Sem orientação adequada, donas de pequenos negócios relatam dificuldades para entender as mudanças na economia e veem sua renda ameaçada
por
Manuela Dias
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28/11/2025 - 12h

A falta de informação qualificada tem se tornado uma das principais barreiras para microempreendedoras brasileiras que dependem de insumos importados ou de produtos cujo preço varia conforme fatores globais. Em meio a mudanças recentes nas taxas, oscilações cambiais e aumento da burocracia para transações internacionais, muitas afirmam que não sabem onde buscar apoio técnico. É o caso de Danielle Nayara, maquiadora e microempreendedora, que iniciou seu negócio após deixar o emprego formal para trabalhar com eventos.

“Eu sempre gostei de maquiagem, mas nunca tinha pensado em maquiar outras pessoas. Só comecei depois de uma sugestão, fiz um curso e acabei me apaixonando pela profissão”, conta. Hoje, ela atende clientes em casa, em eventos e até pernoita em residências para preparar noivas e madrinhas. Mas apesar da agenda cheia, manter o negócio funcionando tem se tornado cada vez mais complexo.

Um desafio diário

Para Danielle, o principal custo do seu trabalho é a compra de materiais: produtos que sofrem variações constantes de preço, muitas delas impactadas por fatores externos. “Um produto que eu comprei por um valor semana passada já está mais caro hoje. Quando isso acontece, eu preciso ajustar meus preços, porque se não aumento, perco margem”, explica.

Ela relata que, muitas vezes, não entende o motivo dessas oscilações nem encontra informação clara sobre o que está influenciando o aumento. Esse descompasso entre preço e explicação não só dificulta o planejamento, como a impede de aproveitar oportunidades.

“A qualidade dos produtos é essencial. Se o material é ruim, não adianta eu ser boa. Só que para comprar produtos bons, eu preciso pesquisar muito. E os preços mudam rápido demais”, diz.

A falta de informação também interfere na profissionalização. Em eventos como a Beauty Fair, Danielle conseguiu adquirir produtos de alta qualidade com preço reduzido, mas admite que depende do acaso: “Eu fico sabendo por redes sociais. Se eu não vejo no Instagram ou no TikTok, eu perco a chance.”

Redes sociais como principal fonte

Como muitas microempreendedoras, Danielle se informa principalmente pelas redes sociais. “É onde está tudo hoje: Instagram, TikTok, WhatsApp. É ali que vejo notícias, promoções e mudanças”, afirma. O problema, segundo especialistas, é que essa dependência de canais informais deixa empreendedoras vulneráveis. Notícias sobre variações cambiais, tarifas, mudanças em importações ou novas regras para comercialização de cosméticos dificilmente chegam a essas mulheres de forma clara e estruturada. Isso faz com que muitas decisões sejam tomadas às cegas.

Economistas e organizações ligadas ao empreendedorismo feminino têm reiterado que a falta de informação clara é hoje um dos maiores riscos para pequenos negócios liderados por mulheres. À medida que insumos sofrem com oscilações globais, e que o comércio exterior se torna mais complexo, milhares de empreendedoras enfrentam um mercado imprevisível sem apoio técnico.

No caso de Danielle, o impacto ainda é administrável, mas ela admite a preocupação: “Eu tento acompanhar tudo, mas é difícil saber o que realmente vai afetar meu trabalho. Às vezes, descubro um aumento só quando chego na loja para comprar”, relata.

Qualidade e confiança são os dois principais pilares do trabalho de uma maquiadora”.
“Qualidade e confiança são os dois principais pilares do trabalho de uma maquiadora”. Reprodução: arquivo pessoal 

Força para manter o negócio! 

Apesar dos desafios impostos pela falta de informação, pelos custos instáveis e pelas mudanças constantes no mercado, mulheres como Danielle continuam sustentando seus negócios com esforço diário, intuição e dedicação. A realidade que enfrentam é marcada por incertezas, mas também por uma determinação que atravessa jornadas longas, madrugadas de trabalho e decisões tomadas sem o suporte adequado.

No fim das contas, o que sustenta esses negócios não é apenas acesso a crédito ou políticas públicas: é a força de mulheres que, todos os dias, escolhem continuar. A luta feminina, silenciosa ou coletiva, segue sendo a certeza em meio ao cenário incerto e continua provando que, quando essas mulheres resistem, elas transformam não só suas próprias histórias, mas também o futuro do empreendedorismo no país.

 

Transformando a vida de milhões de pessoas todo ano, merece mais reconhecimento e recursos para manter o Brasil vivo
por
Vítor Nhoatto
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28/11/2025 - 12h

Por Vítor Nhoatto

 

Uma das poucas certezas de todo ser humano, tal qual a morte, é a doença. Sabe aquele resfriado que vem junto ao seco do frio, uma ferida que infecciona depois de cair de bicicleta, até aquelas mais sérias que podem aparecer. Fato é que sem saúde não se vive, sendo um direito constitucional não por acaso. Sendo assim, é preciso que o acesso a essa necessidade tão básica quanto respirar e se alimentar seja universal, e não um bem a se comprar apenas por aqueles que podem.

Para isso então que existe o Sistema Único de Saúde (SUS), tão falado e muito mais presente na vida do que alguns podem sequer imaginar, ou querer. Para se ter uma ideia, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão regulador dos medicamentos disponíveis no país, de controle alimentar e hídrico, faz parte do SUS. Regulamentado em 1990, é responsável pelas vacinas e desenvolvimento científico ainda, e sabe os planos de saúde, a Agência Nacional de Saúde (ANS), que os regula, também é integrante do sistema.

Para falar dessa diferença real na vida, antes é preciso até olhar nos papéis para lembrar já a quanto tempo ele é médico, enfermeiro, farmácia. De cabelos curtos hoje, depois de uma repaginada no visual devido ao câncer de pulmão que teve justamente na pandemia de COVID-19, Léia Marisa celebra que há dois anos consegue receber na AME Maria Zélia o micofenolato de Mofetila. Pois é, muitas vezes quando o nome é chique o preço é alto, uns R$500 por caixa, mil reais por mês gastos antes da papelada ficar pronta e ser aceita em 30 de novembro de 2023, já que a doença não espera os trâmites e filas.

A ex-professora, atual dona de casa e empresária a distância do seu restaurante, conta como o período de descoberta e tratamento do câncer, que levou até questões reumatológicas, e ajudou a descobrir uma artrite reumatoide, foi muito difícil. Entre dezenas de idas ao hospital de 2020 até 2023 até chegar ao diagnóstico, foram dias desgastantes, assustadores, e toda ajuda foi essencial, principalmente com os custos de sobreviver à doença. No caso dela, o tratamento do tumor foi feito em rede privada graças ao seu plano de saúde empresarial, que custa salgados R$5 mil reais ao mês. Só aqui são quase quatro salários mínimos, um privilégio muito grande, como ela destaca, olhando para um país em que apenas 7,60% da população ganha entre 5 e 10 salários como o Censo de 2022 do Instituto brasileiro de Geografia e Estatística revela. 

