Comércio de rua gera renda aos colaboradores e mantém viva uma tradição paulistana
por
Nathalia de Moura
Victória da Silva
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27/03/2025 - 12h

As feiras livres paulistanas já ocupam seus espaços pela cidade há anos. Gerando rendimento para muitos feirantes e possuindo uma variedade de produtos para a população, elas são essenciais para a geração de empregos. Com um público diverso, elas também são tradicionais no estado de São Paulo e dão a oportunidade de conhecer diferentes culturas e pessoas. Segundo a Prefeitura de São Paulo, por meio das secretarias de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), a primeira feira livre oficial aconteceu em 1914, através de um ato do então prefeito Washington Luiz Pereira de Souza. A ação surgiu para legitimar uma prática que já acontecia na cidade, mas de forma informal. Na ocasião, cerca de 26 feirantes estiveram no Largo General Osório, na região da Santa Ifigênia. Mais tarde, em 1915, outra feira se instalou, dessa vez no Largo do Arouche, e teve a presença de 116 feirantes.

As feiras não possuem um público-alvo e esse é seu diferencial. É possível ver crianças, jovens, idosos, famílias, moradores locais e até turistas usufruindo a multiplicidade de mercadorias que existem. Em sua grande maioria, pessoas da classe média e da classe trabalhadora são as que mais frequentam as feiras. Muitos também aproveitam para comprar legumes, verduras e frutas frescas, além de conhecer a cultura local.

São Paulo tem registrado cerca de 968 feiras livres e com a expansão desse comércio tão tradicional, a movimentação financeira gira em torno de R$ 2 bilhões por ano, incluindo a venda de até mesmo peças artesanais. Além disso, mais de 70 mil empregos, diretos e indiretos, são gerados.

Em Guarulhos, por exemplo, Quitéria Maria Luize, de 62 anos, vende condimentos e temperos em quatro feiras de bairros diferentes (Jardim Cumbica, Jardim Maria Dirce, Parque Alvorada e Parque Jurema), sendo essa sua única fonte de renda. “Ela é toda a minha renda, de onde eu tiro o sustento. Criei toda a minha família trabalhando com esses temperos. E começando lá de baixo, não comecei lá em cima”, diz Quitéria em entrevista à AGEMT. 

A feirante afirma que antes de estabelecer seu comércio nas feiras, ela iniciou vendendo temperos pelas ruas com um carrinho de pedreiro: “peguei esses temperinhos emprestados que a minha tia já vendia, saí nas portas, batendo palma e contando minha história”.

 

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Diversos condimentos são comercializados na barraca de Dona Quitéria. Foto: Victória da Silva

Vendedor das mais diversas frutas, Queiroz - como é conhecido e gosta de ser chamado - é feirante por tradição. Seu pai e seu avô participaram de feiras livres e passaram o negócio para ele, que vive disso até hoje, aos seus 60 anos. “O meu avô começou na feira em 1945, ele tinha uma chácara, colhia e vendia. Aqui em Guarulhos não tinha nada, mas já tinha a feira”, informa.

“A feira é patrimônio do Estado de São Paulo” afirma o vendedor, defendendo a existência dela como crucial para a vida dos paulistas e paulistanos. Queiroz diz que as feiras são tão importantes quanto os mercados, já que foi por meio desse comércio que eles passaram a existir: “Até o leite era vendido na feira. A feira era uma festa!", relembra QQueiroz. 

 

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Barraca de frutas do seu Queiroz. Foto: Victória da Silva.

Quem trabalha ou frequenta as feiras falam delas com muito carinho e cuidado. Além disso, os feirantes e moradores também podem ajudar na fiscalização das feiras. Caso identifiquem alguma irregularidade, eles podem acionar as subprefeituras para checarem, pois elas são responsáveis pelo monitoramento. Já a organização e a supervisão são feitas pela Prefeitura por meio da SMDHC e da Executiva de Segurança Alimentar e Nutricional e de Abastecimento (SESANA).

Marcos Antonio da Silva é vendedor de ovos na feira do Jardim Cumbica há 10 anos, mas, diferente de Quitéria, durante os dias úteis trabalha em outra profissão: motorista de caminhão. O caminhoneiro de 52 anos diz que o comércio feirante é uma ótima forma de conseguir renda extra aos finais de semana. Contudo, as mudanças econômicas do país em 2025 fizeram as vendas caírem. “A feira me distrai muito. Aqui tem muita gente boa, atendo bem os clientes, tenho muitos, eles gostam do meu trabalho, eu gosto deles, mas a venda deu uma caída, subiu o preço do ovo, subiu o café, subiu o alho, subiram muitas coisas”, finaliza.

Ir à feira é um evento. Vemos diversas cores e sentimos vários cheiros e sabores. Mas as feiras livres possuem mais do que frutas, temperos e artesanatos. Elas apresentam histórias de vida e ali, amizades e novas experiências podem ser compartilhadas. 

Em entrevista exclusiva, vereador Bombeiro Major Palumbo (PP) comenta sobre o programa Smart Sampa e a mudança da GCM para Polícia Municipal
por
Oliver de Souza Santiago
Júlio Antônio Poças Pinto
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18/03/2025 - 12h

 

Câmeras utilizadas no Programa Smart Sampa - Foto: Divulgação/PMSP
Câmeras utilizadas no Programa Smart Sampa. - Foto: Divulgação/PMSP

Dois projetos do Executivo (Prefeitura Municipal de São Paulo) e Legislativo (Câmara Municipal de São Paulo) se destacaram no primeiro trimestre deste ano. O Programa Smart Sampa e o PLO 08/2017 (Projeto de Emenda à Lei Orgânica), que altera o nome da Guarda Civil Metropolitana (GCM) para Polícia Municipal. Com estas medidas, gerou-se uma expectativa de melhora da segurança do município, e virou motivo de comemoração entre parlamentares e munícipes da capital paulista.

O Smart Sampa, inaugurado em julho do ano passado, é um software que conta com mais de 20 mil câmeras espalhadas pela cidade. Todas equipados com inteligência artificial avançada, interligados com a base de dados da  Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC) que permite o reconhecimento de pessoas desaparecidas e da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP), com o software desta instituição "Muralha Paulista", que facilita a leitura facial para a captura de foragidos. Além de uma central de monitoramento de 24 horas com cerca de 250 agentes.

Neste último carnaval (3), o sistema foi aplicado com o objetivo de reduzir a criminalidade ao longo dos dias de folia. Segundo o DataFolha, o aplicativo teve aprovação de 91% dos foliões, o que demonstra uma aprovação quase geral da população. Ainda segundo a prefeitura: "14 criminosos foragidos foram capturados pela Guarda Civil Metropolitana (GCM) e devolvidos ao sistema prisional durante o todo o período de Carnaval deste ano"

Os algoritmos avançados geram alertas capazes de identificar intrusão, vandalismo e furtos. Ganhou notoriedade com um saldo de 841 foragidos capturados e 2.016 criminosos presos em flagrante, divulgados no dia (14). Os números são atualizados diariamente através do Prisômetro, painel de iniciativa do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Foliões em bloco de carnaval de rua em São Paulo. - Foto: Divulgação/PMSP
Foliões em bloco de carnaval de rua em São Paulo. - Foto: Divulgação/PMSP

Já referente à mudança de nomeclatura da GCM, o PLO foi aprovado na quinta-feira (13) em sessão plenária da Câmara, mas foi derrubada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) na terça-feira (18) após pedido de liminar do Ministério Público de São Paulo. O desembargador Mário Deviene Ferraz, afirmou no processo:

"Não podendo o Município, a pretexto da autonomia legislativa, alterar a denominação da guarda municipal, consagrada no artigo 144,8º, da Constituição Federal de 1988, para 'polícia municipal"

Em nota, a Câmara se posicionou após a ação judicial. "Tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal já ratificou o poder das guardas municipais de policiamento ostensivo e comunitário, após recurso da própria Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo, o Legislativo paulistano entende que o nome Polícia Municipal apenas reflete essa decisão da Suprema Corte. Ou seja, a mudança de nome da GCM para Polícia Municipal aprovada pela Câmara está alinhada com o entendimento do STF. A Câmara respeita a decisão do TJ-SP, mas a Procuradoria da Casa vai recorrer da liminar.

Ricardo Nunes lamentou a derrubada da alteração e "em solidariedade ao povo de São Paulo, que pede cada vez mais por segurança e policiamento, espera que ela seja revertida o mais breve possível."


CRIAÇÃO DA POLÍCIA MUNICIPAL

Em entrevista à AGEMTo vereador Bombeiro Major Palumbo (PP), 49 anos, revela detalhes sobre o processo da criação da Polícia Municipal. Palumbo faz parte da Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara, é Major da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo há 28 anos e Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Palumbo ressaltou a importância da criação de uma Polícia Municipal:

"[..] Para você mudar o nome não é aqui na Câmara Municipal. Uma polícia tem que ser estabelecida pela Constituição Federal e isso precisa ser mudado lá em Brasília com três quintos das duas casas (CMSP e Senado Federal). Duas vezes, os três quintos dos deputados federais para que eles possam mudar a lei, fazer uma emenda à Constituição e colocar a polícia. Agora, uma Polícia Municipal, ela terá as atribuições de uso e ocupação do solo o que isso significa?

Significa que eles precisam atuar para ter a polícia. Algumas demandas são do município, por isso polícia municipal, polícia federal entre outras. Algumas terão o âmbito para crimes federais, a Polícia Militar e a Civil que são estaduais, crimes de atribuições estaduais roubo, furto, sequestro, tráfico de drogas. E os crimes que são da Polícia Municipal? Quais são? São os crimes que você tem, por exemplo uma perturbação do sossego. Concorda que é de menor potencial ofensivo?[..]"

Prefeitura apresenta nova viatura da Polícia Municipal, após mudança do nome da GCM aprovada na Câmara Municipal da capital paulista - Foto: Divulgação/PMSP
Prefeitura apresenta nova viatura da Polícia Municipal, após mudança do nome da GCM aprovada na Câmara Municipal da capital paulista. - Foto: Divulgação/PMSP

Como é que você vai colocar todas as estruturas das outras polícias para atender algo com menor potencial ofensivo, quando você poderia estar usando esses caras que são muito bem treinados, pra fazer o quê? Combate ao crime. Então a Polícia Municipal vai existir para atuar nas atribuições de uso e ocupação do solo que são municipais. Seja um comércio ilegal de venda de produtos, alguém que quer usurpar do espaço público.  'Eu quero morar aqui na rua, bem na praça'  Então, ele faz uma casa em cima da praça. Mas escuta, ele sabe que não pode, mas quem que vai lá? É a polícia federal? Não, ela tem outras atribuições, de crimes internacionais aos de colarinho branco", afirma Palumbo. 

