Sem orientação adequada, donas de pequenos negócios relatam dificuldades para entender as mudanças na economia e veem sua renda ameaçada
por
Manuela Dias
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28/11/2025 - 12h

A falta de informação qualificada tem se tornado uma das principais barreiras para microempreendedoras brasileiras que dependem de insumos importados ou de produtos cujo preço varia conforme fatores globais. Em meio a mudanças recentes nas taxas, oscilações cambiais e aumento da burocracia para transações internacionais, muitas afirmam que não sabem onde buscar apoio técnico. É o caso de Danielle Nayara, maquiadora e microempreendedora, que iniciou seu negócio após deixar o emprego formal para trabalhar com eventos.

“Eu sempre gostei de maquiagem, mas nunca tinha pensado em maquiar outras pessoas. Só comecei depois de uma sugestão, fiz um curso e acabei me apaixonando pela profissão”, conta. Hoje, ela atende clientes em casa, em eventos e até pernoita em residências para preparar noivas e madrinhas. Mas apesar da agenda cheia, manter o negócio funcionando tem se tornado cada vez mais complexo.

Um desafio diário

Para Danielle, o principal custo do seu trabalho é a compra de materiais: produtos que sofrem variações constantes de preço, muitas delas impactadas por fatores externos. “Um produto que eu comprei por um valor semana passada já está mais caro hoje. Quando isso acontece, eu preciso ajustar meus preços, porque se não aumento, perco margem”, explica.

Ela relata que, muitas vezes, não entende o motivo dessas oscilações nem encontra informação clara sobre o que está influenciando o aumento. Esse descompasso entre preço e explicação não só dificulta o planejamento, como a impede de aproveitar oportunidades.

“A qualidade dos produtos é essencial. Se o material é ruim, não adianta eu ser boa. Só que para comprar produtos bons, eu preciso pesquisar muito. E os preços mudam rápido demais”, diz.

A falta de informação também interfere na profissionalização. Em eventos como a Beauty Fair, Danielle conseguiu adquirir produtos de alta qualidade com preço reduzido, mas admite que depende do acaso: “Eu fico sabendo por redes sociais. Se eu não vejo no Instagram ou no TikTok, eu perco a chance.”

Redes sociais como principal fonte

Como muitas microempreendedoras, Danielle se informa principalmente pelas redes sociais. “É onde está tudo hoje: Instagram, TikTok, WhatsApp. É ali que vejo notícias, promoções e mudanças”, afirma. O problema, segundo especialistas, é que essa dependência de canais informais deixa empreendedoras vulneráveis. Notícias sobre variações cambiais, tarifas, mudanças em importações ou novas regras para comercialização de cosméticos dificilmente chegam a essas mulheres de forma clara e estruturada. Isso faz com que muitas decisões sejam tomadas às cegas.

Economistas e organizações ligadas ao empreendedorismo feminino têm reiterado que a falta de informação clara é hoje um dos maiores riscos para pequenos negócios liderados por mulheres. À medida que insumos sofrem com oscilações globais, e que o comércio exterior se torna mais complexo, milhares de empreendedoras enfrentam um mercado imprevisível sem apoio técnico.

No caso de Danielle, o impacto ainda é administrável, mas ela admite a preocupação: “Eu tento acompanhar tudo, mas é difícil saber o que realmente vai afetar meu trabalho. Às vezes, descubro um aumento só quando chego na loja para comprar”, relata.

Qualidade e confiança são os dois principais pilares do trabalho de uma maquiadora”.
“Qualidade e confiança são os dois principais pilares do trabalho de uma maquiadora”. Reprodução: arquivo pessoal 

Força para manter o negócio! 

Apesar dos desafios impostos pela falta de informação, pelos custos instáveis e pelas mudanças constantes no mercado, mulheres como Danielle continuam sustentando seus negócios com esforço diário, intuição e dedicação. A realidade que enfrentam é marcada por incertezas, mas também por uma determinação que atravessa jornadas longas, madrugadas de trabalho e decisões tomadas sem o suporte adequado.

No fim das contas, o que sustenta esses negócios não é apenas acesso a crédito ou políticas públicas: é a força de mulheres que, todos os dias, escolhem continuar. A luta feminina, silenciosa ou coletiva, segue sendo a certeza em meio ao cenário incerto e continua provando que, quando essas mulheres resistem, elas transformam não só suas próprias histórias, mas também o futuro do empreendedorismo no país.

 

Transformando a vida de milhões de pessoas todo ano, merece mais reconhecimento e recursos para manter o Brasil vivo
por
Vítor Nhoatto
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28/11/2025 - 12h

Por Vítor Nhoatto

 

Uma das poucas certezas de todo ser humano, tal qual a morte, é a doença. Sabe aquele resfriado que vem junto ao seco do frio, uma ferida que infecciona depois de cair de bicicleta, até aquelas mais sérias que podem aparecer. Fato é que sem saúde não se vive, sendo um direito constitucional não por acaso. Sendo assim, é preciso que o acesso a essa necessidade tão básica quanto respirar e se alimentar seja universal, e não um bem a se comprar apenas por aqueles que podem.

Para isso então que existe o Sistema Único de Saúde (SUS), tão falado e muito mais presente na vida do que alguns podem sequer imaginar, ou querer. Para se ter uma ideia, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão regulador dos medicamentos disponíveis no país, de controle alimentar e hídrico, faz parte do SUS. Regulamentado em 1990, é responsável pelas vacinas e desenvolvimento científico ainda, e sabe os planos de saúde, a Agência Nacional de Saúde (ANS), que os regula, também é integrante do sistema.

Para falar dessa diferença real na vida, antes é preciso até olhar nos papéis para lembrar já a quanto tempo ele é médico, enfermeiro, farmácia. De cabelos curtos hoje, depois de uma repaginada no visual devido ao câncer de pulmão que teve justamente na pandemia de COVID-19, Léia Marisa celebra que há dois anos consegue receber na AME Maria Zélia o micofenolato de Mofetila. Pois é, muitas vezes quando o nome é chique o preço é alto, uns R$500 por caixa, mil reais por mês gastos antes da papelada ficar pronta e ser aceita em 30 de novembro de 2023, já que a doença não espera os trâmites e filas.