Se aprofundando mais ainda nos fatos, de acordo com o estudo “Quanto custa o câncer” de 2023 do Observatório de Oncologia, do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE) e do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer, os custos de tratamento da doença quadruplicaram nos últimos três anos. Uma sessão de radioterapia ou quimioterapia custava quase R$800 em 2022, e dezenas são necessárias na maioria das vezes. Acrescentando nessa conta, consultas, tomografias e biópsias, mil reais ali e cinco acolá, o custo chega facilmente ultrapassa dezenas de milhares de reais. Isso é ainda mais preocupante tendo em conta a incidência do câncer na população, que segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA) entre 2023 e 2025, 704 mil pessoas terão a doença como Marisa. 

E com isso que o SUS se mostra como algo tão relevante, oferecendo tratamento integral e gratuito contra todos os tipos de cânceres. Claro que muitos problemas existem, como destaca Marisa ao lembrar que quando estava no meio do tratamento enfrentou problemas com o plano de saúde, mas que só o medo de depender da demora do SUS caso fosse preciso, a preocupava muito. A saúde é o bem mais precioso para, o que para todos provavelmente deva ser, e por isso justamente que em 2012 a lei 12.732/12 obriga que o tratamento contra o câncer tem que ser iniciado em até 60 dias após o diagnóstico. 

Mas além disso, com os olhos marejados depois de navegar novamente no mar agitado que foi a jornada até a vida que tem hoje, curada e com o diagnóstico da sua doença crônica, ela volta e lembra que a diferença que não ter que pagar pelo Micofenolato que a mantém respirando faz.  Quando tinha que arcar com as despesas era como um fardo a mais imposto a ela, que considera a saúde hoje como o bem mais valioso. As idas mensais  ao posto são um alívio hoje para ela, destacando que o seu medicamento nunca faltou até então, mas que já presenciou pessoas na situação contrária e que não tinham como arcar pessoalmente com os gastos. Essa é uma realidade infelizmente, segundo fiscalização de 2023 da secretaria de contas do Estado de São Paulo, em quase metade dos postos visitados faltavam algum medicamento.

papéis
A cada seis meses Marisa tem que renovar a receita e toda a papelada para solicitação do seu medicamento junto a AME - Foto: Vítor Nhoatto

Milhões de uns

Mesmo que falte muito, afinal, só 4,16% do orçamento federal foi destinado à saúde em 2024 segundo o Painel do Orçamento Federal, a porcentagem vem aumentando desde 2022, e milhões de brasileiros são atendidos todos os dias. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes com um sistema universal de saúde, e 213 milhões dependem diretamente do SUS, segundo o Ministério da Saúde, que contabiliza em média 2,8 bilhões de atendimentos por ano, empregando 3,5 milhões de profissionais.

E mais um desses uns é Valdir Sousa, que do alto de seus 63 anos de idade é um típico caso brasieleiro. Com diabetes do tipo II há 20 anos e hipertenso, conta que se não fosse o acesso ao sistema gratuito, sua vida seria muito diferente, obviamente pelo lado financeiro, e muito também pelo bem-estar. O mineiro nascido em São João do Paraíso e que vive em São Paulo há décadas já viu tanto na vida, e com o passar do tempo o que todos querem e merecem é justamente qualidade de vida. Essa no caso, em grande parte possível graças a insulina que busca no posto na Freguesia do Ó e os comprimidos que cuidam do seu coração acelerado.

Justamente essa hipertensão que é a doença mais presente nos peitos animados dos brasileiros, e 52% da população é diagnosticada com alguma DCNTs, como revela a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019. Além disso, segundo dados de 2020 da Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) como as de Valdir são tecnicamente chamadas, são as mais comuns no mundo e no Brasil, com o diabetes inclusive tendo aumentado 70% entre 2000 e 2019. 

Para contextualização, nos Estados Unidos existe há alguns anos o movimento nas redes sociais insulin4all, criado pela organização sem fins lucrativos T1 International, que denuncia os altos custos da insulina no país, onde um frasco de 10ml gira em torno de U$330. Tal situação vem levando inclusive pessoas a racionarem o medicamento, o que pode levar a complicações e até a morte em casos mais graves. Já no Brasil, o mesmo remédio é disponibilizado pelo SUS, e o preço máximo permitido por lei é de R$125,30. 

Diante desses dados e o envelhecimento da população fica claro como a saúde vai ser cada vez mais necessária, tal qual destaca o jovem de espírito Valdir, que já foi pedreiro e auxiliar de manutenção geral em uma lanchonete, justamente no Hospital das Clínicas. As histórias que já viu na maior referência de saúde pública brasileira enchem a sua mente, e as palavras saem inquietas sobre as melhorias que o SUS precisa e as pessoas merecem. Ele conta em meio a suspiros que quando precisa de exames mais urgentes, ou consultas em meio a crises, tem que recorrer ao plano de saúde da sua esposa, do qual é dependente, já que as unidades de saúde estão sempre cheias e a fila de espera passa de meses algumas vezes. 

Foi nessas passagens obrigadas pela rede privada que ele inclusive descobriu mais um integrante do seu pacote, a doença renal crônica há um ano. Porém, é no SUS que o acompanhamento com nutricionista, nefrologista e endocrinologista foi possível, uma rotina de cuidados essenciais para uma boa qualidade de vida para quem tem a condição. É graças a essa rede de profissionais e a farmácia popular que Valdir vai aproveitando com os dois filhos e a mulher os seus dias, frisando com a voz até meia trêmula, que sem isso não poderia se ter o seu direito de viver com saúde exercido plenamente.

medicamentos
São graças a compostos como esses que tanto Marisa ou Valdir, e os mais de 100 milhões de brasileiros com doenças crônicas podem viver bem tal qual a constituição garante - Foto: Vítor Nhoatto

 

Desigualdade, corrupção e desemprego juvenil deflagram uma revolta que expõe a fragilidade econômica profundamente enraizada.
por
Pedro Bairon
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14/11/2025 - 12h

Por Pedro Bairon

 

Na primeira semana de setembro de 2025, as ruas de Kathmandu foram tomadas por uma onda de protestos liderados pela chamada Geração Z, quando milhares de jovens se reuniram para denunciar a corrupção, o nepotismo e a desigualdade que dominam a vida pública do Nepal. O estopim foi a proibição de 26 plataformas de redes sociais incluindo Facebook, Instagram, X e YouTube, decretada pelo governo, uma medida que ativistas viram como um ataque à liberdade de expressão, Raj Rana, um nepalês que participou das recentes manifestações reafirma tal posição.

