
Fizemos uma entrevista com integrantes do projeto Absorvidas, do Rio de Janeiro, que é uma organização sem fins lucrativos que visa erradicar a pobreza menstrual nos presídios do Rio de Janeiro, levando educação menstrual e absorventes de pano. No ano passado, o projeto Absorvidas fez uma campanha de arrecadação na internet para doar dois mil absorventes de pano e educação menstrual para uma penitenciária no Rio. Elas conseguiram arrecadar 30 mil reais em 17 dias. As respostas são da Victoria Escalcon, diretora de mídias sociais do projeto.
AGEMT - Como surgiu o projeto Absorvidas?
Absorvidas - O projeto surgiu a partir da Giullia Jaques, que é diretora executiva e uma das oito integrantes do projeto. Ela conta que teve essa ideia do Absorvidas por causa de uma palestra de uma ONG chamada X-runner, que fornece vasos sanitários, e ela falou que ficou muito mexida com uma fala deles. “O que você faz quando abre os olhos de manhã?”, eles perguntaram, e aí vieram as respostas como “vou ao banheiro”, “mexo no celular”, “me espreguiço” etc. E então eles perguntam “o que você faria se não tivesse um banheiro?” e foi aí que ela ficou comovida. A partir daí, a Giullia começou a refletir e então surgiu o questionamento: quem não tem acesso ao absorvente e como é que essas pessoas vivem?
Depois disso, houve bastante pesquisa, também através de livros como Prisioneiras, do Dráuzio Varella e Presos que Menstruam, da Nana Queiroz. E então o projeto surgiu em 2019. O Absorvidas é mais que um projeto para levar absorventes, primeiro porque nós temos uma pauta mais voltada a absorventes biodegradáveis, pensando nessa questão da ecologia e segundo porque a nossa meta a longo prazo é a ressocialização das presas, porque muitas delas, quando saem da cadeia, não conseguem empregos e ficam muito vulneráveis, e acabam voltando para a cadeia. Então, o Absorvidas faz com que as próprias presas aprendam a fazer os bioabsorventes, de pano, para vender. É muito mais do que oferecer auxílio, é oferecer também perspectiva dentro de um sistema em que as mulheres são marginalizadas e esquecidas.
AGEMT - Por que vocês decidiram estabelecer a meta de 30.000 reais na arrecadação?
A - Os 30 mil reais foi um valor pensado pelo custo da logística como, por exemplo, o frete, os bioabsorventes, embalagens etc. Foi tudo pensado direcionado para um presídio específico, para mulheres específicas.
AGEMT - Você acha importante que a questão da pobreza menstrual seja ensinada para crianças (pré-adolescentes no início da vida menstrual)?
A - Sim, com certeza. Eu acredito que a pobreza menstrual tem que ser falada, ensinada, porque é só com discussão que podemos pensar em projetos. Sejam projetos governamentais ou um projeto como o nosso, que são apenas jovens tentando fazer a sua parte. Então eu acho muito importante e, quando penso nessa questão do ensino, acredito que não só falar sobre pobreza menstrual, mas também sobre educação menstrual. E não só isso, falar também de educação sexual. É chocante como não falamos com naturalidade sobre a nossa menstruação e estamos sempre coagidas com tudo. Isso é muito triste, porque é só a partir do diálogo que realmente haverá alguma mudança e não só o diálogo entre quem menstrua, mas entre os que não menstruam também.
AGEMT - Como a pobreza menstrual pode afetar também a questão econômica? (porque, por exemplo, muitas mulheres, quando estão menstruadas, não vão ao trabalho/aula por falta de absorvente)
A - Como vocês falaram, muitas mulheres que estão menstruadas muitas vezes não conseguem ir para o trabalho ou para a escola e também tem a questão da dor, da cólica, da TPM, que muitas vezes é desprezada. Lembro que eu gastava mais de 50 reais para comprar dois pacotes grandes [de absorventes descartáveis] e que às vezes não duravam nem dois ciclos inteiros porque meu fluxo é muito grande. E o que são 50 reais para uma família com várias pessoas que menstruam? A gente vive em um país que tem um monte de gente passando fome, como vamos pensar em métodos de menstruação com gente passando fome? Isso é bizarro, porque as pessoas ainda acham que higiene menstrual é um luxo, mas na verdade é só higiene básica. É muito triste.
AGEMT - Qual a importância do projeto de lei da 428/2020, da Tabata Amaral?