A ex-professora, atual dona de casa e empresária a distância do seu restaurante, conta como o período de descoberta e tratamento do câncer, que levou até questões reumatológicas, e ajudou a descobrir uma artrite reumatoide, foi muito difícil. Entre dezenas de idas ao hospital de 2020 até 2023 até chegar ao diagnóstico, foram dias desgastantes, assustadores, e toda ajuda foi essencial, principalmente com os custos de sobreviver à doença. No caso dela, o tratamento do tumor foi feito em rede privada graças ao seu plano de saúde empresarial, que custa salgados R$5 mil reais ao mês. Só aqui são quase quatro salários mínimos, um privilégio muito grande, como ela destaca, olhando para um país em que apenas 7,60% da população ganha entre 5 e 10 salários como o Censo de 2022 do Instituto brasileiro de Geografia e Estatística revela. 

Se aprofundando mais ainda nos fatos, de acordo com o estudo “Quanto custa o câncer” de 2023 do Observatório de Oncologia, do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE) e do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer, os custos de tratamento da doença quadruplicaram nos últimos três anos. Uma sessão de radioterapia ou quimioterapia custava quase R$800 em 2022, e dezenas são necessárias na maioria das vezes. Acrescentando nessa conta, consultas, tomografias e biópsias, mil reais ali e cinco acolá, o custo chega facilmente ultrapassa dezenas de milhares de reais. Isso é ainda mais preocupante tendo em conta a incidência do câncer na população, que segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA) entre 2023 e 2025, 704 mil pessoas terão a doença como Marisa. 

E com isso que o SUS se mostra como algo tão relevante, oferecendo tratamento integral e gratuito contra todos os tipos de cânceres. Claro que muitos problemas existem, como destaca Marisa ao lembrar que quando estava no meio do tratamento enfrentou problemas com o plano de saúde, mas que só o medo de depender da demora do SUS caso fosse preciso, a preocupava muito. A saúde é o bem mais precioso para, o que para todos provavelmente deva ser, e por isso justamente que em 2012 a lei 12.732/12 obriga que o tratamento contra o câncer tem que ser iniciado em até 60 dias após o diagnóstico. 

Mas além disso, com os olhos marejados depois de navegar novamente no mar agitado que foi a jornada até a vida que tem hoje, curada e com o diagnóstico da sua doença crônica, ela volta e lembra que a diferença que não ter que pagar pelo Micofenolato que a mantém respirando faz.  Quando tinha que arcar com as despesas era como um fardo a mais imposto a ela, que considera a saúde hoje como o bem mais valioso. As idas mensais  ao posto são um alívio hoje para ela, destacando que o seu medicamento nunca faltou até então, mas que já presenciou pessoas na situação contrária e que não tinham como arcar pessoalmente com os gastos. Essa é uma realidade infelizmente, segundo fiscalização de 2023 da secretaria de contas do Estado de São Paulo, em quase metade dos postos visitados faltavam algum medicamento.

papéis
A cada seis meses Marisa tem que renovar a receita e toda a papelada para solicitação do seu medicamento junto a AME - Foto: Vítor Nhoatto

Milhões de uns

Mesmo que falte muito, afinal, só 4,16% do orçamento federal foi destinado à saúde em 2024 segundo o Painel do Orçamento Federal, a porcentagem vem aumentando desde 2022, e milhões de brasileiros são atendidos todos os dias. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes com um sistema universal de saúde, e 213 milhões dependem diretamente do SUS, segundo o Ministério da Saúde, que contabiliza em média 2,8 bilhões de atendimentos por ano, empregando 3,5 milhões de profissionais.

E mais um desses uns é Valdir Sousa, que do alto de seus 63 anos de idade é um típico caso brasieleiro. Com diabetes do tipo II há 20 anos e hipertenso, conta que se não fosse o acesso ao sistema gratuito, sua vida seria muito diferente, obviamente pelo lado financeiro, e muito também pelo bem-estar. O mineiro nascido em São João do Paraíso e que vive em São Paulo há décadas já viu tanto na vida, e com o passar do tempo o que todos querem e merecem é justamente qualidade de vida. Essa no caso, em grande parte possível graças a insulina que busca no posto na Freguesia do Ó e os comprimidos que cuidam do seu coração acelerado.

Justamente essa hipertensão que é a doença mais presente nos peitos animados dos brasileiros, e 52% da população é diagnosticada com alguma DCNTs, como revela a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019. Além disso, segundo dados de 2020 da Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) como as de Valdir são tecnicamente chamadas, são as mais comuns no mundo e no Brasil, com o diabetes inclusive tendo aumentado 70% entre 2000 e 2019. 

Para contextualização, nos Estados Unidos existe há alguns anos o movimento nas redes sociais insulin4all, criado pela organização sem fins lucrativos T1 International, que denuncia os altos custos da insulina no país, onde um frasco de 10ml gira em torno de U$330. Tal situação vem levando inclusive pessoas a racionarem o medicamento, o que pode levar a complicações e até a morte em casos mais graves. Já no Brasil, o mesmo remédio é disponibilizado pelo SUS, e o preço máximo permitido por lei é de R$125,30. 

Diante desses dados e o envelhecimento da população fica claro como a saúde vai ser cada vez mais necessária, tal qual destaca o jovem de espírito Valdir, que já foi pedreiro e auxiliar de manutenção geral em uma lanchonete, justamente no Hospital das Clínicas. As histórias que já viu na maior referência de saúde pública brasileira enchem a sua mente, e as palavras saem inquietas sobre as melhorias que o SUS precisa e as pessoas merecem. Ele conta em meio a suspiros que quando precisa de exames mais urgentes, ou consultas em meio a crises, tem que recorrer ao plano de saúde da sua esposa, do qual é dependente, já que as unidades de saúde estão sempre cheias e a fila de espera passa de meses algumas vezes. 

Foi nessas passagens obrigadas pela rede privada que ele inclusive descobriu mais um integrante do seu pacote, a doença renal crônica há um ano. Porém, é no SUS que o acompanhamento com nutricionista, nefrologista e endocrinologista foi possível, uma rotina de cuidados essenciais para uma boa qualidade de vida para quem tem a condição. É graças a essa rede de profissionais e a farmácia popular que Valdir vai aproveitando com os dois filhos e a mulher os seus dias, frisando com a voz até meia trêmula, que sem isso não poderia se ter o seu direito de viver com saúde exercido plenamente.

medicamentos
São graças a compostos como esses que tanto Marisa ou Valdir, e os mais de 100 milhões de brasileiros com doenças crônicas podem viver bem tal qual a constituição garante - Foto: Vítor Nhoatto

 

Desigualdade, corrupção e desemprego juvenil deflagram uma revolta que expõe a fragilidade econômica profundamente enraizada.
por
Pedro Bairon
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14/11/2025 - 12h

Por Pedro Bairon

 

Na primeira semana de setembro de 2025, as ruas de Kathmandu foram tomadas por uma onda de protestos liderados pela chamada Geração Z, quando milhares de jovens se reuniram para denunciar a corrupção, o nepotismo e a desigualdade que dominam a vida pública do Nepal. O estopim foi a proibição de 26 plataformas de redes sociais incluindo Facebook, Instagram, X e YouTube, decretada pelo governo, uma medida que ativistas viram como um ataque à liberdade de expressão, Raj Rana, um nepalês que participou das recentes manifestações reafirma tal posição.

