A chegada da pandemia da Covid-19 estremeceu o mercado editorial. O setor já passava por uma crise desde 2018, quando as gigantes Saraiva e Cultura entraram em recuperação judicial. Ex-líder do mercado de livrarias no Brasil, a Saraiva chegou a ter 112 lojas físicas em 2017, número que caiu para 38 no ano passado.
Diante da adoção das medidas de isolamento social, muitas livrarias se viram impossibilitadas de praticar seu modelo de negócio convencional. A situação acelerou o crescimento do e-commerce do setor, que viu as vendas digitais serem responsáveis por 84% do faturamento das editoras em 2020, enquanto as vendas em lojas físicas caíram 32% em relação ao ano anterior, de acordo com estudo realizado pela Nielsen BookScan em parceria com a Câmara Brasileira do Livro e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel). As vendas totais do setor, por sua vez, sofreram queda de 18,43% em 2020. Já em 2021, houve aumento de 15,4%, atingindo faturamento de R$5,8 bilhões, 12,9% superior ao faturamento de 2020.
Na contramão do fechamento de grandes unidades físicas do setor, livrarias de bairro têm conquistado a atenção de consumidores que valorizam a experiência de compra e desejam contribuir com a preservação de espaços culturais. Luiz Eduardo, advogado de 25 anos, conta que prefere estabelecimentos pequenos a grandes redes por seu aspecto aconchegante e intimista. “O ambiente aqui é gostoso, eu me sinto bem recebido. Eu sei que estou pagando quinze reais mais caro nos livros, mas acho que a ideia é justamente saber que tem um propósito, que é ajudar a manter esses pequenos comércios”, diz.
Presente no bairro da Bela Vista desde 2018, a Livraria Simples conquista quem passa pelo local por seu ambiente acolhedor e pet-friendly. Autointitulado “casinha linda”, o espaço conta com funcionários servindo xícaras de café aos consumidores enquanto sucessos da MPB ecoam pelo estabelecimento. Além de vender livros novos e seminovos, a livraria também promove eventos literários e feiras de troca aos finais de semana.
Lá, é possível conferir um vasto acervo sobre os mais variados temas, além de um espaço dedicado ao público infantil. “Eu gosto de falar que o acervo da Simples foi montado pelos clientes, porque no começo a gente não tinha tantos livros. As pessoas foram dando dicas do que seria legal acrescentar no nosso acervo e construímos ele a partir disso”, conta Beto Ribeiro, fundador da livraria.
O atendimento personalizado é considerado um grande diferencial pelos consumidores. Na Simples, é possível conseguir recomendações sobre temas e autores durante conversas com os funcionários e frequentadores da loja. Entre as bancadas, o consumidor também pode conhecer Toninho Basquiat, o felino e mascote da livraria.
Eliane, professora aposentada de 56 anos, conta que é cliente fiel da loja, frequentando o espaço todos os sábados. “Eles têm um referencial muito grande e o ambiente é muito gostoso. É um lugar que parece que te abraça e você se sente bem de ficar”, complementa.
Para atender os consumidores mesmo com as portas fechadas, Beto conta que criou o e-commerce da livraria logo no início das restrições sanitárias. “A gente se viu carente de uma loja online para continuar trabalhando sem perder o ritmo. A livraria ficou fechada durante oito meses, mas não paramos”, diz. Atualmente, as vendas online representam cerca de 50% da receita do local.

Localizada no bairro de Perdizes há 40 anos, a Livraria Zaccara é um dos maiores exemplos dos benefícios da criação de vínculos com a comunidade. Com presença discreta nas redes sociais, a loja mantém sua base de consumidores através do boca-a-boca de quem passa por lá. “A gente vive essa coisa do dia a dia, das pessoas que são trazidas por algum motivo, não pelas redes”, comenta Lucio Zaccara, dono do estabelecimento.
O livreiro conta ainda sua escolha de sugerir títulos que possam despertar interesse em seus consumidores, em vez de priorizar aqueles que estão em alta. “Uma pessoa vai entrar aqui na livraria e eu vou indicar uma obra que está em todas as revistas? Não, o que a gente indica aqui são coisas em que nós acreditamos. Esse é o nosso trabalho”, completa.
