Ataque televisionado, silenciamento de jornalistas e fome declarada na região palestina
por
Maria Mielli
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29/08/2025 - 12h

O complexo médico Nasser, um dos maiores e um dos últimos hospitais em funcionamento no sul da faixa de Gaza, foi alvo de dois bombardeios seguidos na manhã da última segunda-feira (25). O double tap strike (ataque duplo), é uma tática militar que tem como objetivo atacar duas vezes o mesmo local para intensificar o número de vítimas. 

O segundo ataque foi televisionado enquanto a emissora local mostrava ao vivo a tentativa de resgate dos sobreviventes feridos ainda no primeiro bombardeio. A ofensiva deixou ao menos 20 pessoas mortas, incluindo 5 jornalistas: Mariam Riyad Abu Dagga, 33 anos; Moaz Abu Taha, 27 anos; Mohammad Saber Ibrahim Salama, 24 anos; Husam Al-Masri, 49 anos; Ahmad Salama Abu Aziz, 29 anos. 

A “arma” que o governo de Israel mais teme são as câmeras dos jornalistas que lutam dia a dia para denunciar os horrores que o exército israelense comete em mais de dois anos de genocídio.

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Mariam Riyad Abu Dagga; Moaz Abu Taha; Mohammad Salama; Husam Al-Masri e Ahmad Abu Aziz / Foto: Reprodução Stop Murdering Journalists

Segundo o site Stop Murdering Journalists, cerca de 300 jornalistas foram mortos por tropas israelenses. Em pronunciamento oficial divulgado no site da rede de notícias Al-Jazeera, na qual o fotojornalista Mohammad Salama trabalhava, a emissora repudiou os ataques e os classificou como “uma intenção clara de enterrar a verdade”.

Em entrevista para a AGEMT, o historiador Mateus Orantas afirmou que o mundo está assistindo a um holocausto dos palestinos e que, assim como foi durante a segunda guerra, a propaganda ainda é a maior arma a favor do opressor. “A propaganda anti Palestina e pró Israel é muito forte, mas hoje, temos a internet que faz com que a globalização seja mais intensa e acaba nos mostrando a realidade…porém por causa dos algoritmos e de quem comanda as redes, você só vai ter conhecimento do que está acontecendo, se seguir as páginas certas” declara. 

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Desespero palestino para tentar se alimentar / Foto: reprodução Instagram Ahmed Nofal
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Na última quarta-feira (27), Ramiz Alakbarov, coordenador especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Processo de Paz no Oriente Médio, afirmou em reunião do Conselho de Segurança (CSNU), que Gaza “está afundando cada vez mais em um desastre”. Segundo Ramiz, as consequências da crise – gerada por Israel – são os volumosos números de vítimas civis, deslocamento em massa e a fome, que é uma verdadeira arma de guerra. 

Uma análise realizada pela Classificação Integrada de Segurança Alimentar (IPC), formada por várias agências humanitárias internacionais, classifica a fome na região palestina como sendo de nível máximo. 

Outros 1,07 milhão de pessoas estão em estado de emergência. Segundo este estudo, os números devem piorar ainda mais nos próximos meses. É esperado que a desnutrição se expanda para cidades do sul da Faixa de Gaza, como Deir al-Balah e Khan Younis, deixando quase um terço da população em estado catastrófico (nível 5 IPC). A previsão ainda afirma que até junho de 2026, pelo menos 132 mil crianças menores de cinco anos sofram com a escassez de alimentos.

O coordenador de ajuda emergencial das Nações Unidas, Tom Fletcher, ressaltou que por trás desses números alarmantes, existem vidas – filhos, filhas, mães, pais e todo um futuro que foi interrompido. “Esta fome não é produto de uma seca ou algum tipo de desastre natural. É uma catástrofe criada ", esclareceu Fletcher em documento divulgado pelo Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA). A declaração pede, majoritariamente, a cessação imediata das hostilidades em Gaza; a libertação de todos os reféns e a proteção de civis; e infraestrutura crítica e funcional. O coordenador finaliza dizendo que apesar de ter havido um certo aumento na ajuda humanitária, ainda há muito o que ser feito. “Ainda há tempo para agir”.

 

 

Iniciativa coordenada pelo sindicato da categoria em São Paulo busca justiça pelos colegas de profissão mortos pelo exército israelense
por
Marcelo Barbosa P.
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29/08/2025 - 12h

Na última quinta-feira (28), o Sindicato dos jornalistas profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) realizou uma manifestação contra o assassinato dos profissionais de imprensa pelo Estado de Israel. O evento ocorreu em frente ao prédio da CNN, na Avenida Paulista, em São Paulo.

A mobilização foi anunciada nas redes sociais na quarta-feira (27).  “A manifestação desta quinta-feira tem como objetivo exigir a interrupção das operações militares israelenses e do genocídio do povo palestino e que termine imediatamente a matança de jornalistas pelo Estado de Israel. As autoridades israelenses civis militares responsáveis pelos assassinatos de profissionais da mídia precisam ser punidas.” afirmam na publicação. O post se refere aos dois ataques feitos a um hospital em Gaza, ocorridos na segunda (25), que resultaram na morte de cinco jornalistas, além dos profissionais da saúde.

O ato começou por volta das 17h. A princípio, havia poucos manifestantes, mas gradualmente mais pessoas se juntaram ao protesto. Os cidadãos chegaram com bandeiras e placas na mão e gritavam: “Palestina Livre”. 

Lilian Borges, uma assistente social especializada em pessoas em situação de rua, que participa da Frente Palestina São Paulo, marcou presença e afirmou que um dos principais motivos para ir protestar é considerar desumano o que ocorre em Gaza. “Cabe a nós, como humanos, ajudar a eles neste momento difícil que estão vivendo. Então, eu acho que toda população deveria estar aqui. Além disso, exigimos que o presidente Lula rompa as relações diplomáticas e comerciais com Israel e, principalmente, que a gente pare de mandar petróleo para lá, já que isso ajuda a financiar o poder bélico deste Estado.”

 

Lilian Borges segura uma bandeira/ Reprodução: Marcelo Barbosa
Lilian Borges segura uma bandeira/ Foto: Marcelo Barbosa

 

Breno Altman, jornalista fundador do site de notícias Opera Mundi, afirma que o assassinato aos jornalistas foi um crime planificado por Israel. Sobre a ótica de Bruno, o ocorrido foi ocasionado para que o acesso à informação fosse dificultado e que outros países não tivessem acesso ao que ocorre em Israel. “Eles não querem que relatos e imagens cheguem ao mundo, já que comprovaria o genocídio que o regime sionista está fazendo.”.

 

Apesar da diferença, Mohamad Saimurad uniu-se ao amigo palmeirense para ir à manifestação
Apesar das diferenças, o corinthiano Mohamad Saimurad uniu-se ao amigo palmeirense pela causa palestina/ Reprodução: Marcelo Barbosa


Encostado em uma parede, Mohamad Saimurad, diretor de uma escola, vestia uma camisa do Corinthians e, acompanhado do amigo palmeirense, protestava. "O sionismo é uma ideologia europeia, colonizadora e racista. Eu me pergunto por que a humanidade está em silêncio. Então, eu estou aqui para ver se a humanidade acorda em relação ao Estado genocida de Israel".