A - Eu acho bizarro como só em 2020 essa pauta foi levantada com mais força. Isso chega a ser ridículo, porque nós não começamos a menstruar agora. Preservativos sempre tiveram né [sempre foram disponibilizados pelo governo], e é muito importante continuar tendo mesmo, mas não ter sido implementado nada sobre absorventes antes é bizarro. Isso mostra a vulnerabilidade que mulheres e pessoas que menstruam, de modo geral, sofrem.
AGEMT - Além do projeto de lei da 428/2020, da Tabata Amaral, existe algum outro movimento do governo para combater a falta de acesso a absorventes higiênicos?
A - Existiu um outro projeto da Luciana Genro, do PSOL, no Rio Grande do Sul, para que absorventes fossem colocados em cesta básica, e acho que no Rio e no Mato Grosso também. Mas, no Congresso, essa discussão nunca teve tanta força, acredito que esteja começando a ter nesse momento com a internet e os debates que são levantados lá.
Leia mais sobre pobreza menstrual aqui.
O Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, anunciou que planeja suspender a obrigatoriedade do uso de máscara, conforme recomendação do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês). Um informativo oficial afirma que a expectativa é de que isso aconteça no dia 15 de junho. A medida vale só para as pessoas que já tomaram as duas doses da vacina contra a Covid-19.
Com quase 40 milhões de habitantes, segundo o Departamento do Senso dos Estados Unidos, 37.826.298 doses de imunizantes contra a Covid-19 já foram aplicadas no estado, de acordo com o governo, ou seja, mais da metade da população já está vacinada. Enquanto isso, cresce a esperança para o fim das restrições e a volta à vida normal.

Para a jovem brasileira Maria Holtz, de 22 anos, que trabalha como au par (programa de intercâmbio de inglês onde se trabalha como babá de crianças na casa que reside), no Vale do Silício, na Califórnia, o novo momento é sinal do cumprimento de medidas de prevenção seguidas pelos moradores da região. “Eu fiquei bem feliz ao saber que o uso da máscara não será mais obrigatório. Aqui, as pessoas seguem, desde março de 2020, com o uso de máscara, de álcool em gel, e distanciamento social. Lembro de um dia que eu estava no supermercado e eu cheguei mais perto de uma pessoa e ela ficou brava comigo.
Os restaurantes ficaram fechados todo esse tempo e voltaram a abrir no final de dezembro do ano passado”, afirma Holtz. Mesmo com a pouca idade, Maria já conseguiu tomar as duas doses da vacina contra a Covid-19, o que não seria possível no Brasil por conta do atraso da imunização no país. Ela conta que a situação brasileira em relação à pandemia repercute negativamente sempre que há pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro. “Quando o Bolsonaro fala alguma coisa, as pessoas não gostam, até porque a Califórnia é muito focada no Joe Biden, que é totalmente oposto ao presidente brasileiro”, ressalta.
De acordo com dados do Governo da Califórnia, 62.092 pessoas já morreram em decorrência da Covid-19 no estado, desde o início da pandemia. Investindo em ciência, os Estados Unidos vacinam com os imunizantes da Pfizer/BioNTech, Moderna e Janssen (Johnson & Johnson). Para a jovem Maria Holtz, uma única certeza: “a vacina salva”. “É preciso um pouco de estudo sobre o cenário atual, um pouco de respeito, porque aqui também não foi fácil. O comércio também fechou. O recado é: tome vacina, porque ela, realmente, protege do vírus”, finaliza Holtz.

As relações de muitas pessoas com a alimentação passaram por diversas alterações no contexto pandêmico. O podcast a seguir busca abordar as interfaces entre a saúde e a pandemia seguindo pelos pilares da função dos alimentos à imunidade, mas também tratando de assuntos voltados para a compulsão alimentar e o abuso de substâncias alcoólicas. Na ocasião, a nutricionista e residente em oncologia na Unifesp, Bruna Lima e o graduando em psicologia pela FIG, Valter de Souza, foram entrevistados a fim de destrinchar com mais detalhes a temática abordada, relatar mitos de alimentos tidos como cura para a Covid-19 e o papel das redes sociais nesse questão. Confira:

Sabe quando você se corta acidentalmente e começa a sangrar? No mesmo momento, você já pensa em alternativas para estancar o sangue. Agora, imagine não ter nenhum jeito de fazer o sangue parar e ficar sangrando por bastante tempo. Você se sentiria incomodado? Acredito que sim. Apesar desse exemplo ser banal, esse desconforto e falta de opção realmente ocorre com muitas meninas e mulheres durante o período menstrual, sendo muito mais constrangedor e difícil do que a situação anteriormente apresentada.