Os protestos rapidamente escalaram: confrontos com a polícia resultaram em uso ostensivos de bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e munição real, segundo Rana. No dia 9 de setembro, o primeiro-ministro KP Sharma Oli renunciou, pressionado pela magnitude da insatisfação dos jovens, porém, não se limitou ao veto digital. Por trás da indignação estava uma reclamação mais profunda: a escassez de empregos dignos, a persistência de elites privilegiadas (os chamados “nepo kids”) e a sensação de que, apesar de tanto crescimento econômico reportado, o Estado falhou em converter recursos em oportunidades para a maioria da população. De fato, segundo o Banco Mundial, mais de 80% da força de trabalho nepalesa está na informalidade, um número clássico de economias frágeis. O economista Karki Lama aponta que as remessas enviadas por nepaleses que trabalham no exterior (equivalentes a mais de um terço do PIB, segundo Fundo Monetário Internacional, FMI) sustentam o país, mas não geram empregos de qualidade e mantêm muitos jovens reféns de oportunidades materiais mínimas.

Esses protestos, segundo analistas, não são apenas uma manifestação política: são um grito de alerta sobre a saúde estrutural da economia nepalesa. A relação entre a frustração juvenil e as debilidades econômicas torna-se evidente à medida que se examina o modelo de desenvolvimento vigente no país. A economia nepalesa há muito tempo depende fortemente das remessas de migrantes para manter sua liquidez externa e financiar o consumo interno. Para Lama, entretanto, essa dependência representa um fracasso de capacidade produtiva nacional, não há trabalho suficiente internamente, e a migração torna-se quase inevitável. Mas a crise das ruas tem um custo direto para a economia. Um relatório recente do Banco Mundial alerta que a turbulência política pode reduzir fortemente o crescimento econômico em 2025-26: a previsão foi ajustada para 2,1%, com possibilidade de contração se a instabilidade persistir. O documento prevê ainda uma queda nas chegadas de turistas, um golpe duplo para o Nepal, que depende fortemente do turismo para gerar divisas e emprego formal. A erosão da confiança dos investidores já se tornou palpável. A Federação da Indústria do Nepal (FNCCI), por exemplo, emitiu um apelo para que o novo governo garanta segurança e estabilidade para os negócios, destacando que o setor privado é vital para a recuperação. Segundo esse mesmo apelo, as perdas com os danos materiais causados pelos protestos já afetam indústrias, propriedades e a cadeia de valor do turismo, hotéis, guias, transportes, tudo foi afetado.

Além disso, a insatisfação juvenil encontra respaldo em dados econômicos estruturais que expõem fragilidades profundas. O Nepal registra uma das maiores taxas de desemprego entre jovens na região: cerca de 20 %, segundo o mais recente relatório do IBGE Países. A falta de emprego qualificado, o baixo investimento em infraestrutura produtiva e a fraca diversificação industrial criam uma economia incapaz de absorver seu capital humano mais o peso das remessas, embora vital, é paradoxal: elas sustentam a economia, mas corroem o potencial de desenvolvimento autônomo. Conforme observa a New Humanitarian, muitos jovens veem sua saída como única rota possível, enquanto outros permanecem para protestar contra um sistema que lhes fecha portas. A migração, nesse contexto, deixa cicatrizes na cena política, no tecido social e nas finanças públicas.

O choque dos protestos também traz riscos no balanço externo. A volatilidade gerada pelas manifestações mobiliza redes de capital para fora do país, deixando o Nepal vulnerável a choques cambiais e restringindo sua capacidade de investir em longo prazo. A perda de turistas, a recomposição mais lenta de reservas cambiais e a alta cautela dos investidores estrangeiros são efeitos colaterais duradouros desse momento de ruptura. Do ponto de vista fiscal, a crise exige que o governo interino encontre um delicado equilíbrio. Por um lado, há pressão para responder às demandas dos jovens por mais transparência, combate à corrupção e reforma política. Por outro, há necessidade urgente de restaurar a confiança dos mercados, garantir fluxo de investimentos e sustentar a receita pública. Se o Estado optar por cortes agressivos para manter a disciplina fiscal, pode abrir mão de sua capacidade de gerar empregos, exatamente aquilo que a Geração Z exige. Por outro lado, expandir gastos sem controle também pode agravar vulnerabilidades já existentes. A situação contemporânea do Nepal também reflete um dilema geopolítico. Localizado entre Índia e China, o país sempre foi estratégico para ambos. A instabilidade recente pode frear projetos bilaterais de infraestrutura e perturbar o plano de desenvolvimento sustentável que muitos observadores internacionais defendiam para a nação. Além disso, a falta de boas políticas industriais internas limita sua capacidade de atrair investimento direto que não dependa exclusivamente de remessas ou do turismo.

Embora a revolta da Geração Z tenha derrubado um governo, ela colocou a economia nepalesa sob os holofotes: o modelo baseado em remessas e fluxo turístico é funcional, mas frágil. A instabilidade desencadeada pelos protestos expôs o dilema clássico de economias dependentes: crescer, mas sem construir uma base real de produção, oportunidades e institucionalidade. Se o novo governo quiser responder ao grito dos jovens, terá de investir não apenas na reconstrução política, mas sobretudo na transformação econômica: criando empregos, promovendo reformas estruturais e reduzindo a dependência de fatores que escapam ao controle interno. Sem isso, o Nepal pode voltar a caminhar, mas continuará sobre uma ponte frágil, com vento forte acima e abismo profundo abaixo.

Videogames se aproximam de artigos de luxo devido aos elevados custos
por
Lucca Cantarim dos Santos
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07/11/2025 - 12h

Por Lucca Cantarim

 

Quem acompanha o cenário dos videogames vem se surpreendendo com a alta nos preços dos jogos nestes últimos meses. Com valores que vão desde R$ 249,95, valor do jogo “Hundred Line – Last line of defense”, lançado em abril de 2025, até R$ 499,99, preço do jogo Mario Kart World, que chegou às lojas em junho do mesmo ano. Esses preços têm dificultado cada vez mais o acesso dos fãs aos jogos que desejam, uma vez que acaba sendo inviável para muitos precisar gastar tanto dinheiro sempre que querem jogar um jogo novo. A estudante de sistemas de computação Gabrielle Rodrigues afirma sempre se arrepender de pagar caro em um jogo no dia do lançamento e acabar ficando sem dinheiro para comprar uma roupa ou até mesmo uma passagem do Rio de Janeiro até São Paulo para visitar seus entes queridos. Já o estudante Gabriel Merino alega sentir cada vez mais que não consegue comprar jogos no lançamento, precisando esperar diversos meses até uma baixa no preço ou promoção para finalmente ter acesso ao produto.