O pronunciamento público teve apoio, além dos organizadores, do Coletivo Shireen Abu Akle de Jornalistas Contra o genocídio, da Federação Árabe-palestina do Brasil (Fepal), Frente Palestina de São Paulo e Núcleo Palestina do PT.

Acusados de colaborarem com 'trabalho forçado do regime cubano', servidores do programa têm vistos revogados
por
Victória Rodrigues
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18/08/2025 - 12h

 

O governo Trump revogou na última quarta-feira (13) os vistos de  dois brasileiros, que participaram da criação do Programa Mais Médicos em 2013. Mozart Júlio Tabosa, secretário do Ministério da Saúde do Brasil, e Alberto Kleiman, ex-funcionário do governo brasileiro, foram os alvos das sanções.

Em nota divulgada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, a justificativa apresentada foi que ambos teriam colaborado para um “esquema coercitivo de exportação de mão de obra” do governo cubano através do programa Mais Médicos, privilegiando o governo de Cuba às custas dos profissionais da saúde e cidadãos do país. 

O programa Mais Médicos foi uma iniciativa criada no governo de Dilma Rousseff, a fim de levar atendimento médico à áreas remotas e com maior vulnerabilidade. Dentro do programa, podem participar tanto profissionais brasileiros quanto estrangeiros, desde que cumpram com as exigências propostas, como formação com diploma e registro profissional. 

Entre 2013 e 2018 foram contratados profissionais cubanos, com uma parceria intermediada pela OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde). Nesse acordo, os participantes recebiam 30% do valor de sua remuneração, que na época chegava a 10 mil reais, os outros 70% eram destinados ao governo de Cuba.

Em 2015, o Mais Médicos, contava com cerca de 14 mil profissionais, dos quais 11,4 mil eram cubanos. No entanto, em 2018, após a eleição de Jair Bolsonaro, a parceria foi encerrada. 

Segundo Marco Rubio, secretário do Departamento de Estado estadunidense, as contratações para o programa não cumpriam a regulamentação impostas pelo próprio governo brasileiro. Também acusou o programa de contornar as sanções dos EUA contra Cuba. 

Rubio ainda justificou as medidas dizendo que o regime cubano estava exportando seus médicos para trabalhar de forma forçada e com isso estava deixando de cuidar da saúde de seus próprios cidadãos. “Esse esquema enriquece o corrupto regime cubano e priva o povo cubano de cuidados médicos essenciais”.

Além do Brasil, autoridades de países africanos, Cuba e Granada também foram alvos das restrições de vistos por cooperarem com o programa Mais Médicos.

Bruno Rodríguez, Ministro de Relações Exteriores de Cuba, criticou a decisão do governo dos EUA. “Isso mostra imposição e adesão à força como nova doutrina de política exterior a esse governo", disse. Também afirmou que Cuba continuará enviando médicos em missões à outros países. 

Nas redes sociais, Mozart Júlio Tabosa defendeu o programa de saúde, e manifestou sua insatisfação com a situação: "Essa sanção injusta não tira minha certeza de que o Mais Médicos é um programa que defende a vida e representa a essência do SUS, o maior sistema público de saúde do mundo - universal, integral e gratuito".

Essa decisão do governo de Donald Trump segue uma sequência de retaliações contra o Brasil. Desde o mês de julho, o país recebeu taxações em produtos exportados e sanções contra o Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. 

Presidente estadunidense evita divulgação da lista de Epstein e população levanta possibilidade de seu nome estar nela
por
Daniella Ramos
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14/08/2025 - 12h

 

Donald Trump foi eleito em 2024 tendo como uma de suas promessas a divulgação de uma suposta lista que teria o nome de todos os investigados por possível envolvimento com Jeffrey Epstein em crimes de pedofilia.

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Trump e Epstein juntos em uma festa em 1992. Foto: Reprodução/NBC

A cobrança em cima do presidente dos Estados Unidos para a divulgação da lista de investigados no caso, o levou a declarar para a imprensa que o caso era uma maneira de desviar a atenção para algo que é uma “besteira”, nas palavras dele.

“O fato de Trump não cumprir com o que prometeu pode ser pelo rumo que a política tomou… além do fato dele estar ou não envolvido”, comenta o doutor em Ciência Política da PUC-SP, Igor Fediczko. Segundo o Wall Street Journal, Donald Trump foi avisado no início do ano que seu nome estava nos documentos relacionados ao caso de Epstein, a Casa Branca respondeu dizendo se tratar de uma fake news. 

Além da indignação de eleitores a Trump sobre a falta de compromisso com a promessa de exposição dos documentos do processo de Jeffrey, os opositores também se manifestam nas redes sociais. Em sua conta no X, a deputada democrata Alexandra Ocasio-Cortez relacionou a demora na divulgação dos arquivos com supostas acusações de crimes sexuais cometidos pelo republicano. 

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Publicação feita no X pela deputada Alexandra Ocasio-Cortez. Foto: Reprodução/@AOC

 

Índices do Google Trends apontam que as pesquisas envolvendo o nome de Donald Trump e Jeffrey Epstein aumentaram no início de Junho e final de Julho, mesmo período em que o presidente estadunidense começou a distribuir altas tarifas para o mundo todo. 

“Talvez isso tenha feito com que a comunicação ou política do Trump tenha se tornado ainda mais radical”, comenta Igor Fediczko analisando que o tarifaço possa ser uma ”cortina de fumaça” para a polêmica de Epstein.

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Gráfico de pesquisa dos nomes de Donald Trump e Jeffrey Epstein. Foto: Reprodução/Google Trends

 

Apesar das hipóteses sobre a ligação do atual presidente dos Estados Unidos, os nomes que mais chamaram atenção recentemente sobre a proximidade com Epstein foram Bill e Hillary Clinton, que irão depor em outubro, e o príncipe Andrew, que aparentava ser amigo pessoal pelos e-mails trocados com Jeffrey. Assim como Trump, existe a comprovação de que eles já andaram no jato particular com Jeffrey Epstein e possivelmente tinham amizade. 

Jeffrey Epstein era um bilionário, empresário e financista americano, que ficou conhecido pela rede de tráfico sexual de menores ao qual tinha ligação. Seu trabalho com investimento fez com que construísse ligação com o ex-presidente Bill Clinton, Donald Trump, o príncipe britânico Andrew e outras celebridades. 

Em 2008, os pais de uma garota de 14 anos declararam à polícia do Estado americano da Flórida que Jeffrey Epstein havia a molestado. Naquele ano, ele firmou um acordo judicial com a promotoria, mas fotos de crianças foram encontradas por toda sua casa em Palm Beach causando sua condenação por exploração sexual de menores. Escapou de denúncias federais que poderiam causar prisão perpétua, conseguindo um acordo de 13 meses de prisão e indenização às vítimas. 