Sobre uma futura reestruturação para a mudança, ele comenta: "A segurança pública é o maior questionamento que o cidadão da cidade de São Paulo faz hoje. Junto com saúde e educação, mas a segurança pública fica na frente. Então é preciso dar uma agilidade. E para isso, a Guarda Civil, futura Polícia Municipal, vai ter que mudar os seus cronogramas de treinamentos. Por exemplo, eu refiz todo o estande de tiro da Guarda Civil Metropolitana, futura Polícia Municipal. Coloquei uma emenda minha, reformei tudo. Por quê? Para que eles tivessem a chance de ter um bom treinamento e exercer a proteção do cidadão com bastante técnica. Porque não adianta só você ter o nome[..]"


SMART SAMPA

O parlamentar também compartilhou informações sobre o funcionamento do Smart Sampa: 

"[..] É um algoritmo colocado nas mais de 20 mil câmeras que estão espalhadas na cidade. Elas captam tudo, porém não consegue rodar o Smart Sampa sem um outro programa, que é o Muralha Paulista. O outro software tem dados de todos os criminosos fichados do Brasil inteiro.

Quais são os que estão procurados, quem estão presos, os que são fugitivos, os que cometeram crime e ainda não foram pegos? Eles possuem essa informação!. O que aconteceu? O Muralha Paulista colocou o banco de imagens, através do Estado, da Secretaria de Segurança Pública, à disposição das prefeituras. Então, a Prefeitura instala e na hora que até que passe uma pessoa. Não é pela cor da pele como os partidos de oposição aqui na Câmara, que entraram até com ação na justiça para evitar, alegando que o Smart Sampa era um programa que ia providenciar o racismo na cidade. Não. Ele é técnico. Ele pega a distância entre olhos, nariz e boca, orelha. Desenha um triângulo no rosto da pessoa, mesmo se ele altera o cabelo, mas isso aqui não muda (aponta para a Íris). 

Palumbo também revelou algumas curiosidades sobre o software: "Elas estão no centro e espalhadas em todos os lugares. Elas têm os braços articuláveis e conseguem pegar distâncias de dois, três quilômetros. Então daqui, se você tiver uma Smart Sampa aqui em cima do prédio onde a gente está. Consegue chegar até no Viaduto do Chá e consegue identificar quem seja. O que a gente tem que fazer é com que esse sistema seja conhecido pela população.

 


 

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A instituição marca a vida dos frequentadores, viabilizando a cultura, o lazer e o aprendizado
por
Victória da Silva
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28/11/2024 - 12h

 

O Serviço Social do Comércio, mais conhecido como Sesc, é uma entidade privada muito frequentada por paulistas e paulistanos, e desempenha um papel fundamental para a democratização do acesso à cultura e à educação. Seus espaços são repletos de exposições, shows, sessões de cinema, práticas de esportes e várias outras atividades que inserem os visitantes em um ambiente agradável.

Desde sua fundação - pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) em 1946 - o Sesc visa a melhoria de vida das pessoas que trabalham com comércio, suas famílias e a sociedade em geral. Além disso, tem a educação como base para a transformação social, fazendo com que ela seja alicerce de toda a instituição.

De acordo com o seu site: “No estado de São Paulo, o Sesc conta com uma rede de mais de 40 unidades operacionais – centros destinados à cultura, ao esporte, à saúde e à alimentação, ao desenvolvimento infantojuvenil, à terceira idade, ao turismo social e a demais áreas de atuação”.

Para Matheus Sampaio, graduado em história da arte pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e colaborador do Sesc Pinheiros, todos que vivem e amam cultura, consequentemente, amam o Sesc. A instituição é ligada ao setor do comércio e ganha 1% da verba de todo o estado, e dessa forma consolidou seu grande poder aquisitivo. “Eu acredito que esse poder está sendo voltado para a população, então eu considero fundamental e acho lindo”, afirma Sampaio.

Luíza Claudino, estudante de 17 anos, é uma das frequentadoras do Sesc e costuma ir às unidades Belenzinho, Guarulhos, Itaquera e Pompeia. A jovem compartilha que apesar de sua família não ser do âmbito comercial, ela frequenta os espaços desde criança. “Acredito que é isso que me faz gostar tanto do Sesc: ele é acessível a todos. Já fui em muitos shows, peças e exposições no Sesc, tudo por um valor baixo ou até mesmo de graça”, afirma.

A gratuidade de algumas das atividades do Sesc é ponto relevante, já que vários indivíduos, principalmente das periferias, não possuem recursos suficientes para obter o direito a essas experiências. Além disso, o Sesc quebra as barreiras e o estereótipo errôneo de que pessoas de baixa renda são desprovidas de cultura e desinteressadas pela esfera artística.

De acordo com Sampaio, esse estigma foi muito pautado em sua graduação, já que espaços como galerias e museus são, por vezes, inacessíveis às comunidades. Ele reforça: “O MASP, por exemplo, é um dos museus mais relevantes da América Latina e tem muita gente que não sabe disso e nunca visitou. Por causa desse distanciamento, não é algo fácil ou acessível. Já o Sesc - pensando nas artes visuais e nas exposições – rompe com esse paradigma, pois além das exposições serem gratuitas, elas estão localizadas em diferentes partes de São Paulo”.

A estudante do 3° ano do ensino médio, Nicolly Gomes, também considera o Sesc como um facilitador de acessos, já que beneficia a comunidade possuindo lazer de qualidade e preços acessíveis. “Eu gosto do Sesc porque é um ambiente acessível, com muitas opções culturais e esportivas, onde eu sempre posso participar e aprender algo novo", afirma.

Matheus, que até este ano já contribuiu para 21 exposições artísticas e passou por diferentes instituições como o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), Farol Santander e o Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia (MuBE), disserta que o Sesc já é valorizado, mas poderia ser ainda mais. “O que o Sesc faz é muito grande e bonito. O empenho de montar essas exposições e promover esses shows, gratuitos ou por um preço baixo, é encantador”, conta o educador.

Além do mais, muitas vezes as pessoas não vão para o Sesc em busca de uma exposição artística, mas ao ir para exercer outra atividade, elas se deparam com diferentes mostras. “É uma das coisas que eu gosto ainda mais do Sesc, porque ele realmente aproxima as pessoas. Claro que ainda existem várias camadas, ainda existe uma barreira, mas não tão grande quanto as grandes galerias de artes que até mesmo quando há gratuidade, não é nada convidativo”, ele completa.

Há diversas exposições em cartaz até dezembro de 2024 como “Novo Poder: passabilidade” na unidade da Avenida Paulista, “Terra de Gigantes” no Sesc Casa Verde, “Nós - Arte e Ciência por Mulheres” em Interlagos e “Um Defeito de Cor” na unidade Pinheiros.

 

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Visita de alunos da PUC-SP e Mackenzie na exposição “Um Defeito de Cor”. Foto: Victória da Silva

Para além do campo das artes, o Sesc alcança aqueles que gostam da prática de esportes. Luíza conta que faz parte do programa “Esporte Jovem” há quase três anos, este que promove o exercício de diferentes jogos entre jovens de 13 e 17 anos, ensinando as técnicas e táticas de cada um. “Jogo vôlei com uma turma muito bacana e aprendo bastante, tanto sobre a vida quanto sobre o esporte”, a estudante informa.

Alguns Sescs dispõem de piscinas para recreação e nado livre. São ao todo 15 unidades na capital e grande São Paulo que oferecem esse serviço, e possibilitam o usufruto desse lazer não só para crianças e adolescentes, mas também para o público 60+.

Embora haja muitos elogios à estrutura e até mesmo à comida do Sesc, há alguns pontos de melhoria que são considerados. Luíza, por exemplo, sente falta de um teatro no Sesc Itaquera, já que outras unidades comportam teatros, mas não há nenhum nessa unidade que ela habitualmente frequenta: “Com um teatro, teríamos mais peças, principalmente aquelas que poderiam interessar à população da periferia, onde a unidade fica localizada.” Já a outra jovem, Nicolly, declara a sua insatisfação pela pouca variedade de livros na biblioteca da unidade Guarulhos.

Em suma, a instituição Sesc atua de maneiras diferentes em todo o Brasil, mas garante - especificamente em São Paulo - um refúgio para os dias corridos da cidade grande e ainda, proporciona para diferentes indivíduos vivências e programas de qualidade. Luíza finaliza: “Penso que, com seus cursos e atividades, o Sesc muda a vida das pessoas. Como já participei de alguns cursos, pude ver essa transformação acontecer pessoalmente”.

A cultura popular jamaicana de sistemas de som comove e inspira transformações no estilo de vida dos brasileiros
por
Bianca Abreu
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01/10/2024 - 12h

Por Bianca Abreu

Ao ar livre ou em um espaço fechado, caixas e auto-falantes são empilhadas umas sobre as outras formando grandes estruturas - por vezes tão altas que é preciso erguer a cabeça rumo ao céu para acompanhar seu tamanho. A elas se unem o toca-discos, vinis e amplificadores. Com a missão de manter esse grupo em harmonia chega o selecta, comandante desse conjunto que, desde seu surgimento na Jamaica na década de 40, foi nomeado Sound System. De lá pra cá, esse cenário já se repetiu incontáveis vezes e, faça chuva ou faça sol, esse movimento segue firme em seu objetivo coletivo de unir, informar e empoderar o povo negro e periférico - seja ele jamaicano ou brasileiro.

Foi uma espontânea sequência de oitos de maio na vida de um homem chamado Hadley Jones a responsável por tecer o surgimento desse que é um dos movimentos culturais mais relevantes do século XX. Em 1943, ele foi convocado para a Força Aérea da Inglaterra por conta da Segunda Guerra Mundial. Lá foi treinado como engenheiro de radar e enviado para a guerra na Europa um ano depois. Nessa mesma data, em 1945, o conflito foi dado como encerrado e, em 1946, Jones embarcou em Glasgow, na Escócia, para atravessar o Oceano Atlântico e retornar à sua terra natal.

 

Hadley Jones.
Hadley Jones. Foto: Acervo Hadley Jones / RedBull Music Academy / reprodução.

Em sua volta pra casa, ele trouxe na bagagem a habilidade de desenvolver circuitos elétricos e uma rede de contatos para a importação de discos de vinil. Em 1946, fascinado pelo rádio e sua capacidade de transmissão, o jamaicano - que também era músico - abriu uma loja de consertos do aparelho e aplicou ali seus novos conhecimentos adquiridos na Força Aérea. Confiando em seus novos saberes, Hadley Jones projetou, em 1947, seu primeiro amplificador. Em seguida, montou a loja Bop City e passou a comercializar vinis, tendo consigo uma coleção distinta de toda a ilha. Para valorizar essa coleção musical, trabalhou no desenvolvimento de um outro amplificador - dessa vez, de alta potência - e investiu em alto falantes poderosos. Seu equipamento realçava as frequências baixas, médias e altas como entidades separadas e permitia ao operador remixá-las. Seu principal objetivo era anunciar seus discos promovendo uma experiência de proximidade entre o público e a música.

Em certa ocasião, para promoção de um baile, o dono de uma loja de ferragens chamado Tom Wong encomendou à Hadley Jones um equipamento sonoro como o dele e o nomeou com o que, dali em diante, seria a nomenclatura substancial daquele conjunto: Sistema de Som. Assim, outros pedidos surgiram e o músico-engenheiro se firmou como o pioneiro inventivo da cultura Sound System jamaicana.

