A individualização política das mulheres e a realidade feminina no Brasil
por
Leticia Falaschi
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14/04/2025 - 12h

Ainda nos últimos meses de 2024, uma trend tomou conta das redes sociais como o TikTok e o Instagram. As tradwifes (abreviação que vem do termo em inglês Traditional Wifes, ou esposas tradicionais, no português) ganhou espaço entre as recomendações de algoritmos ressaltando o estilo de vida conservador exibido por essas influenciadoras. Até hoje hashtags e vídeos têm milhares de curtidas: suas rotinas romantizadas preparando a comida e cuidando dos filhos, claro, que com as roupas e maquiagem sempre intactas geram numerosos comentários de mulheres desabafando como essa seria a vida dos sonhos. O que vem preocupando estudiosos da sociedade é a permanência insistente desse movimento como objeto de desejo e a relação que ele estabelece o como momento político vivido. O que significa tantas mulheres querendo abdicar de suas vidas profissionais e externas ao lar?

Primeiramente, é necessário entender que o papel da mulher e as relações de gênero sempre foram uma questão para todas as sociedades. Durante a história, principalmente ocidental e em países colonizados, as mulheres se viram na posição de adaptar-se e lutar por espaços, mas os processos históricos não são lineares, e não esbanjam progresso durante o percurso. Em entrevista à AGEMT, Maria Eduarda Araújo Guimarães, doutora em Ciências Sociais pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), conta sobre os passos analisados na percepção social do feminino.

"Essa argumentação da naturalização do papel de gênero é muito fortalecida. Essa ideia de que o papel da mulher é estar ao lado do homem contribuindo, mesmo que não seja por vias econômicas e políticas, sempre esteve presente na luta das mulheres, nunca foram superadas”, afirma Maria Eduarda. 

Ilustração mulher "tradwife"
 foto divulgação: flickr/SportSuburban

Muitas das mulheres que desejam esse estilo de vida carregam um cansaço, mesmo que inconsciente. Ainda hoje, a maioria das figuras femininas ainda estão responsabilizadas pela dupla jornada: o trabalho externo, que requer o deslocamento, e os trabalhos domésticos. São muitas horas e preocupações a mais do que boa parte dos homens. Maria Eduarda comenta sobre essa relação: “Você pode até ter uma relação equalitária entre um homem e uma mulher, os dois chegam do trabalho e nenhum vai lavar a louça, mas a mulher vai ficar com peso na consciência... no fundinho de seu ser vai ter um fundo de culpa”.

A entrevistada aponta, especialmente para o cenário brasileiro, o fator do desprezo do trabalho manual, devido as raízes coloniais: “o fato de que nós fomos o país que mais teve escravizados e que mais demorou para libertá-los, traz uma visão muito negativa para o trabalho doméstico. O Brasil não se fundou numa ética do trabalho. A gente desvaloriza o trabalho manual, a pessoa que o faz é desqualificada, mesmo que seja para nós”, ressalta.

Da inferiorização, involuntária e imperceptível, nasce essa angústia, esse fardo. E então, uma boia furada no meio do oceano parece ser uma solução. É necessário compreender que, quando falamos de configurações tradicionais de família, há uma hierarquia que não envolve somente as pessoas que a compõem. Boa parte das influenciadoras que postam esse tipo de conteúdo ficam apenas com o papel de supervisora: ela cuidará dos filhos enquanto uma outra mulher (paga pelo homem provedor financeiro) que fará o trabalho pesado. Em solo brasileiro, questão fica ainda mais profunda: a quantidade de homens que ganhem o suficiente para prover uma família nesses parâmetros é ainda mais difícil. "É um fenômeno branco, pelo menos no Brasil”, diz a entrevistada.

É quase inevitável não relacionar a “volta” triunfal dos moldes tradicionais de família com as ondas conservadoras e de extrema direita que vemos acompanhando. Apesar dos progressos coletados desde as revoluções culturais dos anos 1960 não foram absolutas. Uma possível atribuição para o sucesso das tradwifes é a necessidade de encaixar-se num nicho, num estilo de vida, demanda gerada pela sociedade extremamente on-line. Num mundo onde se pode ser tantas coisas, surge a insegurança na autonomia, muitas vezes calcada nas realidades femininas no mercado de trabalho: “Toda essa dificuldade que as mulheres enfrentam, fazer uma faculdade, mestrado, doutorado e mesmo assim isso não vai significar uma autonomia financeira. É um caminho mais fácil, ilusório, de as mulheres se sentirem protegidas, amparadas... essa ilusão, ao olhar para os EUA, programas de televisão, acabam gerando uma tentativa de mimetização sem levar em conta as com as diferenças das matrizes culturais”, analisa Maria Eduarda.

É curioso analisar como as ondas conservadoras se apropriam das redes sociais com tanta eficácia. Uma onda de mulheres votadas a abdicar de suas vidas profissionais e políticas é minimamente vantajoso aos que vem pregando esse movimento, há muito tempo, antes do TikTok. “sempre vai existir esse jogo de questionar o papel da mulher na sociedade... o que muda é a nomenclatura, é uma repaginação das redes sociais... O que elas trazem nesse discurso de diferente é que elas não estão ali por falta de escolha... e aí a questão de submissão é parcialmente maquiada”, explica Maria Eduarda. “Isso é um discurso para as redes sociais, nenhuma dessas mulheres vai mostrar que apanhou do marido porque ela não fez o que era esperado dela, ela vai expor o que é positivo dessa questão”.

É a figura do homem que está no controle da vida de todos, a mulher somente terá essa vida provida enquanto ele permitir. É ele quem terá maior poder para violentá-la psicologicamente, fisicamente e patrimonialmente. “Quem tem o poder econômico sempre tem o poder... é muito interessante essa volta conservadora, essa ideia de que a mulher é inimiga: nunca criticando a abolição do divórcio, que é criticada na bíblia, e a volta do adultério com crime... é questionável o ‘cara’ conservador que anda com a bíblia debaixo do braço, mas já está na quarta esposa”.

Documentário I’m Not a Robot instiga o telespectador a refletir sobre a evolução das máquinas
por
Vítor Nhoatto
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08/04/2025 - 12h

Não sou um robô, uma etapa de checagem comum ao navegar na internet e uma sentença obviamente verdadeira, ou talvez não. O curta-metragem de co-produção holandesa e belga de mesmo nome, problematiza o chamado teste Captcha, quando a protagonista Lara (Ellen Parren, produtora musical, entra em uma crise existencial ao não conseguir provar sua humanidade.

Logo de cara o enredo de Victoria Warmerdam, também diretora da obra,  pode parecer apenas cômico, e a interpretação de Parren colabora para essa atmosfera. Os diálogos curtos e a indignação diante de uma suposta certeza de Lara prendem a atenção do telespectador ao fazer com que haja identificação com a situação. Provavelmente todos nós já erramos um destes testes simples em algum momento.

A história com pouco mais de 20 minutos continua com a indicação que a personagem tem a chance de ser 87% um robô, segundo um quiz online, e a essência incômoda da ficção científica começa a reluzir. Conversas entre humano e máquina existem há cerca de 60 anos, com a criação do chatbot Eliza, e com o avançar dos anos é cada vez mais comum, de fato.

Seja aquele número para marcar consultas ou o serviço de atendimento ao cliente das operadoras, a Inteligência Artificial rodeia as esferas da vida cotidiana e vem evoluindo rapidamente. Tome como exemplo o robô humanoide que já foi capa de revista e é considerada cidadã saudita, Sophia, da Hanson Robotics desenvolvido em 2015. Ou ainda os influencers virtuais com milhões de seguidores do Instagram hoje como a carismática Lu da empresa de varejo brasileira, Magazine Luiza.