Além da venda de livros, o acervo da loja também inclui obras de artes, discos, vinis e CDs. Segundo Lucio, o espaço é um exemplo de que os meios nos quais a arte se manifesta estão vivos e interligados. O lugar também é palco de apresentações teatrais e musicais. “O mercado editorial é fascinante. Por mim eu ficava aqui 200 anos, mas infelizmente a gente não dura tanto. Nós sempre acreditamos nessa forma de trabalho e é isso que nos move”, finaliza Lucio.
Após cinco anos de negociação e trabalho pesado de lobby, a Eletrobrás abriu seu patrimônio para ser dividido e vendido na Bolsa de Valores, no dia 13 de junho. Os acionários foram rápidos em garantir seus papéis e agora são maioria na composição do Conselho da empresa, que pela primeira vez tem suas decisões concentradas na mão do mercado ao invés do Estado. A medida foi uma das poucas realizações do que o ministro Paulo Guedes prometeu em sua campanha neoliberal. A União ainda tem a “Golden Share”, que lhe permite veto de decisões estratégicas, mas mesmo com essa espécie de proteção, nove representantes públicos que compunham o comitê renunciaram no sábado, 18 de julho. As motivações políticas e todos esses trâmites transacionais embarcam na problemática real do déficit de produção de energia, que causou ameaças de Apagões gerais em neste ano e em 2012 além do consumado Apagão em 2011. Mas a privatização não é a resposta de ouro que resolverá a falta de suprimento, visto que a falta de regularização efetiva e restritiva faz com que os impactos da privatização para a população sejam imprevisíveis, fazendo a venda da maior distribuidora de energia do Brasil - ela carrega em suas costas 1/3 da produção total- especulativa, que nem o mercado onde se encontra.
Ao colocar seus ativos no mercado, a Eletrobrás contava com a mão invisível do mercado para forrar seu caixa. “ O setor público tem dificuldades de fazer investimentos. Vindo de anos de déficit fiscal do governo federal, essa falta de caixa dificulta para uma empresa pública fazer investimentos. Então, teoricamente, a possibilidade de captação no mercado, seja via negociação de ações, ou investimentos de bancos privados e parceiros, seria muito mais fácil, o que permitiria a expansão rápida na produção”, analisa o professor Renan Pieri da Fundação Getúlio Vargas em entrevista concedida para AGEMT. Essa insuficiência da parte elétrica fez com que distribuidoras recorrem a recursos mais caros, como as termelétricas, o que explica em parte a conta de luz ter ficado cada vez mais cara.
Analistas apoiadores dessa privatização também comparam a futura rota da Eletrobrás com a de outras empresas estatais que foram privatizadas na Europa, uma equiparação atrasada em vista do processo de reestatização de empresas que foram abertas para o mercado em meados de 1980 e 1990. Desde a abertura, os serviços caíram de qualidade e pouco custo benefício. Para além disso, se viu lá um problema endêmico do organismo mercadológico, que é a monopolização da produção naqueles que mais lucram. Por ter começado e terminado seu primeiro ciclo de industrialização, a Europa já conta com regulação própria para evitar tal concentração, coisa que não aconteceu nacionalmente antes da privatização de uma das maiores empresas do Brasil. Pieri explica que “lá, já há um histórico de regulação de oligopólios. Nossa experiência vem desde os anos 90, muito recente. É difícil comparar as empresas elétricas daqui com as de lá, mas elas servem de lição: o grande problema das privatizações é aumentar a concentração de mercado e gerar comportamento monopolista não regulamentado. Do jeito que é hoje, é preciso reforçar mais o papel das agências reguladoras, dando liberdade e condições para regular mercado para não cair nessa baixa de competitividade”.