 

Pelo ar ou pelo mar, as ondas promoveram o intercâmbio cultural entre Brasil e Jamaica

O Mapa Sound System Brasil, primeira publicação nacional de mapeamento dos sistemas de som no país, explica que a ilha de São Luís do Maranhão foi a primeira parada em solo brasileiro que o reggae desembarcou. Na década de 70, o trajeto musical de uma ilha a outra foi realizado por meio das ondas de rádio, que superaram as marítimas e levaram as mensagens que protestam por justiça social aos ouvintes maranhenses. A conquista foi tamanha que, hoje, a cidade é conhecida como a Capital do Reggae.

Daniella Pimenta, integrante do coletivo Feminine-HiFi, seletora, produtora cultural e idealizadora do levantamento é uma das brasileiras arrebatadas pelo movimento. Ela conta que nenhum outro ambiente musical foi capaz de proporcioná-la uma experiência tão gratificante. O sentimento de pertencimento e a maneira como, a partir do grave, a música atinge, adentra e envolve o corpo são os principais fatores que contribuíram para o fascínio desde seu primeiro contato com o Sound System. Natan Nascimento, (também) seletor, produtor cultural, fundador do Favela Sound System e parceiro de Daniella no desenvolvimento do mapa, teve uma experiência semelhante a da colega: se apaixonou pela atmosfera da festa jamaicana à primeira vista. Já conhecia o reggae enquanto ritmo musical, mas a aliança entre o sistema de som e a música apresentou a ele a amplitude de sua dimensão cultural e social.

Tanto Dani quanto Natan foram atravessados pela magia desse movimento e o impacto foi terem seu estilo de vida transformado por ele, com convicções lapidadas e rotas profissionais reconduzidas. Mas apesar dos bons ventos nas festas do movimento, Dani confidencia que, em dado momento, empacou enquanto produzia o mapa. Ela própria contatava os coletivos para inseri-los no catálogo ilustrado mas, por alguma razão, passou a ser ignorada. O levantamento era fundamentado em perguntas simples, como fundação, equipe atual, principal vertente e localização. Além disso, uma foto do sistema de som era solicitada para que o conjunto pudesse ser registrado por completo.

O projeto só voltou a andar quando, em 2018, findou a parceria com Natan. Parte das equipes que não estavam listadas pelo fato de não terem retornado o contato a ela, curiosamente, o fizeram quando, por meio de uma publicação no Facebook, ele solicitou aos interessados o envio das mesmas informações. Ela ficou com a pulga atrás da orelha se perguntando, afinal, qual teria sido a razão para que ela nunca tenha recebido essas mesmas respostas. O resultado foi que ela conseguiu registrar 50 equipes e seu parceiro, o dobro.

Capa do Mapa Sound System Brasil.
Capa do livro Mapa Sound System Brasil. Composição: Daniella Pimenta / Natan Nascimento.

 

Vivendo de Sound System

Vitor Fya.
Vitor Fya, 25 anos, morador da Brasilândia e apreciador da cultura Sound System jamaicana. Foto: Vitor Lima / arquivo pessoal / Facebook.

Outro brasileiro seduzido pela cultura jamaicana é João Vitor Lima, de codinome Vitor Fya, morador da Brasilândia - distrito mais populoso da zona norte de São Paulo - e entusiasta da cultura Sound System há mais de uma década. Hoje, ele trabalha como serralheiro, mas aspira ter condições de fazer de seu estilo de vida mais do que um hobby: uma fonte de renda aliada à paixão.

Seu caminho se cruzou com o movimento Sound System quando ele tinha 15 anos. A primeira festa foi na extinta Fazendinha Skate Parque, pista de skate que fazia parte do complexo esportivo do Centro Educacional Esportivo Oswaldo Brandão (C.E. Vila Brasilândia). O espaço foi eliminado para ceder lugar à construção do Hospital Municipal da Brasilândia - cuja obra, de acordo com a secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, devia ter sido completamente entregue em 2017. No entanto, apenas em 2020 o hospital foi parcialmente aberto. A inauguração ocorreu pressionada pela alta da demanda hospitalar decorrente da pandemia de Covid-19. Não houve compensação pela retirada da pista de skate com a inclusão de um outro espaço público de lazer e esporte pela região e ficou “por isso mesmo”.

Fazendinha aos domingos
Movimentação dominical no Fazendinha Skate Park. Foto: Fazendinha Skate Park / Felipe Gomes / Facebook / Reprodução.
Obras no Fazendinha.
“No momento a obra passa por movimentação de terra e fundação. Nas áreas onde estamos trabalhando havia o CDC e parte do Centro Esportivo”, explica publicação da secretaria de Infraestrutura e Obras um dia antes do início das construções, 2015. Foto: Érika Kwiek / Site Prefeitura SP / Reprodução.
Obras do complexo Brasilândia.
À esquerda, o prédio do Hospital da Brasilândia. À direita, os guindastes das obras do metrô Brasilândia, linha 6, laranja. Construções planejadas de forma que possam atuar como um anexo. Foto: Bianca Abreu.

O Natural Dub, sistema de som comandado por Thales Silva, que comandava as sessões no Fazendinha, se posicionou via Facebook acerca da derrubada da área de lazer. Em nota, pontuou que é a favor de que mais hospitais possam ser construídos na Brasilândia, mas que isso ocorra - preferencialmente - em locais onde áreas de lazer recém construídas não precisem ser destruídas. Assim, o investimento na saúde do bairro não implicaria na dissolução de um espaço cultural frequentado pela juventude na região. Junto à mensagem datada de 22 de julho de 2015 foi publicado um conjunto de fotos do derradeiro evento realizado no local.

24º Vibe.
24º Vibe.
24º Vibe, último evento e amplificação realizados pelo Natural Dub no Fazendinha Skate Park, 2015. Fotos: Natural Dub SP / Facebook / Reprodução.

Em seguida, o Vitor conheceu o Anhangabaroots - como eram chamadas as sessões de diferentes coletivos promovidas ao longo do Vale do Anhangabaú, na região central de São Paulo - e ele foi essencial para aprofundar seu interesse pelo movimento Sound System. Foi lá que a chave virou, seus olhos brilharam e ele decidiu que a cultura dos sistemas de som seria a protagonista de seu estilo de vida. Ele relembra coletivos como o Trezeroots Sistema de Som e festas como a Terremoto, em que não só os sistemas de som das equipes África Mãe do Leão e Zyon Gate se agrupavam, mas que também formavam uma grande estrutura para amplificação a partir da união com outros coletivos.

Trezeroots.Trezeroots.
Trezeroots.
Anhangabaroots com Trezeroots Sistema de Som, 2014. Foto: Trezeroots Sistema de Som / Facebook / Reprodução.
Reunion of Dub.
Reunion of Dub.
Anhangabaroots com Reunion of Dub, 2014. Foto: DC Santos / Flickr / Reprodução.
Terremoto.
Anhangabaroots com Terremoto, 2014. Foto: DC Santos / Flickr / Reprodução.

Outro evento apontado pelo paulistano é a Virada Cultural. Ele destaca a variedade de vertentes reggueiras que podia prestigiar por conta da Arena Sound System, iniciativa que reuniu, simultaneamente, os principais coletivos no centro de São Paulo - sendo eles da capital ou não. Ele lamenta a falta de continuidade dessa programação.

 

Um sistema de som de qualidade aliado a bons discos faz relaxar e viajar sem sair do lugar

João Vitor considera que a cultura Sound System fisga seu público pela experiência completa e transformadora que proporciona. A qualidade dos equipamentos, sua instalação no espaço escolhido para a festa e o domínio musical de quem comanda a sessão são elementos essenciais para que a experiência seja agradável e enriquecedora. Estar em um ambiente seguro, acolhedor e com elementos educativos contribuem para instigar a curiosidade sobre os detalhes daquela cultura, expandindo sua consciência e fortalecendo a admiração e o vínculo com esse estilo de vida. São profundamente cultivados os princípios como respeito, tolerância e inclusão.

O sistema de som é estruturado por um conjunto de caixas equipadas de modo que a experiência sonora alcance e comova o público com o melhor desempenho possível. Para João Vitor, logo de cara, esse conjunto estrutural é o que mais chama a atenção. Os elementos gráficos, como cores e texturas, e a disposição de cada uma das peças de todo o aparato estrutural compõem a identidade do coletivo.

Salto Sound System
Formato de sistema de som do Salto Sound System, coletiva que apresenta-se em busca da “emancipação de mulheres negras e pessoas trans negras através da cultura Soundsystem”. Ilustração: Natan Nascimento / Mapa Sound System, 2019 / Reprodução.

 

Salto.
Formato de sistema de som do Salto Sound System, coletiva que apresenta-se em busca da “emancipação de mulheres negras e pessoas trans negras através da cultura Soundsystem”. Ilustração: Natan Nascimento / Mapa Sound System, 2019 / Reprodução.

A preocupação com o repertório também é parte indispensável da construção da identidade do sistema de som e de seu seletor. Ele deve ser capaz de aliar diferentes elementos sonoros a fim de abrilhantar sua performance e complementar o impacto artístico trago com a escolha dos discos reproduzidos - afinidade com o vinil é fundamental para qualidade do espetáculo. João explica que cada seletor costuma se especializar em um dos vários gêneros possíveis, mas que, nas sessões, costumam transitar entre eles, trazendo variedade e alguns ineditismos às suas apresentações. Vivenciando diferentes festas, ele passou a reconhecer uma variedade de vertentes como Roots, Steppa e Rub-A-Dub.

Questionado sobre conhecer a qualidade feminina na cena, João Vitor Lima exalta o trabalho do coletivo Feminine Hi-Fi, formado pelas seletoras e produtoras Laylah Arruda e Daniella Pimenta - reggueira que deu o pontapé no mapeamento dos sistemas de som em solo nacional.

Feminine HiFi.

 

Feminine HiFi.Feminine HiFi.Feminine HiFi.
Feminine HiFi.
Tendal da Lapa recebe 3ª edição do festival Feminine Hi-Fi, onde a line-up e o comando da sessão são 100% femininos. Foto: Bianca Abreu / Flickr.

 

Entre todos, ele: o pioneiro

Em vários momentos ao longo da conversa, Vitor salienta as virtudes do DubVersão Sound System - comandado por Fábio Murakami, o Yellow P (pronuncia-se ‘pi’) e pioneiro em terras paulistas. Desde 2001, ele propaga a cultura por toda São Paulo e o faz no mais genuíno modelo jamaicano, no que diz respeito à escolha por ambientes abertos e vertentes clássicas em sua performance. É o predileto de João Vitor - que comparece tanto às suas apresentações públicas como privadas - e foi o primeiro contato de Daniella Pimenta com o movimento. O evento Dub Na Praça acontece anualmente na Praça João Cabral de Resende, no Jardim Primavera, zona norte da capital paulista. É um espaço aberto e convidativo para curtir uma tarde gratuita nos moldes tradicionais do Sound System jamaicano. Já o Java, também comandado pelo Yellow P, é o braço pago dos eventos realizados pelo DubVersão e hoje ocorre na Rua Simonsen, na Sé. Além dessas duas festas inegociáveis, a agenda cultural paulista costuma integrar o DubVersão a novos espaços ao longo do ano.