Robô Sophia
Sophia foi inclusive ao Talk Show do apresentador norte-americano Jimmy Fallon - Foto: Hanson Robotics / Divulgação

Parece que a barreira entre o físico e digital, natural e artificial vem sendo quebrada, como aborda a obra de Margareth Boarini, “Dos humanos aos humanos digitais e os não humanos”, lançada em julho do ano passado pela editora Estação das Letras e Cores. O primeiro livro da doutora em tecnologias da inteligência e mestre em comunicação se aprofunda nesses casos de coexistência entre robôs e pessoas, porém, até onde se sabe as diferenças entre máquinas e humanos são perceptíveis, ainda. 

Mas como uma boa teoria de ficção científica, o documentário explora justamente um possível futuro da humanidade, em que máquinas e humanos serão indistinguíveis, A saga de Lara por respostas acaba com a revelação de que Daniël (Henry van Loon), marido da personagem, a encomendou sob medida há alguns anos, como se faz com uma roupa hoje.

Suas memórias, sentimentos e até mesmo relações com outras pessoas, ou robôs, são todas fabricadas, como uma versão muito mais avançada do robô Sophia. A comédia permeia a narrativa um tanto quanto impensável aos olhos de hoje, mas curiosa. A seriedade da executiva da empresa que fabricou Lara, Pam (Thekla Reuten) cria uma atmosfera cômica ao assunto, completada pela tranquilidade que Daniël fala sobre sua “aquisição”.

Parren entrega uma atuação que transborda indignação, e o trabalho cinematográfico é inteligente, com cortes que acompanham a visão de Lara. Sobre o ambiente que o filme se passa, todas as gravações foram no CBR Building em Bruxelas, e a ambientação feita com cores vibrantes e apenas carros de época no estacionamento propõe um contraste entre antigo e moderno, frio e robótico, quente e humano. 

O desfecho se dá com o desejo da protagonista de ser dona do próprio destino, relegando o fato de não poder morrer antes de seu “dono”. Isso pode ser visto talvez como uma negação em aceitar a única coisa que a diferencia de um humano, ou como uma mensagem da autora da obra sobre uma rebelião das máquinas.

Fato é que Lara se joga do topo do prédio, em um take muito inteligente por parte da direção ao filmar de cima, e que apesar de pesado e grotesco consegue ser engraçado e não desagradável aos olhos. Tal qual uma morte comum, há muito sangue saindo do corpo, as necessidades fisiológicas também são como de humanos, mas após alguns instantes a robô volta à vida.

Lara e Daniel em um Volkswagen Fusca azul
Com cinematografia cativante e enredo inesperado, é um Sci-Fi cômico e dramático - Foto: Indie Shorts Mag / Reprodução

Incômodo e perspicaz são boas palavras para definir a quinta produção de Warmerdam, que a fez faturar uma série de prêmios internacionais incluindo o Oscar de Melhor Curta-metragem deste ano. Sua produção também se destaca por ser carbono neutro, com o plantio de uma agrofloresta na Holanda para compensar as emissões de gás carbônico (CO2) da obra.

I’m Not a Robot está disponível de forma gratuita no YouTube desde o dia 15 de novembro de 2025 no canal The New Yorker, com legendas apenas em inglês ou holandês. Mesmo com essa barreira linguística, o choque final é inevitável, e a reflexão provavelmente também, se o seu cérebro não estiver se perguntando se você pode ser também um robô.

Como o consumo consciente cresceu e se popularizou na sociedade atual
por
Vítor Nhoatto
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27/03/2025 - 12h

Sejam em grandes franquias ou em uma pequena porta em um bairro residencial, os brechós ganham cada vez mais consumidores. As principais razões para isso, preços baixos, maior variedade de peças e personalidade. Mas o efeito ambiental das roupas de segunda mão também é um diferencial e necessidade em tempos de mudanças climáticas, além do seu impacto social.

Ao contrário do que pode parecer pela ascensão recente da atividade, a venda de roupas e artigos usados remete ao século XIX na Europa, onde as chamadas ‘Second Hand Stores’, produtos em geral, e ‘Vintage Clothes Stores', especializadas em peças de época eram comuns. As roupas novas eram feitas a mão, resultando em preços altos e limitando o consumo recorrente as classes mais altas. Diante disso, uma saída eram as peças usadas, com preços menores mas de alta qualidade.

No Brasil, o primeiro do ramo documentado data do mesmo período no Rio de Janeiro, chamado de Casa de Belchior. A loja do viajante francês vendia uma série de itens usados e deu origem ao termo ‘brechó’ inclusive. A contração das palavras ao longo dos anos para facilitar o entendimento e a popularização do local originou o termo brasileiro. 

Ao decorrer dos anos, a atividade cresceu e passou a abarcar outros grupos sociais também, destacando as histórias e individualidade das roupas de segunda mão. Em entrevista à AGEMT, Camila Guerreiro, dona há três anos do brechó Dona Clô, destaca os principais motivos apontados por seus clientes: “As pessoas buscam peças diferenciadas, de boas marcas e por um preço bom”.  

Foi justamente nos últimos anos que o ramo realmente atingiu destaque no país. Segundo relatório de 2021 do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), entre 2010 e 2015 o número de brechós cresceu 210% no Brasil. Além disso, durante a pandemia de COVID-19, de 2020 para 2021, o crescimento foi de 50%. Hoje, o país conta com aproximadamente 118.778 brechós ativos, ainda de acordo com o Sebrae, e as expectativas são de mais crescimento.

Segundo a empresa britânica de consultoria, Global Data, o ramo irá ultrapassar, em 2029, em valor o fast fashion, a indústria da moda tradicional baseada em coleções e produção em massa. Foi a partir dos anos 1970 que a busca por produzir roupas em grande quantidade por um baixo custo tomou forma nos EUA, e hoje marcas como Shein, ZARA e C&A dominam o setor da moda. 

Apesar da popularização do setor, um cenário de consumismo e poluição ambiental massiva se configurou. O setor têxtil fica atrás apenas da indústria petrolífera no quesito poluição ambiental segundo dados do relatório de 2022 da Global Fashion Agenda, destacando a importância de repensar a forma como se consome roupa. 

“Isso deve motivar as pessoas a procurar um brechó, não só pelo preço e por ser uma peça exclusiva, mas por essa sustentabilidade. Não se deveria pensar primeiro em comprar em uma loja tradicional uma peça que todos terão igual e que em meses você não usará mais", afirma Camila.

O comportamento volátil da ‘moda rápida' resulta em um desperdício cada vez maior de recursos naturais, e a consequente poluição pela produção desenfreada e descarte prematuro das peças. A Ellen MacArthur Foundation, criada em 2010 para acelerar a adoção de uma economia circular, estima que 60% das peças sejam descartadas ainda no primeiro ano de uso, e que 85% delas nem sejam recicladas.

Ivone Aparecida, dona do brechó ‘O Legado da Vó’, especializado em roupas de época há 20 anos, destaca a lógica instaurada pela indústria hoje. “Tecidos que antigamente levavam três ou quatro meses para serem lançados, hoje em poucos dias chegam às lojas, e são quase descartáveis, não são pensados para serem lavados e durar”.

Nesse sentido, os brechós são uma alternativa sustentável, uma vez que peças que seriam descartadas ainda em condições de uso, ganham nova vida, um incentivo para a mudança de pensamento em relação ao vestuário. Esse prolongamento da vida útil das peças resulta na diminuição da degradação ambiental, ocasionando para o armário de um consumidor de brechó uma pegada de carbono mais baixa.

Além disso, um dinheiro que seria gasto com essas grandes multinacionais poluentes passa a circular nos bairros, impulsionando a economia de base. Segundo o Sebrae, 78% dos negócios do ramo são MEI (Microempreendedor Individual), e 21% micro ou pequenas empresas, culminando no impacto econômico da atividade para o comércio local. Há geração de empregos, desenvolvimento econômico das regiões da cidade e diminuição da necessidade de deslocamento da população para áreas centrais.

Toda a sociedade sente o impacto da atividade, que carrega em si a proposta de uma outra relação com as roupas que se usa. “O brechó é moda sustentável, você ressignifica as peças e pode usar até passar de geração para geração, uma roupa que tem história por trás ”, finaliza Ivone.