Mesmo que administrada pela camada econômica e política mais alta, os efeitos dessa privatização também se estendem para o cidadão comum. Ainda é incerto se essa medida encarecerá ou barateará a conta de luz doméstica. Em perspectiva histórica, a desestatização da Telefonias barateou o serviço e expandiu o acesso, mas isso não é regra. Quando questionado sobre, o professor da FGV reitera o peso da regularização: “o setor energético é muito concentrado, com poucas empresas […] Se o preço vai subir ou cair depende muito da regulação da Aneel, limitando as ações monopolistas, cobrando preços muito altos”. Devido a venda, a Eletrobrás previu a “descotização” do parque gerador de energia da companhia, o que significa que as hidrelétricas da empresa deixarão de seguir o regime de cotas (com preços regulados, mais baixos) e passarão a seguir as regras do Regime de Produção Independente de Energia, em contratos de concessão de 30 anos. O analista do setor de energia elétrica da Lafis Consultoria, Marcel Carneiro, ressalta em entrevista que “Cabe destacar que a empresa deverá pagar ao longo dos próximos anos uma quantia de mais de R$ 30 bilhões de reais para amortizar os custos nas tarifas do sistema elétrico nacional. Caso não houvesse essa obrigação, seria indiscutível que a privatização levaria a um aumento dos preços, mas com essa compensação, os impactos nas tarifas seriam reduzidos. O objetivo dessas compensações é trazer um impacto nulo para as tarifas”. Essas são as medidas acordadas em primeira instância da venda dos ativos e é provável que o Estado consiga impedir qualquer alteração que faça o povo pagar por essa transição, mas, com a mudança de cadeiras do Conselho, isso pode voltar a ser uma dança de interesses e benefícios.
As implicações políticas são indissociáveis do movimento de mercado causado pela Eletrobrás, por mais que a passagem para o mercado especulativo queira diminuir justamente isso. A possível mudança da presidência para as mãos de Lula, cuja campanha é veementemente contra a desestatização, coloca em dúvida o quanto será desfeito, ou pelo contrário, negociado com empresários e retentores de papéis da Eletrobrás. Apesar da integração no mercado internacional, a privatização de estatais é sempre uma aposta de altos lucros ou altas perdas às custas da soberania nacional. “A opinião pública sobre privatização é cíclica”, conclui Pieri, e influenciada pelo quanto pesa no bolso e à qual nome de chapa pode se colocar o nome.
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Uma "mini reforma tributária" que impõe a unificação da carga tributária em uma só foi adiada novamente no mês de maio. Entretanto nesta quarta-feira (15), a lei complementar 192, de 2022 fixou uma taxa única do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para os combustíveis em todos os estados. Trata-se de uma nova lei que impõe a redução da taxa à zero desconsiderando as modificações no preço impostas pelo mercado. O projeto trata da criação de uma compensação da queda da receita devido a diminuição da taxa cobrada nas operações (alíquota) sobre os produtos e serviços
No fim de março deste ano, foi estabelecido uma alíquota única de ICMS de R$ 1,006 por litro de diesel, gerando a possibilidade perante o projeto de lei, de que cada estado crie um desconto para atingir a alíquota atual. Conforme a avaliação do governo, não houveram mudanças no valor de taxas cobradas pelos governos estaduais. Houve a aprovação de 9 emendas e reprovação de 6. Entre elas há a redução a zero até 31 de dezembro de 2022, de PIS (Programa de Integração Social) /Cofins (Seguridade Social) e do Cide (Captação, Inserção e Desenvolvimento).
A alteração na alíquota surgiu como maneira de recompensar as perdas dos estados e municípios, e a estratégia a ser colocada em prática foi a anulação das alíquotas do ICMS impostas sobre diesel e do gás. E a partir de 2024 as taxas sobre esses serviços obterão um teto, pois não poderão ser maiores do que os das operações em geral.
O gás natural, produtos do meio de comunicação e o transporte coletivo também terão uma alíquota estabelecida por serem bens e serviços essenciais. A lei também propõe um percentual mínimo sob o ICMS a ser alcançado nos setores de educação e saúde, pois nessas áreas este imposto é utilizado como fonte primária de obtenção de recursos para o pagamento das despesas as quais são geradas.
Conforme o texto do projeto de lei haverá a proibição da fixação de taxas para esses bens e serviços superiores às das operações em geral. A alíquota máxima vai ter que ser de 17%, no máximo 18% e o ICMS tem representado este valor em grande parte do território dos estados. É previsto que até o dia 31 de dezembro de 2022 haja a atribuição de um desconto em parcelas de dívidas refinanciadas dos estados devido a perda obtida na arrecadação dos impostos.