Dubversão.Dubversão.
Dubversão.
DubVersão Sound System no Tendal da Lapa, 2023. Foto: Bianca Abreu.

João ressalta que prioriza as festas em que sente seu corpo e espírito em estado de conforto e harmonia. Ele conta que, quando vai ao Java, renova suas forças e sai de lá novinho em folha. Segundo ele, mesmo quando uma força maior impede que consiga adquirir o ingresso de uma das edições da festa, ele não reclama da cobrança existir pois a considera justa diante da qualidade da experiência promovida. Ele frisa que o coletivo sempre promove eventos gratuitos e que a qualidade da performance não se abala diante da cobrança da entrada no evento.

Ele conta que já leu comentários nas redes sociais em que alguns perfis reclamavam do fato de o Yellow P performar de costas para o público e questionam se isso seria sinal de vergonha. Vitor esclarece que, na realidade, isso faz parte da apresentação do seletor. Sua intenção é que o público visualize os caminhos que ele percorre para projetar os efeitos sonoros que escolhe ao longo da sessão. Para ele, isso é uma aula. Ele assiste atento e idealiza meios de reproduzir aquela performance em seus próprios equipamentos. O Susi In Transe, casa noturna que recebeu a seleção de Yellow P em suas primeiras apresentações declarou o fechamento de suas portas no último mês. O jovem paulistano lamenta o encerramento das atividades de mais um espaço cultural da cidade.

Susi In Transe
Produtor Daniel Ganjaman e Yellow P, em sessão no antigo Susi In Transe. Foto: Acervo Miguel Salvatore / UOL / Music Non Stop.

 

O desejo de compartilhar

Por conta da influência positiva que o Sound System como estilo de vida o proporcionou, João Vitor deseja ter a oportunidade de multiplicar os beneficiados por ele com a mesma maestria que os pioneiros que admira. Até hoje, como Vitor Fya, ele pôde comandar sessões em eventos de terceiros, como o RNR, sistema de som de seu bairro que o apadrinhou. Entretanto, sua intenção é alçar voos maiores para expansão do conhecimento sobre a cultura em seu território. Para ele, o que mais dificulta sua atuação na cena é o alto custo para tirar um plano como esse do papel, pois montar um sistema de som envolve custos com equipamentos, locomoção e investimentos no repertório musical. Ele gostaria de envolver a criançada do seu bairro nesse movimento cultural, despertando seu interesse em se aproximar da música a partir do manuseio de um toca-discos, estimular sua criatividade na administração dos botões da amplificação e inseri-los em uma prática onde é forte a relação de comunidade.

O intercâmbio cultural entre as ilhas jamaicana e brasileira se findou pela recíproca identificação dos oriundos das periferias de ambos os territórios. Os discos de vinil puderam expandir o alcance dos protestos de um subúrbio ao outro tendo as caixas empilhadas como aliada no ecoar dessas mensagens. Essa celebração reggueira reafirma a importância da valorização do território e o vigor dos encontros presenciais - por isso, conectando sensibilidade e força, tornou-se tradição cá e lá.

A alteração climática trouxe melhorias para a saúde da população e retirou a cidade do topo do ranking mundial de pior qualidade do ar
por
Gabriel Porphirio Brito
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17/09/2024 - 12h

 

Calçada com pessoas com roupa de frio e segurando guarda-chuva
A previsão é de dias frios até quinta-feira (19). / Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

 

Após quinze dias de calor intenso e qualidade do ar comprometida, a cidade de São Paulo experimenta mudança significativa nas condições climáticas, com a chegada de uma frente fria. Entre os dias 15 e 16 de setembro, o Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE) da Prefeitura registrou uma alta na umidade relativa do ar, que chegou a 98%, com algumas áreas atingindo 100%. 

Melhoria da qualidade do ar

De acordo com dados do IQAir, São Paulo chegou a figurar na primeira posição do seu ranking global de metrópoles com piores índices de qualidade do ar, consequência direta da onda de calor, poluição, queimadas, e das condições atmosféricas desfavoráveis.

O CGE informou, na segunda-feira (16), que a formação de uma área de baixa pressão vinda do Paraná, na região Sul do país, trouxe instabilidades atmosféricas, o que provocou a chegada da chuva e a melhora da qualidade do ar. 

Além disso, a precipitação e o aumento da umidade permitiram a dispersão de poluentes que se acumulavam na atmosfera, tornando o ar mais respirável. A expectativa é de que essa melhora seja contínua ao longo dos próximos dias, já que a previsão meteorológica indica que a umidade e as temperaturas amenas devem persistir.

A capital, que até a semana passada estava em primeiro lugar no índice global de poluição, agora ocupa a posição 73, com o ar classificado como “bom”, segundo a plataforma IQAir.

Previsão do tempo

Segundo o Climatempo, a chegada da frente fria trouxe queda nas temperaturas, com máximas que não ultrapassam os 20°C até quarta-feira (18). Para esta terça-feira (17), a mínima registrada foi de 14°C e a máxima não deve passar 20°C. 

Embora a frente fria traga alívio momentâneo, ainda de acordo com o Climatempo, o efeito pode ser temporário. Com a previsão de retorno de temperaturas mais elevadas até o final da semana, com máximas de até 34ºC a partir de sexta-feira (20), é possível que a qualidade do ar volte a piorar, embora em menor intensidade e ainda com pancadas de chuva pontuais.

Estado de alerta

O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitiu, na segunda-feira (16), o alerta amarelo de “perigo potencial”, para a cidade, áreas do litoral e da região metropolitana. A previsão é de chuvas entre 20 e 30 mm/h, com um volume total de até 50 mm por dia, e ventos intensos, que variam entre 40 e 60 km/h. O Inmet também alerta para a possibilidade de alagamentos e pequenos deslizamentos, embora o risco seja considerado baixo.

Já nas regiões de Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, que recentemente sofreram com incêndios florestais devido ao tempo seco, há previsão de chuvas intensas. Essa chuva, que pode alcançar 50 mm por dia e ser acompanhada de ventos de até 60 km/h, representa uma mudança significativa para áreas que sofreram com a seca prolongada. No entanto, há riscos adicionais, como queda de galhos de árvores, cortes no fornecimento de energia elétrica e alagamentos localizados.

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por
Ivan Marino Iannace
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10/05/2021 - 12h

Após um ano de pandemia, aprendemos a tirar ensinamentos sobre os mais diversos assuntos, e na área do trabalho não seria diferente. Hoje, vamos ouvir um pouco sobre como estamos lidando e quais são os melhores meios que as pessoas encontraram para melhorar a condição de trabalho dentro de casa. Acontece que aos poucos fomos percebendo que o trabalho tomou nossas casas e não existe mais essa separação do nosso local de descanso e do local de trabalho, formando quase que uma invasão da nossa própria privacidade. Além disso, ninguém imaginava o quão cansativo seria trabalhar em casa é, sendo assim nada vantajoso para quem está trabalhando e também não para a empresa, pois o empregado fica tão exausto que aos poucos seu rendimento começa a cair.

Com o passar do tempo, as pessoas foram percebendo que para um melhor rendimento, seria necessário fazer um investimento em seus escritórios, visando melhorar seus equipamentos técnicos e também pensar sobre seu conforto, já que agora o escritório virou praticamente sua nova sala de estar. No podcast será levantado dados, números e também uma fala exclusiva de um funcionário de uma grande rede loja de informática. Espero que curta e aproveite o podcast para repensar suas horas em home-office. 

https://soundcloud.com/ivan-marino-iannace/whatsapp-audio-2021-05-10-at-141349

 

Gestão do trabalho home office: como fazer de um modo eficaz

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As covereadoras Dafne Sena e Samara Sosthenes relatam as dificuldades em serem mulheres que representam pautas minoritárias na Câmara Municipal de São Paulo
por
Evelyn Fagundes, Gabriela Costa e Malu Marinho
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08/05/2021 - 12h
A covereadora Samara posa para foto
Samara Sosthenes, covereadora pelo PSOL em São Paulo. — Foto: Divulgação

“Era um momento tão ruim que, para mim, a única saída era a morte, o suicídio”, confessa Samara Sosthenes, atual covereadora do mandato coletivo “Quilombo Periférico”, ao relembrar de sua vida há dois anos atrás. A sua vontade de permanecer viva só retornou quando ela viu Robeyoncé Lima, co-deputada estadual de Pernambuco e Erica Malunguinho, deputada estadual de São Paulo, serem eleitas como mulheres trans, em seus respectivos cargos, e viu o potencial de mudança que as minorias na política possuem. “Hoje, eu estou tendo a oportunidade de legislar com essas pessoas e eu penso que não posso morrer porque é a minha vez de fazer essa diferença. Enxergar mulheres como eu se elegendo e atuando daquele jeito salvou a minha vida”, diz.

Em 2015, Samara Sosthenes foi morar, por necessidade financeira, em uma ocupação do MTST, no extremo sul da capital paulista. Dentro desse contexto, ela começou a conviver com diferentes histórias e a entender a questão da luta por moradia no país. Quando iniciou seus estudos na Uneafro Brasil, da qual hoje é coordenadora de um núcleo da Luz, ela também teve contato com os problemas da educação brasileira atual. “Todo meu aprendizado político foi fruto do meu contato com os movimentos sociais, sejam eles por moradia, por educação ou pelos direitos das mulheres. Tudo o que eu sei é por conta deles.”

Assim como Samara, Dafne Sena, covereadora da “Bancada Feminista” pelo PSOL, aliou-se à política na cidade de São Paulo, mas com foco na causa ambiental. "Eu me organizei, me filiei ao partido quando mudei para São Paulo, há uns seis ou sete anos. Sempre estive organizada nos movimentos ambientais e em várias outras iniciativas aqui na cidade, como pela igualdade de gênero".

Mesmo antes de participar assiduamente dos movimentos sociais, a covereadora já discutia política em casa, com sua mãe e seus avós. Além disso, Dafne é adepta ao veganismo:  “já fazem uns bons anos que sou vegana, sempre estive junto aos ativistas, nesse movimento que aqui no Brasil a gente chama de 'veganismo popular', uma proposta ligada à agroecologia e reforma agrária, contrapondo a vertente liberal, que se alia ao próprio mercado e ao agronegócio."

covereadora Dafne sena
Dafne Sena,  parlamentar pela Bancada Feminista do PSOL em São Paulo. - Foto: Reprodução.

A política ainda é demasiadamente masculina, o que traz a tona, a cada dia, a dificuldade de ser mulher dentro da câmara: "estar nesses espaços, no Brasil de sempre — mas principalmente no de hoje em dia — é um enfrentamento constante". Permanecer nesses ambientes é fortalecer a resistência e ultrapassar obstáculos diários, "se ficarmos presos em estereótipos nunca vamos entender de fato a luta que é necessária, pois, no momento em que estamos, a ideia de 'passar a boiada' significa a destruição absoluta das nossas condições de vida."