Brechó O Legado da Vó
Cada vez mais brechós tomam conta das cidades, e praticamente tudo pode ser encontrado - Foto: Vítor Nhoatto

 

O prazer efêmero da compra logo dá lugar a um vazio crescente
por
Giovanna Montanhan
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12/11/2024 - 12h

Por Giovanna Montanhan

 

Abrir o TikTok é como piscar e ver o mundo mudar em uma fração de segundos. Em uma rolagem veloz, surgem truques para uma maquiagem glow, táticas para uma “pele de porcelana”, segredos para esconder as olheiras com batom vermelho e até dicas para um contorno "ideal" feito com utensílios de cozinha. Uma técnica “nunca antes vista” de delineado usando apenas um grampo de cabelo, uma máscara capilar líquida que permanece nos fios por míseros segundos e que “repara até a alma” — tudo parece essencial, urgente. De um lado, surge uma técnica viral que promete lábios mais volumosos usando apenas corretivo e gloss, aplicados estrategicamente para criar a ilusão de lábios carnudos e esculpidos; do outro, alguém massageia o rosto com um Gua Sha, uma técnica tradicional de origem chinesa que utiliza uma pedra para esculpir a face, de quartzo rosa recém-adquirida, prometendo desinchar o rosto em poucos minutos. A tela se enche de novas promessas a cada hora em que o aplicativo é aberto, como o colágeno em pó que, misturado na água, garante uma dose de juventude pelas próximas décadas, ou a aplicação de blush no nariz para dar aquela falsa sensação de que se esteve na praia e se queimado, e até mesmo o sérum coreano feito de mucina de caracol para uma pele supostamente mais firme e hidratada. Cada dica desponta como um raio no feed, iluminando tudo ao seu redor por um instante, apenas para ser engolida pela próxima febre que chega avassaladora, tornando a moda anterior esquecida antes mesmo de ser assimilada.

No território implacável das redes sociais, onde promessas de uma pele impecável e uma beleza reluzente se espalham como um feitiço, mulheres de todas as idades deslizam os dedos na tela em busca de um brilho que pareça emanar de dentro para fora. Cada toque, cada deslizar, aproxima as compradoras de um ideal escorregadio, um reflexo de perfeição, sintetizado na imagem da pele viçosa perfeita — tão brilhante e lisa quanto um donut vitrificado, idealizada pela marca Rhode, da modelo Hailey Bieber.

Mas essa busca pela beleza aparentemente simples não é tão doce como parece. As consumidoras, atraídas pelos vídeos de influenciadoras, são envolvidas por um mercado que promove o “Glazing Milk” e os “Peptides Lip Tints” como a chave para a pele e os lábios dos sonhos. Não se trata apenas de hidratar, de cuidar ou de valorizar o que já existe, mas de transformar, de reconstruir, de alcançar um brilho irreal que reflete expectativas impossíveis. Para muitas, o desejo por essa pele vitrificada é como um chamado, uma chance de fazer parte de um ideal estético que atravessa culturas, idades e contextos, porém inacessível para a maioria.

No Brasil esse sonho assume ares de luxo proibido. Sem distribuição oficial, os produtos da Rhode se transformam em verdadeiros tesouros a serem caçados em mercados paralelos, frequentemente repletos de riscos. Para experimentá-los, os brasileiros precisam superar o desafio da importação, enfrentando preços inflacionados e longas esperas. Quanto mais distante o sonho, mais intensamente ele é desejado. Em um contexto onde a estética perfeita é exaltada acima de tudo, esses itens de design minimalista tornam-se uma espécie de Santo Graal — símbolos de um ideal que poucos conseguem vivenciar diretamente, mas que muitos cobiçam com olhares ávidos.

Não são apenas os hidratantes e lip tints da Rhode que repousam nesse altar de desejo inatingível. O Lip Glow Oil da Dior, envolto em promessas de lábios irresistíveis, reflete um brilho de glamour que atiça os corações, enquanto a Rare Beauty de Selena Gomez, com seus blushes e iluminadores, embriaga o imaginário dos mais jovens. Há algo mágico, quase sedutor, nesses frascos delicados, como se cada camada de produto pudesse transformar a pele em uma tela de sonhos, oferecendo uma beleza que parece brotar sem esforço algum. Cada uma dessas embalagens repousa no nécessaire com uma falsa simplicidade, promovido com tamanha precisão que passa a impressão de que esses pequenos luxos são mais que desejos — são quase como amuletos, indispensáveis no ritual silencioso de buscar, no reflexo, um toque de perfeição que talvez nunca se alcance.

A obsessão pelo "glazed look" transcende o próprio produto. Não se trata de um efeito milagroso na pele ou da suavidade nos lábios; é uma busca por alinhamento com um ideal, uma concepção vendida como pura, mas que, na verdade, carrega o peso do consumo incessante. Influenciadores, com seus vídeos cuidadosamente editados, se tornam os arautos dessa estética quase mítica, revelando apenas fragmentos do que os produtos prometem, sem expor o verdadeiro custo envolvido. Enquanto isso, do outro lado da tela, um exército de seguidores desliza, em busca do próximo vídeo, da nova promessa — na esperança de transformar um sonho distante em uma realidade tangível, ainda que efêmera.

O TikTok, com seu algoritmo hipnotizante, tornou-se uma vitrine onde milhares de consumidoras mergulham em tutoriais e resenhas, investindo tempo e dinheiro na promessa de uma pele reluzente. Entre elas, há quem se pergunte até que ponto esse ritual em frente ao espelho reflete uma busca legítima pela autoestima ou se é apenas mais uma ferramenta do capitalismo que usa o desejo por aceitação e inclusão para alimentar o consumo excessivo.

É como uma trilha de pequenas confissões, uma corrente de desejos transformados em mercadoria. Em cada vídeo, em cada review impulsionado por essas marcas silenciosas, há mulheres que, ao deslizar a tela e ceder ao apelo das tendências, começam a ver suas rotinas, seus sonhos e até seu próprio reflexo se curvarem a um padrão escorregadio e volátil.

Júlia, Helena e Rayssa são alguns exemplos de meninas que compram de acordo com a tendência do momento no TikTok. Cada uma mora em um estado diferente, mas, enquanto falavam, era como se compartilhassem uma mesma inquietação, algo que transcende a distância e parece habitar um espaço comum entre elas. Com apenas 13 anos, Júlia, mais tímida, confessou que, para ela, comprar os produtos da moda trazia uma sensação de pertencimento que era difícil de encontrar em outros lugares. Ao adquirir aquele item desejado, sentia-se mais próxima das meninas que possuíam o mesmo, como se o produto fosse um passaporte invisível para um mundo onde todas compartilham os mesmos desejos e sonhos de consumo. Com um brilho tímido no olhar, contou sobre seu exemplo mais recente: um kit de pinceis da marca Real Techniques — algo que, segundo ela, todas no TikTok pareciam ter e que, de alguma forma, a fazia sentir-se parte de algo maior.

Com 15 anos, Helena, um pouco mais falante, descreveu a experiência de outra forma, embora a sensação de efemeridade fosse a mesma. Para ela, o ato de consumir a aproximava de suas amigas e da comunidade online, mas logo após a compra surgia um vazio incômodo, como se a satisfação fosse rapidamente substituída por uma nova tendência, já à espreita. "É um ciclo sem fim," disse ela, quase resignada, enquanto mencionava sua última aquisição: o pó facial rosa da influenciadora Karen Bachini, um item que ela não parava de ver nos vídeos e que parecia indispensável — até o próximo lançamento roubar a cena.