Os protestos rapidamente escalaram: confrontos com a polícia resultaram em uso ostensivos de bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e munição real, segundo Rana. No dia 9 de setembro, o primeiro-ministro KP Sharma Oli renunciou, pressionado pela magnitude da insatisfação dos jovens, porém, não se limitou ao veto digital. Por trás da indignação estava uma reclamação mais profunda: a escassez de empregos dignos, a persistência de elites privilegiadas (os chamados “nepo kids”) e a sensação de que, apesar de tanto crescimento econômico reportado, o Estado falhou em converter recursos em oportunidades para a maioria da população. De fato, segundo o Banco Mundial, mais de 80% da força de trabalho nepalesa está na informalidade, um número clássico de economias frágeis. O economista Karki Lama aponta que as remessas enviadas por nepaleses que trabalham no exterior (equivalentes a mais de um terço do PIB, segundo Fundo Monetário Internacional, FMI) sustentam o país, mas não geram empregos de qualidade e mantêm muitos jovens reféns de oportunidades materiais mínimas.

Esses protestos, segundo analistas, não são apenas uma manifestação política: são um grito de alerta sobre a saúde estrutural da economia nepalesa. A relação entre a frustração juvenil e as debilidades econômicas torna-se evidente à medida que se examina o modelo de desenvolvimento vigente no país. A economia nepalesa há muito tempo depende fortemente das remessas de migrantes para manter sua liquidez externa e financiar o consumo interno. Para Lama, entretanto, essa dependência representa um fracasso de capacidade produtiva nacional, não há trabalho suficiente internamente, e a migração torna-se quase inevitável. Mas a crise das ruas tem um custo direto para a economia. Um relatório recente do Banco Mundial alerta que a turbulência política pode reduzir fortemente o crescimento econômico em 2025-26: a previsão foi ajustada para 2,1%, com possibilidade de contração se a instabilidade persistir. O documento prevê ainda uma queda nas chegadas de turistas, um golpe duplo para o Nepal, que depende fortemente do turismo para gerar divisas e emprego formal. A erosão da confiança dos investidores já se tornou palpável. A Federação da Indústria do Nepal (FNCCI), por exemplo, emitiu um apelo para que o novo governo garanta segurança e estabilidade para os negócios, destacando que o setor privado é vital para a recuperação. Segundo esse mesmo apelo, as perdas com os danos materiais causados pelos protestos já afetam indústrias, propriedades e a cadeia de valor do turismo, hotéis, guias, transportes, tudo foi afetado.

Além disso, a insatisfação juvenil encontra respaldo em dados econômicos estruturais que expõem fragilidades profundas. O Nepal registra uma das maiores taxas de desemprego entre jovens na região: cerca de 20 %, segundo o mais recente relatório do IBGE Países. A falta de emprego qualificado, o baixo investimento em infraestrutura produtiva e a fraca diversificação industrial criam uma economia incapaz de absorver seu capital humano mais o peso das remessas, embora vital, é paradoxal: elas sustentam a economia, mas corroem o potencial de desenvolvimento autônomo. Conforme observa a New Humanitarian, muitos jovens veem sua saída como única rota possível, enquanto outros permanecem para protestar contra um sistema que lhes fecha portas. A migração, nesse contexto, deixa cicatrizes na cena política, no tecido social e nas finanças públicas.

O choque dos protestos também traz riscos no balanço externo. A volatilidade gerada pelas manifestações mobiliza redes de capital para fora do país, deixando o Nepal vulnerável a choques cambiais e restringindo sua capacidade de investir em longo prazo. A perda de turistas, a recomposição mais lenta de reservas cambiais e a alta cautela dos investidores estrangeiros são efeitos colaterais duradouros desse momento de ruptura. Do ponto de vista fiscal, a crise exige que o governo interino encontre um delicado equilíbrio. Por um lado, há pressão para responder às demandas dos jovens por mais transparência, combate à corrupção e reforma política. Por outro, há necessidade urgente de restaurar a confiança dos mercados, garantir fluxo de investimentos e sustentar a receita pública. Se o Estado optar por cortes agressivos para manter a disciplina fiscal, pode abrir mão de sua capacidade de gerar empregos, exatamente aquilo que a Geração Z exige. Por outro lado, expandir gastos sem controle também pode agravar vulnerabilidades já existentes. A situação contemporânea do Nepal também reflete um dilema geopolítico. Localizado entre Índia e China, o país sempre foi estratégico para ambos. A instabilidade recente pode frear projetos bilaterais de infraestrutura e perturbar o plano de desenvolvimento sustentável que muitos observadores internacionais defendiam para a nação. Além disso, a falta de boas políticas industriais internas limita sua capacidade de atrair investimento direto que não dependa exclusivamente de remessas ou do turismo.

Embora a revolta da Geração Z tenha derrubado um governo, ela colocou a economia nepalesa sob os holofotes: o modelo baseado em remessas e fluxo turístico é funcional, mas frágil. A instabilidade desencadeada pelos protestos expôs o dilema clássico de economias dependentes: crescer, mas sem construir uma base real de produção, oportunidades e institucionalidade. Se o novo governo quiser responder ao grito dos jovens, terá de investir não apenas na reconstrução política, mas sobretudo na transformação econômica: criando empregos, promovendo reformas estruturais e reduzindo a dependência de fatores que escapam ao controle interno. Sem isso, o Nepal pode voltar a caminhar, mas continuará sobre uma ponte frágil, com vento forte acima e abismo profundo abaixo.