Onze anos depois, houve uma nova acusação de administração de uma rede sexual com meninas menores de idade. Logo foi preso e, enquanto aguardava o julgamento, se suicidou no presídio.

As investigações desses dois casos criminais geraram uma série de documentos que incluem transcrições de entrevistas com as vítimas e testemunhas e objetos confiscados nos imóveis de Epstein. A ex-namorada de Jeffrey, Ghislaine Maxwell, foi condenada em 2021 por associação criminosa de tráfico sexual de meninas.

As Forças de Defesa de Israel confirmaram a autoria do atentado
por
Annanda Deusdará
Maria Mielli
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13/08/2025 - 12h

Uma ofensiva de Israel matou seis jornalistas que estavam instalados em uma tenda de imprensa próxima ao hospital Al-Shifa, na Faixa de Gaza, no último domingo (10). Dentre as vítimas, quatro eram funcionários da agência de notícias Al Jazeera: dois cinegrafistas, Ibrahim Zaher e Mohammed Noufal, e dois repórteres Mohammed Qreiqeh e Anas al-Sharif. Ambos rostos conhecidos pelo êxito em denunciar diariamente o genocídio palestino. 

Minutos antes de morrer, Qreiqeh esteve no ar pela última vez, cumprindo mais um dia de trabalho. Al-Sharif havia postado em suas redes sociais, também pouco antes de se tornar mais um dos milhares de palestinos assassinados, que um ataque israelense estava acontecendo. “Oh Deus, concede-nos a paz, concede-nos a paz. Bombardeio israelense pesado e concentrado com faixas de fogo visando as áreas leste e sul da cidade de Gaza”, lamentou em sua conta no X.

O exército israelense acusou o jornalista de ser membro de uma das células do Hamas, mas sem apresentar provas. “Terrorismo em colete de imprensa ainda é terrorismo. Anas al-Sharif não estava apenas documentando para Al Jazeera. Ele era um membro do Hamas, desde 2013”, declararam em postagens feitas no Instagram oficial. A agência de notícias Al Jazeera, por outro lado, nega veementemente as acusações e afirma que o ataque foi uma estratégia israelense de silenciar um dos grandes nomes do jornalismo local. “Nós sabíamos que Anas era o alvo… Ele era nossa voz”, lastimou o jornalista independente Mohammed Qeita no site oficial da agência, após o ataque. Apesar de ter confirmado o planejamento e execução de al-Sharif, o governo de Israel não se manifestou sobre as outras cinco vítimas.

Não é a primeira vez que ataques a jornalistas ocorrem na Faixa de Gaza. Em julho de 2024, o jornalista Ismail al-Ghoul e o cinegrafista Rami al-Rifi tiveram seu carro bombardeado por um míssil enquanto cobriam o assassinato do chefe político do Hamas também para a Al Jazeera. As Forças de Defesa de Israel (FDI) confirmaram as mortes e alegaram que Ismail integrava as forças Nukhba, divisão militar de elite do Hamas. O noticiário para o qual os profissionais trabalhavam negou as acusações e fez um apelo para que fossem tomadas ações imediatas: “Insistimos que as instituições jurídicas internacionais responsabilizem Israel por seus crimes hediondos e exijam o fim do alvo e do assassinato de jornalistas,” declarou em nota a emissora à época.

No mês passado, quando acusado de ser membro do Hamas pelas FDI, al-Sharif negou toda e qualquer ligação com o grupo. Reafirmou que era um jornalista sem afiliações políticas e que sua única missão era relatar a verdade. “Num momento em que uma fome mortal assola Gaza, falar a verdade tornou-se, aos olhos da ocupação, uma ameaça”, concluiu em postagem na rede social. 

Em mensagem final preparada para o caso de sua morte e publicada postumamente por seus colegas, al-Sharif pede “que não se deixem silenciar por correntes, nem sejam impedidos por fronteiras, e que sejam pontes para a libertação da terra e de seu povo, até que o Sol da dignidade e da liberdade brilhe sobre nossa pátria ocupada”, e finalizou: “Não se esqueçam de Gaza… E não se esqueçam de mim em suas orações sinceras por perdão e aceitação”. 

Silenciamento de jornalistas 

O bloqueio que ocorre em Gaza também limita o acesso e a produção de notícias no local. Os meios de comunicação internacionais são proibidos de circular pela região, a não ser que estejam acompanhados pelo exército israelense. Atualmente, a única maneira de se ter acesso ao que acontece na região, além do relatado por Israel, se dá através das reportagens feitas por jornalistas palestinos.

De acordo com o Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ), 192 jornalistas foram assassinados desde outubro de 2023, quando começou o conflito. Esse número é maior do que a soma das mortes ocorridas nas duas guerras mundiais (69). Além das mortes, 90 profissionais foram presos por Israel no exercício de sua profissão. 

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Gráfico sobre o assassinato de profissionais de comunicação por razões políticas. IArte: Annanda Deusdará/Agemt

 

Ainda segundo a CPJ, em 2024 ao menos 124 jornalistas e outros trabalhadores de comunicação foram mortos; destes, 85 foram vítimas da guerra de Israel contra a Palestina. O número ultrapassou o recorde de 2007, durante a guerra do Iraque, de 113 mortes. O Comitê alerta que o crescimento da violência contra este grupo prejudica a circulação de informações.

Quem eram os seis jornalistas assassinados

Anas al-Sharif, 28 anos, pai de 2 filhos. Segundo a Al Jazeera, um dos rostos mais conhecidos por denunciar o genocídio em Gaza. Nasceu num campo de refugiados em Jabalia, no norte da região, e se formou na Al-Aqsa University Faculty of Media. Seu pai foi morto por Israel em um bombardeio na casa da família em dezembro de 2023.

Mohammed Noufal, 29 anos, era cinegrafista da Al Jazeera. Também de Jabalia, perdeu a mãe e um irmão em ataques de Israel. Seu outro irmão, Ibrahim, também trabalha no veículo. 

Ibrahim Zaher, 25 anos, também era cinegrafista e paramédico voluntário. Nasceu no mesmo campo de refugiados que seus colegas de trabalho.

Mohammed Qreiqeh, 33 anos, fez sua última aparição ao vivo um pouco antes de ser assassinado. Nasceu em Gaza em 1992 e viveu na vizinhança de Shujayea. Formou-se jornalista na Islamic University of Gaza. Israel matou seu irmão, Karim, em março, num bombardeio. 

Moamen Aliwa, 23 anos, era estudante de engenharia e cinegrafista independente.

Muhammad Al-Khalidi, 33 anos, era um jornalista independente que produzia vídeos para o Youtube documentando o conflito em Gaza.

 

Entenda o passo a passo dos próximos dias até o enterro da monarca que morreu nesta quinta-feira (08), em Balmoral, na Escócia.
por
Luan Leão
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09/09/2022 - 12h

A monarquia britânica tem protocolos para tudo e o Palácio de Buckingham já executa o plano denominado "London Bridge", em tradução livre, Ponte de Londres. A operação foi desenvolvida em 1960 e prevê, com detalhes, os protocolos oficiais da realeza para o dia da morte da monarca. 