Com 17 anos, Rayssa, em silêncio até então, finalmente desabafou. Revelou que, todas as vezes que se olhava no espelho, sentia-se como se tentasse capturar o brilho das influenciadoras do TikTok. Mesmo quando conseguia comprar o que tanto desejava, o resultado nunca parecia corresponder ao ideal que via na tela. Em momentos assim, questionava-se se a falha estava nela — como se algo em sua pele, no olhar, ou até em sua própria essência não fosse suficiente para refletir a promessa vendida pelos produtos. Esse sentimento de cobrança, explicou, era quase constante, uma frustração que a fazia sentir-se cada vez mais distante de um ideal inatingível. Sua última compra foi o sérum bronzeador da marca Drunk Elephant, o D-Bronzi Anti-Pollution Sunshine Drops, um item que, como tantos outros, prometia uma transformação que parecia sempre escapar ao seu alcance.

Para elas, o ato de comprar não é apenas um impulso passageiro; traz um alívio momentâneo em uma busca que nunca se completa. Mas logo vem o vazio, uma percepção incômoda de que estão presas a um ritual estranho, onde o consumo é apenas uma dança repetitiva, uma tentativa de tocar algo que escapa. Muitas se encontram no eco numa pergunta inevitável sobre o motivo de não conseguir o mesmo resultado. Como se o erro fosse delas, como se algo na pele, no olhar, ou na própria essência falhasse em alcançar o brilho prometido — um ideal cuidadosamente desenhado para permanecer fora de alcance.

É nesse cenário tentador que se ergue o submundo da Internet, uma espécie de mercado paralelo onde a pressa e o desejo encontram uma nova morada. Para aqueles que não podem ou não querem esperar, marketplaces como a Shopee e a Shein surgem como atalhos — labirintos digitais onde os produtos cobiçados aparecem como ofertas tentadoras, à mercê de vendedores anônimos que se escondem atrás de telas e avatares. Ali, a ansiedade dos consumidores é alimentada com preços reduzidos, porém envoltos em uma névoa de incerteza se o brilho do produto é real, ou apenas uma sombra de autenticidade. Entre o clique e a compra, uma escolha silenciosa é feita — e talvez, para muitos, a necessidade de pertencer ao momento sobrepuje o valor da própria verdade.

Capitalismo

Em uma conversa descontraída o colunista do site Steal the Look, Fábio Monnerat, falou sobre o frenesi que envolve a busca pela beleza idealizada, uma obsessão que, segundo ele, vai além do simples desejo por bons produtos. Ele acha que há uma necessidade de pertencimento, um desejo de aceitação que se esconde por trás de cada nova compra, como se cada aquisição trouxesse consigo um pouco mais de identidade, um passo a mais em direção a um grupo invisível e desejado. Fábio disse enxergar essa ilusão de exclusividade como uma corrente invisível, prendendo o público em um ciclo sem fim, onde o limite entre querer e precisar se desfaz. Nas redes sociais, o ideal de beleza está sempre ali, próximo e sedutor, mas estranhamente fora de alcance, criando um desejo que se mantém sempre vivo. E vai além.

Ele aponta que conter essa maré de consumo desenfreado soa quase como um desafio impossível. A falta de consciência coletiva torna difícil que as pessoas reflitam sobre o impacto de cada compra. Assim, o consumo se transforma em um reflexo do próprio desejo não resolvido, uma repetição constante que nunca traz a satisfação esperada. Para ele, cada nova compra parece inofensiva, mas se transforma em uma onda crescente, que passa despercebida e segue reverberando.

No coração do capitalismo contemporâneo, o TikTok se agiganta, não mais como uma simples distração, mas como um palco onde o desejo se torna espetáculo e o consumo, um ato quase hipnótico. Em cada deslizar de dedo, as consumidoras são lançadas em um torvelinho de tendências, onde as promessas de beleza cintilam como fogos de artifício — intensas, passageiras, inescapáveis. A cada nova febre, o rosto de uma influenciadora parece sussurrar segredos que as espectadoras querem acreditar: uma pele mais luminosa, lábios mais aveludados, o toque de algo quase mágico. Mas é tudo tão fugaz. Produtos que ontem eram o desejo do momento, hoje já perderam o brilho, substituídos por algo "ainda mais revolucionário".

Para essas mulheres, não há descanso. A lógica do hiperconsumo, essa engrenagem que o filósofo Gilles Lipovetsky descreveu, as engole em um ciclo em que o desejo pesa mais que a necessidade, onde o impulso de possuir é atiçado mais pelo medo de perder a novidade do que por uma vontade verdadeira. A cada nova compra, um ritual se repete — uma sensação de satisfação que evapora rápido, cedendo espaço à expectativa do próximo lançamento. E enquanto os frascos se acumulam, um vazio começa a se insinuar, como se, no fundo, soubessem que a próxima tendência também virá, seduzindo-as mais uma vez.

No universo hiperacelerado do TikTok, onde as tendências surgem e desaparecem como reflexos fugidios, as consumidoras são arrastadas para um ciclo quase frenético. Cada novo "must-have" carrega uma data de validade invisível, um convite ao consumo antes que o encanto se esgote. No olho desse furacão está o Carmed, um bálsamo labial produzido pela farmacêutica Cimed, que, embora conhecido por sua hidratação modesta, encanta com suas edições limitadas e colaborações astutas, como a recente parceria com a marca de doces Fini. Versões do bálsamo com sabores de balas de gelatina — banana, dentadura, "Beijos" — evaporaram das prateleiras antes mesmo de alcançarem todas as farmácias, deixando na esteira um rastro de desejo insatisfeito.

Para Helena, que também é uma consumidora voraz de Carmed, a eficácia do produto é apenas um detalhe insignificante. O que realmente importa para Júlia e para quem o consome, é o prazer de possuir um fragmento de algo efêmero, um pedaço da tendência que logo será substituída por outra. Cada lançamento deste produto traz consigo uma promessa de exclusividade, uma sensação de escassez calculada que intensifica o impulso de compra. Nesse jogo de aparências, o Carmed não é apenas um bálsamo; é um lembrete de que, no turbilhão da moda passageira, às vezes o que vale é a experiência fugaz de ser parte de algo que logo deixará de existir.

No emaranhado dos desejos modernos, o consumo de beleza se torna um ritual de encantamento, uma busca ansiosa que reflete mais do que o desejo de uma pele perfeita ou de lábios macios. Fábio Monnerat vê esse cenário com inquietação, especialmente quando o alvo do consumo se desloca para o público infantil. Ele observa, com ceticismo, como produtos de beleza direcionados a crianças e adolescentes, como é o caso do fenômeno do Carmed, onde eles são estrategicamente moldados para enraizar o consumo desde cedo. Com sabores açucarados e colaborações com personagens conhecidos, o Carmed, em suas múltiplas versões, deixa de ser apenas um hidratante labial; ele se torna um emblema de um consumo precoce, uma porta de entrada para um ciclo interminável de desejos e substituições.

Fábio acredita que essa introdução ao consumo desenfreado desde a infância reflete um problema profundo. A indústria da beleza, segundo ele, soube capturar o conceito de autocuidado e transformá-lo em uma sequência constante de compras — não mais um momento pessoal, mas uma dança coreografada pelo mercado. O Carmed e outros produtos semelhantes simbolizam uma sociedade onde o consumo é enaltecido como valor intrínseco, e cada nova edição limitada, cada parceria com um ícone infantil, se torna um capítulo dessa fábula consumista. A ilusão de exclusividade atiça o desejo, e o autocuidado se converte em um ato repetitivo, sem substância.

Enquanto isso, o TikTok acelera essa espiral. Para Júlia, Helena e Rayssa, a plataforma de vídeos é uma vitrine que converte produtos de beleza em pequenos troféus de pertença, um portal onde cada novo sérum, cada nova máscara promete um vislumbre de perfeição. Como no filme  A Substância (2024), onde Elizabeth Sparkle, interpretada por Demi Moore, injeta um líquido espesso e denso na pele na esperança de capturar a juventude que lhe escapa, os jovens de hoje se entregam a promessas tão tentadoras quanto fugazes. A cada nova fórmula, a cada sérum, máscara ou creme milagroso, há uma promessa de transformação que parece deslizar entre os dedos. Eles se lançam nessas poções modernas, cada frasco prometendo que, desta vez, o reflexo no espelho será o que sempre desejaram.