Sobre esses estereótipos, Dafne revelou ser muito difícil tentar alcançar as expectativas colocadas em uma mulher eleita. Geralmente, elas rondam em torno da própria falta de representatividade, já que, como não há muitos integrantes de minorias dentro da política, é sobre os poucos existentes que recai a responsabilidade de expor essas demandas. “A cada pauta adicionada na nossa luta, também acrescentamos mais elementos do que as pessoas esperam que a gente seja e que nunca vamos conseguir atender”.

Além disso, também existem os ideais criados pelos adversários políticos e as dificuldades que são enfrentadas para garantir que determinadas ações sejam realizadas. “É um movimento de muita auto reflexão, às vezes, mas principalmente um movimento de tentar permanecer nesses espaços apesar de todas as contradições e todos os elementos que são colocados como obstáculos”.

Dafne Sena, ao centro da foto, em ato de solidariedade pelo caso da modelo Mari Ferrer. - Foto: Reprodução
Dafne Sena, ao centro da foto, em ato de solidariedade pelo caso da modelo Mari Ferrer. - Foto: Reprodução 

Da mesma maneira que Dafne enfrenta dificuldade por ser mulher dentro da política, Samara também sofreu não apenas por ser uma mulher negra, mas também por ser trans. Na madrugada do dia 31 de janeiro, a covereadora afirmou que um vizinho ouviu barulhos de disparos na frente de sua casa, uma situação parecida com o que ocorreu com as vereadoras Erika Hilton e Carolina Iara”, ambas mulheres trans. A Polícia Civil teria concluído que não houve atentado nem no caso de Iara, nem de Sosthenes e, durante o andamento das investigações, ambas tiveram que andar acompanhadas de seguranças particulares. 

Samara ainda reiterou que, desde a morte de Marielle Franco, os ataques a todo tipo de minorias na política têm aumentado intensamente e que, provavelmente, são causados por conta do crescimento da representatividade dentro da política e são mais direcionados a lideranças femininas, pretas e periféricas. “Nossos corpos na política são novidade e eles sabem o efeito que causamos: a política está mudando, mas isso também causa uma reação do outro lado; o lado branco, sexista, cisgênero, acompanhado por bancadas do boi, da bala e da Bíblia. Então esses ataques vêm por conta do medo, porque a única maneira que eles sabem responder é com a violência.” 

Apesar de todas as dificuldades enfrentadas, principalmente no contexto pandêmico, Dafne afirma continuar na luta, se apegando à imagens de um futuro melhor. “É exaustivo sim, cansa. Tem épocas de profunda desesperança, mas eu entendo isso como uma tarefa histórica. Sinto que perdemos a solidariedade intergeracional, o entendimento de que as mudanças que queremos ver no mundo não necessariamente vão acontecer enquanto eu estou nele, mas acontecerão enquanto outras mulheres estiverem, aquelas que virão depois de mim”, revela.

Esse pensamento de fazer um trabalho que vai além de si é o que manteve Samara viva há dois anos e ainda é o que a sustenta nessa luta. “Acredito muito no poder da representatividade, porque do mesmo jeito que me espelhei em diversas mulheres como eu, muitas pessoas vêm me dizer que sou uma inspiração. Eu me sinto muito lisonjeada, mas também muito pressionada, porque a gente pensa “quem sou eu para servir de inspiração?”, mas só o fato de estarmos vivos, resistindo e lutando já é motivo de inspiração suficiente.” afirma esperançosa, Samara Sosthenes.

 

Medidas preventivas como a do ‘fique em casa’, é um insulto para quem não tem uma
por
Danilo Zelic
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20/04/2021 - 12h

Logo que a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a situação sanitária global como pandêmica, no dia 11 de março de 2020, a primeira medida anunciada para evitar a contaminação de Covid-19 foi a do ‘fique em casa’. Conforme estudo produzido em junho de 2020, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a estimativa do número de pessoas em situação de rua no Brasil é de 221.869, um crescimento de 140% desde 2012. Diante dos entraves que a crise trouxe nas questões socioeconômicas da população, especialmente aos mais vulneráveis, a tendência é de um crescimento da população de rua, segundo Jorge Broide, psicanalista e professor de psicologia da PUC-SP. “As pessoas estão perdendo suas casas, toda essa miséria e a crise social aumentando, a população de rua aumenta”.

Circulando pela região central da capital paulista, é evidente a grande quantidade de pessoas morando nas ruas. De acordo com pesquisa realizada em 2019, pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo em parceria com a Qualitest, o total da população em situação de rua é de 24.344, contabilizando 12.651 pessoas em situação de ‘rua’, conhecido também como ‘calçada’, e 11.693 na condição de ‘acolhido’. Desse total, 83,7% se identificam pelo sexo masculino e 14,8% pelo feminino. Se consideram pardos 35%,  brancos 21%, pretos 16% e indígenas e amarelas somam 2%. Das 32 subprefeituras da cidade, Sé e Mooca, que se localizam na Zona Central, somam 65,01% do total de pessoas morando na rua, respectivamente, 45,38% e 19,63%.

Quando se pediu que as pessoas ficassem em casa, Darcy Costa, coordenador do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), exigiu do poder público medidas emergenciais “como acesso à água potável para lavar as mãos, instalação de banheiros ao redor da cidade, kits com máscaras, sabonete e álcool em gel". Essas medidas visavam um único propósito, “evitar a devastação da população em situação de rua”.

Depois de um ano do atual cenário, Costa relata os principais problemas que se agravaram a respeito das políticas públicas adotadas. “Centros de acolhimento começaram a superlotar, [estão com] um número [de usuários] acima da sua capacidade em todos os serviços, inclusive até aqueles que foram abertos; banheiros públicos fechados; diminuição de pontos de distribuição de alimentos”.

Darcy Costa, coordenador do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) - Foto: Reprodução Facebook do MNPR
Darcy Costa, coordenador do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) - Foto: Reprodução Facebook do MNPR

Em junho do ano passado, a gestão de Bruno Covas (PSDB) registrou 28 óbitos e 289 infecções pela covid-19. Já o MNPR, no mesmo período, contabilizou 40 óbitos pela doença. Para o coordenador, o número oficial é baixo devido a uma “subnotificação”, ao passo que “a prefeitura, a secretaria de saúde e a assistência social se negam a apresentar esses dados”.

Em relação a situação dos equipamentos para a população de rua, constata que “estão com os leitos lotados e uma fila de espera para acessá-los”. “A gente sabe de casos, de ambulância saindo com dois, três dentro dos centros de atendimento, indo para os hospitais e essas pessoas não voltam mais”. Lembra do Comitê Intersetorial da Política Municipal para a População em Situação de Rua, Comitê PopRua, que segundo ele, “ficou um ano desativado”. “Brigamos durante um ano para poder retomar esse GT (Grupo de Trabalho), que jamais deveria ter sido desativado”.

No dia 12 de fevereiro de 2021, a prefeitura de São Paulo anunciou a vacinação para pessoas em situação de rua acima de 60 anos. O coordenador do MNPR relata que foi uma demanda apresentada pelo Conselho Nacional de Saúde ao Ministério da Saúde. Em um primeiro momento, o ministério colocou a população de rua na 16º posição para a vacinação, indo na contramão no que dizia o MNPR, “que era colocar a população de rua como um grupo prioritário, como os quilombolas e os indígenas”.

Por conta do decreto que prioriza a vacinação de pessoas acima de 60 anos, o MNPR conseguiu viabilizar a vacinação para a população de rua. Para Costa, “já é uma vitória” a vacinação dessas pessoas, mas que “um negacionismo muito resistente em não admitir as medidas cabíveis, por parte do governo federal”, além da “pressão que os governadores vêm sofrendo por parte do empresariado”, dificulta a contenção da crise. Ressalta também a falta de um calendário claro “para a vacinação da população, muito menos para a população em situação de rua”.

Ação do MNPR na região da cracolândia - Foto: reprodução Facebook MNPR
Ação do MNPR na região da cracolândia - Foto: Reprodução Facebook MNPR

Na opinião de Broide, “fazer política pública, abrangente e séria”, é o que falta para amenizar a situação em que estamos. “Construir espaços onde as pessoas que estão na rua possam elaborar e construir projetos de vida. E o cuidado sanitário e a questão da moradia, evidentemente”. Costa, no entanto, lembra de ações executadas pelo terceiro setor, que diante “da falta de vontade política [da prefeitura], cai sobre as ONGs”. Sobre isso, ele nota que se enquadra dentro de um “contexto de caridade”, mas alerta que esse contexto “acaba assumindo prerrogativas que deveriam ser garantidas pelo governo”. “Isso já está na Constituição, têm leis, são eles que recebem os impostos. Não que a sociedade civil não possa ter as suas iniciativas, mas isso não pode ficar à mercê de ações paliativas”.

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Decisão que vai contra o pedido da associação de moradores Viva Pacaembu foi tomada pela juíza Maria Gabriella Pavlópoulos em 25 de janeiro, ainda cabe recurso.
por
Eduardo Moura
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16/04/2021 - 12h

Em 2019 o complexo esportivo do Pacaembu, que pertence a prefeitura de São Paulo, foi concedido para a iniciativa privada através de uma concessão de 35 anos para a concessionária Allegra, no valor de R $752.409.974,07 a serem pagos durante esse período. A primeira parcela no valor de R $79,2 milhões, já foi paga pela concessionária.

A concessão do complexo esportivo do Pacaembu, inclui os seguintes itens:

  • estádio de futebol;

  • piscina olímpica aquecida, com arquibancada para 2,5 mil pessoas;

  • ginásio poliesportivo coberto com capacidade 2.500 espectadores;

  • ginásio de tênis com piso de saibro e capacidade para 800 pessoas;

  • quadra externa de tênis com arquibancada para 1,5 mil pessoas;

  • quadra poliesportiva externa com iluminação;

  • três pistas de cooper, com 500, 600 e 860 metros;

  • duas salas de ginástica;

A Praça Charles Miller e o Museu do Futebol não fazem parte da concessão e permanecem sob comando da administração pública.

O embate entre a prefeitura de São Paulo e a associação de moradores do bairro, Viva Pacaembu, acontece desde o início da gestão Dória na prefeitura de São Paulo em 2016, quando o então Prefeito colocou o projeto de concessão do complexo esportivo do Pacaembu como prioridade na agenda da secretaria de desestatização do município. O motivo alegado pela secretaria de desestatização para a concessão do complexo esportivo é a queda de rendimentos devido à significativa diminuição de eventos esportivos no complexo, principalmente os jogos de futebol. Com as arenas de Palmeiras e Corinthians em plena atividade, o estádio deixou de ter uma média anual de 75 jogos para uma média de 30 jogos por mês em 2017. Isso porque Palmeiras e Corinthians, principalmente, eram os clubes que mais utilizavam o estádio para as suas partidas.