A Rainha Elizabeth II morreu nesta quinta-feira (08), aos 96 anos, no Castelo de Balmoral, na Escócia, onde passava o verão. Elizabeth II foi a monarca mais longeva da história do Reino Unido, tendo reinado por 70 anos, comemorados em fevereiro deste ano, como o "Jubileu de Platina da Rainha". 

 

Morre Elizabeth II
Rainha Elizabeth II nas comemorações do Jubileu de Platina. Foto: Hannah McKay / REUTERS

Quem é informado ?

Seguindo o protocolo, o secretário pessoal da rainha deve ligar para comunicar a Primeira-Ministra em atividade, neste caso, Liz Truss, sobre a morte. Todo monarca possui um código para avisar sobre seu falecimento, o de Elizabeth II, de acordo com informações de um memorando vazado há alguns anos, seria: "The London Bridge is down" - (A Ponte de Londres caiu, traduzindo). 

Após o aviso a Primeira-Ministra, o Ministro de Relações Exteriores envia um comunicado para os 14 governos fora do Reino Unido onde a rainha era chefe de estado, além de informar os outros 38 países da Commonwealth. Os oficiais também são comunicados do mais velho no cargo ao mais novo. Após o aviso a todos os ministros, as bandeiras de Whitehall, centro administrativo do Reino Unido, são colocadas a meio-mastro.

A Press Association envia um comunicado para todas as redações do mundo, no mesmo momento em que é afixado o comunicado na parte externa do Palácio de Buckingham.

 

Morre Elizabeth II
Anúncio da morte da rainha em moldura de madeira no Palácio de Buckingham. Foto: Henry Nicholls / REUTERS 

A população é avisada através de um comunicado oficial a imprensa. Um pronunciamento é feito na televisão, e o agora rei Charles III se prepara para uma série de viagens pelo Reino Unido pelos próximos dez dias.

O site da família real também é alterado, ficando apenas uma página preta com um breve comunicado informando sobre a morte da rainha. Os sites governamentais recebem um banner preto em homenagem a Elizabeth II.

Protocolos reais 

Assim que se tornou público o falecimento de Elizabeth II, todas as bandeiras dos palácios ficaram a meio-mastro por dez minutos. De acordo com a Operação London Bridge, as atividades governamentais são suspensas pelo prazo de dez dias, exceto as atividades essenciais. As plenários nos parlamentos da Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte são adiadas. 

 

Morre Elizabeth II
Bandeiras das residências reais e edifícios do governo a meio-mastro.
Foto: @10Downingstreet / Divulgação

Caso não esteja reunido, o Parlamento britânico é chamado. Como a monarca estava fora de Londres, foi iniciada, também, a "Operação Unicórnio", que cuida do translado do corpo até a capital do Reino Unido. 

O regresso do corpo da rainha ao Palácio de Buckingham é prevista para o sábado (10). O trajeto deve ocorrer em comboio desde a Escócia, caso não seja possível, o translado ocorre de avião.

Quem fala ?

A Primeira-Ministra, atualmente Liz Truss, última autoridade a se encontrar com Elizabeth II em evento oficial, deve ser a primeira a se pronunciar. 

 

Morre Elizabeth II
Liz Truss foi nomeada pela rainha em Balmoral, na terça-feira (06). Foto: The Royal Family / Divulgação 

D-Day 

O dia da morte da rainha é considerado o Dia D, e todos os dias que se seguem até o funeral são nomeados como Dia D+1, Dia D+2, Dia D+3 e assim por diante. O funeral ocorre no 10° dia. 

Cerimônias 

Ainda no dia do falecimento, ocorre uma cerimônia fechada na Abadia de Westminster, também conhecida como catedral de São Pedro. A cerimônia reúne ministros e, embora planejada, deve parecer "espontânea".


Veja o passo a passo da operação de acordo com o jornal britânico "The Guardian":

Dia D+1 


Conselho de Adesão se reúne para proclamar Charles como rei. O secretário de Gabinete e a Primeira-Ministra se reúnem com o novo rei. A expectativa é de que o rei Charles III fale ao país e a Commonwealth.

Às 12h, horário local, desta sexta-feira (09), os sinos da Abadia de Westminster, Catedral de St. Paul's e Castelo de Windsor tocarão em homenagem à rainha. Saudações de 96 tiros para marcar cada ano da sua vida serão disparadas no Hyde Park e na Torre de Londres às 13h. 

Dia D+2 e D+3

Rei Charles III é proclamado rei e a proclamação é lida de uma varanda no Palácio St.James, no norte de Londres. outra proclamação será lida na Royal Exchange. Espera-se que Charles III tenha uma audiência com a Primeira-Ministra, o secretário de gabinete, o líder da oposição, o arcebispo de Cantebury e o reitor de Westminster.  

As bandeiras estarão a pleno mastro, e permanecerão assim durante 24 horas. Depois voltarão a meio mastro até o dia seguinte ao funeral. 

O corpo deve ser levado, através de comboio, até o Palácio de Holyroodhouse. Os planos incluem uma procissão ao longo da Royal Mile, em Edimburgo, até a Catedral de St.Giles, onde a família real deve assistir a uma cerimônia reservada, antes da abertura ao público. Em seguida, o caixão será levado para o Palácio de Buckingham. 

Dia D+4

Charles chegará à Irlanda do Norte. Haverá ensaios para o cortejo do caixão da rainha do Palácio de Buckingham e Westminster Hall. (Operação Lion)

Dia D+5

Caixão deve chegar ao Palácio de Buckingham horas antes do cerimonial de estado planejado em Londres. O caixão será transferido de Buckingham até o Palácio de Westminster através de uma rota cerimonial por Londres. Espera-se que o caixão seja transportado em uma carruagem de armas. 

 

Morre Elizabeth II
Rainha será levada ao Palácio de Buckingham. Foto: Will Oliveira / EFE / EPA



Dia D+6 

O corpo da rainha ficará no Palácio de Westminster por três dias recebendo visitas. Haverá um ensaio para o cortejo do funeral de Estado. (Operação Feather / Operação Pena)

Dia D+7

Charles III chegará ao País de Gales e receberá moção de condolências. O rei também terá uma audiência com o Primeiro-Ministro Galês, Mark Drakeford. É esperado que representantes da Commonwealth comece a chegar a Londres.

Dia D+8 e D+9 

São esperados milhares de visitantes em Londres para os últimos dias em que poderão prestar suas homenagens a Elizabeth II, a monarca mais longeva da história do Reino Unido. 

Dia D+10 

Proclamado Dia de Luto Nacional. O funeral de Estado será realizado em Westminster, em todo o país serão cumpridos dois minutos de silêncio ao meio-dia. 

Ao final da cerimônia na Abadia de Westminster haverá um cortejo até o Hyde Park, onde será transferido de carruagem de armas para o carro funerário estadual e viajará para Windsor. 