Mas, assim como Elizabeth, que corre atrás de uma ilusão que nunca a satisfaz, esses jovens podem estar caminhando para um abismo de expectativas vazias. A cada compra, um breve relâmpago de satisfação — um brilho que logo se desfaz, um encanto que desaparece com a mesma rapidez com que veio. E então, a necessidade renasce, mais urgente, mais insistente. Em um ciclo que se auto alimenta, o ideal de beleza se mantém distante, quase ao alcance das mãos, mas sempre escorregadio. E nessa busca, a frustração não desaparece; apenas se recalca, pronta para surgir com força renovada a cada nova promessa que o mercado lança na tela.

Fábio acredita veementemente que o verdadeiro papel do TikTok não é conectar, mas vender — impulsionando um consumo desenfreado que atinge até os mais jovens, seduzidos pela promessa de uma juventude prolongada e de uma beleza idealizada.

No fim, a trilha do consumo se revela como uma corrida sem destino, onde o autocuidado se dissolve em promessas e expectativas. Para Fábio, a verdadeira prática de bem-estar foi sequestrada pela lógica de mercado, que transforma cada novo produto em mais um ponto de partida, mais um item na lista de desejos insaciáveis. O autocuidado, nesse cenário, se torna uma pista de corrida onde o consumidor, sempre em busca da última novidade, esquece de parar, de respirar e de redescobrir o que realmente importa. Talvez, sugere ele, o verdadeiro bem-estar exija uma saída dessa trajetória imposta, uma pausa para recobrar o equilíbrio, para lembrar que cuidar de si não precisa ser uma sequência de compras, mas uma escolha pessoal, guiada por um ritmo próprio, alheio às urgências e apelos do mercado. Afinal, os verdadeiros delírios de consumo da Geração Z não estão em cada frasco ou nova tendência, mas na ilusão de que a satisfação virá com o próximo produto.

 

As conexões digitais facilitaram a vida de muitos, mas também abriram brechas inesperadas.
por |
25/09/2024 - 12h

Por Carolina Rouchou

 

O dia era domingo, o mês era Novembro e o ano, 2022. Em um apartamento antigo no Itaim Bibi, agulhas de tricô descansavam sobre uma cadeira de balanço e o cheiro doce de bolinhos de chuva recém feitos preenchiam o ambiente decorado com toalhinhas de crochê e uma raquete de tênis. Na TV, futebol. No sofá, dona Sylvia. O jogo estava próximo de terminar e, para a alegria da telespectadora, o São Paulo já havia feito três gols contra o Goiás. Aos 45 do segundo tempo, o jogador Juan tomou posse da bola na grande área e se preparava para dar o chute final da partida. O telefone toca. Sylvia o desliga imediatamente, nada poderia distraí-la de um possível quarto gol de seu time. Dito e feito, a bola bate na rede e a torcedora comemora.

O telefone toca mais uma vez. Qualquer pessoa que conheça dona Sylvia sabe que a hora do futebol é sagrada, duas ligações seguidas nesse momento era, portanto, um sinal de emergência. Ela atendeu. Tratava-se de uma ligação de seu banco. Poucos dias antes, sua agência havia sido fechada sem muitas explicações e a conta de Sylvia seria transferida para outra unidade. A atendente informou isso por telefone, mas antes de terminar a ligação deu mais uma informação: o gerente da conta de dona Sylvia estava sendo investigado por lavagem de dinheiro e, por isso, a agência teria sido encerrada.

Pouco tempo depois o telefone volta a tocar, mas dessa vez quem estava do outro lado era a Receita Federal em busca de informações sobre o tal gerente. Pediram algumas informações da senhora de 86 anos: com qual frequência ia ao banco, como era sua relação com o gerente, quanto dinheiro ela tinha na conta, se já havia visto algum movimento suspeito na agência etc. Como cidadã exemplar, Sylvia não poupou detalhes, afinal lugar de bandido é na cadeia. Cooperou com as autoridades como pôde e, mesmo assim, pediu desculpas por não saber de muita coisa.

A ligação terminou com uma ordem: Sylvia deveria transferir parte de seu dinheiro para que a Receita pudesse analisar a origem da quantia. Explicaram que seu gerente usava as contas dos clientes para esconder dinheiro sujo e, por isso, precisavam investigar suas economias. A operação que estavam fazendo era secreta e ainda estava em andamento, portanto ninguém, nem mesmo sua família, poderia saber sobre o ocorrido. Com as autoridades ainda no telefone, Sylvia prontamente fez a transferência e agradeceu.

Segunda-feira quem ligou para a residência são-paulina foi a própria Polícia Federal. Ao atender, Sylvia foi avisada que o dinheiro analisado possuía origem ilegal e, enquanto sua inocência não fosse comprovada, ela corria perigo. O policial pediu o WhatsApp dela para facilitar a comunicação. Não era obrigada a informar seu número pessoal, mas a autoridade avisara-lhe que recusar-se a passar tal informação levantaria suspeita e que “ficaria ruim para o seu lado”.

Os dias passavam e Sylvia mantinha contato com a PF por mensagens de texto. Faziam a ela muitas perguntas, passavam atualizações sobre a investigação e pediam que ela fizesse mais transferências. A octagenária fez tudo para provar sua inocência e ajudar a justiça. O policial quis saber se havia jóias. Dona Sylvia era de uma família tradicional paulistana e se orgulhava das peças que herdara de seus avós. Imediatamente, respondeu que sim. O policial pediu fotos e perguntou se ela tinha nota fiscal dos itens. Com peças que antecediam a mudança do século passado, Sylvia informou que não retinha os comprovantes fiscais (afinal estes sequer existiam na época que as joias foram confeccionadas), mas enviou fotos de todas preciosidades que guardava em seu cofre. A conversa terminou com uma mensagem do policial: “Teremos que ir até sua casa para fiscalizar a legalidade destas peças, por favor me envie seu endereço”.

Entre novembro e dezembro Sylvia transferiu mais de vinte mil reais e recebeu as autoridades em sua residência mais de 5 vezes. Nestas visitas a Receita ou Polícia Federal ia para recolher as jóias e outros itens de valor, tudo para provar a inocência da senhora no mirabolante caso do gerente que lavava dinheiro. A operação se encerrou poucos dias antes do natal, quando Sylvia finalmente ligou para seu filho Rodolpho pedindo ajuda, pois não tinha comida em sua casa e estava sem um tostão no bolso.

A realidade é que nunca houve operação alguma. Quem esteve em contato com dona Sylvia nos últimos dias era uma quadrilha criminosa, especializada em golpes via telefone e internet. A agência da vítima fora de fato fechada, mas por questões internas do banco. O tal gerente era inocente e nunca havia sido investigado pela polícia, foi tudo inventado. As verdadeiras autoridades foram imediatamente acionadas, mas não havia muito que pudessem fazer. A família de Sylvia tomou para si a responsabilidade de auxiliar a matriarca. Sua filha Renata entrou em contato com o banco para pedir o dinheiro de volta, mas não obteve sucesso: como as transferências haviam sido feitas pela dona da conta, o dinheiro só poderia ser devolvido se comprovassem a falcatrua.

Graças a um conhecido que trabalhava no banco, o dinheiro foi recuperado quase seis meses depois, mas o dano já havia sido feito. Desde que sofreu o golpe, dona Sylvia entrou em um estado depressivo e abandonou o estilo de vida ativo que vivia. A vítima conta que se culpa por tudo e que passou a se enxergar como uma idosa incapaz. Seu corpo acompanhou sua mente: de quadras de tênis e academias para visitas constantes a hospitais e uma equipe de cuidadores. A família também atribui a drástica mudança de saúde ao golpe que a mãe e avó sofreu. Até hoje o caso segue sem solução. Não se sabe sequer como os estelionatários conseguiram os dados dela ou do gerente do banco. A única prova do ocorrido são as conversas por WhatsApp, em que o grupo utilizava uma foto do logotipo do banco Bradesco. O número utilizado para se comunicar com a senhora foi denunciado e a família tentou entrar em contato com o WhatsApp, mas a empresa nunca respondeu.