A escassez de absorventes, água encanada, saneamento básico, banheiros com privacidade, sabonetes, papel higiênico, entre outros recursos essenciais representam a pobreza menstrual. A desinformação também é um ponto crucial que influencia esse problema. Com a falta de conhecimento, a população não reconhece a necessidade e a importância de comprar absorventes por pensar que é um item desnecessário para ser adicionado às despesas, além de não saberem os riscos e impactos causados pela falta de cuidados necessários durante a menstruação. O relatório "Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos”, realizado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) juntamente ao Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) deixa explícito a triste realidade de diversas meninas e mulheres.
A pesquisa comprovou que, aproximadamente, 713 mil brasileiras vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro em seu domicílio e mais de 4 milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas. Além de 900 mil não terem acesso à água canalizada em seus domicílios e 6,5 milhões viverem em casas sem ligação à rede de esgoto. Esse problema afeta principalmente aquelas que vivem em condições de pobreza e de extrema vulnerabilidade em contextos rurais e urbanos, como estudantes de baixa renda e presidiárias, e gera muitos impactos durante toda a vida. Além de denunciar a grande desigualdade social.
A menstruação prejudica o ensino de diversas jovens
A escola poderia servir como um refúgio para essas meninas em situações precárias, contendo saneamento básico e produtos menstruais. Porém isso não ocorre, a maioria dos colégios não possuem nem banheiro em condições de uso. Sendo assim, a melhor alternativa que as alunas encontram é faltar nas aulas. A ONU estima que 1 em cada 10 meninas falte à escola durante a menstruação. Contudo, segundo uma pesquisa encomendada pela marca Always, a situação especificamente no Brasil é bem pior, pois uma em cada quatro mulheres já faltou à aula por não poder comprar absorventes. O estudo também comprovou que quase metade destas (48%) tentaram esconder que o motivo foi a falta de absorventes e 45% acreditam que não ir à aula por falta de itens de higiene provocou consequências negativas ao seu rendimento escolar.
Apesar das alunas esconderem o motivo da ausência e terem vergonha de contar, por a menstruação ainda ser um tabu, a diretora de escola, Edicleia Pereira Dias, foi atenta e não deixou esse problema passar despercebido. Em entrevista ao Fantástico, a educadora relata que, ao analisar as faltas e o período no qual elas ocorriam, assimilou os fatos e entendeu que muitas alunas estavam deixando de frequentar o estabelecimento de ensino durante o período menstrual. E, a partir desse entendimento, desde 2014, ela distribui absorventes todo mês para as estudantes, mudando a vida de muitas adolescentes. Mas, infelizmente, não é sempre que um diretor percebe o problema e tenta combatê-lo.
Como resultado da precariedade menstrual e das faltas escolares, meninas prejudicam o seu desempenho escolar, perdendo muito conteúdo e aprendizados. Isso gera consequências graves a longo prazo. Futuramente essas garotas perdem oportunidades de trabalho e não conseguem empregos muito qualificados, não conseguindo melhorar suas rendas e quebrar o ciclo da pobreza. A partir disso, também ocorre o aumento na desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
Pobreza Menstrual nos presídios
A desigualdade de gênero também é ressaltada dentro das penitenciárias, local onde o corpo masculino é tido como padrão para a entrega de kit de higiene. “Só quem sente na pele sabe. Quando falamos em questão de gênero, não queremos dizer que somos iguais aos homens. Nosso corpo é diferente, mas isso não significa que eu seja mais frágil”, afirma Nicole Campos, gerente técnica de projetos da ONG Plan International Brasil. Todos os presos, tanto homens como mulheres, recebem o mesmo pacote para cuidar de sua saúde. No entanto, o Departamento Penitenciário Nacional alega o aconselhamento por parte do órgão de que sejam distribuídos kits de cuidado pessoal com quantidade suficiente de absorvente pelas unidades prisionais. Mas não é com essa realidade que as detentas se deparam.