Elizabeth II será enterrada na abóbada Real, na Capela de São Jorge, do Castelo de Windsor, junto ao pai, Rei George VI, e do marido, Príncipe Phillip. 


 

Monarca mais longeva da história do Reino Unido. Elizabeth II morreu aos 96 anos, após 70 anos de reinado.
por
Luan Leão
|
08/09/2022 - 12h

"The London Bridge is down" - A ponte de Londres caiu, esse era o código definido para que o secretário pessoal da rainha Elizabeth II informasse a Primeira-Ministra do Reino Unido, Liz Truss, sobre o falecimento da monarca. Aos 96 anos, Elizabeth Alexandra Mary Windsor faleceu na tarde desta quinta-feira (08), em Balmoral, na Escócia.
 

Morre Elizabeth II
Arco-íris se formou na frente do Palácio de Buckingham, em Londres, nesta quinta-feira (08). Foto: Frank Augstein / AP

O comunicado oficial por parte do Palácio de Buckingham ocorreu por volta das 14h30 (horário de Brasília), 18h30, horário local de Londres, através de uma rede social. "A Rainha morreu pacificamente em Balmoral esta tarde. O rei e a rainha consorte permanecerão em Balmoral esta noite e retornarão a Londres amanhã", disse o anúncio.
 

Morre Elizabeth II
Rede BBC anunciou a morte com imagem da rainha ao som do hino do Reino Unido. Foto: Andre Couldrige / REUTERS

Os filhos de Elizabeth II, Charles, Anne, Andrew e Edward, estavam todos reunidos no Castelo de Balmoral desde o começo do dia, quando a assessoria do Palácio informou que a rainha estava sob supervisão médica, e que inspirava cuidados.

"Após uma avaliação nesta manhã, os médicos da rainha estão preocupados com a saúde da Sua Majestade e recomendaram que ela permaneça sob supervisão médica. A rainha permanece confortável e em Balmoral", dizia o comunicado. 

Com a morte de Elizabeth II, o príncipe Charles, o seu filho mais velho, e sucessor direto, assume como novo rei do Reino Unido e de mais 14 países. Em pronunciamento a imprensa, cerca de 30 minutos depois do anúncio do falecimento, a Primeira-Ministra Liz Truss informou que Charles usará o nome de Rei Charles III.

Charles Phillip Artur George será o monarca mais velho a tomar posse, aos 73 anos. Charles tem dois filhos, os príncipes William e Harry, fruto de seu casamento com a princesa Diana, cinco netos; George, Charlotte, Louis, Archie e Lilibet, e é casado com a agora rainha consorte, Camilla Parker. 

 

Morre Elizabeth II
Rei Charles III será o rei mais velho a assumir o trono. Foto: Ben Stansall / AFP

Em seu primeiro pronunciamento como Rei Charles III, ele lamentou a morte da mãe. "A morte da minha querida mãe, a majestade a rainha, é um momento de grande tristeza para mim e para os membros da minha família. Nós lamentamos profundamente o falecimento de uma querida soberana e uma mãe que foi muito amada. Eu sei que a perda dela será muito sentida no país, na Commomwealth e por incontáveis povos no mundo", disse o texto. 

Seguindo o protocolo de morte da monarca Elizabeth II e ascensão ao poder de Charles III, as bandeiras do Reino Unido estão a meio mastro e um anúncio de falecimento foi afixado no portão do Palácio de Buckingham. A BBC, rede estatal, suspendeu a programação e transmitirá apenas informações sobre a despedida da rainha. 

 

Morre Elizabeth II
Anúncio afixado na porta do Palácio de Holyroodhouse. Foto: Lee Smith / REUTERS

A transmissão do BBC News Special está sendo conduzida pelo âncora Huw Edwards. Desde o início da cobertura, ainda sem a confirmação da morte, o âncora, repórteres e analistas usam roupas em tons escuros e gravata preta - essa é uma etiqueta da rede para os momentos em que um membro da família real morre.

Candidato da esquerda é eleito com margem mínima e emplaca o primeiro governo de esquerda do país. Francia Márquez será a primeira vice-presidente negra do país.
por
Luan Leão
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20/06/2022 - 12h

No domingo (19), em uma eleição com cerca de 22 milhões de votos, a Colômbia escolheu o novo chefe do executivo. O economista e senador Gustavo Petro, de 62 anos, candidato da coalizão Pacto Histórico, foi o vencedor do pleito obtendo 50,50%; contra 47,16% do empresário Rodolfo Hernández, de 77 anos, candidato de ultradireita, da Liga de Governantes Anticorrupção. A diferença entre os dois candidatos foi de 717 mil votos.

O resultado apertado já era o que apontavam as pesquisas, as projeções, porém, mostravam leve favoritismo de Hernández, que saiu derrotado. Petro obteve 11.281.013 milhões de votos ante 10.580.412 de seu adversário. 

Na sua terceira vez concorrendo ao cargo, Petro liderou as pesquisas de intenção de voto durante boa parte da campanha, e foi o candidato mais votado do 1° turno, tendo 40,32% dos votos. Já Hernández, por sua vez, foi a surpresa desta eleição, desbancando a direita tradicional, grupo político do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe (2000-2010), que governou o país até este ano, tendo Iván Duque como representante.

A vitória de Gustavo Francisco Petro Urrego é um fato histórico para o bloco de esquerda no país, que pela primeira vez integrará o comando executivo nacional. O ex-prefeito da capital Bogotá e ex-integrante do grupo de guerrilheiros Movimento 19 de abril (M-19) governará o país de 2023 a 2026. Através das redes sociais o agora presidente eleito agradeceu os eleitores e disse que era o dia "das ruas e das praças". 

 

"Hoje é dia de festa para o povo. Que se festeje a primeira vitória popular. Que tantos sofrimentos se amorteçam na alegria que hoje inunda o coração da pátria. Essa vitória para Deus e para o povo e sua história. Hoje é o dia das ruas e das praças" - Gustavo Petro.

 

Outro ponto inédito que a disputa deste domingo (19) proporcionou foi a eleição de Francia Elena  Márquez Mina, de 40 anos, advogada e primeira mulher negra a ocupar o cargo de vice-presidente no país. Márquez Mina é figura conhecida pelo seu ativismo ambiental, tendo conquistado o Prêmio Ambiental Goldman, considerado o “Nobel do Meio Ambiente'', em 2018. 

Francia Márquez, nova vice-presidente da Colômbia
Francia Márquez é a primeira vice-presidente negra da Colômbia. Foto: Reprodução / Twitter

Em suas redes sociais, Márquez agradeceu aos eleitores que foram às urnas. "Obrigada às colombianas e aos colombianos que saíram massivamente a votar hoje com dignidade, vencendo o medo e com esperança", disse após a divulgação do resultado. 

Atual presidente, Iván Duque também se pronunciou após a divulgação do resultado falando em transição "harmoniosa, institucional e transparente".  "Liguei para @PetroGustavo para parabenizá-lo como presidente eleito dos colombianos. Concordamos em nos reunir nos próximos dias para iniciar uma transição harmoniosa, institucional e transparente", escreveu o presidente. 