O assunto que diz respeito ao incentivo do uso de combustíveis fosseis no caso do diesel e da gasolina, permeiam questões ambientais que tratam dos danos causados ao meio ambiente provenientes dos combustíveis fósseis, como pontuou o especialista do Banco Central Rafael Bianchini, que também é professor da Fundação Getúlio Varga. “Subsidiar combustível fóssil não tem nenhum sentido e ainda pode causar um problema que envolve a possibilidade de um desabastecimento do diesel caso haja uma cobrança de um preço abaixo do internacional por meio da Petrobras”, afirmou Bianchini.
Para o especialista já que o governo colocou um ajuste de preço no ICMS estabelecendo um teto de preços, ele passará a imagem de que em 2022 ele banca um preço menor, porém a partir do ano que vêm não há nenhuma garantia de que ele mantenha essa mesma medida impostas sobre os combustíveis.
No que diz respeito as modificações impostas na distribuição das alíquotas da gasolina e do etanol até o dia 31 de dezembro de 2022, as operações referentes a gasolina e etanol para fins carburantes, terão alíquota zero de cinco tributos, e para a gasolina foi estabelecido um teto de 23% a 34% de ICMS sobre o seu valor real.
Haverá também a redução zero das alíquotas desses tributos para o óleo diesel, biodiesel, gás liquefeito de petróleo, gás derivado de petróleo, gás natural e querosene de aviação. Nos demais produto; etanol, óleo diesel, biodiesel, GLPgás derivado do petróleo, gás natural e querosene de aviação comprados ou importados para fins de utilização como insumo (misturado em outro combustível) seguem regras de produtos secundários
A partir do momento em que houver a publicação no Diário Oficial da União (DOU), o estado que tiver baixado as taxas de operações dos combustíveis, não poderá alterá-las. Os estados que antes da conversão do texto em lei, já possuíam a alíquota do ICMS sobre os produtos e serviços que passaram a ser fixados na ementa, obterão prioridade na contratação de empréstimos em 2022, a qual ainda não foi mencionada.
As alterações no ICMS ainda não passaram a valer, apenas são propostas pelo texto da emenda o qual foi aprovado recentemente, onde as mudanças ocorridas nas leis que foram mencionadas passam a valer para mercadorias e serviços importados.
O crescimento tecnológico não é novidade e cada vez mais as pessoas dependem de ferramentas eletrônicas, como o celular, que exerce a maioria das funções do dia a dia, como ligações de trabalho, entretenimento e compras on-line.
O consumo mundial de aparelhos em 2021 cresceu em 125 milhões de unidades e no Brasil aproximadamente 109 milhões de usuários têm um smartphone, de acordo com um estudo feito em março de 2022 pela consultoria holandesa de dados Newzoo, ficando atrás da Indonésia, Estados Unidos, Índia e China.
Mesmo com uma opção de ótima qualidade, as propagandas fazem com que o público troque seu aparelho cada vez em menos tempo. Marcas como Apple e Samsung tendem a fazer seus lançamentos anuais e preparar eventos de escala global para anunciá-los.
Uma tática desenvolvida pelos fabricantes de eletrônicos é a chamada obsolescência programada, em que o consumidor se sente forçado a comprar novos aparelhos, já que os produtos são produzidos propositalmente com durabilidade e qualidade menores, fazendo, consequentemente, o cliente consumir mais celulares, por exemplo, em curto prazo.
Embora tal descarte tenha ganhado destaque recentemente com os aparelhos eletrônicos, é uma prática que existe desde 1930, uma época em que os Estados Unidos sofreram com a Grande Depressão, portanto, havia um incentivo para o modelo de mercado baseado na produção em série e no consumo, visando recuperar a economia do país.
Ao mesmo tempo que muitos fabricantes buscam encurtar o período de durabilidade, algumas marcas estão tentando alterar a ideia da obsolescência programada, a exemplo da Samsung. A gigante sul-coreana, após lançar os novos celulares Galaxy S22 e Galaxy Tab S8, teve como novidade que as atualizações de sistemas terão como foco afastar o consumo frenético dos aparelhos eletrônicos.