A associação Viva Pacaembu é muito engajada e ativa em toda e qualquer decisão tomada em relação ao bairro e durante todo esse período vem contestando diversas ações no projeto de concessão.

Uma das questões apontadas pela associação dos moradores é a utilização do complexo esportivo do Pacaembu pela população. A Viva Pacaembu cobra para que o uso do complexo continue gratuito e com acesso livre a todos. Em contato com o Secretário Executivo de Projetos Estratégicos, Alexis Galias de Souza Vargas, ele assegura que a utilização do complexo esportivo para toda a população paulistana, está prevista no contrato da concessão e deverá ser cumprida rigorosamente.

Outra questão apontada pela a associação é a demolição do Tobogã para a construção de um prédio que contará com lojas, restaurantes e até um hotel. No lugar onde fica hoje o tobogã, entre 1940 e 1970, ficava a concha acústica, utilizada para eventos musicais. Somente no final da década de 1960, com o aumento significativo do público nos jogos de futebol, é que o tobogã foi construído, aumentando a capacidade do estádio em 10 mil lugares. O estádio então passaria a ter a capacidade de público de 37 mil pessoas. A associação dos moradores na época, também foi contra a demolição da concha acústica e a construção do tobogã.

Em janeiro deste ano o juiz Alberto Alonso Muñoz da 13 Vara de Fazenda Pública, concedeu uma liminar que proibia a demolição do tobogã. Porém tanto a demolição do tobogã quanto o pedido de anulação da concessão do complexo esportivo do Pacaembu, foram negados Pela juíza Maria Gabriella Pavlópoulos, também da 13 Vara, alegando que o tobogã não faz parte do patrimônio tombado do estádio e que na época da construção do tobogã em 1970, também tiveram críticas em relação a descaracterização da arquitetura do estádio com a construção do tobogã. 

Confira a entrevista feita com o Secretário Executivo de Projetos Estratégicos, Alexis Galias de Souza Vargas, contando um pouco mais sobre o projeto de concessão do complexo do Pacaembu no link abaixo:

 

 

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Em novo livro o pesquisador traz detalhes sobre a milícia brasileira e a relação desses grupos com a morte da vereadora Marielle Franco
por
Artur Ferreira, Gabriela Neves e Natasha Meneguelli
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09/12/2020 - 12h

O jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), Bruno Paes Manso, acaba de lançar seu novo livro “A república das milícias: Dos esquadrões da morte à era Bolsonaro”.

Na obra ele explica diversos aspectos das pessoas que entram para a milícia, a construção desses grupos e seus embates no estado do Rio de Janeiro. Além isso, conta detalhes das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco.

Em entrevista, o pesquisador afirmou que a política brasileira foi o nosso Martin Luther King ao lutar e mostrar para a população das comunidades cariocas que o futuro poderia ser diferente e menos violento. Principalmente, para os jovens que não deveriam se render ao sistema do crime organizado.

Bruno também fala do envolvimento da família do atual Presidente da República com  milicianos e da guerra aos excluídos da sociedade: “O Bolsonaro disse isso na televisão, a solução pro Brasil é uma guerra civil […] Essa guerra ao crime, essa guerra aos bandidos, é guerra aos negros, aos pobres, às pessoas que são vistas como perigosas”, afirma o pesquisador.

Além deste livro, o jornalista também escreveu “A guerra: A ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil” (Todavia, 2018), em parceria com a pesquisadora Camila Nunes Dias.

 

Confira a entrevista na íntegra:

Artur, Gabriela e Natasha: Bruno, acho importante pontuar para o leitor sobre quem é o miliciano, qual o perfil de alguém que entra para a milícia e o que difere do tráfico? E necessariamente todo miliciano é um policial?

Bruno Paes Manso: Quando começaram as milícias, esse modelo miliciano, por volta dos anos 2000, eram policiais, ex-policiais, e pessoas ligadas à segurança privada, os chamados penteados, que eram pessoas que circulavam nesse mercado de proteção, de segurança, tanto público como privado. Na polícia militar, civil, exército, corpo de bombeiros, como na segurança privada, que também é imensa. Um dos que eu entrevisto no primeiro capítulo, inclusive, tentou ser policial, não conseguiu, ele entrou no setor de segurança privada e foi para as milícias. Com o tempo isso vai mudando um pouco, principalmente quando tem uma série de prisões. Os grupos começam a brigar, a matar entre si, o que começa a mudar mais esse perfil, e pessoas ligadas aos territórios que as milícias dominam passam a entrar, sendo policial ou não. Mas sempre a conivência dos batalhões e das delegacias é importante. Mesmo não sendo policial, existe um modelo de negócio que inclui a participação da sociedade, a parceria, de membros da segurança pública nos territórios.

AGN: Outro ponto que é crucial para entender esse cenário que nasceu no Rio de Janeiro é o modelo de negócio da milícia. Se existem registros de milicianos que também traficam drogas, então qual é a diferença entre o tráfico e a milícia?

B: A polícia começa a ganhar muito dinheiro com tráfico. Primeiro nos anos 80, porque o tráfico de drogas é um negócio muito rentável, que gera muito lucro. A partir do momento que o cartel de Cali passa a exportar cocaína na América do Sul pelo Rio de Janeiro, São Paulo, num mercado interno importante aqui no Brasil, mas também no corredor de exportação, essa commodity passa a fazer parte da cultura urbana nessas cidades. Os grupos de tráfico começam a ganhar muito dinheiro, principalmente por conta da venda do varejo, da droga, e tudo o mais. Com o passar do tempo a polícia descobre formas de também lucrar com isso, tanto com a venda de armas, no Rio isso é bem importante, como no desvio de munições para esses armamentos. E com as operações de guerra, eles passam também para o modelo de policiamento no Rio, ao contrário dos demais estados, em São Paulo também não é assim, de invasões a morros, para supostamente fragilizar o tráfico. Mas muitas vezes eles pegam droga e arma para vender no mercado paralelo, e para chantagear e extorquir os traficantes, no pedido de arrego, que é justamente pra evitar que certos grupos sejam mais ou menos visados. Uma espécie de leilão. No caso da polícia civil, também muito próxima dos jogos de azar, das máquinas de caça níquel, que é um tipo de parceria que rende muito dinheiro para eles. Isso começa a mudar a partir dos anos 2000 quando ao invés de chantagear os criminosos eles começam a protagonizar o crime e dominar os territórios, para extorquir os moradores com taxa de proteção, de segurança, os comerciantes vendendo terrenos em áreas protegidas, imóveis em áreas irregulares, mercado de gás, de internet e tudo isso que a gente vai conhecer. Desde o kit churrasco até o cigarro do Paraguai. Tudo vira receita nesses territórios dominados pelos grupos milicianos, e aí o tráfico de drogas entra nessa também. Eles passam a organizar mais essa fonte de receita, nesses territórios que eles dominam. E é o tráfico de drogas principalmente, com uma parceria do TCP, Terceiro Comando Puro.

AGN: As características da milícia, ela vai se assemelhar com outros grupos criminosos ao redor do mundo? No contexto da América Latina. Você citou o próprio cartel de Cali, o cartel de Medellín. Também surgem grupos paramilitares na Colômbia nessa mesma época. Esses grupos têm comparações com outros ou eles são muito únicos do contexto carioca.

B: Eles são muito próprios do contexto carioca, mas é possível fazer alguns paralelos, porque eles ganham legitimidade e apoio da população por se venderem como o inimigo atual do tráfico de drogas. No caso da Colômbia e do México os grupos paramilitares passaram a ter influência nos governos como oposição e como exército inimigo dos cartéis.  Como uma forma de você enfrentar os cartéis. No caso do Rio também, as milícias têm esse discurso. Essa autodefesa comunitária feita pela polícia, os policiais moradores dos bairros que eles passaram a controlar. Sempre com essa justificativa de que o tráfico de drogas é um problema que eles vão ajudar a livrar a população. E assim também que eles vão se infiltrando no governo, no Ministério Público, na justiça, tem uma aceitação maior das instituições do estado que tem uma dificuldade maior em lidar com o tráfico. Então esse paralelo é possível.

AGN: É importante também citar que no livro, no início, você fala da relação do tráfico com a consolidação da milícia. Em um momento do livro, você usa um conceito criado por traficantes que era o de apelidar a milícia de o “Comando Azul”. Essa simbologia de nomes mostra o que dá visão que o tráfico possui da milícia? A relação entre ambos é sempre de conflito?

B: No caso do Terceiro Comando Puro com as milícias não, eles são próximos. Mas tem, não fui eu que chamei, circulou, os policiais, os jornalistas de lá, que apelidaram de “Comando Azul” em determinado momento. Por causa da cor das fardas da Polícia, já o Comando Vermelho, o nome surgiu também em 1979 quando a Falange Vermelha surge também pela imprensa com uma conotação meio ligada aos grupos guerrilheiros, porque eles tinham trocado informação, conversas em Ilha Grande com outros grupos, então os delegados apelidaram de Comando Vermelho, Falange Vermelha. No caso do Terceiro Comando a cor é verde. Mas é interessante – o ADA [Amigos dos Amigos] é amarelo, porque tem alguns aspectos simbólicos que são interessantes porque no fundo eles, apesar dessa rivalidade muito profunda e violenta que existe, eles são muito parecidos na essência. A principal diferença são os paramilitares, que usam farda. Basicamente a diferença é essa, são igualmente violentos e criminosos. Uma tirania violenta que quer ficar rica por meio da venda de drogas, impondo o terror para tentar estabelecer o seu poder territorial.

AGN: E Bruno, entrando principalmente na linha narrativa do livro, você primeiro começa com a entrevista com o Lobo que você dá o apelido pra esse esse miliciano, esse ex-miliciano, [Bruno confirma a informação]. E você vai explicando que existe um conceito de justiça nessas comunidades, e que não é só no Rio de Janeiro, aqui em São Paulo também, a gente muito por conta do contexto do PCC. E lá você vai explicando esse contexto, citando episódios da vida do Lobo. E você poderia explicar o que leva o jovem a crer que entrando no grupo que gera violência, ele vai ter paz, vai ter ordem na comunidade dele.