Menos de uma hora após o resultado ser anunciado, Hernández reconheceu a vitória de Petro por meio de um vídeo publicado nas redes sociais. "Colombianos, hoje a maioria dos cidadãos escolheu o outro candidato. Como eu disse durante a campanha, eu aceito os resultados dessa eleição", afirmou o candidato derrotado. 

Conhecido como “Trump Colombiano”, Hernández também mandou um recado para Petro. “Peço ao doutor Gustavo Petro que seja fiel ao seu discurso contra a corrupção e que não decepcione os que confiaram nele”, disse. 

 

“A mudança consiste em deixar o ódio para trás”

Em seu discurso da vitória ao lado de sua esposa, Veronica Alcocer, Petro falou em “política do amor”. “A política do amor não é uma mudança para nos vingarmos, não é uma mudança para construir mais ódio ou aprofundar o sectarismo na sociedade colombiana. Nossos pais e avós nos indicaram o que significa o sectarismo. A mudança consiste em deixar o ódio para trás”, disse o presidente eleito. 

Gustavo Petro, presidente eleito da Colômbia
Gustavo Petro presidente eleito da Colômbia. Foto: Reprodução / Twitter

Na fala, Petro também mencionou um acordo nacional para assegurar a paz e o direito das pessoas, em um aceno aos grupos de guerrilheiros que ainda não baixaram as armas. O presidente eleito também falou sobre seu próprio passado, dizendo que lutou “contra a injustiça, contra um mundo que não deveria ser, contra a discriminação, contra a desigualdade”. 

 

“Quanta gente morreu, quanta gente está presa hoje, quantos jovens tratados como bandoleiros só porque tinham esperança, só porque tinham amor” - Gustavo Petro 

Reforçando temas abordados na campanha, Petro falou sobre uma maior integração na América Latina, destacou a importância do país na luta contra as mudanças climáticas, dizendo que é preciso salvar a Amazônia para salvar a humanidade, e tornou a falar de um maior diálogo nas Américas, incluindo até conversas com os Estados Unidos. O discurso também tratou sobre o fortalecimento da economia popular. 

 

Irregularidades 

De acordo com a Missão de Observação Eleitoral (MOE), até o encerramento da votação foram registradas 310 denúncias de crimes eleitorais. A entidade informou que ao menos 83 denúncias eram sobre a liberdade do voto. A MOE disse também que recebeu denúncias de coação por parte de empregadores que obrigaram ou ameaçaram seus trabalhadores a votarem em determinado candidato de sua preferência. 

Segundo o relatório, os locais com mais supostos relatos de irregularidades foram: Antioquia, Valle Del Cauca, Atlântico, Risaralda e Bogotá. 

 

Panorama nas Américas 

A vitória de Gustavo Petro faz a Colômbia se unir a outros países da América Latina com governos de esquerda. A virada à esquerda começou em 2018, com a eleição de Manuel López Obrador, no México. Em seguida,  Alberto Fernández foi eleito na Argentina, em 2019, e Luis Arce, em 2020, na Bolívia. Em 2021 foi a vez do Peru, com Pedro Castillo; o Chile, com Gabriel Boric; e Honduras, com Xiomara Castro. 

Segundo documento divulgado pelo Instituto Internacional para a Democracia e a Assistência Eleitoral (Idea), em 2020, a última década foi marcada por polarização na região, e em 2010, com a crise das commodities (matéria-prima), o continente teve uma virada à direita. Agora, com o impacto da pandemia da COVID-19, o movimento é inverso. 

Em entrevista exclusiva à Agemt, Rodrigo Augusto, mais novo doutor do departamento de Relações Internacionais da PUC-SP, analisa o papel dos Estados Unidos no contexto global e os reflexos das dinâmicas internacionais na América Latina e no Brasil
por
Camilo Mota
|
01/06/2022 - 12h
Interconexões do mundo globalizado.
Imagem de TheAndrasBarta. Fonte: Pixabay 

Rodrigo Augusto é Professor Doutor em Relações Internacionais da PUC-SP e membro do Grupo de Estudos de Conflitos Internacionais (GECI), coordenado pelo professor Reginaldo Nasser, do departamento de RI. No último mês, o grupo lançou o livro Revoltas, Conflitos e os Novos Caminhos da Geopolítica: Interconexões Entre Oriente Médio e América Latina, com análises das dinâmicas internacionais e o papel dos Estados Unidos nas duas regiões.

Um dos capítulos é o do professor Rodrigo, escrito em conjunto com o professor Reginaldo, e sucede o tema da sua tese de doutorado “Dinâmicas de Poder dos EUA no Iraque pós-Saddam: A articulação entre o governo norte-americano e as elites do poder iraquiano”, defendida por Augusto no dia 11 de maio, pelo Programa de Pós-graduação em Relações Internacionais (PPGRI) San Tiago Dantas da Unesp, Unicamp e PUC-SP. O autor conversou sobre o assunto com a AGEMT.

 

AGEMT: No livro Revoltas, Conflitos e os Novos Caminhos da Geopolítica, organizado pelo professor Reginaldo Nasser e lançado no dia 7 de maio, são abordadas as Interconexões Entre Oriente Médio e América Latina. Um dos pontos abordados é a forma de poder exercido pelos Estados Unidos sobre essas regiões, que é abordado no seu capítulo com o professor Reginaldo. Quais são as proximidades entre essas regiões?

RA: Esse livro é dividido em duas partes, uma parte especificamente para trabalhar revoltas, geopolítica, temas contemporâneos da agenda política regional da América Latina, e do Oriente Médio, então dividido em duas partes. A ideia geral é demonstrar como essas duas regiões, que em princípio parecem tão diferentes, na verdade revelam dinâmicas sociais sociopolíticas muito semelhantes. Muitos dos recortes que os autores e autoras fizeram nesse livro tem como propósito dar esse destaque, particularmente quando a gente olha para a América Latina de 2018 e 2019, recheada de protestos espalhados particularmente pelo Cone Sul. Eu lembro um dos capítulos, o da professora Terra, que foi sobre as revoltas no Chile e como temporalmente é semelhante a diversas outras revoltas que aconteceram no Oriente Médio e no Iraque, particularmente, que gerou também a derrubada de um governo. Isso para demonstrar que da nossa perspectiva latino-americana o Oriente Médio não é tão diferente assim. Nas nossas lutas, ainda que tenhamos especificidades, temos grandes semelhanças: desigualdade social, pobreza, corrupção e desemprego. Pautas comuns e que geram mobilizações. Isso por um aspecto social e que gera movimentações que muitas vezes se espalham para a região, geram movimentos que vão ser transnacionais, vão mobilizar espíritos revolucionários revoltosos em outras regiões. Aí você menciona o último capítulo, que é aquele que eu pude escrever em conjunto com o professor Reginaldo, destacando um pouco mais a área específica da minha pesquisa, que são os estudos sobre política internacional no Oriente Médio, particularmente dos Estados Unidos e a nossa proposta ali naquele capítulo era justamente demonstrar como o governo Trump também recentemente lidou politicamente com esse aliado, que é um novo aliado, pensando que a partir de 2003 a partir da derrubada do Saddam Hussein o Governo iraquiano, Estado iraquiano, se torna um parceiro importantíssimo para a lógica de poder norte-americana na região. É geopolítica. A importância dessas interlocuções para contenção do Iraque e Irã.

