Especialista alerta para riscos do uso acrítico de plataformas de IA na educação
por
Thomas Fernandez
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04/10/2025 - 12h

A inteligência artificial (IA) ganhou rapidamente espaço em diferentes setores da sociedade, e a educação não ficou de fora dessa tendência. Plataformas capazes de corrigir redações, recomendar atividades personalizadas e até mesmo substituir parte das tarefas do professor estão em alta.

A promessa, vendida por empresas de tecnologia e gestores entusiasmados, é de que a IA pode democratizar o ensino, personalizar a aprendizagem e aliviar a carga de trabalho docente. Não por acaso, de acordo com o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC), sete em cada dez estudantes do Ensino Médio já utilizam ferramentas de IA generativa em trabalhos escolares, mas apenas 32% afirmam ter recebido orientação na escola sobre como usar esses recursos de forma pedagógica. 

Há quem veja nesse movimento um risco de precarização do trabalho dos professores, transformando a inovação em mais uma engrenagem de uma lógica de cortes de custos e desvalorização profissional. Afinal, a inteligência artificial na educação é realmente uma aliada do professor ou pode acabar sendo um instrumento de substituição e perda de direitos? 

Em entrevista à AGEMT, Pedro Maia, cientista de dados e pesquisador em ética e tecnologia, alerta para o risco de que a IA seja utilizada como justificativa para reduzir a presença e a importância dos professores. Para ele, é preciso estar atento à lógica de mercado que move grande parte das inovações tecnológicas aplicadas à educação: “O risco é que as escolas passem a enxergar a inteligência artificial não como apoio, mas como substituição. Se uma plataforma consegue corrigir automaticamente atividades e sugerir trilhas de estudo, a tentação de reduzir o quadro docente e cortar custos é enorme”, explica. 

Segundo Maia, isso poderia levar a uma precarização ainda maior do trabalho docente, em um cenário no qual professores já enfrentam baixos salários, excesso de carga horária e falta de condições adequadas de trabalho. “A promessa de eficiência pode esconder a intenção de enxugar gastos. É a lógica neoliberal aplicada à educação: menos investimento em pessoas, mais aposta em soluções padronizadas”, acrescenta.

Pedro Maia, cientista de dados.
Pedro Maia, cientista de dados. Foto: Arquivo Pessoal.

 

Maia também chama atenção para o risco de aprofundar desigualdades: “Nesse cenário, a IA não democratiza, mas acentua a exclusão. O aluno da periferia continua com menos oportunidades que o de elite, ainda que ambos usem supostamente a mesma tecnologia”. Esse alerta encontra respaldo nos números. Em 2023, 69% dos estudantes já conheciam a IA; em 2024, esse índice subiu para 80%, segundo levantamento nacional feito pela Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES).

No entanto, nem todos têm acesso à mesma qualidade de ferramentas ou de acompanhamento pedagógico. Enquanto escolas privadas de ponta conseguem incorporar plataformas sofisticadas, parte da rede pública depende de versões limitadas, com pouco ou nenhum suporte docente.

Mesmo assim, o cenário não é apenas de resistência. Pesquisas feitas pela SEMESP (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo), mostram que 74,8% dos professores acreditam que a IA pode ser aliada no processo de ensino, e 39,2% já utilizam a tecnologia regularmente em sala de aula. Esses dados revelam uma categoria dividida, mas que enxerga potencial na tecnologia quando aplicada como ferramenta de apoio, não como substituição. 

Além disso, iniciativas públicas começam a surgir. O governo federal, em parceria com a UNESCO e a Huawei, lançou o projeto “Open Schools” na Bahia e no Pará. Ambos locais foram escolhidos pela falta de infraestrutura educacional, conectividade e recursos tecnológicos. A iniciativa foca na formação de professores em competências digitais e uso de IA, além de investimentos em conectividade e infraestrutura. O objetivo é reduzir desigualdades e preparar a rede pública para essa transição.

A coexistência desses dois pontos de vista - o risco de precarização e a promessa de apoio pedagógico - evidencia o dilema atual: A IA pode ser tanto aliada quanto algoz, dependendo da forma como for implementada. Se o objetivo for cortar custos, há risco de enfraquecer a profissão docente. Mas se, por outro lado, houver investimento em formação, infraestrutura e regulação, ela pode abrir espaço para práticas pedagógicas mais ricas e inclusivas.

O que está em jogo, portanto, não é apenas a chegada de uma nova tecnologia, mas o modelo de educação que o país pretende construir. A questão central permanece: a inteligência artificial será um recurso a serviço de professores e alunos ou mais um instrumento de precarização do trabalho em nome da eficiência econômica?

Enquanto não há consenso, cresce a urgência em debater publicamente os rumos dessa transformação. O futuro da escola não depende apenas das máquinas, mas das escolhas políticas, sociais e econômicas que definirão como, para quem e com quais propósitos a tecnologia será utilizada.

“Professor, amante da literatura e do bom jazz” era como ele se descrevia nas redes sociais; amigos e alunos lamentam a partida
por
Maria Eduarda Camargo
Khauan Wood
Bianca Novais
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29/09/2025 - 12h

O professor doutor José Salvador Faro, de 78 anos, morreu na madrugada desta segunda-feira (29), no hospital Samaritano Higienópolis, em São Paulo capital. 

Morre, aos 78 anos, o professor José Salvador Faro
Morre, aos 78 anos, o professor José Salvador Faro.
Foto: @cursojornalismopucsp via Instagram.