Essa tática adotada pelas marcas faz com que muitas pessoas se policiem em relação ao desuso de aparelhos. Matéria publicada pelo South China Morning Post (SCMP) indica a probabilidade de 6 bilhões de celulares serem descartados até 2025.
Na análise feita pela Global E-waste Statistics Partnership (GESP), entidade ligada à Organização das Nações Unidas (ONU), o descarte cresceu 21% no período de 2014 a 2019, o que representa 53,6 milhões de toneladas de resíduos. Apenas 17,4% desse material chegou às casas de reciclagem.
Já no cenário brasileiro, que se encontra em quinto lugar no ranking de maior produtor de lixo no mundo, 2,1 mil toneladas de eletrônicos são descartados anualmente e a reciclagem deste material equivale apenas a 3% do total.
Nesta pequena porcentagem existem projetos que estão preocupados com a saúde ambiental, como o da ONG Trocafone, que instalou dois quiosques em São Paulo com objetivo de avaliar e analisar o valor que o usuário pode ter com a venda e entregar o dinheiro no mesmo instante.
Outra iniciativa na mesma linha é a do Instituto Água e Terra (IAT), no Paraná, que está recolhendo equipamentos que já não estão mais em uso. A meta é que a campanha evite que os moradores façam o descarte de aparelhos em locais inadequados, como terrenos abandonados, já que esse tipo de equipamentos possui substâncias tóxicas.
Mas, mesmo com serviços como o do IAT, a atitude mais comum ainda é a compra de novos celulares, e os motivos são os mais diversos. A enfermeira Vitória Guimarães, 26, por exemplo, trocou seu antigo aparelho porque já não atendia às suas necessidades. Já Renato Nascimbeni, 19, estudante de psicologia, troca de celular pelo simples gosto de comprar coisas novas e que proporcionam uma felicidade temporária.
Pesquisa feita na plataforma Go2Mob com consumidores do Brasil revelou que 41,2% dos brasileiros de classe C e D trocaram de celular durante a pandemia. O estudo mostrou que 58,2% adquiriram um aparelho com média de preço de R$ 2.000, mesmo tendo renda inferior a R$ 1.000.
A mídia, querendo ou não, tem grande poder de influência nesse tipo de decisão, já que veicula um bombardeio diário de propagandas dos mais diversos itens. Muitas pessoas já trocaram de celular por receberem um e-mail de um novo aparelho nas lojas. Vitória, por exemplo, admite já ter substituído o celular após a marca ter enviado uma propaganda a ela.
Porém, é preciso tomar cuidado com esse tipo de dívida, pois a longo prazo o que deveria ser uma felicidade se torna um problema. Quase oito em cada dez famílias no Brasil estão com dívidas, em atraso ou não. Essa é a maior proporção de endividados desde o início da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), em 2010, segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
A pandemia do coronavírus fez com que muitas áreas fossem afetadas, como a da saúde, o saneamento e, sobretudo, da economia. No contexto brasileiro não foi diferente, com impacto sobretudo nos mais pobres. A edição mais recente da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), mostra que o número de desempregados atingiu 11,3 milhões entre os meses de fevereiro e abril deste ano. No primeiro trimestre de 2021, quando os efeitos da pandemia eram ainda mais severos, esse contingente era de 15,2 milhões de pessoas — o pico do desemprego —, representando 14,9% dos trabalhadores.
Além disso, houve uma maior informalidade e um aumento de trabalhadores sem carteira assinada. No terceiro trimestre de 2021, o número de trabalhadores por conta própria totalizou 25,5 milhões, um aumento de 3,3% em relação ao terceiro trimestre do ano. Trata-se de um acréscimo de 4 milhões de pessoas entre as que trabalham por conta própria.
A artesã Aparecida de Fátima Costa, 67, moradora de São Bernardo do Campo, conta que quando se aposentou em 2002, deixando o emprego na Telefônica Brasil, queria adotar uma nova atividade para que pudesse passar o tempo. Por isso, começou a fazer artesanato para vender na vizinhança.
Há um mês, ela expõe seus produtos todo domingo na Avenida Paulista. Vai com a irmã, Rita das Graças Costa Salles, que faz toucas e cachecóis junto com a amiga Maria Sebastiana Pires, também artesã. Fátima pontua que a prefeitura autoriza o comércio de artesanatos na avenida, e, por esse motivo, nunca tiveram problemas com a Polícia Militar.