 

AGEMT: No dia 11 você defendeu sua tese de doutorado que fala sobre as dinâmicas de poder dos Estados Unidos com relação à intervenção, especificamente, no Iraque. Você faz esse recorte no livro, que fala sobre o governo Trump, mas seu artigo remonta o período a partir de 2003 quando os Estados Unidos utilizam o Iraque como justificativa de resposta ao 11 de setembro, a chamada Guerra ao Terror. Também é abordada a aplicação do Soft e Hard Power, conceitos das Relações Internacionais, que se diferem do Sticky Power (poder pegajoso), termo de Walter Russell Mead que emerge no governo Trump. Olhando especificamente sobre os Estados Unidos, como que eles atuam nesse sentido e como o Stick Power se dá na prática?

RA: Russell Mead, que é um pesquisador conservador norte-americano particularmente crítico às ações intervencionistas dos Estados Unidos desde o governo Bush e que se estende pelo governo Obama, Trump e agora no governo Biden. Ele estabelece esse conceito de Sticky Power com o propósito de tentar demonstrar de uma maneira prática e metafórica esse poder pegajoso econômico, que não é propriamente um poder coercitivos militar forte. Ele também é isso, mas ele é muito mais do que isso. Ele tem como grande objetivo ter essa estrutura Econômica Liberal internacional presente nos Estados do Oriente Médio e as transformações que foram perpetradas a partir do 11 de setembro no Oriente Médio: políticas, econômicas; e que dialogo na minha tese. O Iraque, por exemplo, que é meu caso de estudo, um Estado de economia nacionalizada e fechado. O governo Baath estava há 40 anos no poder. Os americanos tinham um termo bastante utilizado nos anos 2000, o Nation Building, a ideia de reconstrução de uma nação e que naquele momento, obviamente não era consenso nos Estados Unidos, mas predominou essa narrativa, iniciou um projeto intrusivo largo no Médio tanto que os dados atuais apontam para quase oito trilhões de dólares de investimento na tal Guerra ao Terror, uma cifra enorme, que vai trazer mecanismos militares, para retirar esses poderes antigos e para manter um novo status quo, mecanismos de ajuda internacional, articulação com novos bancos criados na região. Acho que a grande coisa do início dos anos 2000 é que isso foi uma aposta e quando a gente olha para isso de uma perspectiva contemporânea, entrando na terceira década do século XXI, evidentemente que as críticas são muito maiores do que naquela época, justamente porque temos a continuidade desses processos intervencionistas, não se tem uma transformação completa desses Estados tendo em vista até o tema do livro, essas revoltas, essa insatisfação popular desses novos Estados reformados. Mas por outro lado você tem sim a presença dessas normativas liberais do capitalismo incipiente, que revela que você tem uma penetração, mas que não é total. Por isso que na minha tese eu prefiro utilizar o arcabouço teórico neogramsciana para tentar explicar sobre esse mecanismo de poder norte-americano no Iraque. Essa equação que combina força de um lado, então poder militar, que vai lá e derruba o Saddan Hussein em pouco tempo e o Poder consensual, muito mais difícil, que aquele que vai ser conquistado através das transformações constitucionais e políticas, mas que tem que ser incorporado pela sociedade. Se não for incorporado pela sociedade gera repudio, gera afastamento, e quando olhamos para  o Iraque, Afeganistão e outros Estados em crise no Oriente Médio, isso fica evidente. Até hoje nós temos constantes revoltas, não estão necessariamente ligadas aos processos de intervenção lá de 2000, 2003, mas são consequências disso. E a expressão mais clara dessa insatisfação, desse modelo não penetrado é o Estado Islâmico. A gente pode afirmar que esse é um elemento que inclusive no governo Trump, tema do capítulo, é um grande desafio. Como combater esse grupo político transnacional, que tem um projeto retrógrado para o Oriente Médio, reacionário que visa o poder islâmico conservador com leis bastante severas e que uma parte da sociedade até interpreta como um positivo? Ou seja, essas batalhas de narrativas.

 

AGEMT: A teoria neogramisciana também fala sobre a existência dessa reação, de grupos contra hegemônicos, que vão questionar esses modelos de dominação e temos visto, como por exemplo o Caso do Chile, onde uma estrutura foi fortemente questionada, inclusive a partir da atuação do movimento estudantil, que é o capítulo da Profa. Terra. Esse movimento consegue romper com um modelo que estava ali estruturado

RA: Enquanto tem poder, tem reação. As reações podem vir da própria estrutura da Elite, como é o caso do Iraque quando eu observo a intervenção norte-americana pontualmente apoiando uma elite de oposição ao governo do Saddam Hussein e de maneira bem-sucedida consegue reverter a ordem política nesse sentido, mas sem dúvida nenhuma a melhor forma de você transformar é você incorporando a sociedade, você trazendo as forças contra a elite. Isso, sem dúvida nenhuma, é uma boa estratégia. No caso do Chile essa força contra a elite vem da própria sociedade. E a gente não pode afirmar plenamente que é uma revolução no sentido estrito do termo, porque não se trata de um rompimento do tecido social e da estrutura de poder. A estrutura de poder chilena é uma democracia, permanece democracia e foi eleita democraticamente, mas é uma reforma que vem da base, que vem da do movimento estudantil, que tem como liderança presidencial uma dessas representações da sociedade, o Boric. Tem no seu corpo político ministros e ministras que faziam parte desse movimento e todas essas dinâmicas revelam na verdade como as relações internacionais, como a política internacional se faz e refaz através dessas dinâmicas de poder e de luta interna, às vezes incorporando agentes externos, às vezes os agentes externos tendo predominância como é o caso do Iraque e os Estados Unidos.

 

AGEMT: E qual a análise você faz do papel atual dos Estados Unidos, não apenas no Oriente Médio, mas no contexto geopolítico atual, visto que os EUA foram um dos principais atores insistentes na disputa política e que culminou na invasão da Ucrânia? A nível global, qual a sua influência?

