida pessoal e proporcionar os melhores momentos para o cliente.
Imagem da capa: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil
A jardinagem está se tornando um dos mais novos e promissores setores da agricultura brasileira na pandemia. Plantas e flores estão se tornando cada vez mais um objeto de conforto para as pessoas que se veem presas dentro de casa nesta pandemia. Este novo hobby proporciona uma sensação de conforto e paz para os consumidores, além de deixar suas casas mais bonitas e aconchegantes. Mesmo com a expectativa de baixa no mercado no começo de 2020, o ano ainda fechou com registro de alta para o setor, o que marca um grande interesse do consumidor, e uma boa previsão para os anos seguintes.
Lojistas e produtores vêm surgindo com novas estratégias de venda e distribuição, o que tem sido fundamental para a ascensão desse mercado. Uma das razões para os bons números esperados neste ano. Segundo o Instituto Brasileiro da Floricultura (Ibraflor), essa mudança no perfil do consumidor, agora voltado para a decoração de suas casas, e os novos formatos adotados pelos vendedores, como o delivery e o e-commerce, devem proporcionar um crescimento de 5% no mercado em 2021.
Ainda segundo o Ibraflor, houve um aumento registrado por alguns produtores de até 20% nos negócios. O que acontece é que um crescimento de 5% ainda é pouco considerando os anos anteriores à pandemia. A decaída no setor de festas e eventos fez com que as vendas de flores de corte caíssem consideravelmente, o que deixa os 8.200 produtores da área dependentes majoritariamente da venda de plantas.
Mesmo assim, esse novo interesse pelo plantio e por plantas em geral vem assumindo um papel muito importante na vida do consumidor brasileiro. É o que diz Aline Jorge, dona da loja online Botanismo, criada em 2020, “Nasci na pandemia, mas percebo sim o aumento da procura das pessoas por produtos que possam inspirar mais suas vidas e trazer mais inspiração para o cotidiano, que é um dos objetivos do Botanismo”.
Ela acrescenta que a marca vem crescendo desde o seu nascimento, em setembro de 2020, e que a cada mês a margem de lucro tem aumentado. A loja Botanismo é um e-commerce de objetos inspirados e com temas de plantas e flores, o que explica essa nova atenção do consumidor pelo assunto. Outro meio digital que explora esse interesse são podcasts e blogs botânicos. A PlantaconsCiência, por exemplo, é um blog criado por alunas da Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz (Esalq), que tem como proposta “divulgar ciência para aqueles que não têm acesso direto à academia e também para os próprios cientistas”, segundo matéria no site da Esalq. A própria instituição divulga esse projeto pelo podcast Estação Esalq, que também trata do assunto.
Em entrevista publicada no Jornal da USP, a psicóloga Leila Tardivo explica que “um ambiente agradável é capaz de melhorar o astral” e que “estar num lugar onde se sente bem é superimportante”.
Ao adotar esse hobby, o consumidor brasileiro ajuda no crescimento do setor no Brasil, fazendo com que lojas de plantas tenham uma oportunidade de ficar no mercado durante a pandemia. O que não significa que tais lojas não tiveram que fazer mudanças para se adequar ao ambiente pandêmico.
”Como no começo da pandemia passamos por algumas dificuldades, fechamos a loja física e começamos a fazer o atendimento por Whatsapp, com a entrega dos produtos feita por delivery” conta Caroline Carvalho, responsável pela comunicação e marketing da loja Selvvva. “No começo da pandemia, foi necessário reduzirmos a equipe e a oferta de produtos e plantas. Posteriormente, alinhamos mês a mês conforme as demandas, e fizemos algumas novas contratações. Com relação aos produtos e plantas, em alguns momentos foi necessário diminuir a quantidade, em outros, fomos surpreendidos pela necessidade de aumento”, acrescenta Caroline.
Ainda assim, esse interesse pelo assunto se manteve alto nas pesquisas durante 2020, de acordo com o Google Trends. Apesar da informação acessível, as dúvidas são muitas entre os leigos. O que faz com que as lojas de plantas e artigos botânicos criem ou adicionem em suas contas no Instagram dicas e artigos de como cuidar, cultivar e plantar cada tipo de planta. Exemplos de contas no Instagram que foram criadas somente para estes propósitos são @plants.be e @prof.cactus.e.suculentas, que ajudam o consumidor a entender o mundo do plantio e, em alguns casos, vendem folhetos e artigos informacionais, sendo assim uma fonte de renda para o dono da conta.