Fazer um jogo é um processo extremamente caro, e para a desenvolvedora independente “Dumativa”, responsável por jogos brasileiros como “Enigma do Medo” e “Lenda do Herói”, esse é o principal motivo para o aumento no custo do produto final. Já para Juno Cecílio, CEO da “Gixer Entertainment”, outra desenvolvedora independente, criadora do projeto “Changer Seven”, que se encontra em desenvolvimento atualmente, existe um fator ainda mais sensível.

 

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"Changer Seven", jogo de Juno Cecílio                                                 Foto:Divulgação/Gixer

 

Juno defende que existe uma estratégia de mercado mais agressiva por parte das empresas, que almejam maximizar sua receita em cima de um público fiel e cada vez mais disposto a pagar por franquias conhecidas. O grande problema, é que não existe um teto que defina até onde uma corporação queira ganhar, o que acaba sucateando o setor. O desenvolvedor faz um comparativo com outros setores no Brasil, como o de faculdades, que são compradas, demitem o corpo docente e substituem-no por profissionais mais baratos e revendem para o próximo, que fará o mesmo. Esse caso pode se observar na faculdade Anhembi Morumbi, que sofreu demissões e perdas massivas na grade horária após ser comprada pelo grupo Ânima Educação em 2021, como afirma uma matéria publicada na UOL em 2023.

Mas ele também aponta para outro fator, que também é abordado pela Dumativa, a falta de regionalização do preço. Quando um jogo chega no Brasil apenas convertido pela taxa do dólar, sem considerar a realidade do poder de compra local, ele acaba se tornando um produto quase que de luxo, e é nessas situações que observamos preços como os R$ 500,00 de Mario Kart World. A maioria dos jogos independentes já consideram fatores regionais quando lançam seus produtos em outros países, mas as produções de empresas grandes, como Nintendo, Ubisoft e Activision não, o que agrava uma ideia de “ganância” por parte dessas empresas.

Oferecer preços acessíveis ao consumidor é importante por inúmeros fatores, e um deles é justamente oferecer a experiência de jogo para um público mais amplo. Para muitos fãs de videogames, é extremamente doloroso, apesar de não chegar a um estágio extremo, ser privado de jogar algum jogo que goste devido ao seu custo elevado.

Gabrielle, por exemplo, diz que se sentiria mal caso fosse impedida de comprar um lançamento que estivesse com vontade de jogar. Ela alega que tem vontade de jogar o “Persona 3 Reload” a cerca de um ano, mas até hoje não o fez devido ao alto custo do jogo. Ela conta que até pensou em piratear a mídia apenas para consumo, e pagar por ela quando tivesse a oportunidade – igual já fez com outras franquias – mas que os sistemas que as empresas andam colocando em seus produtos, dificultam muito a pirataria. Gabriel Merino passa por uma situação similar, ficaria chateado caso não conseguisse comprar um jogo devido ao preço, mas também não compraria um jogo à preços exorbitantes mesmo se tivesse as condições para isso.

Lançar os jogos à preços acessíveis é essencial para que essas pessoas consigam consumir a mídia que desejam sem precisar se arriscar na pirataria ou pagar valores elevados. Além disso, é essencial para a criação de um consumo saudável. Nas palavras de Juno, quando um jogo lança à um preço compatível com a realidade do brasileiro, ele vende mais e ajuda a fortalecer o mercado e a comunidade local, e a trazer mais espaço para as empresas no País. Um exemplo foi o “Hollow Knight: Silksong”, lançado pela Team Cherry em setembro desse ano. O preço de R$ 60,00 cobrado pela mídia fez com que ela vendesse muitas unidades em um único dia – culminando na queda dos servidores da plataforma de compras Steam.

As empresas e publicadoras são as primeiras que podem participar na criação de um preço mais acessível e justo para o bolso da população. Grandes empresas e distribuidoras (Nintendo, Ubisoft, Microsoft) podem ajudar aprimorando a regionalização de preços, levando em conta o poder de compra de cada país; aprimorar a educação e formação de talentos, o que em longo prazo reduz o custo de produção global; oferecer programas de incentivo e parcerias com estúdios locais, o que acaba por gerar mais empregos, e visibilidade.

Quanto às empresas independentes, não se pode transferir as mesmas responsabilidades, uma vez que estas não tem o mesmo poder financeiro que as “gigantes do setor”. No entanto, elas podem e devem estabelecer métodos de acessibilidade nos preços de seus jogos, e algumas já tomam as providências, apesar de este ser um dos maiores desafios para essas instituições.

A Dumativa têm feito uso dos sistemas de financiamento coletivo em seus lançamentos, isso ajuda as empresas a terem uma base financeira mais sólida antes mesmo do lançamento, além de estabelecer uma relação saudável com empresa e consumidor, a partir do sistema de recompensas e conteúdo adicional dependendo de quanto cada pessoa optou por investir no jogo, além do próprio produto completo após o lançamento.

Já Juno, da Gixer, amplia ainda mais sua visão, para ele, jogos independentes não precisam competir com os grandes lançamentos em preço, na realidade, esses lançamentos têm de entregar valor percebido, autenticidade e qualidade dentro de seu escopo. Além disso, ele acredita que uma das melhores formas de equilibrar as contas sem depender do preço cheio é a diversificação de fontes de receita, e podem fazer isso por meio do lançamento de edições digitais com bônus, participação em festivais e até mesmo outros tipos de produto, como colecionáveis, histórias em quadrinho e até trilhas sonoras.

Outra ajuda também pode vir das próprias lojas, plataformas como a Steam se destacam quando o assunto é tornar seus preços mais acessíveis. Além da abundância de promoções, principalmente em datas comemorativas, que podem levar um preço de R$ 200,00 a R$ 40,00, a plataforma criou um sistema de famílias, que permite que um grupo de pessoas compartilhem a mesma biblioteca, podendo jogar jogos que pertencem à conta de terceiros (desde que inseridos na mesma família, cujo limite de pessoas é seis).

 

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Logo da loja digital Steam                                                                           Foto: Divulgação/Steam

 

Para Gabrielle Rodrigues e Gabriel Merino, que participam da mesma família alegam o quão benéfico isso é para eles, ambos afirmam como conseguiram ter mais acesso à jogos que não conseguiriam ter de outra forma, além da possibilidade de repartir os custos com os membros do grupo. Gabrielle afirma que financeiramente a família Steam é algo divino.