A falta de regulamentação no mundo digital abre espaço para que dados pessoais sejam vendidos e compartilhados entre grupos mal-intencionados. Sem se responsabilizar de maneira alguma, as plataformas on-line aceleraram o crime e não aparentam estar dispostas a lutar contra isso. Mesmo quando notificadas pelas autoridades, as redes sociais se recusam a cumprir com a legislação brasileira. Se dona Sylvia e sua família quiserem descobrir quem estava por trás do golpe, talvez devam esperar até que um deles concorra à Prefeitura paulistana.

Doenças mentais são a principal causa de suícidio: entenda como identificar sinais de quem precisa de ajuda
por
Sônia Xavier
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10/09/2022 - 12h

 

O mês de setembro é marcado pelas campanhas em prevenção ao suicído que, embora aconteçam durante todo ano, se intensificam neste mês em tributo ao dia 10, Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio. 

As campanhas tiveram início nos Estados Unidos quando Mike Emme,17, cometeu suicídio em 1944. Mike sofria de sérios problemas psicológicos, mas seus familiares e amigos não perceberam a tempo. 

No dia do velório foi feita uma cesta com muitos cartões decorados com fitas amarelas e dentro deles havia a mensagem “se você precisar, peça ajuda”. Os cartões chegaram realmente nas mãos de pessoas que precisavam de apoio e a partir desta  iniciativa foi dado início a um movimento importante em prevenção ao suicídio. O laço amarelo é usado até hoje como símbolo da campanha. 

 

O laço amarelo é símbolo da campanha contra o suicídio
A cor amarela é usada como símbolo em todas as iniciativas da campanha. Foto: Reprodução/UOL

 

No Brasil a campanha acontece desde 2014, por uma iniciativa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), com o objetivo de prevenir e reduzir os números de suicídio no país. Em 2022 a campanha chega em seu oitavo ano trazendo um novo tema : "A vida é a melhor escolha".

"Precisamos orientar para conscientizar, prevenir e no mês de setembro concentramos os nossos esforços e vamos para a prevenção efetiva do suicídio. A morte por suicídio é uma emergência médica e pode ser evitada através do tratamento adequado do transtorno mental de base", afirma o presidente da ABP, Dr. Antônio Geraldo da Silva. 

Os registros de suicídios no país se aproximam de 14 mil por ano, ou  seja, uma média de 38 pessoas por dia tiram sua própria vida e a maior parte deles está  ligado a transtornos mentais que não foram diagnosticados a tempo ou que são tratados de maneira ineficiente.

Hellen Diana, 20, quase entrou para essa estatística diversas vezes. A primeira delas quando tinha 11 anos de idade e já sofria de depressão. Diana só não virou um número porque em todas as vezes que tentou, foi impedida por alguém, no caso da primeira, pelo seu irmão que na época tinha apenas 10 anos. 

O suicídio é um importante problema de saúde pública, mas, infelizmente, ainda é considerado tabu. O psicoterapeuta Árlon Miqueias aponta alguns sinais em que devemos ficar atentos para, possivelmente, impedir alguém que esteja com pensamentos suicidas "isolamento social, utilização de medicamentos ou drogas, mudança de comportamento, porque ninguém consegue esconder por muito tempo".

Miquéias também salienta a importância de ouvir as pessoas e estar vigilante a potenciais crises “a primeira coisa {a fazer} é ter sentimento de empatia e saber que falta de saúde mental é algo sério. Os próximos passos são não deixar a pessoa só e incentivá-la a buscar ajuda profissional”.

 

Hellen já tentou suicídio diversas vezes
Hellen conta sobre a importância da família no seu tratamento. Foto: Reprodução/ Instagram 

Hoje, a rede de apoio de Hellen conta com, além dos familiares, psicólogo e psiquiatra “Se eu não tivesse minha rede de apoio eu não estaria viva no dia de hoje”, acrescenta. 

Diana conta que a família exerce um papel central no seu tratamento, a preocupação vai além da alimentação, incentivo a práticas de atividades físicas ou com a medicação “ eles se preocupam em relação a tudo, querem me ver sempre bem”. 

Um pouco da história do skate no Brasil e como ele foi arma de resistência no país
por
Gustavo Oliveira de Souza
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28/06/2022 - 12h

O skateboard, uma das modalidades olímpicas e esportes mais praticados no mundo, surgiu nos Estados Unidos por volta dos anos 50 e desde então evolui sua forma de prática até chegar ao Brasil nos anos 70 e se tornar uma das modalidades mais queridas pelos brasileiros. Ele foi inventado como um derivado dos patins e do surfe, já que os primeiros modelos eram de rodas de patins montadas em pranchas de madeiras com os praticantes tentando reproduzir os movimentos do esporte aquático, já que não haviam mais ondas nas praias da Califórnia, local em que o skate apareceu. O esporte começou a ser desassociado do surfe após os jovens descobrirem que era possível praticá-lo em locais de transição como as piscinas, que na época foram esvaziadas devido à grande seca que atingiu todo o estado da Califórnia, e dessa forma surgiu o skate vertical. Ele se tornou uma grande febre pela cultura do “do it yourself” (faça você mesmo), onde se tornou possível construir rampas de madeira em ruas, praças e nos quintais das casas.

 Foto de Bill Eppridge - Life Magazine

Não demorou muito para o Skateboard chegar ao Brasil. No início dos anos 70 ele chegou ao Rio de Janeiro possivelmente trazido por filhos de norte americanos que visitavam o país ou por alguns raros brasileiros que viajavam aos Estados Unidos para surfar, e ele inicia sua trajetória sendo chamado de Surfinho, sendo construído de eixos de patins com rodas de borracha ou ferro pregadas em madeira. Ele se popularizou de maneira rápida no país, com a divulgação sendo feita numa revista voltada para o público jovem que começou em 1972, e em 1976 a primeira pista da América Latina foi inaugurada em Nova Iguaçu no Rio de Janeiro, mas no final da década o skate começou a decair, já que as fabricantes de peças não comercializavam produtos próprios para a modalidade, e os investimentos feitos nos atletas e campeonatos se encerrou, mas os que ainda praticavam o esporte construíam rampas particulares, e dessa forma o cenário continuava vivo, mesmo correndo o risco de desaparecer.

Primeira pista de skate do Brasil: Nova Iguaçu (RJ). Foto: Reprodução/Guia do Estudante

No ano de 1984 a modalidade ressurgiu por iniciativa dos próprios skatistas e a vinda de alguns ídolos internacionais do esporte ajudou ainda mais o trabalho que era feito pelos amantes do esporte, e em 1986 a Associação Brasileira de Skate foi fundada, mas durou apenas dois anos, dando lugar à União Brasileira de Skate, que durou até 2000, e o skate sofre dois duros golpes: O primeiro , com a proibição da prática da modalidade pelo então prefeito da cidade de São Paulo, Jânio Quadros, que inicialmente proibiu que se andasse de skate no Parque do Ibirapuera, mas após uma passeata dos praticantes, ele proíbe o esporte em toda a cidade de São Paulo. O outro revés foi em 1990 com o presidente do Brasil, Fernando Collor, que devido ao chamado “Plano Collor” freou todo o desenvolvimento do skate no Brasil, e diversas empresas relacionadas ao Skateboard faliram da noite para o dia, mas mesmo assim, os skaters não interromperam suas atividades e trabalharam para a consolidação e profissionalização do esporte no Brasil.