A construção do Banco Palmas em 1998, o primeiro banco comunitário do Brasil, surgiu a partir da necessidade dos moradores do Conjunto Palmeiras, localizado na periferia de Fortaleza. Joaquim Melo, fundador do banco, conta que a urbanização do bairro fez com que o custo de vida aumentasse. “Em meados dos anos 90, quando o bairro foi urbanizado, começaram a chegar conta de água, luz, telefone, IPTU, essas taxas todas, e as famílias mais pobres começaram a vender os barracos e ir morar em outras favelas.”
A pergunta “por que nós somos pobres?” foi o fio condutor para compreender o estilo de vida das pessoas. A maioria das respostas foi: pela falta de dinheiro. Por isso, Melo e alguns companheiros do bairro decidiram realizar uma pesquisa sobre o hábito de consumo das famílias. O Mapa da Produção e do Consumo Local apontou que as compras mensais das famílias somavam R$ 1,2 milhão, com cerca de 25 mil moradores na época. “E se viu que a maioria das pessoas ali, por mais pobres economicamente que fossem, já tinha algum dinheiro circulando, o grande problema é que tudo vinha de fora do bairro”, conta Melo.
Após analisarem a situação, surgiu a ideia de criar um banco comunitário para que o capital girasse entre os negócios locais. “Começou como um projeto de desenvolvimento local, mas a ideia sempre foi criar um circuito econômico local onde as pessoas pudessem consumir e produzir aqui mesmo”, explica o fundador.
Um empréstimo inicial de R$ 2 mil da ONG Ceará Periferia deu início ao banco. “E o que a gente tinha era muito simples: um cartão de crédito de papelão que era feito no mimeógrafo. A gente organizou a carteira de crédito e nem tinha computador na época, nem tinha internet, a gente tinha um caderninho para fazer a contabilidade”, lembra. Os empréstimos eram feitos para os moradores, com intuito de incentivar os pequenos negócios do bairro.
Além disso, a criação da moeda “palmas” foi essencial para que a circulação de dinheiro dentro da comunidade fosse efetiva, sistema que perdura até hoje. “A essência do banco comunitário, a sua natureza e seu maior serviço, é fazer esse dinheiro circular localmente. Quando o dinheiro circula localmente gera trabalho, gera renda. Então a moeda social é o coração da atividade do banco”, explica o empreendedor.
A iniciativa se popularizou ao longo dos anos e se estruturou como Instituto Banco Palmas, que também oferece cursos profissionalizantes, oficinas e projetos para a comunidade. O banco passou a apoiar a criação de iniciativas similares em outros municípios do Brasil, formando a Rede Brasileira de Bancos Comunitários. “Cada município com seu próprio banco, mas todos foram criados e acompanhados inicialmente pelo Banco Palmas”, conta Melo. Hoje o banco funciona em todo país por meio da plataforma digital E-dinheiro.
As ações impulsionaram a vida de diversos moradores, reunindo diversas trajetórias de vida junto ao banco. Uma pesquisa da Universidade Federal do Ceará mediu o impacto da iniciativa para os moradores e 90% apontaram melhora na qualidade de vida. “Não é só emprestar o dinheiro, é ajudar as pessoas a se mobilizarem, a se organizarem, a participar da comunidade e criar essa conexão com o bairro, com a vida e com a economia”, diz Melo.
Katiana Oliveira, 38, moradora do Conjunto Palmeiras desde 1989, é um dos exemplos citados pelo fundador. Ela conheceu o Banco Palmas em 2013, quando precisou de um empréstimo para uso pessoal. Nas idas ao banco para pagar as parcelas, ela soube dos cursos oferecidos e se inscreveu para gastronomia e corte e costura.
Após as especializações, Katiana participou da Oficina de Educação Financeira, que a ajudou a conquistar sua independência financeira e emocional. “Eu me apaixonei [pela educação financeira] porque comecei a aprender a administrar o dinheiro”, conta. Hoje, além de ser presidente do Centro de Nutrição e coordenadora do Prato Colorido (que oferece os cursos), ela também é assistente social do Banco Palmas.