Videogames se aproximam de artigos de luxo devido aos elevados custos
por
Lucca Cantarim dos Santos
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07/11/2025 - 12h

Por Lucca Cantarim

 

Quem acompanha o cenário dos videogames vem se surpreendendo com a alta nos preços dos jogos nestes últimos meses. Com valores que vão desde R$ 249,95, valor do jogo “Hundred Line – Last line of defense”, lançado em abril de 2025, até R$ 499,99, preço do jogo Mario Kart World, que chegou às lojas em junho do mesmo ano. Esses preços têm dificultado cada vez mais o acesso dos fãs aos jogos que desejam, uma vez que acaba sendo inviável para muitos precisar gastar tanto dinheiro sempre que querem jogar um jogo novo. A estudante de sistemas de computação Gabrielle Rodrigues afirma sempre se arrepender de pagar caro em um jogo no dia do lançamento e acabar ficando sem dinheiro para comprar uma roupa ou até mesmo uma passagem do Rio de Janeiro até São Paulo para visitar seus entes queridos. Já o estudante Gabriel Merino alega sentir cada vez mais que não consegue comprar jogos no lançamento, precisando esperar diversos meses até uma baixa no preço ou promoção para finalmente ter acesso ao produto.

Fazer um jogo é um processo extremamente caro, e para a desenvolvedora independente “Dumativa”, responsável por jogos brasileiros como “Enigma do Medo” e “Lenda do Herói”, esse é o principal motivo para o aumento no custo do produto final. Já para Juno Cecílio, CEO da “Gixer Entertainment”, outra desenvolvedora independente, criadora do projeto “Changer Seven”, que se encontra em desenvolvimento atualmente, existe um fator ainda mais sensível.

 

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"Changer Seven", jogo de Juno Cecílio                                                 Foto:Divulgação/Gixer

 

Juno defende que existe uma estratégia de mercado mais agressiva por parte das empresas, que almejam maximizar sua receita em cima de um público fiel e cada vez mais disposto a pagar por franquias conhecidas. O grande problema, é que não existe um teto que defina até onde uma corporação queira ganhar, o que acaba sucateando o setor. O desenvolvedor faz um comparativo com outros setores no Brasil, como o de faculdades, que são compradas, demitem o corpo docente e substituem-no por profissionais mais baratos e revendem para o próximo, que fará o mesmo. Esse caso pode se observar na faculdade Anhembi Morumbi, que sofreu demissões e perdas massivas na grade horária após ser comprada pelo grupo Ânima Educação em 2021, como afirma uma matéria publicada na UOL em 2023.

Mas ele também aponta para outro fator, que também é abordado pela Dumativa, a falta de regionalização do preço. Quando um jogo chega no Brasil apenas convertido pela taxa do dólar, sem considerar a realidade do poder de compra local, ele acaba se tornando um produto quase que de luxo, e é nessas situações que observamos preços como os R$ 500,00 de Mario Kart World. A maioria dos jogos independentes já consideram fatores regionais quando lançam seus produtos em outros países, mas as produções de empresas grandes, como Nintendo, Ubisoft e Activision não, o que agrava uma ideia de “ganância” por parte dessas empresas.

Oferecer preços acessíveis ao consumidor é importante por inúmeros fatores, e um deles é justamente oferecer a experiência de jogo para um público mais amplo. Para muitos fãs de videogames, é extremamente doloroso, apesar de não chegar a um estágio extremo, ser privado de jogar algum jogo que goste devido ao seu custo elevado.

Gabrielle, por exemplo, diz que se sentiria mal caso fosse impedida de comprar um lançamento que estivesse com vontade de jogar. Ela alega que tem vontade de jogar o “Persona 3 Reload” a cerca de um ano, mas até hoje não o fez devido ao alto custo do jogo. Ela conta que até pensou em piratear a mídia apenas para consumo, e pagar por ela quando tivesse a oportunidade – igual já fez com outras franquias – mas que os sistemas que as empresas andam colocando em seus produtos, dificultam muito a pirataria. Gabriel Merino passa por uma situação similar, ficaria chateado caso não conseguisse comprar um jogo devido ao preço, mas também não compraria um jogo à preços exorbitantes mesmo se tivesse as condições para isso.

Lançar os jogos à preços acessíveis é essencial para que essas pessoas consigam consumir a mídia que desejam sem precisar se arriscar na pirataria ou pagar valores elevados. Além disso, é essencial para a criação de um consumo saudável. Nas palavras de Juno, quando um jogo lança à um preço compatível com a realidade do brasileiro, ele vende mais e ajuda a fortalecer o mercado e a comunidade local, e a trazer mais espaço para as empresas no País. Um exemplo foi o “Hollow Knight: Silksong”, lançado pela Team Cherry em setembro desse ano. O preço de R$ 60,00 cobrado pela mídia fez com que ela vendesse muitas unidades em um único dia – culminando na queda dos servidores da plataforma de compras Steam.

As empresas e publicadoras são as primeiras que podem participar na criação de um preço mais acessível e justo para o bolso da população. Grandes empresas e distribuidoras (Nintendo, Ubisoft, Microsoft) podem ajudar aprimorando a regionalização de preços, levando em conta o poder de compra de cada país; aprimorar a educação e formação de talentos, o que em longo prazo reduz o custo de produção global; oferecer programas de incentivo e parcerias com estúdios locais, o que acaba por gerar mais empregos, e visibilidade.

Quanto às empresas independentes, não se pode transferir as mesmas responsabilidades, uma vez que estas não tem o mesmo poder financeiro que as “gigantes do setor”. No entanto, elas podem e devem estabelecer métodos de acessibilidade nos preços de seus jogos, e algumas já tomam as providências, apesar de este ser um dos maiores desafios para essas instituições.

A Dumativa têm feito uso dos sistemas de financiamento coletivo em seus lançamentos, isso ajuda as empresas a terem uma base financeira mais sólida antes mesmo do lançamento, além de estabelecer uma relação saudável com empresa e consumidor, a partir do sistema de recompensas e conteúdo adicional dependendo de quanto cada pessoa optou por investir no jogo, além do próprio produto completo após o lançamento.

Já Juno, da Gixer, amplia ainda mais sua visão, para ele, jogos independentes não precisam competir com os grandes lançamentos em preço, na realidade, esses lançamentos têm de entregar valor percebido, autenticidade e qualidade dentro de seu escopo. Além disso, ele acredita que uma das melhores formas de equilibrar as contas sem depender do preço cheio é a diversificação de fontes de receita, e podem fazer isso por meio do lançamento de edições digitais com bônus, participação em festivais e até mesmo outros tipos de produto, como colecionáveis, histórias em quadrinho e até trilhas sonoras.