 

Movimento nas lojas aumentam conforme as épocas temáticas do ano vão chegando
por
Nathalia de Moura
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24/10/2025 - 12h

Por Nathalia de Moura

 

Entre o vai e vem e o sobe e desce das pessoas, a 25 de Março é o centro das vendas, principalmente em épocas como Carnaval, Natal e Halloween. Cores, brilhos, formas, luzes, ocupam as fachadas das lojas fazendo cada cliente lembrar que as bruxas chegam em 31 de outubro, o Papai Noel dará o ar da graça em 25 de dezembro e o Carnaval em breve tomará conta das ruas do País. 

A correria para atender o cliente que precisa de uma abóbora laranja e gigante, a atenção para cortar o tecido para a roupa do velhinho do Polo Norte ou até mesmo separar as lantejoulas para a confecção da fantasia faz parte do dia a dia das vendedoras do centro de São Paulo. Marlene tem 53 anos e veio atrás dos sonhos na capital paulista aos 16. Hoje fala com muito carinho no orgulho em fazer parte desses momentos. Com um sorriso, mas a voz embargada e os olhos marejados, relembra a dificuldade de se iniciar nesse mundo dos produtos de aviamentos e sazonais. Sempre sonhou em ter o que possui hoje, e mesmo com tantos patrões desacreditando de seu potencial, conseguiu ir atrás daquilo que a motivava: a arte do artesanato.

Os produtos chegam na loja e dali, são transformados em grandes realizações. Ela conta que nada é mais gratificante do que poder ajudar alguém que nem sabia o que estava procurando e encontra ali no seu estabelecimento. Na correria dos dias, as horas passam, a agitação aumenta, o fluxo cresce. Cada cliente fica um tempo observando aquele ambiente repleto de oportunidades. Oportunidade de fazer algo diferente do ano anterior, a chance de colocar uma cor diferente na decoração, de enfeitar a casa com pisca-pisca ou até fazer a festa temática do dia das bruxas que não aconteceu antes.

Na salinha apertada, rodeada de papelada importante e também do quadro estampando a foto da sua família, Marlene contava que proporcionar produtos de qualidade aos clientes a transforma. Pode ser que o Papai Noel não seja vendido hoje, que a abóbora gigante ainda passe despercebida ou o letreiro de “Feliz Natal” não seja usado, mas ela segue acreditando que cada fio, botão ou glitter pode ser utilizado em outros momentos justamente para não ser desperdiçado.

Ao andar pelas lojas, percebemos os olhares atentos nas promoções, o barulho dos comentários ao ver uma peça exposta ou as perguntas em relação aos preços. Para lá ou para cá, a multidão toma conta dos ambientes. Mesmo antes dos dias de comemoração, as pessoas fazem questão de irem em busca do que procuram o quanto antes. Mas sempre tem os que preferem comprar aos 45 minutos do segundo tempo. Na pressa para conseguir atender todos os clientes, Elen, funcionária que enfrenta todas as épocas corridas de venda do ano, fala que em alguns momentos, não consegue dar a atenção que as pessoas merecem. Seu olhar acompanhava a chegada e a saída dos clientes na loja. A atenção é máxima em um lugar que a exige a todo tempo.

No meio das linhas, botões e tecidos, a cearense de sotaque presente e forte expressa que nem imagina as diversas possibilidades que podem sair dali na sacola de cada pessoa. Uma linha pode se tornar mais de uma peça no Carnaval do Sambódromo do Anhembi ou nos bloquinhos pela cidade. E quando ela pensa nisso, os olhos até brilham em saber que, de alguma forma, fez parte daquilo.

A oferta e a demanda não param, assim como a agitação que só o ambiente da mais conhecida rua de comércio paulistana é capaz de proporcionar. Pelas ruas da 25 de março andam jovens, idosos, mulheres e homens carregando pequenas sacolas ou grandes volumes de mercadorias. De um lado o consumidor, do outro o vendedor. Ambos sabem que precisam um do outro, principalmente nessas épocas agitadas do comércio. Para Marlene, inspirar pessoas com seu empreendimento é motivo de orgulho. Em meio aos elogios que sua loja recebe, ela sempre sai com o sentimento de missão cumprida ao ver seus clientes com as sacolas recheadas de produtos que farão a diferença em épocas que se tornam especiais nas particularidades de cada um.

por
Letícia Assis
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31/10/2019 - 12h

Um novo modelo no ramo alimentício está caindo no gosto dos paulistanos. Apelidados de ‘dark kitchen’ ou ‘cozinhas fantasmas’, diversos restaurantes estão surgindo sem mesa, cadeiras, garçons e nem mesmo um espaço para receber clientes. Localizados em endereços desconhecidos – que podem até ser um imóvel residencial –, dependem apenas dos aplicativos de entrega para estar em funcionamento.

Com maior popularidade entre os jovens, os locais mais frequentes para esses pedidos são o trabalho e o domicílio. É o caso da jornalista Maria Teresa Gândara, 25, que utiliza os serviço de delivery principalmente por conta da rapidez e praticidade que os aplicativos oferecem. Para a jovem, tornaram-se tão comuns os pedidos via entrega que o próprio aplicativo já mantém seus restaurantes preferidos em uma aba exclusiva de fácil acesso. 

Fugindo da estrutura tradicional, com música ambiente, decoração e comida servida à mesa, os novos empreendedores romperam o conceito de estabelecimentos com serviço de atendimento, recebendo pedidos apenas via aplicativos especializados. 

Um exemplo é o restaurante Entrega Vegana. Para o proprietário Paulo Enomoto, 32, a intermediação feita pelos aplicativos de entrega ajudou a alavancar as vendas. “A onda do delivery acaba sendo uma nova vertente para as vendas, mas existe um público que ainda busca uma experiência gastronômica e com uma hospitalidade bem pensada e, para mim, eles não se conflitam”, afirma Enomoto. 

Restaurante Fasano, um dos mais conhecidos e caros da cidade de São Paulo ainda segue a estrutura tradicional. Localizado no Jardins.
Restaurante Fasano, com estrutura tradicional. Localizado no Jardins. Fonte: Divulgação/Fasano.

Para quem abre uma cozinha fantasma, um dos principais atrativos é a redução de custo em relação aos estabelecimentos com atendimento local. Ao subtrair os gastos com garçons e os altíssimos aluguéis nas zonas nobres de São Paulo, nota-se uma grande diferença no fechamento das contas ao final do mês. 

Outro fator vantajoso para quem opta por esse modelo de restaurante é a menor preocupação com o tipo de salão alugado e a localização. Embora aplicativos de entrega ainda utilizem a região atual do usuário para encontrar estabelecimentos próximos, agora o empresário não precisa se preocupar com a fachada e muito menos com o espaço para o cliente, podendo estar localizado até mesmo em um apartamento, desde que equipado. 

De acordo com o site ‘Cidade de São Paulo’, criado pela Secretaria Municipal de Turismo, existem em São Paulo mais de 20 mil restaurantes e 30 mil bares, oferecendo as mais variadas opções para o consumidor final.