O velório será realizado no Cemitério São Paulo, localizado na Rua Cardeal Arcoverde, em Pinheiros, nesta segunda, a partir das 13h. Às 17h, o corpo seguirá para cremação em Jandira, município da região metropolitana de São Paulo.

Historiador pela Universidade de São Paulo (USP), Faro seguiu seus estudos no campo da comunicação no mestrado e doutorado, na Universidade Metodista de São Paulo (1992) e na USP (1996), respectivamente. Dedicou-se à produção acadêmica, com mais de cem artigos e quatro livros publicados, ao longo de mais de 30 anos de carreira.

Desde 2000, fazia parte do corpo docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde lecionou com paixão e entusiasmo nos cursos de comunicação da instituição.

Nas redes sociais, amigos, colegas de trabalho e alunos lamentaram a partida do professor.

Luisa Ayres, estudante de jornalismo da PUC-SP, lembra como eram as aulas: “Fui aluna, monitora e grande admiradora do Faro. Como era gratificante termos um professor que ainda prezava por sentarmos em círculo e conversarmos, discutirmos, ouvirmos e olharmos uns nos olhos do outro”.

Luisa guarda com carinho pequenos detalhes da convivência diária com o professor Faro: “O sorriso, o jeitinho de estar lendo suas notícias e escrevendo para seu blog sempre nos momentos que antecediam as aulas. A preocupação às quartas à noite com o jogo do Corinthians que se desenrolava no mesmo horário”. 

Victoria Silva, também aluna de jornalismo, destaca como Faro lecionava com empolgação dentro e fora das salas de aula: “Nas reuniões da iniciação científica, ele sempre chegava com o seu entusiasmo e conversava outros mil assuntos que não se relacionavam com o tema, mas sempre pertinentes com a realidade. Isso mostra como em qualquer momento, mesmo que fora das salas de aula, José Salvador Faro ensinou.

Faro fazia tratamento contra o câncer desde 2022, mas se manteve na sala de aula até o primeiro semestre de 2025, quando precisou se afastar para cuidar da saúde. 

“Fica aqui nosso muito obrigado, Salvador! Sua história e suas aulas com certeza salvaram muitos de nós”, se despede Luisa.

“Vai deixar muita saudade! Sua trajetória vai continuar ensinando, suas aulas vão continuar nas mentes e sua risada nos corações”, garante Victoria.

José Salvador Faro deixa a esposa Rozana Faro, as filhas Paula e Patrícia e o enteado Pedro.

A AGEMT lamenta a partida do professor Faro, que com alegria, paixão e confiança em seus estudantes, colaborou para a formação de senso crítico e ética de centenas de jornalistas e comunicadores ao longo de sua docência.

 

Quando o padrão de beleza tem idade, o que resta é virar resistência
por
Laila Santos
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19/09/2025 - 12h

Não é segredo que envelhecer é visto como inimigo geral da nação pela maioria das pessoas, principalmente mulheres, que lidam com suas próprias inseguranças e com a pressão imposta pelos outros nesse processo. Com o passar do tempo e a intensificação da era digital, parece que essa fase da vida bate na porta cada vez mais cedo. Uma sociedade que atrela a jovialidade à beleza e acredita estar sempre atrasada não é uma combinação amigável para quem está envelhecendo.

O molde representado na mídia e nos meios digitais tem forte influência nessa negação da idade porque valoriza o oposto. Nesse sistema, o idoso é visto como insuficiente e desatualizado, o que é lido como desnecessário, e isso resulta na invisibilidade de suas causas e dores.

A estudante de Psicologia Rafaelly Ketellyn, de 20 anos, dividiu o que escutava sobre o envelhecimento na infância: “Eu escutava que envelhecer era sinônimo de limitação, doença e solidão. Parecia ser sempre algo pesado, quase como se fosse o fim da linha e poucas vezes era falado sobre o lado positivo, como o aprendizado acumulado e a experiência.”

Já Maria Marinalva, de 55 anos, disse que, quando criança, ouvia que quanto mais a pessoa envelhece, mais ela fica chata e ranzinza. Ela afirma que não quer se encaixar nesse rótulo.

Segundo o relatório da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) divulgado em junho deste ano, o Brasil é o segundo país que mais realiza procedimentos estéticos não cirúrgicos. Entre as intervenções mais recorrentes estão: toxina botulínica, mais conhecida como Botox (45,7%), ácido hialurônico (22,9%) e procedimento de rejuvenescimento da pele com efeito lifting (7,9%). Todos esses métodos buscam, de alguma forma, retardadores de envelhecimento. O primeiro pode eliminar linhas de expressão; o segundo é usado para restaurar a elasticidade da pele, consequentemente, promete prevenir rugas; e o terceiro, por si só, já carrega a promessa de apagar os sinais da idade.

Atualmente, chegar à velhice se tornou ainda mais indesejado, por conta do padrão criado pelas redes sociais. A alta porcentagem de procedimentos estéticos é um reflexo disso. A juventude sempre foi um dos requisitos para mulheres na TV, como as “Paquitas”, assistentes de palco da apresentadora Xuxa, as dançarinas do Faustão ou até as Panicats. Hoje em dia, essa lógica migrou para a internet, cada vez mais presente na nossa rotina. Criadoras de conteúdo jovens têm mais patrocinadores e visibilidade.

Você é quem cria a sua fonte da juventude

Contra essa onda de pessoas que veem o envelhecimento como um pesadelo, há quem levante a bandeira de maturidade mais alto. Rafaelly lida naturalmente com esse processo da vida e pensa ser parte dela, embora entenda que não seja uma situação simples. Porém, sabe que é inevitável e tenta levar esse fato como uma oportunidade de amadurecimento e ganho de sabedoria. Para ela, o lado positivo do tempo é o de poder colher frutos que já plantou, uma chance de viver novas etapas e aprender a valorizar o presente.