Outra ajuda também pode vir das próprias lojas, plataformas como a Steam se destacam quando o assunto é tornar seus preços mais acessíveis. Além da abundância de promoções, principalmente em datas comemorativas, que podem levar um preço de R$ 200,00 a R$ 40,00, a plataforma criou um sistema de famílias, que permite que um grupo de pessoas compartilhem a mesma biblioteca, podendo jogar jogos que pertencem à conta de terceiros (desde que inseridos na mesma família, cujo limite de pessoas é seis).

 

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Logo da loja digital Steam                                                                           Foto: Divulgação/Steam

 

Para Gabrielle Rodrigues e Gabriel Merino, que participam da mesma família alegam o quão benéfico isso é para eles, ambos afirmam como conseguiram ter mais acesso à jogos que não conseguiriam ter de outra forma, além da possibilidade de repartir os custos com os membros do grupo. Gabrielle afirma que financeiramente a família Steam é algo divino.

 

Movimento nas lojas aumentam conforme as épocas temáticas do ano vão chegando
por
Nathalia de Moura
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24/10/2025 - 12h

Por Nathalia de Moura

 

Entre o vai e vem e o sobe e desce das pessoas, a 25 de Março é o centro das vendas, principalmente em épocas como Carnaval, Natal e Halloween. Cores, brilhos, formas, luzes, ocupam as fachadas das lojas fazendo cada cliente lembrar que as bruxas chegam em 31 de outubro, o Papai Noel dará o ar da graça em 25 de dezembro e o Carnaval em breve tomará conta das ruas do País. 

A correria para atender o cliente que precisa de uma abóbora laranja e gigante, a atenção para cortar o tecido para a roupa do velhinho do Polo Norte ou até mesmo separar as lantejoulas para a confecção da fantasia faz parte do dia a dia das vendedoras do centro de São Paulo. Marlene tem 53 anos e veio atrás dos sonhos na capital paulista aos 16. Hoje fala com muito carinho no orgulho em fazer parte desses momentos. Com um sorriso, mas a voz embargada e os olhos marejados, relembra a dificuldade de se iniciar nesse mundo dos produtos de aviamentos e sazonais. Sempre sonhou em ter o que possui hoje, e mesmo com tantos patrões desacreditando de seu potencial, conseguiu ir atrás daquilo que a motivava: a arte do artesanato.

Os produtos chegam na loja e dali, são transformados em grandes realizações. Ela conta que nada é mais gratificante do que poder ajudar alguém que nem sabia o que estava procurando e encontra ali no seu estabelecimento. Na correria dos dias, as horas passam, a agitação aumenta, o fluxo cresce. Cada cliente fica um tempo observando aquele ambiente repleto de oportunidades. Oportunidade de fazer algo diferente do ano anterior, a chance de colocar uma cor diferente na decoração, de enfeitar a casa com pisca-pisca ou até fazer a festa temática do dia das bruxas que não aconteceu antes.

Na salinha apertada, rodeada de papelada importante e também do quadro estampando a foto da sua família, Marlene contava que proporcionar produtos de qualidade aos clientes a transforma. Pode ser que o Papai Noel não seja vendido hoje, que a abóbora gigante ainda passe despercebida ou o letreiro de “Feliz Natal” não seja usado, mas ela segue acreditando que cada fio, botão ou glitter pode ser utilizado em outros momentos justamente para não ser desperdiçado.

Ao andar pelas lojas, percebemos os olhares atentos nas promoções, o barulho dos comentários ao ver uma peça exposta ou as perguntas em relação aos preços. Para lá ou para cá, a multidão toma conta dos ambientes. Mesmo antes dos dias de comemoração, as pessoas fazem questão de irem em busca do que procuram o quanto antes. Mas sempre tem os que preferem comprar aos 45 minutos do segundo tempo. Na pressa para conseguir atender todos os clientes, Elen, funcionária que enfrenta todas as épocas corridas de venda do ano, fala que em alguns momentos, não consegue dar a atenção que as pessoas merecem. Seu olhar acompanhava a chegada e a saída dos clientes na loja. A atenção é máxima em um lugar que a exige a todo tempo.

No meio das linhas, botões e tecidos, a cearense de sotaque presente e forte expressa que nem imagina as diversas possibilidades que podem sair dali na sacola de cada pessoa. Uma linha pode se tornar mais de uma peça no Carnaval do Sambódromo do Anhembi ou nos bloquinhos pela cidade. E quando ela pensa nisso, os olhos até brilham em saber que, de alguma forma, fez parte daquilo.

A oferta e a demanda não param, assim como a agitação que só o ambiente da mais conhecida rua de comércio paulistana é capaz de proporcionar. Pelas ruas da 25 de março andam jovens, idosos, mulheres e homens carregando pequenas sacolas ou grandes volumes de mercadorias. De um lado o consumidor, do outro o vendedor. Ambos sabem que precisam um do outro, principalmente nessas épocas agitadas do comércio. Para Marlene, inspirar pessoas com seu empreendimento é motivo de orgulho. Em meio aos elogios que sua loja recebe, ela sempre sai com o sentimento de missão cumprida ao ver seus clientes com as sacolas recheadas de produtos que farão a diferença em épocas que se tornam especiais nas particularidades de cada um.

Com movimentação milionária, cenário competitivo de eSports tem ganhado cada vez mais atenção
por
Matheus Monteiro da Luz
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05/05/2023 - 12h

Nos últimos anos, o setor de games tem desfrutado de um crescimento expressivo em relação a público e investimentos. “Houve um período de hiato no cenário brasileiro com a queda das peculiaridades da lans houses. Esse cenário só apresentou recuperação em meados de 2009 com a vinda do CS:GO, League of Legends e novas publishers aqui para o Brasil, permitindo assim a entrada do investimento necessário para alavancar o cenário nacional”, conta Leo de Biase, entusiasta e pioneiro dos eSports no Brasil.

Impulsionado pelo crescente interesse dos brasileiros em competições de jogos eletrônicos, bem como pela evolução da tecnologia e pela popularidade dos jogos online, o setor tem se expandido rapidamente e se tornado cada vez mais importante para a economia do país.

“As marcas não viam esse local como algo interessante para ser investido e com isso os valores agregados acabavam sendo muito pequenos. Mas os games deixaram de ser algo de nicho, ou contracultura, para se tornar o mainstream. Isso atrai marcas não só relacionadas a games ou tecnologia, mas também atrai marcas de consumo, de carros e até mesmo bancos”, relata Leo.