Esse período foi sombrio e gerou muitas dúvidas nos praticantes. Por ser um movimento que lutou contra o sistema, o skate foi marginalizado e foi até chamado de “esporte assassino” numa manchete do Jornal Estado de São Paulo, numa clara tentativa de chamar os skatistas de bandidos, mas alguns representantes do Skateboard continuaram com a luta pelo simples direito de se divertir com o esporte. Um dos que participou dos movimentos naquela época, o skatista Marcos Santos, diz que a repressão foi muito grande: “A Guarda Municipal confiscou as rampas e os skates de todo mundo que andava no Ibirapuera. Um dos nossos amigos, o Álvaro, se revoltou e retornou ao local para buscar tudo que havia sido preso, e o prefeito decidiu tornar a proibição uma lei”. Ele conta como foi o dia da marcha organizada contra a proibição: “Tinham umas 200 pessoas. Muitos levaram faixas e megafone para protestar, e a marcha partiu do metrô Paraíso até chegar no Parque Ibirapuera. Eu não estava lá, mas conheço vários que participaram do protesto. O intuito era entregar uma carta pro prefeito com diversas assinaturas, que pediam a revogação da proibição apenas, mas todo mundo foi barrado, por que o parque estava fechado, e isso gerou uma grande revolta”. Marcos está no movimento desde os anos 1980 e vê uma grande evolução: “Hoje está tudo mais fácil para quem quiser andar”. “Tem várias pistas por aí e hoje a gente é bem aceito pela sociedade, mas o trabalho ainda é duro, já que as marcas nacionais ainda não investem tanto nos atletas, por falta de estrutura mesmo.” “O cara que quiser ser profissional tem que ir para os Estados Unidos, por que o mundo todo do skate está reunido lá”.

Protesto dos skatistas em São Paulo, 1988. Foto: Alexandre Tokitaka

O skate brasileiro realmente ainda tem muito a evoluir, mas caminha bem. Alguns dos principais skatistas do ranking da Street League (principal campeonato de skate do mundo, que terá a sua última etapa realizada no Brasil nesse ano) são brasileiros, e o Brasil possui cinco títulos.

“A Justiça é uma noção construída e não colocada de fora para dentro”, aponta mediadora e advogada Carla Zamith ao falar sobre as formas possíveis de fazer justiça.
por
Malu Araújo
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07/06/2022 - 12h

Provavelmente, você já deve ter escutado o bordão “O Brasil prende muito e prende mal” e embora existam hoje mais de 900 mil pessoas encarceradas, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),  um dos principais ecos da sociedade é a impunidade vivida. Com efeito dessa contradição, surgem as questões: em qual parte então a justiça criminal brasileira está falhando? Será que prender e punir é a única forma de se fazer justiça?

A princípio, o cenário que se evidencia no sistema criminal é de ineficiência e precariedade. De acordo com o conselheiro do CNJ, Mauro Martins, cerca de 45% dos presos estão sem uma condenação definitiva e por isso, cumprem maior tempo de pena necessária, sendo 67% dessa população formada por pessoas negras. Ademais, segundo o Departamento Penitenciário Nacional, das 1.381 unidades prisionais, 997 têm mais de 100% da capacidade ocupada e outras 276 estão com ocupação superior a 200%, ou seja, também existe a superlotação dos presídios. Soma-se a isso a ausência de práticas que busquem estimular o infrator ao desvencilhamento da vida do crime e a sua inserção como cidadão no convívio social. Sob essa perspectiva, percebe-se que o sistema penitenciário atual está mais para um mecanismo de atraso e perpetuação de ciclos na criminalidade, uma vez que punir se torna diferente de responsabilizar e conscientizar o ofensor do crime cometido.  Mas será que existe uma outra forma de se lidar com os conflitos, trazendo reparação para a vítima e diminuição dos apenados em uma lógica cada vez menos coerente?

Uma alternativa em construção

A Justiça Restaurativa surgiu na Nova Zelândia em 1970, tendo como inspiração a forma como os aborígenes Maoris, povos nativos do país, solucionam seus conflitos de litígio. A prática chega ao Brasil na década de noventa e é oficialmente iniciada em 2005, com o projeto "Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro”.  Em entrevista à Agência Maurício Tragtenberg, a cientista social e mestre criminal Raffaela Palloma, formada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, explica que a Justiça Restaurativa não é um conceito fechado, uma vez que é formada por um conjunto de práticas, valores e princípios. “Alguns vão dizer que é um modelo de Justiça, uma forma de responder aos conflitos [...] (sendo) atrelada a possibilidade da gente responsabilizar a pessoa que praticou a conduta criminosa de outra forma, não dando uma resposta punitiva, mas dando uma resposta, digamos, mais positiva”, completa Palloma.

No Brasil a Justiça Restaurativa segue a metodologia do Ciclos Restaurativos, que seria um roda de diálogo com as pessoas envolvidas no conflito, tanto o ofensor, quanto a vítima devem estar ali de forma voluntária. A  partir dessas conversas são feitos pequenos acordos, que buscam reparar os danos causados a vítima. Por consequência, a prática encontra um meio para responsabilizar o infrator, criando um ambiente em que ele encare as consequências do seu crime e perceba sua nocividade.

Processo da metodologia seguida pelos ciclos restaurativos.
        Processo da metodologia seguida nos ciclos restaurativos.

 

Em contraste, a prática dentro do país ganhou tons próprios, a advogada nos conta que no Brasil há uma tendência dos processos de justiça restaurativa serem mais voltados aos ofensores, esse fato decorre também por parte das vítimas possuírem desconhecimento e receio sobre o que é a prática.  Outro ponto observado, é a centralidade do judiciário na condução dos processos, visto que as primeiras experiências surgem em projetos pilotos implementados pelo sistema. Diferentemente, em outros países são organizações não governamentais que cuidam dos casos, recorrendo apenas ao poder judiciário se necessário. Um dos possíveis riscos para Justiça Restaurativa, em decorrência dessa centralidade, é de que seu diferencial seja apagado, podendo ser cooptado e contaminado pela lógica do sistema tradicional. 

A forma de reparação pode ser diferente para cada vítima

  Em relato, a cientista Palloma nos conta sobre uma história muito marcante, em que um adolescente havia matado intencionalmente seu amigo. A família da vítima resolveu tratar o caso pela Justiça Restaurativa, dentro do processo a mãe sempre dizia que sentia muita falta do seu filho. Conforme os ciclos foram feitos, um dos acordos era que o adolescente, amigo do filho dela, iria almoçar com ela todos os sábados, uma vez que ela queria companhia e queria que isso acontecesse.  O desfecho desse caso, assim como outros, podem espantar as pessoas dentro daquilo que se espera acontecer, mas para essa mãe esse acordo trazia em alguma medida reparação a morte do seu filho. "São coisas que a gente não explica, mas que foi importante para ela" afirma Palloma.

Dessa forma, é importante pensar que o conflito muitas vezes não possui uma natureza única, por isso, não respondem a uma mesma resposta. Em entrevista, a mediadora e advogada Carla Maria Zamith, doutora pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, explicou que “a noção de que conflito não é um pensamento linear de causa e efeito", uma vez que não decorre de um único motivo. Quando, por exemplo, há uma “situação de conflito que acontece numa escola, este conflito não está descolado da estrutura da escola e das pessoas que chegam ali [...] o que a prática olha não é qual lei foi infringida, qual a regra que foi infligida, mas qual a necessidade que não está e não foi atendida que deu causa para o surgimento daquela situação” elucida a mediadora. 

Estudantes universitários da UniSecal realizam projeto de extensão da Justiça Restaurativa.
               Estudantes universitários da UniSecal realizam projeto de extensão da Justiça Restaurativa.

A doutora também faz a diferenciação entre mediação e justiça restaurativa, embora ambas possuam o mesmo “princípio do não saber”, a Justiça Restaurativa conta com uma rede de apoio e sustentação de grande porte, enquanto a mediação não demanda desse fator, necessariamente. Uma das experiências trazidas pela mediadora Carla era de uma casal que estava se separando e “estava em um grau de desrespeito e discussões que não conseguiam se falar, tornando a convivência em casa impossível”. A partir disso, foram sendo feitos pequenos acordos entre os dois no processo de mediação, com esse exercício de comunicação, foi possível se transformar esse momento, ao ponto deles conseguirem se escutar novamente.