O tempo como vilão está presente em diversas obras, como filmes, livros e mitos. O longa-metragem A Substância, estrelado por Demi Moore e Margaret Qualley, traz luz sobre o envelhecimento na indústria do entretenimento e critica a pressão para manter a juventude e a beleza, especialmente sobre as mulheres. No livro O Retrato de Dorian Gray, o personagem principal se sujeita a um pacto para nunca ficar velho e manter sua aparência jovem para sempre. Além disso, há também o mito da fonte da juventude, representada em vários trabalhos, por exemplo, Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, que, por incrível que pareça, nunca envelhece.

Marinalva também tem um pensamento mais aliviado com a passagem de idade. Ela compartilhou que lida super bem com isso e não deixa a mente envelhecer com o corpo. Acredita que precisamos aprender a aceitar para não ver isso como um grande problema. Porque a idade mais avançada faz parte da vida e acontece com todos.

Muitas mulheres buscam se encaixar no padrão imposto pela sociedade e sofrem com isso, porque é um ideal impossível de sustentar para sempre. Enquanto houver vida, não há como fugir da passagem do tempo e o que resta é aprender a lidar com isso e, principalmente, não deixar de viver por causa disso. 

Especialistas em arbitragem comemoram a decisão e ressaltam a importância da qualificação, para além da tecnologia
por
Tamara Ferreira Santos
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29/09/2025 - 12h

Por Tamara Ferreira

 

No dia 10 de agosto de 2024, após o empate por 1 a 1 contra o Flamengo, pela 22ª rodada do Campeonato Brasileiro, Abel Ferreira, técnico do Palmeiras, disparou contra a arbitragem brasileira, classificando o sistema como arcaico e dizendo não confiar no VAR, nos árbitros e nem nas televisões. O treinador declarou, inclusive, que só passaria a acreditar e confiar nas decisões dos lances quando a tecnologia fosse modificada. Na época, era o segundo jogo seguido da equipe contra o Rubro-Negro. No duelo anterior, realizado no dia 7, pelas oitavas de final da Copa do Brasil, Flaco López chegou a marcar, mas o impedimento foi assinalado — decisão contestada por amantes do futebol e, principalmente, palmeirenses, que reclamaram da falta de critério na marcação das linhas.

Parece distante, já que o lance ocorreu em 2024, mas o que não faltam são gols anulados por impedimentos milimétricos que, pela fama da arbitragem brasileira, geram dúvida se estavam irregulares ou não. Muitos desses lances, a olho nu, aparentam ser legais.

Recentemente, Samir Xaud, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) deu diversas declarações afirmando a chegada do impedimento semiautomático ao Brasil em 2026 para a disputa do Campeonato Brasileiro e da Copa do Brasil. Popularizado na Copa do Mundo do Catar, em 2022, a tecnologia também foi utilizada na Champions League e na Copa do Mundo de Clubes de 2025, além de ser protagonista nos dois jogos da final do Campeonato Paulista deste ano. O sistema usa de 12 câmeras especiais para recriar o lance em 3D e dar o veredito final do lance aos responsáveis pela arbitragem. O VAR que se conhece hoje custa mais de R$ 20 mil por partida, porém, estima-se que o novo sistema vai custar cerca de R$ 100 mil por jogo. Samir declarou no programa Seleção, do SporTV, que é um investimento alto, mas o trata como uma ferramenta importante e necessária para diminuir ainda mais os erros da arbitragem, reforçando sua ideia de transformar a arbitragem brasileira na melhor do mundo.

Sálvio Spínola, ex-árbitro e comentarista da Record, comemorou a utilização da nova tecnologia a partir do próximo ano. Assim como Abel, ele classificou o modelo atual como arcaico, por ser baseado em uma computação gráfica manual, na qual o árbitro de vídeo precisa traçar as linhas azul e vermelha sobre o ombro ou outra parte do corpo. Para Sálvio, o novo sistema é mais preciso, exige menos intervenção humana, garante decisões mais rápidas e confiáveis e, consequentemente, traz mais segurança ao público e aos profissionais envolvidos no jogo.

Paulo Vinícius Coelho, mais conhecido como PVC, jornalista e comentarista da Paramount+ e do UOL, vê o impedimento semiautomático como algo objetivo, já que a máquina será responsável por determinar a distância do atacante em relação ao último marcador, encerrando assim as discussões sobre impedimentos milimétricos e o trabalho manual de traçar linhas.

A 17ª rodada do Brasileirão deste ano também trouxe polêmicas, desta vez, em dois jogos diferentes, com lances muito parecidos, onde um o gol foi confirmado e no outro o impedimento foi assinalado. 

Em São Paulo x Fluminense, Ferreirinha marcou de cabeça após cruzamento de Marcos Antônio, ampliando para 2 a 0. Pouco depois, em Cruzeiro x Ceará, Marcos Victor fez o terceiro do Vozão, mas o gol foi anulado. O problema é que, nos dois lances, as linhas estavam praticamente sobrepostas e de acordo com a regra que a CBF tornou válida a partir de 2025, nos casos em que as linhas traçadas (a vermelha, do atacante, e a azul do defensor), ficassem uma em cima da outra, mesmo que o atacante esteja à frente, o impedimento seria desmarcado e o gol validado — o que não aconteceu no gol do Ceará. 