Entretanto, com a pandemia a sua produção foi afetada. “Fiz menos artesanatos, pois perdi um pouco a energia. Isso no começo, por conta das notícias, mas depois fui me adaptando e voltei a produzir”, relembra Aparecida. Porém, mesmo que goste de produzir sua arte, para ela só vender seus artesanatos não ‘quebra o galho’ financeiramente, fazendo com que precise ter outra atividade remunerada nos dias de semana, trabalhando em home office na Via Varejo.
Valéria é outra vendedora de artesanatos que pode ser encontrada na Paulista. A atividade, que já realiza há cinco anos, foi completamente impossibilitada para ela por quase dois anos, e a forma que encontrou de dar continuidade foi migrar para as redes sociais.
Não quis abrir mão do artesanato, porém acabou fazendo outros serviços informais para se manter. “As pessoas não estão pensando em arte por conta da situação ruim, tanto da saúde, ‘de morte’. Por mais que a arte transmita algo bom, financeiramente, para mim, foi muito ruim”, diz Valéria. E completa: “Eu acredito que todos que vendem aqui perto estão da mesma maneira. Quem tá aqui acredita que vai melhorar. Todos têm a mesma sintonia”.
Lucas Silveira, de 25 anos, também descreve sua experiência como vendedor de bebidas na rua. Há mais de cinco anos na atividade, o jovem obtém com as vendas uma renda extra para casa, já que nos dias de semana trabalha de carteira assinada em uma empresa de telemarketing.
Durante a pandemia, Lucas continuou trabalhando com o seu comércio ambulante. Ele cita o auxílio emergencial como fundamental para a sua renda familiar, já que durante o isolamento não estava formalmente contratado.

Dados da Pnad mostram que 70% dos ambulantes receberam o benefício do governo durante os primeiros meses da pandemia. Contudo, com a redução do auxílio e as novas regras criadas em 2021, inúmeros brasileiros dizem que não foi o suficiente para manter a renda familiar, considerando as altas taxas de desemprego e inflação no país.
Como pai de um filho de três anos de idade, a principal preocupação de Lucas e de seus colegas “da rua” é o prejuízo causado pela repressão policial.
“É muito prejuízo, só [a carreta usada] custa mais de R$ 300, o isopor R$ 90, sem contar os produtos.” diz o jovem. O vendedor enxerga a situação dos ambulantes como “normal”, mas reconhece que no início do confinamento houve um grande aumento nos casos de violência policial.
O setor informal, descrito pelo IBGE como as unidades econômicas “com baixo nível de organização, com alguma ou nenhuma divisão entre trabalho e capital como fatores de produção, e em pequena escala, sendo ou não formalmente constituídas”, é o que mais reflete a situação econômica no momento devido à vulnerabilidade de quem atua nele.
Vendendo sua arte desde os 16 anos, Sarah Soares diz que o artesanato é sua principal fonte de renda. Aos 39, ela conta que a pandemia foi complicada para todos os artesãos, já que tal categoria não teve “respaldo algum de nenhum órgão artístico ou governamental”.
Sarah nem sempre trabalhou na rua. Dos 23 anos de seu negócio, sete foram em uma loja localizada em Pinheiros, porém passou por dificuldades com a fiscalização por ser confundida como vendedora de produtos falsificados. Ao retornar às ruas, diz ter sido muito bem recebida. A artesã também ensina arte para jovens de comunidades.

A artista trabalha aos fins de semana na rua, e nos dias da semana cuida de hortas comunitárias, que hoje representam parte dos seus rendimentos. Sarah recorda que, em governos anteriores, ela conseguia trabalhar de domingo a domingo apenas com sua arte. Mesmo assim, é ela que sustenta sua família: hoje a artesã tem três filhas e três casas ao redor do Brasil.
Os vendedores ambulantes e os artesãos, protegidos por iniciativas como a da Avenida Paulista, representam um dos grupos de trabalhadores mais vulneráveis da população, e seu aumento e suas condições de trabalho são reflexos do momento econômico atual.