Uma das principais evidências desse crescimento é o aumento das premiações em competições de eSports. Nos últimos anos, os prêmios oferecidos têm aumentado significativamente, atraindo cada vez mais jogadores profissionais e equipes para o mercado brasileiro. De acordo com um levantamento da consultoria especializada Newzoo, em 2020, o Brasil foi o 13º país com as maiores premiações em eSports do mundo, movimentando cerca de US$ 3,3 milhões.

Além disso, novos jogos ganharam popularidade e aumentaram a diversidade de opções em que tantos os jogadores como empresas podem investir seu tempo e dinheiro. Anteriormente, os jogos competitivos que faziam sucesso nacionalmente se limitavam ao CS:GO, LOL e Dota 2. Porém, nos últimos anos, Free Fire, Valorant, Overwatch, Fifa  e Rainbow 6 e Fortnite caíram nas graças dos jogadores, desenvolvendo um cenário competitivo bem consolidado no país.

Outro fator que tem contribuído para o crescimento do cenário brasileiro de eSports é a profissionalização das equipes e jogadores. Muitas organizações têm investido em treinamentos, infraestrutura e tecnologia para aprimorar o desempenho de seus jogadores e alcançar melhores resultados em competições. Além disso, muitos jogadores têm se dedicado exclusivamente aos eSports, tornando-se profissionais e se dedicando integralmente às competições e treinamentos.

Com todo esse crescimento, os eSports tem se tornado uma indústria cada vez mais importante para a economia do país. Além das premiações, o setor gera empregos e movimenta a economia de diversas formas, como com a venda de produtos relacionados aos jogos e equipamentos de jogos. Tudo isso torna os eSports um mercado em expansão e uma excelente oportunidade para empresas e investidores interessados em explorar o potencial dessa indústria.

“Quando a gente começou a apresentar números de gente grande, trabalho profissional, deixamos de ser apenas pessoas apaixonadas e agora  podemos contar com mais investimentos. Com isso conseguimos trazer profissionais de maior gabarito de outros segmentos para escalonar cada vez mais o nosso produto”, diz Leo sobre o motivo do crescimento dos eSports no Brasil.

Os eSports têm se tornado uma indústria cada vez mais importante para a economia global. De acordo com outro estudo da consultoria Newzoo, em 2021, a indústria de Esports movimentou  cerca de US$ 1,5 bilhão, um aumento de meio milhão em relação ao período pré-pandemia. Esse crescimento tem impactos significativos na economia de modo geral.

Uma das principais formas de impacto dos eSports na economia é a geração de empregos. A indústria de eSports emprega milhares de pessoas ao redor do mundo, desde jogadores profissionais até profissionais de marketing, produção de eventos, transmissão e gestão de equipes. Além disso, a indústria movimenta diversos setores, como tecnologia, transporte, turismo e alimentação, gerando empregos indiretos em diferentes áreas.

Outro impacto importante é o aumento das receitas das empresas envolvidas na indústria de eSports. Grandes empresas, como fabricantes de hardware e periféricos, patrocinadores, desenvolvedores de jogos e empresas de streaming, têm visto suas receitas crescerem significativamente devido ao aumento do interesse na modalidade. Além disso, as competições de eSports têm atraído a atenção de grandes marcas, que investem em publicidade e patrocínio de eventos, gerando mais receita para o setor.

Além disso, a indústria de eSports tem um impacto positivo na imagem e reputação dos países que sediam grandes eventos. As competições atraem um grande público de diferentes partes do mundo, aumentando a visibilidade e a reputação dos países que sediam esses eventos. Além disso, a realização de competições pode gerar benefícios econômicos para as cidades-sede, desde a rede hoteleira até o comércio local.

Produtos destinados ao público feminino custam em média 12% a mais que itens masculinos similares
por
Ana Kézia Andrade
Bruna Parrillo
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04/05/2023 - 12h
Arte por: Bruna Parrillo
Arte por: Bruna Parrillo

 

A "taxa rosa" é uma atividade comercial que envolve a venda de produtos específicos para mulheres, muitas vezes a preços mais elevados do que os equivalentes masculinos. Esta prática tem sido cada vez mais criticada por ativistas, que argumentam ser uma forma de discriminação de gênero e exploração financeira das mulheres. 

A prática foi amplamente discutida na mídia após uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) em 2016, revelando que os produtos com embalagens cor- de rosa para mulheres custavam em média 12% a mais do que os produtos equivalentes com embalagens azuis. A prática, além de reforçar o estereótipo social de que a mulher é consumista, impacta negativamente as finanças de uma classe que, apesar de pagar mais pelos seus produtos, ganha em média 22% a menos que os homens, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

O estudo realizado pelo IDEC gerou indignação em todo o país,  motivando uma série de ações e discussões sobre o assunto. A partir disso, foi criado o Projeto de Lei 4.240/2019, que proíbe a cobrança de preços diferentes por gênero em serviços e produtos. Ainda assim, a taxa rosa continua sendo uma prática comum em muitas lojas e comércios em todo o mundo. 

As empresas que praticam a taxa rosa geralmente justificam a diferença de preços entre produtos para homens e mulheres com a diferença de custo de produção, alegam que os produtos para mulheres têm custo adicional por causa da embalagem e marketing. Informam que, por possuírem maior demanda e especificidade, obrigam as empresas a cobrarem preços mais elevados.  

Essas justificativas são frequentemente questionadas por especialistas e ativistas. Thatiane Piscitelli, coordenadora do grupo de estudos Gênero e Tributação da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), afirma que a parcela da população que possui um rendimento inferior, também é mais prejudicada, pois utiliza todo o valor recebido para consumir produtos básicos: “Essas pessoas são tributadas integralmente na sua renda, então, proporcionalmente, o mais pobre paga mais. Quando a gente olha para a pirâmide de distribuição de renda no Brasil, quem são as pessoas mais pobres? São as mulheres e, especificamente, as negras”. 

Além da fiscalização intensiva de órgãos de defesa do consumidor contra a prática, a conscientização social sobre o problema para que se denuncie a “taxa rosa”, uma vez que é uma prática constitucionalmente ilegal, afim de atenuar este ônus social que persegue o gênero feminino. A diferença de preços, além de inconstitucional, não é justa, pois perpetua a desigualdade de gênero., A discriminação também está escancarada na alíquota de impostos de produtos de uso predominantemente feminino, como: absorventes menstruais e tampões (27,25%), coletores menstruais (33,75%) e, pílulas anticoncepcionais (30%), que são mais taxados que fraldas geriátricas (9,25%), preservativos (9,25%) e Viagra (18%). 