Renato Gaúcho, técnico do Flu, não poupou críticas à arbitragem, afirmando que toda rodada há uma polêmica com o VAR. Segundo ele, se a imagem mostrada no telão do Morumbis for a oficial, Ferreirinha estaria impedido e o gol deveria ter sido anulado. Irritado, disse ainda que erros como esse podem custar posições, rebaixar clubes e até definir o campeão.

Já Renata Ruel, ex-árbitra e comentarista da ESPN, destacou que a chegada do impedimento semiautomático ao Brasil é fundamental por sua precisão. Ela lembrou que o sistema atual pode errar até 30 centímetros por lance, margem significativa para jogadas milimétricas. Também ressaltou que as longas análises atrapalham a dinâmica do jogo e que as linhas atuais não passam credibilidade, já que não se sabe ao certo de onde são traçadas e qual é o frame da bola.

Samir Xaud, também declarou, desta vez ao BTB Sports que, a princípio, a entidade arcará com os custos da tecnologia, mas que futuramente o custo passará por um processo de transição para os clubes — o que preocupa, especialmente os de menor expressão, que já enfrentam dificuldades financeiras.

Sobre isso, Sálvio afirma que alguns estádios do Brasil não têm infraestrutura suficiente e não estão preparados para adotar a tecnologia, dependendo inclusive dos clubes que subirem para a Série A do Campeonato Brasileiro. Ele classifica a implementação em todas as fases da Copa do Brasil como algo praticamente inviável, acreditando que só deve ocorrer a partir das oitavas de final ou fases seguintes. O comentarista também ressaltou a necessidade de tempo hábil para preparar os estádios.

PVC destacou também que, além da tecnologia, a entidade precisa investir nos árbitros, oferecendo mais treinamento em diferentes tipos de lances, para que tenham autonomia e segurança — fatores que hoje ainda não são vistos com frequência. O jornalista lembrou que, durante Copas do Mundo, a arbitragem brasileira costuma se sair bem, mas no cenário nacional o desempenho cai. Para ele, não falta qualidade, mas sim confiança.

Uma fala que remete ao lance inusitado ocorrido no jogo de volta entre Corinthians e Athletico-PR, pelas quartas de final da Copa do Brasil, em 10 de setembro. Na ocasião, Diego, árbitro de vídeo, chamou Davi, árbitro principal, para revisar um pênalti marcado a favor do Athletico, afirmando: “Eu tenho o sentimento de que está fora (da área), está bom? Mas é sentimento.”

Momento do toque na mão de Matheuzinho que resultou em pênalti em Corinthians x Athletico-PR pela Copa do Brasil — Foto: Reprodução/CBF
Momento do toque na mão de Matheuzinho que resultou em pênalti em Corinthians x Athletico-PR pela Copa do Brasil — Foto: Reprodução/CBF

Davi, com personalidade, rebateu de imediato: “Nós não trabalhamos com sentimento, e sim com imagens.” Como o lance foi considerado inconclusivo, a decisão de campo foi mantida.

Além do semiautomático e da qualificação da arbitragem, torcedores e especialistas defendem a adoção de outras tecnologias, como o chip na bola. Isso evitaria dúvidas em jogadas como o gol de Yago Pikachu, do Fortaleza, contra o Sport, pela sexta rodada do Campeonato Brasileiro. Naquele lance, a bola bateu na trave e quicou próxima à linha, mas sem clareza se entrou ou não. No próprio áudio divulgado pela CBF, os árbitros não chegaram a um consenso, e a decisão de campo foi mantida. Para a comentarista Renata, o uso do chip, junto do semiautomático, é essencial para garantir a precisão e a credibilidade das decisões.

Fato é que a implementação da tecnologia será fundamental para o futebol brasileiro, prometendo transformar o cenário da arbitragem. Porém, ainda será necessário analisar como a CBF conduzirá esse processo, já que os clubes vivem realidades distintas, especialmente no aspecto financeiro. O próprio presidente da entidade já admitiu que o sistema é caro e que haverá transferência de responsabilidade.

Apesar dos desafios, torcedores, atletas e especialistas concordam que a tecnologia é indispensável para reduzir polêmicas. O caminho até 2026, contudo, exigirá investimentos em infraestrutura, capacitação e planejamento. Afinal, como destacou PVC, o objetivo é acabar com discussões que em outros lugares já não existem.

Entenda como a privatização do transporte público influencia na sua segurança
por
Amanda Campos
Gabriela Blanco
Lorena Basilia
Manuela Schenk
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10/06/2025 - 12h

Após o trágico acidente na linha 5-lilás que matou um homem de 35 anos, o assunto segurança no transporte público vem sendo amplamente discutido, principalmente quando se fala das vias privadas. A reportagem a seguir fala sobre a falta de segurança na mobilidade urbana na cidade de São Paulo. Em entrevista à AGEMT, o especialista Igor Bonifácio responde algumas das perguntas mais recorrentes sobre o assunto. Assista. 

 

 

 

Estação que dá acesso a bairro de cultura asiática teve seu nome alterado durante governo de Bruno Covas
por
Vinícus Evangelista
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30/04/2024 - 12h

Famoso por suas icônicas luminárias japonesas e por abrigar a maior comunidade asiática do Brasil, o bairro da Liberdade, em São Paulo, atrai cerca de 20 mil visitantes todos os fins de semana, conforme dados da APECC (Associação Paulista dos Empreendedores do Circuito das Compras). Muitos, cativados pela culinária, produtos e atmosfera oriental que permeia as ruas, desconhecem a origem negra do bairro e pouco têm acesso a essa história quando caminham sob a região próxima ao centro da cidade. A conexão com a cultura asiática foi ainda mais fortalecida com a mudança do nome da estação de metrô que serve a região para “Japão-Liberdade”, uma iniciativa sancionada pelo então prefeito Bruno Covas (PSDB) em 2018.