RA: Estamos vivendo uma crise Global iniciada pela intervenção russa na Ucrânia porque os efeitos são globais, economicamente. Isso atinge o Brasil inclusive, quando olhamos não só os preços do petróleo, preço de produtos de commodities que aumentam, somado obviamente a um governo brasileiro que tem a maior parcela da culpa das inflações, mas além desse cenário interno e negativo, esse conflito também traz elementos econômicos que nos afetam. É um conflito que tem implicações globais e sem dúvida a perspectiva de incorporação da Ucrânia na Otan, pensando que a Ucrânia é um dos Estados que faz fronteira com a Rússia, ex-União Soviética, que faz parte desse cinturão geográfico e que afasta a Otan do território russo, historicamente sempre foi um tema de debate e sempre foi um elemento em que a Rússia bateu a tecla dizendo que nenhum Estado no meu entorno vai fazer parte desse organismo. Quando a gente olha para narrativa do governo Putin, isso fica latente. Há algumas semanas ele fez uma declaração mediante ao Dia da Vitória, o dia que os russos comemoram a vitória da Segunda Guerra Mundial, e insistiu no mesmo assunto, que a culpa da guerra, para eles, é dos norte-americanos. Eles que forçaram essa vontade de entrada da Ucrânia na Otan e obviamente que os outros países da Otan assinaram embaixo. Um pouco temerário no início, mas depois foram com tudo, tanto que boa parte desses países da Otan, Alemanha, França, estão auxiliando militarmente a Ucrânia e podemos dizer que se a Ucrânia não tivesse esse apoio militar dos Estados Unidos, dos seus aliados da Europa Ocidental, já teria sido devastada pela capacidade militar russa, que é histórica. Essa intervenção se inicia por uma razão particularmente liberal, o princípio de autodeterminação dos povos, então os russos vão falar que estão iniciando as intervenção para dar legitimidade ao povo de Donbass, duas repúblicas autônomas, Luhansk e Donetsk, e se expande à medida em que os dias passam. No terceiro, quarto dia de intervenção, russos já estavam atingindo os territórios para além de Donbass. Uma guerra que tem dimensões globais, mas que acho que é importante destacar, não é batalhada de maneira global, ela não é uma terceira guerra. É uma guerra de nível local, regional entre Russos e ucranianos, mas cuja presença norte-americana vem através dos auxílios, do sistema de sanções, não podemos esquecer também que são formas indiretas econômicas de você tentar prejudicar o seu inimigo, no caso os russos, que sentem no bolso essas sanções econômicas e que geram um grande impasse há mais de 2 meses de conflito. De um lado uma Ucrânia que só tem capacidade de se manter mediante o apoio internacional, e do outro uma Rússia que está cada vez mais enfraquecida economicamente. Acho que o ator que acabamos não mencionando, mas que vale a pena trazer é a própria China, mais afastado, mas que bate na narrativa também de que esse conflito é culpa do ocidente, do Biden. Isso é muito curioso, começamos falando do capítulo que eu escrevo com o prof. Reginaldo tentando fazer um balanço do governo Trump para o Iraque, é até engraçado olharmos em perspectiva, mas é muito mais moderado o governo Trump e talvez até mais consciente de suas ações em termos de não criar crises internacionais tão graves do que o governo Biden, que já no seu primeiro ano mediante a ascensão do Talibã gera uma crise no Oriente Médio em que os Estados Unidos abrem mão. E quando trazemos a cifra de trilhões de dólares gastos – na guerra ao terror, iniciada como justificativa ao 11 de setembro -, a pergunta é para quê? Para sair no final de 20 anos depois de um lado, e do outro uma segunda crise motivada também por implicações estratégicas no mínimo curiosas. No segundo ano de mandato do Biden é isso que vemos. Não podemos simplesmente fechar para as narrativas ideológicas do partido Democrata ou do Partido Republicano. Quando a gente olha para a ação norte-americana em perspectiva internacional, existe na verdade uma constância das ações inclusivas, uma constância no projeto hegemônico de manter o seu poder global quase a qualquer custo e isso é um ponto fundamental a ser observado.

 

AGEMT: E para finalizar, como o GECI se insere nesse contexto, o Grupo de Estudos sobre Conflitos Internacionais da PUC-SP, no atual contexto brasileiro, inclusive acompanhando a própria cobertura da guerra na Ucrânia, onde há muitos deslizes, uma crítica para o próprio jornalismo quando não há tanto uma formação sobre a complexidade desses atores envolvidos e precisamos olhar muito mais o fator cultural desses povos para entender um mínimo ali do conflito. Mas o papel desse grupo de estudo também no acadêmico para o Brasil e para as Relações Internacionais?

RA: Acho que como qualquer grupo de estudos, o Geci não é diferente, vivemos num contexto particularmente mais difícil em termos de pesquisa, produção e incentivo com relação ao governo federal. O trabalho dos grupos de estudos depende particularmente de investimento, de fomento. Aqui na PUC a gente não pode esquecer que existem fontes de financiamento internas, assessoria de pesquisa é muito importante na manutenção dessas atividades, desses grupos, da possibilidade de escrever um livro, da possibilidade de fazer projetos como nós fizemos no próprio Al Janiah ano passado, um projeto muito interessante em que a gente fez um diálogo com os funcionários do restaurante que vieram refugiados, então entender essas trajetórias. Tudo isso é importante a nível de São Paulo e a nível de Brasil. Transformar os nossos conhecimentos acadêmicos em conhecimentos sociais é uma responsabilidade da academia, uma visão particular minha e que é compartilhada entre nós no Geci, que é um grupo que existe desde 2015 e foi mobilizado a partir de um propósito muito específico de desenvolver a pesquisa, leitura e que hoje é muito mais amplo do que isso. Nós temos programas de TV, temos podcast, temos página no Instagram, página no Facebook, onde divulgamos esses nossos trabalhos e acho que a grande tarefa nossa é tentar trazer luz para os debates que acendem a sociedade em termos de conflitos internacionais, particularmente, de uma maneira a incorporar as nossas pesquisas, mas também tornar mais fácil de compreender. É uma via de dois lados, de um, trazer luz para debates que acabam sendo muito esvaziados, às vezes, sobre os conflitos, falamos antes da gravação que no passado o grande tema era o Talibã, então nós estivemos – membros do Geci - em alguns programas falando sobre isso, trazendo luz a esse debate e agora é a mesma coisa quando a falamos do conflito russo-ucraniano. É importante estarmos nesses lugares, é importante falar, estar presente. Isso é um elemento fundamental, papel dos grupos de pesquisa, papel do acadêmico, do pesquisador ter essa interlocução com a sociedade. E nada mais satisfatório quando conseguirmos trazer essa introdução e tornar isso legível essa nossa linguagem.

 

A grande cobertura midiática da Guerra na Ucrânia trouxe à tona o questionamento a respeito da cobertura de guerras no Oriente: será que é dada a mesma atenção?
por
Letícia Coimbra
Mariana Luccisano
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05/05/2022 - 12h

Desde o início do conflito, a Guerra na Ucrânia tem tido grande cobertura midiática com atualizações diárias ocupando boa parte do noticiário. Porém, essa situação trouxe à tona o seguinte questionamento: todas os conflitos são tratados com a mesma atenção? 

Sem dúvidas o conflito russo-ucraniano merece a devida atenção, porém, várias outras guerras, como a no Iêmen, que dura mais de oito anos, não tem a mesma visibilidade. Nesse sentido, é impossível não pensar que, infelizmente, o grau de importância de algum conflito - que é baseado em poder e interesses comerciais - varia de acordo com o que está sendo disputado e o local onde está acontecendo.

Clique aqui para acessar o podcast onde é feita uma reflexão a partir dessa questão.