Quando disponibilizam, são entregues, em média, 12 absorventes por mês. Há locais que só dão 8, o que é extremamente precário, principalmente para aquelas que têm um fluxo intenso e mais duradouro. Em razão dessa insuficiência, as mulheres recorrem a maneiras inseguras para conter a menstruação. Maria Teresa dos Santos, presidente da Associação de Familiares e Amigos de Pessoas Privadas de Liberdade, declarou ao jornal Estado de Minas que as presas reclamavam de fome, mas, quando um grupo foi visitar o Presídio São Joaquim de Bicas, observou-se que havia miolos de pão na cama e eram usados para substituir o absorvente, pois o que recebiam não era suficiente. Além disso, muitas chegam a utilizar jornal, pedaços de roupa, papel e até resto de plástico. O grande problema consiste nos riscos à saúde. Essas formas de conter o fluxo podem provocar infecções e até mesmo candidíase e cistite
Em outras situações, quando não pecam pela falta, deslizam na má condição do produto. Na Penitenciária Feminina de Piraquara, as detentas já acusaram de receber absorventes vencidos há anos, com um cheiro muito forte e uma fina espessura, sem conseguir reter o sangramento por completo. Helen, auxiliar de cozinha, até o ano passado, pelo menos, visitava uma amiga na cadeia e relatou ao Jornal Plural, de Curitiba, um problema ginecológico pelo qual sua colega enfrentou e que outras mulheres também devem sofrer. “[A hemorragia] começou na segunda, fui visitá-la no domingo e ainda não tinha parado. Eu falei para ela ir ao médico, mas ela disse que já tinha tentado. Quando demora o atendimento, elas batem na ‘bocuda’. Ela fez isso. E em vez de ser tirada para o atendimento, foi mandada para o castigo”, comentou.
Há também escassez de papel higiênico. São concedidos dois rolos a cada 30/45 dias. Esquecem-se de que as mulheres usam mais pelo fator menstrual e pela anatomia. Por conta desses déficits, ficam na dependência dos “jumbos”, itens que suas visitas podem lhe fornecer. Contudo, muitas são abandonadas pela família e ficam sem essa possibilidade de receber mais absorvente. E, com a pandemia, isso se agravou. O envio das mercadorias precisou ser via Sedex, mas, por ter que pagar taxa, deixaram de entregar – já que as pessoas, em sua maioria, têm baixa renda.
Como uma forma de buscar auxiliar as presas, começaram a surgir muitas organizações comunitárias para arrecadar e doar itens de higiene a elas, como o coletivo Nós Mulheres, de São Paulo; coletivo Narcisa Amália, do curso de Jornalismo da PUC-SP; Flores no Cárcere, de Minas Gerais e o projeto Absorvidas, do Rio de Janeiro.
Presos que menstruam: a brutal vida das mulheres - tratadas como homens - nas prisões brasileiras, de Nana Queiroz
Neste livro, há relatos de sete mulheres com quem a jornalista conviveu por um tempo, entre outras que teve apenas um breve encontro, algo passageiro. As entrevistadas eram de diferentes localidades, pelo menos uma de cada região do Brasil. A narrativa contém explicações sobre o sistema penitenciário feminino, descrições de agressões que as presas sofrem, histórias de vida e como são as condições gerais do cárcere - marcados pela insalubridade das celas, alimentos em mau estado e falta de recebimento dos itens essenciais de saúde, como absorvente e papel higiênico. Sem contar que retrata como as mulheres são vistas como homens. Em um dos casos, elas tinham um espelho que deformava o rosto e vestidas por uniformes masculinos que as despersonalizavam. Narramos trechos da obra que representam a pobreza menstrual nos presídios. Ouça aqui!
Entrevista Absorvidas RJ
Confira aqui a entrevista que foi realizada com o projeto Absorvidas, uma organização que luta contra a pobreza menstrual nos presídios.
A pandemia provocou uma crise econômica e social sem precedentes. Para tentar conter a disseminação do vírus no país, as autoridades brasileiras buscaram estabelecer algumas medidas restritivas desde o início de 2020. Porém, alguns setores não pararam, como a área de saúde.
Ao mesmo tempo em que o Brasil vive o agravamento da situação pandêmica, com o novo avanço do número de mortes, segue em alta a discussão sobre o conflito entre medidas para salvar vidas ou a economia.
Dados de 26 estados mostram que o gasto conjunto com saúde somou no ano passado R$ 164,8 bilhões. Este valor decorre de um aumento superior ao dobro da taxa de crescimento das receitas.