“Você trocar o nome de ‘Liberdade’ para ‘Japão-Liberdade’ faz duas coisas, primeiro, mata uma parte da história importantíssima do país, e segundo, gera um conflito e um desconforto desnecessário entre dois povos que ajudaram tanto no crescimento do Brasil”, explica o empreendedor social Thiago Braziel, em entrevista a CartaCapital. “Dentro do bairro Liberdade não são só Japoneses que vivem, são pessoas da China, Coréia, Taiwan, que estão ali ajudando a construir o Brasil”, completa. A estética do bairro tal qual conhecemos hoje começou a se moldar em 1970, quando foram instaladas as primeiras famosas lanternas orientais, porém, séculos antes disso, o bairro era visto como periferia. Conhecido como “bairro da pólvora”, nome que fazia alusão a Casa da Pólvora, fundada em 1754. Na época, a população do bairro era majoritariamente indígena e de origem africana, com dois locais que chamavam atenção: o Pelourinho, atual 7 de Setembro, e o Largo da Forca, atual Praça da Sé, onde escravizados que tentassem fugir ou cometessem, à época, outros crimes dignos de pena de morte, eram açoitados no primeiro local e castigados ao segundo, até serem enforcados publicamente.
 

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Placa instalada no Largo 7 de Setembro, antigo Pelourinho, em 2019. Foto: Vinícius Evangelista
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A teoria mais aceita para a origem do nome ‘Liberdade’ se deu em 1871 durante o Brasil colônia, na execução dos militares negros sentenciados por liderarem uma revolta que reivindicava acertos nos atrasos remuneratórios e exigia igualdade salarial entre soldados brasileiros e portugueses. Os líderes Joaquim Cotindiba e Francisco José das Chagas, conhecido como Chaguinhas, foram enviados de Santos, onde atuavam, até São Paulo, para serem enforcados publicamente no Largo da Forca. A prática de enforcamento público, comum à época, servia para dar exemplo e amedrontar possíveis revoltosos. A primeira execução a ser realizada foi a de Joaquim, que foi morto, porém na vez de Chaguinhas, a corda que o enforcaria arrebentou em duas tentativas. Os espectadores então começaram a gritar “Liberdade!”, clamando pela absolvição do condenado, porém, ele foi levado a uma terceira tentativa de enforcamento. Dessa vez com uma corda de couro, Chaguinhas foi enforcado, porém não morreu imediatamente, ele ainda apresentava sinais vitais mesmo pendurado pelo pescoço, até ser morto a pauladas.

“Atrás da porta que era a da cela de Chaguinhas as pessoas colocam pedidos, batem três vezes e acendem a vela no velário, um ritual feito há 201 anos. Francisco José das Chagas então é um herói de uma revolta nativista, ele é um mártir e um santo popular.”, afirma Wesley de Souza Vieira, pesquisador da USP, em entrevista ao Brasil de Fato.

A partir de doações de cabelo, o projeto confecciona perucas gratuitas para pacientes em tratamento quimioterápico
por
João Pedro Lopes
Natália Perez
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30/04/2024 - 12h

“Quando estava carequinha e ganhei uma peruca, vi o quanto essa peruca me ajudou a enfrentar o tratamento, os olhares de pena e também o espelho”, diz Débora Pieretti, fundadora do projeto à AGEMT. Sua ideia foi criar eventos para corte de cabelo solidário, nos quais as mechas doadas são usadas para a confecção de perucas que são doadas para mulheres - que assim como ela - perderam seus cabelos para tratamentos contra o câncer ou queda de cabelo (alopecia).

Em 2017, no dia 8 de março nascia a ONG Instituto Amor em Mechas. Um mês depois, no Dia Mundial da Saúde, foram entregues as primeiras perucas. Distribuídas em salões de belezas, urnas do projeto reúnem doações de mechas de cabelo cortadas que provavelmente seriam descartadas. Desde então, a meta mensal da entidade é arrecadar 1 quilo de mechas por urna, nas mais de 400 espalhadas pelo país. 

“Na verdade, a gente doa mais que uma peruca, nós doamos o kit do amor que além da peruca tem lenço, álcool em gel, colar de pérola, brinco, maquiagem, máscara, livro de autoajuda, tudo isso dentro de uma bolsa, tudo de forma gratuita” conta Débora. Com uma média mensal de 110 kits, o projeto já doou mais de 6100 kits do amor.  

 

MECHA
Desde sua fundação em 2017, o Instituto Amor em Mechas já entregou milhares de perucas e kits do amor gratuitamente, promovendo a autoestima e a confiança de mulheres em tratamento contra o câncer em todo o Brasil.
Foto: João Pedro Lopes

Motivação 

Durante seu tratamento quimioterápico, em 2016, Débora participou de um evento para pacientes oncológicas, no qual enquanto o cabeleireiro cortava a  franja da peruca que acabara de ganhar, pensou: "Quando eu estiver melhor quero que outras mulheres tenham a oportunidade de sentir o que eu estava sentindo e de terem acesso a uma peruca gratuitamente”, afirma.

Um ano depois, ela começou o projeto na sala de casa. Não muito depois, viu a necessidade de expandir, ter uma sala comercial e um estatuto formal com a parte jurídica. Apresentou sua ideia para empresas e assim fechou ações do Amor em Mechas principalmente durante o Outubro Rosa, mês de conscientização e alerta sobre o câncer de mama. 