Em síntese, a Justiça Restaurativa não propõe uma solução única para os problemas da justiça criminal e muito menos diz que ambas não podem caminhar juntas, mas tenta construir a ideia de que o conflito está dentro de um todo e isso não deve ser ignorado. E a partir desse entendimento, traz a reflexão de que o diálogo e a escuta podem ser mais eficientes no processo de responsabilização do infrator e na não perpetuação de novos crimes.

 

 

“O TikTok me fez voltar a um hábito de leitura que eu não tinha desde os 14 anos”, diz Marcela Fregonesi, jovem e leitora”
por
Anna Cecília Nunes
Beatriz Tiemy
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07/06/2022 - 12h

Com a chegada do cenário pandêmico no Brasil, muitos setores comerciais tiveram que encontrar uma maneira para sobreviver, com o setor editorial não seria diferente. Presenciou-se muitas livrarias encerrando as suas atividades, o que gerou o questionamento de quais seriam os novos caminhos que guiarão a área. Formas de divulgações através da internet sobre os conteúdos literários ganharam força. Um grande exemplo é o TikTok, em que a hashtag booktok, voltada para vídeos envolvendo livros, acumula mais de 56 bilhões de visualizações, que foi o classificado com o maior índice de influência em vendas de livros. 

De acordo com os dados do Painel do Varejo de Livros, divulgados pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), entre  2020 e 2021 houve um crescimento de 38,38% no volume de livros comercializados e um faturamento 28,46% superior. Isso significa que 3,91 milhões de livros foram vendidos contra 2,82 milhões de títulos nesse mesmo intervalo em 2020. Umas das booktokers mais conhecida é a criadora de conteúdo digital, Leticia (@biblioleticia), que acumula mais de 500 mil seguidores e 26 milhões de likes em sua rede social. As recomendações são para todas as idades, mas, segundo dados da plataforma TikTok, 66% dos usuários têm menos de 30 anos, com faixa etária entre 16 e 24 anos. 

Por ser uma plataforma voltada para o público jovem, o conteúdo do booktok teve uma contribuição significativa na evolução e popularização da leitura entre os adolescentes. Marcela Fregonesi, 19, diz como o booktok ajudou no seu retorno ao mundo literário: “O TikTok me fez voltar a um hábito de leitura que eu não tinha desde os 14 anos. Os vídeos de indicação me influenciaram muito a voltar com tudo, diria que os principais foram ‘Os sete maridos de Evelyn Hugo’ e ‘Metanoia’”. Além disso, Marcela diz que passou um ano lendo apenas indicações do booktok e como a plataforma influenciou outras pessoas que não tinham o hábito de leitura: “Em 2020, eu praticamente só li indicações do TikTok. Não me sinto tão influenciada hoje como eu já fui, mas mesmo assim ainda me impacta e vi que impactou muita gente que não lia, até porque você pode receber indicação de qualquer estilo de livro, o que faz com que seja mais fácil das pessoas encontrarem algo que interessa elas a entrarem no mundo da leitura e, talvez, até influenciar outras pessoas próximas.”

Livros na categoria "booktok" na livraria.
Categoria "booktok" é vista em livraria. Reprodução: Twitter/@desastredastar
 

 

Bárbara Pollo, influencer da plataforma TikTok que grava conteúdos sobre livros, explica o porquê do sucesso dos vídeos do booktok: “O booktok cresceu tanto por conta da maneira que os criadores de conteúdos fazem os vídeos, pois no TikTok só era permitido vídeos de até 1 minuto, e tínhamos que criar uma resenha que desse vontade de ler no público, e por conta do tempo de vídeo, não ficava cansativo para as pessoas nos ouvirem.” 

Perante à grande repercussão do booktok, determinados títulos muito comentados na plataforma como “Mentirosos” (2014), “Vermelho, Branco e Sangue Azul” (2019), “Corte de Espinhos e Rosas” (2018), chamou a atenção de inúmeros jovens e passaram a ser os mais vendidos no Brasil, “os queridinhos do booktok” em algumas livrarias como a Leitura passaram a ter uma sessão dedicada somente aos títulos mais comentados na rede. 

"Muitas pessoas que já liam começaram a repassar suas experiências para os outros através da internet, em especial na pandemia, pois ficamos em casa com mais tempo disponível para ler. Alguns criadores de conteúdo utilizam dessa ferramenta como forma de trabalho, outros fazem por diversão e outros fazem apenas para popularizar um livro que gostou”, explica a booktoker, Bárbara Pollo.

O evento acontecerá em formato híbrido, de 31 de maio a 4 de junho. 41 marcas estarão presentes na edição deste ano.
por
Ana Beatriz Villela
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31/05/2022 - 12h

A 53ª edição da São Paulo Fashion Week (SPFW) começa nesta terça-feira (31/05) e vai até o próximo sábado (04/06). O evento será realizado em formato híbrido, com 22 marcas com desfiles presenciais e 19 marcas virtualmente com transmissão online pelos canais oficiais.

O tema desta edição é in-Pactos e representa o momento de reinvenção da moda em relação a causas como sustentabilidade, inovação, conhecimento e tecnologia.

"É um momento desafiador, mas também muito rico, em que a diversidade e os novos formatos estão surgindo e sendo testados. Temos a obrigação de provocar a inovação, um chamado para que novos pactos possam surgir em torno do compromisso com as mudanças urgentes que precisam acontecer para criarmos um ambiente mais humano e saudável para todos", explica o criador da SPFW e produtor de eventos, Paulo Borges.
 

spfw
Foto: Reprodução/ Instagram @spfw @dendezeiro

 


Os desfiles presenciais vespertinos serão no Senac Lapa, como uma espécie de ponto de encontro entre mercado e moda. Já os desfiles noturnos, serão no Komplexo Tempo, um espaço recém-inaugurado em um galpão do século passado, na Móoca, bairro pioneiro na indústria têxtil da capital paulista. Algumas marcas optaram por realizar suas apresentações em outros espaços, como na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP).

Mais de 40 marcas nacionais participam da SPFW N53, sendo três estreantes: Thear Vestuário, Martha Medeiros e Dendezeiro. Confira o cronograma completo abaixo:

 

31/05 (terça)

20h - À La Garçonne

 

01/06 (quarta)

15h30 - Martha Medeiros (Senac)

16h30 - Fauve (digital)

17h - Ponto Firme (Senac)

18h - Dendezeiro (digital)

18h30 - Ta Studios (digital)

20h - Rocio Canvas (Komplexo Tempo)

21h30 - Boldstrap (Komplexo Tempo)

 

02/06 (quinta)

13h - Anacê (Faap)

14h - Renata Buzzo (digital)

16h - Sankofa: Meninos Rei (Senac)

17h30 - Sankofa: Naya Violeta (Senac)

18h - Freiheit (digital)

18h30 - Modem (digital)

19h - Mnisis (digital)

20h - Igor Dadona

20h30 - Apartamento 03 (digital)

21h30 - Misci (Komplexo Tempo)

 

03/06 (sexta)

14h - Victor da Justa (digital)

14h30 - Sankofa: Silvério (Senac)

15h30 - Aluf (digital)

16h - Martins (Senac)

17h - Thear (digital)

17h30 - João Pimenta (Senac)

18h - Wilson Ranieri (digital)

18h30 - Gloria Coelho (digital)

20h - Lino Villaventura (Komplexo Tempo)

21h - Handred (digital)

21h30 - Walério Araújo (Komplexo Tempo)

 

04/06 (sábado)

13h - Neriage (Rosewood)

14h - Soul Básico (digital)

14h30 - Weider Silveiro (Senac)

15h - Ronaldo Silvestre (digital)

15h30 - Sankofa: Az Marias (Senac)

16h - Corcel (digital)

17h - Sankofa: Santa Resistência (Senac)

18h30 - Depedro (digital)

19h - Led (Komplexo Tempo)

19h30 - ÀLG (digital)

20h - Ateliê Mão de Mãe (Komplexo Tempo)

21h30 - Isaac Silva (Komplexo Tempo)