Há mais de um ano atuando na linha de frente contra a Covid-19, o impacto na vida dos trabalhadores deste setor é generalizado. De acordo com a Fiocruz, 95% dos profissionais de saúde tiveram suas vidas afetadas de uma forma significativa pela pandemia.
Os dados obtidos pela pesquisa feita em março de 2021, que ouviu mais de 25 mil participantes, mostram um quadro estarrecedor onde a exaustão, a insegurança, o sofrimento e o medo são rotinas.
Além disso, 50% desses profissionais apresentaram aumento na carga horária de trabalho. Vale ressaltar que 45% desses profissionais necessitam de dois empregos para sobreviver.
Um dos aspectos relevantes para a gestão das atividades em saúde é planejar ações com antecedência, algo que não é possível em um cenário pandêmico onde o inesperado e imprevisível fazem parte das rotina diária.
Em épocas de surto, as unidades de saúde podem ser caracterizadas como locais conturbados e caóticos, pressionados por uma demanda bem superior à usual. .
No que se refere aos trabalhadores do setor, manter a competência técnica e científica exige muito controle emocional, considerando que o atendimento apresenta riscos, responsabilidades e sofrimentos. A combinação destes fatores pode ocasionar o adoecimento profissional, e assim impactar o processo de trabalho, e, consequentemente, ameaçar a qualidade e segurança dos serviços.
O fisioterapeuta da Santa Casa de São Paulo Lucas Del Sarto foi um dos afetados pela alta demanda de profissionais de saúde em razão da Covid-19. Ele relata que sua carga horária aumentou radicalmente, passando a 60 horas semanais. Para ele, mais de um ano depois do início da pandemia, é inviável continuar com o mesmo ritmo de trabalho.
Lucas conta que no começo pensava que seria igual à crise da H1N1 (gripe causada pelo vírus influenza que atingiu mais de 200 países entre 2009 e 2010,na primeira pandemia do século 21). Com o tempo, porém, ele foi percebendo que o problema era mais sério. “Eu não fiquei com medo quando os números começaram a aumentar, eu fiquei com pavor”, diz.
Um dos maiores problemas de gestão de crise sanitária e econômica, segundo o fisioterapeuta, é o tempo que as pessoas permanecem internadas. “Os doentes chegam muito rápido, mas demoram para sair”, relata Lucas ao ser questionado sobre a superlotação dos hospitais. “Hoje tem mais de 400 pacientes esperando uma vaga na UTI.”
Segundo o governo de São Paulo, de janeiro a março deste ano, os pacientes com coronavírus ficaram, em média, 19 dias internados na UTI em São Paulo. A média aumentou em comparação com os dados de 2020, que mostravam de 14 a 15 dias.
Lucas, no entanto, relata que o maior problema que tem enfrentado é o isolamento afetivo. Durante a pandemia, ele perdeu o pai, seu grande companheiro. “Eu me sinto em um labirinto cheio de medo, impotência e irritabilidade.” Porém Del Sarto fez questão de frisar a sua esperança em um futuro melhor: “Está difícil, mas a vacina está chegando”.
Esta realidade não é apenas de Lucas, mas de milhares de profissionais que se viram pressionados ao extremo e afastados de seus entes queridos durante a pandemia. Ainda de acordo com o estudo da Fiocruz, durante a pandemia, as alterações mais citadas pelos profissionais foram perturbação do sono (15,8%), irritabilidade/choro frequente/distúrbios em geral (13,6%), incapacidade de relaxar/estresse (11,7%), dificuldade de concentração ou pensamento lento (9,2%), perda de satisfação na carreira ou na vida/tristeza/apatia (9,1%), sensação negativa do futuro/pensamento negativo/ suicida (8,3%) e alteração no apetite/alteração do peso (8,1%).
Pesquisa apresentada pelo Journal of Management & Health of Care, a pandemia forçou a modificação de hábitos de vida em trabalhadores da área da saúde, principalmente em fisioterapeutas e enfermeiros, considerados profissionais da linha de frente. O maior impacto observado foi o sedentarismo, que pode levar ao desenvolvimento de doenças e afetar o trabalho.
O fato é que a pandemia expôs a essencialidade dos cuidados em saúde para todos os seres humanos. Contraditoriamente, revelou o quanto estes profissionais ainda não são considerados e respeitados nesse processo.