Habitada por mais de 12 milhões de pessoas de acordo com dados do IBGE de 2018, a cidade de São Paulo recebe por ano quase 15 milhões de turistas, segundo o Observatório de Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo (OTE) de 2014. A junção de quase 30 milhões de pessoas gera uma concentração de diferentes culturas, fator que ajuda na ampliação da oferta dos cardápios dos restaurantes paulistanos. 

'Restaurantes'fantasmas' possibilitam maior variação de cardápio. Fonte: Divulgação/Arably.
'Restaurantes'fantasmas' possibilitam maior variação de cardápio. Fonte: Divulgação/Arably.

Ao contrário dos estabelecimentos fixos que determinam o tipo de comida que será servida aos clientes, os restaurantes virtuais têm a opção de experimentar diversas combinações em uma única cozinha, formando um maior leque de opções com custo reduzido, na medida em que dispensam gastos com estrutura.

Originárias da China, essas cozinhas valeram-se dos aplicativos de entrega de comida largamente utilizados no país. Somente em 2018, de acordo com a IResearch, a indústria do delivery movimentou mais de US$ 70 bilhões na China.

De acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), no Brasil esse novo mercado de pedidos via aplicativos de entrega movimenta cerca de R$ 1 bilhão por mês.

Um dos primeiros a investir no setor foi a multinacional americana Uber, ainda em 2017. Após expandir seu mercado para além do transporte de pessoas e criar a franquia Uber Eats, a empresa esteve envolvida na abertura de mais de quatro mil restaurantes virtuais. 

As plataformas de entrega de comida online foram o degrau de apoio de muitas cozinhas fantasmas. Por conta de atrativos como cupons de desconto, anúncios via redes sociais e até a propaganda dentro dos aplicativos, os restaurantes têm nesse meio uma maior difusão entre os adeptos da prática. 

A adequação do modelo ao setor foi tamanha que, recentemente, em agosto deste ano, a Ifood, startup brasileira de delivery, anunciou a marca de 20 milhões de pedidos por mês. Em junho, a empresa contabilizava cerca de 17,4 milhões de pedidos mensais. Com esse feito, a companhia registrou um crescimento de 15% em apenas dois meses.

Gigante Ifood conta com mais de 72 mil entregadores. Fonte: Divulgação/Ifood

Com mais de 100 mil estabelecimentos cadastrados em sua plataforma, de acordo com a própria startup, hoje a Ifood conta com mais de 72 mil entregadores parceiros em mais de 662 cidades brasileiras. 

A estudante Giulia Trevizan, 21, é a personificação desse novo perfil de consumidor. Utilizando o aplicativo mais de seis vezes por semana, geralmente pede lanches e pizzas. Para a estudante, a facilidade e a diversidade de restaurantes disponíveis no aplicativo são dois fatores significativos para a migração de tantas pessoas para a categoria. 

No entanto, tanto Trevizan quanto Gândara afirmam que as entregas, embora ofereçam comodidade, não substituem a experiência de ir a um estabelecimento. Para Gândara, “comer em casa é coisa para se fazer durante a semana e quando se está cansado, não te acrescenta nada”.

por
Carolina Faita Baptista
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31/10/2019 - 12h

Nos últimos anos tornou-se cada vez mais comum ouvir falar de intolerância ou alergia a alguns alimentos, principalmente ao glúten. E quem possui essa restrição alimentar sabe como a busca por produtos pode ser desgastante. Além da preocupação com alimentos industrializados, as opções oferecidas ainda são escassas e geralmente caras. Segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), 1% da população mundial sofre com a intolerância permanente ao glúten, a chamada doença celíaca.

 Essa doença é uma reação autoimune às proteínas encontradas no trigo, cevada e centeio, ou seja, o sistema imunológico identifica o alimento, que para a maioria das outras pessoas seria inofensivo, como uma ameaça. Indivíduos diagnosticados com ela sofrem danos intestinais e, se não for identificada e gerenciada corretamente, a doença pode levar ao câncer. O único tratamento é uma alimentação sem glúten por toda a vida.

Aninha Rodrigues, nutricionista e dona do perfil @meusegredinho, criado em 2013 para contar sobre sua vida sem glúten, hoje conta com mais de 50 mil seguidores no Instagram. Descobriu ser celíaca em 2012, aos 33 anos. Ela conta sobre a dificuldade que tinha há sete anos de encontrar produtos para celíacos. Hoje já temos gôndolas especiais na maioria dos mercados, e há uma oferta bem maior de produtos, inclusive com melhor qualidade. Acredito que aconteceu por uma evolução do mercado, tanto pelo crescimento da demanda pela popularização da dieta sem glúten, da onda saudável e fitness, ascensão do lowcarb, quanto pela maior disseminação de informações sobre as desordens relacionadas ao glúten.

Manter uma dieta especial como essa não é barato. Um estudo de 2018 no Reino Unido mostrou que alguns itens sem glúten custam, em média, 159% a mais do que os convencionais. Os produtos sem glúten substitutos variam. Encontramos pães pelo dobro do preço dos tradicionais ou até mesmo por quatro vezes mais. Mas é uma produção menor, que demanda mais ingredientes, mais cuidados, laudos e certificações que têm custo elevado, além de muitas vezes os produtos mais caros serem importados e por isso têm toda a carga de impostos e tramitação incluídos no valor final, diz Aninha.

Porém, esse mercado vem crescendo cada vez pela moda dos regimes sem glúten. Dados da consultoria internacional Euromonitor mostram que este setor deve ter uma expansão de 35% a 40% nos próximos três anos. Os produtos glúten-free existem para atender ao público celíaco, mas ganharam e conquistaram consumidores que não possuem a doença, mas que buscam uma alimentação natural e mais saudável. Há o entendimento de que a ausência de glúten ou lactose torna um produto light ou fit.

A arquiteta Luciana de Oliveira tem uma filha celíaca há mais de cinco anos e aprendeu a fazer produtos sem glúten, por meio de cursos e workshops. Ela conta que, nesse período, as opções de alimentos seguros para sua filha aumentaram significativamente. Vêm crescendo cada vez mais, pela procura por uma alimentação mais ‘saudável’ e dietas isentas de glúten, açúcar e lactose, diz. Luciana acredita que essa demanda torna o mercado mais atraente aos investidores, beneficiando quem tem a restrição a esses alimentos.

Referindo-se à experiência de sua filha, Luciana também fala sobre os desafios de quem sofre esse tipo de alergia alimentar, que abrangem a mudança de hábitos, de cardápio e a aceitação pela sociedade. A maior dificuldade que vejo é quando ela sai de casa, pois há sempre a dúvida de comer na rua algo que seja em primeiro lugar seguro, pois os lugares na maioria das vezes não estão preparados para atender pessoas com restrições alimentícias. Mas, também, é a visão das pessoas sobre a situação dela que é difícil, pois acham que é frescura, e não veem que realmente é uma questão de vida ou morte.”