A consequência das altas alíquotas na tributação de absorventes é transformar um produto de uso essencial, em um item inacessível para uma parcela da sociedade. A falta de acesso a itens básicos de higiene íntima, revela uma situação comum entre pessoas que menstruam no Brasil, a pobreza menstrual. O Instituto de Pesquisa Locomotiva, em parceria com a marca de absorvente Always, aponta que 52% das pessoas que menstruam já sofreram com a pobreza menstrual e 35% afirmam que a compra de itens de higiene pessoal pesa na renda mensal.  

Segundo dados divulgados pelo o IBGE, cerca de 29,4% da população brasileira vive na linha de extrema pobreza, que, por definição do Banco Mundial, corresponde a uma renda mensal de R$ 168. Eliane, uma mulher em situação de vulnerabilidade, comenta sobre sua indignação com a falta de acesso aà itens essenciais de higiene feminina. “Nos postos em que distribuem preservativos, também poderiam distribuir absorventes, né? Os homens são protegidos de tudo, enquanto nós passamos o  vexame de usar panos para nos limpar.” 

Em 2022, o Governo Federal aprovou uma lei que deu início ao Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, para assegurar o acesso gratuito ade  absorventes e outros cuidados básicos de saúde menstrual para mulheres vulneráveis e de baixa renda, mas nenhuma ação foi tomada até o momento. Por esse motivo, o trabalho de organizações como o “Fluxo Sem Tabu” é essencial para restaurar a dignidade de milhares de brasileiras na  luta contra a pobreza menstrual.  

A fundadora do “Fluxo Sem Tabu", Luana Escamilla, reforça que a dignidade menstrual é uma questão de saúde pública e falta de informação sobre o nosso próprio corpo. “A higiene menstrual é uma questão de saúde pública que foi silenciada por anos. Nós temos que falar sobre nossos corpos, sobre menstruação e higiene. A desinformação e a falta de itens básicos já afetaram e continuam afetando a saúde de milhares de mulheres e pessoas que menstruam em situação de vulnerabilidade social. O ‘Fluxo Sem Tabu’ acredita que nada deveria impedir alguém de mudar o mundo e vamos continuar na luta pelo fim da pobreza menstrual.” 

O projeto faz ações para facilitar o acesso aos absorventes, promovendo a dignidade menstrual. O programa “Fluxo todo mês” distribui itens de higiene íntima para três regiões do Brasil: Norte, Nordeste e Sudeste, além de promover rodas de conversa com especialistas e acompanhar o desenvolvimento de cada comunidade atendida. Em Paraisópolis, zona sul de São Paulo, deu início ao projeto-piloto “Vending Machine", uma máquina que distribui absorventes de forma gratuita e atende mais de 400 beneficiadas. Enquanto essas pessoas não tiverem o apoio e proteção do Governo Federal e as alíquotas enxergarem itens de higiene pessoal como supérfluos, cada ação faz diferença.  
 

Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirma que aumento da faixa de isenção vai dar maior poder aquisitivo à população mais vulnerável
por
Henrique Alexandre
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28/04/2023 - 12h

Depois de meses de debate, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, confirmou nesta sexta-feira, 28, que o governo vai aumentar a faixa de isenção do Imposto de Renda para Pessoas Físicas (IRPF). Anteriormente, quem tinha o direto a isenção eram profissionais que recebiam até R$ 1.903,98. Agora, o valor máximo para a renúncia do imposto é de R$ 2.112,00, mas, para quem recebe o valor de R$ 2.640,00, haverá um desconto de R$ 528 sobre o imposto pago na fonte.

Segundo o governo, essa medida é momentânea e a intenção é de que até o final do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a faixa de isenção chegue em R$ 5.000,00.

“Há o compromisso do presidente Lula de isentar do IR salários de até R$ 5 mil, até o fim do governo. Por enquanto, os salários de até R$ 2.640, a partir de 1º de maio, não terão retenção do IR. Durante o mandato, vamos voltar a falar de isenção quando a condição econômica permitir”, disse o ministro em cerimônia de assinatura do reajuste salarial dos servidores do Executivo Federal.

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Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, diz que a medida “ajudará muito” no poder aquisitivo da classe trabalhadora – José Cruz/Agência Brasil

 

BRASILEIROS BENEFICIADOS

Com a medida, 13,7 milhões de brasileiros já deixarão de pagar o IR a partir do mês que vem, de acordo com informações da Secretaria da Receita Federal. Este número representa  quase 40% dos contribuintes.

O trabalhador não precisará tomar nenhuma medida para garantir a isenção. Isso porque, segundo a Receita Federal, a isenção será concedida de maneira automática.

As projeções do órgão mostram que o governo deixará de arrecadar R$ 3,2 bilhões neste ano. Em 2024, o valor renunciado será de R$ 6 bilhões.

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Presidente Lula tenta colocar em prática promessa de campanha relacionada ao IR - José Cruz/Agência Brasil

 

AUMENTO DO SALÁRIO MÍNIMO

Em relação ao salário mínimo, o ministro do Trabalho disse que só falta a assinatura do presidente Lula para o valor de R$ 1.320,00 entrar em vigor – atualmente, a base salarial é de R$ 1.302,00. O aumento foi decidido depois da reunião do atual presidente com centrais sindicais e a equipe econômica, nesta quinta-feira (27).

Segundo Paulo Marinho, o governo conversará com o Congresso para que, a partir de 2024, a valorização do salário mínimo leve em conta a inflação do ano anterior e também a variação do PIB de dois anos antes.

Decisão do Banco Central de manter Selic em 13,75% revela conflito entre duas visões antagônicas
por
Enrico Souto e Thaís Leoni
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28/04/2023 - 12h

“É só ver a carta do Copom para a gente saber que é uma vergonha a explicação que deram para a sociedade brasileira”, afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante posse de Aloizio Mercadante na presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O atual Presidente da República tem assumido com força, desde o início do seu mandato, um tom combativo contra o Banco Central que, através do Comitê de Política Monetária (Copom), decidiu por unanimidade, em duas reuniões consecutivas, manter o nível da taxa Selic em 13,75%, onde se encontra estacionada desde agosto de 2022.  

Quase três meses depois da primeira reunião do Copom, os atritos entre Lula e Roberto Campos Neto, presidente da autoridade monetária, só fizeram piorar. Para Lula, estabilizar a taxa em um patamar tão elevado, em um momento tão crítico para a economia brasileira, é um descaso com a população. Ele chegou, inclusive, a questionar a legitimidade da autonomia do BC, afirmando que seria do interesse de empresários manter os juros altos. 