"Também participei de uma roda de conversa sobre empoderamento feminino e descobri que sofria violência psicológica e comecei a trabalhar nisso no grupo, me fortalecendo com as minhas colegas”, lembra Katiana. Ela descreve mudanças em todas as áreas de sua vida, tanto em seu ambiente familiar, quanto profissional.
Então, a empreendedora enxergou potencial dentro da comunidade e desenvolveu projetos, oficinas, cursos e rodas de conversa. Como a Cozinha Delas, criada para auxiliar mulheres que passaram pelas mesmas situações que Katiana. O principal intuito é arrecadar dinheiro para as mulheres da comunidade com a venda dos pratos que aprenderam a fazer nas especializações. “Eu não queria sofrer mais nenhum tipo de violência e eu queria que outras mulheres tivessem a oportunidade de superar e criar suas iniciativas e suas ações para sair dessa situação”, conta.
Durante a pandemia, a desigualdade social foi escancarada e acentuou a fome no país. Por isso, Katiana utilizou seus projetos para lançar a campanha “Bucho Cheinho”. Ela explica: “A ideia é que ninguém fique com bucho vazio nessa pandemia. Então a gente lançou essa campanha de arrecadação de alimentos, de doação de dinheiro e cesta básica, [sempre] acompanhando as famílias, fazendo monitoramentos, fazendo visitas”.
Além da alimentação dos brasileiros, o período pandêmico acentuou a crise econômica que o Brasil já enfrentava. A Pesquisa Pulso Empresa, realizada pelo IBGE, mapeia o impacto da Covid-19 nas empresas, realizada em julho de 2020, os negócios representaram mais da metade dos estabelecimentos fechados apenas no primeiro semestre do ano e mais de 716 mil fecharam desde o início da pandemia.
Os bancos comunitários, no entanto, foram em outra direção. Apesar do impacto sobre os pequenos negócios, houve um aumento nas empresas registradas na plataforma E-Dinheiro. “Por outro lado, os bancos comunitários cresceram na pandemia, pelo fato de serem digitais e estarem presentes na periferia. Nós recebemos muitas doações, tanto do poder público, da prefeitura, como do empresariado”, comenta Joaquim Melo.
A Rede Brasileira de Bancos Comunitários, em conjunto com os líderes locais, criou contas digitais para os moradores. Com doações de R$ 100 a R$ 200, eles puderam comprar do comércio do próprio bairro, “salvando a vida das pessoas porque tinham o que comer e salvando também as economias locais”, conclui Melo.
Embora a menstruação continue sendo um tabu na sociedade, muitas mulheres têm falado abertamente sobre o assunto e comentado sobre terem trocado os absorventes descartáveis convencionais por utensílios mais sustentáveis durante o período menstrual. Dentre eles, estão os coletores menstruais, calcinhas absorventes, absorventes de pano e outros produtos que produzem menos lixo e podem ser usados a longo prazo.
Em uma pesquisa feita pela Agemt em um grupo do Facebook, a maioria das 26 mulheres que responderam disseram que nunca haviam usado coletor menstrual ou calcinha absorvente, entretanto, também manifestaram que têm vontade de experimentar esses produtos.
Quanto às respostas das mulheres que já usavam coletores ou calcinhas absorventes, grande parte delas disseram que sentiam incômodo físico ou alergia quando utilizavam as opções descartáveis. Elas também afirmaram ter economizado ao adquirir os produtos que duram por um longo tempo e não exigem a aquisição mensal, como os absorventes comuns. Além disso, ao final da pesquisa, cerca de 80% das mulheres disseram crer que os coletores menstruais e calcinhas absorventes vão se tornar uma tendência de consumo pela praticidade e sustentabilidade que oferecem.
Bianca Pavanello, estudante de música do Conservatório de Tatuí, decidiu usar o coletor por motivos parecidos aos das entrevistadas pela pesquisa. Ela tem gostado bastante do produto e percebeu que economizou bastante ao adquiri-lo. “Na minha casa três pessoas menstruam, então eram vários pacotes de absorvente todos os meses. Hoje nós reutilizamos e não nos preocupamos em gastar aquela ‘grana’ alta”, conta ela.