Investir nesse nicho é uma boa opção para os empreendedores e também facilitará a vida de celíacos em todo o país. Mesmo sendo um grupo restrito, é fundamental para essas pessoas encontrar alimentos para elas comerem bem e de forma saudável, sem a necessidade de uma mudança tão radical de uma hora para outra, realidade que os celíacos enfrentam hoje no Brasil.

por
Leonardo Pratt
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31/10/2019 - 12h

O pão é um dos alimentos mais consumidos no mundo, e no Brasil não poderia ser diferente. Ele está presente quase que diariamente nas mesas dos brasileiros, nas mais diversas formas, tamanhos e sabores – até por isso, influencia nas finanças dos consumidores. E, por ser um dos produtos mais conhecidos do mundo, acabou ganhando o seu próprio dia: 16 de outubro. A data foi escolhida pela União Internacional de Padeiros e Afins, em 2000, e é uma homenagem ao dia de fundação da FAO, Organização para Alimentação e Agricultura da ONU.

O pão no Brasil tem como principal ingrediente o trigo, mesmo podendo ser feito à base de diversos outros grãos. E, por conta justamente do preço do trigo, padarias de todo o país registram variações no preço do seu produto mais importante. "No ano passado, vendíamos o pão na faixa dos R$ 10 e hoje já estamos vendendo a R$ 12,90, devido à farinha [de trigo], que ficou mais cara", afirma Rosinha Carneiro, encarregada de pães na Padaria Maria dos Pães, em Osasco.

O Brasil importa muito este grão. Somente neste ano, até setembro, quase 5 milhões de toneladas já foram trazidas. A Argentina é, de longe, o país que mais exporta trigo para o Brasil, representando cerca de 85,5% do total, segundo a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo). Paraguai, em segundo lugar, e Uruguai, em terceiro, também aparecem com um certo destaque nas importações deste grão.

A panificação é responsável por 55% do uso de todo o trigo no país, produzido ou importado. Não por acaso, o setor está presente em todos os municípios do Brasil. Como resultado, a produção de pães emprega, atualmente, mais de 920 mil pessoas diretamente e mais 1,6 milhão indiretamente. Os dados são da Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (Abip). São mais de 70 mil padarias e confeitarias em todo o país, sendo 95% delas micro ou pequenas empresas familiares. Mas em todas elas o grande destaque é o pão francês.

"Pão francês é o carro-chefe da padaria. É o primeiro produto que vai para a mesa do cliente", afirma Almir Rogério, padeiro do Supermercado Sorocaba, em Osasco. Mas, mesmo sendo muito importante, o consumo deste produto está em queda.

A Abip mostra que o volume de pães franceses vendidos está diminuindo desde 2015. Entre 2017 e 2018, foi registrada a maior queda do período: 4,61%. Até por isso, as padarias têm sido obrigadas a oferecer mais produtos aos consumidores, como salgados, doces e, claro, outro tipos de pães.

Mesmo em queda, os pães franceses são os principais produtos entre os mais de 5,6 milhões de panificados produzidos anualmente. É o que garante José Batista de Oliveira, presidente da Abip. "Apesar do nome, o pãozinho francês é coisa muito nossa. Ele é a cara do Brasil e o principal produto das nossas padarias, representando, sozinho, 45% da venda de pães no país. E não é para menos, quem não tem uma lembrança gostosa, um momento especial ou uma memória afetiva que envolva um pão quentinho, o cheiro de café recém-passado e os amigos ou a família reunidos? É ele quem está nas mesas dos brasileiros há décadas, e cada um tem um jeito de comer pão francês”, afirma Oliveira.

Para o presidente da Abip, pão francês é coisa séria e não somente um "alimento do dia a dia". Citando a ABNT NBR 16170, norma técnica de qualidade e classificação publicada em 24 de abril de 2013, ele explica como deve ser um pão francês ideal: "Tem um tom dourado, uma textura crocante por fora, e um miolo com toque aveludado, bem macio e sem buracos. Nosso legítimo pãozinho tem apenas uma pestana, que é aquele corte na parte superior, bem fina, e uma certa elasticidade, ou seja, quando damos a famosa ‘apertadinha’ conseguimos comer, numa mesma mordida, tanto o miolo macio quanto a casca crocante".

Atualmente, o pão francês enfrenta uma concorrência maior nas padarias, com mais opções para quem quer fugir do tradicional. Mas isso não preocupa a Abip, justamente por o pão francês ainda representar a maior fatia dos produtos panificados. E uma maior busca por pães de fermentação natural ou pães artesanais é vista de com bons olhos.

"A procura por alimentos da linha fitness aumentou nos últimos anos, mas não há indícios de que isso afete diretamente a procura pelo tradicional pão francês", diz Isabela Abalen, assessora de imprensa da Abip. "Neste caso, os pães de fermentação natural entram como mais uma opção para o consumidor, e não como substituto do tipo francês. Tanto que o faturamento do pão francês no primeiro semestre de 2019 teve um aumento na sua média final de 4,24% em relação ao mesmo período no ano passado, com a média puxada para cima por aquelas empresas que mostraram bom retorno a partir dos investimentos em melhoria de processos e de qualidade do pão".

por
João Pedro Freitas
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31/10/2019 - 12h

Por João Pedro Freitas


Um projeto de lei de autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ)
promete pôr fim à crise financeira do futebol brasileiro, incentivando
clubes a se transformarem em sociedades anônimas (S/A), com
ações negociadas na bolsa de valores. A proposta ainda precisa ser
aprovada pela Câmara dos Deputados.

Vale lembrar que atualmente nada impede um clube de futebol de
deixar o modelo de associação e virar empresa limitada ou
sociedade anônima, porém os impostos, que são parciais ou
inexistentes para associações sem fins lucrativos, passariam a ser
cobrados integralmente dos clubes que assumirem a condição de
companhias. Como forma de forçar a migração dos clubes para a estrutura
empresarial, o deputado pretende aplicar impostos sobre
associações sem fins lucrativos como se fossem empresas
limitadas ou S/A.

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Créditos: FalaGalo

As dívidas fiscais não poderiam ser incluídas em processos de
recuperação judicial. Neste caso, Pedro Paulo pretende aliviar a
situação dos clubes com um percentual superior de reduções. Enquanto o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut) permitiu o abatimento de até 40% dos juros sobre as dívidas, a proposta do deputado aumentaria este percentual para 50%. Em contrapartida, os clubes que aderirem a este refinanciamento por meio de suas empresas precisariam pagar cinco parcelas de forma antecipada, o
equivalente a 15% da dívida consolidada por meio do refinanciamento. O deputado propõe um alongamento de 20 anos, mesmo prazo do Profut, para que os clubes consigam quitar os impostos não pagos.

A Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados fez a análise
da contabilidade de 19 times da Série A, em 2018, e alguns casos
são mais dramáticos. Santos e Chapecoense, por exemplo, jamais
conseguiriam pagar seus passivos, enquanto o Cruzeiro levaria
mais de 200 anos. O Botafogo vem logo em seguida com 34 anos
para quitar o que deve. O estudo conclui que, apesar das dívidas, o
mercado de futebol no Brasil é bastante promissor aos investidores.
Tanto pela receita líquida dos clubes analisados quanto pela
rentabilidade positiva de metade deles.

Na Europa este modelo já é aplicado há mais tempo, e conta com
alguns resultados ótimos e outros catastróficos, tornando o tema
polêmico. Vários times são empresas e têm ações no mercado,
como Manchester United, Arsenal, Juventus, Lazio e Inter de Milão,
e todos estão bem financeiramente. Porém, existem alguns casos
que deram muito errado e resultaram até em falências, como os dos
tradicionais Parma (Itália) e Rangers (Escócia).


No Brasil, o principal exemplo de sociedade anônima até o
momento é o Figueirense e o resultado foi considerado desastroso,
deixando dirigentes de outros clubes literalmente com o pé atrás.
Em agosto de 2017, os catarinenses começaram a parceria com a
empresa Elephant, que prometia mudar o clube de patamar. No
entanto, depois de dois anos o contrato foi rompido, já que os
investidores não cumpriram o acordo. O período ficou marcado por
salários atrasados, descaso com as categorias de base e o W.O.
diante do Cuiabá, que deixou o clube na lanterna da Série B do
Brasileiro.

O advogado esportivo Aldo Kurle diz que, quando uma empresa ou
um investidor descumprir um acordo, as sanções recairão sobre os administradores. “Já existem previsões de penalidades disciplinares, mas não têm sido aplicadas com a devida seriedade”,
afirma.

Da elite nacional, apenas os dirigentes de Athletico-PR, Botafogo e
CSA enxergam o projeto com bons olhos. Mas na segunda divisão
a proposta atrai quase metade dos 20 clubes. América-MG,
Coritiba, Guarani e São Bento encomendaram estudos de
viabilidade para avaliar a migração. Botafogo-SP, Red Bull
Bragantino e Londrina, por sua vez, já se tornaram empresas.
A maioria dos clubes considerados "grandes" já se posicionou a
respeito do tema por meio de seus dirigentes e discordou do projeto
por conta da equiparação tributária entre as associações sem fins
lucrativos e empresas.

O Flamengo, um dos únicos clubes do Brasil
a fazer ajustes fiscais e com as contas em dia, discorda do projeto
em três pontos importantes: carga de impostos, a liberação de
recursos de apostas apenas para quem se tornar clube-empresa e
a criação de um fundo para ajudar quem estiver com dificuldades
financeiras. Na contramão do rubro-negro, o Botafogo, afundado em
dívidas, aderiu ao projeto e está em busca de investidores para
transformar-se em sociedade anônima a partir do ano que vem.

O economista e ex-presidente do Palmeiras Luiz Gonzaga Belluzzo
não vê problema em clubes virarem empresas, mas não concorda
com a forma como a questão vem sendo conduzida. “Não tenho
nada contra os clubes virarem empresas, acho válido terem a
liberdade, pois é opção de cada um, mas este projeto de lei está
obrigando todos a virarem empresas. É um absurdo cobrar de
associações sem fins lucrativos o mesmo que se cobra de
companhias”, diz Beluzzo, acrescentando que as instituições podem
ficar reféns de “aventureiros”.
Já Kurle tem outra visão e se mostra favorável ao projeto de lei.
“Entendo que há a necessidade de profissionalização dos clubes.
Atualmente, na figura de associações sem fins lucrativos, os
dirigentes não têm responsabilidade pelos danos causados ao clube
durante sua administração”, argumenta.

por
Raul Vitor
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31/10/2019 - 12h

O número recorde de 9 milhões de microempreendedores individuais (MEIs) que o Brasil atingiu este ano indica uma forte atração pelo setor, mas não significa que a situação do microempreendedor tenha melhorado no país.

A opinião é do engenheiro e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP Paulo Feldmann, ex-presidente do Conselho da Pequena Empresa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo.

“Microempreendedor individual não é empreendedor. A palavra cria essa função, mas na realidade o MEI continua sendo um trabalhador informal”, avalia Feldmann. Para o professor, o conceito de empreendedor no Brasil está vinculado à pessoa que abre uma pequena empresa ou uma microempresa, diferente de boa parte do mundo.

“Empreendedor, em outros países, está vinculado à pessoa que traz uma inovação para o mercado, que cria um produto novo. No Brasil, o responsável pela abertura de uma franquia, por exemplo, é tido como empreendedor, mas, na verdade, é um empresário”, afirma.

Segundo Feldmann, o Brasil é um dos piores países do mundo em proteção e incentivo às pequenas empresas. “Em qualquer país do mundo a pequena empresa tem várias vantagens, como financiamentos especiais e pagamento de impostos reduzidos. O Brasil não tem a mentalidade de apoiar o pequeno empreendedor.”

O professor sustenta que a pequena empresa é uma importante fonte de empregos para o país. De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), os pequenos negócios representam cerca de 99% das empresas do país.

 O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aponta que 75% das vagas criadas em setembro deste ano foram geradas por micro e pequenas empresas. Feldmann relaciona esse aumento ao crescente número de motoristas e entregadores de aplicativo, mas alerta para as condições precárias de trabalho.

“O número de motoristas de aplicativo dobrou em dois anos. Em sua maioria, são trabalhos precários, sem direito algum. É uma ilusão o sentimento de não haver patrão, de que possuem um horário flexível. A maioria ganha mal e não possui direito nenhum”, completa.

“Em outros países há um direito ou garantia mínima para essas pessoas, mas no Brasil não tem nada”, diz. Em setembro deste ano, o Senado da Califórnia aprovou uma lei que obriga empresas de transporte privado urbano, como a Uber, a reconhecer os motoristas que utilizam a plataforma como seus empregados.

Edson Braga, 58 anos, escolheu trabalhar como motorista no Uber após tentativas frustradas de se realocar no mercado de trabalho de origem. “Troquei de profissão quando o setor imobiliário estagnou. Trabalhava como corretor de imóveis na Praia Grande, litoral paulista. Tentei me realocar na minha antiga profissão, onde supervisionava cartas de crédito, mas não obtive sucesso”, conta Edson, que está há três meses no aplicativo.