 

Aliados do presidente reforçaram suas críticas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acredita que “houve uma reação do Banco Central às atitudes do governo anterior no período eleitoral, que ensejou aumento da taxa de juros”. Já Simone Tebet, ministra do Planejamento e Orçamento, fez um apelo ao BC, pedindo por “um gesto positivo, a favor do Brasil” 

 

A taxa Selic 

A Selic, é a taxa básica de juros de economia, sendo um valor referencial para fixação de juros cobrados por instituições financeiras. A sigla remete ao Sistema Especial de Liquidação e Custódia. Seu sistema é uma plataforma do Banco Central, em que são realizadas as operações de compra e venda de títulos federais. A oferta dos títulos é como se o Estado estivesse pegando empréstimos com investidores (pessoas físicas, bancos ou empresas) para pagar suas dívidas.  

Na prática, a média dos juros cobrados do governo pelo dinheiro que foi emprestado é a taxa Selic. Para o Banco Central, ela é a principal ferramenta para o controle de inflação, e interfere diretamente no uso de crédito e na tomada de empréstimos. Quanto mais alto os juros, maior o custo para pegar dinheiro emprestado, assim, cria-se uma pressão para redução do consumo. 

 

 

 

Se ocorre uma diminuição de demanda pela aquisição de bens e serviços, a tendência é que a inflação caia ou entre em estagnação.  

Apesar do veredito do Copom, que decidiu manter a Selic em 13,75% pela quinta vez consecutiva, Lula declarou que continuará lutando para que não aconteça esse aumento. Ele classifica a taxa como absurda e afirma que o país não tem inflação de demanda, o que impactou no mercado de tal forma que a curva de juros e câmbio se modificou.   

De acordo com o Copom, a decisão de manter a Selic tem se dado porque existe um cenário turbulento na economia e no sistema bancário global, o que pode causar pressão para as questões inflacionárias globais. O arcabouço fiscal e a inflação ao consumidor também são uma preocupação. 

 

Por trás do conflito 

Para Marcos Henrique do Espírito Santo, professor e mestre em economia política, a motivação para a definição da taxa Selic está na visão econômica do Banco Central, que ainda é muito ortodoxa. “A organização se apoia em um receituário monetarista, que enxerga na inflação um dos únicos problemas da economia. Então, com o argumento de conter a inflação, a taxa de juros é elevada, que é um modus operandi posto em prática desde a pandemia”, afirma.  

Entretanto, de acordo com ele, essa não passa de uma falácia. O argumento seria que a taxa de juros controla a inflação que, baseada na demanda, cresce conforme o consumo aumenta e o mercado se aquece. “Mas a inflação com que lidamos no Brasil hoje tem origem em oferta e custos – no choque entre o petróleo e outras commodities, por exemplo – e, nesse caso, o controle que a taxa de juros teria é pequeno”, pontua 

Segundo Marcos, o conflito também revela fortes interesses políticos. “Hoje, o Brasil é o maior pagador de juros do mundo, o que faz com que, para os grandes investidores, o país tenha se tornado um verdadeiro paraíso financeiro. E, como a liderança do BC sempre tem uma relação íntima com os bancos, essa taxa se torna uma conveniência”, acrescenta. 

Sendo assim, a curto prazo, a diminuição da taxa Selic sinalizaria o barateamento do crédito no país, abrindo espaço para que a roda da economia volte a girar, sobretudo no varejo, que é um dos setores mais afetados por este contexto, como mostrou o caso Americanas. “Agora, a longo prazo, aí sim, a diminuição da taxa Selic pode ser um excelente auxiliar para o crescimento econômico”, avalia.  

Marcos conclui reiterando que, dentro da economia, não existem julgamentos morais, como ‘certo’ e ‘errado’, e sim matrizes teóricas diferentes e, a partir do choque entre elas, ditarão quais interesses ganham e quais perdem: “Nesse caso, o conflito se estabelece entre quem está a favor de um diagnóstico que beneficia o mercado financeiro, e quem está a favor do crescimento econômico, da distribuição de renda e de um maior investimento pú

Lojas de fábrica e menores despesas com aluguel e marketing estão entre os fatores que tornam os produtos no bairro mais acessíveis
por
Anna Cecília Nunes
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28/04/2023 - 12h

Os preços das roupas variam de país para país e dependem de uma série de fatores, como a demanda, o custo de produção, os impostos e as políticas de comércio. No entanto, os preços de roupas no Brasil frequentemente são mais  elevados do que em alguns outros países, devido a uma combinação de fatores, como a alta carga tributária, a falta de competitividade no mercado devido à escassez de concorrência em algumas áreas e o custo de transporte e importação.   

Além disso, o valor do dólar em relação ao real também pode afetar o preço das roupas importadas, tornando-as mais caras para os consumidores brasileiros. Na edição mais recente do Índice Zara –  pesquisa realizada pelo banco BTG Pactual que compara os preços de produtos vendidos pela marca Zara em diversos países do mundo –, o Brasil ficou em segundo lugar, perdendo apenas para a Turquia. Algumas regiões, no entanto, continuam sinônimo de roupas acessíveis, como o bairro paulistano do Brás.  

O presidente da Alobrás (Associação de Lojistas do Brás), Fauze Yunes,  explica por que as roupas de lá são mais baratas. Segundo ele, a economia do Brás funciona normalmente, ou seja, dentro da legislação que rege o comércio formal. “De maneira geral, as roupas possuem preço bom, ou mais barato do que na maioria dos lugares, porque muitas lojas do Brás são lojas de fábrica, o que permite praticarmos melhores preços”, diz Yunes. 

Pessoa vendo o preço de uma roupa.
População mais pobre procura alternativas para fugir da inflação das roupas - Créditos: Skaman 306   
 

De acordo com o dirigente, comparadas às roupas da Zara, existem outros fatores que fazem com que seja mais barato comprar no Brás, como as menores despesas dos lojistas em itens como marketing e aluguel. “O Brás massivamente é um comércio popular a céu aberto”, observa Yunes, acrescentando que, por esse motivo, os comerciantes da região não têm os mesmos custos que os instalados em shopping centers.  

Jackson Barbosa de Oliveira, 55, é comerciante no Brás e explica o que permite que os lojistas vendam as peças de roupas mais baratas que em outros lugares. “Os impostos são reduzidos devido à concentração de boxes na mesma região. Lugares que deveriam ser uma loja se transformam em vários boxes.  Isso reduz os impostos, que são divididos entre pequenos empreendedores.