“Estar triste e deprimida interfere no sistema imunológico, por isso procuramos levar alegria em nossas ações, elevando a autoestima da mulher em tratamento, para se sentir bela e feminina” explica ela. Além de seus marcos próprios, o projeto conta também com parcerias com empresas como Magazine Luiza e Max Love para a promoção de mais eventos. “A gente acredita que se cada um faz um pouquinho podemos chegar lá, por isso a hashtag do projeto é #juntos_podemos_mais.” 

 

MECHA
A iniciativa do Instituto Amor em Mechas vai além da doação de perucas, abrangendo parcerias com empresas e eventos como o Outubro Rosa, visando levar alegria e apoio às mulheres em sua jornada contra o câncer.
​​​​Foto: João Pedro Lopes

Trote Solidário 

Há 3 anos a PUC-SP recebe o Instituto durante a semana de Recepção Solidária dos novos alunos. Promovido pela Pastoral Universitária e pela Pró-reitora de Cultura e Relações Comunitárias, o evento aconteceu no dia 5 de março no hall em frente à biblioteca da universidade. “Para nós é super importante essa arrecadação tanto da mecha como também do nosso bazar. As pessoas que aqui participam do bazar estão também participando do trote solidário.” 

Além de participações em eventos, aquele que deseja colaborar pode ir até um dos pontos de coleta ou enviar pelo correio para o Instituto, sediado na Barra Funda. Durante o ano todo são bem-vindas doações financeiras, lenços ou bijuterias e principalmente mechas de cabelo de no mínimo de 15cm.  

“Eu sabia que ia ter, mas não tinha certeza se viria. Aí quando vi o pessoal aqui, me animei. Foi um pensamento de só ir, sabe? Cabelo cresce!” contou Letícia Patrocínio, uma das estudantes que mais doou cabelo no evento da Amor em Mechas na PUC. 

Para mais informações de como doar, acesse. Abaixo mais fotos do evento na PUC-SP.

MECHA
Letícia Patrocínio, uma das participantes do evento da Amor em Mechas na PUC-SP, compartilha sua experiência de doação, destacando a importância de contribuir para a causa e espalhar a mensagem de que 'cabelo cresce'.
Foto: João Pedro Lopes

 

MECHA
Em parceria com universidades como a PUC-SP, o Instituto Amor em Mechas promove eventos solidários, como o Trote Solidário, incentivando a doação de mechas de cabelo e contribuindo para a causa.
Foto: João Pedro Lopes

 

MECHA
Débora Pieretti, inspirada por sua própria jornada contra o câncer, fundou o Instituto Amor em Mechas, que oferece não apenas perucas, mas também um 'kit do amor' completo, incluindo itens essenciais e mensagens de esperança.
Foto: João Pedro Lopes

 

MECHA
Com mais de 400 urnas de doação distribuídas pelo país, o Instituto Amor em Mechas tem como meta mensal arrecadar 1 quilo de mechas por urna, demonstrando o poder da solidariedade em transformar vidas durante o tratamento contra o câncer.
Foto: João Pedro Lopes

 

MECHA
O Instituto Amor em Mechas, com sua missão de promover a beleza feminina e elevar a autoestima, oferece não apenas perucas, mas todo um kit do amor, repleto de cuidados e acessórios, para que cada mulher em tratamento contra o câncer possa sentir-se bela e confiante em sua jornada.
Foto: João Pedro Lopes

 

MECHA
Os eventos de corte de cabelo solidário do Instituto Amor em Mechas são momentos de solidariedade e esperança, onde cada mecha doada se transforma em uma oportunidade de fazer a diferença na vida de mulheres em tratamento.
Foto: João Pedro Lopes

 

A nova exposição do MASP explora designs contemporâneos, moda conceitual e a arte por trás das peças.
por
Livia Machado Vilela
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29/04/2024 - 12h

A coleção MASP RENNER reúne, pela primeira vez, as peças criadas por artistas e estilistas contemporâneos brasileiros especialmente para o acervo do MASP. O projeto durou três temporadas, entre 2017 e 2022, e envolveu 26 duplas de artistas e designers de moda, resultando em 78 trabalhos que compõem a exposição. 

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Sônia Gomes + Gustavo Silvestre, Vestido 3 (2020)

“A coleção foi pensada para exclusivamente para o museu, não sendo comercializada", afirma Leandro Muniz, curador-assistente da exposição. Ele explica, ainda, que existem diversos pontos de encontro entre moda e arte, como a técnica e o conceito por trás das obras. A exposição tem o objetivo de destacar estes pontos de encontro, aproximando a moda e arte aos olhos do público. 

A relação do MASP com a moda, no entanto, nasceu de um projeto anterior, que serviu de inspiração para a parceria do museu com seu patrocinador: a Renner. A coleção MASP Rhodia produziu 79 looks na década de 1960, que foram doados ao museu em 1972. O objetivo da coleção era continuar divulgando as ideias da indústria química Rhodia, que realizava desfiles no país para promover seus tecidos sintéticos e encomendava as peças aos seus criados, refletindo as tendências da arte e da moda.

Já na vez da coleção MASP RENNER, foram artistas e estilistas que atuam no cenário atual para colaborarem com a produção. Tendo em mente uma variedade de temas que abrangem questões de gênero, sexualidade, religiosidade, sustentabilidade e a pandemia da Covid-19.