Nathalia Silva, que utiliza o seu Instagram para falar um pouco de tudo, mas principalmente de assuntos que envolvem beleza e saúde, diz que comprou o coletor por ter incômodos e alergias na região íntima. Ela conta que a experiência tem sido positiva. “É meio complicado mesmo para colocar, mas é só uma questão de prática e paciência, pois, assim que você consegue, você sequer sente o coletor. É confortável para todas as atividades, eu danço, vou à piscina, durmo sem calcinha, faço exercícios e ele continua ali, no lugar, sem vazar ou manchar roupas.”
As marcas mais procuradas desses produtos são: a Korui, Pantys, Inciclo, Fleurity e Herself. Em reportagem publicada em março desse ano na revista Exame, a Inciclo diz que conseguiu crescer 156% em 2020, contratou 50 funcionários e abriu 600 novos pontos de revenda. A Korui também afirmou que “houve um aumento significativo nas vendas”, em entrevista realizada para a Agemt. A marca também conta que já tem novos produtos em fase de criação, e, depois de abrir uma loja física em São Paulo, pretende expandir para mais locais.
Mesmo a menstruação deixando de ser um tabu entre as pessoas ao longo dos últimos anos, ainda há muitas que não têm acesso ou condições de comprar absorventes internos ou externos, questão chamada pobreza menstrual. Segundo a ONU Mulheres, das 1,8 bilhão de pessoas que menstruam ao redor do mundo, 12,5% delas têm dificuldades em todos os ciclos para obter produtos menstruais, produtos de higiene geral e até mesmo saneamento básico, banheiros próprios, água tratada e educação adequada para saber lidar com o período. Em torno de 1 bilhão de mulheres não possui acesso a um banheiro seguro e limpo e outras 526 milhões não têm sequer um banheiro em casa.
Apesar disso, a menstruação tem sido pauta para questões ambientais que impulsionam a demanda por produtos como coletores e calcinhas absorventes. O aumento das vendas das marcas que fabricam esses produtos mostra uma divulgação maior desses produtos, não apenas pelas marcas, mas também por quem os utiliza. Nathalia fez uma série de stories em seu Instagram falando sobre sua experiência com o coletor menstrual e recebeu diversos feedbacks de pessoas que compraram o produto. “Recebi inúmeras mensagens de meninas que compraram o coletor ou o disco menstrual ou ficaram interessadas em saber mais, o que é muito bom. A partir daí, senti que o que eu levaria para elas deu muito certo, pois é mais do que influenciar a compra de um produto, é adotar um hábito mais benéfico para nossa saúde íntima e assim se conhecer melhor. Fiquei muito feliz”, diz ela.
Imagem da capa: Ilustração de coletores menstruais| Via: Toda Teen - UOL
Em março de 2020, quando foi declarada a pandemia do novo coronavírus pela OMS, as aglomerações e os eventos sociais foram suspensos. Em meio ao cenário da crise de saúde brasileira, os profissionais da cultura foram duramente prejudicados, com 458 mil postos de trabalho, tanto formais quanto informais, perdidos ao final do ano passado, em comparação com o último trimestre de 2019, segundo informações do Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural.
Antes da pandemia, o segmento cultural, junto com o setor criativo, movimentava cerca de R$ 171,5 bilhões por ano, correspondente a quase 3% da riqueza nacional. A previsão era de que esses segmentos gerassem R$ 43,7 bilhões para o PIB brasileiro até 2021, porem 35% desse valor deixou de ser gerado devido às paralisações causadas pela crise do novo coronavírus, como foi apresentado nos resultados preliminares da pesquisa Percepção dos Impactos da Covid-19 nos Setores Culturais e Criativos do Brasil, divulgados em 29 de abril e feita pela Universidade de São Paulo (USP).
No terceiro trimestre de 2020 que a Lei Aldir Blanc entrou em vigor, prevendo uma renda emergencial de três parcelas de R$ 600 para profissionais da cultura, além de um subsídio mensal de R$ 3 mil a R$10 mil para a manutenção de pequenas empresas, organizações culturais e espaços artísticos que ficaram paralisados.