B: O que levou 60 milhões de pessoas a votarem em um candidato que durante 27 anos defendeu a morte e a violência paramilitar contra bandidos? A gente não está mais falando de justiceiros localizados territorialmente nas periferias, como eram nos anos 80, como aconteceu na Baixada Fluminense. A gente tá falando agora de um país, que apesar de ao longo da história, e se imaginou que com o passar e o fortalecimento das instituições democráticas iria mudar, que iria ter um processo civilizatório que diminuísse a violência, os homicídios e a violência policial, a gente chega em 2018 elegendo o grande apologista dos justiceiros. O cara que falava que os grupos de extermínio da Bahia tinham que ser importados pro rio, o filho tentava legalizar as milícias, ele falava que no Carandiru tinha morrido pouca gente, tinha que morrer mais de mil presos, ele sempre foi um apologista dessa violência paramilitar. Por quê? Por que as pessoas engolem isso e por que isso persiste há tanto tempo? Eu venho entrevistando homicidas, né, e depois eu pesquisei o PCC, é uma coisa que é muito presente em territórios ou em sociedades com instituições políticas e demonstrativas frágeis, é uma constante sensação de vulnerabilidade e a crença de que o resgate da autoridade só pode ser feito por meio da violência. Então o homicídio e a violência nesses casos eles não são um problema em si, nesses casos é uma solução para o problema da ameaça de desordem, da ameaça de caos. Isso é muito forte. Eu lembro uma vez que eu fui fazer uma palestra nos Céus, Centros de Educação Unificados, tinham várias professoras, era um ambiente que eu imaginava muito amigável. Estava o Suplicy nessa conversa, tinha um rapper do Hip hop, e eu falando dos direitos humanos, uma audiência muito grande. E de repente uma senhora levantou, quando acabou a palestra, levantou a mão e perguntou: “olha, é o seguinte, meu filho foi assassinado em um roubo aqui na periferia e você tá falando de direito humanos. Eu queria saber o que você fala pra uma mãe como eu que perdeu o filho dela assassinado por um ladrão”? E a audiência inteira começou a bater palma, e eu fiquei com cara de otário no palco, é muito difícil eu falar e responder nessa situação. Mas é como se ela estivesse falando, “falar é fácil, mas se a gente não matar o ladrão, se você ficar defendendo o ladrão, a situação não se resolve”. Você desconstruir essa crença pra pessoa que vive uma imprevisibilidade cotidiana, uma violência, assaltado no ponto de ônibus. Esse tipo de ação covarde dos ladrões, e essa sensação de vulnerabilidade, ela acaba demandando algum tipo de solução, e o homicídio passou ao longo do tempo a seduzir as pessoas que acreditavam equivocadamente que isso podia ser uma solução para o problema. E a gente não conseguiu desconstruir isso, até achava que estava conseguindo, a Nova República vinha avançando e a democracia se fortalecendo. E a gente chega em 2018, com o grande defensor dessa forma de enxergar as coisas, sendo eleito presidente do Brasil com 60 milhões de votos.

AGN: E Bruno, ainda dentro esse imaginário popular de justiça e de “o bandido bom é o bandido morto”, essa mensagem acaba aparecendo também. Você vai falar de uma das milícias mais importantes nesse contexto, que é a Liga da Justiça. E eu como uma pessoa que cresceu vendo desenhos animados de Batman, Superman, Mulher Maravilha, lendo quadrinhos e queria saber isso de você, como foi analisar alguém que usa o símbolo do Batman e é um executor dependendo da situação...

B: É engraçado! Não, super legal essa sua pergunta! Primeira vez que me fazem, e eu tô dando muita entrevista, ela é boa! Não deixa de ser interessante que o Batman é um justiceiro, é um vigilante, ele tem toda uma moralidade própria, ele não deixa de ser um representante dessa ideia de vigilante, porque é numa cidade, Gotham, em que você não acredita em ninguém, não acredita no governo, na polícia, nas instituições, então o Batman que tem uma moralidade, o herói, super da elite tradicional de Gotham City, um cara muito bem educado, que tem esse lado sombrio e essa busca por justiça. E ao mesmo tempo ele não ultrapassa certos limites, ele evita matar, tem uma nobreza também. E, você sabe que um dos primeiros matadores e a Liga da Justiça ela surgiu porque tinha um policial matador que chamava “Batman”, e tinha um outro policial que as pessoas apelidaram de “Robin” e ele era um cara muito famoso na Liga da Justiça, e muito violento, inclusive, e por causa disso se ganhou o apelido. O Jerônimo e o Natalino, que eram dois dos chefes, me contaram e disseram que não era nada disso a história, e que na verdade eles ganharam esse nome porque quando eles eram candidatos a vereador eles saíam com esses trios elétricos para fazer campanha nas comunidades, nas favelas, tipo essas charangas com super herói, para atrair as crianças, pra fazer festa, e eles me disseram que era por causa disso. Mas, tem essa outra versão, que era por causa do Batman, que era super violento e tinha um parceiro que chamava Robin. O primeiro livro que eu escrevi, quando eu comecei a entrevistar os homicidas, quando eu comecei essa pesquisa 20 anos atrás, esse livro foi lançado em 2005, se chama o “Homem X”. E ele partia de uma entrevista que eu fiz com vários matadores, mas um deles, eu perguntei, “não vou poder usar o seu nome, você tá me contando sobre vários homicídios que você cometeu, então como é que eu posso te chamar”? E ele sugeriu “Wolverine”, “me chama de Wolverine”. E eu o entrevistei em 99, o X-Men não era muito conhecido ainda, tava começando, tinha o desenho na Record, e era por isso que ele sugeriu, não tinha o filme, não tinha toda essa franquia, tinha os quadrinhos, óbvio, mas não toda a franquia ainda que se tornaria popular. E eu achei uma metáfora super legal, por isso inclusive que eu usei o Homem X eu fiz referência a esse apelido, que ele se enxergava. E ele já tinha matado mais de 40 pessoas, já tinha perdido a conta, entrevistei ele porque eles praticavam chacinas, numa época que tinham 100 chacinas por ano em São Paulo, e chacinas é quando tem mais de três pessoas mortas, então era uma cena caótica. E eles ficavam matando entre si, porque tinham vinganças que começavam a acontecer a partir do momento em que um amigo deles era morto, eles iam lá e matavam o que matou o amigo, e o amigo do que morreu matava, então eles ficavam 10 anos se matando. Às vezes entrava uma terceira quebrada, e o “Zé povinho”, que era a galera que morava no bairro mas que não fazia parte em absoluto desse cenário, a não ser como mãe, prima e tal, mas estavam completamente de fora, eles eram o Zé povinho pra quem eles estavam pouco se lixando. Então um deles chegou a me descrever um tiroteio num parquinho de diversão num domingo a noite e ele me contou: “e tal pessoa correu pra lá e eu atirei”, mas eu falei, “esse parque tava vazio?” “Não, tinha gente”, e eu falei “p*rra, você só tá me contando dos caras, mas alguém morreu, alguém foi vítima de bala perdida”?! E aí, esse X-Men ou esse Wolverine, de alguma forma a disposição para matar, fazia com que ele se enxergasse como um super herói mesmo, porque de fato é um super poder, é quase uma evolução da espécie você ter a disposição pra atirar em alguém, pra matar alguém, você passa a ser um ex-humano, praticamente, e você ganha um super poder que quem não tá disposto a matar não tem. E ele só se importava com os outros ex-humanos, e eles ficavam nesse universo. E o Zé povinho, que eram os frágeis, os pouco poderosos, não tinham muita importância nessa lógica, nessa dinâmica, nesse universo masculino, da guerra e da segurança pública, e do medo, e no fundo é a tônica do que vai ser esses conflitos em diferentes níveis, em diferentes tipos de organização, mas sempre com pessoas se enxergando nessa guerra, nesse conflito, e eles tão pouco se lixando pro resto.

AGN: Outro ponto importante é o cinema, o que ele já retratou essa relação, você cita no livro o lançamento do “Cidade de Deus”, e você acabou de descrever um pouco da história do filme, que é esse ciclo de vingança, pode falar o que mudou nesse período? Você cita também a morte de Tim Lopes, que converge na mesma situação.

B: Cidade de Deus é um filme muito importante, tanto o filme quanto o livro do Paulo Lins, que inclusive escreveu na quarta capa do livro, sou “fanzaço” do livro, do Lins que é uma grande figura, do filme e do Meirelles também. O filme foi um divisor de água no cinema brasileiro, mas eles falam de um período do final dos anos 70, que no livro eu também descrevo, a partir da testemunha do Ailton Batata, que deu o testemunho pra Alba Zaluar em 2017. Alba Zaluar era uma orientadora, professora, uma antropóloga, que morreu no ano passado e que era orientadora do Paulo Lins quando ele começou a fazer o trabalho de campo na cidade de Deus, e era final dos anos 70, começo dos 80, quando a cocaína ainda estava começando a chegar, a venda de drogas ainda era pouco importante. Os ladrões de Caxangá, de casa, eram os principais criminosos do bairro, muito poucos, mas que já eram muito temidos. Mas, ao mesmo tempo o imaginário das pessoas, do medo e do fato de aquele bairro ter negros, pobres e pessoas perigosas, isso sempre foi a tônica da cidade e da violência da cidade. Esse medo, resultado do racismo estrutural histórico, um dos problemas raciais que a gente vive, os estigmas e tudo mais, justificava contra esses bairros uma ação violenta pela polícia nesses bairros, um abuso em todos os sentidos, de invasão de casa, de moradores, de esculachos constantes. As polícias passam, diante desse medo grande e muito profundo, enraizado, histórico e estrutural, a lidar com esses bairros como lugares onde vivem os inimigos, e passam a mandar, constantemente, tropas do exército para matá-los, prendê-los, e é quem vive nesses lugares passa a se enxergar como inimigo da cidade, é um drama grande, ainda mais que a maioria ainda tem que trabalhar. É muito disso que as facções vão usar pra seduzir a molecada que vivem nesses bairros, de “olha, o estado e o sistema te odeiam, eles querem te matar ou te trancafiar, te jogar numa jaula, vamos bater de frente contra esse sistema, você morre antes dos 25 ou você é preso, mas não vamos abaixar a cabeça”. Então, a gente começa a construir esses jihadistas típicos das periferias e dos grandes centros brasileiros. Pessoas que preferem morrer antes dos 25 anos mas que não querem baixar a cabeça pra esse sistema que os quer humilhar. Tudo isso é muito triste, é muito cruel, a gente produz isso, a gente acha que tá solucionando as coisas e tá criando problemas piores.

AGN: E, Bruno, acho importante pontuar isso também, que você fala no livro algumas vezes que o jovem vê a escolha na milícia, vê a escolha no tráfico e pouco lembra de viver de acordo com a lei, e achar outra maneira. E vão ter personagens na história do Rio que vão querer ver de outra maneira, achar outra solução e você cita a Marielle, uma pessoa que vai fazer uma carreira acadêmica, uma pessoa que vai militar contra isso, tem uma origem humilde e vai ser vítima disso [a violência]. Você pode contar como foi investigar o caso e contar isso, falar dos assassinos e dessa relação política.