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Randolph Lamonier + Vicenta Parotta, Casa Transcomunal (2022)

Quatro modos de operar são destacados no trabalho dos designers: aqueles que traduzem a sua marca pessoal nas peças, os que brincam com modelagens e a estrutura das roupas, outros que usam a moda como um meio de expressão política e social, e os que desafiam o conceito e os limites da moda. Todas estas ideias apresentam o mesmo ponto de encontro e o mesmo incentivador: o MASP. 

Segundo Leandro Muniz, “Alguns estilistas optaram por representar resistência e focaram no quesito social. Enquanto outros representaram o corpo, a técnica e a escultura das peças”. Para o curador-assistente, três palavras resumem a exposição: Memória, narrativa e corpo.

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Leda Catunda + Marcelo Sommer, Roupa de noivo (2017)

Para acompanhar a cobertura da exposição, acesse o link do vídeo

 

 

Montadora alemã denunciava trabalhadores “subversivos” para a polícia
por
Matheus Almeida
Anderson Santos
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29/04/2024 - 12h

Em 2024 completamos 60 anos do início da Ditadura Militar Brasileira. Durante os 21 anos que permaneceu no poder, o governo praticou abusos de poder e crimes contra sua própria população. Porém a violência não foi apenas estatal, visto que existiram empresas que colaboraram com o regime ditatorial. Uma delas é a atual segunda maior montadora de carros no mundo, a Volkswagen. 

Durante os anos de repressão a empresa trabalhou em conjunto com os órgãos de segurança pública, mantendo um controle ideológico dos seus funcionários e denunciando aqueles que apresentam qualquer atividade considerada “subversiva”. Um exemplo foi a demissão do eletricista José Miguel, despedido por distribuir um jornal entre os trabalhadores, além disso suas informações pessoais foram entregues à polícia. Não só informações eram entregues como os empregados também, sendo permitido prisões ilegais dentro das fábricas. Henrich Plagge foi um deles. Preso dentro do local onde trabalhava, Plagge foi levado ao DOPS e ficou encarcerado por cerca de três meses, submetido a torturas. O verdadeiro paradeiro dele foi ocultado, no dia da prisão, um gerente da fábrica foi a casa de Henrich e contou para sua esposa, Neide, que ele havia viajado a trabalho. 

Os operários que tinham contato com sindicatos eram classificados como “indesejáveis” e colocados nas chamadas “Listas Negras”, documentos com nome e endereço dos observados. As pessoas presentes nessa lista eram proibidas de serem empregadas em outras empresas e principalmente cargos de gerência e chefia. Outras companhias também contribuíram com essa lista, porém foi a Volkswagen quem mais registrou funcionários, 73. 

Em 2015, dez centrais sindicais e outras entidades civis entraram com uma representação no Ministério Público contra a Volkswagen, com base em levantamentos feitos pela Comissão Nacional da Verdade, onde foi apontada coparticipação da empresa alemã em repressões realizadas durante o regime militar. O MP iniciou negociações para a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta com a montadora em 2018, procurando um acordo para recompor danos causados às vítimas da repressão. Em 2020, mesmo com contradições, ambas as partes chegaram a um acordo com a empresa tendo que pagar R$36 milhões para ex-trabalhadores de suas fábricas que foram perseguidos durante o período. Isso livrou a Volkswagen de possíveis processos judiciais. 

O Ministério Público Federal (MPF) em 31 de março de 2021, divulgou o relatório final sobre a investigação da participação da Volkswagen na ditadura militar no Brasil (1964-1985), apontando que a montadora alemã se aliou de maneira autônoma ao regime e participou de diversos atos de repressão política. O relatório do MPF aponta que, apesar de não existirem provas que ligam a empresa alemã ao começo do Golpe, ela esteve presente no apoio a sua manutenção e obteve benefícios financeiros e de privação de direitos. Friedrich Schultz-Wenk, presidente da Volks em 1964, era ex-filiado ao partido nazista e demonstrava apoio aos militares em ações contra membros e apoiadores de partidos de esquerda.

Lucio Bellentani
Lúcio Bellentani, ex-funcionário da empresa - Foto: Lucas Lacaz Ruiz/Folhapress

Segundo o relatório, a Volkswagen por meio do seu Departamento de Segurança Industrial, delatava os seus trabalhadores aos órgãos de repressão do regime e prisões foram efetuadas dentro das fábricas. Lúcio Bellentani, ex-funcionário da Volks, declarou à Comissão da Verdade de São Paulo: “na hora em que cheguei à sala de segurança da Volkswagen, já começou a tortura, já comecei a apanhar ali, comecei a levar tapa, soco” 

Bellentani também disse em entrevista ao Brasil de Fato que ainda sofre com as consequências psicológicas. "Eu passei a ser uma testemunha viva do ocorrido dentro da fábrica. Eu fui preso lá, comecei a ser torturado lá. Foram 48 dias de pancadaria e tortura, não tinha dia nem hora. O problema é a sequela psicológica. Quem paga o pato é a minha esposa. Principalmente nesse período que estou dando bastante depoimento, tem noite que eu sonho que estou brigando". 

A Volkswagen também esteve presente em mobilizações para enfrentar as greves dos metalúrgicos que ocorreram entre 1979 e 1980 demonstrando, segundo o relatório, que ela "agiu para criminalizar as lideranças sindicais, colaborando com a polícia política para reprimir o movimento". 