Também foi disponibilizado um montante de R$ 3 bilhões, repassado pelo governo federal para o pagamento desse auxílio. Porém, segundo o Ministério do Turismo em abril de 2021, 25% desse valor, que corresponde a R$ 773,9 milhões, não foram utilizados nos 120 dias do prazo inicial, permanecendo, assim, nas contas dos Executivos locais.
Esse atraso na utilização da verba destinada aos profissionais da cultura ocorreu devido a irregularidade de diversas regulamentações que deveriam ser feitas por prefeitos e governadores dentro do prazo inicial. Assim, em 21 de abril de 2021, foi aprovado um projeto de lei que reformulou a Lei Aldir Blanc, permitindo aos Estados e Municípios a utilização do saldo remanescente do montante até dia 31 de dezembro.
A prorrogação da lei foi vista como uma vitória por muitos do setor cultural, já que ainda não existe um meio viável para criar ambientes presenciais seguros para muitos segmentos artísticos, e o auxílio permite que muitos profissionais mantenham seus trabalhos.
O ator, pesquisador e estudante Pitágoras Lemos ressalta que a Lei Aldir Blanc foi sancionada em um momento altamente necessário, porém nada é perfeito. “Para muitas pessoas pode parecer só um ‘legal, ganhei 600 reais’, mas nós (artistas) precisamos continuar trabalhando, e pra isso eu preciso apresentar uma peça, uma dança, uma performance. E eu, que faço teatro, sei lidar com o público, mas não sei lidar com edição de imagem, então eu vou ter que contratar alguém que saiba, e aí esses 600 reais já se transformaram em 500, em 400... Isso é o suficiente para uma compra do mês?”
Compartilhando a mesma visão acerca do auxílio, a dançarina, professora e estudante Deborah Lugli também ressalta que continuar trabalhando não precisa significar um trabalho contínuo ou automático, e sim de forma que seja possível e acessível para cada profissional no meio virtual. “É preciso olhar para o todo, e não apenas para o individual. Então, esses coletivos que se juntaram para repensar o setor cultural devem continuar a se fortalecer, é preciso olhar para o todo”, adiciona.
Porém, os impactos no meio cultural vão muito além das questões financeiras e do auxílio emergencial. A vida longe dos palcos físicos e sem a possibilidade de trocar experiências e sensações com o público dificultam muito o trabalho dos artistas, assim como a diminuição das oportunidades no mercado de trabalho e a maneira com que o governo tem tratado as questões referentes ao setor.
“Quando a gente está finalizando a graduação, é um momento complicado, é um momento de caminharmos com as próprias pernas, mas descobrir isso no meio de uma crise sanitária, em um momento que tudo se transformou, é bastante difícil de lidar, porque a cena mudou, e ter estudado a cena presencial e me formar na cena digital nesse período da crise é algo difícil de entender”, aponta Deborah.
Já para Pitágoras, a falta de contato com os espectadores é o principal desafio: “Há a perda da troca, da crítica. O que é apresentar para uma tela? Como é para o público receber isso? Nós não sabemos mais, tudo é mediado pelo computador, não há mais troca física”.
Sem mais a possibilidade de juntar um público, as peças via Zoom, lives no Instagram, exposições virtuais e até ensaios fotográficos via FaceTime explodiram por todo o país, e mesmo entre tantas dificuldades, os artistas ainda veem no cenário digital, uma premissa para o futuro, afirmando que dificilmente haverá o rompimento com o virtual, por já ter se tornado uma camada incorporada à arte, capaz de conectar pessoas de todo o Brasil e do mundo em um único lugar.
Ainda assim, as soluções à distância não são o bastante para manter economicamente os mais de 6 milhões de profissionais que trabalham no segmento cultural, tornando um subsídio do Estado uma necessidade para todo o setor, que deverá ser o último a retomar as atividades presenciais, em razão das medidas sanitárias necessárias para tal acontecimento.
Foto da capa: O ator Luis Carlos Shinoda, fundador do Cangaias Coletivo Teatral. Imagem de divulgação da peça "Na colônia penal", transmitida pelo YouTube.