B: Eu só acho o seguinte, eu não acho que poucos jovens vão pra esse lado. Respeitam as leis e muitos vão pro crime, mas, o que acontece, quando a gente é adolescente, principalmente homem porque isso tá muito ligado a masculinidade, você tem identidades a serem escolhidas e traçadas para virar adulto. E, o que o crime passou a usar para seduzir a molecada foi justamente esse discurso antissistema de: “olha, o seu pai decidiu abaixar a cabeça pro sistema, decidiu pegar ônibus e foi humilhado pela polícia e morreu como um tiozinho, zé ninguém e você pode ser o cara! Bater de frente! Você morre atirando porque esse sistema só quer te ferrar, só quer te fuder. Então vamos bater de frente com esse sistema, fazer uma carreira no crime porque pelo menos a gente mantém a honra”. E quando o garoto tá formando sua identidade, a gente tá disputando com esse discurso, e a gente tá tentando falar que isso é uma grande ilusão, pode ser sedutor, mas, as pessoas que foram seduzidas por ele e hoje estão com 40 anos, 45 anos, e estão presos. Porque tem um monte de gente querendo matá-lo, ele não tem nenhum amigo, não tem mulher, não tem filho, ou se tem ele precisou pisar na bola e ser egoísta. Porque é uma vida egoísta. Então é uma escolha de alguém que precisa abrir mão de alguém de vários laços sociais pra seguir um caminho material e egoísta, na essência. Então, quando o cara entrou na onda assim, quando ele estava no embalo e ele vive aqueles 4, 5 anos se achando o X-Men ele tá se achando, ele tá curtindo ainda, mas, ele começa a perceber que é uma puta de uma roubada. E todos que eu converso e que conseguiram sobreviver falam isso “se eu pudesse eu saia, se eu pudesse falar pra alguém não entra, é uma puta de uma roubada”! Só que a gente não consegue mostrar e não consegue ganhar muitas vezes essa molecada, e como é que a gente ganha? É abrindo portas, abrindo janelas, pela cultura, pela arte, pela construção de um estado que garanta uma certa sensação de segurança, que permita falar de amor, de solidariedade, com muito mais participação das mulheres. E a Marielle, acima de tudo, era essa voz feminina das periferias, ela era essa voz que vinha com esse discurso “olha, gente vocês estão errados, isso é um discurso masculino equivocado, a guerra não leva a nada, a violência não leva a nada”. E esse era um dos motes dela “quantas pessoas vão ter que morrer até que essa guerra acabe”? Ela tinha inclusive o lema da campanha “Ubuntu”, que vem da África do Sul, do Mandela, do 15º, quando o Mandela é eleito presidente no pós-apartheid e propõe uma solução política e revê a história do Apartheid e fazer uma espécie de “Comissão da Verdade” e falar dos problemas do que aconteceu, mas, não pra haver um grande racha da sociedade, mas, pra propor pra partir pela política e caminhar pra frente. Então, ela tinha muita essa visão conciliatória, essa visão ao mesmo tempo muito corajosa de uma mulher e de chega da guerra, a solução é a política. E ela era a representante desse discurso antiguerra, né, e por isso que eu acho que ela é tão significativa, ela representa tanto. E ela foi o “nosso Martin Luther King” simbolicamente de tudo que ela representava, num momento muito especial, pouco antes da eleição do Bolsonaro, ela era anti-mensagem do Bolsonaro, era outro tipo de visão.

AGN: E Bruno, ainda nessa estrutura política, nessa estrutura de incentivo a jogar milhares de jovens nesse cenário, você disse que teve um espanto ao analisar profundamente. Você citou que viu a estrutura da milícia e do tráfico se compararem por fuzis, pela quantidade de fuzis que eles tinham. E você como alguém que veio do contexto paulista, e tinha mais essa análise do PCC e desse contexto que a gente tinha em São Paulo, e como você vê essa estrutura, as diferenças entre cada uma, e você poderia citar outros espantos que te gerou essa investigação no Rio?

B: Lá no Rio tem muitos fuzis, e foi muito recorrente eu ouvir isso dos traficantes, e das pessoas que estão envolvidos nessa cena, essa comparação: “no meu morro tem 400 fuzis” ou “quando eu era chefe tinha 100 fuzis”, “as milícias tem 800 fuzis”, e todo poder criminal sendo medido por fuzis. Então, a compra, essa guerra fria, essa corrida quente e fria, mas, essa corrida armamentista faz parte da cena do Rio. O mercado de fuzis é estrutural pro problema da cidade. E, também como a polícia está completamente envolvida nessa cena e como acaba sendo protagonista dessa cena e tal. Aqui em São Paulo ainda existe essa divisão de “crime e polícia”, por mais que a polícia também tenha seus esquemas e também mate, e tenha vários problemas e muitas vezes, principalmente pós-Bolsonaro, você vê que tem uma série de notícias de negócios de policiais em algumas quebradas vendendo terreno, vendendo gás, será que é um princípio de milícia? Sempre na iminência de perder o controle da polícia. E, isso de fato acontece pela violência da polícia de São Paulo você corre esse risco, mas, ainda não, os próprios oficiais da polícia conseguiram por enquanto zelar, mas, estão sempre aí na iminência “será que perde o controle, será que não perde”? Mas, no Rio não, no Rio já foi, já foi embora, e precisa reinventar a polícia, porque a situação é muito complicada.

AGN: Bruno, aproveitando que a gente já falou da Marielle, eu queria falar mais desse contexto político. No livro, você relata a questão do Bolsonaro, a família Bolsonaro, com as milícias e queria que você comentasse um pouquinho se essa relação deles, política – temos aí um presidente eleito, é uma forma de institucionalizar a milícia e de levar ela para outros lugares do Brasil, você também citou um pouco agora de São Paulo.

B: Eu acho que apesar da milícia estar infiltrada na instituição, ela se caracteriza por ser paramilitar, e você ter um presidente que seja um defensor das milícias ou políticos que defendam essa violência paramilitar é o melhor dos mundos para eles, porque eles ganham dinheiro no mercado informal. Então, se eles virarem “Estado” eles entram pra formalidade e até perdem a característica que permite que eles fiquem ricos, que é justamente organizar e negociar no mercado ilegal, tanto armas, munições e tudo isso. Mas, você ter amigos “costas quentes”, e parceiros costas quentes, quando você consegue ter políticos simpatizantes é o melhor dos mundos, você consegue eleger pessoas, e manter essas pessoas no poder eles vão ficar fortes. E é algo que a gente tem visto com a eleição do Bolsonaro e o crescimento da violência policial no Brasil inteiro, foram 3 anos de recordes seguidos. O modelo de negócios do Rio já é uma fonte de inspiração pra outras ideias, para serem reinventados em outros estados, de acordo com as histórias e com as oportunidades criminais do estado. Agora, quem sabe, isso é um pesadelo de 4 anos que nós estamos vivendo e nas próximas eleições isso acabe? Eu acho que, enfim, a gente teve aí 33 anos de Nova República relativamente civilizada, uma democracia que com todos os problemas se manteve, um país que progrediu no ponto de vista civilizacional e cidadão e tal. Mas, que a gente entrou nessa imensa depressão coletiva em 2018 por uma série de problemas políticos, econômicos, fiscais e tal e que elegeu Voldemort, falando em personagens, né. E achou que o Voldemort era a solução, ou o Capitão Feio da minha época de Mônica e Cebolinha. Então, “vamos escolher o vilão para governar já que os heróis não conseguiram”.

AGN: E Bruno, e essa questão da pandemia e a família Bolsonaro estar envolvida com a milícia, você acha que eles continuam [juntos] ali ideologicamente ou mudou alguma coisa nesse contexto atual?

B: Não, eu acho que o Bolsonaro se tem assim uma grande qualidade, me parece assim quanto a isso não se pode negar, é a honestidade de falar tudo que ele pensa, inclusive coisas que os próprios militares sempre tiveram vergonha de assumir nos porões, como a tortura e o assassinato. O Bolsonaro defendia o pau de arara numa bancada do Congresso, em uma CPI do Banco Central ele falou que tinha que colocar no pau de arara o ex-presidente do Banco Central porque aí ele ia começar a falar, e defendia a tortura em plena sessão oficial de CPI. Defende assassinatos, defende guerra civil, ele sempre defendeu e foi um apologista da violência paramilitar e sempre desacreditou a constituição de 1988, tanto ele como uma série de pessoas no Exército inspiradas e norteadas pelo Carlos Brilhante Ustra, além de ser um dos principais combatentes e torturadores dos portões da Ditadura Militar, foi um dos ideólogos importantes desse grupo que dizia que a Nova República era a grande derrota do Regime Militar e dos militares, porque tinha colocado guerrilheiros nos postos de comando. E o grande desafio do Exército era vencer a batalha ideológica que eles estavam perdendo pros comunistas e esquerdistas que estavam nas universidades, nas escolas, nas artes, em todos os campos culturais, eles perderam a batalha da cultura, depois vai dialogar com Olavo de Carvalho e com esse loucões que a gente vai conhecer agora nos tempos de hoje, que antes pareciam figuras que a gente dava risada e viviam sozinhas no mundo, e que não ameaçavam e por algum motivo isso a criar uma força quase, voltando a falar do Voldemort, uma Sonserina se articulando e o “mundo das sombras” vindo à tona. Esqueci o que você tinha perguntado, e você vê, vou divagando e vou fugindo da sua pergunta.

AGN: Da questão da pandemia e se mudou alguma coisa.

B: Então, ou seja, eu tô dizendo tudo isso pra dizer que eles são muito convictos dessas bobagens todas e dessas teorias conspiratórias. Eles acham que eles são os vilões e eles são os mocinhos! E a gente votou neles. Votou nos caras que queriam destruir o Brasil, diziam que tinham que matar 30 mil pessoas, o Bolsonaro disse isso na televisão, a solução pro Brasil é uma guerra civil, “enquanto não morrerem 30 mil pessoas ou menos isso aqui não tem jeito”, é uma pessoa que despreza as pessoas que vivem no Brasil! Essa guerra ao crime, essa guerra aos bandidos, é guerra aos negros, aos pobres, as pessoas que são vistas como perigosas! Isso é uma coisa evidentemente racista! Isso é autodestrutivo, é uma pessoa que odeia os brasileiros. Isso é muito triste, a gente fazer essa escolha suicida, escolher o vilão, pra mandar na gente, né, e inverter as coisas, e ele justifica essa guerra dizendo que os vilões são os “outros” que não concordam com ele. E por alguma forma ou maneira, um motivo, que espero que passageiro e talvez muito veiculado a tristeza, muito veiculada ao desespero, a crise que houve em 2018 a tudo isso.

AGN: E, Bruno, indo para a reta final da nossa conversa que foi um prazer e nós gostamos muito de tirar essas dúvidas e bater esse papo, eu preciso fazer uma das perguntas que eu mais queria fazer para você que é ainda no imaginário popular e de “a gente eleger o vilão”, uma coisa que eu também cresci vendo foram os filmes de Máfia, como Scarface, Poderoso Chefão, entre outros clássicos do cinema. E você narra de uma forma muito cinematográfica, o que me lembra Tropa de Elite e Cidade de Deus, e você narra a prisão do Queiroz e fala que na sala em que ele estava quando foi preso havia um cartaz do AI-5 [Ato Institucional Número 5], e um boneco do Tony Montana do filme Scarface. O que o imaginário de um miliciano que tinha tanta influência tanto no governo quanto fora, mostra sobre o Brasil e sobre nós, e sobre o que este país está virando?

B: Precisa dizer alguma coisa?! Não precisa! O cara tinha um boneco do Tony Montana na lareira, assim o que mais?! Ele está dizendo o escárnio! Qualquer coisa que eu disser não vai chegar aos pés da imagem! As pessoas muito claramente podem tirar suas próprias conclusões, não há o que eu diga. O que eu disser vai atrapalhar, porque é muito forte a cena.

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