A mostra reúne obras de presos políticos, projeto realizado pelo coletivo “Mulheres Possíveis” e acervo de resistência LGBT durante a Ditadura Militar
por
Ana Julia Bertolaccini
Raissa Santos Cerqueira
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28/04/2024 - 12h

“Toda obra de arte precisa ser exposta, principalmente sobre um período tão sombrio da nossa história, tão triste, tão horroroso e que a gente não pode deixar de falar sobre", afirma Alberto Iszlaji Júnior, professor de história graduado pela PUC-SP durante visita à exposição “Sol Fulgurante: Arquivos de Vida e Resistência”. A parceria da Pinacoteca com o Memorial da Resistência reúne obras feitas por presos políticos durante o golpe militar que partem da Coleção Alípio Freire, doada ao Memorial em 2023, e ficará em cartaz até 18 de agosto na Pina Estação, com entrada gratuita aos sábados.

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(Obra “Fantasmas da Esperança” de Marcela Cantuária - 2018/Foto: Ana Julia Bertolaccini)

“Sempre que eu trago os alunos aqui (no Memorial), o objetivo é que eles reflitam sobre a luta pela liberdade e pelo estado democrático de direito que temos hoje”, afirma, em entrevista à AGEMT, Ronaldo Silva, professor de história e filosofia que levou seus alunos para uma visita ao local.

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(Entrada da Exposição/Foto: Ana Julia Bertolaccini)

A exposição se divide em três partes, sendo a primeira delas um conjunto de pinturas, colagens e outros tipos de arte, produzidas em presídios da cidade de São Paulo nos anos 1970, como Carandiru, Tiradentes e o Presídio Militar Romão Gomes (Barro Branco). A segunda seção, parte de um projeto artístico realizado pelo coletivo “Mulheres Possíveis”, concluído em 2019, composto por desenhos e cartas descritivas desenvolvidas por mulheres em situação de cárcere na Penitenciária Feminina da Capital.

A última parte é destinada ao Acervo Bajubá, com arquivos que registram as memórias de resistência da comunidade LGBT+ durante o período militar. “A gente não pode esquecer que entre os anos 1960 e os anos 1970, a liberdade dos corpos era muito latente, lá fora principalmente, e essas influências entravam aqui (no Brasil) apesar da ditadura, então tinha muita resistência.”, afirma Alberto.

Muitas das obras são da autoria do jornalista Alípio Freire (In Memorian), preso político encarcerado e torturado no presídio Tiradentes, e tem destinatários identificados, pois eram enviadas como cartas para parentes, amigos e conhecidos. O jornalista, escritor e artista plástico detido pelo regime militar aos 23 anos, passou cinco anos prisioneiro devido ao seu envolvimento com a militância contra a ditadura. “O Brasil nessa época tinha uma Lei de Segurança Nacional que prendia elementos subversivos e aí a definição de elemento subversivo era qualquer coisa.” Explica Alberto à AGEMT.

“Uma pessoa que estivesse andando na rua e fizesse alguma crítica a um militar poderia ser presa como elemento subversivo, assim como algum membro da luta armada.” Adiciona o professor. Alípio e todos os presos políticos detidos pelos militares entre 64 e 85 eram considerados elementos subversivos ao regime. 
“Na minha opinião, acho que a arte é uma forma de você resistir a alguma coisa, geralmente. E o estar preso naquelas condições, daquela forma é muito difícil você resistir, então encontrar na arte algum lugar pra resistência é fundamental.” Afirma Alberto.

Todas as obras expostas pela Pinacoteca foram produzidas por presos políticos encarcerados em diversos presídios de São Paulo, algumas das obras também foram produzidas por presos ainda no DOPS (Departamento de Ordem Política e Social). As produções se divergem entre pinturas explícitas que fazem referências claras à ditadura e pinturas mais poéticas que passam uma mensagem mais simbólica e menos explícita. “Pode ser tanto um recado que você está dando para o seu torturador mesmo que seja de forma não tão explícita assim porque você também não quer que isso seja algum tipo tipo de censura, seja atrapalhado de alguma forma; ou pode ser pura e simplesmente expressão de uma pessoa que está presa durante a ditadura”, opina o professor. 

O projeto artístico desenvolvido pelo coletivo “Mulheres Possíveis” traz a discussão sobre o sistema carcerário atual brasileiro e sua relação com o passado opressor e violento dos anos de chumbo. Para Alberto: “Boa parte da situação carcerária que a gente tem hoje, falando de problemas, falando sobre crime organizado principalmente, vem da ditadura. É um resquício dela” e, acrescenta: "o que a gente vê hoje da situação carcerária, da pessoa ser presa tendo um delito pequeno e entrando no sistema carcerário, não conseguir mais deixá-lo, de alguma forma é também um resquício disso.” completa. 

“O Brasil não olha para sua população carcerária de forma adequada, o Brasil teme, e parece que é um temor de discutir o assunto, é como se estivesse ‘defendendo bandido’ quando na verdade não". A área da exposição reservada à memória das resistências LGBT+ durante o período conta com revistas e jornais produzidos com foco na comunidade, usando principalmente capas do jornal “O Lampião da Esquina”, que foi o primeiro jornal de circulação nacional feito “por” e “para” homossexuais. Ele circulou entre abril de 1978 e julho de 1981 surgindo dentro do contexto de imprensa alternativa da época. Os itens foram reunidos pelo acervo Bajubá, um projeto comunitário que se dedica ao registro de memórias das comunidades LGBT+ brasileiras. Eles também reúnem  uma coleção de itens que registram a diversidade sexual e a pluralidade de expressões e identidades de gênero no Brasil. O Bajubá colabora com exposições, capacitações e projetos de produção, mediação e circulação de narrativas sobre as histórias de pessoas LGBT+ no território nacional.

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(Jornais que pertencem ao Acervo Bajubá/Foto: Ana Julia Bertolaccini)